terça-feira, janeiro 18, 2011

BENJAMIN STEINBRUCH

Podia ser diferente
BENJAMIN STEINBRUCH
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

OS CULPADOS PELAS OCUPAÇÕES IRREGULARES NÃO SÃO OS OCUPANTES, E SIM A AUTORIDADE PÚBLICA

Passados mais de 40 anos, ainda estão em minha memória imagens que vi nos jornais e na televisão da tragédia do deslizamento de morros de Caraguatatuba, no litoral norte de São Paulo. Em 1967, morreram ali 436 pessoas, uma catástrofe para o país e um episódio aterrador para meus olhos de 14 anos.
Infelizmente, nesses anos todos que se passaram desde o deslizamento em Caraguatatuba, tragédias semelhantes se repetiram em vários pontos do país, culminando com a da semana passada na região serrana do Rio de Janeiro, com mais de 600 mortos até agora em quatro municípios.
A memória mais recente nos leva a Blumenau e outros municípios de Santa Catarina, em novembro de 2008; a Angra do Reis, no Réveillon de 2009/2010; a Pernambuco e Alagoas, em junho de 2010; ao Morro do Bumba, Niterói, em abril de 2010; ao Jardim Pantanal, bairro localizado na várzea do rio Tietê, em São Paulo, e a recorrentes enchentes nas marginais de São Paulo, as últimas há duas semanas, que já se tornaram um triste espetáculo para a mídia mundial pelos congestionamentos espetaculares que provocam.
Todos esses eventos terríveis deixaram milhares de desabrigados e centenas de mortos. Em todos ou quase todos há uma marca: o homem ocupando irregularmente espaço que deveria ser preservado para a natureza. Ou seja, pessoas morando em áreas de risco. Só na região metropolitana da Grande São Paulo estima-se que existam mais de 400 dessas áreas com moradias.
Os culpados pelas ocupações irregulares não são os ocupantes, e sim a autoridade pública que permite as construções.
Para administradores de cidades, é politicamente mais interessante -rende mais votos- incentivar obras irregulares, às vezes até fornecendo tijolos e cimento, do que impedi-las. Quando sobrevêm as catástrofes, em geral, os responsáveis pela negligência que levou à tragédia já estão fora da administração.
O país precisa, portanto, de um megaprograma nacional para estimular, ensinar e obrigar as autoridades municipais a cuidar desse problema.
Essa é a atitude que se espera para o futuro a partir de agora, além do uso de tecnologias para sistemas de alerta à população que, em muitas cidades, já estão até instalados, mas muitas vezes não são usados na forma desejada por desleixo ou falta de pessoal qualificado.
De outra parte, será preciso também corrigir erros do passado. Milhares e milhares de residências terão de ser interditadas e as pessoas removidas para habitações seguras.
Trata-se de uma tarefa extraordinariamente difícil, especialmente nas grandes metrópoles, porém necessária em praticamente todas as cidades do país, a cargo das administrações municipais, com apoio estadual e federal.
Perdas de pessoas provocam traumas familiares e não podem ser reparadas. Mas perdas materiais podem. A TV e os jornais mostraram, nos últimos dias, depoimentos dramáticos de pessoas que levaram até 40 anos construindo sua casa, agora aniquilada pela tromba d'água junto com móveis, eletrodomésticos e demais pertences da família.
O Brasil, pela sua performance macroeconômica, vai aos poucos adquirindo status de novo rico na esfera internacional. E, como membro aspirante a essa comunidade, também começa a receber duras cobranças.
Uma consultora da ONU, por exemplo, observou que o Brasil não pode alegar desconhecimento desse problema, que se torna cada vez mais frequente. Não pode ser surpreendido por chuvas que, a despeito de sua virulência tropical, são previsíveis. Lembrou, ainda, que o país tem dinheiro para fazer o que é preciso nessa área. É preciso admitir: a consultora tem razão.
Uma das imagens mais marcantes da tragédia da semana passada na região serrana do Rio saiu no caderno Cotidiano da Folha, mostrando um trator abrindo valas no cemitério municipal de Petrópolis. O país chora e enterra seus mortos. Dava para ser diferente. Desastres naturais e tempestades tropicais não podem ser evitados. Tragédias podem.
BENJAMIN STEINBRUCH, 57, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

VINICIUS TORRES FREIRE

Alerta de mortes estúpidas
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

Governo quer sistema de aviso de desastres naturais, mas precisa melhorar a prevenção dos sociais


O MASSACRE do Rio ao que parece vai induzir a criação de um "sistema nacional de prevenção e alerta" contra desastres naturais. Segundo o governo federal, deve levar uns quatro anos para ficar pronto. É um negócio mesmo complicado. Depende de satélites, supercomputadores, radares e outros equipamentos meteorológicos. Depende de mapear áreas de risco. Depende de haver gente treinada. Cientistas e outros.
Se a coisa passar da licitação mais ou menos corrupta de equipamentos, se os equipamentos forem postos em uso etc., o sistema apenas funcionará se houver um plano e meios logísticos de retirar as pessoas do alvo da fúria da natureza. Quer dizer, pessoal treinado para agir em pequenas prefeituras, meios de transporte, estradas, lugares de acolhida, comida e água para as pessoas deslocadas.
Uhm: estradas e transportes públicos? Temos plano para isso também?
Sim, é um avanço da civilização criar um sistema de evitar mortes estúpidas. Mas a descrição breve das condições de funcionamento do programa dá o que pensar, não apenas sobre o alerta de chuvas assassinas mas sobre os sistemas de prevenção de violências várias no Brasil.
Considere-se uma notícia de ontem desta Folha, um relato recorrente sobre mais suspeitas de desvios brutais de dinheiro da Funasa. Essa Fundação Nacional da Saúde é um órgão de "prevenção e alerta" contra desastres sanitários, como mortes devidas à saneamento primitivo, malária, dengue, mal de Chagas e outros assassinos primitivos.
Bem, para dar um exemplo curto e pop, no ano passado morreram mais de 500 pessoas de dengue. As mortes anuais devidas a picadas de bichos e saneamento medieval passam da casa dos dezenas de milhares. Não causam muita sensação. Mas o "sistema de prevenção de desastres" sanitários até existe, embora a prevenção verdadeira seria civilizar o país de fato, tirando as pessoas da vida em favelas (e similares) ultrajantes. Favela é parte da natureza brasileira, a gente aceita na boa. É mais natural que chuvas de verão.
Verdade que há progressos. Fazemos vacinação direito -logo, temos capacidade de sermos menos bárbaros. Mas, por falar em mortes em massa, passada década e pouco do novo código de trânsito, ainda é raro ver gente perder a carteira de motorista por excesso de selvageria no volante. Morrem umas três dezenas de milhares de pessoas no trânsito, por ano.
E o "sistema de prevenção" de mortes por tiro? A gente se acostumou a ver selvagens carregando fuzis e pistolões em bairros populares de Rio, São Paulo, Recife etc. Morte a bala é uma das piores endemias brasileiras. Onde está o sistema de prevenção dessa catástrofe que é o contrabando de armas? Alguém já ouviu falar da prisão de um grande contrabandista de armas?
Lembrar esses outros horrores não é, por favor, pouco-caso com as vítimas do massacre do Rio. Porém, o tamanho concentrado do desastre nas serras fluminenses suscita indignações igualmente concentradas no tempo, que duram enquanto não sobrevém o tédio da falta de "recordes de mortos" e de "novas histórias humanas". Mas o nosso modo de produção de mortes estúpidas está por toda a parte, o ano inteiro, matando ainda mais gente, de modo tão ou mais cruel.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

