sexta-feira, julho 01, 2016

A voz do povo é a voz de Deus - JOAQUIM FREITAS

O PONTO CEGO  

A priori defendo a democracia representativa, e sou refratário à consulta popular.

O referendo do BREXIT me ascendeu uma luz sobre o assunto.

Me dei conta que tanto no referendo sobre desarmamento no Brasil, como no BREXIT, a Globo, mídia tradicional brasileira, e boa parte da do Reino Unido eram quase unânimes na mesma tese. Assistimos campanhas publicitárias e todos os sabichões concordando, fazendo parecer que as decisões eram tão óbvias que alguém que não quisesse se ater um pouco mais sobre os temas, se perguntaria por que consultar a população sobre um tema que todos concordam?

Eis que vem o povo, e na contramão de todos os formadores de opinião, escolhe justamente o “não” ao desarmamento e “sim” ao BREXIT.

O que foi que houve? A mídia não controla as massas?

Para não perder a oportunidade de criar uma teoria, lá vai eu....

A ideia é que os referendos/plebiscitos quando tratam de assuntos que influenciam no comportamento do cidadão, a mídia não consegue penetrar na sua mente mais do que na sua vivência cotidiana.

Por mais que Wagner Moura, Chico Buarque e Camila Pitanga tivessem ido para TV dizer que armas levam à violência, e que o amor é a maior força do universo, quando o sujeito estava em casa de noite, e escutava um barulho no quintal e sabia que se ligasse para a polícia, ela não iria aparecer a tempo de lhe proteger, o cara esquecia de Wagner, Camila e Chico (todos bem protegidos em seus condomínios) e só desejava ter um revolver, para pelo menos atirar para o alto e afugentar o invasor.

Assim como, por mais que Obama, Cameron e outros medalhões digam que os povos e culturas devem conviver harmonicamente, sob um governo central que irá decidir tudo bem certinho para a felicidade de todos, o cidadão inglês olha para janela e vê uma passeata de pessoas protestando contra a prisão de um suspeito de terrorismo, nessa hora ele ignora Cameron e Obama.

Começo a achar que em certos casos, um referendo protege o povo dos seus pensadores.


O Gato quântico de Gaspari - REINALDO AZEVEDO

Folha de SP - 01/07

Aos 54 anos, cheguei à idade em que cobro dos interlocutores a objetividade necessária. Com mais tempo pela frente, talvez eu condescendesse com imprecisões. Mas tenho pressa, não minto. E deixo claro: recomendo aos jovens que não tolerem feitiçarias intelectuais. É perda de tempo.

Nesta semana, três doutores, cada um em seu ofício, convocaram em mim o apreciador da matemática e da física, as disciplinas das quais fui monitor no ensino médio, que se chamava "colégio". Sempre que alguém começa a passear pela metafísica, eu protejo a minha carteira existencial.

Elio Gaspari, uma espécie de decano moral do jornalismo –de tal sorte o é que eu, elogiosamente, o apelidei cá comigo de "aiatoélio"–, escreveu uma coluna (http://goo.gl/x2Iafj) nesta Folha intitulada "Há golpe". No muito antigamente, uma das disciplinas próximas da matemática era a gramática. Reaproximo-as.

Um tantinho de filosofia da linguagem a partir da análise sintática.

Gaspari não escreveu "impeachment é golpe", circunstância em que haveria um sujeito ("impeachment"), um verbo de ligação ou cópula, como era chamado ("é"), e um predicativo do sujeito ("golpe"), com um substantivo fazendo as vezes de adjetivo ("derivação imprópria"). Se alguém diz que "impeachment é golpe", elimina circunstâncias e história e se fixa numa imanência. Nesse caso, o impeachment carrega a sua qualidade ou estado.

Como Gaspari não é burro –ou "aiatoélio" não seria–, ele optou pelo "há golpe".

Sua coluna, de fato, nega que o impedimento carregue em si a imanência inconstitucional e ilegal. Ele reconhece que, ainda que Dilma não pudesse responder pelas pedaladas (e a perícia não entrou nesse mérito), bastaria a edição dos decretos de créditos suplementares, sem autorização do Congresso, para caracterizar o crime de responsabilidade.

O autor, então, driblou imanências e escolheu a fórmula "há golpe". Ah, que mal fizeram os "modernos" aos brasileiros, né?, ao eliminar o ensino da gramática em benefício da "interpretação de texto", que é o doutor Thomás Turbando da linguagem.

O "há" de Gaspari é verbo transitivo direto; "golpe" é objeto direto, e essa é uma Oração Sem Sujeito – ou de sujeito inexistente. Por isso, se eu perguntar ao autor quem deu o golpe, ele não conseguirá me dizer. Se eu quiser passar a oração para a voz passiva, não tenho como porque, inexistindo sujeito na voz ativa, não há agente da voz passiva. Gaspari optou por uma fórmula gramatical que o exime de dizer aos brasileiros quem golpeou quem.

Como ele nega, em sua coluna, a fórmula "impeachment é golpe", mas diz que "há golpe", estamos diante do "Gato de Schrödinger" da política, que pode ser chamado de "Gato de Gaspari": há uma realidade que, não sendo golpe, porque isso ensejaria um sujeito, existe, no entanto, como objeto direto de um verbo sem sujeito. É o golpe quântico!

Não é Reinado Azevedo quem cobra uma resposta do autor. É a gramática.

Ancestral como os primeiros grunhidos.

Os outros dois que provocaram as minhas virtudes matemáticas, físicas e nunca metafísicas foram Rodrigo Janot e Roberto Barroso. Ficam para outras colunas.

Lá se foram os meus caracteres todos. Eu me apaixonei pelo Gato Quântico de Gaspari. Aquele que, embora não sendo, há.


Dólar, esperança e especulação - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 01/07

O preço do dólar em reais queima mais do que a gordura acumulada nos momentos mais intensos da crise política. Parece haver mesmo um exagero na outra direção.

É típico das instabilidades do país e, em segundo lugar, das possibilidades oferecidas pelo parque de diversões especulativas do grande mercado brasileiro. Ainda assim, está animado demais.

Registre-se antes de mais nada que o dólar chegou a custar até R$ 4,16 no terço final de janeiro deste ano. O preço então caiu, em parte porque passou o feio pânico chinês e global de fevereiro, no que o barquinho do Brasil seguiu ondas e marolas mundiais.

Em parte caiu também porque pareciam aumentar as chances de deposição de Dilma Rousseff.

Em junho, porém, o caso brasileiro pareceu excepcional, consideradas as moedas de países assemelhados, com quem costumamos andar de par nessas reviravoltas da finança do mundo.

O que houve? Isto é, se a pergunta tem alguma resposta, em se tratando de taxa de câmbio.

Nestes dias, era possível ouvir na praça gente falando de "melhoras de fundamentos" (economia pelo menos com desequilíbrios a menos). Mas não há "melhora de fundamentos". Melhora das contas externas, redução do deficit nas transações com o exterior? É notícia velha.

"Melhora de expectativas"? Sim, mas são poucas e podem se quebrar. O governo de Michel Temer tem um bom script de promessas de política econômica a ser encenado por bons atores (autoridades econômicas) ainda nos bastidores. Só.

Sim, é melhor do que a perspectiva anterior, de desastre quase certo. Porém, a "peça" da nova política econômica já havia sido anunciada.

Taxas de juros gordas? Já tínhamos. Talvez uma combinação de juros com perspectivas melhores venha alimentando a especulação no mercado futuro. Fluxo de entrada de dinheiro, capitais, "dólar", não há. No ano, estamos no vermelho.

Além do mais, o Banco Central vem desmontando sua posição no mercado de câmbio (que equivalia a uma tentativa de evitar maior desvalorização do real, os tais "swaps cambiais"). Talvez o valor dos "swaps" ainda seja alto demais (no trimestre, caiu de US$ 105 bilhões para US$ 62 bilhões).

O BC vai acelerar esse desmonte? Sob nova direção, insinuou que não vai meter a mão no câmbio. Mas não vai intervir nem para desmontar uma intervenção antiga? Pode-se dizer que há alguma vantagem no dólar "barato": redução da dívida das grandes empresas e a tradicional grande mãozinha no controle da inflação e na baixa dos juros.

