O GLOBO - 05/07
País gastou com os estádios da Copa mais do que Alemanha e África do Sul juntas. Com brasileiro não há quem possa
Os pessimistas e a elite branca deram com os burros n’água: a Copa do Mundo no Brasil é um sucesso. A bola está rolando redondinha, os gramados estão todos verdinhos e o país chegou até aí batendo mais um recorde: gastou com os estádios da Copa mais do que Alemanha e África do Sul juntas. Com brasileiro não há quem possa.
Aos espíritos de porco que ainda têm coragem de reclamar do derrame sem precedentes de dinheiro público promovido pelos faraós brazucas, eis a resposta definitiva e acachapante: a Copa no Brasil tem uma das maiores médias de gols da história. Fim de papo. De que adianta ficar economizando o dinheiro do povo, evitando os superfaturamentos e as negociatas na construção dos estádios, para depois assistir a um monte de zero a zero e outros placares magros? Fartura atrai fartura. Depois da chuva de verbas, a chuva de gols. É a Copa das Copas. Viva Messi, viva Neymar, viva Dilma.
Está todo mundo feliz, e o país mais uma vez se renderá a Lula. O oráculo afirmou que era uma babaquice esse negócio de querer chegar de metrô até dentro do estádio. Que o brasileiro vai a jogo até de jegue. O filho do Brasil mais uma vez tinha razão.
O país teve sete anos para usar a agenda da Copa e investir seriamente em infraestrutura de transportes. Sete anos para planejar e executar uma expansão decente do metrô nas capitais saturadas, por exemplo — obras caras que dependem do governo federal. Ainda bem que nada disso foi feito, e as capitais continuaram enfrentando sua bagunça a passo de jegue. Seria um desperdício, porque todo mundo sabe que essa mania de querer chegar aos lugares de metrô é uma babaquice da elite branca. Felizmente, o dinheiro que seria torrado nessa maluquice foi bem aplicado nos estádios mais caros do mundo, entre outros investimentos estratégicos.
Agora a Copa deu certo, o brasileiro está sorrindo e a popularidade de Dilma voltou a subir — provando de uma vez por todas que planejamento sério é uma babaquice. O que importa é bola na rede.
Nos anos que antecederam a Copa das Copas, os pessimistas encheram a paciência do governo popular com a questão dos aeroportos. Mas o PT resistiu mais uma vez à conspiração dessa burguesia ociosa que reclama de tudo. E deixou para privatizar (que ninguém nos ouça) os aeroportos às vésperas da Copa. Foi perfeito, porque sobrou mais tempo para o bando da companheira Rosemary Noronha parasitar o setor da aviação civil, proporcionando aos brasileiros o que eles mais gostam: ser maltratados nos aeroportos em ruínas, se possível derretendo com a falta de ar-condicionado (o que Dilma chamou carinhosamente de “Padrão Brasil”).
Os pessimistas perderam mais essa. Na última hora, com um show vertiginoso de remendos e puxadinhos (Brasil-sil-sil!), os aeroportos nacionais não obrigaram nem uma única delegação estrangeira a vir para a Copa de jegue. Todas as seleções entraram em campo — a televisão está de prova. E, no que a bola rolou, quem haveria de memorizar detalhes insignificantes, como metade dos elevadores da Favela Antonio Carlos Jobim enguiçados, além de algumas esteiras e escadas rolantes interditadas, entre outros desafios dessa gincana Padrão Brasil?
Ora, calem a boca, senhores pessimistas. A Copa deu certo. A Rosemary também.
Quem vai cronometrar o tempo dos otários nas filas monumentais? Os cronômetros só medem a posse de bola. E bem feito para quem ficou preso nos engarrafamentos a caminho do estádio, de casa ou de qualquer lugar. Lula avisou para ir de jegue. Você ficou engarrafado porque é um membro dessa elite branca que contribui para o aquecimento global. Além de tudo, é ignorante, porque ainda não entendeu que o combustível no Brasil foi privatizado pelos companheiros e seus doleiros de estimação. Como diria o petista André Vargas ao comparsa Alberto Youssef, o petróleo é nosso.
Além de jegue e jabuticaba, o Padrão Brasil tem feriado. Muito feriado. Quantos o freguês desejar. Pode haver melhor legado que esse para a mobilidade urbana? Se todo mundo andar de jegue e ninguém precisar ir trabalhar, acabaram-se os problemas viários. Poderemos ter Copa todo mês. E os brasileiros não precisarão mais correr riscos com obras perigosas como os viadutos — que, como se sabe, desabam.
