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Ex-governador de Minas Gerais que deixou o cargo com popularidade recorde, Aécio Neves perdeu para o paulista José Serra o posto de pré-candidato do PSDB a presidente, mas não cultiva mágoa ou despeito. Certo de que a presidenciável petista Dilma Rousseff "é uma grande incógnita", Ele quer começar a campanha de Serra por Minas Gerais, como pré-candidato ao Senado e sem falar em vice. Os dois vão se reunir neste início de semana para marcar a data. Aécio vai propor dia 19. "Condicionei meu descanso primeiro ao lançamento da candidatura no dia 10, e agora por mais nove dias", conta Aécio, que só sairá em férias depois de pedir voto aos mineiros. "Acho que a ida a Minas, no início de sua caminhada, tem o simbolismo de demonstrar a proximidade pessoal nossa, e de Minas e São Paulo, nesta eleição", avalia. Ao mesmo tempo, porém, o tucano adverte que não promete vitória a Serra. "Prometo o empenho. Ninguém induz o voto do eleitor, que é livre para fazer suas escolhas", diz Aécio, em entrevista ao Estado. "Vou tentar demonstrar que, para Minas e para o Brasil, a eleição de Serra é muito melhor." O que o senhor achou do discurso de lançamento de José Serra? Foi um discurso conceitual. Ele precisava abordar vários temas, fez críticas objetivas à ação do governo - jamais pessoais, o que achei muito positivo. Eu procurei falar antes dele, para superar constrangimentos de setores do PSDB que se atemorizam com a proposta do debate FHC x Lula. Há razão para temer comparação? Ao contrário. Vamos para o embate. O PT comete o equívoco de restringir sua existência aos oito anos de governo Lula. Vamos reconstruir as nossas trajetórias e ver quem contribuiu mais para que chegássemos aonde estamos hoje. Não tenho dúvida de que nós do PSDB sempre tivemos muito mais generosidade para com o País do que o PT. Busquei despersonalizar a disputa, refazer o passado. A partir daí vamos discutir o presente. Seu discurso de oposição, no lançamento, foi em tom acima do habitual. Oposição ao PT, porque acho importante que o Brasil saiba qual é e qual foi a postura do PT nos momentos mais graves até aqui. O que me incomoda é ver o PT tentando vender aos brasileiros a ideia de que o Brasil das virtudes e do desenvolvimento foi construído por eles, quando, em vários momentos cruciais, eles preferiram priorizar o projeto partidário ao nacional. Negaram voto a Tancredo, apoio a Itamar Franco, porque Lula já aparecia em posição boa nas pesquisas para presidente, e na construção da estabilidade, no governo FHC. Seu discurso no lançamento foi para conclamar a militância à luta eleitoral? Falei com o objetivo de dar coragem aos nossos companheiros para enfrentar este debate no campo que o PT quiser. No campo ético, vamos lá. Se querem falar de privatização, quem pode ser contra a privatização da telefonia ou da siderurgia? Quanto a futuro e propostas para o Brasil, estamos muito mais preparados. E vamos discutir também o presente e o passado. Mas o senhor não citou o nome da candidata adversária, Dilma Rousseff. Eu tenho respeito pessoal pela Dilma e acho que esta campanha não pode ser personalizada. Se formos por este caminho, ela perde a essência, se amesquinha. Quero dizer o que o PT no governo representa. Principalmente o PT sem o pragmatismo e a autoridade de Lula, que o enquadrou na manutenção da política econômica atual. Dilma não terá essa autoridade? Esta é a grande incógnita. Ela terá que demonstrar durante a campanha como será a relação com o PT, como virá o PT ideológico do Estado máximo e que presença o PT dos problemas éticos terá no governo. Foram todos absolvidos e, no lançamento da candidatura dela, estavam muito sorridentes. A disputa entre seus aliados em Minas já é sinal de que faltará comando? Não é demérito. É natural que ela não tenha sobre o PT a liderança que o presidente Lula tem, por sua história, seu carisma e sua alta popularidade. A Dilma terá dificuldades e esta é uma preocupação que permeará a campanha. Alguns tucanos, especialmente os paulistas, se queixaram da falta de empenho de Minas na última eleição. Isso é falso. Está na cabeça de um ou outro áulico que não conhece Minas. Recebi um telefonema do governador Alckmin na quinta-feira, para dizer que não se lembra de ninguém que tenha se empenhado tanto na eleição dele como eu. O resultado da eleição você não define. O empenho sim, e este Serra terá. Alckmin e Serra, em 2002, tiveram. Só que disputavam com Lula, que era muito popular. Será que Alckmin teria os 40 e muitos por cento que teve em Minas não fosse o empenho muito grande nosso? Com o Lula fora da eleição fica mais fácil dar vitória para Serra em Minas? Lula é um adversário muito mais difícil. Agora, não prometo vitórias. Prometo o empenho, que será de todos nós. Ninguém fez mais gestos em favor da unidade do partido e demonstrou mais desprendimento do que eu. E não fiz isto com má vontade, contrariado. Apostei em uma proposta, apresentei ao País. Quando vi que o PSDB caminhava em outra direção e que insistir poderia provocar um cisma no PSDB, privilegiei o projeto de País porque acho extremamente importante que este ciclo que está aí se encerre. O ciclo do PT não foi positivo? Reconheço virtudes no presidente Lula, mas acho que o PSDB está muito mais preparado hoje para acabar com esse aparelhamento absurdo da máquina pública. E a ministra Dilma, com os méritos que tem, terá que entrar no debate de forma muito clara sobre o espaço desse PT ideológico, estatizante, que aparelha o Estado em razão da filiação partidária, o coloca a serviço de seus interesse, e muitas vezes insinua ações de restrição à liberdade de imprensa e às conquistas democráticas. E o debate Serra x Dilma? Esse é bom para nós também porque os nossos modelos de gestão vão estar em debate. Vamos demonstrar que a meritocracia é o antídoto ao messianismo, porque ela te permite dados objetivos de avaliação dos resultados na vida das pessoas. Os que apostam no messianismo, nos discursos e na autoproclamação da própria bondade temem essa comparação. Vamos contrapor esses dois modelos e acho que temos grandes vantagens. Lula será sempre reconhecido pelo Brasil como um presidente extremamente importante em um momento da nossa história. A perpetuação do PT no poder não é boa para o País. Que vantagem tem o PSDB no embate de perfis Serra x Dilma? São duas pessoas dignas, com histórias de vida respeitáveis e nós temos que partir deste pressuposto. O Serra resgata a eficiência na gestão pública como instrumento dos avanços sociais e representa uma política externa muito mais afim aos interesses do Brasil, inclusive os comerciais e pragmáticos, e não uma aliança meramente ideológica. Não há hipótese de interromper programas que estão dando certo, mas podemos aprimorá-los. E a ministra Dilma? O grande senão que se coloca em relação a ela - e aí é um preço que ela paga exatamente por não ter tido a experiência de comando no Executivo, nem mandato eletivo - é qual será a presença