Quanto ao comércio exterior, essas mexidas de curto prazo na taxa de câmbio não permitem que se diga grande coisa sobre o que se vai passar. No entanto, convém notar que as várias medidas do custo do trabalho no Brasil, "salário em dólar", estão com tendência de piora desde o início do ano (vem aumentando, cortesia de inflação e produtividade em baixa).

Não, câmbio não diz tudo sobre saldo comercial. Sim, o comércio mundial vai mal. Sim, nosso comércio exterior é pequeno em relação ao tamanho da economia e, enfim, a contribuição extra que o setor externo pode dar agora à economia talvez seja cadente. Mas, na ruína em que estamos, não convém desprezar décimos de PIB.


Sem ousadias com a inflação - JOSÉ PAULO KUPFER

O Globo - 01/07

Banco Central e CMN sinalizam preferir ir mais devagar com o corte nos juros e usar o câmbio para levar a inflação mais rápido ao centro da meta



Pouco a pouco vai ficando claro o tamanho do desafio proposto pelo governo do presidente interino Michel Temer para reequilibrar as contas públicas e, em consequência, a própria economia. Começa a se consolidar a ideia de que, além da habilidade política para aprovar e manter o teto congelado das despesas públicas, a chave do programa de ajuste é a retomada do crescimento econômico.

Sem crescimento robusto e sustentável — e não apenas com uma reversão cíclica da profunda contração em curso, que parece a caminho —, tanto maiores serão os esforços e sacrifícios para conter a trajetória explosiva da dívida pública e evitar um novo período de inflação alta, ineficiência produtiva e aumento da pobreza, como os vividos nos anos 80. A compreensão do valor superior do crescimento deriva das experiências de ajuste fiscal anteriores, todas, sem exceção, baseadas em elevação de receitas públicas, via novos tributos ou revisão de alíquotas, cujos resultados acabaram sempre se mostrando efêmeros.

Muitos podem ser os caminhos da política econômica para centrar fogo nesse objetivo primordial. Mas, sem a abertura de espaços para a redução consistente das taxas de juros, dificilmente o crescimento dará as caras, no nível em que dele se necessita.

Consumo e investimento, as principais forças propulsoras da expansão da economia, não se moverão na direção da expansão dos negócios se os juros não caírem e o custo dos financiamentos continuar nas alturas em que se encontram. Com o custo do dinheiro acima da taxa de retorno, como atualmente, não há confiança que se transforme em investimento, da mesma forma que, sem crédito relativamente farto e barato, não há demanda de consumo digna do nome que ganhe músculos.

Está aí a explicação para tanta ansiedade com a definição da política monetária, da qual a taxa básica de juros é a expressão mais importante, desde o anúncio da nomeação do economista Ilan Goldfajn para a presidência do Banco Central. Antes da apresentação do relatório trimestral de inflação, referente ao segundo trimestre, nesta terça-feira, chegaram a circular com alguma intensidade hipóteses a respeito de mudanças nas metas de inflação.

Presente na apresentação do relatório, o primeiro elaborado já em sua gestão, Goldfajn já havia desfeito qualquer possibilidade de que fosse adotada uma meta ajustada e reafirmou convicção na condução da inflação para o centro da meta como objetivo único da política monetária. Ontem, o Conselho Monetário Nacional (CMN), que reúne os ministros da Fazenda e do Planejamento e o presidente do Banco Central, preferiu evitar ousadias e manteve tudo como está desde 2005. Nem a meta de 2017 foi ajustada para cima, permitindo acelerar o corte dos juros, nem a de 2018 ficou diferente dos 4,5% de sempre.

Foi assim reforçada a mensagem, que, depois das declarações de Goldfajn dois dias antes, já havia chegado ao mercado: entre manter juros mais altos, propiciando uma taxa de câmbio mais baixa, que colabore para levar a inflação a convergir mais rapidamente para o centro da meta, ou reduzir juros para evitar que um real mais valorizado limite a competitividade dos bens e serviços exportáveis, a primeira opção será a preferida. E a expectativa de que o início de um ciclo de cortes na taxa básica já se desse em julho foi adiada para outubro ou novembro.

Vê-se, mais uma vez, como tem sido costumeiro na história econômica brasileira, que o dilema dos juros voltou ao centro do palco da política econômica. Na maior parte dos episódios anteriores — aí incluído o do Plano Real —, a tentação de se valer da taxa de câmbio como âncora para o controle da inflação redundou em crises cambiais, como na segunda metade dos anos 90, e impulsos à desindustrialização, como ao longo dos anos 2000, nos governos Lula, com o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, no comando do Banco Central.


Ficou para quando der - CELSO MING

O ESTADÃO -01/07
O governo entendeu que não podia estreitar o jogo monetário num momento de tanta incerteza


Afinal, não houve mudança relevante nas diretrizes da política monetária (política de juros). E a não mudança também diz alguma coisa.

Uma das ideias era reduzir a meta de inflação para 2018, dos atuais 4,5% para 4,0%, para que, desde já, os agentes econômicos passassem a trabalhar com uma inflação mais baixa em 2018.

Mas a proposta não passou porque o governo entendeu que não podia estreitar o jogo monetário num momento de tanta incerteza.

Antes de continuar, vamos às noções gerais. Muita gente pode achar que decisões como essa tomada nesta quinta-feira pelo Conselho Monetário Nacional (CNM),de manter tanto a meta de inflação (4,5%) como o tamanho da área de escape (bandas de flutuação para cima ou para baixo) de 1,5 ponto para 2018, não passam de providências burocráticas, ou de mais uma dessas declarações de intenção feitas para não serem cumpridas, como acontece desde 2009.





Não é para ser assim. No regime de metas de inflação é o governo, representado pelo Conselho Monetário Nacional, que define o nível de inflação que se quer cumprir a cada ano. A área de tolerância, tanto para cima como para baixo, é molejo destinado a acomodar imprevistos, como a alta de preços que nada tem com a política de juros, como o encarecimento dos alimentos em consequência de seca ou de enchentes.

Essa área de escape é necessária pelo modelo adotado por aqui. A meta de inflação tem de ser cumprida no ano-calendário, de 1.º de janeiro até 31 de dezembro. Outros bancos centrais operam com meta de inflação de 12 meses corridos (móveis) e, portanto, não precisam dessas bandas.

Cabe ao Banco Central manejar a política monetária (política de juros) para obter o resultado pretendido. Se a inflação tende a ultrapassar a meta, trata de reduzir o volume de moeda na economia, ou seja, reduz a oferta de dinheiro, o que aumenta seu preço, os juros. Se a inflação estiver dentro da meta, o Banco Central pode reduzir os juros. Quanto menos dinheiro circular na economia, mais baixa tende a ser a inflação, mais ou menos como acontece com os regimes alimentares: quem quer manter boa forma corporal tem de respeitar a dieta.

A equação não fica restrita à incógnita monetária. Também leva em conta que dinheiro mais apertado segura a atividade econômica. E aí é preciso escolher em que proporção o governo quer inflação e avanço do PIB.

A rejeição da proposta de meta mais baixa de inflação para 2018 permitirá que os juros básicos (Selic) caiam mais cedo do nível de 14,25% ao ano em que se encontram. Se a meta fosse estreitada, a política de juros teria de ser algo mais dura.

O que ainda não está claro é se o governo Temer vai cumprir a sua parte, que é consertar o desarranjo das contas públicas, principal fator de inflação nos últimos cinco anos. E subsistem, é claro, as incertezas políticas que prevalecerão até que aconteça o desfecho do processo de impeachment da presidente afastada Dilma.

CONFIRA:




O mês de junho terminou com queda das cotações do dólar diante do real de nada menos que 11%. Os analistas já vinham observando que a valorização do real é a mais acentuada entre as moedas dos emergentes, o que não deixa de ser paradoxal diante da crise que subsiste no Brasil.

Continua a incerteza
Mas a principal explicação para esse movimento é certo retorno do nível de confiança, que reduziu a saída de moeda estrangeira e aumentou a entrada. Como tudo ainda é muito precário diante das incertezas políticas, não há como definir tendência firme.