A Copa no Brasil tem tido jogos realmente emocionantes. É o triunfo do único inocente nessa história — o futebol. Viva ele. Os zumbis que ficavam gemendo pelas ruas que “não vai ter Copa” sumiram na paisagem do congraçamento das torcidas. Mas é claro que isso será entendido pela geleia geral brasileira como... gol da Dilma! É a virada dos companheiros, a vitória dos oprimidos palacianos sobre as elites impatrióticas etc. A taça é deles. E a conta é nossa.
Se você não suporta mais essa alquimia macabra, que faz qualquer sucata populista virar ouro eleitoral, faça como os atletas do Felipão: chore.
sábado, julho 05, 2014
O antimilagre econômico do governo brasileiro - ROLF KUNTZ
O ESTADO DE S. PAULO - 05/07
Milagre econômico, no Brasil, na Alemanha ou no Japão, é só um exagero de linguagem, mas antimilagre é uma realidade inegável. Se alguém duvidar, examine os números da indústria, das contas externas, do investimento produtivo e do crescimento do produto interno bruto (PIB) nos últimos quatro anos. De janeiro a junho - só para citar um exemplo - a corrente de comércio foi 2,8% menor que a de um ano antes, com redução tanto das exportações quanto das importações. É um claro sintoma de graves desarranjos na economia. Na maior parte do mundo, governos comuns, sem talentos excepcionais e sem poderes mágicos, derrubam o crescimento para conter a inflação, fechar buracos nas contas externas ou controlar a dívida pública - muitas vezes para cuidar de todos esses problemas ao mesmo tempo. Essa política pode ser dolorosa, mas com frequência é inevitável. Numa exibição de virtudes extraordinárias, o governo da presidente Dilma Rousseff realizou a mágica oposta: reduziu o crescimento industrial, espalhou a insegurança entre empresários e consumidores e fez encolher o comércio exterior sem atacar um só desajuste fundamental. O desemprego medido pelo Pnad, 7,1% no primeiro trimestre, supera o de várias economias desenvolvidas. É como se o País sofresse os efeitos penosos de uma terapia severa - mas sem terapia.
Esse antimilagre se explica por uma combinação desastrosa de vários fatores - diagnóstico errado, confusão de objetivos, voluntarismo, populismo e sujeição das decisões econômicas a interesses pessoais e partidários. O problema do diagnóstico bastaria, sozinho, para causar boa parte dos estragos dos últimos anos. As primeiras ações a partir da crise global podem ter sido corretas, ou pelo menos justificáveis, mas as condições mudaram e a política, apesar disso, foi mantida.
Desde o fim de 2008 o governo tenta estimular a economia como se o País estivesse, em todo esse tempo, travado por problemas conjunturais. Problemas desse tipo justificariam os estímulos ao consumo, assim como justificaram, em 2009, o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), bancado com subsídios pelo Tesouro e operado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Lançado como ação provisória, em 2009, o programa foi prorrogado várias vezes e seu prazo atual terminará no fim do próximo ano. Há muito tempo deixou de ser uma ação contracíclica, assim como os estímulos fiscais e financeiros ao consumo. As autoridades, no entanto, nunca admitiram esse fato.
O impacto recessivo da crise de 2008 durou até 2009 para o Brasil e para a maior parte dos emergentes, mas o governo brasileiro continuou agindo como se o quadro nunca tivesse mudado. O diagnóstico de crise conjuntural pode ter sido correto em 2008 e 2009, mas o governo deveria tê-lo abandonado há muito tempo. Ao mantê-lo, manteve também uma estratégia esgotada, custosa, inflacionária e ineficaz - uma paródia de política keynesiana. Ao insistir em ações de efeito conjuntural, o governo tratou como desafios de curto prazo problemas estruturais. A percepção desses problemas parece ter sido sempre muito fragmentada e, além disso, prejudicada pela insistência em atribuir o baixo crescimento da economia nacional a causas externas.
A alardeada redescoberta do planejamento nunca foi além da retórica. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), inventado em 2007 e mantido a partir de 2011, nunca foi mais que uma costura malfeita de retalhos juntados sem efetiva articulação e sem prioridades bem definidas. Acabou servindo para um discurso mistificador, ao incorporar, por exemplo, o plano de investimentos da Petrobrás. Esse plano, atualizado regularmente, era parte da rotina da empresa e continuaria existindo sem o PAC. Mais que isso: seria executado com eficiência muito maior sem a interferência de interesses políticos, pessoais e partidários. Enfim, cada novo balanço confirma o peso desproporcional dos financiamentos imobiliários e das construções habitacionais no total das aplicações.
