sexta-feira, julho 08, 2011

LUIZ GARCIA - Ação no campo


Ação no campo
LUIZ GARCIA
O GLOBO - 08/07/11

Prevenir assassinatos é obviamente uma obrigação importante de qualquer governo - talvez mais até do que punir assassinos. Muitos crimes, obviamente, não são previsíveis, mas, pelo menos no Brasil, e apesar do nosso tamanhão todo, as disputas por terras têm um potencial histórico de violência.

Este ano, a Comissão Pastoral da Terra ofereceu ao governo federal uma lista de 165 pessoas ameaçadas de morte. Uma década atrás, eram 207, mas a redução não é indício de redução da violência no campo: as 42 que saíram da lista foram assassinadas.

O governo, agora, foi menos pessimista que a Pastoral: a Secretaria de Direitos Humanos cortou 34 nomes da relação dos cidadãos ameaçados, por considerar que não correm mais perigo. É verdade que a ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário, também disse que seria impossível as autoridades protegerem adequadamente todos os 165 da lista inicial. O que pode parecer pouca fé na eficiência das autoridades - ou excesso de medo da eficiência dos ladrões de terras. Há motivo suficiente para esse temor: nos últimos dez anos, 42 líderes rurais, sem-terra e defensores do meio ambiente foram assassinados.

Seja como for, o planejamento da proteção é bastante sofisticado. Todos os 131 cidadãos a serem protegidos tiveram seus casos estudados e receberam um "coeficiente de risco pessoal e familiar". Dependendo do coeficiente de cada um, merecerão maior ou menor atenção de autoridades federais e estaduais.

De qualquer maneira, talvez seja também uma boa ideia dar intensa publicidade à punição dos invasores de terras e assassinos de líderes rurais. Além disso, se o governo sabe quem está ameaçado, com certeza também conhece muitos dos autores das ameaças - e seria bastante útil que a opinião pública também os conheça. Principalmente se são fazendeiros com prestígio local e poder político.

Pode ser precipitação e injustiça imaginar um cenário em que os vilões da disputa de terras sejam exclusivamente ricos proprietários de terras - mas só a publicidade objetiva dos episódios dessa guerra doméstica permitirá ao Brasil urbano conhecer as dimensões do problema e avaliar as ações das autoridades.

Enfim, se as ações agora prometidas tiverem a eficiência que, pelo menos no papel, parecem ter, melhor para o governo e para todo o país.

EDITORIAL - FOLHA DE SÃO PAULO - Fim da linha


Fim da linha
EDITORIAL
Folha de S. Paulo - 08/07/2011

Trem-bala segue a caminho de um terceiro adiamento, com as muitas dúvidas que ainda cercam a viabilidade do empreendimento faraônico O terceiro adiamento que se prenuncia para o leilão do trem-bala deveria também ser o derradeiro. Melhor ainda seria pôr um ponto final nessa ideia fixa dos governos petistas.
Um trem de alta velocidade (TAV), que viajaria a 350 km/h entre Rio de Janeiro, São Paulo e Campinas, embora justificável, está longe de ser prioridade. O Brasil tem gargalos logísticos mais graves e urgentes, como portos sucateados, aeroportos apinhados e estradas malconservadas.
O empreendimento, hoje, mais se parece com um delírio de grandeza. Não há projeto executivo de engenharia. Não se definiu com clareza quais serão as estações intermediárias. O cálculo do valor das desapropriações ainda é grosseiro. O custo estimado da obra deu saltos extraordinários.
Com tantas incertezas, não estranha que os consórcios em gestação relutem em apresentar propostas. Diante da alta probabilidade de fiasco, dois leilões já foram postergados, no final de 2010 e em abril passado. É sintomático que, agora, o grupo mais sólido -TAV Brasil, com participação sul-coreana- tome a iniciativa de solicitar o adiamento do certame marcado para segunda-feira.
Grandes empreiteiras nacionais negociam com empresas do setor ferroviário no exterior, mas não se engajaram em consórcio algum. Como de hábito por aqui, almejam ver o governo federal arcar com quase todo o risco e o investimento para pôr o trem-bala nos trilhos.
Não se contentam com os R$ 4 bilhões que o Planalto planeja injetar na aventura, mais R$ 22 bilhões de empréstimo a juros subsidiados do BNDES e até R$ 5 bilhões de fundos de pensão. Já projetam um custo total de R$ 55 bilhões e pretendem que o governo de Dilma Rousseff triplique para R$ 12 bilhões os aportes diretos na estatal do trem-bala, a Etav.
Se depende tanto de inversões e subsídios estatais, parece evidente que o projeto não apresenta viabilidade econômica. A demora do Planalto em demonstrar a racionalidade do trem-bala permite concluir que a tarefa seja impossível e que o TAV se resuma a mais uma obra faraônica para exibir em campanhas eleitorais e alimentar devaneios de superpotência.
No Brasil real, o Ministério dos Transportes dedicou mais energia, sob administrações petistas, a atender os interesses eleitorais e materiais de seus ocupantes. Por seus corredores trafegavam mais políticos envolvidos em maquinações do que engenheiros encarregados de estudos técnicos.
Não foi por outra razão que caíram o ministro Alfredo Nascimento (PR-AM) e seus auxiliares imediatos. Uma boa hora para despedir-se também do trem-bala.

ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK - Chegou a hora de acionar os freios no BNDES


Chegou a hora de acionar os freios no BNDES
ROGÉRIO L. FURQUIM WERNECK
O Globo - 08/07/2011

Na esteira do ruidoso caso Pão de Açúcar, o BNDES não sai das manchetes. E não se pode dizer que a mídia esteja dando destaque a aspectos positivos da instituição. O episódio, altamente desgastante para o governo, enseja reflexões sobre a lamentável trajetória do BNDES nos útimos anos. É preciso entender como as coisas chegaram a esse ponto e as correções que se fazem necessárias.

Desde 2008, o Tesouro tem feito transferências maciças de recursos ao BNDES, bancadas por emissão de dívida pública. Aos R$230 bilhões transferidos entre 2008 e 2010, somaram-se agora mais R$55 bilhões em 2011. O valor total - R$285 bilhões - é quatro vezes maior do que o da gigantesca operação de capitalização da Petrobras do ano passado. Corresponde a cerca de 24 vezes o valor dos recursos do Tesouro canalizados ao PAC no primeiro semestre deste ano. Tais transferências, feitas por fora do processo orçamentário e sem contabilização nas estatísticas de dívida líquida e de resultado primário, têm permitido ao governo manter farto orçamento paralelo no BNDES, principal canal da expansão fiscal observada nos últimos anos.