desses setores ideológicos do PT e dos aloprados no seu eventual futuro governo. Ela terá que dizer aos brasileiros exatamente o que pensa de modelo de Estado, das instituições democráticas, da liberdade de imprensa, do aparelhamento do Estado e desse inchaço da máquina pública. O senhor não promete vitória. Dá para vencer sem derrotar Dilma em Minas? O PSDB nacional diz que não. Eu disse que não prometo resultado. Felizmente, cada eleitor brasileiro vale um voto, esteja ele no Nordeste, no Sul ou em São João Del Rei. Isto já é um avanço, porque antigamente os líderes indicavam seus sucessores. Eu, acima de qualquer projeto pessoal que possa ter tido, estarei absolutamente engajado na campanha do Serra por duas razões: vejo nele todas as condições de fazer um belo governo e acho fundamental encerrar este ciclo, porque o enraizamento desses setores que estão no governo pode ser muito perverso para o País. Qual é o significado do convite a Serra para abrir o roteiro de viagens da pré-campanha em Minas Gerais? É um gesto simbólico, para demonstrar de forma clara que estaremos juntos independentemente da minha posição e da candidatura que eu venha a disputar. O senhor se refere a dúvidas quanto a seu engajamento na campanha? Na verdade, esta dúvida está na cabeça de meia dúzia de pessoas que desconhecem a realidade de Minas e não acompanharam a campanha. Serra e o governador Geraldo Alckmin agradeceram o empenho e a forma como atuamos, frente ao adversário Lula, que era muito forte em Minas. A ida de Serra a Minas, no início de sua caminhada, tem o simbolismo de demonstrar a proximidade pessoal nossa, e de Minas e São Paulo, nesta eleição. Mas ninguém induz o voto do eleitor. O eleitor é livre para fazer suas escolhas. Eu vou tentar demonstrar que, para Minas Gerais e para o Brasil, a eleição de Serra é muito melhor. |
segunda-feira, abril 12, 2010
CHRISTIANE SAMARCO
GEORGE VIDOR
De escada
O GLOBO - 12/04/2010
O economista José Júlio Senna cunhou, certa vez, uma frase ótima sobre o comportamento das taxas básicas de juros no Brasil: “elas sobem de elevador e descem de escada”. Mas é possível que este ano os juros básicos passem a subir também de escada, com o propósito de acalmar o pessoal do mercado financeiro, impressionado com a trajetória recente da inflação
Os índices de preços já estão recuando e muito em breve estarão rodando na faixa de 0,25% ao mês. A economia continuará crescendo, embora não mais a um ritmo chinês. A fase de rearrumação dos preços relativos, depois de superado o pior momento da crise financeira internacional, parece estar chegando ao fim.
Ainda assim, o mercado financeiro tem alimentado expectativas de uma inflação acima do ponto central da meta (4,5%) em 2010, com previsões já entre 5% e 6%, e será necessário neutralizálas, pois de fato podem fazer a cabeça dos demais agentes econômicos, contribuindo para um ambiente em que todos se acomodem diante de reajustes de preços não justificáveis (o que, temporariamente, pressionaria os índices).
No Brasil, como em várias outras economias, não se deve menosprezar o fator psicológico na composição da inflação.
O crédito facilitado é visto pelos analistas financeiros como um dos propulsores da inflação. Não é uma opinião unânime.
Ernane Teixeira Torres Filho, superintendente da Área de Pesquisa Econômica do BNDES, chama a atenção, em artigo na última “Visão de Desenvolvimento” do banco, que o crédito no país — atualmente correspondendo a 45% do Produto Interno Bruto — caminha para um quadro mais compatível com a realidade da economia brasileira. Chegaria a representar 70% do PIB por volta de 2014, padrão inferior a de países desenvolvidos.
O crédito de longo prazo começa a ganhar importância no Brasil e isso deve favorecer mais a estabilidade da economia do que provocar graves desequilíbrios.
Nesse sentido, seria bem ruim que os juros básicos voltassem a subir de elevador. Se tiverem de subir, que subam de escada.
Nova York talvez não seja um bom termômetro do atual ambiente da economia americana, embora, como centro financeiro do mundo, estivesse no olho do furacão durante a fase mais aguda da crise que jogou o planeta na pior recessão desde o fim da Segunda Guerra. De fato ficou mais fácil por lá reservar lugares em hotéis, restaurantes, apresentações de grupos musicais etc. Mas, numa observação superficial, não parece faltar consumidores nas grandes lojas e nos locais da moda (os preços da maioria dos produtos em oferta continuam a surpreender os visitantes, e não por acaso os Estados Unidos permanecem com o título de templo do consumo).
Annette Herster, economista brasileira casada com um geólogo canadense, ambos residentes em Calgary (a capital dos hidrocarbonetos no Canadá), divide seu tempo pelas Américas, pois ela, que se especializou na geopolítica do petróleo, continua tentando decifrar a excessiva obsessão de Washington pelo Oriente Médio na área de energia. Os principais fornecedores de petróleo para os Estados Unidos hoje estão nas Américas (Canadá, México, Venezuela, Brasil e Equador). O Oriente Médio responde por bem menos que 20% das importações americanas, sendo que a Arábia Saudita participa com 11% — a fatia dos demais, somados, não passa de 7%. Com sua política no Oriente Médio, os Estados Unidos têm protegido mais os interesses da China, da Índia e do Japão (efetivamente os que mais dependem da região para suprimento de óleo) do que os deles mesmos.
Annette foi durante muitos anos sócia de Jean Paul Prates em uma consultoria no Rio (no momento ele está se dedicando à secretaria de Energia do Rio Grande do Norte).
Recebi mensagens dos ex-secretários Tito Ryff e Márcio Fortes com certo tom de desapontamento por não ter mencionado na coluna da semana passada o esforço na área de desenvolvimento econômico, já a partir dos anos 90, para tirar o Estado do Rio da espiral negativa. Evidentemente que esse trabalho (para o qual contribuiu um competente segundo escalão nesse setor específico, mantido por sucessivos governadores de partidos diferentes) pavimentou o caminho da recuperação.
A atração de empresas como Volkswagen Caminhões, Guardian, Galvasud, Riopol, PeugeotCitroën e CSA ThyssenKrupp foi marcante, mas por si só não venceu o tremendo ceticismo que havia em relação ao Rio. A visível mudança de clima entre investidores em geral é mais recente, e a intenção aqui foi registrar esse momento. Mas sintamse homenageados todos os que contribuíram positivamente, na administração estadual, para esse processo.
A Reader’s Digest, que edita a revista “Seleções”, vendeu no Brasil, no ano passado, 1 milhão de CDs, o que equivale a 5% do mercado fonográfico. Esse tipo de vendas responde por 60% do faturamento da empresa (a revista é o carrochefe, mas significa 20% do negócio). Luiz Fichman, executivo de 37 anos que dirige a empresa americana no país, espera estender essa experiência pra o comércio eletrônico — não de maneira generalizada, mas com foco em determinados produtos — o que será inédito no grupo, no mundo.