Sem surpresa, o PSI, o PAC, as desonerações e os estímulos fiscais e financeiros a setores e a grupos selecionados foram insuficientes para impulsionar a indústria e o investimento. O total investido em capital fixo - máquinas, equipamentos, construções e instalações particulares e obras de infraestrutura - continua na vizinhança de 18% do PIB. A meta de 24%, padrão encontrado facilmente em outros emergentes, continua como promessa para um futuro indefinido. O pífio desempenho da indústria - de janeiro a maio produção 1,6% inferior à de um ano antes - é apenas a continuação de três anos e meio muito ruins, segundo o IBGE.
Não se trata de problema conjuntural, mas de competitividade, disse na quinta-feira o gerente executivo de pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca. A encrenca é reconhecida tanto no Brasil quanto no exterior. A distância entre a produtividade brasileira e o padrão médio das economias desenvolvidas continua muito grande, segundo estudo publicado na semana pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A advertência vale para a maior parte dos emergentes, mas é especialmente importante para o Brasil, estagnado e cada vez menos competitivo. O déficit comercial acumulado no ano só diminuiu de maio para junho (quando chegou a US$ 2,490 bilhões) porque as importações diminuíram. Em junho a receita das vendas foi 3,2% menor que a de um ano antes, mas a despesa foi 3,8% inferior à de junho de 2013 - mais um sinal de uma economia murcha.
Em pesquisa publicada em dezembro pela CNI, 64% dos consultados mencionaram ganhos de produtividade em suas empresas em cinco anos. Mas só 7% avaliaram suas companhias como mais produtivas que as estrangeiras. Doze por cento apontaram produtividade similar, 28% qualificaram suas empresas como menos produtivas e - mais notável - 53% nem sequer responderam. Terá alguma autoridade, em Brasília, lido essa pesquisa?
Milagre econômico, no Brasil, na Alemanha ou no Japão, é só um exagero de linguagem, mas antimilagre é uma realidade inegável. Se alguém duvidar, examine os números da indústria, das contas externas, do investimento produtivo e do crescimento do produto interno bruto (PIB) nos últimos quatro anos. De janeiro a junho - só para citar um exemplo - a corrente de comércio foi 2,8% menor que a de um ano antes, com redução tanto das exportações quanto das importações. É um claro sintoma de graves desarranjos na economia. Na maior parte do mundo, governos comuns, sem talentos excepcionais e sem poderes mágicos, derrubam o crescimento para conter a inflação, fechar buracos nas contas externas ou controlar a dívida pública - muitas vezes para cuidar de todos esses problemas ao mesmo tempo. Essa política pode ser dolorosa, mas com frequência é inevitável. Numa exibição de virtudes extraordinárias, o governo da presidente Dilma Rousseff realizou a mágica oposta: reduziu o crescimento industrial, espalhou a insegurança entre empresários e consumidores e fez encolher o comércio exterior sem atacar um só desajuste fundamental. O desemprego medido pelo Pnad, 7,1% no primeiro trimestre, supera o de várias economias desenvolvidas. É como se o País sofresse os efeitos penosos de uma terapia severa - mas sem terapia.
Esse antimilagre se explica por uma combinação desastrosa de vários fatores - diagnóstico errado, confusão de objetivos, voluntarismo, populismo e sujeição das decisões econômicas a interesses pessoais e partidários. O problema do diagnóstico bastaria, sozinho, para causar boa parte dos estragos dos últimos anos. As primeiras ações a partir da crise global podem ter sido corretas, ou pelo menos justificáveis, mas as condições mudaram e a política, apesar disso, foi mantida.
Desde o fim de 2008 o governo tenta estimular a economia como se o País estivesse, em todo esse tempo, travado por problemas conjunturais. Problemas desse tipo justificariam os estímulos ao consumo, assim como justificaram, em 2009, o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), bancado com subsídios pelo Tesouro e operado pelo Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Lançado como ação provisória, em 2009, o programa foi prorrogado várias vezes e seu prazo atual terminará no fim do próximo ano. Há muito tempo deixou de ser uma ação contracíclica, assim como os estímulos fiscais e financeiros ao consumo. As autoridades, no entanto, nunca admitiram esse fato.
O impacto recessivo da crise de 2008 durou até 2009 para o Brasil e para a maior parte dos emergentes, mas o governo brasileiro continuou agindo como se o quadro nunca tivesse mudado. O diagnóstico de crise conjuntural pode ter sido correto em 2008 e 2009, mas o governo deveria tê-lo abandonado há muito tempo. Ao mantê-lo, manteve também uma estratégia esgotada, custosa, inflacionária e ineficaz - uma paródia de política keynesiana. Ao insistir em ações de efeito conjuntural, o governo tratou como desafios de curto prazo problemas estruturais. A percepção desses problemas parece ter sido sempre muito fragmentada e, além disso, prejudicada pela insistência em atribuir o baixo crescimento da economia nacional a causas externas.