Na gestão das contas públicas federais, convivem hoje dois mundos completamente ditintos. De um lado, tem-se a dura realidade do Orçamento Federal, onde tudo é escasso e se contam os centavos. De outro, tem-se a Ilha da Fantasia do BNDES, mantida com emissões de dívida pública, onde parece haver recursos para tudo. Não é surpreendente que esse ambiente de tanta fartura tenha fomentado um clima de megalomania e dissipação, fundado na presunção de que dinheiro público é o que não falta. Ganham força as agendas próprias, multiplicam-se as missões inadiáveis e os investimentos grandiosos e voluntaristas, com custo a ser debitado ao contribuinte. Disseminou-se a ideia de que não há projeto, por mais dispendioso e injustificável que pareça, que não possa ser financiado pelo BNDES. E os que podem, ao banco, acorrem.

O que chama a atenção no caso Pão de Açúcar são a extensão e o vigor da resistência da opinião pública ao envolvimento do BNDES na operação. Foi muito mais que reação da mídia. É impressionante que até mesmo formadores de opinião que não perdem oportunidade de tecer elogios ao governo tenham manifestado estranheza com o despropósito da operação. O caso parece ter sido a última palha diante do crescente desconforto com o destino pouco defensável que recursos públicos vêm tendo no BNDES. Os jornais de quarta-feira, 29, já não deixavam dúvidas sobre a extensão da indignação. Mas o governo levou algum tempo para notar que o caldo tinha entornado. No dia 30, o BNDES ainda tentou enrolar-se na Bandeira Nacional para defender a operação. Só no dia 1º, quando o alarme soou no Planalto, a instituição se viu afinal compelida a tentar desfazer a trapalhada e conter danos.

O episódio pode vir a ser um divisor de águas. Salta aos olhos que chegou o momento de acionar os freios no BNDES. Já corre no Senado a proposta de que a Lei de Diretrizes Orçamentárias exija que futuras transferências ao BNDES sejam incluídas no Orçamento. Mas só isso é pouco. O ideal seria simplesmente fechar de vez a ligação clandestina do BNDES ao Tesouro.

A nota dissonante - quem diria - veio do Banco Central. O Relatório de Inflação, publicado pela instituição em 29/6, inclui estimativas dos impulsos fiscais a que vem sendo submetida a economia brasileira, feitas de acordo com três metodologias distintas. Todas elas baseadas no resultado primário do governo. Tendo em conta as três medidas, o BC concluiu que a política fiscal foi neutra em 2010! Como os R$107,5 bilhões transferidos do Tesouro ao BNDES foram omitidos da estatística oficial de resultado primário, o BC simplesmente não conseguiu detectar a farra fiscal de 2010. Quem deve estar eufórico é o ministro Guido Mantega. Ganhou do Banco Central um atestado de que foi austero em 2010. Com um BC desses, sim, dá gosto trabalhar, terá comemorado Mantega.

ALON FEUERWERKE - Tecnicismo impossível


Tecnicismo impossível
ALON FEUERWERKE
Correio Braziliense - 08/07/2011

Quem ajuda a sustentar governos na democracia ou na ditadura quer retribuição em nacos de poder. Para abrigar os amigos e alavancar os negócios dos amigos

A crise no Ministério dos Transportes e a remoção do ministro desencadearam nova rodada de debates a respeito do chamado fisiologismo. É mesmo inevitável a discussão. Há entre nós a ideia consolidada sobre a vantagem de governos ditos técnicos.

Vacinados contra a política.

Eles só existem na imaginação. Combater a corrupção é vital. Imaginar que o sucesso nessa empreitada passa pela recusa à política é devaneio.

Governos técnicos são impossíveis na democracia, mas toda crise provocada pela revelação de malfeitos, ou por simples acusações, acaba retornando ao tema. Uma ficção conveniente.

A única certeza sobre governos técnicos é serem formados por políticos suficientemente espertos para vender o peixe. Até que o primeiro grande escândalo desmonta o teatro.

Aliás, são impossíveis também nas ditaduras. Principalmente. Quem ajuda a sustentar governos na democracia ou na ditadura quer retribuição em nacos de poder. Para abrigar os amigos e alavancar os negócios dos amigos.

Até que um dia a sociedade se cansa do monopólio do mando pelo mesmo grupo durante muito tempo e resolve dar um basta. Pode ser com eleição ou, na falta dela, com revolução.

É o que se passa no mundo árabe. Países com muitas riquezas em que panelinhas se aboletam no poder para fazer negócios embalados numa suposta missão histórico-ideológica.

Há muito tempo as formações evoluídas encontraram o mecanismo mais eficaz para combater a tendência de o poder escorregar rumo à ilegalidade sistemática e orgânica.

É a alternância. Revezar os grupos, as panelinhas. Não deixar a rapaziada na zona de conforto.

A melhor maneira de impedir que o Estado passe a ter donos é cultivar as condições para que alguém diferente mantenha a possibilidade real de chegar lá.

Há as ferramentas de controle e punição do próprio Estado. Que devem ser usadas. A polícia, os promotores e os juízes estão aí para isso.

Infelizmente, toda autonomia tem um limite. É inevitável que as partes do Estado se deixem influenciar pela política.

O sistema perfeito de freios e contrapesos não existe. É utopia.

De vez em quando alguém pomposamente recorre à expressão "políticas de Estado, instituições de Estado e não de governo", mas o discurso costuma vir para dar legitimidade adicional aos intentos de um governo qualquer.

E a regra vale em todos os patamares. Um sistema político é tão mais saudável quanto menos penoso e arriscado é fazer oposição. Nacional, regional ou local.

Vai mal
Por esse ângulo, a coisa no Brasil merece cuidados. Nota-se nos vários níveis o quase desaparecimento da oposição. Não a formal, mas a real. A fórmula corriqueira no Brasil destes dias é o governo sem contraponto.

O fenômeno tem mais visibilidade na União e nos principais estados, mas espalha-se por todo o território nacional. Uma gentileza aqui, uma emenda ali, uma canetinha acolá. E a coisa está resolvida.

A tendência não discrimina partido ou viés político-ideológico.

É raríssimo encontrar quem esteja disposto a ficar fora do jogo para construir seu próprio caminho à margem do poder.

Para começar, o sujeito precisa de uma legenda. Como as atuais têm dono, precisa de uma só para ele. Fica um pouco mais fácil se o objetivo é aderir. Mas se é construir uma alternativa, o risco é chegar à situação atual de Marina Silva.

Tendo que começar do zero. Não é para qualquer um.

E só uma sigla não basta, pois o sistema bloqueia a possibilidade de outsiders adquirirem massa crítica. Um bloqueio eficaz são as regras para a propaganda no rádio e na televisão e para os debates. Outro é a fidelidade partidária.

Nem ouvir falar
A comissão da Câmara dos Deputados que analisa a reforma política tem esperança de que o assunto seja votado ainda este ano. Mas há preocupação com a descoordenação entre deputados e senadores.

