VALOR ECONÔMICO - 11/12
Retomo hoje os temas da demografia. Os leitores que acompanham esta série de artigos que tenho escrito ao longo de 2013 sobre temas demográficos sabem que neste espaço tratei da natureza difusa do envelhecimento; da pirâmide etária do país; das revisões da projeção populacional feitas pelo IBGE; do Censo de 2010; da questão de gênero; das características diferenciadas por faixas etárias específicas; da relação com a produtividade; da trajetória da População Economicamente Ativa (PEA); e do encolhimento do número absoluto de crianças, adolescentes e jovens. O tema que gostaria de tratar com os leitores hoje é o que poderíamos denominar de quarta idade ou, seja, o grupo composto pelos super-idosos de 80 anos ou mais de idade, para diferenciar da faixa de pessoas tradicionalmente definidas como idosas , de 60 anos ou mais (definição que talvez esteja na hora de mudar, à luz da maior longevidade da população). Os números que acompanham este artigo praticamente falam por si.
Uma das características da ação do tempo é que ele muda não apenas o próprio corpo, mas também o modo como cada um avalia o mundo. Quando éramos crianças, pessoas de 40 ou 80 anos de idade pertenciam à mesma categoria: algo até certo ponto inconcebível para um indivíduo com poucos anos de idade, a quem é difícil entender que aquelas pessoas são a gente amanhã . Com o passar dos anos e o lento ingressar do corpo e da mente nesses mares nunca dantes por eles navegados, a percepção vai se modificando.
O país deveria pensar nessa perspectiva. Quando se transita pelas ruas de Montevidéu, dá para entender por que o Uruguai tem um gasto com Previdência Social muito elevado: há muitos idosos naquela cidade - e, particularmente, muitos idosos de fato muito idosos, com mais de 85 ou 90 anos, cena ainda relativamente rara nas cidades brasileiras. O Brasil já tem uma despesa previdenciária elevada, e (ainda) somos um país jovem (embora cada vez menos). A uruguaização da nossa população, porém, é inexorável. É apenas uma questão de tempo: um dia chegaremos lá.
Tenho, nos últimos 20 anos (meu primeiro artigo sobre questões previdenciárias é de final de 1992) procurado alertar, mediante livros, artigos técnicos ou jornalísticos, acerca das questões que venho abordando neste espaço ao longo dos últimos meses. Se em 2010 tínhamos menos de 3 milhões de pessoas com 80 anos ou mais, e em 2060 teremos mais de 19 milhões de pessoas nessa faixa etária, creio que será inexorável se aposentar mais tarde.
Essa é uma questão à qual o brasileiro comum tem dificuldades de se adaptar. Sei disso por experiência própria, pela quantidade de vezes - confesso que já perdi a conta - em que fui, literalmente, xingado pelos meus artigos. O cidadão comum tende a fazer o seguinte raciocínio: se trabalhei os 35 anos que a Lei exige, tenho direito a aposentadoria integral . O problema é que é muito diferente trabalhar 35 anos e viver mais 20 e trabalhar o mesmo tempo e viver mais 30 anos. O primeiro caso é uma situação administrável para o país, mas o segundo pode deixar de sê-lo. Tenho repetido como um mantra há duas décadas uma noção que me parece chave para entender estas questões: os problemas previdenciários não podem jamais ser encarados como uma simples questão matemática, mas eles são também uma questão matemática!
Os números expostos levantam outra questão, associada ao mercado de trabalho. Muitos anos atrás, num evento cheio de jovens, o palestrante, perguntado sobre que profissões iriam se expandir mais no futuro, saiu-se com esta: Vocês acham que vou falar de informática, nanotecnologia ou engenharia de petróleo, mas sinto decepcioná-los: a profissão que mais vai crescer no mundo nos próximos 40 anos vai ser a de enfermeiro de idosos . Na época, com meus escassos 30 anos, não atentei para a dimensão do tema, mas hoje, tendo acompanhado dramas de família, comuns a quem tem 50, e viu in loco os problemas associados a quem chega aos 90 anos em condições precárias de saúde, consigo perceber quão perspicaz era a frase.
Nos meus debates sobre previdência, mais de uma vez algum participante notou que a geriatria era um ramo moderno da medicina, pelo fato de que no passado as pessoas morriam cedo. O fato é que teremos, cada vez mais, que lidar com problemas de saúde pública ligados a questões típicas da quarta idade , como quedas ou longas internações. Que, com tantas pressões orçamentárias pela frente, continuemos permitindo a aposentadoria de pessoas aos 52 ou 53 anos, fala bem da irresponsabilidade coletiva em que o Brasil está incorrendo. Espero que um dia o país acorde para a importância do tema.
quarta-feira, dezembro 11, 2013
Consumo e poupança - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 11/12
Ontem, em depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, advertiu que o Brasil tem de ter mais cuidado com sua poupança:
"O Brasil precisa aumentar a poupança externa e doméstica nas próximas décadas. Precisamos criar folga para financiar de forma sustentável todos os investimentos."
É recado que não leva o endereço dos agentes econômicos privados. Precisa ser dirigido ao governo, porque a expansão da poupança e do investimento depende de políticas, as mesmas que não vêm merecendo suficiente atenção.
Hoje, o nível da poupança (em princípio, a riqueza e a renda não consumida) no Brasil é muito baixo. Não passa de 15,0% do PIB.
Essa é uma percepção que vai crescendo dentro do governo Dilma. Em setembro, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avisou que, para crescer 4% ao ano, o investimento tem de aumentar à velocidade de 7% ao ano. Essa tomada de consciência no governo para por aí. Não dá seguimento de modo a garantir o pulo do gato.
Para dar mais importância à poupança, o governo precisaria mudar suas práticas. Não pode continuar, por exemplo, dando tanta importância ao consumo. É verdade que alguma coisa mudou também aí. No início do governo Dilma, o entendimento dos administradores da política econômica era o de que bastaria ativar o consumo, que o resto viria espontaneamente em seguida: demanda, investimento, renda, enfim, desenvolvimento econômico. Deu errado. Logo se viu que são necessárias políticas de investimento. E o caminho já é conhecido. Pelos cálculos do Ministério da Fazenda, cada real aplicado na expansão da infraestrutura tende a puxar mais 3 reais em PIB. Os leilões de concessão, embora tardios, são avanços nessa direção. Mas a maior deficiência está mais embaixo.
Alexandre Tombini preferiu não avançar sobre o que precisaria ser feito para estimular a poupança: "Porque este não é assunto do Banco Central". Mas não há divergências sobre alguns dos passos a dar. A primeira condição para expandir a poupança é garantir estabilidade na economia, por meio de uma administração responsável das contas públicas que reduza o endividamento e dê mais eficiência ao Estado.
A segunda condição é levar adiante as reformas cujos projetos estão há anos engavetados. Trata-se das reformas tributária, previdenciária, trabalhista, política, etc. Desse capítulo depende também o desenvolvimento de um mercado de capitais de longo prazo, hoje inibido no Brasil.
A condição seguinte consiste em desenvolver a produtividade do trabalho. Hoje, um dos obstáculos ao crescimento é a situação de relativa escassez de mão de obra que se reflete na situação de quase pleno emprego. Esse aumento de produtividade requer melhora da educação e novos esforços em treinamento. Não basta baixar leis que, no futuro, reservem mais verbas para a educação, se não houver também aumento da qualidade. Até agora, o governo não esclareceu como pretende aumentar a eficiência do trabalho.
Ontem, em depoimento na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado, o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, advertiu que o Brasil tem de ter mais cuidado com sua poupança:
"O Brasil precisa aumentar a poupança externa e doméstica nas próximas décadas. Precisamos criar folga para financiar de forma sustentável todos os investimentos."
É recado que não leva o endereço dos agentes econômicos privados. Precisa ser dirigido ao governo, porque a expansão da poupança e do investimento depende de políticas, as mesmas que não vêm merecendo suficiente atenção.
Hoje, o nível da poupança (em princípio, a riqueza e a renda não consumida) no Brasil é muito baixo. Não passa de 15,0% do PIB.
Essa é uma percepção que vai crescendo dentro do governo Dilma. Em setembro, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, avisou que, para crescer 4% ao ano, o investimento tem de aumentar à velocidade de 7% ao ano. Essa tomada de consciência no governo para por aí. Não dá seguimento de modo a garantir o pulo do gato.
Para dar mais importância à poupança, o governo precisaria mudar suas práticas. Não pode continuar, por exemplo, dando tanta importância ao consumo. É verdade que alguma coisa mudou também aí. No início do governo Dilma, o entendimento dos administradores da política econômica era o de que bastaria ativar o consumo, que o resto viria espontaneamente em seguida: demanda, investimento, renda, enfim, desenvolvimento econômico. Deu errado. Logo se viu que são necessárias políticas de investimento. E o caminho já é conhecido. Pelos cálculos do Ministério da Fazenda, cada real aplicado na expansão da infraestrutura tende a puxar mais 3 reais em PIB. Os leilões de concessão, embora tardios, são avanços nessa direção. Mas a maior deficiência está mais embaixo.
Alexandre Tombini preferiu não avançar sobre o que precisaria ser feito para estimular a poupança: "Porque este não é assunto do Banco Central". Mas não há divergências sobre alguns dos passos a dar. A primeira condição para expandir a poupança é garantir estabilidade na economia, por meio de uma administração responsável das contas públicas que reduza o endividamento e dê mais eficiência ao Estado.
A segunda condição é levar adiante as reformas cujos projetos estão há anos engavetados. Trata-se das reformas tributária, previdenciária, trabalhista, política, etc. Desse capítulo depende também o desenvolvimento de um mercado de capitais de longo prazo, hoje inibido no Brasil.
A condição seguinte consiste em desenvolver a produtividade do trabalho. Hoje, um dos obstáculos ao crescimento é a situação de relativa escassez de mão de obra que se reflete na situação de quase pleno emprego. Esse aumento de produtividade requer melhora da educação e novos esforços em treinamento. Não basta baixar leis que, no futuro, reservem mais verbas para a educação, se não houver também aumento da qualidade. Até agora, o governo não esclareceu como pretende aumentar a eficiência do trabalho.
Obviedades do propinaço de SP - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 11/12
Empresas têm boas teses sobre manicômio fiscal da cidade, mas, sem desculpa, muitas pagaram propina
É DIFÍCIL IMAGINAR uma hipótese segundo a qual empresas não tenham pago propina para fiscais do ISS na cidade de São Paulo. Por exemplo, a gente poderia imaginar que a Máfia do ISS não passaria de uma espécie de comando libertário dedicado à redução da carga tributária e do "custo Brasil": cobraria menos impostos, mas não levaria nada em troca.
Mas a gente não está a lidar com um Robin Hood das incorporadoras e outras empresas. Se ainda é preciso explicar o sarcasmo, sabe-se que impostos não foram pagos e funcionários públicos formaram patrimônio de dezenas de milhões.
Pagou-se propina, ponto.
Pelo menos uma empresa envolvida e uma associação do setor argumentam que houve propinas porque houve extorsão.
Extorsão implica abuso da situação de alguém por meio de ameaça ou violência. Por exemplo, num caso ameno, o fiscal ameaça não entregar o comprovante de quitação do imposto e, assim, segura o Habite-se, sem o que o negócio não vai para a frente, causando prejuízos.
É possível. Mas: 1) Ainda haveria propina; 2) Mesmo que o extorsionário tenha exigido propina em troca da papelada legal, por que a empresa se sentiu também "obrigada" a pagar menos imposto? 3) Apesar de todos os pesares, não é difícil encontrar promotor, policial ou jornalista a fim de armar um flagra. Por que então empresas se "sujeitaram" a pagar propina e menos imposto?
Claro está que o nosso manicômio legal-burocrático propicia as tantas situações em que um fiscal pode encontrar pelo em ovo. É quase impossível tocar legalmente um negócio, tanto que em São Paulo há centenas de milhares de edificações irregulares ou com "alvará provisório", uma expressão que denota idiotice e/ou má-fé.
Ainda assim, voltamos ao caso anterior: por que não se chamou a polícia? O telhado da construtora seria de vidro, pois? Se é, o caso está encerrado: a propina acobertou outro rolo.
Empresas e suas associações argumentam que: 1) O sistema de cobrança é uma burocracia porca (é verdade) e arbitrária; 2) A cobrança é feita por um método irregular e possivelmente ilegal e inconstitucional (uma tese razoável).
A prefeitura sujeita a liberação do Habite-se à quitação final do ISS devido, o que seria irregular, algo chamado "sanção política": o Habite-se, certificado de adequação da edificação, nada tem a ver com a obrigação fiscal.
A coisa seria ilegal de resto porque a prefeitura regulou a base de cálculo do ISS, imposto definido na Constituição da República e regulamentado em lei federal. Criou base de cálculo que leva em conta um custo por metro quadrado da obra, não o custo da despesa de fato.
Diga-se de passagem que isso pode dar em injustiça tributária e em estímulo à ineficiência; é mais um indício dos tantos arbítrios fiscais "cum" distorções econômicas deste país.
Ainda assim, o que isso tem a ver com o pagamento de propinas e redução ilegal de imposto recolhido? Nada, a não ser o fato de que a lei e a administração pública acabam por colocar em contato íntimo corruptos e corruptores. Não é, decerto, uma ideia prudente. Mas a situação em si mesma não causa privação de sentidos morais, um transe corruptor.
Empresas têm boas teses sobre manicômio fiscal da cidade, mas, sem desculpa, muitas pagaram propina
É DIFÍCIL IMAGINAR uma hipótese segundo a qual empresas não tenham pago propina para fiscais do ISS na cidade de São Paulo. Por exemplo, a gente poderia imaginar que a Máfia do ISS não passaria de uma espécie de comando libertário dedicado à redução da carga tributária e do "custo Brasil": cobraria menos impostos, mas não levaria nada em troca.
Mas a gente não está a lidar com um Robin Hood das incorporadoras e outras empresas. Se ainda é preciso explicar o sarcasmo, sabe-se que impostos não foram pagos e funcionários públicos formaram patrimônio de dezenas de milhões.
Pagou-se propina, ponto.
Pelo menos uma empresa envolvida e uma associação do setor argumentam que houve propinas porque houve extorsão.
Extorsão implica abuso da situação de alguém por meio de ameaça ou violência. Por exemplo, num caso ameno, o fiscal ameaça não entregar o comprovante de quitação do imposto e, assim, segura o Habite-se, sem o que o negócio não vai para a frente, causando prejuízos.
É possível. Mas: 1) Ainda haveria propina; 2) Mesmo que o extorsionário tenha exigido propina em troca da papelada legal, por que a empresa se sentiu também "obrigada" a pagar menos imposto? 3) Apesar de todos os pesares, não é difícil encontrar promotor, policial ou jornalista a fim de armar um flagra. Por que então empresas se "sujeitaram" a pagar propina e menos imposto?
Claro está que o nosso manicômio legal-burocrático propicia as tantas situações em que um fiscal pode encontrar pelo em ovo. É quase impossível tocar legalmente um negócio, tanto que em São Paulo há centenas de milhares de edificações irregulares ou com "alvará provisório", uma expressão que denota idiotice e/ou má-fé.
Ainda assim, voltamos ao caso anterior: por que não se chamou a polícia? O telhado da construtora seria de vidro, pois? Se é, o caso está encerrado: a propina acobertou outro rolo.
Empresas e suas associações argumentam que: 1) O sistema de cobrança é uma burocracia porca (é verdade) e arbitrária; 2) A cobrança é feita por um método irregular e possivelmente ilegal e inconstitucional (uma tese razoável).
A prefeitura sujeita a liberação do Habite-se à quitação final do ISS devido, o que seria irregular, algo chamado "sanção política": o Habite-se, certificado de adequação da edificação, nada tem a ver com a obrigação fiscal.
A coisa seria ilegal de resto porque a prefeitura regulou a base de cálculo do ISS, imposto definido na Constituição da República e regulamentado em lei federal. Criou base de cálculo que leva em conta um custo por metro quadrado da obra, não o custo da despesa de fato.
Diga-se de passagem que isso pode dar em injustiça tributária e em estímulo à ineficiência; é mais um indício dos tantos arbítrios fiscais "cum" distorções econômicas deste país.
Ainda assim, o que isso tem a ver com o pagamento de propinas e redução ilegal de imposto recolhido? Nada, a não ser o fato de que a lei e a administração pública acabam por colocar em contato íntimo corruptos e corruptores. Não é, decerto, uma ideia prudente. Mas a situação em si mesma não causa privação de sentidos morais, um transe corruptor.
O futuro do Brasil na China - MARCELO DE PAIVA ABREU
O Estado de S.Paulo - 11/12
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, visitou a China no começo de dezembro acompanhado de numerosa comitiva empresarial. Estava em busca de investimentos chineses nas ilhas britânicas e de reaproximação com Beijing, depois de ter caído em desgraça por ter encontrado o Dalai Lama. Em meio à visita, o jornal chinês Global Times, de propriedade estatal, comentou que a Grã-Bretanha seria apenas um destino de turistas e estudantes, com uns poucos times de futebol decentes...
O episódio suscita reminiscências históricas. Em 1792-1793, Lord Macartney chefiou uma delegação britânica que buscou obter concessões do imperador Qianlong: acesso ao mercado chinês, cessão de uma ilha perto de Xangai, como entreposto comercial, e estabelecimento de embaixada permanente em Beijing. O ritual da corte chinesa exigia que os embaixadores fizessem o kotow: três genuflexões, a cada uma tocando o solo três vezes com a cabeça. Macartney recusou-se: seria aceitar a vassalagem da Grã-Bretanha à China. Sua missão não teve sucesso, embora a falta de kotow não pareça ter sido vital: os documentos chineses continuaram a referir-se aos britânicos como "bárbaros" e a instar a "trêmula obediência" de seu monarca. A China era o "império imóvel", desinteressada em manter relações com o mundo exterior, a despeito da renda per capita ser provavelmente um terço da britânica. Cinquenta anos depois, as reivindicações britânicas seriam bem mais agressivas, com a guerra do ópio culminando na cessão de Hong Kong. Por mais de um século, a China teve a sua soberania violada por tratados assimétricos com inúmeras concessões territoriais para potências europeias menores e, militarmente, pelo Japão. Até mesmo o Brasil, de olho na imigração de coolies, pegou carona na extração de concessões do império agonizante. O tratado de amizade, comércio e navegação de 1881 entre a China e o Brasil estabelecia que brasileiros que cometessem, na China, crimes contra chineses seriam presos pelas autoridades consulares brasileiras e punidos segundo as leis do Brasil.