A alardeada redescoberta do planejamento nunca foi além da retórica. O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), inventado em 2007 e mantido a partir de 2011, nunca foi mais que uma costura malfeita de retalhos juntados sem efetiva articulação e sem prioridades bem definidas. Acabou servindo para um discurso mistificador, ao incorporar, por exemplo, o plano de investimentos da Petrobrás. Esse plano, atualizado regularmente, era parte da rotina da empresa e continuaria existindo sem o PAC. Mais que isso: seria executado com eficiência muito maior sem a interferência de interesses políticos, pessoais e partidários. Enfim, cada novo balanço confirma o peso desproporcional dos financiamentos imobiliários e das construções habitacionais no total das aplicações.
Sem surpresa, o PSI, o PAC, as desonerações e os estímulos fiscais e financeiros a setores e a grupos selecionados foram insuficientes para impulsionar a indústria e o investimento. O total investido em capital fixo - máquinas, equipamentos, construções e instalações particulares e obras de infraestrutura - continua na vizinhança de 18% do PIB. A meta de 24%, padrão encontrado facilmente em outros emergentes, continua como promessa para um futuro indefinido. O pífio desempenho da indústria - de janeiro a maio produção 1,6% inferior à de um ano antes - é apenas a continuação de três anos e meio muito ruins, segundo o IBGE.
Não se trata de problema conjuntural, mas de competitividade, disse na quinta-feira o gerente executivo de pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Renato da Fonseca. A encrenca é reconhecida tanto no Brasil quanto no exterior. A distância entre a produtividade brasileira e o padrão médio das economias desenvolvidas continua muito grande, segundo estudo publicado na semana pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
A advertência vale para a maior parte dos emergentes, mas é especialmente importante para o Brasil, estagnado e cada vez menos competitivo. O déficit comercial acumulado no ano só diminuiu de maio para junho (quando chegou a US$ 2,490 bilhões) porque as importações diminuíram. Em junho a receita das vendas foi 3,2% menor que a de um ano antes, mas a despesa foi 3,8% inferior à de junho de 2013 - mais um sinal de uma economia murcha.
Em pesquisa publicada em dezembro pela CNI, 64% dos consultados mencionaram ganhos de produtividade em suas empresas em cinco anos. Mas só 7% avaliaram suas companhias como mais produtivas que as estrangeiras. Doze por cento apontaram produtividade similar, 28% qualificaram suas empresas como menos produtivas e - mais notável - 53% nem sequer responderam. Terá alguma autoridade, em Brasília, lido essa pesquisa?
Rumo ao PIB real - RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 05/07
RIO DE JANEIRO - Deu no jornal. O Reino Unido e a Itália, cansados de ver sua economia caindo a níveis deprimentes, resolveram incluir em seu PIB (Produto Interno Bruto) os ganhos de atividades tradicionalmente ignoradas nas contas oficiais, e, com isso, acrescentar os bilhões que elas movimentam na vida real. Quais? A prostituição, o contrabando e o tráfico de drogas.
Ao fazer isto, estão se ajustando ao que já é praticado pelas vizinhas Holanda, Áustria, Suécia, Noruega, Finlândia e outros. O fato de tais atividades terem ficado de fora por tanto tempo no cálculo da economia não tem uma conotação moral --afinal, todo país produz ou vende legalmente coisas mais letais do que sexo, muamba e drogas. É porque, como os proxenetas, contrabandistas e traficantes não pagam imposto, não mantêm livro-caixa e não descontam para o instituto, seus rendimentos são de difícil mensuração.
Bem, se o problema é fazer contas, por que não? --eles se perguntaram. O IBGE britânico estima que o Reino Unido tem, por exemplo, 60 mil prostitutas ativas. À média de 25 clientes cada, por semana, a 67 libras (R$ 260) por saída, chegou-se a um movimento anual de 5, 3 bilhões de libras (R$ 21 bilhões). Como ignorar esses números, que superam a sua produção de guarda-chuvas, remédios para dor de dentes e gorros do Manchester United, tudo junto?
Se o Brasil fizer o mesmo com sua economia informal, ilegal e imoral, nosso PIB irá para a estratosfera. Esqueça os camelôs, os ambulantes, os despachantes. Para ficar apenas no segmento do tráfico, imagine quanto não rola pelo exército de aviões, vapores, gerentes e endoladores em todo o país. Sem falar na propina para a polícia.