No ano passado, a subsidiária brasileira passou da oitava para a quarta posição na Reader’s Digest.
CARLOS ALBERTO SARDENBERG
A culpa é do governo
O Estado de S. Paulo - 12/04/2010 |
Chegaram a dizer que o governo gasta pouco em obras de prevenção dos desastres naturais porque é obrigado, por lei, a fazer um superávit primário elevado. Isso, o superávit, é a parte do orçamento que vai para o pagamento de juros da dívida pública com o objetivo de reduzir o endividamento. Ora, fazer esse superávit, regra introduzida pelo governo Fernando Henrique Cardoso em 1998 e mantida no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, é um dos pilares da política econômica de estabilização, que antes se acusava de neoliberal. De maneira que caímos nisso: tem enchente por causa do mercado que exige do governo o pagamento de juros em vez de investimento público em obras de contenção e saneamento. É por causa desse tipo de raciocínio que estamos onde estamos. Um governo altamente endividado tem dificuldades para se financiar e paga juros cada vez mais altos. Isso reduz sua capacidade de investimento. Ao contrário, um governo que faz o sacrifício de sanear as finanças e equilibrar suas contas adquire maior capacidade de financiamento e investimento. Ora, por aqui, o governo se endividou largamente no passado, fez inflação para desvalorizar suas dívidas e gastos e depois aumentou brutalmente a carga tributária. Ou seja, fez dinheiro, muito dinheiro. E onde está a infraestrutura que amenizaria as catástrofes naturais? Em vez disso, tivemos inflação e calotes. Do Real para cá, a situação foi melhorando, o setor público cada vez mais saneado, mais capaz de gastar de maneira saudável. De novo, onde estão as obras? No superávit primário? Mas quais foram os gastos que mais cresceram nos últimos anos? Pessoal, custeio, previdência. O governo arrecada mais de 36% do PIB e aplica menos de 3% no superávit primário. Descontado isso, portanto, sobram 33% do PIB, uma receita superior à de qualquer outro país emergente. Vamos reparar, de novo: descontando o primário, o setor público brasileiro dispõe proporcionalmente de mais recursos do que as nações de desenvolvimento parecido. Nessas, a carga tributária, em geral, não passa dos 22% do PIB. Mesmo assim, não consta que os serviços públicos aqui sejam proporcionalmente superiores. Ocorre que os gastos são mal administrados. Considere Niterói. A prefeitura e o governo estadual tiveram dinheiro para urbanizar bairros levantados em áreas que se sabia serem de risco. E se sabia não de ouvir dizer, mas com base em relatórios técnicos, alguns feitos para a própria prefeitura. Assim mesmo, acharam melhor levar para esses bairros avenidas asfaltadas, ruas pavimentadas, redes de água e de luz, centros esportivos e até escolas. Por que fizeram isso em vez de, primeiro, impedir que se levantássem os bairros e, segundo, remover as populações dessas áreas perigosas? É fácil, não é mesmo? Cada urbanização dessas é uma inauguração, uma festa, um palanque. Depois, quando vem o desastre, autoridades mandam que as pessoas saiam, mas não oferecem locais razoáveis para abrigá-las. E ainda dizem que as pessoas deviam ter consciência de que estavam em uma área de risco. Mas como poderiam saber? Moradores mais recentes do bairro do Bumba, em Niterói, contaram que compraram suas casas dentro da lei e que pagavam o IPTU para a prefeitura. Não era isso um sinal de que estava tudo bem? Eis o ponto: o governo é ruim, os políticos são tão desprovidos de espírito público que um ministro acha natural que mande mais verbas para o Estado em que faz política. A culpa é deles, não é do superávit primário, nem do neoliberalismo e, muito menos, das chuvas. Planejamento? Pesquisando meus arquivos pessoais, encontro uma entrevista feita para a revista Veja em 23 de maio de 1979, com o então ministro da Aeronáutica Délio Jardim de Mattos. Dizia ele que estava decidido: o principal aeroporto de São Paulo seria o de Viracopos (Campinas) "porque ali os fatores atmosféricos influem menos e há uma serra barrando o crescimento de São Paulo na direção do aeroporto". Informava então que Viracopos seria consolidado e que seria construído "um sistema de transporte moderno", um trem, no canteiro central da Rodovia dos Bandeirantes. Não saiu nada disso. O principal aeroporto paulista ficou em Guarulhos (Cumbica), inaugurado em 1985, com a promessa de uma linha de trem de São Paulo até lá. Continua na promessa. Mais recentemente, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, falou em revitalizar Viracopos (20 anos depois!) e torná-lo um dos principais aeroportos da América Latina. Anunciou ainda reformas e ampliações em Cumbica e, sobretudo, um terceiro aeroporto na região metropolitana. Aliás, a Infraero e a Agência Nacional da Aviação Civil (Anac) tinham prazo de três meses para apresentar o projeto desse novo aeroporto. Sabem quando venceu o prazo? Em outubro de 2007. Tudo bem, não é mesmo? O que são dois anos e meio de atraso diante dos 21 anos do trem para Viracopos? Incertezas. Muito ruído na área do Banco Central. Muita gente dentro do governo insatisfeita com a permanência de Henrique Meirelles e de bronca com a iminente alta dos juros. |
NAS ENTRELINHAS
Reflexos imediatos
Denise Rothenburg |
Correio Braziliense - 12/04/2010 |
Se Lula quiser, como disse, ´´matar a coisa no primeiro turno´´, tem que começar tirando Ciro Gomes do páreo. E ele se debate tanto que pode terminar arranhando quem tentar tirá-lo da piscina eleitoral Surgiu no sábado um ponto de convergência entre PT e PSDB: a vontade de escolher o sucessor de Lula no primeiro turno da eleição, em 3 de outubro. O presidente deixou isso claro no evento que soou mais como um ´´olha eu aqui´´ — o tal encontro com sindicalistas no ABC paulista. Foi tudo montado às pressas para não deixar Dilma fora do noticiário no dia em que o PSDB apresentou José Serra como seu candidato a presidente da República, mas Lula conseguiu o que queria: produzir um fato. Conclamou a todos a ´´matar a coisa logo no primeiro turno´´. Os tucanos pensam a mesma coisa. Em conversas reservadas durante o pré-lançamento da candidatura de Serra, a análise era a de que seja em favor deles ou do PT, a eleição se dará no primeiro turno. Em conversas ontem com os políticos foi possível tirar várias premissas com as quais tucanos e petistas trabalham separadamente, mas com o mesmo objetivo. Uma delas é a de que Ciro Gomes não será candidato. Da parte do PT, a ordem é fazer de tudo para tirar a candidatura de Ciro do ar. A primeira delas é a ida de Dilma Rousseff hoje a Fortaleza, onde receberá o título de cidadã da capital administrada pela petista Luizianne Lins e dará entrevista para