Os tempos mudaram. Depois de mais de dois séculos, Cameron fez um kotow moderno, com as posições transpostas em relação ao final do século 18, reconhecendo a atual posição proeminente da China na economia global. Julgou-se que a modesta humilhação seria justificável do ponto de vista econômico.
No caso do Brasil, a posição da China é ainda mais relevante. Em meio à inércia da diplomacia comercial brasileira, vai sendo consolidada a posição do País como exportador de commodities para a China. Por outro lado, gradativamente a China tem ampliado a sua participação nas importações brasileiras e o Brasil vem enfrentando concorrência chinesa que desloca produtos industriais brasileiros em seus mercados tradicionais.
As perspectivas exportadoras brasileiras são favoráveis. Dependem do ritmo da urbanização chinesa (minério de ferro), da velocidade de convergência da dieta chinesa para padrões ocidentais (soja) e das perspectivas de produção de petróleo pela China, incluindo gás de xisto. O Brasil é importante fonte de recursos naturais requeridos pelo rápido crescimento da economia chinesa. Não há nada de mau nisso. Sem as suas commodities competitivas, o Brasil estaria em situação bem pior. Mas a perspectiva de perpetuação dessa posição é incômoda.
A relação com a China deve ocupar por longo tempo posição crucial na agenda externa do Brasil. A despeito disso, falta reflexão sobre as relações econômicas e políticas com a China no longo prazo. Idealmente, o esforço de análise deveria ser realizado num quadro de radical rearrumação das ideias quanto ao futuro papel do Brasil na economia global. Ganha força a percepção de que é preciso abandonar o atual modelo fechado e medíocre. Desatracar do bolivarianismo e do kirchnerismo faria bem ao Brasil.
O primeiro-ministro britânico, David Cameron, visitou a China no começo de dezembro acompanhado de numerosa comitiva empresarial. Estava em busca de investimentos chineses nas ilhas britânicas e de reaproximação com Beijing, depois de ter caído em desgraça por ter encontrado o Dalai Lama. Em meio à visita, o jornal chinês Global Times, de propriedade estatal, comentou que a Grã-Bretanha seria apenas um destino de turistas e estudantes, com uns poucos times de futebol decentes...
O episódio suscita reminiscências históricas. Em 1792-1793, Lord Macartney chefiou uma delegação britânica que buscou obter concessões do imperador Qianlong: acesso ao mercado chinês, cessão de uma ilha perto de Xangai, como entreposto comercial, e estabelecimento de embaixada permanente em Beijing. O ritual da corte chinesa exigia que os embaixadores fizessem o kotow: três genuflexões, a cada uma tocando o solo três vezes com a cabeça. Macartney recusou-se: seria aceitar a vassalagem da Grã-Bretanha à China. Sua missão não teve sucesso, embora a falta de kotow não pareça ter sido vital: os documentos chineses continuaram a referir-se aos britânicos como "bárbaros" e a instar a "trêmula obediência" de seu monarca. A China era o "império imóvel", desinteressada em manter relações com o mundo exterior, a despeito da renda per capita ser provavelmente um terço da britânica. Cinquenta anos depois, as reivindicações britânicas seriam bem mais agressivas, com a guerra do ópio culminando na cessão de Hong Kong. Por mais de um século, a China teve a sua soberania violada por tratados assimétricos com inúmeras concessões territoriais para potências europeias menores e, militarmente, pelo Japão. Até mesmo o Brasil, de olho na imigração de coolies, pegou carona na extração de concessões do império agonizante. O tratado de amizade, comércio e navegação de 1881 entre a China e o Brasil estabelecia que brasileiros que cometessem, na China, crimes contra chineses seriam presos pelas autoridades consulares brasileiras e punidos segundo as leis do Brasil.
Os tempos mudaram. Depois de mais de dois séculos, Cameron fez um kotow moderno, com as posições transpostas em relação ao final do século 18, reconhecendo a atual posição proeminente da China na economia global. Julgou-se que a modesta humilhação seria justificável do ponto de vista econômico.
No caso do Brasil, a posição da China é ainda mais relevante. Em meio à inércia da diplomacia comercial brasileira, vai sendo consolidada a posição do País como exportador de commodities para a China. Por outro lado, gradativamente a China tem ampliado a sua participação nas importações brasileiras e o Brasil vem enfrentando concorrência chinesa que desloca produtos industriais brasileiros em seus mercados tradicionais.
As perspectivas exportadoras brasileiras são favoráveis. Dependem do ritmo da urbanização chinesa (minério de ferro), da velocidade de convergência da dieta chinesa para padrões ocidentais (soja) e das perspectivas de produção de petróleo pela China, incluindo gás de xisto. O Brasil é importante fonte de recursos naturais requeridos pelo rápido crescimento da economia chinesa. Não há nada de mau nisso. Sem as suas commodities competitivas, o Brasil estaria em situação bem pior. Mas a perspectiva de perpetuação dessa posição é incômoda.
A relação com a China deve ocupar por longo tempo posição crucial na agenda externa do Brasil. A despeito disso, falta reflexão sobre as relações econômicas e políticas com a China no longo prazo. Idealmente, o esforço de análise deveria ser realizado num quadro de radical rearrumação das ideias quanto ao futuro papel do Brasil na economia global. Ganha força a percepção de que é preciso abandonar o atual modelo fechado e medíocre. Desatracar do bolivarianismo e do kirchnerismo faria bem ao Brasil.
Canção do exílio - ALEXANDRE SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 11/12
Quando economistas propõem 'núcleos' de inflação, pergunto em que galáxia estiveram exilados
Não é preciso grande poder de observação para notar que a economia brasileira anda mal das pernas. A inflação, descontadas intervenções pontuais do governo, segue pressionada, e o deficit externo é crescente, caminhando para fechar o ano acima de US$ 80 bilhões.
Essa combinação de inflação e deficit sugere uma economia com excesso de demanda, apesar do crescimento pífio, ao redor de 2%. Trata-se de indicação clara de que a capacidade de expansão do país é baixa, reflexo de investimento insuficiente, particularmente em infraestrutura, deficiências na formação de mão de obra e produtividade lerda.
Por outro lado, é necessária enorme desatenção para atribuir esse resultado ao chamado "tripé macroeconômico", que foi praticamente abandonado, de forma mais clara a partir de 2011, período em que a economia nacional se deteriorou a olhos vistos.
Assim, quando economistas propõem "flexibilizar" o regime de metas para a inflação, preconizando a adoção de "núcleos" de inflação, ou prazo de convergência mais longo para a meta, eu me pergunto em que galáxia estiveram exilados desde então.
Como tive a oportunidade de discutir em coluna recente, "núcleos" são medidas de inflação menos afetadas por fenômenos transitórios ou localizados, que ajudam analistas na tarefa de diferenciar os verdadeiros processos inflacionários de desvios temporários da inflação. Em particular, se a inflação "cheia" estiver muito acima dos "núcleos", há bons argumentos para que o Banco Central modere altas da taxa de juros e vice-versa.
Ocorre que, nos últimos dez anos, o desvio médio da inflação "cheia" relativamente aos "núcleos" foi da ordem de 0,02% (dois centésimos de 1%) por ano, jamais superior a 0,45%, ou inferior a 0,50% negativo. Na verdade, a inflação oficial nunca esteve distante dos núcleos e muito menos de forma persistente: em 5 dos 10 anos, a inflação ficou acima dos núcleos e, obviamente, abaixo deles nos outros 5.
Posto de outra forma, o histórico brasileiro sugere --ao menos para economistas que permaneceram na Via Láctea-- que o uso de núcleos de inflação não seria a panaceia imaginada pelos exilados. Hoje em dia, aliás, em tese forçaria o BC a ser mais agressivo no que se refere ao aumento da taxa de juros.
Já fixar o prazo de convergência para a meta em dois anos seria um avanço, se considerarmos que a inflação permanece acima dela desde 2010 e sem perspectivas de retorno até depois de 2015, fato aparentemente não percebido pelos exilados.
O que a distância astronômica também não lhes permite captar são os efeitos colaterais da convergência lenta da inflação.
Imagine, por exemplo, que a inflação em determinado ano atinja 6,5%, dois pontos acima da meta, e que o BC, em vez de trazê-la de volta em um ano, prometa fazê-lo em dois. É claro que --de posse dessa informação-- trabalhadores e empresas passariam a esperar (na melhor das hipóteses) que a inflação seja de 5,5% no primeiro ano e 4,5% no segundo.
Ao reajustarem hoje seus salários e preços, portanto, incorporarão 5,5% de aumento (em vez de 4,5%), tornando mais difícil a tarefa do BC. Caso a convergência seja mais lenta (digamos, em quatro anos, ou redução de 0,5% por ano), as expectativas de inflação para o primeiro ano seriam 6%, devidamente repassadas a preços e salários.
Em outras palavras, a persistência da inflação, que muitos atribuem apenas a fatores culturais (a tal "indexação"), também reflete a velocidade de convergência: quanto mais lenta, maior a persistência, comportamento desconhecido nas galáxias vizinhas.
A verdade é que os exilados tentam, de forma nada sutil, esconder que a política econômica dos últimos anos reflete exatamente suas propostas, sem guardar nenhum parentesco com o tripé macroeconômico, gerando os resultados lamentáveis descritos no primeiro parágrafo. O que lhes falta é apenas a coragem de assumir a paternidade do modelo fracassado.
Quando economistas propõem 'núcleos' de inflação, pergunto em que galáxia estiveram exilados
Não é preciso grande poder de observação para notar que a economia brasileira anda mal das pernas. A inflação, descontadas intervenções pontuais do governo, segue pressionada, e o deficit externo é crescente, caminhando para fechar o ano acima de US$ 80 bilhões.
Essa combinação de inflação e deficit sugere uma economia com excesso de demanda, apesar do crescimento pífio, ao redor de 2%. Trata-se de indicação clara de que a capacidade de expansão do país é baixa, reflexo de investimento insuficiente, particularmente em infraestrutura, deficiências na formação de mão de obra e produtividade lerda.
Por outro lado, é necessária enorme desatenção para atribuir esse resultado ao chamado "tripé macroeconômico", que foi praticamente abandonado, de forma mais clara a partir de 2011, período em que a economia nacional se deteriorou a olhos vistos.
Assim, quando economistas propõem "flexibilizar" o regime de metas para a inflação, preconizando a adoção de "núcleos" de inflação, ou prazo de convergência mais longo para a meta, eu me pergunto em que galáxia estiveram exilados desde então.
Como tive a oportunidade de discutir em coluna recente, "núcleos" são medidas de inflação menos afetadas por fenômenos transitórios ou localizados, que ajudam analistas na tarefa de diferenciar os verdadeiros processos inflacionários de desvios temporários da inflação. Em particular, se a inflação "cheia" estiver muito acima dos "núcleos", há bons argumentos para que o Banco Central modere altas da taxa de juros e vice-versa.
Ocorre que, nos últimos dez anos, o desvio médio da inflação "cheia" relativamente aos "núcleos" foi da ordem de 0,02% (dois centésimos de 1%) por ano, jamais superior a 0,45%, ou inferior a 0,50% negativo. Na verdade, a inflação oficial nunca esteve distante dos núcleos e muito menos de forma persistente: em 5 dos 10 anos, a inflação ficou acima dos núcleos e, obviamente, abaixo deles nos outros 5.
Posto de outra forma, o histórico brasileiro sugere --ao menos para economistas que permaneceram na Via Láctea-- que o uso de núcleos de inflação não seria a panaceia imaginada pelos exilados. Hoje em dia, aliás, em tese forçaria o BC a ser mais agressivo no que se refere ao aumento da taxa de juros.
Já fixar o prazo de convergência para a meta em dois anos seria um avanço, se considerarmos que a inflação permanece acima dela desde 2010 e sem perspectivas de retorno até depois de 2015, fato aparentemente não percebido pelos exilados.
O que a distância astronômica também não lhes permite captar são os efeitos colaterais da convergência lenta da inflação.
Imagine, por exemplo, que a inflação em determinado ano atinja 6,5%, dois pontos acima da meta, e que o BC, em vez de trazê-la de volta em um ano, prometa fazê-lo em dois. É claro que --de posse dessa informação-- trabalhadores e empresas passariam a esperar (na melhor das hipóteses) que a inflação seja de 5,5% no primeiro ano e 4,5% no segundo.
Ao reajustarem hoje seus salários e preços, portanto, incorporarão 5,5% de aumento (em vez de 4,5%), tornando mais difícil a tarefa do BC. Caso a convergência seja mais lenta (digamos, em quatro anos, ou redução de 0,5% por ano), as expectativas de inflação para o primeiro ano seriam 6%, devidamente repassadas a preços e salários.
Em outras palavras, a persistência da inflação, que muitos atribuem apenas a fatores culturais (a tal "indexação"), também reflete a velocidade de convergência: quanto mais lenta, maior a persistência, comportamento desconhecido nas galáxias vizinhas.
A verdade é que os exilados tentam, de forma nada sutil, esconder que a política econômica dos últimos anos reflete exatamente suas propostas, sem guardar nenhum parentesco com o tripé macroeconômico, gerando os resultados lamentáveis descritos no primeiro parágrafo. O que lhes falta é apenas a coragem de assumir a paternidade do modelo fracassado.
À espera do Fed - CRISTIANO ROMERO
VALOR ECONÔMICO - 11/12
O governo brasileiro acredita que a redução dos estímulos monetários nos Estados Unidos pode começar já na próxima semana. Se não ocorrer agora, o tapering (a redução gradual dos estímulos) virá até o fim do primeiro trimestre de 2014. O tapering é igual ao Carnaval: de março não passa , brinca uma autoridade.
Como o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, deixou claro ontem em depoimento à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), o governo torce para que o processo comece logo. O corte dos estímulos monetários terá efeitos no curto prazo em variáveis como taxa de câmbio e juros, mas fechará um capítulo e abrirá outro na economia mundial, reduzindo as incertezas existentes hoje.
É difícil prever o que vai ocorrer quando o Federal Reserve Bank (Fed), o banco central americano, iniciar o tapering , mas economistas oficiais confiam que uma parte importante desse processo já foi precificada pelos mercados. O que não quer dizer que não vá ter um salto nas variáveis em geral. Depois, volta. Na sexta-feira tivemos um gostinho disso , diz uma fonte.
Na última sexta-feira, o governo americano divulgou números parrudos do seu mercado de trabalho - geração de 203 mil empregos em novembro, diante de expectativa de 180 mil, e queda do índice de desemprego de 7,3% para 7%. Os dados alimentaram a esperança de que o Fed começará o tapering na reunião do dia 18. A resposta imediata do mercado foi a valorização do dólar, mas em seguida esse movimento se reverteu.
Acho que foi o começo de um amadurecimento em relação a esse processo de transição de normalização monetária , opina um economista do governo. Para ele, o BC americano já deixou claro que haverá uma boa distância entre o tapering e a elevação da taxa de juros. O importante é que o Fed fez a separação entre redução dos estímulos quantitativos e aumento de juros. Há uma forward guidance (orientação para a frente) bem ancorada.
O Brasil estaria, então, preparado para enfrentar os efeitos da transição monetária dos EUA? O mercado acredita que não. A desconfiança está refletida principalmente nos prêmios de risco pagos por títulos públicos de longo prazo. E diz respeito, principalmente, ao desempenho das contas públicas, em particular à redução do superávit primário e ao aumento da dívida bruta.
Brasília sustenta que é quase eleitoreiro dizer que nada mudou nos últimos meses. Desde abril, o BC elevou a taxa básica de juros em 275 pontos base (de 7,25% para 10% ao ano). A taxa de câmbio voltou a flutuar, apesar do programa adotado no fim de agosto para oferecer hedge (proteção) ao mercado e impedir desvalorização acentuada do real. O governo acha que a situação fiscal também mudou.
Os bancos públicos estão moderando a oferta de crédito e isso é reconhecido, inclusive, por banqueiros privados. Estão sendo dados passos, senão na área fiscal, na quasi-fiscal. Tem havido progresso , sustenta uma fonte. O programa de concessões de infraestrutura, depois do ajuste das regras para atender a demanda dos investidores, está deslanchando.
O negócio está destravando e aumentando a confiança no longo prazo, na modelagem. Todas as mudanças que têm sido feitas são na direção market-friendly (amigáveis ao mercado) , diz um importante auxiliar da presidente Dilma Rousseff.
Esse assessor reconhece que o mercado está sentindo um cheiro de fragilidade . Há uma eleição presidencial no meio do caminho que turva tudo . A oposição aproveita as críticas do mercado para alavancar e o governo se defende toda vez que sai alguma coisa , observa a fonte.
O governo, por sua vez, tem dificuldade de entender a natureza dos movimentos do mercado, que independem de quem está no poder. Um exemplo: na transição do primeiro para o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, o mercado forçou a mudança do regime cambial por acreditar que a precária situação fiscal o tornava insustentável.
As piores situações que o Brasil viveu no passado recente foram com Armínio Fraga no BC e Pedro Malan na Fazenda ou com Gustavo Franco no BC e Malan na Fazenda. São pessoas completamente amigáveis ao mercado e sofreram horrores , pondera um técnico do atual governo. Não é ataque especulativo; é defesa especulativa.
O governo questiona o nervosismo por acreditar que as fragilidades percebidas agora não dizem respeito aos fundamentos, ao contrário do que ocorreu em 1998, 1999 e 2002. O país hoje tem reservas cambiais (US$ 375 bilhões), uma máquina que sabe arrecadar bem, pleno emprego, inflação sob controle. O problema está mais naquele negócio da percepção, da criatividade [da contabilidade das contas públicas], que são coisas mais fáceis de resolver , aposta esse economista.
Um interlocutor privilegiado da presidente Dilma assegura que o projeto que mudava de forma retroativa o indexador da dívida dos Estados, se não está enterrado, caminha a passos largos para isso. Ocorre que duas comissões do Senado - a CAE e a de Constituição e Justiça - promovem sessão hoje cedo para votar a proposta, que, se aprovada, abrirá espaço para os entes da federação elevarem o endividamento.