Mas tudo isso é fichinha diante do que circula em comissões pelos desvãos oficiais. Estas, sim, nos fariam disparar no ranking dos PIBs mundiais.
RIO DE JANEIRO - Deu no jornal. O Reino Unido e a Itália, cansados de ver sua economia caindo a níveis deprimentes, resolveram incluir em seu PIB (Produto Interno Bruto) os ganhos de atividades tradicionalmente ignoradas nas contas oficiais, e, com isso, acrescentar os bilhões que elas movimentam na vida real. Quais? A prostituição, o contrabando e o tráfico de drogas.
Ao fazer isto, estão se ajustando ao que já é praticado pelas vizinhas Holanda, Áustria, Suécia, Noruega, Finlândia e outros. O fato de tais atividades terem ficado de fora por tanto tempo no cálculo da economia não tem uma conotação moral --afinal, todo país produz ou vende legalmente coisas mais letais do que sexo, muamba e drogas. É porque, como os proxenetas, contrabandistas e traficantes não pagam imposto, não mantêm livro-caixa e não descontam para o instituto, seus rendimentos são de difícil mensuração.
Bem, se o problema é fazer contas, por que não? --eles se perguntaram. O IBGE britânico estima que o Reino Unido tem, por exemplo, 60 mil prostitutas ativas. À média de 25 clientes cada, por semana, a 67 libras (R$ 260) por saída, chegou-se a um movimento anual de 5, 3 bilhões de libras (R$ 21 bilhões). Como ignorar esses números, que superam a sua produção de guarda-chuvas, remédios para dor de dentes e gorros do Manchester United, tudo junto?
Se o Brasil fizer o mesmo com sua economia informal, ilegal e imoral, nosso PIB irá para a estratosfera. Esqueça os camelôs, os ambulantes, os despachantes. Para ficar apenas no segmento do tráfico, imagine quanto não rola pelo exército de aviões, vapores, gerentes e endoladores em todo o país. Sem falar na propina para a polícia.
Mas tudo isso é fichinha diante do que circula em comissões pelos desvãos oficiais. Estas, sim, nos fariam disparar no ranking dos PIBs mundiais.
Na marca do pênalti - DEMÉTRIO MAGNOLI
FOLHA DE SP - 05/07
A Copa simula a guerra, mas o jogo continua a ser jogo: a sobrevivência da nação não está em causa
O capitão --logo ele!-- refugou. Diante do Chile, na hora da cobrança dos pênaltis, Thiago Silva implorou para não bater. Antes Julio César, o goleiro, que ele. "Bater pênalti é uma grande responsabilidade em casa, e pedi a Deus para não chegar a minha cobrança", justificou-se. O primeiro longa dirigido por Wim Wenders, "O Medo do Goleiro Diante do Pênalti" (1972), com roteiro de Peter Handke, não é o que o título sugere. Sem assisti-lo, Sepp Maier, o eterno goleiro do Bayern, disparou a crítica futebolística certeira: "O medo do jogador que vai chutar o pênalti --isto, sim, seria digno de um romance". Mas, se Thiago Silva fosse o protagonista da trama proposta por Maier, o roteiro deveria concentrar-se no contexto.
A Copa simula a guerra. Entretanto, o jogo continua a ser jogo: a simulação opera como substituição e, normalmente, quase todos os envolvidos sabem que a sobrevivência ou a honra da nação não estão em jogo. O jogador que vai bater o pênalti tem medo, mas chuta. No caso de Thiago Silva, o medo cedeu lugar ao pânico paralisante. Desconfio que isso se deve menos a seus conhecidos traumas pessoais com pênaltis que ao deplorável clima bélico criado em torno da participação brasileira na Copa do Mundo.
Antes da estreia, Felipão e mesmo o sóbrio Parreira proclamaram que "o Brasil" tem a "obrigação" de ser campeão. Possivelmente, eles adotaram tal estratégia discursiva sob a inspiração de algum manual de autoajuda --mas fizeram mal, e não só aos jogadores do time. O jogo é jogo porque inscreve-se na esfera da incerteza: ninguém pode carregar o fardo de um resultado que não controla. A única "obrigação" da equipe era dar o seu melhor, até o fim: fazer como a seleção inesquecível de Telê, Zico, Sócrates, Júnior e Falcão, derrotada em 1982, não como os astros egocêntricos reunidos por Parreira em Weggis e derrotados em 2006.