Valores que ficaram - MIRIAM LEITÃO

O Globo - 01/07

O real começou circular há exatamente 22 anos, quando em primeiro de julho de 1995 a URV se transformou em moeda. Para Pedro Malan, que presidia o Banco Central e foi ministro da Fazenda na consolidação do plano de estabilização, o país já consolidou os valores da inflação baixa e da inclusão. “Somos hoje mais intolerantes às discriminações”.

Malan explicou que o governo Dilma retomou o discurso de que um pouco mais de inflação não faria diferença. Para evitar o estouro da meta em 2014, os preços de energia elétrica e dos combustíveis ficaram artificialmente baixos. Essa distorção foi corrigida com um tarifaço.

— Aquilo desancorou as expectativas de inflação e o 6,5% passou a ser um piso. Agora, o trabalho está sendo levar a inflação de volta à meta. Não consigo imaginar um governo que adote uma atitude complacente com a inflação e que não seja punido nas urnas.

Outro valor que “deitou raízes entre nós”, segundo Malan, foi o da inclusão social e busca de uma sociedade menos desigual.

— Também não vejo nenhum governo no futuro, seja qual for sua orientação política, que possa deixar de lado o objetivo de aumentar a igualdade de oportunidades. Nós adquirimos um grau mais alto de intolerância às discriminações. Isso é um valor.

Em entrevista que me concedeu ontem, na GloboNews, ele comentou outro avanço institucional que acontece nesse momento com a Operação Lava-Jato.

— A sociedade democrática preza as liberdades e a justiça. E um dos componentes da justiça é a igualdade perante a lei. Existem discussões sobre excessos da operação, mas neste caso o próprio poder os corrige.

Malan admite que a operação tem agregado um nível maior de incerteza ao país.

— Já vínhamos com enorme grau de incerteza na área econômica por outras razões. Na política já havia uma crise de representação e conflitos entre o Legislativo excessivamente fragmentado e o Executivo à deriva. A Lava-Jato veio adicionar um grau de incerteza ainda maior, mas temos que lidar com isso e estamos lidando. Tudo o que tem acontecido no país está sendo dentro das nossas balizas constitucionais. No Supremo, oito dos 11 ministros foram nomeados nos governos Lula e Dilma. Isso faz parte das dores de crescimento de uma democracia de massas.

As perspectivas econômicas, para Malan, apontam para a volta dos superávits fiscais apenas em 2019. Sobre o crescimento, lembra que “nenhuma economia cai indefinidamente”. Ele acredita que em 2017 o país terá um PIB positivo, ainda que pequeno.

— Não existem situações difíceis que não tenham opções de saída. A solução começa por chamar gente competente e isso foi feito. É possível que a gente encontre o nosso caminho, eu acredito muito no Brasil. Vamos sair dessa.

Definindo sempre a administração Temer como “um governo interino e que a partir de agosto pode deixar de ser”, Malan aprova as medidas anunciadas na área econômica, mas disse que vê com cautela o aumento de gastos.

— Para as circunstâncias, a decisão de estabelecer um teto foi correta. Melhor do que decidir no último dia do ano, ajustando o teto ao efetivamente realizado. Mas exige várias outras medidas. O teto obriga o governo — qualquer governo — a discutir a composição do gasto, definir prioridades e avaliar diferentes programas, analisando o custo-benefício de cada um. Será necessário também dar continuidade às reformas.

Para Malan, um valor que ainda não se firmou na sociedade brasileira foi o do equilíbrio fiscal. Recentemente, os governos petistas elevaram em cinco pontos percentuais do PIB as despesas e isso não pode ser revertido rapidamente.

Na avaliação dele, até abril de 2006, a política econômica do governo Lula não diferiu em nada da praticada pelo governo Fernando Henrique. A partir daí, começou o aumento de gastos. Quando veio a crise de 2008, a aposta foi dobrada. As políticas para evitar a recessão foram entendidas como uma licença para continuar ampliando as despesas. No governo Dilma houve “perda total de controle com subsídios e desonerações e a continuidade das apostas. Tudo era possível porque desejável”.

O Brasil, segundo Malan, “tem um lado moderno e um lado anacrônico”. E sua esperança é que o lado moderno prevaleça sobre o anacrônico.


Investimento em imóveis nos EUA - CRISTINA DE HOLLANDA E ANA PAULA BARCELLOS

VALOR ECONÔMICO - 01/07

Seja qual for a estrutura de aquisição de propriedade a ser adotada, a tributação nos EUA não pode ser evitada

Muitos brasileiros, por razões variadas, têm decidido investir no mercado imobiliário norte-americano, que continua a oferecer segurança e rentabilidade, sobretudo em cidades como Miami e Nova York. Estima-se que, em 2015, apenas na área de Miami, o setor tenha recebido investimentos de mais de US$ 6 bilhões, boa parte de origem brasileira. Nada obstante as vantagens, o ingresso em outra ordem jurídica exige cuidados, sobretudo para minimizar os múltiplos impactos tributários que essa espécie de investimento possa atrair.

O status fiscal de um estrangeiro perante o Fisco norte-americano (IRS) não é alterado, por exemplo, pelo fato de ele possuir um imóvel no país. No entanto, o estrangeiro pode ser considerado residente para efeitos fiscais em qualquer ano em que esteja presente no país: (a) por 183 dias ou mais, ou (b) por 31 dias ou mais, desde que, neste caso, a presença tenha sido "substancial" ao longo de um período de três anos. Os tempos de visita aos EUA devem ser monitorados, portanto.

E isso porque, caso seja considerado residente fiscal, o estrangeiro sujeita-se ao Imposto de Renda americano em sua receita global, bem como a uma série de deveres acessórios de informação acerca de ativos mantidos fora dos EUA. Não existe no momento acordo de bitributação entre Brasil e Estados Unidos, mas há acordo prevendo troca de informações fiscais, e o IRS admite, na hipótese de tributação global, crédito fiscal estrangeiro.

Além disso, caso a ideia seja adquirir e alugar bens imóveis nos Estados Unidos, indivíduos não residentes e entidades estrangeiras estão sujeitos a Imposto de Renda federal sobre essa espécie de rendimento. Impostos estaduais e locais também podem ser aplicados. No âmbito federal tanto a base de cálculo quanto a alíquota variam de forma importante conforme o IRS entenda que o proprietário esteja ou não engajado em uma atividade econômica de locação de imóveis.

Embora não haja imposto federal sobre a transferência ou sobre a propriedade de bens imóveis em si, Estados e cidades podem tributar tais operações, e frequentemente o fazem. Há ainda impostos estaduais sobre a valorização do imóvel, o que deve ser considerado de forma cuidadosa dependendo dos objetivos do investimento.

Uma outra questão por vezes negligenciada pelos investidores envolve a transmissão post-mortem, seja por testamento ou sucessão. A transferência atrai imposto federal de até 40% (observada isenção de US$ 60 mil), inclusive em relação a participações em empresas que possuam bens nos EUA. Alguns Estados, como Nova York, também tributam herança.

Parte das questões referidas acima passa, claro, pela definição de como adquirir propriedades nos EUA. Uma opção popular entre os investidores é constituir uma sociedade de responsabilidade limitada norte-americana (LLC) para esse fim. Embora uma LLC possa se aproximar da sociedade limitada brasileira sob alguns aspectos, a analogia para fins fiscais é enganosa. As distribuições de uma LLC com mais de um membro a sócio não residente estão sujeitas à retenção na fonte, e o uso de uma LLC não afasta o imposto de transmissão, já que o IRS trata a participação societária em uma LLC como ativo localizado nos EUA. Ou seja: nem sempre o uso de uma LLC será uma boa solução.

Além da necessidade de um planejamento fiscal global adequado, o investidor deve estar atento igualmente a outras exigências do fisco norte-americano. A partir de 2016, por exemplo, o IRS anunciou que passará a exigir das companhias de seguros informação acerca da identidade de sócios de entidades que adquiram bens imóveis em dinheiro. Inicialmente, as regras serão aplicadas apenas em Manhattan (para transações envolvendo propriedades no valor de mais de US$ 3 milhões) e em Miami (para propriedades no valor de mais de US$ 1 milhão). A perspectiva é que o programa seja expandido e ampliado, de modo a combater a evasão fiscal e lavagem de dinheiro.