rádios. A segunda premissa é a de que Marina Silva não terá 10% dos votos e restringirá o grosso de sua votação ao Acre, insuficiente para levar a disputa a um segundo turno. Dentro dessa perspectiva, como a transferência de votos de Lula ainda é uma incógnita na cabeça de petistas e tucanos, ambos consideram que vencerá a eleição o candidato que errar menos nesse período. Dilma começou sua pré-campanha por Minas Gerais com o pé esquerdo. Chegou defendendo um parceria com o PSDB de Aécio Neves e Antônio Anastasia. O resultado foi desastroso: quase perde o PMDB e ainda empurrou Aécio mais para perto de seu partido, com um forte discurso em favor de Serra. O ex-governador foi tão incisivo que alguns pensaram que ele abriu a porta para ser o candidato a vice na chapa presidencial de seu partido. A viagem ao Ceará prevista para hoje também está no rol dos possíveis desastres antes mesmo de ocorrer. A agenda foi alterada cinco vezes. A cidade de Juazeiro do Norte, onde o prefeito Manoel Santana (PT) passa por denúncias de superfaturamento já divulgadas na imprensa local, foi cortada da programação para evitar colocar a imagem de Dilma relacionada a uma prefeitura petista com problemas desse tipo. Para completar, ainda seria considerado uma provocação a Ciro Gomes, que sempre fala de Padre Cícero. O Ceará é onde Ciro concentra maior votação e transfere hoje grande parte para José Serra, caso fique fora do páreo. É por isso que o estado entrou na agenda de Dilma nessa primeira fase. O PT quer, desde já, tentar agarrar mais uns votos de Ciro e, assim, tornar mais fácil a pressão sobre o aliado PSB contra a candidatura própria à Presidência da República. Ciro reagiu. Na última Sexta-feira, disse a uma TV local, na Bienal do Livro de Fortaleza, que ´´o comportamento de certos setores do PT chega à beira do criminoso´´. Ontem, o site Ceará Agora trouxe uma resposta dos petistas. O líder de Luizianne na Assembléia, vereador Acrísio Sena, disse que os ataques de Ciro “passaram dos limites da responsabilidade política. Essa forma de agir, cheira à inconsequência no trato das divergências e na delicadeza das relações. Só confirma: a cada dia o deputado se enforca com a própria língua". É nesse clima tenso entre o PT e Ciro que Dilma chega ao Ceará. Um passo em falso e pode deixar Ciro tão ou mais irritado do que ficou o ex-ministro das Comunicações Hélio Costa, há uma semana. E hoje, o governador do Rio Sérgio Cabral só não entrou nesse grupo porque a viagem ao Rio foi trocada por São Paulo de última hora a pedido do PMDB que não queria ver Dilma no lançamento da pré-candidatura de Garotinho. Essas confusões indicam que, à primeira vista, Dilma está mais exposta a erros políticos do que o tucano José Serra — até porque ela tem mais palanques do que ele, portanto, mais problemas para administrar. No caso de Ciro Gomes, a tensão está tão grande que o PT começa a sair arranhado nessa operação para tirar o socialista da piscina eleitoral. Para completar esse imbróglio político, vem por aí o confronto de currículos: Dilma nunca participou de uma eleição, nem proporcional, nem majoritária. Também nunca exerceu o comando de estado, nem de prefeitura. É por aí que Serra vai entrar na avenida nos próximos dias, quando for a Minas Gerais levantar louros à gestão do governo Aécio Neves. Até o momento, nesse jogo dos erros, os tucanos levam uma ligeira vantagem. Se vai continuar assim, o tempo dirá. Pelo visto, essa campanha será, como diria Roberto Carlos, repleta de emoções… |
DEMÓSTENES TORRES
De Washington@edu para Gaspari@jor
FOLHA DE SÃO PAULO - 12/04/10
Um negro rico tem mais direito a cota que um branco pobre? Ou o Brasil quer institucionalizar em 2010 o racismo americano de 1910?
ILUSTRE jornalista Elio Gaspari, Quem lhe responde é Booker T. Washington, ex-escravo. Faço-o porque li que o senhor, uma estrela da comunicação, sustenta pela segunda vez em artigos que o senador Demóstenes Torres tentou explicar a escravidão atribuindo-a aos negros.
A teoria negacionista não é dele, que nem sequer a advoga. Nem os alunos de Madame Natasha ou os colegas de Eremildo interpretariam assim os discursos, entrevistas e textos de Demóstenes.
O combate do senador é pela educação, que começa na escola em tempo integral e permeia as demais fases do ensino, para que não se necessite de cotas, nem as raciais, que ele considera racistas, nem as sociais, que defende por beneficiarem os pobres de qualquer cor. Esse item, educação, nos aproxima.
Vou lhe contar meu caso. Passei da servidão a reitor de universidade não por graça, mas por obra. Acreditei na educação não para o sucesso de uma raça, mas para ascensão das pessoas e desenvolvimento de uma nação.
Discordo do senador, pois creio em raças, e ele diz que não existem. A seu favor, ele tem a tecnologia, que avançou e descobriu que a diferença genética entre negros e brancos é nula. Um setor em que parece não ter havido avanços é o da ideologia, que continua ofuscando até mentes brilhantes.
Na virada do século 19 para o 20, eu era tido como conciliador, por querer a emancipação dos negros por meio da educação. O mesmo debate chega ao século 21, com os mesmos argumentos, os mesmos equívocos.
Se Cazemiro e Baquaqua, citados em sua carta, deixaram descendentes, não se surpreenda se houver louros de olhos azuis. O Brasil é muito diferente dos Estados Unidos em que vivi.
Um país miscigenado como esse não merece ser tratado como bicolor. A tese do senador é que as cotas, motivo das discussões acerca de frases ditas por ele ou inventadas para ele, devem ser temporárias e, sendo sociais, são também raciais, pois servem a todas as raças. Por que a cota racial tem de ser só para uma cor?
Um negro rico tem mais direito a cota que um branco pobre? Ou o Brasil quer institucionalizar em 2010 o racismo dos EUA de 1910? Aí há racismo, mas incomparável com o daqui. O ciclo nocivo que faz um país precisar de reserva em universidades públicas começa no ensino fundamental ruim, quando aí deveria estar o início da construção do mérito. No médio, uns pais se sacrificam e põem os filhos em colégios particulares, outros já são tão sacrificados que a renda da família é menor que a mensalidade.
Daí a competição ser desigual. Por isso o senador quer prazo de 12 anos para que o aluno que entrar hoje na escola em tempo integral termine o ensino médio em condição de disputar vaga com o do colégio privado.
Em nenhum lugar, com nenhuma palavra, o senador negou o horror da escravidão ou as monstruosidades dos senhores e das leis com os cativos.
Não ajuda em nada as ações afirmativas entortar suas palavras, interpretá-las para colar no senador a pecha de que é racista, vitaminar militantes para hostilizá-lo.