Na Copa das Confederações, a torcida inaugurou a prática de entoar "a capela" a segunda parte do hino nacional. Aquilo era uma manifestação política: o eco, dentro dos estádios, das manifestações multitudinárias que, fora deles, exigiam das autoridades um módico de decência e espírito público. Um ano depois, a prática esvaziou-se de seu sentido original, degenerando num ritual de natureza marcial: gritado a plenos pulmões, o hino coletivo veicula a exigência de um sacrifício sangrento no campo verde onde a pátria joga a sua honra. É guerra isso?
É guerra? Na Venezuela, o regime denuncia complôs diários, antes contra a vida de Chávez, agora contra a de Maduro, contra a moeda nacional e contra a rede elétrica. No Brasil, um "complô da mídia" ameaça, todo o tempo, o "governo popular" --e, estalando os dedos, nove escribas cavilosos ergueram um estádio para hostilizar a presidente. A coisa pega. Após o triunfo sobre o Chile, Parreira inventou a hipótese de um "complô" para impedir a conquista do hexa. Teorias conspiratórias cumprem a função política de substituir a incerteza da história pelas certezas dos contos infantis. No caso da Copa, o "complô" imaginário emergiu como providencial complemento da suposta "obrigação" de vitória: a temida derrota ganhou uma explicação que preserva a honra nacional. A Fifa seria a culpada por um fracasso, antecipou o coordenador técnico. Mas e a almejada vitória? Seria, simétrica e logicamente, obra da Fifa?
Um pênalti é só um pênalti. Convertê-lo é uma questão de técnica, um termo que abrange o controle emocional. Thiago Silva tinha o dever de se voluntariar para chutar --porque é um profissional consagrado, um jogador experiente e o capitão do time. Ele não tinha esse dever perante a bandeira nacional, pendão auriverde que a brisa beija e balança, ou a torcida brasileira, mas diante de seus companheiros de equipe e de si mesmo. O capitão refugou. Culpa dele. Culpa nossa.
A Copa simula a guerra, mas o jogo continua a ser jogo: a sobrevivência da nação não está em causa
O capitão --logo ele!-- refugou. Diante do Chile, na hora da cobrança dos pênaltis, Thiago Silva implorou para não bater. Antes Julio César, o goleiro, que ele. "Bater pênalti é uma grande responsabilidade em casa, e pedi a Deus para não chegar a minha cobrança", justificou-se. O primeiro longa dirigido por Wim Wenders, "O Medo do Goleiro Diante do Pênalti" (1972), com roteiro de Peter Handke, não é o que o título sugere. Sem assisti-lo, Sepp Maier, o eterno goleiro do Bayern, disparou a crítica futebolística certeira: "O medo do jogador que vai chutar o pênalti --isto, sim, seria digno de um romance". Mas, se Thiago Silva fosse o protagonista da trama proposta por Maier, o roteiro deveria concentrar-se no contexto.
A Copa simula a guerra. Entretanto, o jogo continua a ser jogo: a simulação opera como substituição e, normalmente, quase todos os envolvidos sabem que a sobrevivência ou a honra da nação não estão em jogo. O jogador que vai bater o pênalti tem medo, mas chuta. No caso de Thiago Silva, o medo cedeu lugar ao pânico paralisante. Desconfio que isso se deve menos a seus conhecidos traumas pessoais com pênaltis que ao deplorável clima bélico criado em torno da participação brasileira na Copa do Mundo.
Antes da estreia, Felipão e mesmo o sóbrio Parreira proclamaram que "o Brasil" tem a "obrigação" de ser campeão. Possivelmente, eles adotaram tal estratégia discursiva sob a inspiração de algum manual de autoajuda --mas fizeram mal, e não só aos jogadores do time. O jogo é jogo porque inscreve-se na esfera da incerteza: ninguém pode carregar o fardo de um resultado que não controla. A única "obrigação" da equipe era dar o seu melhor, até o fim: fazer como a seleção inesquecível de Telê, Zico, Sócrates, Júnior e Falcão, derrotada em 1982, não como os astros egocêntricos reunidos por Parreira em Weggis e derrotados em 2006.
Na Copa das Confederações, a torcida inaugurou a prática de entoar "a capela" a segunda parte do hino nacional. Aquilo era uma manifestação política: o eco, dentro dos estádios, das manifestações multitudinárias que, fora deles, exigiam das autoridades um módico de decência e espírito público. Um ano depois, a prática esvaziou-se de seu sentido original, degenerando num ritual de natureza marcial: gritado a plenos pulmões, o hino coletivo veicula a exigência de um sacrifício sangrento no campo verde onde a pátria joga a sua honra. É guerra isso?