Finalmente, a Casa Branca anunciou recentemente que pretende encaminhar propostas para novas regras destinadas a limitar o uso de entidades norte-americanas em esquemas de ocultação de ativos. Dentre elas, a exigência de uma diligência mais rigorosa sobre investidores estrangeiros.

Em resumo, seja qual for a estrutura de aquisição de propriedade a ser adotada, a tributação nos EUA não pode ser evitada. Será importante, assim, evitar o modelo "one size fits all" e escolher uma estrutura adaptada às circunstâncias e objetivos pessoais do investidor, a fim de mitigar o impacto tributário sobre a propriedade.

Cristina de Hollanda e Ana Paula de Barcellos são, respectivamente, consultora jurídica de Sheldrick & Co, advogada no Brasil e nos Estados Unidos, membro do Comitê de Assuntos Inter-Americanos e do Conselho de Direito Internacional da Ordem dos Advogados da Cidade de Nova Iorque (NY City Bar); sócia consultora do BFBM Advogados, consultora jurídica sênior de Sheldrick & Co, professora de direito constitucional da UERJ, vice-presidente da Comissão de Direito Constitucional da OAB-RJ

Uma visão tropical - FERNANDO GABEIRA

O Estado de S. Paulo - 01/07

Batalhões de intérpretes vão analisar as consequências mundiais da saída do Reino Unido da União Europeia. Aqui, nos trópicos, essa experiência traumática me conduz a inúmeros caminhos. O que é possível aprender com esse salto no escuro?

Já havia refletido sobre o tema quando li o ensaio de Tony Judt Europa, a Magnífica Ilusão (em Quando os Fatos Mudam, Editora Objetiva). Uma das ilusões que o choque do petróleo, na década de 1970, balançou foi a de um crescimento estável, de uma superação definitiva do passado. O otimismo dos primeiros anos tornou-se mais prudente.

Uma crença importante para mim, e talvez a mais necessária: a ideia da Europa uniu ambições filosóficas e poder administrativo. Para seus admiradores, a União era uma herdeira do despotismo esclarecido do século 18.

Um grande projeto racional levou um tombo. Daí a perplexidade de todos: diante de tantos argumentos a favor, ainda assim os britânicos optaram por sair.
Grande parte dos eleitores era de idosos e eles votaram para retornar ao Estado-nação do século 19. Estava ainda nítido em sua lembrança.

Que condições levam a maioria a optar pela pior saída? Esse é um tema que me interessa aqui. Na Europa, creio que o declínio do Estado de bem-estar social, as crises econômicas e, finalmente, essa grande onda de imigrantes tiveram seu peso.

Desde a década dos 70, partidos de extrema direita cresceram com o discurso nacionalista. Na França, Jean-Marie Le Pen, com sua Frente Nacional, chegou a disputar com Jacques Chirac o segundo turno das eleições presidenciais.

Felizmente, perdeu: seria, de novo, um baque da razão. Mas aí é que entra a minha hipótese: quanto mais grave fica a situação econômica e social, mais possibilidades existem para saltos no escuro, como esse dado no Reino Unido.

O Brasil tem uma conjunção mais desfavorável: a crise econômica será longa e o sistema político está em frangalhos.

Felizmente, as vozes que se voltam para um passado ditatorial são minoritárias e inexpressivas. Ainda assim, a maturidade democrática pode ser abalada por outros fatores.

Um deles observo no Rio de Janeiro, com a quase falência do Estado. Serviços públicos estão entrando em colapso. Aumentam os assaltos e assassinatos. Num clima de grande complexidade, aparecem inúmeras falsas, mas simples, soluções. A pena de morte, no meu entender, é uma delas.

Outro tema europeu que me faz pensar por aqui: a reforma da previdência. O tema passou por inúmeros debates. De um ponto de vista estratégico, considerando a realidade demográfica, as reformas seriam necessárias. Elas, contudo, entram em conflito com as aspirações eleitorais.

Europa e Brasil são diferentes, mas é um conflito comum. Lá as hesitações e mudanças na previdência tiveram seu clímax dramático na Grécia.

Pode ser uma conclusão singela, porém o desenrolar do processo europeu mostra como é equivocada, no Brasil, uma tática do tipo quanto pior, melhor. O quanto pior é pior, uma vez que assim aumentam as possibilidades de decisões equivocadas.

Grandes construções racionais podem e até devem nos mover. É preciso, no entanto, não as confundir com a realidade com suas arestas. E, sobretudo, admitir que milhões não estão tão seguros dessa racionalidade e resolvem retroceder.

Aquela imagem de Tony Judt sobre o despotismo esclarecido herdado do século 18 me impactou de várias maneiras. Até que ponto ele sobrevive num contexto de democracia plebiscitária?

Os defensores dos grandes projetos racionais precisam também da habilidade que às vezes se adquire na cotidiano das lutas minoritárias. A maioria é difícil de alcançar e sempre muito volátil.

Não sei se, tão distante da Europa, posso opinar. Mas a confiança no triunfo racional leva a uma certa superestimação do próprio argumento. O assassinato da jovem deputada trabalhista Jo Cox por um fanático nacionalista chegou a despertar a esperança de que a Europa triunfasse.

Nem sempre a razão em política triunfa. Não se trata de abandoná-la. Mas admitir que estamos sujeitos a inúmeros processos corrosivos, sobretudo a crises econômicas e, no caso brasileiro, às outras dimensões dramáticas.

Teremos consultas populares em 2016 e 2018, ainda com um grande número de desempregados, tensões de toda ordem, sobretudo no serviço público, e um sistema político desintegrado, agora posto a nu pela Operação Lava Jato.

Mesmo confiando na resposta da sociedade, considero que entramos num período de vulnerabilidade. Um período aberto a aventuras, propostas demagógicas.

Nem todos recebem a crise da mesma maneira. A ideia de uma devassa na política e, simultaneamente, a reconstrução econômica parece uma saída racional.

A ação da Lava Jato é majoritariamente aprovada. Já a reconstrução econômica implica vencedores e perdedores, alguns simplesmente empatados. Como seguir um caminho que parece racional, mas às vezes não é majoritário?

A decisão inglesa de sair da União Europeia deu um susto. Mas pode ser até pedagógica se, no futuro, vierem a reconhecer que se tratou de uma decisão equivocada.

Certamente a União Europeia vai seguir o seu caminho. Mas pelo menos ficou claro que a História não tem script, não é um desdobramento triunfante de um projeto cerebral.

Temos de estar preparados para tudo. Para tudo e um pouco mais, como é o caso do Brasil em crise.

Com instituições funcionando, a sociedade informada e algumas medidas certas na economia, o Brasil pode sair dessa, mas a experiência mostra como são traiçoeiros e surpreendentes os caminhos da própria democracia.


Péssimas ideias - HÉLIO SCHWARTSMAN

Folha de SP - 01/07

A tarefa é inglória, mas vou defender o deputado Jair Bolsonaro. Ou melhor, vou defender que ele tem o direito de exprimir qualquer ideia bizarra que lhe passe pela cabeça sem ter de responder por incitação ao crime.

Penso até que a Primeira Turma do STF, que decidiu torná-lo réu por ter dito asneiras envolvendo uma deputada e o delito de estupro, se apoiou num fóssil jurídico, que é o artigo 286 do Código Penal, para fazer populismo. Numa só tacada, deram um chega para lá numa figura que pessoas civilizadas desprezamos e ainda fizeram uma média com as mulheres.

Não tenho nada a favor de Bolsonaro e nada contra as mulheres, mas me parece difícil conciliar as interpretações mais modernas e amplas do princípio da liberdade de expressão com o tipo penal de incitação ao crime, que já deveria ter sido extirpado do código. Esse é um enquadramento que serve bem para calar ideias e criminalizar grupos, mas que pouco ou nada faz pela paz social.

Se alguém acha que uma conduta hoje qualificada como crime é positiva, deve ter plena liberdade de dizê-lo. A polícia e os tribunais só devem ser acionados se a pessoa tentar cometer o ato. O próprio STF já adotou essa linha, quando declarou que as marchas da maconha são legais.