A guerra contra as drogas
Fernando Henrique Cardoso
VALOR ECONÔMICO - 18/01/11

A guerra contra as drogas é uma guerra perdida e 2011 é o momento para afastar-se da abordagem punitiva e buscar um novo conjunto de políticas baseado na saúde pública, direitos humanos e bom senso. Essas foram as principais conclusões da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia que organizei, ao lado dos ex-presidentes Ernesto Zedillo, do México, e César Gaviria, da Colômbia.

Envolvemos-nos no assunto por um motivo persuasivo: a violência e a corrupção associadas ao tráfico de drogas representam uma grande ameaça à democracia em nossa região. Esse senso de urgência nos levou a avaliar as atuais políticas e a procurar alternativas viáveis. A abordagem proibicionista, baseada na repressão da produção e criminalização do consumo, claramente, fracassou.

Após 30 anos de esforços maciços, tudo o que o proibicionismo alcançou foi transferir as áreas de cultivo e os cartéis de drogas de um país a outro (conhecido como efeito balão). A América Latina continua sendo a maior exportadora de cocaína e maconha. Milhares de jovens continuam a perder as vidas em guerras de gangues. Os barões das drogas dominam comunidades inteiras por meio do medo.

Concluímos nosso informe com a defesa de uma mudança de paradigma. O comércio ilícito de drogas continuará enquanto houver demanda por drogas. Em vez de aferrar-se a políticas fracassadas que não reduzem a lucratividade do comércio - e, portanto, seu poder - precisamos redirecionar nossos esforços à redução do consumo e contra o dano causado pelas drogas às pessoas e sociedade.

Ao longo da história, sempre existiu algum tipo de consumo de droga nas mais diversas culturas. Hoje, o uso de droga existe por toda a sociedade. Pessoas de todos os tipos usam drogas por motivos de todos os tipos: para aliviar dores ou experimentar prazer, para escapar da realidade ou para incrementar a percepção dela.

A abordagem recomendada no informe da comissão, no entanto, não significa complacência. As drogas são prejudiciais à saúde. Minam a capacidade dos usuários de tomar decisões. O compartilhamento de agulhas dissemina o HIV/Aids e outras doenças. O vício pode levar à ruína financeira e ao abuso doméstico, especialmente de crianças.

A capacidade das pessoas de avaliar riscos e fazer escolhas estando informadas será tão importante para regular o uso das drogas quanto leis e políticas mais humanas e eficientes. A repressão aos usuários de drogas é também ameaça à liberdade.

Reduzir o consumo o máximo possível precisa, portanto, ser o objetivo principal. Isso, contudo, requer tratar os usuários de drogas como pacientes que precisam ser cuidados e não como criminais que devem ser encarcerados. Vários países empenham-se em políticas que enfatizam a prevenção e tratamento, em vez da repressão - e reorientam suas medidas repressivas para combater o verdadeiro inimigo: o crime organizado.

A cisão no consenso global em torno à abordagem proibicionista é cada vez maior. Um número crescente de países na Europa e América Latina se afastam do modelo puramente repressivo.

Portugal e Suíça são exemplos convincentes do impacto positivo das políticas centradas na prevenção, tratamento e redução de danos. Os dois países descriminalizaram a posse de drogas para uso pessoal. Em vez de registrar-se uma explosão no consumo de drogas como muitos temiam, houve aumento no número de pessoas em busca de tratamento e o uso de drogas em geral caiu.

Quando a abordagem política deixa de ser a de repressão criminal para ser questão de saúde pública, os consumidores de drogas ficam mais abertos a buscar tratamento. A descriminalização do consumo também reduz o poder dos traficantes de influenciar e controlar o comportamento dos consumidores.

Em nosso informe, recomendamos avaliar do ponto de vista da saúde pública - e com base na mais avançada ciência médica - os méritos de descriminalizar a posse da canabis para uso pessoal.

A maconha é de longe a droga mais usada. Há um número cada vez maior de evidências indicando que seus danos são, na pior hipótese, similares aos provocados pelo álcool ou tabaco. Além disso, a maior parte dos problemas associados ao uso da maconha - desde o encarceramento indiscriminado dos consumidores até a violência e a corrupção associadas ao tráfico de drogas - é resultado das atuais políticas proibicionistas.

A descriminalização da canabis seria, portanto, um importante passo à frente para abordar o uso de drogas como um problema de saúde e não como uma questão para o sistema de Justiça criminal.

Para ter credibilidade e eficiência, a descriminalização precisa vir acompanhada de campanhas sólidas de prevenção. O declínio acentuado e persistente no consumo de tabaco nas últimas décadas mostra que as campanhas de prevenção e informação pública podem funcionar, quando baseadas em mensagens consistentes com a experiência das pessoas que são alvo desses esforços. O tabaco foi desglamourizado, tributado e regulamentado; não foi proibido.

Nenhum país concebeu uma solução abrangente ao problema das drogas. A solução, no entanto, não exige uma escolha cabal entre a proibição e a legalização. A pior proibição é a proibição de pensar. Agora, enfim, o tabu que impedia o debate foi quebrado. Abordagens alternativas estão sendo testadas e precisam ser cuidadosamente avaliadas.

No fim das contas, a capacidade das pessoas de avaliar riscos e fazer escolhas estando informadas será tão importante para regular o uso das drogas quanto leis e políticas mais humanas e eficientes. Sim, as drogas corroem a liberdade das pessoas. É hora, no entanto, de reconhecer que políticas repressivas em relação aos usuários de drogas, baseadas, como é o caso, em preconceito, medo e ideologia, são da mesma forma uma ameaça à liberdade.

Fernando Henrique Cardoso é ex-presidente do Brasil (1995-2002), copresidente da Comissão Latino-Americana sobre Drogas e Democracia e organizador da Comissão Global sobre Políticas para Drogas.

GOSTOSA

LUIZ FELIPE LAMPREIA

Choque de poder
LUIZ FELIPE LAMPREIA
O Globo - 18/01/2011

Os presidentes Obama e Hu Jintao, líderes das duas maiores potências globais, encontram-se esta semana em Washington. Desse diálogo, surgirão resultados que podem ser positivos ou negativos para a paz e a segurança do mundo.