A fonte insiste: O governo tem dado sinais de que não brinca no precipício. O ideal seria não chegar nem perto, mas a reação tem sido totalmente na direção da responsabilidade, da austeridade . E acrescenta, não sem polêmica: a excitação não está no setor produtivo, cujos representantes têm rendido elogios ao governo, mas na área financeira. O nervosismo é da Paulista e da Faria Lima , disse ele, referindo-se às avenidas de São Paulo onde estão as sedes dos principais bancos do país.
Apesar de criticar o nervosismo do mercado, o governo estaria consciente de que 2015 será um ano de ajuste, mas que isso não será comunicado agora. Acha também que o rebaixamento da nota de crédito soberano antes das eleições é possível, embora não seja provável. O momento é perigoso e delicado, não é uma coisa eles contra nós , é a situação [o tapering ], que já aconteceu com gente benquista pelo mercado. É um comportamento defensivo gerando oportunidades , explica o assessor.
O governo brasileiro acredita que a redução dos estímulos monetários nos Estados Unidos pode começar já na próxima semana. Se não ocorrer agora, o tapering (a redução gradual dos estímulos) virá até o fim do primeiro trimestre de 2014. O tapering é igual ao Carnaval: de março não passa , brinca uma autoridade.
Como o presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, deixou claro ontem em depoimento à Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (CAE), o governo torce para que o processo comece logo. O corte dos estímulos monetários terá efeitos no curto prazo em variáveis como taxa de câmbio e juros, mas fechará um capítulo e abrirá outro na economia mundial, reduzindo as incertezas existentes hoje.
É difícil prever o que vai ocorrer quando o Federal Reserve Bank (Fed), o banco central americano, iniciar o tapering , mas economistas oficiais confiam que uma parte importante desse processo já foi precificada pelos mercados. O que não quer dizer que não vá ter um salto nas variáveis em geral. Depois, volta. Na sexta-feira tivemos um gostinho disso , diz uma fonte.
Na última sexta-feira, o governo americano divulgou números parrudos do seu mercado de trabalho - geração de 203 mil empregos em novembro, diante de expectativa de 180 mil, e queda do índice de desemprego de 7,3% para 7%. Os dados alimentaram a esperança de que o Fed começará o tapering na reunião do dia 18. A resposta imediata do mercado foi a valorização do dólar, mas em seguida esse movimento se reverteu.
Acho que foi o começo de um amadurecimento em relação a esse processo de transição de normalização monetária , opina um economista do governo. Para ele, o BC americano já deixou claro que haverá uma boa distância entre o tapering e a elevação da taxa de juros. O importante é que o Fed fez a separação entre redução dos estímulos quantitativos e aumento de juros. Há uma forward guidance (orientação para a frente) bem ancorada.
O Brasil estaria, então, preparado para enfrentar os efeitos da transição monetária dos EUA? O mercado acredita que não. A desconfiança está refletida principalmente nos prêmios de risco pagos por títulos públicos de longo prazo. E diz respeito, principalmente, ao desempenho das contas públicas, em particular à redução do superávit primário e ao aumento da dívida bruta.
Brasília sustenta que é quase eleitoreiro dizer que nada mudou nos últimos meses. Desde abril, o BC elevou a taxa básica de juros em 275 pontos base (de 7,25% para 10% ao ano). A taxa de câmbio voltou a flutuar, apesar do programa adotado no fim de agosto para oferecer hedge (proteção) ao mercado e impedir desvalorização acentuada do real. O governo acha que a situação fiscal também mudou.
Os bancos públicos estão moderando a oferta de crédito e isso é reconhecido, inclusive, por banqueiros privados. Estão sendo dados passos, senão na área fiscal, na quasi-fiscal. Tem havido progresso , sustenta uma fonte. O programa de concessões de infraestrutura, depois do ajuste das regras para atender a demanda dos investidores, está deslanchando.
O negócio está destravando e aumentando a confiança no longo prazo, na modelagem. Todas as mudanças que têm sido feitas são na direção market-friendly (amigáveis ao mercado) , diz um importante auxiliar da presidente Dilma Rousseff.
Esse assessor reconhece que o mercado está sentindo um cheiro de fragilidade . Há uma eleição presidencial no meio do caminho que turva tudo . A oposição aproveita as críticas do mercado para alavancar e o governo se defende toda vez que sai alguma coisa , observa a fonte.
O governo, por sua vez, tem dificuldade de entender a natureza dos movimentos do mercado, que independem de quem está no poder. Um exemplo: na transição do primeiro para o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso, o mercado forçou a mudança do regime cambial por acreditar que a precária situação fiscal o tornava insustentável.
As piores situações que o Brasil viveu no passado recente foram com Armínio Fraga no BC e Pedro Malan na Fazenda ou com Gustavo Franco no BC e Malan na Fazenda. São pessoas completamente amigáveis ao mercado e sofreram horrores , pondera um técnico do atual governo. Não é ataque especulativo; é defesa especulativa.
O governo questiona o nervosismo por acreditar que as fragilidades percebidas agora não dizem respeito aos fundamentos, ao contrário do que ocorreu em 1998, 1999 e 2002. O país hoje tem reservas cambiais (US$ 375 bilhões), uma máquina que sabe arrecadar bem, pleno emprego, inflação sob controle. O problema está mais naquele negócio da percepção, da criatividade [da contabilidade das contas públicas], que são coisas mais fáceis de resolver , aposta esse economista.
Um interlocutor privilegiado da presidente Dilma assegura que o projeto que mudava de forma retroativa o indexador da dívida dos Estados, se não está enterrado, caminha a passos largos para isso. Ocorre que duas comissões do Senado - a CAE e a de Constituição e Justiça - promovem sessão hoje cedo para votar a proposta, que, se aprovada, abrirá espaço para os entes da federação elevarem o endividamento.
A fonte insiste: O governo tem dado sinais de que não brinca no precipício. O ideal seria não chegar nem perto, mas a reação tem sido totalmente na direção da responsabilidade, da austeridade . E acrescenta, não sem polêmica: a excitação não está no setor produtivo, cujos representantes têm rendido elogios ao governo, mas na área financeira. O nervosismo é da Paulista e da Faria Lima , disse ele, referindo-se às avenidas de São Paulo onde estão as sedes dos principais bancos do país.
Apesar de criticar o nervosismo do mercado, o governo estaria consciente de que 2015 será um ano de ajuste, mas que isso não será comunicado agora. Acha também que o rebaixamento da nota de crédito soberano antes das eleições é possível, embora não seja provável. O momento é perigoso e delicado, não é uma coisa eles contra nós , é a situação [o tapering ], que já aconteceu com gente benquista pelo mercado. É um comportamento defensivo gerando oportunidades , explica o assessor.
OMC avança, mas não resolve o essencial - MARCOS SAWAYA JANK
O Estado de S.Paulo - 11/12
Após 12 anos de intermináveis reuniões, os 160 países-membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) fecharam sábado, na Ilha de Bali (Indonésia), o acordo que permite a continuidade das negociações da Rodada Doha. O seu principal mérito é manter a OMC em pé, depois de várias tentativas fracassadas e desacertos de governança. Com quase 70 anos de idade, o sistema multilateral de comércio há 20 anos não moderniza as suas regras.
Está cada vez mais claro que a OMC não produzirá aberturas comerciais efetivas, tamanha é a criatividade dos diplomatas em negociar fórmulas tarifárias obtusas, cotas restritivas, salvaguardas, tratamentos diferenciados e toda sorte de exceções envolvendo países e produtos sensíveis. Basta verificar que o documento de Bali não menciona reduções tarifárias, seja em produtos agrícolas ou industriais. O principal avanço foi o capítulo sobre "facilitação de comércio", que visa basicamente a reduzir custos de transação nas fronteiras. Trata-se do único item a ser comemorado pelos exportadores, ao trazer regras que vão diminuir burocracias e atrasos nas alfândegas, principalmente nos países em desenvolvimento.
Avançamos um pouco na questão da administração das cotas de importação de produtos agrícolas por países desenvolvidos. Porém, se olharmos o ambicioso mandato de Doha em 2001, concluiremos que na agricultura não avançamos quase nada. Em subsídios à exportação, houve um retrocesso em relação à ministerial de Hong Kong, quando chegamos bem perto da sua virtual eliminação. Bali quase fracassou por causa de uma nova exceção que a Índia teimou em abrir para construir grandes estoques de commodities agrícolas fora das disciplinas da OMC. Basicamente, o governo indiano quer comprar produtos a preços altos dos produtores e revendê-los a preços baixos a consumidores. Intervenções dessa natureza - em que o governo destrói o mercado com políticas de estoques e preços administrados - jamais funcionaram no mundo, como prova a própria agricultura brasileira antes dos anos 1990. Tecnologia, produtividade, assistência técnica e integração nas cadeias produtivas são a única solução de longo prazo para pequenos agricultores. Preços artificialmente altos e estoques manipulados apenas adiam o ajuste necessário, que, em muitos casos, termina sob a forma de subsídios à exportação, um total contrassenso que a Índia já praticou várias vezes e que agora parece não ter fim. É curioso como os grandes emergentes estão hoje copiando as piores práticas dos países ricos - subsídios agrícolas caros, de eficiência duvidosa e que distorcem fortemente o comércio mundial.
Ainda que tímido, o pequeno avanço obtido em Bali precisa ser comemorado por dois motivos. Primeiro, porque a entidade conta com o único tribunal multilateral em que é possível solucionar controvérsias comerciais. Se as regras não se modernizam, o tribunal perde eficácia. Segundo, porque a OMC é o único foro em que é factível negociar soluções para os temas sistêmicos do comércio, como, por exemplo, a redução de subsídios. Tarifas podem ser reduzidas dentro de um bloco menor de países, impactando os que estão fora, que não terão esse benefício. Subsídios governamentais, se reduzidos, beneficiam todos os países, independentemente de estarem ou não no bloco. Por isso os países só querem negociá-los se todos os que interessam estiverem na mesa, no caso, a OMC. Ou seja, se é difícil resolver temas sistêmicos na OMC, fora dela é praticamente impossível.
Mas o que mais me chamou a atenção em Bali foram o entusiasmo e a pressa de parte dos representantes de governos e setor privado e dos especialistas em comércio em voar para Cingapura, onde começava mais uma reunião da Parceria Trans-Pacífico (TPP, em inglês). Capitaneada por EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, a TPP reúne players da América Latina (México, Peru e Chile) e da Ásia (Malásia, Cingapura, Vietnã e, mais recentemente, o Japão). O acordo pretende reduzir a zero 90% das tarifas de todos os bens comercializados entre esses países até 2015 e o restante até o final da década. Prevê, ainda, a integração das áreas de serviços, proteção a investimentos, compras governamentais, comércio eletrônico, propriedade intelectual, concorrência e meio ambiente. A TPP propõe uma nova arquitetura de comércio que reforça a integração dos países em cadeias globais de suprimento e valor, sem tratamentos diferenciados. Não é por outra razão que em Bali já se falava abertamente da integração de Coreia do Sul, Tailândia e Filipinas à TPP. Até a China já manifestou interesse em conversar.
Outro grande impacto é que a TPP quer avançar na chamada "convergência regulatória", ou seja, a harmonização de todas as leis e regulamentos dos países-membros. No caso do agronegócio, a combinação de convergência regulatória com reduções tarifárias vai provocar forte desvio do fluxo de exportações e investimentos vindos do Brasil e da Argentina para a região Ásia-Pacífico, em favor de EUA, Canadá e Austrália como origem, para dizer o mínimo.
Enfim, graças à imensa habilidade do diretor-geral embaixador Roberto Azevêdo, podemos comemorar que a OMC continuará viva e operando. Ele conseguiu colocar os negociadores na mesma página e trazer a entidade de volta aos trilhos. O problema é que o trem da OMC é obsoleto e avança muito devagar. Enquanto isso, trens menos pesados e bem mais modernos estão circulando com rapidez e vontade. Dez anos atrás o Brasil estava na locomotiva de dois trens, chamados Alca e União Europeia-Mercosul, mas o primeiro quebrou e o segundo descarrilou. Neste momento, pelo menos dois trens de alta velocidade estão passando ao nosso lado, o Trans-Pacífico e o Transatlântico. Muitos ficarão dizendo que trens não saem sem o Brasil, trens não cruzam oceanos e outras bobagens. Recomendo que você vá ao menos conferir.
Após 12 anos de intermináveis reuniões, os 160 países-membros da Organização Mundial do Comércio (OMC) fecharam sábado, na Ilha de Bali (Indonésia), o acordo que permite a continuidade das negociações da Rodada Doha. O seu principal mérito é manter a OMC em pé, depois de várias tentativas fracassadas e desacertos de governança. Com quase 70 anos de idade, o sistema multilateral de comércio há 20 anos não moderniza as suas regras.
Está cada vez mais claro que a OMC não produzirá aberturas comerciais efetivas, tamanha é a criatividade dos diplomatas em negociar fórmulas tarifárias obtusas, cotas restritivas, salvaguardas, tratamentos diferenciados e toda sorte de exceções envolvendo países e produtos sensíveis. Basta verificar que o documento de Bali não menciona reduções tarifárias, seja em produtos agrícolas ou industriais. O principal avanço foi o capítulo sobre "facilitação de comércio", que visa basicamente a reduzir custos de transação nas fronteiras. Trata-se do único item a ser comemorado pelos exportadores, ao trazer regras que vão diminuir burocracias e atrasos nas alfândegas, principalmente nos países em desenvolvimento.
Avançamos um pouco na questão da administração das cotas de importação de produtos agrícolas por países desenvolvidos. Porém, se olharmos o ambicioso mandato de Doha em 2001, concluiremos que na agricultura não avançamos quase nada. Em subsídios à exportação, houve um retrocesso em relação à ministerial de Hong Kong, quando chegamos bem perto da sua virtual eliminação. Bali quase fracassou por causa de uma nova exceção que a Índia teimou em abrir para construir grandes estoques de commodities agrícolas fora das disciplinas da OMC. Basicamente, o governo indiano quer comprar produtos a preços altos dos produtores e revendê-los a preços baixos a consumidores. Intervenções dessa natureza - em que o governo destrói o mercado com políticas de estoques e preços administrados - jamais funcionaram no mundo, como prova a própria agricultura brasileira antes dos anos 1990. Tecnologia, produtividade, assistência técnica e integração nas cadeias produtivas são a única solução de longo prazo para pequenos agricultores. Preços artificialmente altos e estoques manipulados apenas adiam o ajuste necessário, que, em muitos casos, termina sob a forma de subsídios à exportação, um total contrassenso que a Índia já praticou várias vezes e que agora parece não ter fim. É curioso como os grandes emergentes estão hoje copiando as piores práticas dos países ricos - subsídios agrícolas caros, de eficiência duvidosa e que distorcem fortemente o comércio mundial.
Ainda que tímido, o pequeno avanço obtido em Bali precisa ser comemorado por dois motivos. Primeiro, porque a entidade conta com o único tribunal multilateral em que é possível solucionar controvérsias comerciais. Se as regras não se modernizam, o tribunal perde eficácia. Segundo, porque a OMC é o único foro em que é factível negociar soluções para os temas sistêmicos do comércio, como, por exemplo, a redução de subsídios. Tarifas podem ser reduzidas dentro de um bloco menor de países, impactando os que estão fora, que não terão esse benefício. Subsídios governamentais, se reduzidos, beneficiam todos os países, independentemente de estarem ou não no bloco. Por isso os países só querem negociá-los se todos os que interessam estiverem na mesa, no caso, a OMC. Ou seja, se é difícil resolver temas sistêmicos na OMC, fora dela é praticamente impossível.
Mas o que mais me chamou a atenção em Bali foram o entusiasmo e a pressa de parte dos representantes de governos e setor privado e dos especialistas em comércio em voar para Cingapura, onde começava mais uma reunião da Parceria Trans-Pacífico (TPP, em inglês). Capitaneada por EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, a TPP reúne players da América Latina (México, Peru e Chile) e da Ásia (Malásia, Cingapura, Vietnã e, mais recentemente, o Japão). O acordo pretende reduzir a zero 90% das tarifas de todos os bens comercializados entre esses países até 2015 e o restante até o final da década. Prevê, ainda, a integração das áreas de serviços, proteção a investimentos, compras governamentais, comércio eletrônico, propriedade intelectual, concorrência e meio ambiente. A TPP propõe uma nova arquitetura de comércio que reforça a integração dos países em cadeias globais de suprimento e valor, sem tratamentos diferenciados. Não é por outra razão que em Bali já se falava abertamente da integração de Coreia do Sul, Tailândia e Filipinas à TPP. Até a China já manifestou interesse em conversar.
Outro grande impacto é que a TPP quer avançar na chamada "convergência regulatória", ou seja, a harmonização de todas as leis e regulamentos dos países-membros. No caso do agronegócio, a combinação de convergência regulatória com reduções tarifárias vai provocar forte desvio do fluxo de exportações e investimentos vindos do Brasil e da Argentina para a região Ásia-Pacífico, em favor de EUA, Canadá e Austrália como origem, para dizer o mínimo.
Enfim, graças à imensa habilidade do diretor-geral embaixador Roberto Azevêdo, podemos comemorar que a OMC continuará viva e operando. Ele conseguiu colocar os negociadores na mesma página e trazer a entidade de volta aos trilhos. O problema é que o trem da OMC é obsoleto e avança muito devagar. Enquanto isso, trens menos pesados e bem mais modernos estão circulando com rapidez e vontade. Dez anos atrás o Brasil estava na locomotiva de dois trens, chamados Alca e União Europeia-Mercosul, mas o primeiro quebrou e o segundo descarrilou. Neste momento, pelo menos dois trens de alta velocidade estão passando ao nosso lado, o Trans-Pacífico e o Transatlântico. Muitos ficarão dizendo que trens não saem sem o Brasil, trens não cruzam oceanos e outras bobagens. Recomendo que você vá ao menos conferir.
Padrão de vida - ANTONIO DELFIM NETTO
FOLHA DE SP - 11/12
Recentes pesquisas de opinião, com todas as suas óbvias limitações, vão confirmando que o excessivo pessimismo de alguns setores que atinge a política governamental está longe de contaminar a sociedade.
O Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal estabilizaram a economia e eliminaram o estresse social produzido pela inflação e pela amea-ça do desequilíbrio fiscal sempre iminente.
Uma pesquisa feita pela Confederação Nacional da Indústria foi ao ponto crítico, com duas perguntas fundamentais: 1ª) Seu padrão de vida mudou para melhor?; 2ª) O que você espera para o padrão de vida de seus filhos?