Outra preocupação é com as eleições municipais. A comissão decidiu que não fará nenhuma proposta de mudança para as urnas do ano que vem. A pressão das bases municipais prevaleceu.

Prefeitos e vereadores não querem nem ouvir falar em reforma política já.

NELSON MOTTA - Velha novela, novos atores


Velha novela, novos atores
NELSON MOTTA
O Globo - 08/07/2011

Há 22 anos, nos estertores do governo Sarney, fazia espetacular sucesso a novela "Vale tudo", de Gilberto Braga, que expressava os sentimentos mais profundos do país naquele momento, com a inflação desenfreada, a fraude do Plano Cruzado, a moratória humilhante, o desastre administrativo, a corrupção generalizada e impune. Maria de Fátima e Odete Roitman eram odiadas como símbolos nacionais da arrogância, da mentira, do cinismo e da maldade.

Reprisada no canal Viva, a novela repetiu o sucesso. As vilanias, as covardias, os roubos, os deboches - e a impunidade - continuam atuais. A diferença é que a festa pobre que Cazuza cantava na abertura de "Vale tudo" agora é rica, nouveau riche, deslumbrada, movida a jatinhos e resorts, com empresários e sindicalistas confraternizando alegremente, julgadores e julgados dividindo mesas e viagens, controladores e controlados sem qualquer controle.

Os políticos são os mesmos, só mudam de nome e de partido, mas agora são botoxados e trocaram o acaju dos cabelos pelo negro graúna. Os empresários só mudaram de cara e de ramo, agora são todos progressistas, preocupados com a comunidade e a sustentabilidade, e o seu objetivo principal é gerar empregos e impedir que os estrangeiros invadam nosso mercado (rs).

Diante da fúria e da revolta que me despertam a ladroeira e o cinismo dessa gentalha, faço um exame de consciência: será que, depois de 22 anos como um liberal radical e independente, fui dominado pela ira indignada e regredi a um moralismo pequeno burguês udenista?

O engraçado é que na época de "Vale tudo", quando era oposição e o seu denuncismo implacável revelava falcatruas e maracutaias, o PT foi apelidado de "UDN de macacão". Bons tempos, bom humor. Hoje a palavra de ordem é defender o companheiro a qualquer custo, e depois levá-lo num canto e dizer que ele estava errado.

A surpresa é ver o governo Dilma patinando na administração, logo onde se esperava dinamismo e eficiência, mas se mostrando muito mais comprometido com a ética e o combate à corrupção do que o anterior. Não é que seja tão difícil assim, mas já é um avanço.

EDITORIAL - O ESTADO DE SÃO PAULO - Dilma diante da alcateia


Dilma diante da alcateia
EDITORIAL
O Estado de S.Paulo - 08/07/11

A presidente Dilma Rousseff não escapou do ressentimento da base parlamentar do Planalto por ter preferido esperar que o ministro dos Transportes, Alfredo Nascimento, titular do mal chamado Partido da República (PR), se enforcasse nas próprias cordas, em vez de fazer a coisa certa para demonstrar a sua intransigência com a corrupção, qualquer que fosse o preço a pagar: afastar o ministro juntamente com os seus quatro auxiliares diretos suspeitos de cobrar propinas e superfaturar obras pagas pela pasta. Mas, ao poupá-lo, além de tornar a ser vista como vacilante, Dilma não escapou das críticas dos chamados aliados. "O ministro não merecia esse desenlace", reclamou um deputado da sua legenda. "Isso terá consequências", previu o presidente de outra sigla governista, inconformado com a demissão dos quatro suspeitos sem consulta a Nascimento.

Afinal, ele teve de se demitir, anteontem, quando novos escândalos mancharam o seu já carregado prontuário. Na mesma quarta-feira, O Globo revelou que uma empresa de seu filho Gustavo Morais Pereira cresceu colossais 86.500% em seis anos - de R$ 60 mil para R$ 52,3 milhões. O precoce empresário de 27 anos fazia negócios com outra empresa, beneficiária de recursos do Ministério dos Transportes - onde a mulher de seu proprietário é funcionária nomeada por Nascimento e mexe com dinheiro grosso. Além disso, o site do Estado revelou que o então chefe de gabinete da pasta, Mauro Barbosa, um dos afastados por Dilma, constrói em Brasília uma casa que deverá custar-lhe cerca de R$ 4 milhões. E, completando a safra de escândalos do dia, em um dos 74 inquéritos abertos para apurar desvio de verbas no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a Polícia Federal apurou que um sobrinho do deputado federal João Maia, outro republicano, cobrava pedágio de 5% dos valores pagos a uma empresa prestadora de serviços ao órgão.

O Ministério dos Transportes, terreno de onde jorra lama onde quer que se perfure, foi cedido pelo então presidente Lula, ainda no seu primeiro mandato, ao PL do vice José Alencar. A legenda veio a se chamar PR depois da fusão com o Prona. Pelo ingresso de Alencar na chapa, o PT, presidido pelo deputado José Dirceu, pagou R$ 10 milhões ao PL controlado pelo colega Valdemar Costa Neto. Eles se reuniram a poucos metros de onde Lula e Alencar se entendiam. Réu do mensalão, Costa Neto renunciou para não perder o mandato. Reeleito, segue sendo o capo do PR presidido por Nascimento. "Despachava" com empreiteiros no gabinete do ministro. Disputa com outros figurões da base a condição de encarnar o acervo mais representativo da herança maldita que a presidente recebeu do seu mentor. Lula não só uniu em torno de si a escória política nacional, como permitiu-lhe frequentar sem embaraço os cofres federais.

Sabe-se hoje que sua ministra da Casa Civil não estava pisando nos astros, distraída, enquanto se perpetrava o assalto ao trem pagador do Ministério dos Transportes. Já não vem ao caso imaginar o que ela fez ou deixou de fazer pelo patrimônio público posto ao alcance dos lobos. Mas dois fatos atuais não podem ser deixados de lado. Um é que, ao assumir a Presidência da República, prometeu ser implacável com a corrupção. O outro é que a corrupção continuou solta e pesada nos Transportes até que a imprensa a expusesse. Nessa hora, no fim da semana passada, a presidente teve a chance histórica de iniciar uma cirurgia radical na pasta para livrar-se da "herança maldita". Em vez de aproveitá-la, preferiu manter o ministro e entregar-lhe a apuração das traficâncias praticadas a um palmo do seu nariz. Depois, em zigue-zague, mandou suspender as licitações por ele aprovadas, enquanto as ministras da Casa começavam a tratá-lo como um morto-vivo.

A presidente, em suma, deixou passar a primeira hora da verdade da sua gestão. A segunda já ressoa pela voz dos dirigentes do PR que não abrem mão do seu feudo e advertem que Dilma terá de se entender com o caído Nascimento para a escolha do sucessor.

