REINALDO AZEVEDO - REDE TV/UOL
“Ah, mas ele também faz acusações contra Lula...”, cujo governo, diz, institucionalizou a corrupção. Ora, isso nem tipo penal é. A acusação só serve para “lavar” o objetivo da operação: derrubar Temer.
A patética entrevista concedida por Joesley Batista à revista “Época” tem o seu grande momento, o seu ápice moral, aquele instante que restará para a história como o sumo e a síntese de uma era e de seus protagonistas. Quando os pósteros quiserem saber quem mesmo foi Rodrigo Janot, terão de consultar este trecho da entrevista. Bem, impressiona-me que gente que se queira séria a leve a sério. Vamos lá.
Eis aí. Michel Temer está na Presidência da República há pouco mais de um ano. Aécio passou os 13 anteriores na oposição, e Joesley, o nosso herói sem nenhum caráter, o nosso Macunaíma que tinha o BNDES de Lula como o seu muiraquitã, não tem dúvida: o número 1 é Temer, e o 2, Aécio. E a ele, ora vejam!, coube a dura missão de revelar isto à nação.
Na nota em que respondeu às delinquências morais do açougueiro de instituições, lembrou o Palácio do Planalto:
“Em 2005, o Grupo JBS obteve seu primeiro financiamento no BNDES. Dois anos depois, alcançou um faturamento de R$ 4 bilhões. Em 2016, o faturamento das empresas da família Batista chegou a R$ 183 bilhões. Relação construída com governos do passado, muito antes que o presidente Michel Temer chegasse ao Palácio do Planalto.”
Reportagem da Folha desta segunda demonstra que ele não sabe ao certo quando conheceu Michel Temer. Ora diz ter sido em 2010, ora em 2011. Sim, faz diferença; a diferença entre quem não é vice-presidente da República (2010) e quem é (2011).
Nos anos todos de relacionamento com Lula, Joesley nunca quis gravar nada. Teve essa ideia só agora, quando caiu nas malhas de Janot. Aí, meus caros, foi preciso delatar pesos-pesados. Aquele que confessou ser o maior criminoso do Brasil deixou-se tomar por impulsos patrióticos e tentou mandar para a fogueira os presidentes da República e do PSDB, principal adversário do PT.
“Ah, mas ele também faz acusações contra Lula…”, cujo governo, diz, institucionalizou a corrupção. Ora, isso nem tipo penal é. A acusação só serve para “lavar” o objetivo da operação: derrubar Temer.
Bem, eu não queria, nesse caso, estar e ter estado cem por cento certo. E estava, não é?
Joesley é a obra-prima de Janot!
Joesley é o seu anjo vingador!
Joesley veio para provar que, se todos são iguais, então Lula é melhor, como escrevi em dias longínquos em coluna na Folha.
Tenho, sim, certa compaixão por quem caiu na conversa de Janot e dos salvacionistas e agora se pega em meio a uma grande, literalmente, roubada.
Ah, quantos insultos não tive de ouvir e de ler de vigaristas!
Ah, quantas não foram as vezes em que uma simples restrição técnica, publicada aqui, era tratada por vagabundos e pistoleiros como uma conspiração.
A verdade está começando a vir à luz. E acreditem: está só no começo.
O tempo, este grande corretor de rumos, está se encarregando de evidenciar quem é quem e quem quer o quê nessa peleja.
O meu norte sempre foi, é e continuará a ser o Estado de Direito.
Nem sempre foi fácil. Mas me orgulho até da dor. Ela não me fez perder o juízo.
Ah, não custa registrar: um dia ficará claro que a mão que balançou o berço do herói delator Joesley Batista tem uma sigla: PT!
Sim, sempre soube que o tempo me daria razão. Porque, afinal, eu estava certo. A verdade está começando a aparecer até antes da hora esperada. Como sabemos, bêbado de tanto poder, Janot cometeu alguns erros. E alguns de seus baba-ovos também se revelam.
Janot vai para o trono ou não vai?
Por tudo o que vemos aí, já foi!
ESTADÃO - 19/06
O governo faria melhor se viesse a público com a mesma determinação de seus tinhosos adversários petistas
O PT mente com tamanha determinação e energia que, mesmo sendo o principal responsável pela crise econômica, política e moral que o País hoje enfrenta, consegue aparecer, pasme o leitor, como a vanguarda da luta contra um governo em cuja testa pregou o estigma de “corrupto” e “inimigo do trabalhador”. Se há algo que o governo de Michel Temer poderia aprender com os aguerridos petistas, é justamente o vigor com que eles se dedicam à tarefa de fazer prevalecer sua versão dos fatos, mesmo que esta, no caso petista, contrarie frontalmente a realidade. Tivesse metade dessa garra ao defender as reformas que encaminhou e ao denunciar o descalabro que herdou da trágica era lulopetista, certamente o presidente Temer estaria em melhor situação.