E não é só a incitação ao crime que deveria ser revogada. Na mesma categoria entram a apologia do crime, leis de desacato, de difamação de religiões e alguns aspectos dos delitos contra a honra. Não estou propondo nada que abalará os alicerces do Estado e da família. Em seguidos relatórios publicados desde os anos 90, a bem-comportada OEA pede que seus membros anulem alguns desses dispositivos, por julgá-los incompatíveis com o artigo 13 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

No mais, como já ensinava Stuart Mill, precisamos que as péssimas ideias, terreno em que Bolsonaro excele, circulem para que as boas possam confrontá-las e, assim, triunfar.


De costas para a realidade - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 01/07

Dilma Rousseff está afastada da Presidência da República porque responde à acusação formal de ter cometido crimes de responsabilidade. Mas completa o quadro seu catastrófico desempenho à frente do governo, que é condenado por 2 em cada 3 brasileiros. Legitimamente eleita em outubro de 2014, ela perdeu a legitimidade conquistada nas urnas no momento em que a esmagadora maioria dos brasileiros se deu conta de sua clamorosa incompetência política e gerencial e das mentiras a que recorreu para haver o segundo mandato. Dilma, portanto, é uma página virada da História, como deverá ser confirmado até o fim de agosto com a aprovação definitiva do impeachment pelo Senado. Mas ela finge não saber disso.

Estimulada pelas naturais dificuldades que o presidente em exercício Michel Temer tem enfrentado – muitas que ele próprio está criando –, Dilma passou a cultivar um “otimismo realista” em relação à sua recondução ao Palácio do Planalto e está mergulhada numa frenética e delirante tentativa de viabilizar esse retorno pelos meios à sua disposição. A imaginação nunca foi um de seus melhores atributos, mas agora, num tour de force, ela compartilha a autoria de uma “carta aos brasileiros” que é um verdadeiro conto de fadas. Os termos desse documento, a que teve acesso o jornalista Raymundo Costa, do jornal Valor, foram adiantados na quinta-feira.

A tal “carta” parte do princípio imaginoso de que após a reeleição Dilma buscou “reconciliar o País”, tentando aproximar-se das ideias econômicas defendidas pela oposição. Seria esse o sentido da nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda. Mas essa tentativa, segundo ela, foi “sabotada pela direita” e pelas pautas-bomba do Congresso. Dilma se diz disposta agora a, de volta ao governo, retomar o programa “popular” que apresentou na campanha e não cumpriu, pelo que foi acusada, por seus próprios seguidores, de cometer um “estelionato eleitoral”.

Tentando entender: Dilma se arrepende de tudo o que fez na área econômica no primeiro ano de seu segundo mandato e agora quer voltar à Presidência para retomar a “nova matriz econômica” lulopetista que levou o País à falência. Assim, em matéria de política econômica Dilma confessa que errou duas vezes. A primeira quando, no primeiro mandato, perseverou na “nova matriz econômica”. A segunda, no segundo mandato, quando tentou corrigir o erro anterior entregando a economia nas mãos do “neoliberal” Joaquim Levy, que sabotou como pôde e lhe fez gosto. Felizmente, não deverá ter oportunidade de errar uma terceira vez.

As explicações de Dilma para o malogro de sua suposta tentativa de “reconciliar o País” em 2015 são ridículas. A “sabotagem da direita” colide com o fato de que estava à frente da Fazenda exatamente alguém acusado pelo PT de ser de direita. As pautas-bomba foram o resultado de sua falta de competência e habilidade na relação com o Parlamento. Dilma preferiu manter senadores e deputados a distância, tratando-os, nas raras oportunidades em que os recebia, com arrogância. Pagou por isso.

Há dias, em entrevista, Dilma repetiu a tese de que está sendo vítima de um golpe e confirmou a intenção de divulgar a tal carta de compromisso com a qual pretende fortalecer a hipótese de retomar a Presidência. E partiu para o ataque. Prometeu “devolver os direitos que estão sendo retirados dos brasileiros” e minimizou a importância do reajuste de 12,5% concedido pelo governo interino aos beneficiários do Bolsa Família, superior aos 9% por ela prometidos antes de ser afastada. Garantiu que esse reajuste foi o resultado da “cobrança” dos petistas. E, sem corar diante da espantosa incoerência, acusou Temer de “absoluta irresponsabilidade fiscal” pelo fato de ter concedido aos servidores federais o aumento de salário com o qual ela própria já se havia comprometido.

Como se vê, Dilma desistiu da ideia demagógica e inviável da convocação de um plebiscito para decidir sobre a antecipação das eleições presidenciais. Mas seu estoque de propostas delirantes movidas pelo desespero é inesgotável. Só não se encontra ali algo parecido com a intenção de discutir a sério os problemas do País. Desse mato não sairá coelho.


Pouca renda, muito gasto - ELIANE CANTANHÊDE

O ESTADÃO - 01/07

O êxito (ou sobrevivência...) do governo Michel Temer depende de um complexo equilíbrio num tripé, especialmente enquanto o impeachment definitivo de Dilma Rousseff não vem: opinião pública, Congresso Nacional e o chamado “mercado”. Quando ele joga excessivamente o peso numa dessas pernas, as outras duas se ressentem. Quando joga em duas, a terceira ameaça ruir.

Para não assombrar ainda mais a opinião pública, Temer tem de repetir, dia sim, dia não, que não quer, não pretende e não pode ameaçar a Lava Jato e, além disso, precisa gastar lábia e recursos para neutralizar o discurso de Dilma e do PT de que ele vai enxugar os programas sociais e acabar com a Bolsa Família.

Foi por isso que Temer anunciou um reajuste médio de 12,5% no Bolsa Família, pegando carona numa solenidade de liberação de R$ 742, 8 milhões para a educação básica de Estados e municípios. É o primeiro reajuste do programa central da era petista em dois anos, com um porcentual maior, inclusive, do que os 9% que Dilma prometeu em maio, mas ainda não tinham sido aplicados. Logo, os 12,5% são mais políticos do que econômicos ou sociais.

Ainda em sintonia com a “opinião pública”, Temer achou muito mais prudente levar adiante o aumento salarial do Judiciário e do Ministério Público do que alegar a imensidão da crise para adiar a medida. Em público, ele argumenta que Dilma já tinha assumido o compromisso, a tramitação já estava avançada no Congresso e, afinal, o valor já fora “precificado” no rombo de R$ 170 bilhões. Em privado, admitiu: é melhor pagar o preço do que amanhecer com o Judiciário e o MP detonando uma temporada de greves no serviço público.

Se contemplada a opinião pública, que não quer nem ouvir falar na volta de Dilma, mas também não morre de amores por Temer, ele cede em todas no Congresso e não titubeou um minuto antes de atender à novíssima pressão dos senadores, que ameaçaram não aprovar a medida provisória que dá fôlego financeiro à Infraero se ele não se comprometesse a vetar a cláusula que abre 100% das empresas aéreas brasileiras ao capital estrangeiro. O Senado estava, evidentemente, atendendo ao lobby do setor, apesar de a Latam ter um pé no Chile e a Avianca, na Colômbia. E quem é mesmo dono da Azul? Mas o Planalto fechou os olhos para esses “detalhes” e topou o veto.

É também com um olho na real crise dos Estados e com o outro na influência dos governadores em suas bancadas em Brasília que Temer, camarada, abriu mão de receber boa parte do pagamento da dívida dos Estados que não fizeram o dever de casa e estão devendo até salário de funcionários, aposentados e pensionistas. Como se apenas os Estados estivessem endividados e a União estivesse nadando em dinheiro...

Somando os R$ 50 bilhões que o governo federal deixará de receber dos Estados endividados nestes três anos aos R$ 25 bilhões estimados com o aumento do Judiciário até 2019 e aos R$ 2,1 bilhões ao ano com o reajuste do Bolsa Família, o resultado é: o governo Temer anda muito perdulário para quem chora tanto a falta de dinheiro e o tamanho do rombo fiscal. Sem contar que a prioridade do País é criar emprego para quem não tem, não aumentar o salário dos que já têm.

É aí que entra a terceira ponta do tripé. O tal “mercado” dá de ombros para a Lava Jato e para escândalos e só pensa naquilo: a recomposição da economia brasileira. Mas, se Temer abre tanto a guarda para agradar a opinião pública e o Congresso, no que ele conseguirá se distinguir de Dilma na sobriedade com as contas públicas? Dilma torrou o que tinha e o que não tinha na eleição de 2014. Temer pode estar torrando a confiança do empresariado na transição de 2016 – e, com ela, suas chances. A perna do tripé que mais torce e trabalha pelo sucesso de Temer é justamente o setor produtivo, no campo e nas cidades.