Se ela sucumbir à chantagem, já não fará muita diferença para a sua imagem se convidar de uma vez para o cargo o próprio Valdemar Costa Neto.

ANCELMO GOIS - Um instante, maestro

Um instante, maestro
ANCELMO GOIS
O GLOBO - 08/07/11

O maestro Roberto Minczuk não reina mais sozinho como diretor-artístico da OSB. Continua como regente principal, mas dividirá o poder agora com um comitê artístico formado por três pessoas — o musicólogo Pablo Bacelar, o ex-diretor do Theatro Municipal do Rio
Fernando Bicudo e um terceiro nome que será indicado pelos próprios músicos da orquestra. 

Na prática...
Minczuk, que está no Canadá e já foi comunicado, não poderá mais, por exemplo, demitir ou contratar músicos. A decisão foi tomada segunda em reunião do Conselho da OSB, que aprovou ainda um novo regimento interno, antiga reivindicação dos músicos.

Gois na Flip I

Dilma pediu à organização da Flip 70 convites, caso confirmasse presença. Fora o grande número de pedidos de prefeitos, deputados, senadores, empresários e puxasacos, que, de livros, só conhecem as capas. Mas a turma desistiuao saber que ela não ia.

Gois na Flip II
Vem aí a Flupp, versão da festa literária de Paraty a ser realizada nas favelas pacificadas. O projeto é tocado por Ricardo Henriques, presidente do Instituto Pereira Passos. 

Gois na Flip III
Dilma e Cabral acabaram não indo. Mas, ainda assim, a Flip este ano é, pela primeira vez, meio, digamos, chapa branca. Afinal, tem dinheiro de BNDES, Petrobras, governo do Rio e Ministério da Cultura.

Lar, doce lar
Sérgio Cabral vai passar a morar no Palácio Laranjeiras a partir de segunda. 

Fator Lula 
Na entrevista ao GLOBO, Jean-Charles Naouri, presidente mundial do grupo Casino, em guerra aberta contra Abílio Diniz, lembrou que a empresa francesa investiu US$ 2 bi no Pão de Açúcar, em 2005, “impressionado com a Carta ao Povo Brasileiro, de Lula, que prometera respeitar contratos”. A referência não foi à toa. É que o Casino desconfia de que o ex-presidente vem dando respaldopolítico à ação de Diniz. 

O imortal

O coleguinha Merval Pereira toma posse na ABL dia 23 de setembro. Será recebido pelo imortal Eduardo Portella. 

Retratos da vida I

Uma desembargadora entrou com ação contra o marido no Tribunal de Justiça do Rio com base na Lei Maria da Penha. Acusa o companheiro de agressão física. 

Retratos da vida II
Waldir Onofre, 78 anos, o cineasta e ator, vencedor de um Kikito de Ouro em 1976 com seu filme “As aventuras amorosas de um padeiro”, teve uma isquemia e, sem plano de saúde, foi levado para a UPA de Campo Grande, no Rio. Precisou de remoção, mas...
não havia ambulância. Os médicos o mandaram para casa. 

Morar bem
João Filipo, dono da Locanty, a empresa acusada de envolvimento numa fraude que desviava carros de depósitos terceirizados da prefeitura do Rio, comprou o último apartamento disponível, de um andar inteiro, no prédio que acaba de ser construído na esquina de Av. Vieira Souto com Jardim de Alah, de frente para o mar de Ipanema. Oriundo de Duque de Caxias, RJ, Filipo é ligado à Grande Rio. 

Quilombo do Sacopã 
Oficiais de Justiça foram ontem ao antigo Quilombo do Sacopã, na Lagoa, único em área urbana do Rio reconhecido pelo Incra como área de remanescentes de escravos, avisar que hoje voltam para lacrar o local. Já há protesto à vista. 

Ano-novo verde 
O tema do réveillon deste ano na Praia de Copacabana será a Rio+20, a conferência mundial de meio ambiente que a ONU promove na cidade em 2012. 

DORA KRAMER - Síndrome da saúva

Síndrome da saúva
DORA KRAMER
O ESTADÃO - 08/07/11

A aprovação do Regime Diferenciado de Contratações para as obras da Copa e da Olimpíada sem resistência nem debate no Senado e a manutenção da cota do PR no Ministério dos Transportes, depois da comprovação de que as indicações do partido foram todas deletérias, dizem quase tudo a respeito da promiscuidade nas relações entre Executivo e Legislativo.

Mostram como se opera o milagre da transformação da contestação em concordância sobre uma medida provisória rechaçada de início até pelo presidente do Senado, sem que seja necessário fazer alterações no conteúdo antes criticado.

Mostram também como um partido que indica gestores com o objetivo comprovado de se locupletar consegue não só preservar sua capitania na administração pública, como ganha a prerrogativa de comandar a substituição dos demitidos sob forte suspeita de corrupção ao ponto de condicionar a decisão da presidente da República às suas vontades.

Consolidou-se nas últimas décadas, desde a redemocratização, e aprofundou-se nos últimos anos a tese de que no modelo governo de coalizão brasileiro não há outro jeito a não ser seguir a norma segundo a qual o Executivo é comprador, fornecedor e distribuidor e o Legislativo entra na história no papel de mercadoria.

Dissemina-se também a convicção de que a vida é mesmo assim: sempre foi e sempre será. Não é verdade. O cientista político José Álvaro Moisés está lançando o livro “O Papel do Congresso Nacional no Presidencialismo de Coalizão” e a respeito do tema deu uma entrevista ao “Estado”.

Aliás, na edição do último domingo do Estado, dizendo que pode sim ser diferente.

“Se o mandatário tiver habilidade e capacidade de negociar, cria uma base homogênea para acompanhá-lo, com base em um programa de governo claramente anunciado.

Admite a coabitação, mas determina qual programa a ser seguido”, argumenta. É uma operação de difícil execução, mas não impossível. Como aponta Moisés citando o professor da UnB, Lúcio Rennó, “depende da virtude do presidente”.

Desde José Sarney, o fisiologismo grassou em diferentes níveis. O primeiro governo civil depois do período militar foi refém do poderio do PMDB no Congresso, que lançou as bases da dinâmica “é dando que se recebe”.

Fernando Henrique Cardoso impôs um programa. Cedeu bastante, notadamente em função do plano de criar o instituto da reeleição, mas não cedeu completamente: conseguiu viabilizar reformas, acabou com o cabide das “teles” e profissionalizou a Petrobrás.

Não do dia para a noite nem de forma conclusiva. Mas iniciou um processo que o sucessor, Luiz Inácio da Silva, interrompeu ao optar pelo caminho aparentemente mais fácil: a cooptação pura e simples, partindo do princípio de que se os “picaretas” estavam à venda bastava comprá-los.