É guerra? Na Venezuela, o regime denuncia complôs diários, antes contra a vida de Chávez, agora contra a de Maduro, contra a moeda nacional e contra a rede elétrica. No Brasil, um "complô da mídia" ameaça, todo o tempo, o "governo popular" --e, estalando os dedos, nove escribas cavilosos ergueram um estádio para hostilizar a presidente. A coisa pega. Após o triunfo sobre o Chile, Parreira inventou a hipótese de um "complô" para impedir a conquista do hexa. Teorias conspiratórias cumprem a função política de substituir a incerteza da história pelas certezas dos contos infantis. No caso da Copa, o "complô" imaginário emergiu como providencial complemento da suposta "obrigação" de vitória: a temida derrota ganhou uma explicação que preserva a honra nacional. A Fifa seria a culpada por um fracasso, antecipou o coordenador técnico. Mas e a almejada vitória? Seria, simétrica e logicamente, obra da Fifa?
Um pênalti é só um pênalti. Convertê-lo é uma questão de técnica, um termo que abrange o controle emocional. Thiago Silva tinha o dever de se voluntariar para chutar --porque é um profissional consagrado, um jogador experiente e o capitão do time. Ele não tinha esse dever perante a bandeira nacional, pendão auriverde que a brisa beija e balança, ou a torcida brasileira, mas diante de seus companheiros de equipe e de si mesmo. O capitão refugou. Culpa dele. Culpa nossa.
Indefinições no gás de xisto CELSO MING
O ESTADÃO - 05/07
Graças à produção de petróleo e gás a custos muito baixos, a partir do fraturamento hidráulico do xisto, os Estados Unidos passam por uma revolução energética
Após 40 anos, os Estados Unidos começam a reabrir as exportações de petróleo bruto.
No dia 24, o Departamento do Comércio dos Estados Unidos autorizou as primeiras operações de embarque, proibidas desde o embargo imposto pelos árabes pelo apoio dos Estados Unidos a Israel na Guerra do Yom Kippur, em 1973. As exportações ainda são insignificantes, mas devem ser vistas como parte de um processo de flexibilização. Se confirmada, essa decisão terá grande impacto econômico e geopolítico, com consequências também sobre o Brasil.
Graças à produção de petróleo e gás a custos muito baixos, a partir do fraturamento hidráulico (fracking) do xisto, os Estados Unidos passam por uma revolução energética. Estão à beira da autossuficiência de petróleo e de gás. Com esse horizonte, empresas de petróleo pressionam o Congresso americano para autorizar a reabertura das exportações de óleo bruto para, assim, viabilizar investimentos e garantir mercado externo para aumentos de produção.
Essas novas condições muito próximas de dispensar o suprimento externo de petróleo podem ajudar a explicar o relativo desengajamento dos Estados Unidos nos conflitos do Oriente Médio, mais especialmente nesta crise que ameaça implodir o Iraque. Ou seja, a revolução do xisto nos Estados Unidos começa a ter impacto geopolítico.
A provável reabertura das exportações de óleo cru nos Estados Unidos deverá produzir duas consequências para o Brasil. A primeira será o relativo desinteresse das empresas globais de petróleo pela produção brasileira. Nos Estados Unidos, contam com mais estabilidade nas regras do jogo, abundante infraestrutura a custos mais baixos e enorme cadeia de fornecedores de equipamentos de exploração. A segunda consequência tende a ser a manutenção (ou até a redução dos preços) do gás natural nos Estados Unidos. É fator que tenderá a atrair mais investimentos industriais, especialmente de unidades eletrointensivas como química básica, metalurgia dos não ferrosos, vidro e cerâmica.
Ou seja, um dos riscos para o Brasil é a perda de investimentos não só para os Estados Unidos, mas, também, para o Canadá e o México, que fazem parte do mesmo bloco comercial, o Nafta.
Por enquanto, o governo brasileiro concentra suas fichas no aumento da produção de gás do pré-sal. Mas aí os custos (e os preços) tendem a continuar elevados. O primeiro leilão de concessões de exploração de gás de xisto foi realizado em novembro de 2013. Mas os investimentos estão ameaçados porque enfrentam indefinições das regras. No início de junho, a Justiça Federal acolheu pedido do Ministério Público de suspensão da 12.ª Rodada de Licitações. O argumento é de que faltam informações sobre a magnitude dos riscos ambientais associados à técnica de fraturamento hidráulico, o que poderia comprometer “em caráter irreversível” o Aquífero Guarani, um dos maiores do mundo. Recurso da Agência Nacional do Petróleo (ANP) foi rejeitado em caráter liminar. A ação tramita na 1.ª Vara Federal de Cascavel.