Historicamente, sempre que uma nova potência surge no tabuleiro internacional, ela o faz com forte necessidade de afirmação e provoca reequilíbrios que podem ser muito traumáticos, como foi o caso da Alemanha em meados do século XIX ou do Japão depois. A China, embora afirme "perseguir inabalavelmente uma política externa de paz" , tem dado mostras crescentes de seu poderio militar e de sua decisão de atuar em sua sua região como a potência dominante. Acaba, por exemplo, de estrear seu novo caça supersônico J-20, invisível aos radares nos moldes do F-117A Nighthawk Stealth , que até então só a Força Aérea americana possuía, e de revelar o lançamento de seu primeiro porta-aviões armado com poderosos mísseis antiaéreos. Estes são galardões de uma superpotência de primeira linha .Nos últimos tempos, os analistas indicam que os chefes do Exército Popular de Libertação chinês agem de modo cada vez mais independente da liderança política do partido.

Nessas condições haverá chances de um bom resultado para a reunião de cúpula entre Obama e Hu Jintao? Os dois líderes estão debilitados politicamente: Obama por ter seu partido perdido fragorosamente as eleições de novembro, e daí a maioria na Câmara; Hu porque está entrando em seu último ano de governo com o declínio de seu poder. Mas, talvez por isso mesmo, convenha a ambos que a reunião seja percebida como um sucesso moderado e possa ser apresentada por cada um com sua face melhor.

As questões na mesa começam pelos assuntos econômicos e comerciais.A pressão americana pela revalorização da moeda chinesa, o yuan, já foi maior, embora persista. Tem havido um pequeno movimento gradual do Banco Central chinês nesse sentido. Por outro lado, a China é um grande importador de produtos americanos e, no meio de um processo penoso de recuperação da sua economia, este é um benefício importante para os Estados Unidos. Já para a China, iniciar uma guerra comercial com os Estados Unidos não é uma alternativa pensável. Por isso creio que não haverá muita faísca neste campo, pois os interesses comuns são maiores do que as diferenças existentes.

O segundo tópico é a Coreia do Norte, país ao qual a China dá sua proteção política e econômica. Para os Estados Unidos, este deve ser um ponto vital da conversa com o líder chinês, pois o regime de Pyong Yang está à beira de provocar uma guerra de desdobramentos imprevisíveis com a Coreia do Sul e atua de modo cada vez mais errático. Persuadir Hu Jintao a aumentar a pressão para trazer os representantes de Kim Jong Il à mesa do diálogo é um objetivo premente para Obama, pois a espiral conflitiva do momento é perigosa para aliados muito importantes de Washington, como Tóquio e Seul. Assim é essencial para os Estados Unidos que se inicie um processo diplomático para evitar novos testes de mísseis e o desenvolvimento de novos sistemas de armamentos por parte da Coreia do Norte.

A parte mais difícil do diálogo será, porém, a meu ver, a desconfiança mútua sobre o equilíbrio de poder na Ásia oriental, em particular no que diz respeito a Taiwan e ao Mar da China. Existe, sem dúvida, uma competição estratégica entre a China e os Estados Unidos, pois a primeira está dando mostras resolutas de sua determinação de exercer peso decisivo no seu entorno, e os americanos se contrapõem para demonstrar que não abrem mão de seu papel dominante na região. Em suma, a China utiliza todo o seu poderio econômico, tecnológico e militar para demonstrar aos Estados Unidos que precisa ser tratada como igual.

Todas estas questões complexas não podem obviamente ser resolvidas numa conversa presidencial, por mais que haja empenho dos chefes de governo. Estamos assistindo a movimentos de camadas geológicas na cena do poder internacional e nenhuma superpotência cede espaço estratégico voluntariamente à outra. Washington certamente se dá conta que não pode cercear a afirmação da China. Mas é do interesse de ambos buscar estabilidade em suas relações e evitar crises ou confrontações sempre que possível. Por isso, creio que é inútil esperar resultados espetaculares da cúpula de Washington como seriam um anúncio conjunto sobre política cambial ou um ultimato a Pyong Yang. Por mais que um comunicado conjunto morno seja decepcionante para quem espera algo mais apimentado, é muito melhor que seja assim. Grave seria que ficasse constatado um impasse em todo o leque de importantes assuntos. 

LUIZ FELIPE LAMPREIA foi ministro das Relações Exteriores no governo Fernando Henrique Cardoso

ALON FEUERWERKER

Viajar juntos
Alon Feuerwerker

Correio Braziliense - 18/01/2011 


Os supostos responsáveis pela segurança das famílias na região das serras pedem atenção para o que não seriam capazes de fazer, só para escapar do juízo por não terem feito o que era perfeitamente possível fazer.


O grau de mobilização do governo do estado do Rio de Janeiro neste mês de chuvas podia, antes de tragédia, ser medido por um detalhe singelo. Decorrido um ano do desastre de Angra dos Reis, a época crítica encontrou o governador reeleito de férias. Tomou posse do mandato novinho em folha e foi descansar fora do país.

Os desastres causados pela natureza (ou pela ação humana na natureza) são de duas categorias: os inevitáveis e os evitáveis. O governante cioso procura evitar a ocorrência dos evitáveis. O esperto usa os inevitáveis como biombo para escapar da justa divisão de responsabilidades quando acontece algo que poderia ter sido evitado.

Depois das centenas de mortos, descobre-se que a culpa é do “populismo”. O uso político do “antipopulismo” costuma ser bastante eficaz no Rio, pois atrai a simpatia de um pedaço influente da sociedade local.

A política carioca e fluminense vinha sendo monopolizada nas últimas décadas por descendentes políticos de Leonel Brizola. Todos acabaram brigados com ele. Uns foram para a esquerda, outros para a direita. O atual governador é o primeiro desde os anos 80 a vir de outra linhagem.

Quando no Rio alguém fala mal do populismo está de quebra falando mal dos governos de Brizola e da herança política e administrativa dele.

Não há espaço aqui para um balanço minucioso, mas fato é que o velho líder trabalhista, em seus dois mandatos após a redemocratização, tomou iniciativas importantes em favor dos mais pobres.

A mais vistosa talvez tenha sido implantar um ensino de boa qualidade e em tempo integral para os filhos dos pobres. Nunca entendi direito por que, mas isso lhe rendeu alguns e importantes inimigos. Hoje, só se fala em educação, e escola integral virou quase unanimidade. O antipopulismo costuma ser um bom disfarce para o político antipopular.

De volta à tragédia do Rio. Ninguém na posse das faculdades exigirá, a sério, que qualquer governo ali resolva em quatro anos o problema da ocupação irregular do solo. Mas quatro anos — sinto muito — é tempo mais que suficiente para montar e colocar em operação um bem azeitado sistema de alerta e providências em caso de chuva excessiva.

A esperteza de recorrer ao “populismo” como bode expiatório é bem esta: os supostos responsáveis pela segurança das famílias na região das serras pedem atenção para o que não seriam capazes de fazer, só para escapar do juízo por não terem feito o que era perfeitamente possível fazer.