A fatura inevitável e insustentável - CESAR FELÍCIO

Valor Econômico - 01/07

Para garantir o longo prazo, Temer negocia a situação imediata


O verdadeiro custo da disputa pelo poder não está nas contas por dentro ou por fora das campanhas eleitorais, ainda que estas não sejam de modo algum irrelevante. De acordo com um especialista em campanhas eleitorais, o caixa dois nas campanhas foi dez vezes superior ao caixa um em 2014, estimativa que projetaria gastos acima de R$ 1 bilhão para o caso da campanha de recondução de Dilma Rousseff.

A fatura pesada da guerra política fica no Tesouro. Estados, municípios, servidores públicos, empresários, aposentados e população vulnerável, todos e cada um, receberam fluxos de recursos da União em algum momento durante a derrocada petista e a tentativa do PMDB de ganhar legitimidade para manter-se no Planalto.

Em um quadro de instabilidade política como o atual, este custo aumenta, porque administrar escassez é nitroglicerina pura: iniciativas de austeridade econômica são procíclicas, sempre potencializam a tempestade. Pacotes de arrocho, rezam os manuais, devem ser aplicados quando se tem prestígio popular para perder. Não por outra razão Joaquim Levy foi engolfado pela guerra em 2015. Suas tentativas de ajuste erodiram as bases de apoio de Dilma no Congresso e na sociedade, e esta erosão foi decisiva para o insucesso do ministro.

A história do primeiro mandato de Dilma Rousseff havia sido o da construção de sua candidatura à reeleição, rompendo um pacto tácito de se devolver o poder a Lula em 2014. Contestado dentro de sua própria base, Dilma necessitava de uma política expansionista de gastos para sedimentar a aliança que a sustentou, e a realizou, como a história das pedaladas fiscais, pretexto para sua desgraça atual, comprova.

A tática de Temer é outra: o novo governo, com dependência absoluta do Congresso para subsistir, precisa liquidar compromissos, antes de ajustar a máquina.

Daí se compreende ter sido colocado um sarrafo tão alto para o déficit público, como demonstrou a jornalista Denise Neumann no blog "Casa das Caldeiras", do Valor PRO, em artigo no dia 29. O déficit primário do governo central foi fixado em R$ 170 bilhões, um valor superestimado diante do dispêndio dos 12 últimos meses de governo Dilma Rousseff, mesmo considerando a despesa para quitar as pedaladas fiscais. Sem o pagamento extraordinário das pedaladas, conforme demonstra Denise, o negativo entre 2015 e 2016 ficou em R$ 90 bilhões no período de um ano encerrado em maio.

Em mês e meio de governo, Temer concedeu uma moratória na prática às dívidas dos governos estaduais, referendou um aumento ao funcionalismo e anunciou a elevação dos benefícios do Bolsa Família. Também enviou ao Congresso a emenda constitucional que congela gastos públicos, em um claro movimento negocial: para entregar um modelo de longo prazo do agrado do mercado, aceita-se um curto prazo conveniente para a classe política.

Mais concessões no curto prazo podem estar por vir. Na próxima semana, o prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda, líder da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), deve voltar à carga em Brasília pedindo um acordo de renegociação da dívida das prefeituras nos mesmos moldes do vantajoso acordo fechado pelos Estados, com suspensão do pagamento por seis meses.

Não se trata de uma opção para Michel Temer: dada às circunstâncias, não havia outro caminho para o presidente interino. Temer não poderia ampliar a galeria já numerosa de seus inimigos sem ter um pilar no qual se sustentasse, sob pena de enfrentar fenômenos como uma greve geral do funcionalismo, gente se manifestando nas ruas e governadores e prefeitos articulando em favor de Dilma no Senado. A manutenção de uma meta fiscal com superávit levaria a este resultado ou a uma nova fraude fiscal semelhante às que selaram o destino de Dilma.

O ano de 2016 precisa ser um ano das concessões porque concretamente se disputa, de modo indireto, uma espécie de quarto turno da eleição presidencial de 2014. O desafio de Temer é maior que o de Itamar Franco em 1992. Na ocasião, o substituto de Fernando Collor subiu ao poder em uma conjuntura de consenso, uma vez que havia dois marcos em que a competição política poderia se dar dentro de marcos aceitos: o plebiscito entre presidencialismo e parlamentarismo, agendado para seis meses após o impeachment de então; e a eleição presidencial de 1994.

O lastro popular de Itamar era melhor logo em sua largada. Ao assumir, o então interino contava com 18% de aprovação para a sua administração. Em seu primeiro teste nas pesquisas, Temer obteve 11,3% de conceitos bom ou ótimo.

Uma das inovações de caráter saneador que deve ser aplicado nas eleições municipais deste ano é a divulgação das doações de pessoas físicas a candidatos, pela internet, até 72 horas depois do ingresso de recursos. A ferramenta poderá deixar claro as limitações que a nova legislação eleitoral possui. O tempo de fiscalização será exíguo para a checagem de uma lista pulverizada de doadores para mais de 500 mil candidatos.

Na visão do Ministério Público Federal em São Paulo, poderemos assistir a um fenômeno de compra de CPFs, como antigamente havia o da compra de votos. A divulgação na internet permite a checagem, mas é possível voar abaixo dos radares. Não será possível cruzar dados, por exemplo, de doadores de campanha com contribuições inferiores a R$ 2,5 mil que sejam isentos do imposto de renda. "A gente não tem a ilusão de que teremos este ano a eleição mais limpa de nossa história", comentou o procurador regional Luiz Carlos Gonçalves.


Carnot e o pré-sal - JOSÉ CARLOS ALELUIA

O Globo - 01/07

O que se propõe é conferir à Petrobras não a obrigatoriedade, mas a preferência para ser operadora dos blocos a serem contratados sob o regime de partilha



Sadi Carnot (1796-1832) foi um engenheiro e militar francês que revolucionou a ciência ao apresentar os fundamentos da segunda lei da termodinâmica. A história conta que ele, filho de um ministro da Guerra, ficou obstinado em provar que a vitória inglesa nas batalhas napoleônicas estava ligada ao maior domínio da energia — mais especificamente, do motor a vapor. Com este intuito, publicou sua única obra em vida, que não só descrevia o funcionamento de um motor, mas reforçava a importância industrial, política e econômica dessa revolução tecnológica.

Dois séculos depois, a matriz da revolução descrita por Carnot — hidrocarbonetos — ainda representa 80% da energia consumida no mundo. É nesse contexto que o Congresso Nacional discute a reforma da lei de exploração e produção de petróleo no pré-sal. Aparte os discursos movidos por paixão, ideologia e corporativismo, o que se debate é qual o melhor modelo a ser adotado para os próximos anos. Tal qual um “Ciclo de Carnot”, buscamos a máxima otimização de um recurso estratégico sem grandes perdas durante o processo.

O PL 4567/16 , de autoria do senador José Serra (PSDB-SP), ao qual apresentei parecer favorável em comissão especial da Câmara, não define uma resposta à questão. Melhor: torna-a flexível. Pela lei atual (nº 12.351/2010), cabe à Petrobras a obrigatoriedade de participar com no mínimo 30% do consórcio vencedor. É preciso resolver esse impasse que inviabiliza a produção, pois, em decorrência da crise que atinge a empresa, as sucessivas reduções de investimentos preocupam.

O que se propõe é conferir à estatal não a obrigatoriedade, mas a preferência para ser operadora dos blocos a serem contratados sob o regime de partilha. Fica estabelecido que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), em caso de negativa, realizará a licitação, podendo ainda a Petrobras participar do certame. O projeto também preserva a competência do Executivo para ditar os rumos dos leilões das diferentes áreas e as políticas de conteúdo nacional de insumos para o setor.