Foi bem-sucedido em termos imediatos, mas ajudou a construir a armadilha da qual Dilma Rousseff é prisioneira e que só tende a desqualificar, a tirar a legitimidade da democracia representativa.

A fim de que o fisiologismo não acabe por arrasar a democracia no Brasil, urge que se dê um jeito no fisiologismo. Mário de Andrade, em “Macunaíma”, usou a saúva – “Ou o Brasil acaba com a saúva ou a saúva acaba com o Brasil” – para ironizar politicagens em geral.

Acabar com elas não parece factível, mas entre o 8 ideal e o 80 dos tempos atuais há um meio termo, um modus operandi mais decente e que não desmoralize as instituições.

Complicado? Claro, mas o combate à inflação também pareceu impossível por duas décadas e, no entanto, se fez. Juntando-se fatores como compreensão do problema, capacidade de decisão, competência na operação, habilidade de convencimento, eficácia na comunicação, honestidade de propósitos e, sobretudo, vontade de fazer.

Transposição
Engendra-se no Planalto a retirada de todas as obras do PAC do Ministério dos Transportes e a transferência para a jurisdição de Miriam Belchior, no Planejamento. Com isso, a pasta ficaria praticamente reduzida ao acompanhamento de obras de manutenção de estradas.

ILIMAR FRANCO - Blairo arrepia!?

Blairo arrepia!? 
ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 08/07/11

O senador Blairo Maggi (PR-MT) está com medo de assumir o Ministério dos Transportes. Sondado pelo secretário-geral da Presidência, Gilberto Carvalho, ele teme que seus negócios e empresas sejam afetados. Quem conversou com Blairo conta que ele ora diz que está avaliando, ora que não vai. Os dirigentes do partido querem um político no cargo, mas são cautelosos e repetem: “O Ministério é da presidente, e quem nomeia é ela (Dilma)”.

A luta política na oposição

Os tucanos estão divididos em dois grupos sobre como fazer oposição ao governo Dilma. O presidente do PSDB, Sérgio Guerra, e o senador Aécio Neves defendem a construção de um novo programa para o partido. O ex-governador José Serra e seus aliados sustentam que os tucanos precisam fazer uma ferrenha oposição ao governo petista. O debate é acalorado. Hoje a maioria rejeita a linha defendida
por Serra. Eles alegam que o paulista está cobrando valentia de seus correligionários, mas quando teve oportunidade, na campanha eleitoral, colocou o presidente Lula em seu programa de televisão e escondeu o ex-presidente FH.

"A preferência do Planalto é pelo Blairo. Ele pediu um tempo. Esse ministério é um pepino” — Luciano Castro, ex-líder do PR e deputado federal (RR)

NO MEIO DO CAMINHO
. O corporativismo sofreu um revés. Foi aprovada a reforma administrativa relatada pelo senador Ricardo
Ferraço (PMDB-RS). Ela vai gerar uma economia de cerca de R$ 235 milhões. Destes, R$ 75 milhões virão com a aplicação do teto salarial em cerca de 700 servidores. Agora é com os demais senadores. A reforma ainda tem que passar pela Comissão de 
Constituição e Justiça e pelo plenário do Senado. 

Dobradinha
O senador Francisco Dornelles (PP-RJ) aprovou lei que cria a empresa individual de representação limitada. E o senador Lindbergh
Farias (PT-RJ) foi à ministra Gleisi Hoffmann (Casa Civil) pedir a sanção. A lei não agrada à Fazenda.

Costura

O maior partido, o PMDB, e o mais estruturado, o PT, fecharam. Vão tentar aprovar na reforma política a coincidência das eleições
— municipais, estaduais nacional. Eles avaliam que as duas maiores máquinas vão levar vantagem.

Mudou de partido e de lado
O candidato a vice na chapa de José Serra, Indio da Costa, deixou o DEM e hoje é o principal organizador do PSD no Rio. Por isso, Indio fez um movimento de aproximação com o governador Sérgio Cabral e o prefeito Eduardo Paes. O PSD pode receber a adesão de nove deputados estaduais. O dirigente nacional do novo partido, Saulo Queiroz, explica: “O partido virou uma grande janela para as pessoas se aproximarem”.

Frenesi
O ex-deputado Alberto Fraga recitou vários e-mails dos ex-ministros José Dirceu e Erenice Guerra, que teriam sido violados por um hacker, ontem na reunião da Executiva do DEM. Mas garantiu: “Eu li muitos e-mails, mas não comprei”.

Deixa disso
Quando Fraga terminou de falar, o ex-deputado José Carlos Aleluia bradou:
“Conta mais! Conta mais!” O presidente do DEM, senador José Agripino (RN), preferiu mudar de assunto: “Vamos tratar da questão
do partido em Roraima”. 


OS ALIADOS estão de olho no Ministério dos Transportes. Se o PR não quiser a pasta, que vive uma grave crise, outros partidos, como o PMDB, aceitam fazer um troca-troca.

 OS PARLAMENTARES do Rio estão ressentidos com o governador Sérgio Cabral. Eles foram colocados à margem da negociação sobre os royalties do petróleo. 

● ESTÁ MUITO FORTE o chefe da Casa Civil do governo do Rio, Regis Fichtner. Seu cunhado, Marco Aurélio Belize, foi nomeado ontem para o STJ, na vaga que era do ministro Luiz Fux, agora no STF.

WASHINGTON NOVAES - Muito além da internet, mas com que conceitos?


Muito além da internet, mas com que conceitos?
WASHINGTON NOVAES
 O Estado de S.Paulo - 08/07/11

É muito difícil prever o rumo das novas circunstâncias que - para bem ou para mal - estão modelando um novo tempo, esboçadas por questões como a da influência da internet nas rebeliões políticas por que passam a África e o Oriente Médio; ou as invasões de sites como os da CIA, do FBI, do Google e do WikiLeaks, nos Estados Unidos; no Brasil, os da Presidência da República e da própria presidente, Ministérios, Receita Federal, Senado, Prefeitura de São Paulo ou Petrobrás (entre muitos outros). Mas se é difícil prever o novo rumo, tantas são as questões envolvidas, já não há dúvida de que ele está a caminho - a passos acelerados. E envolverá questões muito complexas, conceitos ainda não claros, legislações inéditas ou supressão de muitas hoje vigentes.

Pode ser tudo muito complicado, como as possíveis invasões de sites militares brasileiros (e suas relações com a produção de armas de guerra ou tecnologias nucleares, como observou o jornalista Jânio de Freitas na Folha de S.Paulo (26/6); ou a sites de instituições norte-americanas dedicadas a tecnologias de guerra, como lembrou o embaixador Rubens Barbosa (O Estado de S. Paulo, 23/6), assinalando que o governo norte-americano já os considera "atos de guerra, sujeitos a retaliações". Há suspeitas até mesmo de que os invasores (hackers) estejam vendendo as informações a outros países ou ao crime organizado. O nosso ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, cogita até de contratar "hackers" para ajudarem a "criar ferramentas que o ajudem a dar mais transparência às ações de sua pasta" (Estado, 28/6).