Se valesse aí a nossa regra aqui, a de que basta uma gota de sangue para ser negro, o senador seria um dos nossos, pois é filho de mulata.
Mas não é essa a discussão que interessa. O tema tem de ser a qualidade da educação, a situação de cada prédio e do transporte escolar, o valor nutricional da merenda, além de salário, preparo e condições de trabalho dos professores.
Desviar o assunto das cotas para buscar o iniciador do tráfico de pessoas é uma forma de esquecer que o Brasil continua atrasado em educação, talvez com média insuficiente para entrar na instituição que dirigi, o Instituto Normal e Industrial Tuskegee, no Alabama.
Outro dia eu encontrei o Gilberto Freyre e lhe disse não entender o fato de ter sido proscrito. Fazia tempo que eu queria perguntar-lhe por que os racialistas repelem tão correto e talentoso pesquisador. Ele deu a entender que queriam que "Casa Grande & Senzala" fosse um panfleto grande, e não um grande livro.
Gaspari, a escravidão foi brasileira, assim como é brasileira uma certa dificuldade de entender que quem mais grita por cota é quem menos defende o mérito. É possível vencer com esforço, estudo e oportunidade. Eu que o diga.
Com todo respeito,
Washington.
P.S.: Há um pouco sobre Booker T. Washington em "Uma Gota de Sangue", de Demétrio Magnoli (Contexto). Que Deus nos livre da pressa que estão impondo para institucionalizar o racismo no Brasil.
DEMÓSTENES TORRES, 49, procurador de Justiça, é senador da República pelo DEM-GO.
ANCELMO GÓIS
Negócio da China
O Globo - 12/04/2010
Chuva contra o crime A chuvarada de terça passada mostrou que ladrão carioca também foge da chuva.
Segundo a polícia do Rio, houve no dia do temporal 1.077 ocorrências no estado.
Uma semana antes, dia 30, foram 1.847 casos.
Negócio da China
O presidente da China, Hu Jintao, não vai mais ao Porto do Açu, do empresário Eike Batista, no Rio.
Mas os dois se encontrarão, sexta, em Brasília, quando será assinado um memorando de entendimento, que prevê a construção de uma grande usina de aço no porto, em parceria com a chinesa Wisco.
Mas...
De qualquer forma, uma centena de empresários chineses, que acompanham Hu Jintao, vão ao Porto do Açu na própria sexta de olho em novos negócios.
Anos rebeldes
A Rocco vai lançar em maio “Anos rebeldes — os bastidores da criação de uma minissérie”, com o roteiro completo do clássico de Gilberto Braga, na TV Globo, em 1992.
Terá prefácio do nosso Artur Xexéo, orelha da escritora Ana Maria Machado e alentada introdução de Braga.
Agaciel na rede
Lembra-se do Agaciel Maia, aquele ex-diretor-geral que inchou os quadros do Senado com o meu, seu, nosso dinheiro? Afastado da casa, agora é blogueiro: www.agacielmaia.com.
É sua mãe
Wagner Moura retoma com amigos da faculdade a banda “Sua mãe”, lançando em maio o CD “The very best of the greatest hits”, com o ator de vocalista.
O grupo vai fazer shows em Salvador, São Paulo e Rio.
CABRAL E PAES têm razão quando denunciam o populismo e a irresponsabilidade em relação à ocupação ilegal do espaço urbano. Aliás, isto também é feito em certas áreas nobres por alguns bacanas. O choque de ordem é bem-vindo. Bumba nunca mais. Mas paralelamente ao império da lei, cabe aos governos, de maneira séria e generosa, ajudar na recolocação das pessoas em moradias dignas, e em lugares com facilidade de transporte. Veja esta foto do coleguinha Ari Kaye, em Niterói, feita dias antes do temporal. Numa calçada ao lado do Estádio Caio Martins, uma família, com suas crianças e seus idosos, vivia desde o final do mês passado, dormindo em colchões no chão frio, e até cozinhando no meio-fio. Dali para o Bumba é um passo. Meu Deus...
Avatar contra Lula
O cineasta James Cameron, diretor dos sucessos “Avatar” e “Titanic”, confirmou que participará hoje cedo de uma manifestação em Brasília contra a construção da usina de Belo Monte.
Tem ambientalista que vai ao ato vestido como os monstros azuis do filme “Avatar
Segue...
Cerca de 700 moradores das áreas que seriam afetadas pela construção da hidrelétrica são esperados na passeata.
Não é fofo?
De Plínio de Arruda Sampaio, 79 anos, a Chico Alencar, depois que o deputado disse que ele continuava na luta “quando podia estar cuidando dos netos, das flores, das memórias”: — Dessas coisas, Chico, eu cuido quando ficar velho! O intelectual, um dos fundadores do PT, foi lançado, sábado, pelo PSOL, candidato à Presidência da República.
ZONA FRANCA
Hoje, Carlos Villa Nova lança “Televisão pioneira”, na Travessa do Leblon.
João Nabuco assina a trilha do documentário “Secrets of the tribe”, que estreia no É Tudo Verdade.
O professor Miguel Padilha fala amanhã no Centro de Convenções de Boston sobre os avanços da catarata.
O juiz Leonardo Borges toma posse como membro honorário do IAB.
Até o dia 16, estande próximo à bilheteria da Marina da Glória recebe doações para vítimas da chuvarada.
José do Nascimento Junior, do Ibram, organiza, no Rio, o seminário Museus, (Bio) Diversidade e Sustentabilidade Ambiental.
A American Airlines testa tecnologias em um voo comercial para reduzir emissões de carbono.
Orfeu de volta
Escrita por Vinicius de Moraes em 1954, com trilha sonora de Tom Jobim, a peça “Orfeu da Conceição” será remontada com direção de Aderbal Freire Filho.
Estreia em setembro no Rio e outubro em São Paulo.
A peça foi a primeira parceria feita por Vinicius e Tom
A volta de Dori
Depois de oito anos sem lançar CD, Dori Caymmi, que mora no exterior, chega esta semana ao Brasil para promover o “Mundo de Dentro”, seu disco independente.
Tem apresentações marcadas em São Paulo, Rio e Brasília.
Ficha limpa
Filho de Jorge Picciani, presidente da Assembleia do Rio, o deputado federal Leonardo Picciani reassumiu semana passada o mandato em Brasília com um discurso... contra o projeto Ficha Limpa. Faz sentido
Cena carioca
Sexta, hora do almoço, esquina da Rua Evaristo da Veiga com 13 de Maio, no Rio, camelôs ofereciam DVDs piratas dizendo ser do filme “Chico Xavier” (mas é de outro filme sobre o médium), quando uma mulher advertiu: — Olha que o Chico Xavier vai puxar o pé de vocês por venderem DVD pirata do filme dele!
No mais
José Mariano Beltrame tem razão quando diz que “quem trabalha para bandido bandido é”.
O secretário se referia aos cinco militares — um sargento, dois cabos e dois soldados — que faziam a segurança do bicheiro Rogério Andrade, vítima de um atentado na Barra.