A resposta à primeira foi que 8 entre 10 cidadãos consideram que sua situação hoje é muito melhor ou melhor que a dos seus pais. À segunda, que revela a confiança no futuro, a resposta reafirma o sentimento anterior: 8 entre 10 pais confiam que o padrão de vida de seus filhos será muito melhor ou melhor que o seu. Os resultados revelam uma alta expectativa de ascensão social, que cresce nas regiões com menor renda per capita. Para o Brasil, como um todo, 63% responderam que hoje é mais fácil melhorar socialmente do que foi no passado.
Outra pesquisa interessante foi a publicada pela Folha no último domingo. Feita pelo Datafolha em 28 e 29/11, ouviu 4.557 pessoas em 194 municípios. Contém muito material para reflexão pelos estudiosos das disciplinas sociais. Até para alguns economistas que heroicamente se assumem como "praticantes de uma ciência indiferente aos valores".
A pesquisa é exatamente sobre os "valores", as preferências reveladas pelos brasileiros no seu comportamento pessoal e nos temas econômicos. A verificação talvez mais interessante é que, de acordo com as definições e a relativa arbitrariedade das classificações, "os resultados mostram que o brasileiro médio preza valores comportamentais de direita, mas manifesta acentuada tendência de esquerda no campo econômico".
De fato, no campo dos comportamentos, 49% revelaram-se de direita (mais centro-direita) contra 29% de esquerda (mais centro-esquerda), enquanto no campo econômico, 26% classificam-se como direita (mais centro-direita), contra 46% de esquerda (mais centro-esquerda), numa aparente dissonância cognitiva.
Pelos problemas que levanta, essa pesquisa deveria ser amplamente discutida, principalmente do ponto de vista metodológico.
No questionário seria preciso discriminar, no campo econômico, os que acreditam que pode haver benefício para alguns sem custo para a sociedade, o que é uma impossibilidade física, mas "politicamente correta" para setores de certa "esquerda".
Recentes pesquisas de opinião, com todas as suas óbvias limitações, vão confirmando que o excessivo pessimismo de alguns setores que atinge a política governamental está longe de contaminar a sociedade.
O Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal estabilizaram a economia e eliminaram o estresse social produzido pela inflação e pela amea-ça do desequilíbrio fiscal sempre iminente.
Uma pesquisa feita pela Confederação Nacional da Indústria foi ao ponto crítico, com duas perguntas fundamentais: 1ª) Seu padrão de vida mudou para melhor?; 2ª) O que você espera para o padrão de vida de seus filhos?
A resposta à primeira foi que 8 entre 10 cidadãos consideram que sua situação hoje é muito melhor ou melhor que a dos seus pais. À segunda, que revela a confiança no futuro, a resposta reafirma o sentimento anterior: 8 entre 10 pais confiam que o padrão de vida de seus filhos será muito melhor ou melhor que o seu. Os resultados revelam uma alta expectativa de ascensão social, que cresce nas regiões com menor renda per capita. Para o Brasil, como um todo, 63% responderam que hoje é mais fácil melhorar socialmente do que foi no passado.
Outra pesquisa interessante foi a publicada pela Folha no último domingo. Feita pelo Datafolha em 28 e 29/11, ouviu 4.557 pessoas em 194 municípios. Contém muito material para reflexão pelos estudiosos das disciplinas sociais. Até para alguns economistas que heroicamente se assumem como "praticantes de uma ciência indiferente aos valores".
A pesquisa é exatamente sobre os "valores", as preferências reveladas pelos brasileiros no seu comportamento pessoal e nos temas econômicos. A verificação talvez mais interessante é que, de acordo com as definições e a relativa arbitrariedade das classificações, "os resultados mostram que o brasileiro médio preza valores comportamentais de direita, mas manifesta acentuada tendência de esquerda no campo econômico".
De fato, no campo dos comportamentos, 49% revelaram-se de direita (mais centro-direita) contra 29% de esquerda (mais centro-esquerda), enquanto no campo econômico, 26% classificam-se como direita (mais centro-direita), contra 46% de esquerda (mais centro-esquerda), numa aparente dissonância cognitiva.
Pelos problemas que levanta, essa pesquisa deveria ser amplamente discutida, principalmente do ponto de vista metodológico.
No questionário seria preciso discriminar, no campo econômico, os que acreditam que pode haver benefício para alguns sem custo para a sociedade, o que é uma impossibilidade física, mas "politicamente correta" para setores de certa "esquerda".
De boas intenções - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 11/12
Não têm sido eficazes os resultados das investidas dos tribunais superiores - tanto o Supremo quanto o Eleitoral - no campo das regras que regem eleições.
Digo isso, e já explico melhor, a propósito do julgamento marcado para esta semana no STF de uma ação de inconstitucionalidade apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil contra as doações de pessoas físicas e jurídicas para campanhas.
A OAB pede a proibição do financiamento por intermédio de empresas e sugere a alteração do porcentual (10% dos rendimentos brutos) permitido para doações individuais.
A intenção, expressa no texto da ação, é boa. A Ordem argumenta que a "excessiva infiltração do poder econômico nas eleições gera graves distorções", cria desequilíbrio em favor dos mais ricos e enseja "perniciosas vinculações entre doadores de campanha e os políticos, que acabam sendo fonte de favorecimentos e de corrupção após a eleição".
Nenhum reparo a fazer à argumentação. Acontece isso mesmo. Basta verificar a desproporção de montantes destinados a candidatos governistas e aos de oposição quando não representam uma perspectiva segura de poder.
Hoje as doações de pessoas jurídicas respondem por 98% do financiamento das campanhas, e apenas 2% de pessoas físicas. Os números não deixam dúvida quanto à indisposição do brasileiro em transferir dinheiro do bolso para o caixa de partidos e/ou de candidatos.
A razão é a mesma que torna a proposta de financiamento público inexequível na prática: desconfiança e má vontade com a política. Sentimentos baseados em fatos reais, pois não?
De onde o gesto da OAB pode ser bem-intencionado, mas no mínimo bastante questionável do ponto de vista da eficácia. Proibidas as doações de empresas, seria posto o quê no lugar? Financiamento público não passa na sociedade e, por consequência, não passa no Congresso.
A rigor, os partidos é que deveriam se virar para conseguir dinheiro, dentro da legalidade, e deixar o contribuinte - que hoje já "colabora" com o Fundo Partidário e a renúncia fiscal decorrente do horário cedido pelas emissoras em períodos eleitorais - fora disso.
A realidade, porém, é mais dura e não obedece a condições ideais. Proibir pura e simplesmente as doações de pessoas jurídicas "por dentro" só teria como imediata consequência o aumento dos recursos "não contabilizados". O conhecido caixa dois.
Dificilmente os partidos, diante das exigências do marketing cada vez mais caras, concordariam em se adequar a instrumentos modestos para fazer campanha. Seria ótimo que isso acontecesse - mas, sem outras mudanças de fiscalização e procedimentos, prevaleceria o mercado negro.
Ou não, se os Três Poderes da República se envolvessem numa ofensiva efetiva e muito ampla para mudar o panorama. O Legislativo reclama quando o Judiciário é instado a se envolver no assunto, junto com o Executivo falam muito sobre o tema, usam o "sistema" como justificativa para atitudes condenáveis, mas não fazem nada em prol da já desacreditada reforma política.
De forma isolada não chegarão a lugar algum. Em pelo menos dois casos, o STF e o TSE produziram resultados contrários ao pretendido ao transitar pelo campo das regras eleitorais e partidárias.
Em um deles, a Justiça derrubou a cláusula de barreira - pela qual os partidos deveriam obter um porcentual mínimo de votos para ter representação no Congresso - sob o argumento de que feria o direito das pequenas legendas.
Em outro, permitiu que políticos filiados a partidos novos carregassem consigo o tempo de televisão e os recursos do Fundo Partidário, quando as leis ordinárias dizem que para isso é preciso passar pelo crivo de uma eleição.
Com acontece com a OAB, a intenção era boa, mas a realidade bem menos generosa.
Não têm sido eficazes os resultados das investidas dos tribunais superiores - tanto o Supremo quanto o Eleitoral - no campo das regras que regem eleições.
Digo isso, e já explico melhor, a propósito do julgamento marcado para esta semana no STF de uma ação de inconstitucionalidade apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil contra as doações de pessoas físicas e jurídicas para campanhas.
A OAB pede a proibição do financiamento por intermédio de empresas e sugere a alteração do porcentual (10% dos rendimentos brutos) permitido para doações individuais.
A intenção, expressa no texto da ação, é boa. A Ordem argumenta que a "excessiva infiltração do poder econômico nas eleições gera graves distorções", cria desequilíbrio em favor dos mais ricos e enseja "perniciosas vinculações entre doadores de campanha e os políticos, que acabam sendo fonte de favorecimentos e de corrupção após a eleição".
Nenhum reparo a fazer à argumentação. Acontece isso mesmo. Basta verificar a desproporção de montantes destinados a candidatos governistas e aos de oposição quando não representam uma perspectiva segura de poder.
Hoje as doações de pessoas jurídicas respondem por 98% do financiamento das campanhas, e apenas 2% de pessoas físicas. Os números não deixam dúvida quanto à indisposição do brasileiro em transferir dinheiro do bolso para o caixa de partidos e/ou de candidatos.
A razão é a mesma que torna a proposta de financiamento público inexequível na prática: desconfiança e má vontade com a política. Sentimentos baseados em fatos reais, pois não?
De onde o gesto da OAB pode ser bem-intencionado, mas no mínimo bastante questionável do ponto de vista da eficácia. Proibidas as doações de empresas, seria posto o quê no lugar? Financiamento público não passa na sociedade e, por consequência, não passa no Congresso.
A rigor, os partidos é que deveriam se virar para conseguir dinheiro, dentro da legalidade, e deixar o contribuinte - que hoje já "colabora" com o Fundo Partidário e a renúncia fiscal decorrente do horário cedido pelas emissoras em períodos eleitorais - fora disso.
A realidade, porém, é mais dura e não obedece a condições ideais. Proibir pura e simplesmente as doações de pessoas jurídicas "por dentro" só teria como imediata consequência o aumento dos recursos "não contabilizados". O conhecido caixa dois.
Dificilmente os partidos, diante das exigências do marketing cada vez mais caras, concordariam em se adequar a instrumentos modestos para fazer campanha. Seria ótimo que isso acontecesse - mas, sem outras mudanças de fiscalização e procedimentos, prevaleceria o mercado negro.
Ou não, se os Três Poderes da República se envolvessem numa ofensiva efetiva e muito ampla para mudar o panorama. O Legislativo reclama quando o Judiciário é instado a se envolver no assunto, junto com o Executivo falam muito sobre o tema, usam o "sistema" como justificativa para atitudes condenáveis, mas não fazem nada em prol da já desacreditada reforma política.
De forma isolada não chegarão a lugar algum. Em pelo menos dois casos, o STF e o TSE produziram resultados contrários ao pretendido ao transitar pelo campo das regras eleitorais e partidárias.
Em um deles, a Justiça derrubou a cláusula de barreira - pela qual os partidos deveriam obter um porcentual mínimo de votos para ter representação no Congresso - sob o argumento de que feria o direito das pequenas legendas.
Em outro, permitiu que políticos filiados a partidos novos carregassem consigo o tempo de televisão e os recursos do Fundo Partidário, quando as leis ordinárias dizem que para isso é preciso passar pelo crivo de uma eleição.
Com acontece com a OAB, a intenção era boa, mas a realidade bem menos generosa.
O poder de uma foto - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 11/12
BRASÍLIA - Cético por dever profissional, sempre fico constrangido quando uma notícia desperta em mim um sentimento de simpatia ou esperança. No meu ofício, o otimista é só um repórter mal-informado.
Ainda assim, assumo o risco. Dilma Rousseff acertou na mosca ao convidar os ex-presidentes brasileiros para que fossem juntos ao funeral de Nelson Mandela, na África do Sul. A imagem da petista junto com Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor e José Sarney nos remete a um Brasil que talvez se torne realidade um dia --um país no qual os desiguais convivam com urbanidade e os interesses da nação se sobreponham a divergências ideológicas ou partidárias.
É claro que não é esse ainda o caso. Mas a cada reunião dessas de ex-presidentes, um passo a mais é dado. Pode parecer pouca coisa. Não é. Não existem cenas iguais do passado por uma simples razão: ex-presidentes nunca se encontravam nem se deixavam fotografar todos juntos. Passada a ditadura militar (1964-1985), nada justificaria os civis convidarem os generais para algum convescote.
Mesmo no início do atual ciclo democrático, faria pouco sentido os sucessores imediatos de Fernando Collor chamá-lo enquanto os processos relativos ao período do impeachment ainda estavam inconclusos.
Muitos devem ter torcido o nariz ao saber que Dilma convidou Collor e Sarney. Não é fácil defender seus governos. Só que os dois carregam a experiência de ter sentado na principal cadeira do Palácio do Planalto. Nos EUA, enquanto era vivo, Richard Nixon também participava de encontros de ex-presidentes --mesmo tendo deixado a Casa Branca acossado pelo risco de impeachment.
Em política, ingenuidade é mortal. O Brasil continua basicamente igual ao que era antes da viagem de Dilma e seus antecessores à África do Sul. Mas a foto de todos juntos torna o país um pouco mais civilizado e urbano. Uma imagem, às vezes, é tudo.
BRASÍLIA - Cético por dever profissional, sempre fico constrangido quando uma notícia desperta em mim um sentimento de simpatia ou esperança. No meu ofício, o otimista é só um repórter mal-informado.
Ainda assim, assumo o risco. Dilma Rousseff acertou na mosca ao convidar os ex-presidentes brasileiros para que fossem juntos ao funeral de Nelson Mandela, na África do Sul. A imagem da petista junto com Luiz Inácio Lula da Silva, Fernando Henrique Cardoso, Fernando Collor e José Sarney nos remete a um Brasil que talvez se torne realidade um dia --um país no qual os desiguais convivam com urbanidade e os interesses da nação se sobreponham a divergências ideológicas ou partidárias.
É claro que não é esse ainda o caso. Mas a cada reunião dessas de ex-presidentes, um passo a mais é dado. Pode parecer pouca coisa. Não é. Não existem cenas iguais do passado por uma simples razão: ex-presidentes nunca se encontravam nem se deixavam fotografar todos juntos. Passada a ditadura militar (1964-1985), nada justificaria os civis convidarem os generais para algum convescote.
Mesmo no início do atual ciclo democrático, faria pouco sentido os sucessores imediatos de Fernando Collor chamá-lo enquanto os processos relativos ao período do impeachment ainda estavam inconclusos.
Muitos devem ter torcido o nariz ao saber que Dilma convidou Collor e Sarney. Não é fácil defender seus governos. Só que os dois carregam a experiência de ter sentado na principal cadeira do Palácio do Planalto. Nos EUA, enquanto era vivo, Richard Nixon também participava de encontros de ex-presidentes --mesmo tendo deixado a Casa Branca acossado pelo risco de impeachment.
Em política, ingenuidade é mortal. O Brasil continua basicamente igual ao que era antes da viagem de Dilma e seus antecessores à África do Sul. Mas a foto de todos juntos torna o país um pouco mais civilizado e urbano. Uma imagem, às vezes, é tudo.
A barbárie que se repete - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 11/12
Vai explicar como aqui é possível realizar jogos de futebol decisivos sem a presença da polícia. E que se pode entrar no estádio com uma barra de ferro com prego na ponta
No momento em que corre o mundo o exemplo de Nelson Mandela, revelando até onde pode ir a grandeza humana — a tolerância, a capacidade de perdoar, o espírito pacifista —, é justamente nesse momento que o Brasil resolveu exportar o oposto do que o líder sul-africano pregou. As imagens do que se passou aqui, domingo, num estádio de futebol, constituem uma pequena mostra do que de pior é capaz o gênero humano: a violência selvagem, o fanatismo, a barbárie, a covardia. A imprensa estrangeira, com espanto, não escondeu a preocupação com o que pode acontecer daqui a seis meses. Só faltou repetir o bordão com que há algum tempo expressamos nossa incerteza e pessimismo: “Já imaginou na Copa!” Se nada for feito, o espetáculo que transformou a arquibancada da Arena Joinville num octógono de MMA, com vários lutadores se agredindo durante mais de uma hora, vai se repetir.
Pena que aquele show de fúria assassina tivesse acontecido numa cidade que chama a atenção pela qualidade de vida e pela civilidade de seu povo, ostentando um alto IDH — entre 2000 e 2010, o indicador que mais cresceu foi o da educação. Vai explicar como aqui é possível realizar jogos de futebol decisivos sem a presença da polícia. E que se pode entrar no estádio com uma barra de ferro com prego na ponta, como fez um dos trogloditas que aparece espancando alguém caído no chão desacordado, sem falar em outro absurdo, o de que apenas três dos envolvidos nos vários conflitos acabaram detidos.
De quem a culpa? A PM alega que é do Ministério Público, que teria proibido a presença de policiais na Arena. Já o promotor Francisco de Paula Fernandes Neto disse que houve “erro de interpretação” e que a responsabilidade é de quem organiza, portanto, do Atlético-PR, que, por sua vez, acusou a empresa de segurança contratada, a qual disse ter advertido o clube para a insuficiência do número solicitado de 20 homens. Ou seja, um empurra-empurra em que cada um teve a sua parte.
Pela repercussão que ganhou, graças às contundentes imagens, o vale-tudo de Joinville mobilizou o governo que, da presidente ao ministro do Esporte, passou a exigir um basta para essa antiga praga do futebol. Legislação prevendo punição não falta, falta cumpri-la. Por exemplo: um dos três vascaínos presos agora é o mesmo que, acusado em 2007 da morte de um torcedor do Flamengo, ficou três meses na cadeia, mas escapou da condenação. Como afirma o comandante do Grupamento Especial de Policiamento de Estádios do Rio, João Fiorentini, “o clube é que dá o ingresso para o torcedor violento ir aos estádios”. O que os cartolas têm a dizer sobre a repetição dessas cenas de barbárie e a reincidência dos que as praticam?