É certo que a mentira frequenta certos círculos políticos, mas, numa época em que, infelizmente, a verdade aparenta importar cada vez menos, o PT parece ter entendido muito bem o poder do discurso que seja apenas “lógico”, isto é, que faça “sentido”, embora não guarde relação nenhuma com a realidade. Se é de uma batalha que se trata, travada entre a realidade e a “pós-verdade” – termo que designa as circunstâncias em que as crenças pessoais são mais importantes do que os fatos objetivos –, o PT está claramente muito mais bem preparado para ela do que seus adversários.
Para um partido que foi dado como praticamente aniquilado depois do impeachment da presidente Dilma Rousseff e da grande derrota nas eleições municipais de 2016, o PT ainda consegue atrapalhar, e muito, o necessário debate nacional. Basta que seu chefão, Lula da Silva, empunhe um microfone para que os grandes dilemas e desafios nacionais se reduzam a um confronto pueril entre o bem – representado pelos petistas, naturalmente – e o mal, encarnado no “resto”, em especial nos “golpistas” alinhados a Temer, na mídia e nos empresários gananciosos.
É claro que, deflagrada nesses termos, tal batalha exige muito mais do lado de quem precisa governar, isto é, lidar com os fatos da vida real, do que daqueles que não têm nenhuma responsabilidade. Enquanto Lula da Silva grita por aí que “voltou a ter criança pedindo esmola” e que “nós sabemos como fazer a economia crescer, como criar emprego, como aumentar salário”, o presidente Temer e sua competente equipe econômica precisam articular politicamente apoio a medidas de austeridade que são, por sua própria natureza, impopulares. Não é difícil imaginar quem sairá mais lanhado desse embate.
Queixar-se de que Lula está a desferir golpes abaixo da linha da cintura e tentar desmentir cada uma de suas patranhas, como se a verdade pudesse dessa maneira prevalecer, é justamente o que o demiurgo petista pretende. Os petistas em geral, e Lula em particular, têm certeza de que uma parte do eleitorado prefere acreditar nas suas mentiras delirantes, pois elas são um confortável refúgio ante o desafio de reconstruir o País à custa do sacrifício de todos. É perda de tempo, portanto, chamar os petistas à responsabilidade, porque eles nunca se dispuseram a colaborar efetivamente para a melhora da vida nacional, dado que estão preocupados apenas com seu projeto de poder, que está na gênese de toda essa crise.
O governo Temer faria melhor se viesse a público com a mesma determinação de seus tinhosos adversários petistas e defendesse de forma mais enfática as reformas econômicas de que o País tanto necessita. Também faria melhor se demonstrasse, ao mesmo tempo, o mal que o PT causou ao Brasil. Em situações normais não é elegante que um governante fique a justificar suas dificuldades citando a “herança maldita” de seu antecessor, mas definitivamente não vivemos tempos normais.
Nada garante que essa estratégia assegurará um triunfo completo sobre as mentiras de Lula e sua turma, mas pelo menos arregimentará, para o governo, um apoio mais vibrante do Brasil decente, que sabe muito bem o que o PT fez ao País e o que é preciso fazer para sair da crise.
FOLHA DE SP - 19/06
SÃO PAULO - O Brasil, que há pouco tempo entrou para o clube da delação premiada, logo descobriu o potencial dessa ferramenta para enfrentar esquemas de corrupção inseridos no funcionamento do governo. Avoluma-se, contudo, a sensação de que estamos nos lambuzando com o melado recém-descoberto.
Quando não há limites para delatar, o conjunto de incentivos que deveria levar ao bem maior para a sociedade entra em parafuso. A teoria recomenda restringir os prêmios ao primeiro a entregar os comparsas. Exige que os relatos sejam sustentados por sólidas provas factuais.
A afoiteza de procuradores e a esperteza de criminosos confessos, entretanto, vão alargando as fronteiras do instituto no Brasil. É difícil encontrar caso no mundo em que se foi tão longe com delações premiadas.
Agora se aceita, sem tempo para análise detalhada, um vasto lote de doações registradas na Justiça Eleitoral como evidência de múltiplos atos de suborno. Ou se demonstra, uma a uma, qual foi a contrapartida ilícita desses repasses, ou essas provas vão morrer, e os procuradores terão comprado gato por lebre.
A lentidão judicial dificulta a avaliação em tempo hábil do que foi exposto pelos delatores. Eles desfrutam dos benefícios à vista, mas a ameaça de perda do bônus por terem mentido quase inexiste de tão distante.
O sistema de adesões sucessivas favorece relatos que confirmem as teorias acusatórias da Procuradoria e desincentiva os que as contradigam.
Está aberta a via para um ciclo de delações interminável –e potencialmente infernal, porque composto de informações de difícil verificação.
Se delinquir, procure botar a culpa em alguém próximo. Se ainda não há grandes banqueiros na história, encontre algum em suas relações. Se ainda não há juízes do Supremo, envolva um. E que tal enlaçar um procurador de seu círculo? A guilhotina, afinal, não serviu apenas aos jacobinos. Serviu-se deles também.