DIRA PAES, a linda atriz que esbanja talento e simpatia, volta aos palcos com a peça “Caderno de memórias”, de Jean Claude Carrière, dirigida por Moacyr Góes
AS ATRIZES Elisa Lucinda e Helena Ranaldi capricham no chamego com o ator e escritor Marcos Caruso na estreia de “As pontes de Madison”, no Rio
MARIANA AYDAR, Emílio Santiago e Zélia Duncan posam nos bastidores do show em homenagem a Dolores Duran, dirigido por Wagner Tiso
DENIS LERRER ROSENFIELD
Laudos e ética
O Estado de S.Paulo - 12/04/10
Pequenos agricultores, empreendedores rurais e urbanos, empresas do agronegócio, condomínios, bases da Marinha e da Aeronáutica, unidades da Federação e ordens religiosas, quando confrontados a demandas ou invasões indígenas e quilombolas, ficam literalmente desamparados. Isso já ocorre em Estados como Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Bahia, Mato Grosso do Sul e Pará, para citar só alguns casos. A legislação que rege essas matérias estabelece, para os respectivos processos de identificação e demarcação, a elaboração de laudos antropológicos e relatórios, para os quais são empregados ou contratados antropólogos.
Os que têm as suas terras e propriedades em litígio se encontram, à sua revelia, numa condição inesperada e arbitrária. Devem fazer face a todo um processo administrativo previamente montado. Quando notificados, ficam numa difícil situação: a quem recorrer para fazer um outro laudo? Sensatamente, a resposta seria: contrata-se um outro antropólogo para determinar a veracidade do laudo ou relatório em questão. Mas a resposta é: não há a quem recorrer, pois antropólogos já estão previamente engajados com laudos e relatórios que deveriam, por princípio, ser sempre favoráveis aos indígenas e quilombolas. A situação é propriamente insensata, porém dramaticamente real.
O laudo, nessa ótica, deveria ser orientado para a tomada de decisões dos juízes e membros doMinistério Público Federal em favor dos indígenas e quilombolas. O seu compromisso não seria com a verdade, mas com obter ganho de causa a uma das partes, o que expressa uma perversão mesma do conceito de laudo. Ora, o que acontece com o laudo antropológico? Se fôssemos seguir o "código de ética" da Associação Brasileira de Antropologia, deveria o antropólogo fornecer a "garantia de que a colaboração prestada à investigação" não seria "utilizada com o intuito de prejudicar o grupo investigado". O "código de ética" não se volta à imparcialidade do trabalho, à verdade, mas se caracteriza pelo comprometimento com uma das partes.
Observe-se que, para os antropólogos, isso significa seguir um código de ética, como se a ética fosse a defesa de interesses parciais e corporativos, desvinculados de qualquer universalidade. É como se o juramento de salvar vidas em quaisquer circunstâncias, feito por médicos, tivesse a seguinte versão: alguns o médico deveria salvar, outros não. Ou pior, alguns já estariam condenados, de modo que o laudo deveria ser sempre o mesmo.
Logo, a ética interna da profissão inviabilizaria um laudo pericial isento! Ou ainda, o "bom" antropólogo seria aquele que sempre daria ganho de causa aos indígenas, enquanto o "mau" antropólogo seria aquele que daria ganho de causa aos "fazendeiros". No dizer de uma antropóloga: "Qual de nós, aqui nesta sala, aceitaria fazer um laudo para um fazendeiro que esteja ocupando terras indígenas, mesmo que o tenha feito sem conhecimento disso (o que é possível)? Há antropólogos que se prestaram a esse tipo de serviço e são aqueles que denominamos como antropólogos de fundo de quintal da Funai." O mesmo valeria para os quilombolas.
Em todo contencioso, uma parte pode ou não ter razão. Num conflito fundiário, um produtor rural ou urbano pode ter razão em relação a um pleito quilombola. Em outro, uma demanda de quilombos pode estar justificada contra um esbulho possessório. Em outro conflito, um grupo de indígenas pode ter razão em relação a uma empresa do agronegócio. Em outro, sob outras circunstâncias, a razão pode estar do lado do agronegócio contra uma pretensão indígena. Assim é o mundo.
Mas não é assim que se passa nesse mundo de antropólogos (e de certos promotores), onde a razão está sempre, necessariamente, numa das partes, a indígena e a quilombola, independentemente dos casos em questão. A razão está sempre direcionada, como se, de certa maneira, os indígenas e os quilombolas fossem portadores de uma espécie de razão histórica, como se eles fossem sempre os representantes de uma moralidade e justiça perdidas.
Isso significa dizer que o antropólogo não tem como função nem como objetivo "desvelar uma verdade", mas advogar por uma das partes. O "juízo ponderado" e imparcial não faria parte de seu trabalho. Nesse sentido, sua desconsideração para com o juiz, em sua função de imparcialidade, universalidade e verdade, é reveladora. O antropólogo, por analogia, seria um advogado de defesa. Os seus laudos seriam necessariamente parciais, para beneficiar uma das partes. Em consequência, os laudos antropológicos não deveriam nem poderiam ser requeridos pela Funai e pelo Incra, por não permitirem o exercício do contraditório e por terem um vício de origem.
Do ponto de vista de alguns promotores que seguem a mesma orientação, os direitos dos remanescentes de quilombolas se situariam acima do direito de propriedade, como se esse não fosse uma cláusula pétrea e devesse ficar à mercê do arbítrio de uma posição ideológica, alçada à posição de um valor absoluto. Alguns vão mesmo além e chegam a afirmar que o direito dos quilombolas (e indígenas) seria atemporal e preexistente, devendo prevalecer sobre os bens públicos e privados. Antropólogos e promotores se tornariam uma espécie de hermeutas de um "direito atemporal e preexistente", a cuja existência só eles teriam acesso.
O direito de propriedade e os direitos do Estado, os bens privados e públicos dos cidadãos tornam-se, nessa perspectiva, bens relativos, à mercê de um direito anterior a todos eles. A própria Constituição brasileira seria subordinada a uma espécie de Constituição preexistente, a que é estipulada pelos intérpretes dos dispositivos indígenas e quilombolas existentes na atual Constituição, alçados à posição de uma espécie de Direito Natural, situado acima da própria Constituição. Promotores e antropólogos seriam não apenas intérpretes privilegiados, mas hermeutas do absoluto.
PAINEL DA FOLHA
Meia diária
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SÃO PAULO - 12/04/10
Enquanto o PSDB promovia a festa de José Serra anteontem em Brasília, Luizianne Lins (PT) tentava, a poucos metros do evento tucano, demover a campanha de Dilma Rousseff de levá-la ao Ceará hoje. A prefeita de Fortaleza defendeu que a agenda poderia ser frustrada diante da ameaça de rompimento do PT local com o governador Cid Gomes (PSB). Argumenta que Dilma só deveria visitar o Estado quando houver certeza da candidatura (ou não) de Ciro Gomes (PSB).