Vai explicar como aqui é possível realizar jogos de futebol decisivos sem a presença da polícia. E que se pode entrar no estádio com uma barra de ferro com prego na ponta
No momento em que corre o mundo o exemplo de Nelson Mandela, revelando até onde pode ir a grandeza humana — a tolerância, a capacidade de perdoar, o espírito pacifista —, é justamente nesse momento que o Brasil resolveu exportar o oposto do que o líder sul-africano pregou. As imagens do que se passou aqui, domingo, num estádio de futebol, constituem uma pequena mostra do que de pior é capaz o gênero humano: a violência selvagem, o fanatismo, a barbárie, a covardia. A imprensa estrangeira, com espanto, não escondeu a preocupação com o que pode acontecer daqui a seis meses. Só faltou repetir o bordão com que há algum tempo expressamos nossa incerteza e pessimismo: “Já imaginou na Copa!” Se nada for feito, o espetáculo que transformou a arquibancada da Arena Joinville num octógono de MMA, com vários lutadores se agredindo durante mais de uma hora, vai se repetir.
Pena que aquele show de fúria assassina tivesse acontecido numa cidade que chama a atenção pela qualidade de vida e pela civilidade de seu povo, ostentando um alto IDH — entre 2000 e 2010, o indicador que mais cresceu foi o da educação. Vai explicar como aqui é possível realizar jogos de futebol decisivos sem a presença da polícia. E que se pode entrar no estádio com uma barra de ferro com prego na ponta, como fez um dos trogloditas que aparece espancando alguém caído no chão desacordado, sem falar em outro absurdo, o de que apenas três dos envolvidos nos vários conflitos acabaram detidos.
De quem a culpa? A PM alega que é do Ministério Público, que teria proibido a presença de policiais na Arena. Já o promotor Francisco de Paula Fernandes Neto disse que houve “erro de interpretação” e que a responsabilidade é de quem organiza, portanto, do Atlético-PR, que, por sua vez, acusou a empresa de segurança contratada, a qual disse ter advertido o clube para a insuficiência do número solicitado de 20 homens. Ou seja, um empurra-empurra em que cada um teve a sua parte.
Pela repercussão que ganhou, graças às contundentes imagens, o vale-tudo de Joinville mobilizou o governo que, da presidente ao ministro do Esporte, passou a exigir um basta para essa antiga praga do futebol. Legislação prevendo punição não falta, falta cumpri-la. Por exemplo: um dos três vascaínos presos agora é o mesmo que, acusado em 2007 da morte de um torcedor do Flamengo, ficou três meses na cadeia, mas escapou da condenação. Como afirma o comandante do Grupamento Especial de Policiamento de Estádios do Rio, João Fiorentini, “o clube é que dá o ingresso para o torcedor violento ir aos estádios”. O que os cartolas têm a dizer sobre a repetição dessas cenas de barbárie e a reincidência dos que as praticam?
A Exortação de Francisco à sua Igreja militante - OLIVEIROS S. FERREIRA
O Estado de S.Paulo - 11/12
Mantenhamos como pano de fundo a advertência papal: "Tanto os intelectuais como os jornalistas caem, frequentemente, em generalizações grosseiras...". O que nos diz que comentar a Evangelii Gaudium é tarefa sumamente delicada, antes de tudo, porque os quadros mentais do papa Francisco e os dos "intelectuais e jornalistas" são muito diferentes. Os referenciais de Francisco são as Escrituras e a Moral; os nossos, uma pretensa Razão, preocupada com a possível influência política dos textos provindos do Vaticano. Será o caso de, aqui, destacarmos a reiterada opção pelos pobres, parte da Doutrina Social da Igreja, quando não inscrita no próprio Evangelho, como Francisco faz questão de assinalar aqui e ali.
João Paulo II afirmara, numa de suas últimas encíclicas, que a questão social é, para a Igreja, uma questão moral - é, portanto, uma daquelas questões sobre as quais o papa fala ex catedra. Francisco vai mais longe, lembrando que "deriva da nossa fé em Cristo, que Se fez pobre e sempre Se aproximou dos pobres e marginalizados, a preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais abandonados da sociedade". E insiste: "Mas a quem deveria (a Igreja) privilegiar? Quando se lê o Evangelho, encontramos uma orientação muito clara... Não devem subsistir dúvidas nem explicações que debilitem esta mensagem claríssima. Hoje e sempre, 'os pobres são os destinatários privilegiados do Evangelho'".
Sempre que examinam os textos papais, intelectuais e jornalistas defrontam-se com uma dificuldade: a qual universo Sua Santidade se estará referindo? Ao real, da práxis cotidiana, ou ao espiritual? Diz dos pobres de meios ou dos pobres de espírito? Sem dúvida, para o papa Francisco, a Igreja Católica tem a missão de levar a mensagem de Cristo a todos. Haverá ainda, porém, outra missão: "A Igreja não cresce por proselitismo, mas 'por atração'... Repito aqui... prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças... enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: 'Dai-lhes vós mesmos de comer'... Não deixemos que nos roubem o Evangelho!".
A Igreja é, pois, militante. Isso estará explicitado em diferentes momentos da Evangelii Gaudium, sem ambages: "Embora 'a justa ordem da sociedade e do Estado seja dever central da política', a Igreja 'não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça'". Francisco e sua Igreja defenderão a propriedade, justificada por um "direito" que lhe é anterior: "A solidariedade é uma reação espontânea de quem reconhece a função social da propriedade e o destino universal dos bens como realidades anteriores à propriedade privada".
A esta altura, um intelectual presunçoso e prepotente se lembrará do Discurso sobre a desigualdade e de que "aquele que cercou um pedaço de terra e disse 'isto é meu' foi o verdadeiro fundador da sociedade civil". Os demais perguntaram-lhe em nome de que direito a propriedade era reivindicada: o do primeiro ocupante ou o do mais forte? Como a resposta nada lhes dizia, seguiu-se a guerra de todos contra todos, que cessou quando os ricos e fortes puderam convencer os pobres e fracos a que aceitassem o governo.
Para Francisco, nem o direito do mais forte, nem o direito do primeiro ocupante, nem um contrato social justificam a propriedade. Ela se justifica por "realidades" anteriores e terá uma "função social": a "posse privada dos bens justifica-se para cuidar deles e aumentá-los de modo a servirem melhor ao bem comum, pelo que a solidariedade deve ser vivida como a decisão de devolver ao pobre o que lhe corresponde". É como se voltássemos ao poeta romano e à era primeva, a de ouro, em que os homens viviam sem lei e sem juiz. Ou ao Éden, em que tudo foi de todos, até que se cometeu o Pecado...
Enganar-se-ão os que pretenderem ver na Exortação a "anistia" papal à Teologia da Libertação. A defesa dos pobres faz-se em nome de Cristo, cujo caráter salvífico é constantemente afirmado sem nenhuma referência ao seu suposto caráter revolucionário. A missão, hoje, não é pôr-se em armas contra ricos, poderosos e opressores. Nem dar fim à desigualdade pela expropriação da propriedade pelo Estado, eliminando a mais-valia. A leitura da Exortação só permite uma conclusão: a sociedade não se divide entre proprietários dos meios de produção e operários, mas sim entre o rico e o pobre, o primeiro devendo "devolver" ao segundo "o que lhe corresponde"...
O cerne da questão não está na propriedade - está na alienação que se dá no dinheiro. Convém lembrar que São Paulo já condenava não o dinheiro, mas a cobiça por ele. Francisco dirá: "Não à nova idolatria do dinheiro"; e "uma das causas desta situação está na relação estabelecida com o dinheiro, porque aceitamos pacificamente o seu domínio sobre nós e as nossas sociedades... O dinheiro deve servir, e não governar! A adoração do antigo bezerro de ouro... encontrou uma nova e cruel versão no fetichismo do dinheiro e na ditadura de uma economia sem rosto e sem um objetivo verdadeiramente humano... O papa ama a todos, ricos e pobres, mas tem a obrigação, em nome de Cristo, de lembrar que os ricos devem ajudar os pobres, respeitá-los e promovê-los".
Nesse ponto, Francisco avança contra "ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum" e de preservar a Natureza e o Homem indefesos "em face dos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta".
A Igreja militante terá seus soldados, sua disciplina e também sua hierarquia. Na Exortação, o papa Francisco cuida desse problema.
Mantenhamos como pano de fundo a advertência papal: "Tanto os intelectuais como os jornalistas caem, frequentemente, em generalizações grosseiras...". O que nos diz que comentar a Evangelii Gaudium é tarefa sumamente delicada, antes de tudo, porque os quadros mentais do papa Francisco e os dos "intelectuais e jornalistas" são muito diferentes. Os referenciais de Francisco são as Escrituras e a Moral; os nossos, uma pretensa Razão, preocupada com a possível influência política dos textos provindos do Vaticano. Será o caso de, aqui, destacarmos a reiterada opção pelos pobres, parte da Doutrina Social da Igreja, quando não inscrita no próprio Evangelho, como Francisco faz questão de assinalar aqui e ali.
João Paulo II afirmara, numa de suas últimas encíclicas, que a questão social é, para a Igreja, uma questão moral - é, portanto, uma daquelas questões sobre as quais o papa fala ex catedra. Francisco vai mais longe, lembrando que "deriva da nossa fé em Cristo, que Se fez pobre e sempre Se aproximou dos pobres e marginalizados, a preocupação pelo desenvolvimento integral dos mais abandonados da sociedade". E insiste: "Mas a quem deveria (a Igreja) privilegiar? Quando se lê o Evangelho, encontramos uma orientação muito clara... Não devem subsistir dúvidas nem explicações que debilitem esta mensagem claríssima. Hoje e sempre, 'os pobres são os destinatários privilegiados do Evangelho'".
Sempre que examinam os textos papais, intelectuais e jornalistas defrontam-se com uma dificuldade: a qual universo Sua Santidade se estará referindo? Ao real, da práxis cotidiana, ou ao espiritual? Diz dos pobres de meios ou dos pobres de espírito? Sem dúvida, para o papa Francisco, a Igreja Católica tem a missão de levar a mensagem de Cristo a todos. Haverá ainda, porém, outra missão: "A Igreja não cresce por proselitismo, mas 'por atração'... Repito aqui... prefiro uma Igreja acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às próprias seguranças... enquanto lá fora há uma multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: 'Dai-lhes vós mesmos de comer'... Não deixemos que nos roubem o Evangelho!".
A Igreja é, pois, militante. Isso estará explicitado em diferentes momentos da Evangelii Gaudium, sem ambages: "Embora 'a justa ordem da sociedade e do Estado seja dever central da política', a Igreja 'não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça'". Francisco e sua Igreja defenderão a propriedade, justificada por um "direito" que lhe é anterior: "A solidariedade é uma reação espontânea de quem reconhece a função social da propriedade e o destino universal dos bens como realidades anteriores à propriedade privada".
A esta altura, um intelectual presunçoso e prepotente se lembrará do Discurso sobre a desigualdade e de que "aquele que cercou um pedaço de terra e disse 'isto é meu' foi o verdadeiro fundador da sociedade civil". Os demais perguntaram-lhe em nome de que direito a propriedade era reivindicada: o do primeiro ocupante ou o do mais forte? Como a resposta nada lhes dizia, seguiu-se a guerra de todos contra todos, que cessou quando os ricos e fortes puderam convencer os pobres e fracos a que aceitassem o governo.
Para Francisco, nem o direito do mais forte, nem o direito do primeiro ocupante, nem um contrato social justificam a propriedade. Ela se justifica por "realidades" anteriores e terá uma "função social": a "posse privada dos bens justifica-se para cuidar deles e aumentá-los de modo a servirem melhor ao bem comum, pelo que a solidariedade deve ser vivida como a decisão de devolver ao pobre o que lhe corresponde". É como se voltássemos ao poeta romano e à era primeva, a de ouro, em que os homens viviam sem lei e sem juiz. Ou ao Éden, em que tudo foi de todos, até que se cometeu o Pecado...
Enganar-se-ão os que pretenderem ver na Exortação a "anistia" papal à Teologia da Libertação. A defesa dos pobres faz-se em nome de Cristo, cujo caráter salvífico é constantemente afirmado sem nenhuma referência ao seu suposto caráter revolucionário. A missão, hoje, não é pôr-se em armas contra ricos, poderosos e opressores. Nem dar fim à desigualdade pela expropriação da propriedade pelo Estado, eliminando a mais-valia. A leitura da Exortação só permite uma conclusão: a sociedade não se divide entre proprietários dos meios de produção e operários, mas sim entre o rico e o pobre, o primeiro devendo "devolver" ao segundo "o que lhe corresponde"...
O cerne da questão não está na propriedade - está na alienação que se dá no dinheiro. Convém lembrar que São Paulo já condenava não o dinheiro, mas a cobiça por ele. Francisco dirá: "Não à nova idolatria do dinheiro"; e "uma das causas desta situação está na relação estabelecida com o dinheiro, porque aceitamos pacificamente o seu domínio sobre nós e as nossas sociedades... O dinheiro deve servir, e não governar! A adoração do antigo bezerro de ouro... encontrou uma nova e cruel versão no fetichismo do dinheiro e na ditadura de uma economia sem rosto e sem um objetivo verdadeiramente humano... O papa ama a todos, ricos e pobres, mas tem a obrigação, em nome de Cristo, de lembrar que os ricos devem ajudar os pobres, respeitá-los e promovê-los".
Nesse ponto, Francisco avança contra "ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum" e de preservar a Natureza e o Homem indefesos "em face dos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta".
A Igreja militante terá seus soldados, sua disciplina e também sua hierarquia. Na Exortação, o papa Francisco cuida desse problema.
Gratuidade suspeita - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 11/12
SÃO PAULO - A reforma educacional dá o tom da campanha eleitoral chilena. Os estudantes, ecoando uma palavra de ordem comum na América Latina, exigem que as universidades públicas do país, que cobram mensalidades de todos, ofereçam ensino superior gratuito.
A pergunta que se impõe (e não só para o Chile) é se a tal da gratuidade é mais ou menos justa que o sistema atual, no qual o governo distribui bolsas por critérios de desempenho ou necessidade e concede empréstimos em condições mais favoráveis.
O primeiro ponto a salientar é que não existe universidade grátis. Ou a conta é paga pelo estudante e sua família, ou pela sociedade, por meio de impostos cobrados a todos.
A segunda hipótese tem a vantagem de assegurar que bons alunos não se verão excluídos pelo fato de serem eventualmente pobres.
A primeira é, em tese, menos regressiva, já que dispensa a população, inclusive os que têm menos recursos, de pagar por um curso que, no futuro, possibilitará ao estudante beneficiado auferir salários bem maiores do que os de pessoas que não frequentaram a universidade.
A escolha se daria então entre favorecer a mobilidade social e promover justiça tributária. Mas há um complicador adicional. O advento do que os demógrafos chamam de casamento assortativo (no qual as partes se escolhem livremente) pode estar criando um novo estamento social. Ao menos nos EUA, economistas já apontam o fato de universitários tenderem a casar-se entre si como uma fonte de desigualdade. Seus filhos, por uma combinação de razões econômicas, biológicas e culturais, terão mais chance de chegar à universidade, assegurar renda e unir-se a outra pessoa nas mesmas condições.
Se esse fenômeno é real, o papel da faculdade como mola de ascensão social pode estar se reduzindo, o que faria da gratuidade um subsídio que os mais pobres oferecem aos mais ricos. Ironias da história.
SÃO PAULO - A reforma educacional dá o tom da campanha eleitoral chilena. Os estudantes, ecoando uma palavra de ordem comum na América Latina, exigem que as universidades públicas do país, que cobram mensalidades de todos, ofereçam ensino superior gratuito.
A pergunta que se impõe (e não só para o Chile) é se a tal da gratuidade é mais ou menos justa que o sistema atual, no qual o governo distribui bolsas por critérios de desempenho ou necessidade e concede empréstimos em condições mais favoráveis.
O primeiro ponto a salientar é que não existe universidade grátis. Ou a conta é paga pelo estudante e sua família, ou pela sociedade, por meio de impostos cobrados a todos.
A segunda hipótese tem a vantagem de assegurar que bons alunos não se verão excluídos pelo fato de serem eventualmente pobres.
A primeira é, em tese, menos regressiva, já que dispensa a população, inclusive os que têm menos recursos, de pagar por um curso que, no futuro, possibilitará ao estudante beneficiado auferir salários bem maiores do que os de pessoas que não frequentaram a universidade.
A escolha se daria então entre favorecer a mobilidade social e promover justiça tributária. Mas há um complicador adicional. O advento do que os demógrafos chamam de casamento assortativo (no qual as partes se escolhem livremente) pode estar criando um novo estamento social. Ao menos nos EUA, economistas já apontam o fato de universitários tenderem a casar-se entre si como uma fonte de desigualdade. Seus filhos, por uma combinação de razões econômicas, biológicas e culturais, terão mais chance de chegar à universidade, assegurar renda e unir-se a outra pessoa nas mesmas condições.
Se esse fenômeno é real, o papel da faculdade como mola de ascensão social pode estar se reduzindo, o que faria da gratuidade um subsídio que os mais pobres oferecem aos mais ricos. Ironias da história.
Queda de braço - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 11/12
Em qualquer lugar do mundo, com exceção do Brasil e de alguns outros países com precário desenvolvimento institucional, o Orçamento tem que ser cumprido. Aqui, ele é quase uma ficção, chamado de "autorizativo", isto é, o Executivo tem o poder de não pagar certas despesas, fazendo o contingenciamento do montante necessário ao cumprimento das metas fiscais. E os legisladores supervalorizam as receitas para aumentar os gastos das "emendas parlamentares".
O que historicamente foi a origem do Parla-mento, a necessidade de estabelecer parâmetros para o financiamento das obras públicas e as prioridades de um governo, passou a ser um detalhe da atividade parlamentar. O orçamento impositivo, que o presidente da Câmara, Henrique Alves, pretende aprovar, é a mais nova dor de cabeça para o Palácio do Planalto, provocando uma queda de braço que impede a aprovação do Orçamento.
A presidente Dilma parece disposta a vetar o orçamento impositivo e, mais que isso, cortar a verba para as emendas parlamentares do próximo ano. Sendo 2014 o ano da eleição presidencial, esse curto-circuito entre Executivo e Legislativo, comanda-do pelo PMDB, tem alto teor de periculosidade para o Palácio do Planalto.
Há quem considere que a aprovação do orçamento impositivo pode trazer um benefício: acabar com o "é dando que se recebe" com relação às emendas parlamentares, provocando uma redefinição de forças no Congresso, porque parlamentares deixariam de se alinhar automaticamente com o governo só para liberar suas emendas.