Até a ONU pode introduzir questões de difícil solução, se declarar o acesso à internet como "direito humano", quando afirma no artigo19 do Pacto Internacional pelos Direitos Civis e Políticos que "todo cidadão tem direito à liberdade de expressão e de acesso à informação por qualquer tipo de veículo". Nesse caso, como fica a questão do sigilo em geral ou das instituições e dos governos? Como ficam as informações relacionadas com o direito à propriedade? Ou com a privacidade, a propriedade intelectual (relacionada ou não com tecnologias)? E as informações relacionadas com a segurança e a proteção contra o crime? E com a vida pessoal de cada cidadão?

Mais complicado ainda: nesse mundo regido pela informação, como ficarão os direitos dos analfabetos (ainda são muitos milhões no Brasil, centenas de milhões no mundo)? E os das pessoas que não têm acesso à internet ou nem sequer possuem computador? Segundo o Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa/OCDE), 50% dos estudantes no Brasil não têm acesso a computadores, ante mais de 90% na Europa, nos Estados Unidos e no Japão que dispõem desse recurso.

A solução estará em restringir acessos à internet, considerá-los crimes em certas circunstâncias - como já fazem a China, o Irã, o Vietnã? Estará em restrições que começam a ser implantadas na França, na Grã-Bretanha, na Hungria? Em sistemas mais fechados, como os vigentes em Cuba, na Coreia do Norte, na China, em Mianmar (a antiga Birmânia)? Segundo o jornal The New York Times (27/6), o governo Barack Obama já trabalha com a criação/implantação de sistemas paralelos de internet e telefones celulares que dissidentes poderiam usar para lutar contra "governos repressivos". Mas se a moda pegar e informações "roubadas" forem usadas também contra governos legalmente eleitos? Como estabelecer limites e formatos?

Na verdade, está entrando em questão o próprio conceito de civilização. E, embutidas nessa questão, muitas perguntas: por que é indispensável o sigilo? A quem ele beneficia? Por que negociações entre países precisam ser secretas? Por que governos - de países, de Estados, de municípios, tudo - precisam de sigilo? Por que se cogita, como agora, até de sigilo nas quantias envolvidas em licitações? Quem quiser pode estender a pergunta até mesmo às relações pessoais: por que sigilo? E como se responde a essas questões? Com controle estatal da informação? Abolindo todos os controles? Com que consequências?

Mais uma vez, coloca-se o problema sempre deixado de lado: a quem pertence a informação? Não se trata, aqui, de ausência de censura ou de liberdade de pensamento, já garantidos pela nossa Constituição; trata-se de liberdade de acesso à informação como um direito da cidadania - já que informação se traduz, ou se pode traduzir, em poder político ou econômico (quem tem mais informação tem mais poder). E, atualmente, nada garante esse direito nem mesmo nos meios de comunicação: nada impede que um deles não publique, ou divulgue, ou censure, ou deturpe informações, ferindo direitos (econômicos, a honra, a dignidade etc.) de uma pessoa, de uma empresa, de um governo. Seria preciso, então, inscrever esse direito na Constituição, para se poder legislar a respeito, protegê-lo na prática. Mas não há nenhuma iniciativa nesse sentido. Nem discussão mais ampla do tema da informação nestas contingências modernas.

Só que a questão da internet é ainda mais complexa, porque uma solução parece (?) exigir um novo conceito civilizatório, com toda a informação aberta, ao alcance de qualquer pessoa, em qualquer lugar, em qualquer circunstância. Será possível? Mas isso implica também um mundo com direitos iguais para todas as pessoas - políticos, econômicos, sociais. Como se faria, na prática? Ou, hipótese radicalmente contrária, se vai tentar resolver os problemas da internet simplesmente com mais fechamento, mais repressão? E que consequências isso pode ter?

A questão está posta diante de todos, terá repercussões na vida de cada um. Convém começar a pensar nela. Lembrando mais uma vez as palavras do cardeal belga Leo-Jozef Suenens, já em 1968: o que levava um século para acontecer, hoje, com a velocidade da informação, acontece em uma década; o que levava uma década vem em um ano. Não percamos tempo.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Empresa investe R$ 130 mi para a compra de navios
MARIA CRISTINA FRIAS 
FOLHA DE SP - 08/07/11

Depois de dez anos inativa, a empresa de transporte marítimo Graninter volta ao mercado e investe US$ 80 milhões (cerca de R$ 130 milhões) na compra de duas novas embarcações.
Fundada em 1981, para transporte de produtos químicos, a companhia, braço marítimo do Grupo Rocha, de Curitiba (PR), vai agora transportar carga seca.
"Existe uma carência de investimentos nesse segmento de transporte no Brasil", diz Luiz Philippe Figueiredo, presidente da Graninter. A estratégia é trabalhar em parceria com outra empresa do grupo, a Rocha Terminais Portuários e Logística, com operação nos portos de Paranaguá (PR), São Francisco do Sul (SC) e Santos (SP).
"A empresa terá o controle de toda a cadeia logística, desde a indústria ao transporte marítimo", diz Figueiredo. O primeiro contrato foi fechado no final de junho com a ArcelorMittal Vega. "Serão embarques mensais de bobinas de aço, de Itajaí (SC) para a Argentina."
A companhia está em fase final de negociação com outras siderúrgicas que têm interesse em exportar para países da América do Sul. Os novos navios foram encomendados do estaleiro Rio Maguari, em Belém (PA), e terão capacidade de 17 mil toneladas cada um. O primeiro será entregue no final de 2012. Hoje, a companhia opera com navios fretados.
Os investimentos foram feitos com recursos próprios e com financiamento do fundo da marinha mercante.

VENTANIA BRASILEIRA

O Brasil ultrapassou no final do primeiro semestre a marca de 1.000 MW produzidos em energia eólica. Até o momento, a produção foi de 1.060 MW, de acordo com a Associação Brasileira de Energia Eólica. "Nossos parques estão concentrados no Nordeste", diz o diretor-executivo da entidade, Pedro Perrelli.
O Estado do Ceará é responsável por mais de 560 MW produzidos, seguido do Rio Grande do Sul. "Conseguimos aumentar a produção porque antecipamos as operações em alguns parques no Rio Grande do Sul. As obras ficariam prontas apenas em 2012, mas já estão em funcionamento", afirma Perrelli.
A produção de energia eólica continuará crescendo no Brasil. Hoje, a espanhola Gamesa inaugura fábrica na Bahia. Até o fim deste ano, a Alstom também terá nova planta no Estado, segundo a associação do setor.