Ou seja, em nada altera as regras de pagamento de participações governamentais, de tributos e de determinação do excedente em óleo da União, resguardando — e até ampliando — a arrecadação de royalties para a educação. Também estão preservados os poderes da ANP e da empresa pública Pré-Sal Petróleo S/A (PPSA) para regular e fiscalizar o cumprimento dos contratos de partilha de produção, bem como a autonomia da União para controlar a velocidade do aproveitamento dos recursos petrolíferos. Em resumo: o projeto não altera em nada a soberania nacional, ao contrário do que dizem aqueles que tendem a encarar o debate menos pela razão e mais pela emoção ou posição política. “Pior do que o monopólio do petróleo é o monopólio do patriotismo”, disse um dos especialistas consultados.

Após oito audiências públicas na comissão e um seminário que promovi como presidente da Fundação Liberdade e Cidadania (instituição ligada ao Democratas), o que concluímos é que não existe melhor ou pior regime, existem regimes diferentes, mais ou menos adequados a cada situação particular. O regime mais inadequado é aquele que impede o aproveitamento das nossas riquezas petrolíferas.

No Plano de Negócios e Gestão 2015-2019 da Petrobras, apresentado em janeiro deste ano, o volume total de investimentos foi estimado em US$ 98,4 bilhões. Isso representa uma diminuição de 24,5% em relação ao valor previsto apenas seis meses antes e 42,1% a menos do que o Plano de Negócios 2011-2015. Mantidas as regras que limitam a participação da iniciativa privada, em 2019 estaremos produzindo menos petróleo que hoje.

O debate que fizemos na comissão foi amplo e contou com a participação de todas partes interessadas, desde o próprio autor José Serra, empresários do ramo, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro e da Universidade Nacional de Brasília, além de representantes de associações, sindicatos, clubes de engenharia e prefeituras de municípios produtores. Saio convencido de que este marco legal carece de alterações ainda maiores, embora estejamos priorizando a celeridade no resgate de investimentos no setor.

A obstinação de Carnot em pesquisar e provar, por meio da ciência, os motivos pelos quais a França perdeu a guerra levou à teorização de uma revolução energética. Dois séculos depois, tomo a frase de um geólogo renomado para lembrar que “o petróleo é encontrado na mente dos homens”. Cabe ao debate franco, livre de preconceitos ideológicos e falsas premissas, encontrar a melhor forma de produzi-lo.


O sistema ainda funciona? - FERNANDO DANTAS

O ESTADÃO - 01/07

Com 35 partidos registrados no Tribunal Superior Eleitoral e 27 deles representados na Câmara de Deputados, uma presidente em processo de impeachment, a economia devastada pela crise de governabilidade e uma colossal coleção de escândalos de corrupção, o Brasil tem um sistema político difícil de defender.

O regime foi nomeado de “presidencialismo de coalizão” em 1988, ano de promulgação da Constituição, pelo cientista político Sérgio Abranches. Como o termo sugere, cada presidente tem que formar uma coalizão partidária para governar, já que nenhum partido político brasileiro é, nem de longe, grande o suficiente para garantir maioria nas duas casas do Congresso. Mesmo alianças de dois ou três partidos são insuficientes, quando se considera que as necessárias emendas constitucionais exigem sólidas maiorias de 3/5.

À primeira vista, o presidencialismo de coalizão parece um sistema pouco inteligente e nada prático de governar um país. Afinal, é evidentemente difícil para o Executivo liderar uma base parlamentar com diversos partidos, cada um com seus interesses e bandeiras particulares. A forma de arrebanhar maiorias para as medidas de governo inclui necessariamente expedientes fisiológicos, como a distribuição de cargos e verbas, quando não descamba para esquemas ilegais.

Entretanto, apesar de todos esses problemas, e da visão negativa da sociedade sobre a forma de fazer política no Brasil, há um grupo de cientistas políticos que considera que o presidencialismo de coalizão funcionou razoavelmente bem no Brasil desde a redemocratização. Eles alegam, para começar, que o País fez progressos notáveis desde a década de 80, como a própria democratização, o fim da hiperinflação e os grandes passos na inclusão social. Se o sistema político fosse tão ruim assim, como se explicariam esses avanços?

De forma simplificada, a visão é de que os presidentes no Brasil têm poderes fortes, podendo emitir medidas provisórias, iniciar legislação, pedir urgência para matérias em trâmite no Congresso, vetar leis, comandar o processo orçamentário e criar e extinguir ministérios e estatais. Isto daria a capacidade de consolidar maiorias no Congresso, mediante repartir o governo com os partidos aliados e atender demandas mais paroquiais dos políticos, mas que não necessariamente resvalam para o terreno ilegal.

Mesmo com a grande crise política e econômica atual, alguns pesquisadores consideram que, ainda que de maneira conturbada e sofrida, a democracia brasileira continua a avançar na direção certa.

Abranches, que batizou o sistema, vê em ação “instituições resilientes e mecanismos que levam a soluções de impasses”. A atual crise, para ele, ecoando os tempos de Collor, deriva em grande parte do fato de a presidente afastada, Dilma Rousseff, não ter nenhuma habilidade no trato com o Congresso, o que é obviamente fundamental no presidencialismo de coalizão. Em linha semelhante, o cientista político Carlos Pereira acha que os governos do PT monopolizaram demasiadamente o poder nas próprias mãos do partido, em detrimento dos aliados, levando aos escândalos (uma via torta de conseguir as maiorias) e à crise do impeachment de Dilma. Pereira já vê avanços de governabilidade no governo Temer, no qual o PMDB repartiu bastante o governo com os partidos aliados.

De qualquer forma, os dois pesquisadores observam que, apesar de relativamente funcional, o sistema político necessita de reparos. Esta agenda menos ambiciosa e, portanto, mais factível, inclui itens como cláusulas de desempenho para conter a fragmentação partidária, fim das coligações proporcionais e mudanças (que já começaram) no financiamento das campanhas. Se este diagnóstico estiver certo, a crise atual são as dores de um sistema em penosa evolução, mas não em desmoronamento.

*Colunista do Broadcast, serviço de informações da Agência Estado, e consultor do Ibre/FGV

Bondades versus confiança - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 01/07

O governo vai precisar da confiança de empresários e consumidores para conduzir o País de volta ao crescimento e, ao mesmo tempo, para iniciar a execução de uma ambiciosa pauta de reformas. Precisará também de apoio político, especialmente no Congresso, e cada passo importante poderá exigir negociações. Sinais de confiança começam a aparecer, mesmo num quadro de muita incerteza, e reforçam o capital político do presidente em exercício Michel Temer. Mas ele e sua equipe devem cuidar desse capital, para no mínimo preservá-lo até a conclusão do processo de impeachment. Se o governo provisório se tornar permanente, terá mais força para decidir e negociar. O perigo, até lá, será ceder muito facilmente e exagerar nas bondades. Se cometer esse erro, decepcionará quem hoje aposta em sua vocação para mudar, será mais vulnerável a pressões e terá dificuldades muito maiores para eliminar os grandes desajustes.

O País “começa a andar” e há indícios de aumento da confiança de consumidores e de empresários, disse na quarta-feira, em São Paulo, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. Sondagens divulgadas nos últimos dias confirmam a melhora – ainda incipiente, mas sensível – das expectativas. Indicadores do comércio e do setor de serviços publicados pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) mostram aumento da confiança em relação aos próximos seis meses. No caso do comércio, o índice de confiança atingiu o maior nível desde maio do ano passado. Além disso, a elevação da média móvel trimestral, de 2,2 pontos, foi a maior desde março de 2010. Embora seja cedo para falar de otimismo, sondagens do setor industrial têm apontado sinais mais favoráveis no cenário de negócios.

Ao analisar os últimos números da atividade industrial paulista, o empresário Paulo Francini, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), confirmou essa nova percepção. Antes do crescimento vem a estabilidade e, antes desta, a redução da queda, comentou, logo acrescentando: “Nós estamos nesta fase”. Em maio, o indicador de nível de atividade da Fiesp foi 1% menor que em abril, na série sem efeitos sazonais. No ano, o nível médio foi 10,1% mais baixo que nos primeiros cinco meses de 2015. Apesar dos números ainda muito negativos, o índice de expectativas, o Sensor Fiesp, situou-se em junho no mais alto nível desde setembro do ano passado.