Os coordenadores bateram o pé, mas, ao contrário da agenda ampla, que incluiria passagem por Juazeiro, a visita se limitará à capital, com uma homenagem dos petistas a Dilma na Câmara Municipal.
Os coordenadores bateram o pé, mas, ao contrário da agenda ampla, que incluiria passagem por Juazeiro, a visita se limitará à capital, com uma homenagem dos petistas a Dilma na Câmara Municipal.
Foco. No próximo mês, a maioria das viagens de Dilma será centrada em três temas: visitas a programas sociais, encontros com mulheres e eventos com público jovem.
Ponto de vista. O núcleo da campanha considera equivocada a avaliação de que Dilma foi mal na visita a Minas. Não obstante a confusão do "Anastadilma", os objetivos de torná-la mais conhecida e firmar identidade própria teriam sido alcançados.
Tabuleiro. Com o assunto Ciro pendente, o Planalto afaga o PSB nos Estados. No DF, tudo caminha para Agnelo Queiroz (PT) ceder uma vaga ao Senado na chapa a Rodrigo Rollemberg. Na Paraíba, há promessa de neutralidade de Lula diante da disputa entre Ricardo Coutinho (PSB) e o atual governador José Maranhão (PMDB).
Acarajé. Serra deverá visitar Feira de Santana (BA) no próximo dia 22. Estará com o candidato ao governo de sua aliança, Paulo Souto (DEM).
Som na caixa. O jingle "Serra é do bem", que embalou o lançamento da candidatura tucana anteontem, foi atualizado na véspera, em Lisboa, por PC Bernardes.
Vão cantar?. Ao se encontrarem na manhã de sábado para voar até Brasília, Aécio Neves e seu ex-vice, Antonio Anastasia, perceberam que vestiam camisa e blazer praticamente iguais. A saída foi Aécio tirar o blazer antes de entrar no evento do PSDB.
Cabides. Candidata à reeleição no Maranhão, Roseana Sarney (PMDB) insiste em obter apoio do PT no Estado. Ela pretende entregar mais cargos no governo. Tudo na expectativa de que ainda seja possível reverter o placar entre petistas, hoje favorável a apoiar Flávio Dino (PC do B).
Cabides. Candidata à reeleição no Maranhão, Roseana Sarney (PMDB) insiste em obter apoio do PT no Estado. Ela pretende entregar mais cargos no governo. Tudo na expectativa de que ainda seja possível reverter o placar entre petistas, hoje favorável a apoiar Flávio Dino (PC do B).
Racha. Em Tocantins, o PMDB se dividiu. Uma ala do partido negocia indicar o candidato a vice de Siqueira Campos (PSDB), em dobradinha com o DEM. A outra quer candidatura própria ou compor com Raul Filho (PT).
Será? O PR alardeia ter obtido o compromisso de Lula com a candidatura do ex-ministro Alfredo Nascimento ao governo do Amazonas, apesar das pretensões do PMDB de lançar Omar Aziz (PMN), vice de Eduardo Braga (PMDB).
Fechado. Candidato ao governo do Acre, o senador Tião Viana (PT) acertou o nome de Edvaldo Magalhães (PC do B), presidente da Assembleia Legislativa, como candidato ao Senado em sua chapa.
Oferta. Respaldados pelo PMDB de Paulo Hartung, os prefeitos João Coser (PT) e Sérgio Vidigal (PDT), de Vitória e Serra, respectivamente, propuseram a Renato Casagrande (PSB) indicar o candidato ao Senado no "chapão" governista no Espírito Santo, em troca de sua desistência em enfrentar Ricardo Ferraço (PMDB) ao governo. Mas, até agora, não houve resposta.
A calhar. Além de atrair Casagrande, o que transformaria a eleição num confronto entre Ferraço e o tucano Luiz Paulo Vellozzo Lucas, o bloco resolveria outra dificuldade, a ausência de um nome ao Senado após a desistência Hartung em disputar.
com SILVIO NAVARRO e LETÍCIA SANDER
Tiroteio
Na mesma semana da visita infeliz de Dilma a Minas, Lula distorce as palavras de Aécio na tentativa de desqualificá-lo. E a campanha nem começou. Onde vamos parar?
Tiroteio
Na mesma semana da visita infeliz de Dilma a Minas, Lula distorce as palavras de Aécio na tentativa de desqualificá-lo. E a campanha nem começou. Onde vamos parar?
Do deputado RODRIGO DE CASTRO (PSDB-MG), sobre o fato de o presidente ter dito que, ao defender as privatizações realizadas por FHC, o ex-governador estaria sugerindo ao país "entregar os dedos".
Contraponto
Pendências No evento em que o PC do B declarou apoio à candidatura de Dilma Rousseff, na quinta-feira à noite, Lula fez graça sobre o fato de, hoje, o país ser credor do FMI.
- Não estou vendo nenhuma faixa aqui de "fora FMI". Antigamente eu ia em encontro do PC do B e, quando ia falar, ninguém me via, de tanta faixa que tinha...
Diante da plateia às gargalhadas, Lula continuou sua reflexão, dizendo que, agora, só via faixas de candidatos no evento. E novamente arrancou risadas, dirigindo-se ao presidente do PC do B, Renato Rabelo:
- E com alguns candidatos a gente vai ter de conversar, viu, Renato? Não pense que está tudo resolvido não...
Contraponto
Pendências No evento em que o PC do B declarou apoio à candidatura de Dilma Rousseff, na quinta-feira à noite, Lula fez graça sobre o fato de, hoje, o país ser credor do FMI.
- Não estou vendo nenhuma faixa aqui de "fora FMI". Antigamente eu ia em encontro do PC do B e, quando ia falar, ninguém me via, de tanta faixa que tinha...
Diante da plateia às gargalhadas, Lula continuou sua reflexão, dizendo que, agora, só via faixas de candidatos no evento. E novamente arrancou risadas, dirigindo-se ao presidente do PC do B, Renato Rabelo:
- E com alguns candidatos a gente vai ter de conversar, viu, Renato? Não pense que está tudo resolvido não...
RUY CASTRO
De volta ao passado
FOLHA DE SÃO PAULO - 12/04/10
RIO DE JANEIRO - Foi nos anos 80, pouco depois que a implantação dos computadores na Redação de um jornal carioca aposentou as máquinas de escrever. Era o futuro chegando e, com ele, o fim da matraca das teclas, das laudas amassadas e atiradas na cesta, das correções com xxxxxx cobertos de tinta e das matérias que tinham de viajar de mesa em mesa, do repórter ao editor, ao copy, ao secretário, ao diagramador e à oficina. Os computadores eram frios, silenciosos e perfeitos.
Um dia, o desastre. Uma pane paralisou o sistema na hora do fechamento da edição e ninguém conseguia achar a causa do defeito. Corre-corre, angústia entre os técnicos, desespero entre os editores. O tempo passando e o impensável iria acontecer: pela primeira vez em quase 60 anos, o jornal não sairia no dia seguinte.
