O GLOBO - 10/03
Não há qualquer ditadura na relação dos países mais ricos , com renda mais bem distribuída, com os melhores índices de desenvolvimento humano
A morte de Hugo Chávez leva a reflexões sobre os caminhos escolhidos pelos latino-americanos para superar o mal da pobreza e da miséria, ainda marca registrada do continente, embora hoje menos presente em alguns países da região. A Venezuela, um deles, e graças ao próprio Chávez. Por aproveitar a explosão dos preços do barril de petróleo no seu período de poder, de US$ 20 para mais de US$ 100, e canalizar os petrodólares abundantes aos pobres, o caudilho melhorou o quadro social no seu país. Segundo dados da Cepal, da ONU, o contingente de pobres venezuelanos caiu de 45% da população para 27%.
Importa discutir se a experiência chavista reforça a defesa de regimes autoritários como a via mais eficiente para a justiça social. Não reforça, é o contrário.
Rápida consulta na lista das economias mais desenvolvidas do mundo, das sociedades em que a renda é mais bem distribuída, e da relação dos melhores índices de desenvolvimento humano (IDH) mostra maciça presença de países em que as instituições democráticas republicanas são historicamente fortes. Não por coincidência. O Brasil, por sua vez, tem obtido conquistas sociais capazes de rivalizar com as chavistas dentro dos marcos da democracia representativa.
No outro verso da História, há o fracasso dos projetos coletivistas, autoritários, o mais estrondoso deles a União Soviética. Parêntesis: a China ainda é um ponto fora da curva, em trânsito, porque é preciso saber até quando um regime fechado, de partido único, resistirá ao enriquecimento da população, com a criação de forte e ambiciosa, no bom sentido, classe média.
Pelo fato de os caudilhos/ditadores esmagarem as instituições que dão estabilidade ao desenvolvimento — por meio do respeito ao direito de propriedade, a uma série de direitos civis, segurança jurídica —, o sucesso que pode ser obtido num período de bonança econômica não se sustenta a médio e longo prazos.
A Argentina é exemplo mais reluzente: Perón distribuiu renda e criou um aparato sindical com ligações ao Estado tão forte que o partido Justicialista domina o espaço político, e o peronista da vez, hoje Cristina K., curva as instituições à sua vontade. O resultado é o empobrecimento e perda mundial de importância da Argentina.
A sorte do Brasil foi o varguismo ter sido contido pela modernização a partir da abertura econômica na década de 90. Mesmo assim, ainda há o peso da CLT e a atuação de corporações sindicais na defesa de privilégios contra os interesses da sociedade. A luta para quebrar o cartório dos portos é um exemplo. A própria Venezuela deixada de herança por Chávez está em frangalhos: previsão de 28% de inflação, a petroleira PDVSA desmantelada, desbastecimento, falta de divisas.
A ponto de o legado do caudilho poder destruir o chavismo. A própria falta de instituições fortes leva os chavistas a forçar a criação do mito Chávez. Este filme também é conhecido.
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