Quantos teriam morrido se houvesse no Rio um sistema de alerta e providências compatível e operacional? Impossível fazer o cálculo exato, mas certamente menos do que o tanto de gente que morreu.

Comecei esta coluna notando que a tragédia encontrou o governador reeleito de férias. É elementar. Se o chefe não está concentrado num problema, muito menos os subordinados. Qualquer um que tenha sido chefe, nem que por cinco minutos, sabe disso. E sabe a importância da presença física do chefe nos momentos críticos.

O bom oficial vai na frente da tropa, não atrás.

Em qualquer ambiente político menos tolerante o atual governador do Rio estaria em sérios apuros. Mas ele tem a graça de ser aliado do governo federal, uma vacina contra críticas do PT. E tem outra graça, na simpatia dos militantes do antipopulismo. Daí que seja quase unanimidade.

Está na hora de o governador retribuir, em agradecimento pelas graças alcançadas. Não é todo dia que um político escapa quase ileso de fatos que, tecnicamente, deveriam encerrar a trajetória dele.

Se não é possível trazer de volta os mortos desta tragédia, o calendário ainda reserva no mandato de sua excelência mais este resto de verão, além de mais três verões inteirinhos. Tempo suficiente para mexer-se.
E sairá com certeza bem mais barato do que sairia o governador levar sempre com ele nos passeios fora do país, na época das chuvas, toda a população do Rio.

GOSTOSA

JOSÉ SIMÃO

"BBB"! A operada perdeu a régua! 
José Simão
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! E mais um predestinado: tem um juiz em Marilândia do Sul, no Paraná, que se chama Mauricio Pereira DOUTOR. E aí todo mundo chama ele de doutor Doutor! E em Campo Maior, no Piauí, tem um armazém com a placa: "Vendo ovos e outras frutas". Rarará. E um amigo meu disse que ele só paga imposto quando lançarem o IPerereca!
E eu amei o show da Amy. A Nina Simone do século 21. A Amy WineWhiskey Vodka! Só teve uma piada pronta: acabou a bebida no meio do show. Ou ela tomou todo o estoque do Anhembi antes ou foi a Defesa Civil! Amy decreta a Lei Seca! E aí o povo bebia o quê? SALIVA! Encheu a cara de saliva! Foi ao show da Amy e encheu a cara de saliva.
E aqueles que falam: "Ai, ela esqueceu a letra". Mas com aquela voz precisa de letra? Letra é pra Bob Dylan! Letra é pra sertanejo, que com cinco palavras faz umas 28 músicas: cama, motel, solidão, chifre e volta pra mim! "Volta pra mim" é uma palavra só! E aí dizem: "A Amy atravessou a música". Então vai ao show da Celine Dion. Rarará! E o povo queria mesmo que ela bebesse e caísse. Vida de barraqueira é dura: se dá escândalo, o povo critica. Se não dá escândalo, o povo fica decepcionado!
E o "BBB"? O Big Podre Brasil! Sacanagem! A operada foi pro paredão. Ela já tem um membro eliminado e agora querem eliminar ela inteira? Rarará! E eu conheço um transexual que, quando cortou o pingolim, perdeu o namorado! O namorado perdeu o interesse e se picou! E a operada confessou que fazia programa. Inclusive quando era travesti! E como disse aquele mineiro: "Travesti é como torresmo, uma delícia de comer, mas ninguém recomenda". Rarará.
E olha o anúncio que eu vi na Folha: "Bia Loira, travesti dotada. TRAGA A RÉGUA!". Rarará!
O Brasileiro é cordial! A penúltima do Gervásio! Esse Gervásio é um vulcão em erupção. Olha o cartaz na empresa em São Bernardo: "Se eu descobrir quem derramou café aqui e não limpou, vou fazer o perturbado beber cinco litros de cândida até ficar branco como o Michael Jackson. Conto com todos. Assinado: Gervásio". E eu vou dar uma de Gervásio: "Se eu pegar o cabrunco que votou pra operada ser eliminada, eu corto o pinto do desalmado na prensa. Conto com todos. Assinado: Simão". Rarará. Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

Sua graça
SONIA RACY
O ESTADO DE SÃO PAULO - 18/01/11

Avanços na USP. A partir deste ano, alunos travestis e transexuais poderão colocar seus "nomes sociais" nos diplomas.

Segundo circular da diretora em exercício da Faculdade de Direito, Maria Sylvia Di Pietro, a norma cumpre o Decreto 55.588/2010. O documento garante direito à escolha de tratamento nominal nos atos promovidos pela Administração direta e indireta do Estado.

Sua graça 2
É justamente por causa deste decreto que pacientes do SUS já têm este tratamento garantido em seus cadastros.

Quem dá mais
A Prefeitura está prestes a levar o prédio do Itaú Unibanco na rua Boa Vista, no centro. Por quanto? Calcula-se R$ 30 milhões. Abrigará a Secretaria de Finanças, até então espalhada em quatro endereços. O edifício, ao lado do Cidade 1, ocupado pelo Governo Alckmin, também era cobiçado pelo Estado.

Potemkin
O PT avançou sobre a cultura com a saída de Juca Ferreira, mas a Ancine é do PC do B e ninguém tasca. Manoel Rangel, que é presidente da entidade, foi escolhido por Lula, sabatinado pelo Senado e tem mandato até... 2013.

Sem festa
As chuvas que arrasaram a região serrana do Rio provocaram o adiamento da cerimônia que celebraria 70 anos do Ministério da Aeronáutica e 80 do Correio Aéreo Nacional. Estava marcada para amanhã e ainda não há nova data.

Vale lembrar que a FAB também está envolvida no trabalho de resgate às vítimas.

Tio Sam
Marina Silva não quer saber de breves encontros com Al Gore, como o de hoje no Campus Party. Em março, ela segue para os EUA para uma série de palestras e quer falar sobre mudanças climáticas com o ex-vice-presidente. Por, pelo menos, uma hora.

ManequimNa primeira reunião ministerial, Dilma mostrou preocupação com a silhueta. Nas três horas de conversa, os ministros se distraíram com sucos e sanduíches. A presidente ingeriu apenas água.Sem gás.

Pernas
Costanza Pascolato vai descobrir quantos quilômetros anda por dia na Bienal, durante a SPFW. Receberá um "contador de passos" da Mundial Impala para medir a maratona. E, de quilômetro em quilômetro, ganhará massagens.

Pincelada
A galeria Emma Thomas prepara individual de Arnaldo Baptista para este semestre.

O músico, aliás, já tem usado a internet para expor sua obra como artista plástico. Frases e pensamentos, mais de cem, são usados como base para a criação.

Uma garotinha

Paulo Henrique Fontenelle já começou a pesquisa de imagens para o documentário sobre Cássia Eller. O roteiro? Ainda embrionário. "Acabo de fechar negócio com a família dela", diz.

Pin-up

Betty Boop ganhou linha especial na Zara. O acordo é mundial.