Até que alguém da direção teve a ideia: mandar buscar no depósito, onde estavam esquecidas, acumulando umidade e poeira, as velhas máquinas de escrever. O jornal daquele dia teria de ser feito "no braço", como antigamente -como desde que existia jornal. Quando os contínuos entraram pela Redação trazendo as Remingtons nos ombros, houve um grito, um urro coletivo, como de gol. O jornal se fez e, no dia seguinte, o sistema se refez. O passado voltou para o seu lugar, mas foi bonito enquanto durou.
Pois, há mais de dez dias, também estou de volta ao passado. Uma instabilidade no Velox, serviço de internet da Oi, anterior à chuva no Rio, me deixou na mão. A visita de um técnico do Velox, solicitada, prometida e protocolada, não aconteceu. Em vez dela, o silêncio.
Com isso aqui estou, ilhado, sem internet, impossibilitado de receber e enviar mensagens e ditando palavras, vírgulas e aspas por telefone, inclusive esta coluna da Folha. Viva os anos 70.
Um dia, o desastre. Uma pane paralisou o sistema na hora do fechamento da edição e ninguém conseguia achar a causa do defeito. Corre-corre, angústia entre os técnicos, desespero entre os editores. O tempo passando e o impensável iria acontecer: pela primeira vez em quase 60 anos, o jornal não sairia no dia seguinte.
Até que alguém da direção teve a ideia: mandar buscar no depósito, onde estavam esquecidas, acumulando umidade e poeira, as velhas máquinas de escrever. O jornal daquele dia teria de ser feito "no braço", como antigamente -como desde que existia jornal. Quando os contínuos entraram pela Redação trazendo as Remingtons nos ombros, houve um grito, um urro coletivo, como de gol. O jornal se fez e, no dia seguinte, o sistema se refez. O passado voltou para o seu lugar, mas foi bonito enquanto durou.
Pois, há mais de dez dias, também estou de volta ao passado. Uma instabilidade no Velox, serviço de internet da Oi, anterior à chuva no Rio, me deixou na mão. A visita de um técnico do Velox, solicitada, prometida e protocolada, não aconteceu. Em vez dela, o silêncio.
Com isso aqui estou, ilhado, sem internet, impossibilitado de receber e enviar mensagens e ditando palavras, vírgulas e aspas por telefone, inclusive esta coluna da Folha. Viva os anos 70.
CLÁUDIO HUMBERTO
Sede do TSE terá 115 mil metros quadrados
Uma obra pública estimada em R$ 328,5 milhões provoca indignação e perplexidade até em Brasília, cidade habituada a escândalos e extravagâncias: a nova sede do Tribunal Superior Eleitoral terá 115.500 metros quadrados de luxo e conforto para que sete ministros atuem, a rigor, apenas quando há eleições. Advogados experientes atestam: a atual sede do TSE atende perfeitamente as necessidades do serviço.
Exagerada
A obra do novo TSE ofende o princípio da economicidade, segundo o Ministério Público Federal no DF, que move ação para embargá-la.
Babilônia é aqui
Segundo o MPF, o Tribunal de Contas da União suspeita de "vícios" e superfaturamento, nas obras do palácio babilônico do TSE.
Firma rica
Até 2009 o contrato de construção da nova sede do TSE recebeu onze termos aditivos, inclusive para reajustar os valores iniciais.
Extravagância
Apenas o projeto da nova sede do TSE, encomendado ao arquiteto Oscar Niemeyer, custou uma fortuna: R$ 5,9 milhões.
Queda
Denúncias de improbidade na Cia de Desenvolvimento Habitacional (Codhab) do DF fizeram a Corregedoria-Geral do governo recomendar a demissão das cúpulas da Secretaria de Habitação e da empresa. Foram exonerados o secretário Túlio Roriz Fernandes e a diretora Valéria Machado, que inclusive promoveria sessões, nos banheiros da empresa, a fim de "espantar os demônios e afastar mau olhado".
Muito estranho
A Cia de Desenvolvimento Habitacional do DF tem só 128 funcionários, mas alugou 250 computadores da Omni, uma empresa de informática.
O elo perdido
Maldade com nosso ancestral: certos políticos brasileiros vão gritar "papai!", se virem de perto o hominídeo descoberto na África do Sul.
Moto anfíbia
Em meio ao caos da chuva no Rio, a Assembleia votava projeto do deputado petista Alcides Rolim criando o Dia do Motoboy. Muito justo.
Generosidade
O terrorista italiano Cesare Battisti mofa no presídio, em Brasília, mas sob assistência de diplomatas do seu país, que até levam-lhe livros. Queixoso do tratamento na Papuda, pediu à embaixada para "facilitar" o recebimento de verduras. É que terrorista também faz dieta...
Sanciona
A Assembleia do Rio de Janeiro aprovou, mês passado, o Programa de Revitalização e o Fundo de Desenvolvimento das áreas atingidas por enchentes, e o projeto "boia' na gaveta do governador Sérgio Cabral.
Pé direito
A convite do novo controlador Ricardo Pessoa (UTC Engenharia), o ex-ministro João Santana assumiu a presidência da construtora Constran com pé direito: assinou o primeiro contrato, com o Metrô de Fortaleza.
Segredo
O respeitável contribuinte não pode saber quanto custaram nem como são os helicópteros de ataque MI-35, comprados da Rússia em 2008: "É assunto tratado com reserva", diz a assessoria da Aeronáutica.
... de US$300 milhões
A FAB se limitou a revelar que os 12 helicópteros, batizados de AH-2 Sabre, saem da base aérea de Porto Velho (RO) para combater tráfico de drogas na Amazônia. Na Internet o preço é de US$ 300 milhões.
FRASE DO DIA
"Os outros têm vergonha de ter participado do governo FH"
Pré-candidata petista Dilma Rousseff, sobre os tucanos nos tempos "pós-FH"
PODER SEM PUDOR
O 'convidado' ilustre
Craque das "pegadinhas", o falecido deputado Maurício Fruet (PMDB-PR) telefonou certa vez ao colega e conterrâneo Hélio Duque. Imitando com perfeição a voz de Ulysses Guimarães, convidou-o para jantar na residência do presidente da Câmara. Duque ficou intrigado: eram conhecidas suas divergências com o Dr. Ulysses. Ainda assim, aceitou o convite. No jantar, Fruet passou a noite se divertindo com o constrangimento do anfitrião e do seu "convidado".
SEGUNDA NOS JORNAIS
- Globo: Paes anuncia remoções imediatas em 8 favelas
- Folha: Instituto usa nome do MEC para dar golpe em escolas
- Estadão: 'Dilma é uma grande incógnita', diz Aécio
- JB: Benefício que mata
- Correio: A face do mal
- Valor: Remuneração de executivo vai aumentar 45% este ano
- Estado de Minas: A nova cara da exportação mineira
- Jornal do Commercio: Polícia acha corpos de jovens desaparecidos
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