Porém, o "orçamento impositivo" só trata de par-te ínfima do Orçamento, a das emendas parlamentares, e essas é que se tornariam impositivas. Seus críticos veem nesse privilégio das emendas parlamentares um perigo adicional: elas se transformariam em verdadeiras moedas de troca, com o malefício se espalhando pelas casas legislativas do país. O mandato seria, então, a garantia de ter uma verba de milhões para negociar.
Toda vez que existe uma votação importante no Congresso, há também uma corrida de deputados e senadores ao Palácio do Planalto em busca da liberação de verbas contingenciadas do Orçamento federal. Esse processo de contingenciamento de verbas para emendas parlamentares foi aperfeiçoado no governo Fernando Henrique, tornando-se o principal instrumento de controle das votações no Congresso, transformando-se num mecanismo de disciplina de voto.
Deputados experientes no Congresso consideram, porém, que o Legislativo se tornou no decorrer desse processo um departamento do Poder Executivo.
Essa situação de submissão seria atenuada se os partidos se guiassem por pro-gramas para participarem do governo, mas, no sistema atual, um partido recebe um ministério sem mesmo saber qual é o programa que vai conduzir.
Ao contrário dos países mais desenvolvidos, onde 70% do trabalho do Legislativo são definição do Orçamento, entre nós quem o define é o Executivo, e, se um parlamentar quiser alguma mudança, tem que negociar com o Executivo. Não foi sempre assim.
Na Constituição de 1946, os parlamentares podiam emendar o Orçamento inteiro, como nos Estados Unidos se emenda. A partir da ditadura militar, o Orçamento passou a ser tratado como um decreto-lei. O Congresso só podia aprová-lo ou rejeitá-lo, não podia emendá-lo. E os deputados e senadores tinham uma cota para dar verbas a entidades assistenciais.
A Constituição de 1988 retomou o espírito da de 1946, com a capacidade de emenda do Congresso. Mas, no governo Collor, surgem os "anões do Orçamento", com o ex-deputado João Alves - que "ganhou" várias vezes na loteria - de relator, manipulando o Orçamento a favor de um pequeno grupo, em todos os sentidos. O Executivo voltou então a centralizar as decisões sobre o Orçamento.
Essa disputa entre Executivo e Legislativo provavelmente não dará em nada, ainda mais nas proximidades da eleição. Mas indica uma relação conflituosa que só fará aumentar, caso a presidente Dilma se reeleja.
O que historicamente foi a origem do Parla-mento, a necessidade de estabelecer parâmetros para o financiamento das obras públicas e as prioridades de um governo, passou a ser um detalhe da atividade parlamentar. O orçamento impositivo, que o presidente da Câmara, Henrique Alves, pretende aprovar, é a mais nova dor de cabeça para o Palácio do Planalto, provocando uma queda de braço que impede a aprovação do Orçamento.
A presidente Dilma parece disposta a vetar o orçamento impositivo e, mais que isso, cortar a verba para as emendas parlamentares do próximo ano. Sendo 2014 o ano da eleição presidencial, esse curto-circuito entre Executivo e Legislativo, comanda-do pelo PMDB, tem alto teor de periculosidade para o Palácio do Planalto.
Há quem considere que a aprovação do orçamento impositivo pode trazer um benefício: acabar com o "é dando que se recebe" com relação às emendas parlamentares, provocando uma redefinição de forças no Congresso, porque parlamentares deixariam de se alinhar automaticamente com o governo só para liberar suas emendas.
Porém, o "orçamento impositivo" só trata de par-te ínfima do Orçamento, a das emendas parlamentares, e essas é que se tornariam impositivas. Seus críticos veem nesse privilégio das emendas parlamentares um perigo adicional: elas se transformariam em verdadeiras moedas de troca, com o malefício se espalhando pelas casas legislativas do país. O mandato seria, então, a garantia de ter uma verba de milhões para negociar.
Toda vez que existe uma votação importante no Congresso, há também uma corrida de deputados e senadores ao Palácio do Planalto em busca da liberação de verbas contingenciadas do Orçamento federal. Esse processo de contingenciamento de verbas para emendas parlamentares foi aperfeiçoado no governo Fernando Henrique, tornando-se o principal instrumento de controle das votações no Congresso, transformando-se num mecanismo de disciplina de voto.
Deputados experientes no Congresso consideram, porém, que o Legislativo se tornou no decorrer desse processo um departamento do Poder Executivo.
Essa situação de submissão seria atenuada se os partidos se guiassem por pro-gramas para participarem do governo, mas, no sistema atual, um partido recebe um ministério sem mesmo saber qual é o programa que vai conduzir.
Ao contrário dos países mais desenvolvidos, onde 70% do trabalho do Legislativo são definição do Orçamento, entre nós quem o define é o Executivo, e, se um parlamentar quiser alguma mudança, tem que negociar com o Executivo. Não foi sempre assim.
Na Constituição de 1946, os parlamentares podiam emendar o Orçamento inteiro, como nos Estados Unidos se emenda. A partir da ditadura militar, o Orçamento passou a ser tratado como um decreto-lei. O Congresso só podia aprová-lo ou rejeitá-lo, não podia emendá-lo. E os deputados e senadores tinham uma cota para dar verbas a entidades assistenciais.
A Constituição de 1988 retomou o espírito da de 1946, com a capacidade de emenda do Congresso. Mas, no governo Collor, surgem os "anões do Orçamento", com o ex-deputado João Alves - que "ganhou" várias vezes na loteria - de relator, manipulando o Orçamento a favor de um pequeno grupo, em todos os sentidos. O Executivo voltou então a centralizar as decisões sobre o Orçamento.
Essa disputa entre Executivo e Legislativo provavelmente não dará em nada, ainda mais nas proximidades da eleição. Mas indica uma relação conflituosa que só fará aumentar, caso a presidente Dilma se reeleja.
Um banho de Brasil para a Fifa - ELIO GASPARI
FOLHA DE SP - 11/12
Com caviar, batedores e descortesias, o doutor Joseph Blatter constrói uma encrenca para a Copa
Joseph Blatter, presidente da Fifa, pensa que é um chefe de Estado e leva uma vida de magnata. Viaja no avião da entidade, é recebido por presidentes de agenda porosa, atravessa algumas cidades precedido por batedores e durante os jogos de futebol fica em camarotes de VIPs onde garçons servem champanhe e caviar. (Na abertura da Copa da Confederações, felizmente, a doutora Dilma reclamou do mimo.)
A Fifa não é um Estado, e se fosse, com sua crônica de propinas, estaria entre as cleptocracias da segunda divisão. Para os brasileiros, há a lembrança do ocaso de João Havelange, que dirigiu a instituição de 1974 a 1998, quando tornou-se seu presidente honorário. Renunciou em abril, na esteira de um escândalo. A Fifa é uma organização de cartolas e a Copa do Mundo tornou-se um empreendimento que move bilhões de dólares. Durante as manifestações de junho a imprensa internacional lembrou o fato de que a competição será realizada num país onde multidões protestavam contra o preço das tarifas de transportes públicos enquanto a entidade anunciava que entre os patrocinadores do evento estará a champagne Taittinger (US$ 100 a garrafa).
A Fifa mudou o horário de sete jogos da Copa, atendendo a pedidos dos patrocinadores e das emissoras, interessadas em transmitir os jogos ao vivo. Jogo jogado, pois essa possibilidade estava prevista. As pessoas que compraram ingressos para os velhos horários e por algum motivo quiserem desistir perderão pelo menos 10% do valor pago. Ou seja, o sujeito marcou uma consulta no dentista, pagou adiantado, o doutor mudou o horário, e ele perderá 10% do preço da visita se quiser cancelá-la. Pouco custaria à Fifa livrar a clientela dessa tunga, até porque serão poucas as desistências.
Quando a burocracia dos cartolas baixa no Brasil com tamanha desconsideração, cria antipatias desnecessárias. Blatter vende ingressos para uma população que o vê passando na rua com batedores (no Rio já chegaram a fechar as transversais da avenida Atlântica para que ele tivesse pista livre). Os ingressos para os jogos terão preços salgados, as companhias aéreas e os hotéis estão de olho no bolso da galera. Além disso, o evento colocará nas ruas milhares de policiais com o treinamento e os modos que mostraram em junho.
Esses problemas são parte da vida nacional, não é preciso agravá-los. Blatter deveria vir ao Brasil por três dias, para viver como uma pessoa comum. Descobriria que o amigo que o hospeda no Rio ou em São Paulo paga mais IPTU do que ele na Suíça. Descobriria também que enquanto paga o equivalente a R$ 100 por ano para andar quantas vezes quiser em todas as autoestradas do seu país, aqui pagará R$ 40 por um só percurso do Rio a São Paulo, com direito a engarrafamento. Quando um brasileiro desce no aeroporto, rala na alfândega. Ele, não. Sendo suíço, verá que Pindorama é o único país do mundo onde a fila dos nativos para o exame de passaportes é maior que a dos estrangeiros.
Quando um pedaço do Itaquerão desabou, Blatter pediu a "Deus e Alá" que garantam a entrega das arenas a tempo. Se os brasileiros se aborrecerem durante a Copa, o doutor não deverá invocar seus nomes em vão.
Com caviar, batedores e descortesias, o doutor Joseph Blatter constrói uma encrenca para a Copa
Joseph Blatter, presidente da Fifa, pensa que é um chefe de Estado e leva uma vida de magnata. Viaja no avião da entidade, é recebido por presidentes de agenda porosa, atravessa algumas cidades precedido por batedores e durante os jogos de futebol fica em camarotes de VIPs onde garçons servem champanhe e caviar. (Na abertura da Copa da Confederações, felizmente, a doutora Dilma reclamou do mimo.)
A Fifa não é um Estado, e se fosse, com sua crônica de propinas, estaria entre as cleptocracias da segunda divisão. Para os brasileiros, há a lembrança do ocaso de João Havelange, que dirigiu a instituição de 1974 a 1998, quando tornou-se seu presidente honorário. Renunciou em abril, na esteira de um escândalo. A Fifa é uma organização de cartolas e a Copa do Mundo tornou-se um empreendimento que move bilhões de dólares. Durante as manifestações de junho a imprensa internacional lembrou o fato de que a competição será realizada num país onde multidões protestavam contra o preço das tarifas de transportes públicos enquanto a entidade anunciava que entre os patrocinadores do evento estará a champagne Taittinger (US$ 100 a garrafa).
A Fifa mudou o horário de sete jogos da Copa, atendendo a pedidos dos patrocinadores e das emissoras, interessadas em transmitir os jogos ao vivo. Jogo jogado, pois essa possibilidade estava prevista. As pessoas que compraram ingressos para os velhos horários e por algum motivo quiserem desistir perderão pelo menos 10% do valor pago. Ou seja, o sujeito marcou uma consulta no dentista, pagou adiantado, o doutor mudou o horário, e ele perderá 10% do preço da visita se quiser cancelá-la. Pouco custaria à Fifa livrar a clientela dessa tunga, até porque serão poucas as desistências.
Quando a burocracia dos cartolas baixa no Brasil com tamanha desconsideração, cria antipatias desnecessárias. Blatter vende ingressos para uma população que o vê passando na rua com batedores (no Rio já chegaram a fechar as transversais da avenida Atlântica para que ele tivesse pista livre). Os ingressos para os jogos terão preços salgados, as companhias aéreas e os hotéis estão de olho no bolso da galera. Além disso, o evento colocará nas ruas milhares de policiais com o treinamento e os modos que mostraram em junho.
Esses problemas são parte da vida nacional, não é preciso agravá-los. Blatter deveria vir ao Brasil por três dias, para viver como uma pessoa comum. Descobriria que o amigo que o hospeda no Rio ou em São Paulo paga mais IPTU do que ele na Suíça. Descobriria também que enquanto paga o equivalente a R$ 100 por ano para andar quantas vezes quiser em todas as autoestradas do seu país, aqui pagará R$ 40 por um só percurso do Rio a São Paulo, com direito a engarrafamento. Quando um brasileiro desce no aeroporto, rala na alfândega. Ele, não. Sendo suíço, verá que Pindorama é o único país do mundo onde a fila dos nativos para o exame de passaportes é maior que a dos estrangeiros.
Quando um pedaço do Itaquerão desabou, Blatter pediu a "Deus e Alá" que garantam a entrega das arenas a tempo. Se os brasileiros se aborrecerem durante a Copa, o doutor não deverá invocar seus nomes em vão.
A verdadeira causa da crise de municípios - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 11/12
Prefeitos fazem bem ao cortar gastos, inclusive de pessoal, para se enquadrar na Lei Fiscal. Mas, na verdade, muitas prefeituras foram criadas sem qualquer viabilidade
Na federação brasileira reconfigurada pela redemocratização, a partir da Constituição de 1988, caberia ao município um papel-chave na descentralização da prestação dos serviços públicos. A União, tornada pela ditadura centro único de poder e, por decorrência, polo aglutinador da arrecadação tributária, repassaria funções e garantiria os recursos necessários para estados e municípios se desincumbirem delas.
Não foi o que aconteceu. O Executivo federal transferiu a prestação de serviços, mas, por meio do artifício das contribuições — as quais o Planalto não precisa compartilhar com o resto da federação —, recompôs com sobras suas finanças, sem distribuir na federação a arrecadação feita alegadamente para financiar Saúde, Educação, gastos sociais, enfim. Foi assim com a CPMF, extinta, e continua sendo com o Finsocial etc.
Prefeitos sempre formaram grande bancada ávida por dinheiro do Tesouro. Agora, reclamam que perdem com a política de desonerações de impostos federais (IPI) executada nos últimos tempos pela União. Como os fundos de participação captam menos, em função do corte de alíquotas do IPI, cai o fluxo desse dinheiro “carimbado” que sustenta a grande maioria das prefeituras. Esta é a grande distorção. Muitos prefeitos, noticiou ontem O GLOBO, têm feito cortes de gastos, inclusive de pessoal (servidores sem estabilidade), para se manter dentro dos parâmetros da Lei de Responsabilidade Fiscal. Agem com acerto.
Mas erra quem procura responsabilizar a União por todas as agruras municipais. Na verdade, há muitos municípios que, por não terem viabilidade fiscal — não arrecadam sequer o mínimo para bancar o custo da máquina administrativa —, dependem apenas desta “mesada” do fundo de participações, dinheiro federal e estadual. Algo como uma “Bolsa Município”.
A proliferação de novos municípios pós-Carta de 88, quando caciques regionais aproveitaram uma legislação frouxa e espalharam prefeituras pelo país para atender a projetos clientelistas e patrimonialistas, foi contida na década de 90; porém chegaram a ser fundadas mais de mil prefeituras.
Há pouco, a presidente Dilma teve a clarividência de vetar projeto de lei do Senado que restaurava em parte a facilidade na fundação de municípios. Em ano eleitoral, uma farra. O movimento pela mudança estimava a possibilidade de 188 prefeituras adicionais — a se somar às 5.570 atuais.
Mas nota técnica do Ipea, de Adolfo Sachsida, Leonardo Monasterio e Isaac Lima, conclui, com base numa amostra de estados, que poderiam ser emancipados não 188, mas no mínimo 363 municípios, quase o dobro do estimado. Resumo: mais prefeituras sem viabilidade fiscal, a viver dos repasses federais e estaduais. Além do problema de se constituírem em sério obstáculo a uma verdadeira reforma tributária que possa reduzir a pesada carga geral de impostos.
Prefeitos fazem bem ao cortar gastos, inclusive de pessoal, para se enquadrar na Lei Fiscal. Mas, na verdade, muitas prefeituras foram criadas sem qualquer viabilidade
Na federação brasileira reconfigurada pela redemocratização, a partir da Constituição de 1988, caberia ao município um papel-chave na descentralização da prestação dos serviços públicos. A União, tornada pela ditadura centro único de poder e, por decorrência, polo aglutinador da arrecadação tributária, repassaria funções e garantiria os recursos necessários para estados e municípios se desincumbirem delas.
Não foi o que aconteceu. O Executivo federal transferiu a prestação de serviços, mas, por meio do artifício das contribuições — as quais o Planalto não precisa compartilhar com o resto da federação —, recompôs com sobras suas finanças, sem distribuir na federação a arrecadação feita alegadamente para financiar Saúde, Educação, gastos sociais, enfim. Foi assim com a CPMF, extinta, e continua sendo com o Finsocial etc.
Prefeitos sempre formaram grande bancada ávida por dinheiro do Tesouro. Agora, reclamam que perdem com a política de desonerações de impostos federais (IPI) executada nos últimos tempos pela União. Como os fundos de participação captam menos, em função do corte de alíquotas do IPI, cai o fluxo desse dinheiro “carimbado” que sustenta a grande maioria das prefeituras. Esta é a grande distorção. Muitos prefeitos, noticiou ontem O GLOBO, têm feito cortes de gastos, inclusive de pessoal (servidores sem estabilidade), para se manter dentro dos parâmetros da Lei de Responsabilidade Fiscal. Agem com acerto.
Mas erra quem procura responsabilizar a União por todas as agruras municipais. Na verdade, há muitos municípios que, por não terem viabilidade fiscal — não arrecadam sequer o mínimo para bancar o custo da máquina administrativa —, dependem apenas desta “mesada” do fundo de participações, dinheiro federal e estadual. Algo como uma “Bolsa Município”.
A proliferação de novos municípios pós-Carta de 88, quando caciques regionais aproveitaram uma legislação frouxa e espalharam prefeituras pelo país para atender a projetos clientelistas e patrimonialistas, foi contida na década de 90; porém chegaram a ser fundadas mais de mil prefeituras.
Há pouco, a presidente Dilma teve a clarividência de vetar projeto de lei do Senado que restaurava em parte a facilidade na fundação de municípios. Em ano eleitoral, uma farra. O movimento pela mudança estimava a possibilidade de 188 prefeituras adicionais — a se somar às 5.570 atuais.
Mas nota técnica do Ipea, de Adolfo Sachsida, Leonardo Monasterio e Isaac Lima, conclui, com base numa amostra de estados, que poderiam ser emancipados não 188, mas no mínimo 363 municípios, quase o dobro do estimado. Resumo: mais prefeituras sem viabilidade fiscal, a viver dos repasses federais e estaduais. Além do problema de se constituírem em sério obstáculo a uma verdadeira reforma tributária que possa reduzir a pesada carga geral de impostos.