Na frente


Curtindo o sol em Trancoso na casa de seu filho, Paulo Henrique, e da nora Evangelina, Fernando Henrique Cardoso preparava-se no fim de semana para embarcar hoje. Destino? Europa, onde fará diversas palestras.

Pascaline Wilhelm, diretora de moda do Première Vision, virá para versão brasileira do evento. Amanhã, no Transamérica Expo Center.

A Banda Seu Chico, que toca sucessos de Chico Buarque, lança CD e DVD. Sexta, no Studio SP.

Começa hoje, em BH, o programa de itinerância da Bienal. Mais 11 cidades receberão a mostra.

Acontece hoje o lançamento do livro Nada mais que a Verdade - A Extraordinária História do Jornal Notícias Populares. No Posto 6.

Leandra Leal não pretende tirar férias. A atriz começa a filmar, em março, o longa Éden, de Bruno Safadi.

Pérolas da internet: "Totó não tem gosto mesmo para mulher. Trocou Clara (Mariana Ximenes) por Flora (Patrícia Pillar)!". Cruzes!

Interinos: Débora Bergamasco, João Luiz Vieira, Marilia Neustein e Paula Bonelli.

POLITICAMENTE CORRETO

MÔNICA BERGAMO

PAPEL PASSADO
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

A escritora Lygia Fagundes Telles sugeriu que a editora Cosac Naify lance uma versão popular de "Capitu", livro com o roteiro de cinema que ela e o crítico Paulo Emílio Sales Gomes (1916-1977) escreveram em 1967, baseado em "Dom Casmurro", de Machado de Assis. Reclama que a obra, parte de uma coleção dedicada a Paulo Emílio, é "muito cara", estaria indisponível e cogita até tirá-la do catálogo da empresa, para tentar viabilizar sua edição mais barata.

NUNCA ANTES

Cassiano Elek Machado, editor da Cosac Naify, diz que a casa nunca fez edições mais baratas de livros já lançados, mas que a proposta não está descartada. Afirma que, contratualmente, Lygia não pode tirar a obra da editora. "Capitu" vendeu cerca de 1.100 exemplares, de uma tiragem de 3.000 -os 1.900 restantes continuam no mercado. A edição, ilustrada e com capa dura, custa R$ 45.

NO CABIDE
Embora tenha escolhido para o look da fotografia oficial um blazer creme diferente da roupa que usou na posse, a presidente Dilma Rousseff chegou a fazer alguns cliques com o traje que vestiu na cerimônia do dia 1º. O equipamento de iluminação, com dois filtros, foi o mesmo utilizado no retrato presidencial de Barack Obama.

ESTOU COM SORTE

O brasileiro Alexandre Hohagen, diretor-geral do Google para a América Latina, foi promovido a vice-presidente da empresa para a região.

VIZINHOS DO BARULHO

Moradores de nove prédios do entorno do Real Parque (zona sul) estão se mobilizando contra o projeto de urbanização da favela tocado pela prefeitura. Eles temem a expansão do tráfico de drogas e que o local se degrade como o antigo Cingapura, ao lado da Marginal Pinheiros. Reclamam ainda que o terreno onde 340 casas pegaram fogo, em setembro do ano passado, não foi incluído.

ÁREA NOBRE
A Secretaria da Habitação diz que "atua na área antes, durante e após as obras" para evitar a degradação. Afirma que o terreno onde houve o incêndio é caro -está sendo leiloado por R$ 12 milhões. Uma das áreas desapropriadas para o projeto, por R$ 3,1 milhões, era do empresário José Ermírio de Moraes Neto, do grupo Votorantim -onde o secretário da Habitação, Ricardo Pereira Leite, já trabalhou.

SEM CHORO

Deborah Secco assistiu ao show de Amy Winehouse ao lado do marido, Roger Flores, no sábado, cercada por três seguranças. Estrela de "Insensato Coração", ela faz parte do núcleo cômico da nova trama de Gilberto Braga e Ricardo Linhares. "Novela é uma obra longa e poder fazer de forma leve, rindo, é mais legal do que passar nove meses chorando."

SÓ ELEGÂNCIA

O músico Lobão se apresentará ao vivo no desfile da grife Reserva, na São Paulo Fashion Week, no dia 31. O tema é "Decadence avec Elegance". Sua autobiografia "Lobão - 50 Anos a Mil" vendeu mais de 40 mil exemplares. "Sou autor de um best-seller. Qualquer coisa que escrever agora vai dar mais uma grana, não é verdade?"

É A GLÓRIA
A estilista Gloria Coelho inaugura em 3 de fevereiro, um dia após seu desfile na SPFW, uma mostra sobre sua carreira no Museu da Casa Brasileira. Lança ainda um segundo livro sobre seu trabalho. E, pela primeira vez, mostrará antes uma roupa da próxima coleção. No dia 27, a atriz Mayana Moura, que usou criações da estilista em "Passione", desfila um look para convidados na Casa Electrolux, nos Jardins.

AFINADOS NA PISTA
Antes do show de Amy Winehouse, Henri Castelli e Marília Gabriela, entre outros, fizeram um esquenta no bar Blá. No camarote no Anhembi, encontraram a atriz Fernanda Paes Leme e o músico Otto. Um dia depois de se despedir da vilã Clara, Mariana Ximenes ficou no gargarejo. Roberto Lima, presidente da Vivo, e Bia Antony também circularam por lá.

CURTO-CIRCUITO
O tecladista Jared Gold se apresenta hoje, às 21h, no Madeleine Bar. 18 anos.

O Santos está leiloando camisas de Neymar, Marta e Léo no site Mercado Livre, em prol das vítimas das chuvas na região serrana do Rio. O Centro Cultural São Paulo e o shopping Cidade Jardim estão recolhendo doações.

O livro "Nada Mais Que a Verdade", sobre o jornal "Notícias Populares", será relançado em uma edição atualizada, com sessão de autógrafos hoje, às 19h, no bar Posto 6.

Serpui Marie assina uma edição de bolsas especiais para a próxima edição da São Paulo Fashion Week.

com ELIANE TRINDADE (interina), DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

DORA KRAMER

Crise de abstinência
Dora Kramer
O ESTADO DE SÃO PAULO - 18/01/11

O mesmo Congresso que não se mexeu durante os últimos 12 anos para aprovar reformas consideradas essenciais para o País, deixando morrer propostas que tramitam na Câmara e no Senado, agora reclama da decisão de Dilma Rousseff de abandonar essa agenda para, no máximo, investir em mudanças pontuais no sistema tributário.

A respeito das possíveis razões do governo tratamos no domingo (Ninguém é de ninguém) e agora cumpre dedicar um minuto de atenção sobre a reação, entre indignada e preocupada, do Congresso. Notadamente da base governista, apreensiva com a possibilidade de a oposição "capturar" a pauta das reformas e atuar politicamente no vácuo deixado pela situação.

E aí surge a justificativa ao molde de lugar comum: em política, não existe espaço vazio e, portanto, conviria ao governo ocupá-lo antes que seja tarde.