O mesmo tom tem aparecido em comunicados de importantes segmentos da indústria. Em maio, 469 postos de trabalho foram fechados nas fábricas de produtos eletroeletrônicos. Foi a 16.ª queda consecutiva do nível de emprego, mas a notícia foi divulgada pela associação das empresas do setor, a Abinee, com um toque positivo: “O resultado, o menor desde fevereiro de 2015, indica uma diminuição no ritmo das demissões”. Em março deste ano, segundo a nota, 2.856 pessoas haviam sido demitidas.

Enquanto o humor começa a melhorar lentamente na frente empresarial, o governo tenta avançar pelo caminho da menor resistência no dia a dia da política. O pacote de bondades do presidente em exercício já chegou a R$ 125 bilhões em gastos e renúncias fiscais, segundo o Estado. A lista de benefícios é variada. Inclui reajustes salariais para o funcionalismo, aumento de 12,5% para o Bolsa Família, renegociação das dívidas de Estados com o Tesouro Nacional, ajuda ao Rio de Janeiro para a segurança nos Jogos Olímpicos, além de outros itens.

Algumas bondades são justificáveis pelo menos parcialmente. É o caso da renegociação com os Estados. O acordo inclui uma limitação do aumento dos gastos estaduais, um detalhe positivo para as contas públicas. O aumento da folha salarial é bem mais discutível, especialmente numa fase péssima para os trabalhadores do setor privado. Além do mais, de modo geral as bondades complicam o conserto das contas públicas. Hoje o governo tem a seu favor a expectativa dos empresários. Se continuar distribuindo bondades, poderá desperdiçar também esse capital político adiantado como crédito pelo setor privado.


Investigação em órgãos federais - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 01/07

O país tem de ficar atento às últimas revelações da Operação Lava-Jato em que órgãos federais, sem a mesma vitrine da Petrobras, encontram-se envolvidos no novelo de corrupção, ora desvendado pelas autoridades competentes em todas as esferas governamentais. Assim como a população acompanha de perto o desenrolar das investigações patrocinadas pela Lava-Jato, que descortinou o maior esquema de corrupção de que se tem notícia no Brasil, os órgãos investigativos têm o dever de esclarecer, até as últimas consequências, acusações de desvio de recursos públicos em instituições públicas federais.

O governo tem de ir a fundo nas investigações de denúncias de práticas nada ortodoxas em organismos estatais, como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), a Fundação Nacional de Saúde (Funasa), o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), o Banco do Nordeste e Docas, apenas para citar os apontados pelo ex-presidente da Transpetro, Sérgio Machado, em sua delação premiada.

Todos esperam que a independência da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF), entre outros organismos de investigação, continue intocada em levantamentos de irregularidades como, por exemplo, concessões de empréstimos, favorecimento de empresas e desvio de recursos para campanhas políticas, no Banco do Nordeste. De acordo com relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), apenas no esquema de empréstimos fraudulentos foram desviados mais de R$ 680 milhões, quantia que pode ser considerada pouca diante do desvio de mais de R$ 40 bilhões estimados pela PF na Petrobras. Mas é muito para um país como o Brasil.

O loteamento político dos cargos de direção desses órgãos federais leva, inexoravelmente, à implementação de sofisticados esquemas de corrupção. No Dnit, onde o histórico de corrupção soma décadas, o último escândalo levou à demissão do então ministro Alfredo Nascimento - indicação do PR - e à demissão de 20 pessoas. Há anos nas mãos do PMDB e do PP, o Dnocs foi recentemente investigado depois de denúncia de supostos desvios em contratos no valor estimado de R$ 200 milhões.

Diante de tantas evidências e dos resultados que a Lava-Jato vem obtendo desde a sua instalação, em 2014, as autoridades policiais e judiciais não podem relaxar e deixar de lado denúncias tão graves envolvendo instituições federais indispensáveis para o bom funcionamento da máquina estatal, dentro dos parâmetros da ética e do bem comum. Isso é o que se espera das autoridades brasileiras, em todos os níveis de comando.


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

CUNHA RENUNCIARÁ PARA DRIBLAR O PLENÁRIO DO STF
Eduardo Cunha (PMDB-RJ) vai renunciar à presidência da Câmara porque sua estratégia é escapar de julgamento no plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), onde já se considera condenado. Sessões do plenário são transmitidas pela TV e Cunha avalia que ministros podem ser pressionados pelo “clamor das ruas”. Como deputado comum, seu caso vai para a 2ª Turma, onde sessões não são transmitidas pela TV.

COMPOSIÇÃO

A 2ª Turma do STF, presidida por Gilmar Mendes, tem também os ministros Dias Toffoli, Celso de Mello, Cármen Lúcia e Teori Zavascki.

UM AMIGO LÁ

Outro fator para a renúncia é que Cunha quer influenciar na escolha do sucessor-tampão, que presidirá a votação de sua eventual cassação.

A FILA ANDA

Confirmada a renúncia de Cunha, só Renan Calheiros, presidente do Senado, deverá enfrentar julgamentos no plenário do STF.

MANDATO-TAMPÃO

Após a renúncia, um presidente-tampão será eleito no prazo de cinco sessões para cumprir o restante do mandato de Cunha, até fevereiro.

DECISÃO DE TOFFOLI GERA POLÊMICA ENTRE JURISTAS

Provocou polêmica entre juristas a decisão do ministro Dias Toffoli, do Supremo Tribunal Federal (STF), de soltar Paulo Bernardo, ex-ministro dos governos Lula e Dilma acusado de envolvimento na ladroagem investigada na Operação Custo Brasil. Há juristas que consideram que houve “supressão de instâncias”, na medida em que o recurso contra a prisão deveria ser julgado primeiro pelo Tribunal Regional Federal e depois pelo Superior Tribunal de Justiça, antes de chegar ao STF.

CASO ATÍPICO

Advogado, Eduardo Mendonça achou atípico, mas não ilegal, que Toffoli tenha decidido mesmo reconhecendo ser o caso de 1ª instância.

CAMINHO LONGO

Outro advogado, Luís Olímpio Ferraz Melo, lembra que, negado pelo TRF, só com nova negativa do STJ é que o recurso iria para o STF.

ILEGALIDADE

O ministro Dias Toffoli decidiu pela soltura de Paulo Bernardo por ter sido provocado e reconheceu “flagrante ilegalidade na prisão”.

ANSIEDADE

Intriga os meios jurídicos de Brasília a demora da Procuradoria-Geral da República (PGR) no envio ao STF do acordo de leniência da OAS, empreiteira enrolada em dez de cada dez escândalos de corrupção.

SÓ NO BRASIL

País curioso, o Brasil, onde um condenado a 41 anos de prisão, como é o caso do bicheiro Carlinhos Cachoeira, continuava livre, leve e solto até ser novamente preso na Operação Saqueador, da Polícia Federal.

CENTRÃO COM ROSSO

O “centrão”, grupo de 200 deputados, tenta salvar o mandato do deputado Eduardo Cunha, apostando na eleição do novato Rogério Rosso (PSD-DF) presidente-tampão da Câmara. Desde que se comprometa em enterrar o processo de cassação de Cunha.

OUTRO LADO

“Eu era feliz na oposição e não sabia”, brinca o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), irmão do ministro Geddel (Governo). Para ele, as articulações demandam muito tempo e exigem bastante esforço.

CLIENTELA ROUBADA

Após acionar o Uber, clientes de Brasília têm sido surpreendidos com a chegada de táxi. O taxista se identifica com o mesmo nome indicado no aplicativo, quando da chamada, e alega que o carro original “quebrou”.

LEILÃO

O deputado JHC (PSB-AL) faz um sorteio curioso para cidadãos interessados em participar de visita de cinco dias à Câmara. Basta curtir sua página e, claro, indicar mais quatro amigos.

CHICO LEITE 2018

Integrante da executiva nacional do Rede Sustentabilidade, o deputado Chico Leite já aparece como forte candidato ao governo do DF, onde Marina Silva, líder do partido, é sempre a mais votada para presidente.

COBRANÇA FISIOLÓGICA

Os aliados de Michel Temer investem contra atrasos nas nomeações de apadrinhados. “As nomeações não estão andando. Há bastante cobrança da turma fisiologista”, afirma Jerônimo Goergen (PP-RS).

MISTÉRIO FEDERAL

O que fez sorrir o bicheiro Carlinhos Cachoeira dentro da viatura da Polícia Federal que o levou em cana?