O papel do BNDES - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 11/12
O Brasil precisará investir muito mais nos próximos anos, para elevar seu potencial de crescimento, mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, defende a redução dos financiamentos concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), principal fornecedor de crédito de longo prazo. O ministro falou em corte de até 20% no valor das operações, no próximo ano. Sem detalhar números, o presidente da instituição, Luciano Coutinho, prometeu para breve o anúncio de uma "nova política operacional". Essa nova política buscará, "de forma cautelosa", mudar a composição e o custo dos empréstimos. A ideia, segundo explicou, é combinar um volume menor de dinheiro a juros mais favoráveis (TJLP) com recursos de mercado. Será possível conciliar os dois objetivos - limitar a atuação do BNDES e estimular o investimento na capacidade produtiva?
Governo e setor privado têm investido em máquinas, equipamentos, infraestrutura e obras civis um volume de recursos na faixa de 18% a 19% do Produto Interno Bruto (PIB). É preciso, segundo estimativa corrente em Brasília e nos mercados, elevar essa proporção para 24%, para garantir um crescimento econômico mais próximo de 5% ao ano. Mesmo essa taxa seria modesta, pelos padrões internacionais, mas o País só deverá alcançá-la, segundo o ministro da Fazenda, em cerca de 10 anos.
A importância do assunto é enorme, mas a discussão, tudo indica, vai por um caminho pouco produtivo. O ministro da Fazenda está obviamente preocupado com as contas públicas. O Tesouro deve reforçar o BNDES com mais R$ 24 bilhões neste fim de ano. Já havia contribuído com cerca de R$ 300 bilhões desde 2009. Desse total, R$ 15 bilhões, liberados neste ano, foram para aumento de capital. O resto foi empréstimo a custo subsidiado.
Essa ajuda tem representado um peso enorme para o Tesouro, mas esse detalhe contábil, embora muito importante, é somente parte do problema. Falta examinar com realismo outro aspecto dessas operações: o dinheiro foi aplicado da melhor forma? As grandes empresas beneficiadas, a começar pela Petrobrás, poderiam ter levantado recursos de outra forma? Os critérios de seleção de clientes foram sempre defensáveis?
Empresas grandes levaram 62% dos R$ 194,45 bilhões de empréstimos concedidos nos 12 meses até outubro. Médias grandes ficaram com 5%. Sobraram 35% para micro, pequenas e médias companhias, embora os financiamentos desembolsados para esse grupo correspondessem a 97% das operações.
O assunto fica um pouco mais claro quando se examinam as atividades financiadas. Em 12 meses, a maior fatia dos empréstimos, de 33%, foi para projetos de infraestrutura. Isso parece muito bom, porque esses investimentos devem contribuir para a redução de um dos maiores entraves ao crescimento econômico. Mas será razoável o BNDES entrar com a maior parte do capital necessário a esses empreendimentos?
Houve recursos de sobra no mercado internacional, nos últimos anos, mas os grandes projetos brasileiros parecem ter sido pouco atraentes. Teria o governo cometido algum erro na formulação e na oferta dos projetos? Sem dúvida, e isso foi reconhecido, pelo menos em parte, com a reformulação dos critérios de concessões.
Além disso - apenas para continuar no capítulo do favorecimento às maiores companhias -, o banco se notabilizou, nos últimos anos, pela política de escolha de campeãs nacionais. Algumas dessas empresas, favorecidas tanto por empréstimos quanto por investimentos do BNDESPar, se tornaram insolventes em pouco tempo. Mesmo sem esse tropeço, seria muito difícil encontrar algum valor estratégico nos critérios adotados pelos dirigentes do BNDES e apoiados pela presidente Dilma Rousseff e seus ministros.
É preciso, sim, reexaminar a participação do Tesouro nos créditos do BNDES e a política de subsídios. Mas é indispensável, antes de mais nada, repensar a estratégia de crescimento, o papel do banco estatal e as formas de atração de capital privado para os grandes projetos. Bom senso e credibilidade podem ser grandes chamarizes.
O Brasil precisará investir muito mais nos próximos anos, para elevar seu potencial de crescimento, mas o ministro da Fazenda, Guido Mantega, defende a redução dos financiamentos concedidos pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), principal fornecedor de crédito de longo prazo. O ministro falou em corte de até 20% no valor das operações, no próximo ano. Sem detalhar números, o presidente da instituição, Luciano Coutinho, prometeu para breve o anúncio de uma "nova política operacional". Essa nova política buscará, "de forma cautelosa", mudar a composição e o custo dos empréstimos. A ideia, segundo explicou, é combinar um volume menor de dinheiro a juros mais favoráveis (TJLP) com recursos de mercado. Será possível conciliar os dois objetivos - limitar a atuação do BNDES e estimular o investimento na capacidade produtiva?
Governo e setor privado têm investido em máquinas, equipamentos, infraestrutura e obras civis um volume de recursos na faixa de 18% a 19% do Produto Interno Bruto (PIB). É preciso, segundo estimativa corrente em Brasília e nos mercados, elevar essa proporção para 24%, para garantir um crescimento econômico mais próximo de 5% ao ano. Mesmo essa taxa seria modesta, pelos padrões internacionais, mas o País só deverá alcançá-la, segundo o ministro da Fazenda, em cerca de 10 anos.
A importância do assunto é enorme, mas a discussão, tudo indica, vai por um caminho pouco produtivo. O ministro da Fazenda está obviamente preocupado com as contas públicas. O Tesouro deve reforçar o BNDES com mais R$ 24 bilhões neste fim de ano. Já havia contribuído com cerca de R$ 300 bilhões desde 2009. Desse total, R$ 15 bilhões, liberados neste ano, foram para aumento de capital. O resto foi empréstimo a custo subsidiado.
Essa ajuda tem representado um peso enorme para o Tesouro, mas esse detalhe contábil, embora muito importante, é somente parte do problema. Falta examinar com realismo outro aspecto dessas operações: o dinheiro foi aplicado da melhor forma? As grandes empresas beneficiadas, a começar pela Petrobrás, poderiam ter levantado recursos de outra forma? Os critérios de seleção de clientes foram sempre defensáveis?
Empresas grandes levaram 62% dos R$ 194,45 bilhões de empréstimos concedidos nos 12 meses até outubro. Médias grandes ficaram com 5%. Sobraram 35% para micro, pequenas e médias companhias, embora os financiamentos desembolsados para esse grupo correspondessem a 97% das operações.
O assunto fica um pouco mais claro quando se examinam as atividades financiadas. Em 12 meses, a maior fatia dos empréstimos, de 33%, foi para projetos de infraestrutura. Isso parece muito bom, porque esses investimentos devem contribuir para a redução de um dos maiores entraves ao crescimento econômico. Mas será razoável o BNDES entrar com a maior parte do capital necessário a esses empreendimentos?
Houve recursos de sobra no mercado internacional, nos últimos anos, mas os grandes projetos brasileiros parecem ter sido pouco atraentes. Teria o governo cometido algum erro na formulação e na oferta dos projetos? Sem dúvida, e isso foi reconhecido, pelo menos em parte, com a reformulação dos critérios de concessões.
Além disso - apenas para continuar no capítulo do favorecimento às maiores companhias -, o banco se notabilizou, nos últimos anos, pela política de escolha de campeãs nacionais. Algumas dessas empresas, favorecidas tanto por empréstimos quanto por investimentos do BNDESPar, se tornaram insolventes em pouco tempo. Mesmo sem esse tropeço, seria muito difícil encontrar algum valor estratégico nos critérios adotados pelos dirigentes do BNDES e apoiados pela presidente Dilma Rousseff e seus ministros.
É preciso, sim, reexaminar a participação do Tesouro nos créditos do BNDES e a política de subsídios. Mas é indispensável, antes de mais nada, repensar a estratégia de crescimento, o papel do banco estatal e as formas de atração de capital privado para os grandes projetos. Bom senso e credibilidade podem ser grandes chamarizes.
Doações às claras - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 11/12
Proibir a participação de empresas no financiamento de campanhas não aprimora o sistema, que demanda mais fiscalização e transparência
A ninguém ocorreria afirmar que doações eleitorais são presididas pelo mesmo princípio que governa ações altruístas; se nestas prepondera genuíno desprendimento, naquelas é o interesse --por vezes inconfessável-- que impera.
Não se ignora que muitos doadores apenas querem auxiliar o candidato que pensam ser o mais adequado para o cargo --hipótese em que o interesse é legítimo.
No mais das vezes, contudo, uma quantia de dinheiro é oferecida durante a campanha com base na expectativa de que o postulante, se eleito, haverá de retribuir o favor. Tal negociação espúria, por subverter os princípios da representação democrática, deve ser combatida --o que não é tarefa fácil, e os escândalos de caixa dois estão aí para demonstrá-lo.
Entende-se, pois, que exista certo consenso quanto à necessidade de alterar o financiamento eleitoral no Brasil. Muitas das tentativas de fazê-lo, no entanto, pecam por confundir as doações justificáveis com aquelas ilegítimas e, no intuito de aprimorar o sistema, não propõem mais que a supressão de prerrogativas razoáveis.
É o caso da ação direta de inconstitucionalidade que deve ser examinada hoje pelo Supremo Tribunal Federal --a Ordem dos Advogados do Brasil pede o fim das doações feitas por pessoas jurídicas.
Tal modalidade configuraria influência excessiva e deletéria do poder econômico na democracia. Por seu peso, atentaria contra o republicanismo e o princípio da igualdade. De resto, empresas não são cidadãs e não deveriam participar do processo eleitoral.
Logo se vê a confusão. Nada há de errado em tentar influenciar a política. O problema é fazê-lo às escondidas. Desde que o cidadão possa saber quais interesses financiam determinada candidatura e desde que possa verificar se o eleito pauta suas ações pelos recursos que recebeu, não cabe condenar, a priori, doações de empresas.
Verdade que, em termos monetários, a influência de pessoas jurídicas --e cidadãos abastados-- é muito maior que a dos demais. Resolver tal distorção é simples: basta fixar um limite, em reais, às doações --hoje, a lei estabelece um teto percentual em relação à renda ou ao faturamento. O financiamento eleitoral, mais difuso, seria também mais representativo.
O crucial, porém, é incrementar mecanismos de transparência e fiscalização. Doações ocultas --ao partido, e não ao candidato-- precisam ser proibidas. Além disso, a prestação de contas deveria ser feita em tempo real, na internet.
Uma lei anacrônica como a atual, que permite a apresentação de recibos à Justiça Eleitoral até 30 dias após o pleito, é útil apenas aos interesses escusos. Esse é o dispositivo que precisa mudar.
Proibir a participação de empresas no financiamento de campanhas não aprimora o sistema, que demanda mais fiscalização e transparência
A ninguém ocorreria afirmar que doações eleitorais são presididas pelo mesmo princípio que governa ações altruístas; se nestas prepondera genuíno desprendimento, naquelas é o interesse --por vezes inconfessável-- que impera.
Não se ignora que muitos doadores apenas querem auxiliar o candidato que pensam ser o mais adequado para o cargo --hipótese em que o interesse é legítimo.
No mais das vezes, contudo, uma quantia de dinheiro é oferecida durante a campanha com base na expectativa de que o postulante, se eleito, haverá de retribuir o favor. Tal negociação espúria, por subverter os princípios da representação democrática, deve ser combatida --o que não é tarefa fácil, e os escândalos de caixa dois estão aí para demonstrá-lo.
Entende-se, pois, que exista certo consenso quanto à necessidade de alterar o financiamento eleitoral no Brasil. Muitas das tentativas de fazê-lo, no entanto, pecam por confundir as doações justificáveis com aquelas ilegítimas e, no intuito de aprimorar o sistema, não propõem mais que a supressão de prerrogativas razoáveis.
É o caso da ação direta de inconstitucionalidade que deve ser examinada hoje pelo Supremo Tribunal Federal --a Ordem dos Advogados do Brasil pede o fim das doações feitas por pessoas jurídicas.
Tal modalidade configuraria influência excessiva e deletéria do poder econômico na democracia. Por seu peso, atentaria contra o republicanismo e o princípio da igualdade. De resto, empresas não são cidadãs e não deveriam participar do processo eleitoral.
Logo se vê a confusão. Nada há de errado em tentar influenciar a política. O problema é fazê-lo às escondidas. Desde que o cidadão possa saber quais interesses financiam determinada candidatura e desde que possa verificar se o eleito pauta suas ações pelos recursos que recebeu, não cabe condenar, a priori, doações de empresas.
Verdade que, em termos monetários, a influência de pessoas jurídicas --e cidadãos abastados-- é muito maior que a dos demais. Resolver tal distorção é simples: basta fixar um limite, em reais, às doações --hoje, a lei estabelece um teto percentual em relação à renda ou ao faturamento. O financiamento eleitoral, mais difuso, seria também mais representativo.
O crucial, porém, é incrementar mecanismos de transparência e fiscalização. Doações ocultas --ao partido, e não ao candidato-- precisam ser proibidas. Além disso, a prestação de contas deveria ser feita em tempo real, na internet.
Uma lei anacrônica como a atual, que permite a apresentação de recibos à Justiça Eleitoral até 30 dias após o pleito, é útil apenas aos interesses escusos. Esse é o dispositivo que precisa mudar.
Vitórias em Bali - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 11/12
Foi uma dupla vitória do brasileiro Roberto Azevêdo, há apenas três meses no difícil cargo de diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC). Tudo conspirava contra um pretendido acordo no encontro de representantes dos 159 países filiados, realizado em Bali, na Indonésia, na semana passada. Entre passos menos importantes rumo à facilitação do comércio internacional, estava a tentativa crucial de aprovar a retomada das negociações para a implantação dos princípios acordados em 2001 na histórica Rodada de Doha, no Catar.
Os países se comprometiam a cumprir uma agenda, sob a condução da OMC, de abertura de todos os mercados. Seria proibida a criação de novas barreiras ao comércio mundial e os governos trabalhariam para a derrubada de medidas protecionistas adotadas ao longo de décadas. Os principais problemas são criados pelos países mais desenvolvidos, na defesa de seus produtos agrícolas, enquanto as nações mais pobres ou em desenvolvimento procuram dificultar a entrada de produtos industrializados e a contratação de serviços.
Criada em 1995, para substituir o antigo e desgastado Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt, na sigla em inglês), à OMC caberia o papel de levar adiante a ideia do multilateralismo nas definições de regras para o comércio mundial. Todos os membros têm poder de veto, o que impediria a imposição dos interesses das economias mais poderosas. Até hoje, a OMC só pode aprovar regras gerais por unanimidade, o que permite soluções mais equilibradas, mas, obviamente, muito mais difíceis de serem aprovadas.
As coisas se complicaram a partir de 2008, com a crise financeira mundial, que recrudesceu o protecionismo. A Rodada de Doha foi simplesmente abandonada, o que relegou a OMC ao papel de mero ouvidor e juiz das queixas dos países prejudicados. Mas o esvaziamento da organização e do multilaterismo teve outras consequências negativas, especialmente para o Brasil. A maioria dos países passaram a negociar acordos bilaterais de comércio, enquanto o governo brasileiro vem insistindo há 12 anos em uma política comercial externa baseada no fortalecimento do Mercosul e da própria OMC.
O avanço dos acordos bilaterais e a prática do protecionismo nos últimos anos atuavam, portanto, contra os propósitos da OMC em Bali. Perseverante, Azevêdo confirmou a fama de hábil negociador ao contornar cada um dos obstáculos que ameaçavam a reunião e a sobrevivência da entidade. Foram os casos dos subsídios à produção de alimentos que a Índia fazia questão de manter e a inesperada exigência de Cuba de que se aprovasse o fim dos embargos dos EUA contra a economia da ilha.
Por fim, além de passos tímidos, como o compromisso de simplificação da documentação aduaneira, o que realmente conta é que todos concordaram na retomada das negociações em torno da Rodada de Doha. Ninguém deve esperar mudanças rápidas. Mas o caminho foi reaberto e o prestígio da OMC resgatado: vitórias de Azevêdo, que, mais do que aplaudidas, precisam ser preservadas.
Os países se comprometiam a cumprir uma agenda, sob a condução da OMC, de abertura de todos os mercados. Seria proibida a criação de novas barreiras ao comércio mundial e os governos trabalhariam para a derrubada de medidas protecionistas adotadas ao longo de décadas. Os principais problemas são criados pelos países mais desenvolvidos, na defesa de seus produtos agrícolas, enquanto as nações mais pobres ou em desenvolvimento procuram dificultar a entrada de produtos industrializados e a contratação de serviços.
Criada em 1995, para substituir o antigo e desgastado Acordo Geral de Tarifas e Comércio (Gatt, na sigla em inglês), à OMC caberia o papel de levar adiante a ideia do multilateralismo nas definições de regras para o comércio mundial. Todos os membros têm poder de veto, o que impediria a imposição dos interesses das economias mais poderosas. Até hoje, a OMC só pode aprovar regras gerais por unanimidade, o que permite soluções mais equilibradas, mas, obviamente, muito mais difíceis de serem aprovadas.
As coisas se complicaram a partir de 2008, com a crise financeira mundial, que recrudesceu o protecionismo. A Rodada de Doha foi simplesmente abandonada, o que relegou a OMC ao papel de mero ouvidor e juiz das queixas dos países prejudicados. Mas o esvaziamento da organização e do multilaterismo teve outras consequências negativas, especialmente para o Brasil. A maioria dos países passaram a negociar acordos bilaterais de comércio, enquanto o governo brasileiro vem insistindo há 12 anos em uma política comercial externa baseada no fortalecimento do Mercosul e da própria OMC.
O avanço dos acordos bilaterais e a prática do protecionismo nos últimos anos atuavam, portanto, contra os propósitos da OMC em Bali. Perseverante, Azevêdo confirmou a fama de hábil negociador ao contornar cada um dos obstáculos que ameaçavam a reunião e a sobrevivência da entidade. Foram os casos dos subsídios à produção de alimentos que a Índia fazia questão de manter e a inesperada exigência de Cuba de que se aprovasse o fim dos embargos dos EUA contra a economia da ilha.
Por fim, além de passos tímidos, como o compromisso de simplificação da documentação aduaneira, o que realmente conta é que todos concordaram na retomada das negociações em torno da Rodada de Doha. Ninguém deve esperar mudanças rápidas. Mas o caminho foi reaberto e o prestígio da OMC resgatado: vitórias de Azevêdo, que, mais do que aplaudidas, precisam ser preservadas.