A alegação, além de injustificável, sustenta-se na falsa premissa de que apenas o Executivo dispõe da prerrogativa de conduzir transformações.

É, sobretudo, uma manifestação antecipada da crise de abstinência da base governista em face de uma pauta imposta pelo Executivo que lhe permita perpetuar o jogo permanente de pressões e contrapressões para que deputados, senadores e respectivas bancadas obtenham benefícios do governo.

A última vez em que o Congresso se dedicou com afinco à pauta das reformas foi no primeiro governo de Fernando Henrique Cardoso. Depois disso, limitou-se ao exercício do faz de conta legislativo, à subordinação às vontades do Executivo, à administração dos próprios escândalos, a construir uma péssima relação com a sociedade e à defesa dos interesses corporativos.

Quando reclama da ausência de uma pauta de reformas induzida pelo Executivo, o Congresso expõe o quanto está viciado em atuar sob a tutela do Palácio do Planalto.

O temor de uma oposição desarticulada é, por óbvio, artificial.

Se o Parlamento de fato entende que as reformas política, da Previdência, tributária, sindical e trabalhista são necessárias, nada impede, a não ser a total falta de compromisso com a delegação recebida das urnas, que suas excelências começassem a próxima legislatura, em fevereiro, trabalhando por elas.

Dificilmente o farão. Por vários motivos, sendo o principal deles o costume de viver das benesses governamentais, o que resulta em ausência de independência para tomar a iniciativa de propor ele mesmo uma agenda e executá-la sem medo de desagradar nem desejo de atender às conveniências do Executivo.

Panos quentes. O jornal Folha de S. Paulo informa que a Controladoria-Geral da União (CGU) concluiu por meio de auditorias que nos últimos quatro anos houve desvios da ordem de R$ 500 milhões na Fundação Nacional de Saúde (Funasa), do Ministério da Saúde.

Embora a CGU seja ligada diretamente à Presidência da República, quem se manifesta é o vice-presidente Michel Temer, presidente licenciado do PMDB, partido encarregado de comandar a Funasa desde 2005.

A Presidência cala e o vice alega que, "se" for comprovada a denúncia, "deve haver sanções" que, na concepção dele, não alcançam seu partido, firme no posto por conta de "um acordo com o ministro da Saúde".

Temer põe em cheque a investigação da CGU e o governo age como se há dois anos o então ministro José Gomes Temporão não tivesse denunciado a corrupção na Funasa e, por isso, obrigado a pedir desculpas ao PMDB. Na época o partido exigiu "mais respeito" e foi atendido.

Agora se não atuar, a presidente Dilma Rousseff estará desqualificando as exigências éticas que acabou de fazer ao ministério e autorizando que se conclua que falou por falar, igualzinho ao antecessor.

Por aqui. Dirigente do PMDB no auge da irritação com o governo: "Querem técnicos? Nomeiem o Felipão e o Luxemburgo e depois peçam que eles arrumem as coisas no Congresso."

GOSTOSA

ELIANE CANTANHÊDE

Milhões pra cá, milhões pra lá
Eliane Cantanhêde
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

Caro leitor, cara leitora, vamos fazer uma continha simples de somar e diminuir?
O governo federal rapidamente anunciou R$ 780 milhões para os gastos mais urgentes nas tragédias deste início de ano no Brasil, incluindo as tempestades no Sudeste e a incrível seca em algumas partes, como no Rio Grande do Sul.

Desse dinheiro, R$ 700 milhões foram destinados ao Ministério da Integração Nacional e à Defesa Civil, para, por exemplo, comida, remédios, colchões e roupas para os desabrigados. Os outros R$ 80 milhões ficaram com o Ministério dos Transportes, para tentar contornar o caos de ruas, avenidas e pontes.Ainda dentro disso, R$ 100 milhões foram para o Rio de Janeiro, onde mais de 600 pessoas morreram e há milhares sem casa e sem rumo, num recorde macabro de calamidades no Brasil.

Ao mesmo tempo, o repórter Bernardo Mello Franco relata na Folha que uma auditoria feita pela CGU (Controladoria-Geral da União) de 2007 a 2010 descobriu desvios que podem chegar a R$ 500 milhões na Funasa, a Fundação Nacional de Saúde (saúde!). Aliás, controlada pelo PMDB desde 2005.

Conforme a CGU, que não é da oposição nem do PIG nem da CIA, o dinheiro sumiu entre sair dos cofres públicos e chegar a convênios irregulares e a repasses sem prestação de contas. Afundou na lama.

Enquanto isso, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) anuncia que vai entrar com ação na Justiça para acabar com a farra da pensão vitalícia dos governadores, que saem dos cargos, mas não desgrudam dos vencimentos -de até R$ 24 milhões por mês.

Então, vamos lá: R$ 780 milhões para a maior catástrofe da história contra R$ 500 milhões para o ralo na sensível área da saúde e mais os "trocados" para ex-governadores não fazerem nada.

A gente soma, diminui, multiplica e divide, mas não chega a resultado nenhum. A conta não fecha.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Entrando no jogo
RANIER BRAGON - interino
FOLHA DE SÃO PAULO - 18/01/11

Aliados de José Serra abandonaram a quarentena pós-eleitoral e já se insurgem contra a trégua de expoentes do PSDB a Dilma Rousseff. A tragédia na região serrana do Rio é o primeiro mote dos serristas, que pregam a responsabilização do governo federal pela ocupação desordenada de áreas de risco, questionando a eficiência gerencial da presidente à frente do PAC. O primeiro a vocalizar o movimento é o senador eleito Aloysio Nunes (SP), para quem o partido deve planejar seu futuro se firmando como "oposição no presente". Enquanto governadores adotam a retórica da parceria federativa, o grupo do candidato derrotado à Presidência tenta reposicioná-lo no tabuleiro.


Na telinha 
O programa de TV dos tucanos, previsto para ir ao ar em fevereiro, será o termômetro da estratégia. Aliados de Serra também querem persuadir Duarte Nogueira (SP), novo líder tucano na Câmara, e Álvaro Dias (PR), no Senado, ao plano de "oposição vigorosa".

Mudança O chefe da assessoria de imprensa de Nelson Jobim (Defesa), José Ramos, será o novo secretário de Imprensa da Presidência.

Headhunter 
Dilma está atrás do nome para comandar a Pré-Sal S.A., a representante da União na exploração. Sondou Guilherme Estrella, diretor da Petrobras, mas ele não teria topado.

Professor 
De um peemedebista, sobre a ênfase de Dilma Rousseff na exigência por técnicos para o segundo escalão: "Daqui a pouco, pra fazer parte do governo o PMDB vai ter de filiar o Luxemburgo e o Felipão".

Veja só 

A divulgação de supostos desvios na Funasa, na casa do meio bilhão de reais, chegou a alegrar setores do PMDB. Danilo Forte, ex-presidente do órgão eleito deputado federal, está desgastado com a cúpula do partido, que o acusa de tentar negociar diretamente com o ministro Alexandre Padilha (Saúde) a sucessão do órgão.