Crédito
O Private Banking do Banco do Brasil aumentou o limite de financiamento máximo de sua linha de "home equity", que exige o imóvel do cliente como garantia, de R$ 500 mil para R$ 5 milhões.

Gasoso
Além de um investimento de R$ 35 milhões em novas fábricas neste ano, a IBG (Indústria Brasileira de Gases) injetará R$ 20 milhões na compra de produtos importados e aquisição de equipamentos de distribuição, como tanques, carretas, cilindros de alta pressão e veículos.

Tubo... 
A Pan-Americana S. A. Indústrias Químicas elevou em 30% sua capacidade de produção de cloro e potassa cáustica da unidade em Honório Gurgel, no Rio de Janeiro. Foram investidos aproximadamente R$ 40 milhões no projeto.

...de ensaio 

Cloro, potassa e seus derivados são os principais produtos da empresa e correspondem a mais de 80% do seu faturamento, de R$ 200 milhões no ano passado. O objetivo é aumentar em 30% neste ano, segundo a empresa.

Atendimento... 

A Fundação Amaral Carvalho, braço social do Hospital Amaral Carvalho, especializado em tratamento oncológico, começa hoje as obras da sua quarta casa de apoio, na cidade de Jaú, no interior de São Paulo.

...oncológico 
A obra, que receberá investimentos de aproximadamente R$ 2 milhões, ficará pronta no primeiro trimestre do ano que vem. O novo espaço dará apoio às mulheres em tratamento oncológico da rede SUS (Sistema Único de Saúde).

Água... 

A AmBev pretende usar 3,5 litros de água para cada litro de cerveja a partir de 2012. Hoje, o índice é de 3,9 litros, segundo informações que foram discutidas no Congresso Brasileiro de Ciência e Tecnologia Cervejeira e na Brasil Brau de 2011.

...no chope 
A meta das principais cervejarias do mundo para o próximo ano é reduzir em 20% a quantidade de água colocada na produção, de acordo com Roland Folz, engenheiro e doutor pela Universidade Técnica de Berlim.

Cresce oferta global de `follow-on' no 2º trimestre

O volume global de ofertas de "follow-on" (oferta de ações de empresas já presentes nas Bolsas) alcançou 2.495 no primeiro semestre, equivalente a US$ 305,1 bilhões, segundo relatório da Ernst & Young Terco.
No segundo trimestre, foram 1.185 ofertas, com US$ 158,4 bilhões, número 8% superior ao período anterior. O aquecimento acompanha a evolução dos IPOs (ofertas iniciais), também em alta, segundo André Ferreira, sócio da empresa.
"É indicador de que o acesso ao mercado de capitais ainda existe, mesmo para empresas que já fizeram IPO." A alta também aponta que companhias que sofreram na crise de 2008 voltam a captar.
com JOANA CUNHA, ALESSANDRA KIANEK e VITOR SION

FERNANDO GABEIRA - As estradas do subdesenvolvimento


As estradas do subdesenvolvimento
FERNANDO GABEIRA
O Estado de S.Paulo - 08/07/11

Na semana em que os norte-americanos comemoram sua independência, muitos discursos de Abraham Lincoln foram lembrados. Em alguns ele enfatizava a necessidade de defender o país contra dois adversários: a guerra, fator externo; e a ganância, poderosa inimiga interna da República.

Na mesma semana, no Brasil, a presidente Dilma demitia quatro funcionários do Ministério dos Transportes, mas reafirmava sua confiança no ministro Alfredo Nascimento, do PR. A resposta de Dilma deve ter levado em conta que a CGU já colecionava, em dois anos, 18 processos na Valec e 150 no Dnit. O corregedor Jorge Hage chegou a suspeitar que a corrupção estivesse inoculada no DNA do Dnit.

Na última campanha eleitoral, denunciando a corrupção na saúde, pedimos atenção especial para o desvio de verbas que provoca mortes. Um estatuto para a corrupção que mata. O constante superfaturamento na construção e reparação de estradas brasileiras também mata. São centenas de buracos que deixam de ser tapados, novos trechos que não se constroem, sinalização que não se atualiza.

O que impediu Dilma de ter sido mais rápida ao constatar o problema? Por que foi tão superficial no combate? É difícil acreditar que o PR seja um partido inocente e tanto Nascimento como Valdemar Costa Neto, ingênuas vítimas de uma quadrilha que se instalou na cúpula do Ministério. A empresa do filho do ministro cresceu 86.500% de 2005 para cá. Dilma avançou pouco porque não pode rever a política de alianças, responsável em muitas ocasiões pelos ataques ao Tesouro Nacional. Mesmo se uma investigação séria comprovar o esquema, tanto governo como aliados têm a resposta na ponta da língua: reforma política. Em outras palavras, não há saída no horizonte. E o partido indica um novo ministro.

A presença do deputado Valdemar Costa Neto no Ministério, os milhões que podem ter sido desviados, tudo isso significa o preço que pagamos pela conciliação com erros do sistema político brasileiro. Acusado de participar do mensalão, denunciado pela ex-mulher por jogar milhares de dólares em cassinos, Valdemar renunciou ao seu mandato com a intenção de ser candidato de novo.

Naquele momento um jurista afirmava que a renúncia foi uma confissão de culpa e Valdemar não seria reeleito. Não contou com sua astúcia. Ao inventar a candidatura Tiririca, o PR catapultou de novo seu presidente de honra. As sobras de Tiririca eram os votos de que Valdemar precisava. Estava consumada mais uma grande farsa na política: uma candidatura de protesto contra " tudo o que está aí" recolocava um elo perdido do mensalão no centro das decisões sobre estradas do País.

Dilma recebe de herança uma política de alianças construídas no período de crescimento. Lula trabalhou de forma própria com o tema. Ele sempre confiou na sua popularidade. Diria que não havia nada de concreto e passaria a mão na cabeça de todos os envolvidos. No caso de Dilma, é mais difícil ignorar. Percebe que os partidos aliados são como insaciáveis cupins devorando o Orçamento nacional - porque acompanha o desenrolar das obras e o crescimento brutal de seus custos. Alguma coisa teria de fazer . A popularidade depende de condições econômicas instáveis, cambiantes. Não se pode confiar apenas nela.

Isaac Deutscher, na sua biografia de Trotsky, acentuava que as condições históricas não permitem que líderes políticos inteligentes se comportem como tal. Eles não são limitados, mas as circunstâncias e a margem de manobra os obrigam a agir como se fossem. Dilma é presidente de um conjunto de forças formado nas eleições e apoiada numa ampla base parlamentar. Seu partido está feliz e próspero, embora, em certos momentos, possa criticar alguns aliados. Essa condição de vanguarda do atraso é perfeitamente satisfatória para quem, no fundo, está preocupado apenas em continuar no poder.