Como melhorar o SUS - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 11/12
Mais do que o aumento das despesas, o que pode melhorar rapidamente a qualidade dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e expandi-los, tornando mais próxima a meta de universalização do atendimento, é o aumento da eficiência no uso dos recursos disponíveis. É claro que, quanto mais se investir em saúde pública, melhores e mais amplos serão os serviços prestados à população, mas, numa recente avaliação dos mais de 20 anos de funcionamento do SUS, o Banco Mundial apontou como um de seus desafios a melhora da qualidade de sua gestão.
Assinado por três especialistas em desenvolvimento humano que trabalham ou trabalharam no Brasil - Michele Gragnolati, Magnus Lindelow e Bernard Couttolenc -, o estudo do Banco Mundial aponta, entre as transformações mais destacadas ocorridas nos últimos anos no campo da saúde pública no País, o aumento da capacidade de atendimento do SUS, sobretudo com a expansão do número de instalações, que passou de cerca de 22 mil em 1981 para quase 75 mil em 2009.
As novas unidades destinaram-se ao atendimento do paciente ambulatorial, visto que o número de hospitais permaneceu praticamente inalterado nesse período (passou de 6.342 para 6.875) e o número de leitos hospitalares até diminuiu.
Esses números são consequência da ênfase dada ao atendimento básico, sobretudo por meio da Estratégia de Saúde Familiar, programa executado por uma equipe que cresceu de 4 mil funcionários, quando o SUS foi criado, para cerca de 32 mil, em 2010.
Outro resultado importante do SUS apontado no estudo do Banco Mundial é a redução das disparidades regionais no acesso aos serviços de saúde. Embora o número de hospitais praticamente não tenha variado, houve uma redistribuição geográfica deles, o que reduziu as diferenças da densidade de leitos (número de leitos comparado com a população) entre os Estados.
Também houve uma descentralização da responsabilidade pela prestação dos serviços, cabendo em grande parte aos municípios a gestão das unidades de atendimento ambulatorial. O número de leitos hospitalares de responsabilidade dos municípios também cresceu, de 11% do total em 1985 para cerca de 50% em 2009.
O estudo do Banco Mundial destaca também os resultados das parcerias entre o setor público e o setor privado, tanto na construção como na operação e gerenciamento de unidades públicas de saúde, citando especificamente a experiência do governo do Estado de São Paulo com a contratação de organizações sociais nessa área.
Quanto aos gastos, eles aumentaram 224% em termos reais entre 1980 e 2010 e 110% em termos per capita, mas as despesas públicas com saúde no Brasil ainda não chegam a 4% do PIB, bem menos do que os gastos médios dos países que fazem parte da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e também do que os de outros países de renda média.
Certamente haverá pressões crescentes por mais gastos públicos com saúde, na medida em que o crescimento econômico gerar mais demandas em termos de qualidade do atendimento e o envelhecimento da população impuser novas necessidades nessa área.
Mas, no momento, a falta de recursos não é o maior problema de saúde pública no Brasil, diz o Banco Mundial. Citando outras pesquisas, o estudo diz que os hospitais brasileiros operam com muito pouca eficiência. Com a mesma estrutura, eles poderiam produzir o triplo do que produzem. Muitos são subutilizados ou mal usados, há excesso de caros equipamentos de diagnóstico em algumas regiões. Em resumo, "problemas de acesso a diagnóstico e tratamento especializados têm mais a ver com a forma como o sistema está organizado do que com falta de recursos".
Melhores resultados poderiam ser obtidos com o dimensionamento dos hospitais de acordo com as necessidades, o aumento de sua eficiência tecnológica por meio da melhora de sua gestão, a redução do desperdício e a melhor alocação dos recursos financeiros, entre outras medidas.
Mais do que o aumento das despesas, o que pode melhorar rapidamente a qualidade dos serviços do Sistema Único de Saúde (SUS) e expandi-los, tornando mais próxima a meta de universalização do atendimento, é o aumento da eficiência no uso dos recursos disponíveis. É claro que, quanto mais se investir em saúde pública, melhores e mais amplos serão os serviços prestados à população, mas, numa recente avaliação dos mais de 20 anos de funcionamento do SUS, o Banco Mundial apontou como um de seus desafios a melhora da qualidade de sua gestão.
Assinado por três especialistas em desenvolvimento humano que trabalham ou trabalharam no Brasil - Michele Gragnolati, Magnus Lindelow e Bernard Couttolenc -, o estudo do Banco Mundial aponta, entre as transformações mais destacadas ocorridas nos últimos anos no campo da saúde pública no País, o aumento da capacidade de atendimento do SUS, sobretudo com a expansão do número de instalações, que passou de cerca de 22 mil em 1981 para quase 75 mil em 2009.
As novas unidades destinaram-se ao atendimento do paciente ambulatorial, visto que o número de hospitais permaneceu praticamente inalterado nesse período (passou de 6.342 para 6.875) e o número de leitos hospitalares até diminuiu.
Esses números são consequência da ênfase dada ao atendimento básico, sobretudo por meio da Estratégia de Saúde Familiar, programa executado por uma equipe que cresceu de 4 mil funcionários, quando o SUS foi criado, para cerca de 32 mil, em 2010.
Outro resultado importante do SUS apontado no estudo do Banco Mundial é a redução das disparidades regionais no acesso aos serviços de saúde. Embora o número de hospitais praticamente não tenha variado, houve uma redistribuição geográfica deles, o que reduziu as diferenças da densidade de leitos (número de leitos comparado com a população) entre os Estados.
Também houve uma descentralização da responsabilidade pela prestação dos serviços, cabendo em grande parte aos municípios a gestão das unidades de atendimento ambulatorial. O número de leitos hospitalares de responsabilidade dos municípios também cresceu, de 11% do total em 1985 para cerca de 50% em 2009.
O estudo do Banco Mundial destaca também os resultados das parcerias entre o setor público e o setor privado, tanto na construção como na operação e gerenciamento de unidades públicas de saúde, citando especificamente a experiência do governo do Estado de São Paulo com a contratação de organizações sociais nessa área.
Quanto aos gastos, eles aumentaram 224% em termos reais entre 1980 e 2010 e 110% em termos per capita, mas as despesas públicas com saúde no Brasil ainda não chegam a 4% do PIB, bem menos do que os gastos médios dos países que fazem parte da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e também do que os de outros países de renda média.
Certamente haverá pressões crescentes por mais gastos públicos com saúde, na medida em que o crescimento econômico gerar mais demandas em termos de qualidade do atendimento e o envelhecimento da população impuser novas necessidades nessa área.
Mas, no momento, a falta de recursos não é o maior problema de saúde pública no Brasil, diz o Banco Mundial. Citando outras pesquisas, o estudo diz que os hospitais brasileiros operam com muito pouca eficiência. Com a mesma estrutura, eles poderiam produzir o triplo do que produzem. Muitos são subutilizados ou mal usados, há excesso de caros equipamentos de diagnóstico em algumas regiões. Em resumo, "problemas de acesso a diagnóstico e tratamento especializados têm mais a ver com a forma como o sistema está organizado do que com falta de recursos".
Melhores resultados poderiam ser obtidos com o dimensionamento dos hospitais de acordo com as necessidades, o aumento de sua eficiência tecnológica por meio da melhora de sua gestão, a redução do desperdício e a melhor alocação dos recursos financeiros, entre outras medidas.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
“A CBF está indignada com os acontecimentos”
José Maria Marin, presidente da CBF, sobre o conflito de marginais em Joinville
DILMA LIDERA, MAS 57,18% AINDA NÃO TÊM CANDIDATO
Dilma Rousseff (PT) lidera as intenções de voto, mas um detalhe deixa a disputa em aberto: quando solicitados a dizer espontaneamente em quem pretende votar para presidente no próximo ano, 57,18% dos entrevistados afirmam que ainda não sabem. Sem contar outros 6,26% que responderam “ninguém”. O Instituto Paraná Pesquisas ouviu 2.250 eleitores, entre os dias 3 e 7 deste mês, em 158 municípios brasileiros.
JÁ FOI PIOR
A pesquisa apurou que o desinteresse do eleitorado em dezembro (57,18%) era maior em setembro: 62,88% não sabiam em quem votar.
ESPONTÂNEA
Dilma lidera na espontânea (16,35%), seguida de Lula (6,13%), Aécio (4,69%), Marina (3,86%), Eduardo (2,04%) e Serra (1,72%).
ESTIMULADA
Na estimulada, quando o entrevistado vê uma lista de nomes, Dilma tem 43,4%, Aécio 17,14%, Joaquim Barbosa 15,61% e Eduardo 6,93%.
FATOR JOAQUIM
O presidente do STF, Joaquim Barbosa, aparece com apenas 1,11% na pesquisa espontânea, mas sobe para o 3º lugar na estimulada.
PT COGITA TROCAR TEMER POR JOSUÉ NA VICE DE DILMA
A pretexto de aproximar Dilma do empresariado, o PT adotou a lógica do ex-presidente Lula, já revelada nesta coluna, de trocar o vice Michel Temer por Josué Gomes, filho do falecido José Alencar. A filiação de Josué ao PMDB-MG foi pilotada por Lula pessoalmente, insinuando sua candidatura ao governo de Minas, estado onde o empresário não vive e mal conhece. Mas o alvo real era mesmo a vaga de Temer.
TEM FUTURO
A cúpula do PMDB nem sequer admite a hipótese de Temer ceder a vice de Dilma, mas vê Josué como possível presidenciável para 2018.
FALTA PULSO FIRME
Voltaram a pipocar críticas a Michel Temer na Câmara: o PMDB não se conforma com o corte das emendas e o veto ao Orçamento Impositivo.
POUCOS DISSIDENTES
Apesar das insatisfações, o PMDB acredita que, com as negociações, só três estados votarão contra reedição da chapa Dilma-Temer.
SONO DOS JUSTOS
O embaixador Roberto Azevêdo, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, dormiu só 3 horas nos primeiros quatro dias da reunião em Bali, costurando o acordo que o faria entrar para a História. Com o término da reunião, no domingo, foi à forra: dormiu 19 horas seguidas.
ZERO EM GEOGRAFIA
Dilma viveu dois momentos “saia justa” na homenagem a Mandela em Johanesburgo: chamou sul-africanos de “sul-americanos”, lendo o texto, e usou uma écharpe preta sobre a roupa branca, a única na cerimônia.
EMBROMATION
O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) ainda não explicou por que em 2011 extinguiu a Câmara Técnica de Combate à Intolerância Esportiva. Enquanto funcionou (um ano), a Câmara fixou padrão de atitude das polícias, dentro e fora dos estádios, que evitou as brigas.
NEGOCIAÇÃO
Durante o jantar com Aécio Neves (MG), domingo (8), Eduardo Campos (PE) pediu apoio mútuo PSB-PSDB em Minas e Pernambuco. Campos teme perder o governo estadual, se houver segundo turno.
PARA BOM ENTENDEDOR...
Para quem já chamou Lula de “o cara”, apertar a mão do ditador Raúl Castro tem o mesmo sentido. Barack Obama criticou “os líderes que se dizem solidários à luta de Mandela, mas não toleram a dissidência”.
CONSUMIDOR LESADO
O dono de um carro Azera, da Hyundai, aguarda há 40 dias um para-choque traseiro e sensores de estacionamento, destruídos após batida. Conhecido advogado de Brasília, ele vai à Justiça contra o desrespeito.
NÃO DÁ IDEIA
O blog do Financial Times concluiu que Dilma foi mau negócio para o Brasil, depois de Lula, “um pragmático capitalista”. Desfia a sucessão de erros econômicos e estratégicos, causa dos protestos em junho.
XABU MISTERIOSO
Esquisita a parceria com a China: além de torrar R$ 160 milhões num foguete louvando feitos maoístas, o Brasil de nada sabe. Sob censura, a imprensa chinesa não tem sequer foto do fiasco da geringonça.
NOTÍCIA DO FIM DO MUNDO
Após a revelação de que Lula teria sido dedo-duro na ditadura, a Comissão da Verdade talvez apoie a exumação do ex-líder sindical.
PODER SEM PUDOR
QUEM CEDO MADRUGA
Coronel Floro Bartolomeu, braço direito (e político) do Padre Cícero, vivia dando conselhos a um afilhado muito preguiçoso:
- Menino, um homem dorme seis horas. A galinha, sete. O porco e outros bichos dormem de oito em diante...
Um dia, o filho do vizinho achou um pacote de dinheiro às cinco da manhã.
- Menino, está vendo? O Zeca só achou o dinheiro porque saiu às cinco.
- É, padrinho Floro, mas quem o perdeu saiu às quatro...
José Maria Marin, presidente da CBF, sobre o conflito de marginais em Joinville
DILMA LIDERA, MAS 57,18% AINDA NÃO TÊM CANDIDATO
Dilma Rousseff (PT) lidera as intenções de voto, mas um detalhe deixa a disputa em aberto: quando solicitados a dizer espontaneamente em quem pretende votar para presidente no próximo ano, 57,18% dos entrevistados afirmam que ainda não sabem. Sem contar outros 6,26% que responderam “ninguém”. O Instituto Paraná Pesquisas ouviu 2.250 eleitores, entre os dias 3 e 7 deste mês, em 158 municípios brasileiros.
JÁ FOI PIOR
A pesquisa apurou que o desinteresse do eleitorado em dezembro (57,18%) era maior em setembro: 62,88% não sabiam em quem votar.
ESPONTÂNEA
Dilma lidera na espontânea (16,35%), seguida de Lula (6,13%), Aécio (4,69%), Marina (3,86%), Eduardo (2,04%) e Serra (1,72%).
ESTIMULADA
Na estimulada, quando o entrevistado vê uma lista de nomes, Dilma tem 43,4%, Aécio 17,14%, Joaquim Barbosa 15,61% e Eduardo 6,93%.
FATOR JOAQUIM
O presidente do STF, Joaquim Barbosa, aparece com apenas 1,11% na pesquisa espontânea, mas sobe para o 3º lugar na estimulada.
PT COGITA TROCAR TEMER POR JOSUÉ NA VICE DE DILMA
A pretexto de aproximar Dilma do empresariado, o PT adotou a lógica do ex-presidente Lula, já revelada nesta coluna, de trocar o vice Michel Temer por Josué Gomes, filho do falecido José Alencar. A filiação de Josué ao PMDB-MG foi pilotada por Lula pessoalmente, insinuando sua candidatura ao governo de Minas, estado onde o empresário não vive e mal conhece. Mas o alvo real era mesmo a vaga de Temer.
TEM FUTURO
A cúpula do PMDB nem sequer admite a hipótese de Temer ceder a vice de Dilma, mas vê Josué como possível presidenciável para 2018.
FALTA PULSO FIRME
Voltaram a pipocar críticas a Michel Temer na Câmara: o PMDB não se conforma com o corte das emendas e o veto ao Orçamento Impositivo.
POUCOS DISSIDENTES
Apesar das insatisfações, o PMDB acredita que, com as negociações, só três estados votarão contra reedição da chapa Dilma-Temer.
SONO DOS JUSTOS
O embaixador Roberto Azevêdo, diretor-geral da Organização Mundial do Comércio, dormiu só 3 horas nos primeiros quatro dias da reunião em Bali, costurando o acordo que o faria entrar para a História. Com o término da reunião, no domingo, foi à forra: dormiu 19 horas seguidas.
ZERO EM GEOGRAFIA
Dilma viveu dois momentos “saia justa” na homenagem a Mandela em Johanesburgo: chamou sul-africanos de “sul-americanos”, lendo o texto, e usou uma écharpe preta sobre a roupa branca, a única na cerimônia.
EMBROMATION
O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) ainda não explicou por que em 2011 extinguiu a Câmara Técnica de Combate à Intolerância Esportiva. Enquanto funcionou (um ano), a Câmara fixou padrão de atitude das polícias, dentro e fora dos estádios, que evitou as brigas.
NEGOCIAÇÃO
Durante o jantar com Aécio Neves (MG), domingo (8), Eduardo Campos (PE) pediu apoio mútuo PSB-PSDB em Minas e Pernambuco. Campos teme perder o governo estadual, se houver segundo turno.
PARA BOM ENTENDEDOR...
Para quem já chamou Lula de “o cara”, apertar a mão do ditador Raúl Castro tem o mesmo sentido. Barack Obama criticou “os líderes que se dizem solidários à luta de Mandela, mas não toleram a dissidência”.
CONSUMIDOR LESADO
O dono de um carro Azera, da Hyundai, aguarda há 40 dias um para-choque traseiro e sensores de estacionamento, destruídos após batida. Conhecido advogado de Brasília, ele vai à Justiça contra o desrespeito.
NÃO DÁ IDEIA
O blog do Financial Times concluiu que Dilma foi mau negócio para o Brasil, depois de Lula, “um pragmático capitalista”. Desfia a sucessão de erros econômicos e estratégicos, causa dos protestos em junho.
XABU MISTERIOSO
Esquisita a parceria com a China: além de torrar R$ 160 milhões num foguete louvando feitos maoístas, o Brasil de nada sabe. Sob censura, a imprensa chinesa não tem sequer foto do fiasco da geringonça.
NOTÍCIA DO FIM DO MUNDO
Após a revelação de que Lula teria sido dedo-duro na ditadura, a Comissão da Verdade talvez apoie a exumação do ex-líder sindical.
PODER SEM PUDOR
QUEM CEDO MADRUGA
Coronel Floro Bartolomeu, braço direito (e político) do Padre Cícero, vivia dando conselhos a um afilhado muito preguiçoso:
- Menino, um homem dorme seis horas. A galinha, sete. O porco e outros bichos dormem de oito em diante...
Um dia, o filho do vizinho achou um pacote de dinheiro às cinco da manhã.
- Menino, está vendo? O Zeca só achou o dinheiro porque saiu às cinco.
- É, padrinho Floro, mas quem o perdeu saiu às quatro...
QUARTA NOS JORNAIS
- Globo: O funeral do conciliador: Sob inspiração de Mandela
- Folha: Delator depõe e liga dois secretários de Alckmin a propina
- Estadão: Justiça envia ao Supremo inquérito do cartel de trens
- Correio: Uma tragédia brasiliense em Orlando
- Zero Hora: Rodovias estaduais – O terceiro verão sem pardais
- Brasil Econômico: Tombini diz que não há subsídio na gasolina
- Estado de Minas: Guarda municipal se arma contra o crime
- Jornal do Commercio: Mandela reúne opostos
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