Ação... 

O TJ-MG publicou ontem acórdão confirmando condenação do deputado federal Marcos Montes (DEM-MG) à perda da função pública e à suspensão dos direitos políticos por oito anos. A pena se refere à contratação sem licitação, quando prefeito de Uberaba (1997-2004), de uma ONG ligada ao deputado Nárcio Rodrigues (PSDB-MG), a Adebrac.

...e reação 
A ONG dava assessoria para convênios com o governo federal. Montes diz que irá recorrer e ressalta que agiu com aval da área jurídica da prefeitura. Afirma ainda que a derrubada pelo TJ da obrigação de ressarcir o gasto - determinada pela 1ª instância -mostra não ter havido dolo.

Disputa 
O deputado do DEM é o candidato de Gilberto Kassab na disputa interna pela liderança da bancada na Câmara. Seu adversário é ACM Neto (BA). Segundo a área técnica da Câmara, se Montes não conseguir anular ou suspender a decisão até o dia 1º, não toma posse.

A postos 

Sobre o jantar que o PR oferecerá hoje em apoio à candidatura de Marco Maia (PT-RS) à presidência da Câmara, fala Sandro Mabel (PR-GO): "Continuo prospectando a possibilidade de sair candidato. Só decidirei na última semana". Ele diz ter informado à legenda que não continuará na liderança do partido em 2011.

De foice 
Depois das negociações por cargos no segundo escalão, Henrique Eduardo Alves (RN), líder do PMDB na Câmara, tem novo abacaxi nas mãos: são sete os candidatos do partido à vice-presidência da Casa.
com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI

Tiroteio


"O governo age politicamente, prejudicando o agricultor, que gera emprego, e protegendo os sem-terra, que agem contra a lei."
DO PRESIDENTE DA UDR, LUIZ ANTONIO NABHAN GARCIA, sobre o governo estadual buscar terras devolutas para assentamento e, segundo ele, não agir contra invasões no Pontal do Paranapanema (SP).

Contraponto


Paraíso
O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) participava em setembro de uma sessão de homenagem ao Hospital de Base de Brasília, na Câmara, quando começou a listar o nome dos médicos presentes.
Em determinado momento, fez uma pausa e, antes de iniciar o discurso propriamente dito, afirmou, se dirigindo ao plenário:
-Quero dizer que pela primeira vez lamento não ser hipocondríaco. Porque este seria o lugar ideal para passar uma tarde.

A VERBA

MÍRIAM LEITÃO

O peso econômico
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 18/01/11


A tragédia humana será sempre maior, mais devastadora, presente em todas as mentes. Mas existe também a tragédia econômica. As áreas atingidas produzem quase todas as hortaliças consumidas no estado do Rio. Tem pólo metal mecânico, têxtil, de confecções e turismo. O Rio conta também as perdas materiais: refazer o destruído, e, quando puder, voltar a produzir.

O governo e as empresas estão ainda calculando quanto se perdeu e quanto tempo será preciso para a recuperação. A Firjan fez uma pesquisa: 62,2% de 278 empresas consultadas foram afetadas, pelo menos 20% delas com alagamento do parque produtivo; a falta de funcionários foi sentida por quase todas; 82% ficaram sem energia elétrica. O cenário na agricultura é também devastador.

Ângela Thompson, diretora do Sítio do Moinho, em Itaipava, estava ontem com sua equipe tomando pé da situação nos seus seis hectares de produção orgânica. Ela fornece o produto para restaurantes, supermercados, e faz entregas domiciliares. As entregas foram suspensas. Ontem, no fim do dia, a empresa avisou que retomará o fornecimento. Uma parte da produção de hortaliças e legumes, feita em área coberta e mais alta, foi salva:

- Alguns dos meus funcionários estão ilhados. Felizmente, não perdemos ninguém, mas alguns perderam tudo e não conseguem vir para o trabalho. Uma ponte para cá foi restabelecida, mas precariamente.

Há produtores em situação bem pior. Além de perder a produção, a camada de terra produtiva foi soterrada por pedras, por areias que saíram do fundo dos rios. Quem tem produto, tem dificuldade de colher e escoar por falta de pessoal e estradas.

Comprar verduras, legumes e frutas é um desafio. Quase nada se encontra, mas o impacto que os moradores do Rio sentem pesará pouco no índice. Tudo acaba diluído, na média. O professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, disse que as coletas diárias de preços já mostravam saltos fortes antes das chuvas:

- Alguns tubérculos subiram muito no fim do ano passado, como batata-inglesa, chuchu e tomate. Tomate, por exemplo, teve salto de 30%. Não apenas no Rio; em Belo Horizonte, tubérculos tiveram alta de mais de 20%. Fruta também subiu. Quando forem coletados os aumentos atuais dos preços de hortaliças e verduras, o impacto, no índice, será pequeno porque eles representam apenas 0,16% do IPCA.

É uma catástrofe para quem produz; um peso para quem consome, mas no índice mal se verá. Se os produtos não forem encontrados, não entrarão no índice.

Mas nos supermercados com os quais conversamos, a informação é de que há altas de preços e desabastecimento.

- Cem por cento das nossas hortaliças vêm de lá. Alguns fornecedores tiveram menos prejuízos porque trabalham com estufas, mas a oferta caiu mais da metade e os preços subiram absurdamente, para nós entre 50% e 60%. Se não tivéssemos essas parcerias e fôssemos comprar na Ceasa, seria o triplo - diz o diretor do Prezunic Genival Beserra.

Ele acha que trazer de São Paulo ficaria mais caro, e poderia derrubar mais ainda os produtores da Região Serrana, que não teriam mercado para o pouco que conseguiram salvar da produção.

Alaídio Gonçalves, gerente-geral do Hortifruti, diz que 100% das hortaliças das suas 21 lojas vêm da Região Serrana. Ele também constata que o que está chegando está com preço bem mais alto. O Pão de Açúcar diz que trará de São Paulo, mas lá também choveu. O Zona Sul não quis falar.

Muitos precisarão de tempo para se recompor. André de Souza Avelar, da UFRJ, especialista em hidrologia e processos erosivos, disse que serão necessários seis meses para recompor o solo perdido e fazê-lo produtivo novamente. E será caro.

O secretário do Desenvolvimento, Julio Bueno, me disse que estão sendo criadas linhas de crédito para socorrer produtores. Mas o que é tão importante na mesa do Rio, que desapareceu das feiras e supermercados, tem um peso até pequeno quando comparado com outros setores produtivos:

- O Valor Adicionado pelo setor agropecuário nestas cidades - Areal, Bom Jardim, Nova Friburgo, Petrópolis, Sumidouro, Teresópolis e São José do Vale do Rio Preto - é R$268 milhões. A indústria é R$2,1 bilhões e o setor de serviços é R$7 bilhões.