As estradas do subdesenvolvimento não são apenas as esburacadas e perigosas. São também os percursos mentais que desvalorizam a vida humana. Políticos tornam-se milionários e juntam-se aos grã-finos numa celebração esfuziante do consumo. Por que se importariam com a vida dos viajantes? Se tivessem a transparência dos fascistas espanhóis, com tantos desfalques na saúde e na construção de estradas, a forças dominantes no Brasil poderiam usar o slogan que nasce dessa prática: viva a morte.

Milhares de mortes anônimas, nos hospitais e nas estradas, alimentam essa estranha fusão de emoções de esquerda com o desejo de enriquecer. Abraham Lincoln tinha razão quando definiu a ganância e a cobiça como grandes adversário internos. Suas palavras têm validade ainda hoje, quando se discute o futuro dos EUA. Mas são quase inúteis num período de prosperidade e euforia, em que quase todos sentem a vida melhorar. Nesse momento a cobiça parece um dínamo e a corrupção, apenas um preço a pagar.

Ao contrário do slogan de Tiririca, a situação pode ficar pior. E, desgraçadamente, talvez seja essa a única chance de melhorar. O crescimento econômico é um poderoso lenitivo. Mas qual a sua viabilidade se a corrupção começa a pipocar em áreas estratégicas?

Essa política de alianças não tem futuro. Talvez alguns anos de sobrevida. O caso do Ministério dos Transportes mostra como ela é um entrave ao desenvolvimento. Sucessivos embates por cargos, pequenas chantagens veladas, escândalos de corrupção, o cimento que a une a aliança pode mantê-la em pé, mas sem condições de dar resposta aos desafios do Brasil, neste momento de velozes transformações.

É um jogo arriscado em qualquer momento entregar transportes e energia ao PR e ao PMDB. Exatamente agora que a importância do Brasil cresceu e que o País é alvo de atenção internacional, é temerário. Grandes escândalos não produzem só manchetes, mas danos econômicos numa escala maior. Podem minar a confiança no crescimento brasileiro. Num cenário menos dramático, o crescimento pode prosseguir, debilitado, apesar dos políticos e suas alianças. Mas ainda assim, no mínimo, seria perdida uma grande chance de se ir mais longe.

GOSTOSA

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Banco de reservas
RENATA LO PRETE
RANIER BRAGON (interino)
FOLHA DE SP - 08/07/11

O governo federal move duas ações de improbidade administrativa contra o suplente do senador Blairo Maggi (PR-MT) -convidado por Dilma Rousseff para assumir o Ministério dos Transportes-, uma delas para ressarcimento aos cofres públicos de suposto desvio de dinheiro durante o esquema dos sanguessugas.
José Aparecido dos Santos (PR), o Cidinho, como é conhecido, assumirá cadeira no Senado caso Blairo aceite ir para a Esplanada. Prefeito de Nova Marilândia (MT) três vezes, Cidinho foi citado no relatório final da CPI dos Sanguessugas. Luiz Vedoin, delator do esquema, afirmou que destinou a ele R$ 117 mil a título de "contrapartida" pela venda das ambulâncias.

Pela metade 
O Ministério Público atua ao lado do governo nas duas ações. Na segunda, a Advocacia-Geral da União cobra devolução de R$ 638 mil por convênio federal para construção de pontes e bueiros. A gestão de Cidinho teria, segundo a acusação, direcionado a licitação e feito pagamento integral da obra com apenas 50% do serviço entregue.

Outro lado 
Advogado de Cidinho no caso das pontes, Nestor Fidelis diz que o ex-prefeito nega irregularidades na execução do convênio. Sobre o caso dos sanguessugas, afirma não ter informação de que ele tenha sido notificado ainda. O ex-prefeito -não localizado ontem- já afirmou que não recebeu "contrapartidas" e obteve as ambulâncias a preço abaixo do de mercado.

Reflexões
A integrantes do Planalto e a aliados, Blairo disse temer ser alvo da imprensa caso aceite a vaga de Alfredo Nascimento.

Caderninho 
A cúpula do PR destaca Paulo Passos, ministro interino dos Transportes, entre os que teriam levado a Dilma denúncias de corrupção na pasta. Também o acusam de ter ido à reunião de quarta com a presidente sem informar o então chefe, embora o Planalto diga ter tentado avisar Nascimento naquela manhã.

Sem interferência 
A despeito de Luiz Pagot relacionar Paulo Bernardo aos aditivos sob suspeita no Dnit, o ministro, hoje nas Comunicações e à época no Planejamento, diz que adotava como regra nunca interferir na gestão de contratos do Dnit ou de outros órgãos.

Apetite 
Paulinho da Força (PDT-SP), organizador da festa regada a cerveja e leitoa que reuniu políticos de diversos matizes na terça em Brasília, quer incluir o evento no calendário da capital. No vácuo do Arraiá do Torto, suspenso por Dilma, o pedetista avisou que alugará um clube para abrigar a segunda edição do evento, em 2012.

Mutirão 

Líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA) disse que cederá um dos seus cargos ao PSOL, que perdeu nove assessores com a mudança na regra de repartição de vagas pelas bancadas da Casa. Em auxílio à "legenda ideológica", buscará ainda quatro vagas no PT e PMDB.

Café com leite 
O PSDB mineiro cogitou divulgar nota de desagravo ao seu presidente, Marcus Pestana, alvo de reprimenda pública feita por José Serra em reunião que teve deputados e senadores tucanos na plateia. A ideia foi abortada pelo grupo de Aécio Neves, mas até ontem o dirigente recebia, pela internet, manifestações solidárias de correligionários.

Regra 3 
Sem opções no tabuleiro do PTB para substituir Jorge Pagura, que deixou a Secretaria de Esportes no escândalo dos plantões médicos, Geraldo Alckmin decidiu promover o adjunto José Benedito Fernandes ao comando da pasta.
com FÁBIO ZAMBELI e ANDREZA MATAIS

tiroteio


"Se estivesse vivo, o grande consultor Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, faria 114 anos. Exemplo para uma nova geração."
DE FÁBIO LEPIQUE, SECRETÁRIO PARTICULAR DE GERALDO ALCKMIN,
relacionando o aniversário póstumo do cangaceiro, ontem, aos recentes escândalos do governo federal.

contraponto

Terapia ocupacional

Há algumas semanas, o ex-ministro Luiz Dulci acompanhou Lula, com quem trabalha na formatação de seu instituto, em viagem a Brasília. Quando deixava um dos eventos da agenda do ex-presidente, foi abordado por um amigo petista, que quis saber como andava a sua vida longe dos afazeres da Secretaria-Geral da Presidência, que ocupou por oito anos.
-Uma beleza! Até agora quatro das minhas seis doenças já foram embora!