Tudo foi violentamente impactado. O setor de turismo se aflige não apenas pelo cancelamento de 100% das reservas nos hotéis, pelo abandono dos restaurantes, mas porque não sabe quando estará de novo em condições de atrair turistas. Em Friburgo, há um forte pólo metal mecânico onde se produz 25% da produção nacional de ferragens e fechaduras. Há produção de água mineral, uma indústria moveleira importante, material elétrico, plásticos, confecções. Tudo está de uma forma ou de outra afetado pela avalanche que passou sobre essa região.

O comércio das três cidades maiores, Petrópolis, Teresópolis e Friburgo, está com uma perda diária de R$8 milhões de faturamento, segundo a Fecomércio.

- O impacto é significativo e vai chegar ao mercado de trabalho, porque o momento é de os empresários fazerem as contas da expectativa da demanda - diz João Carlos Gomes, Superintendente de economia e pesquisa da Fecomércio.

Bueno diz que, ao contrário da ideia que se tem de área rica, a região Serrana tem IDH e arrecadação de impostos per capita menores do que os do estado. Até Petrópolis. Os empregos formais, segundo o Ministério do Trabalho, são 161 mil. Segundo a Firjan, o prejuízo foi, só nas indústrias atingidas, de R$153 milhões.

- O cenário é de terra arrasada - disse Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira, presidente da Firjan.

Será lento e doloroso o caminho da reconstrução econômica da Serra do Rio.

MERVAL PEREIRA

Visão de conjunto
MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 18/01/11


Napoleão dizia que o máximo de subordinados que se deve comandar diretamente é sete. O governo Dilma herdou de Lula uma estrutura com nada menos que 37 ministros, consequência da necessidade de contentar uma base aliada que cada vez se amplia mais, ao mesmo tempo em que se torna mais heterogênea.

Nunca se ouviu do ex-presidente Lula uma reclamação sobre o tamanho do Ministério. Ele simplesmente não despachava com muitos de seus "ministros", e se utilizava das reuniões ministeriais para fazer política e "matar a saudade" de muitos deles.

Hoje são nada menos que dez partidos de peso político na base governista que disputam espaços na administração Dilma Rousseff - PT (88), PMDB (79), PP(41), PR (41), PSB (34), PDT (28), PTB (21), PSC (17), PCdoB (15), PRB (8).

Segundo o cientista político Octavio Amorim Neto, da Fundação Getulio Vargas do Rio, um estudioso do assunto, é importante registrar que a cada eleição batemos recorde de fragmentação partidária.

As causas são variadas: partidos relativamente grandes, como o DEM e o PSDB, diminuíram suas bancadas, assim como o PMDB, que era o maior partido da Câmara, também se viu deslocado para o segundo lugar.

O PT cresceu, mas pouco, e outros partidos que eram pequenos, como o PSB, cresceram também. Essa tem sido a tendência dos últimos anos, segundo Octavio Amorim: os grandes ficam um pouco menores, e os pequenos, um pouco maiores.

Do ponto de vista formal, o governo Dilma tem mais força no Congresso, e poderá aprovar reformas constitucionais e barrar CPIs, ressaltando a fragilidade maior da oposição na futura Legislatura.

Na prática, a presidente sabe que não é bem assim e para não arriscar nenhuma surpresa está evitando se confrontar com o Congresso.

Adiou a escolha do segundo escalão para depois da eleição da presidência da Câmara, dando tempo para que seus aliados, especialmente o PMDB, façam seus acordos internos que não afetem a governabilidade.

E já decidiu que não apresentará ao Congresso nenhuma das reformas estruturantes que são tão necessárias quanto polêmicas, e desfazem qualquer maioria.

Portanto, a decisão de dividir os ministros em quatro grupos, que terão ministros-coordenadores, parece lógica, na impossibilidade de reduzir simplesmente o número de ministérios e secretarias com status de ministério.

O grupo de Desenvolvimento Social e Erradicação da Miséria será coordenado pela ministra Tereza Campello, de Desenvolvimento Social; o de Desenvolvimento Econômico por Guido Mantega, ministro da Fazenda; o de Gestão, Infraestrutura e PAC por Miriam Belchior, ministra do Planejamento; e o de Direitos da Cidadania e Movimentos Sociais por Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência.

Na mesma impossibilidade de despachar com todos os 37 ministros, a presidente vai participar das reuniões setoriais.

Na prática, teremos quatro superministros, além dos que, por si só, ou pelo cargo que ocupam, têm importância reconhecida: o chefe do Gabinete Civil Antonio Palocci, que reúne as duas qualidades; o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini; o Ministro-Chefe das Relações Exteriores, Antonio Patriota; o Ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, e poucos outros.

É mais uma maneira indireta de a presidente Dilma Rousseff explicitar o que pensava, e não podia dizer, da estrutura de poder montada no governo petista, que acaba favorecendo a centralização de decisões.

Aconteceu com José Dirceu quando chefiava o Gabinete Civil, e também com Dilma quando o substituiu.

A reunião de ministérios em grupos temáticos favorece também uma visão de conjunto que falta na administração pública brasileira, falha que está sendo ressaltada agora por ocasião das trágicas enchentes no interior do estado do Rio.

Desta vez, as águas não selecionaram suas vítimas apenas entre as mais pobres, favorecendo uma compreensão mais ampla do problema, mas tudo indica que ainda não temos capacidade para uma ação conjunta dos diversos órgãos que se dedicam a questões de preservação ambiental e moradia social.

A ideia de culpar as autoridades diretamente pelas consequências do desleixo, colocando o Ministério Público à frente das providências, parece um bom começo para obrigar que medidas sejam realmente tomadas, e não apenas prometidas.

O projeto de uma espécie de Lei de Responsabilidade Social, que a OAB-RJ anunciou que vai propor em regime de urgência ao Congresso Nacional, pode ser o começo da reação, e o interessante (e dramático) é verificar quão distante está o ânimo solidário da população da prática da prevenção, que é a única maneira de minorar as consequências das tragédias provocadas por fenômenos naturais que cada vez nos atingem mais, tudo indica devido às mudanças climáticas na Terra.

Foi-se o tempo em que agradecíamos não termos nem tufões nem terremotos nem tsunamis, como se fôssemos abençoados.

Como sempre nos consideramos protegidos das intempéries, também não desenvolvemos uma cultura de prevenção desses acidentes.

Ao mesmo tempo, nossos péssimos hábitos políticos incentivam invasões e ocupações de terrenos na maioria das vezes em locais interditados para construção justamente devidos aos perigos que eles representam.

Há uma visão distorcida, muitas vezes equivocada, a maior parte, porém, oportunista e criminosa, de que permitir a instalação de pessoas carentes em áreas de risco é uma ajuda, quando na verdade é o caminho mais curto para tragédias como as que estamos vivendo no estado do Rio.

Seria preciso que esse espírito de solidariedade que existe em todas as camadas sociais fosse aproveitado para uma mudança cultural que elegesse a prevenção como prioridade.

Para que tragédias inevitáveis tenham a menor consequência possível, como aconteceu recentemente na Austrália.