Enquanto essas dúvidas não forem dirimidas de vez, é difícil de prever avanço da exploração de gás de xisto no Brasil.
CONFIRA:
Pressões na Alemanha
A Alemanha também enfrenta o dilema de incrementar ou não a exploração do gás de xisto. A técnica de fraturamento hidráulico (bombardeio do xisto por uma mistura de água, areia e produtos químicos a alta pressão) vem sendo usada no país há mais de 50 anos, mas com pouca intensidade. A forte concorrência energética dos Estados Unidos e as dúvidas sobre a garantia de suprimento de gás da Ucrânia vêm levando as companhias energéticas a pressionar o governo alemão para dinamizar a exploração.
O outro lado
Na outra ponta, estão os organismos ambientalistas e as cervejarias que vêm fazendo forte campanha contra, porque temem a contaminação dos lençóis freáticos.
Vai parar?
O governo alemão parece mais propenso a suspender as perfurações até que estudos mais aprofundados verifiquem os riscos do processo ou que novas tecnologias mais seguras substituam a atual.
Graças à produção de petróleo e gás a custos muito baixos, a partir do fraturamento hidráulico do xisto, os Estados Unidos passam por uma revolução energética
Após 40 anos, os Estados Unidos começam a reabrir as exportações de petróleo bruto.
No dia 24, o Departamento do Comércio dos Estados Unidos autorizou as primeiras operações de embarque, proibidas desde o embargo imposto pelos árabes pelo apoio dos Estados Unidos a Israel na Guerra do Yom Kippur, em 1973. As exportações ainda são insignificantes, mas devem ser vistas como parte de um processo de flexibilização. Se confirmada, essa decisão terá grande impacto econômico e geopolítico, com consequências também sobre o Brasil.
Graças à produção de petróleo e gás a custos muito baixos, a partir do fraturamento hidráulico (fracking) do xisto, os Estados Unidos passam por uma revolução energética. Estão à beira da autossuficiência de petróleo e de gás. Com esse horizonte, empresas de petróleo pressionam o Congresso americano para autorizar a reabertura das exportações de óleo bruto para, assim, viabilizar investimentos e garantir mercado externo para aumentos de produção.
Essas novas condições muito próximas de dispensar o suprimento externo de petróleo podem ajudar a explicar o relativo desengajamento dos Estados Unidos nos conflitos do Oriente Médio, mais especialmente nesta crise que ameaça implodir o Iraque. Ou seja, a revolução do xisto nos Estados Unidos começa a ter impacto geopolítico.
A provável reabertura das exportações de óleo cru nos Estados Unidos deverá produzir duas consequências para o Brasil. A primeira será o relativo desinteresse das empresas globais de petróleo pela produção brasileira. Nos Estados Unidos, contam com mais estabilidade nas regras do jogo, abundante infraestrutura a custos mais baixos e enorme cadeia de fornecedores de equipamentos de exploração. A segunda consequência tende a ser a manutenção (ou até a redução dos preços) do gás natural nos Estados Unidos. É fator que tenderá a atrair mais investimentos industriais, especialmente de unidades eletrointensivas como química básica, metalurgia dos não ferrosos, vidro e cerâmica.
Ou seja, um dos riscos para o Brasil é a perda de investimentos não só para os Estados Unidos, mas, também, para o Canadá e o México, que fazem parte do mesmo bloco comercial, o Nafta.
Por enquanto, o governo brasileiro concentra suas fichas no aumento da produção de gás do pré-sal. Mas aí os custos (e os preços) tendem a continuar elevados. O primeiro leilão de concessões de exploração de gás de xisto foi realizado em novembro de 2013. Mas os investimentos estão ameaçados porque enfrentam indefinições das regras. No início de junho, a Justiça Federal acolheu pedido do Ministério Público de suspensão da 12.ª Rodada de Licitações. O argumento é de que faltam informações sobre a magnitude dos riscos ambientais associados à técnica de fraturamento hidráulico, o que poderia comprometer “em caráter irreversível” o Aquífero Guarani, um dos maiores do mundo. Recurso da Agência Nacional do Petróleo (ANP) foi rejeitado em caráter liminar. A ação tramita na 1.ª Vara Federal de Cascavel.
Enquanto essas dúvidas não forem dirimidas de vez, é difícil de prever avanço da exploração de gás de xisto no Brasil.
CONFIRA:
Pressões na Alemanha
A Alemanha também enfrenta o dilema de incrementar ou não a exploração do gás de xisto. A técnica de fraturamento hidráulico (bombardeio do xisto por uma mistura de água, areia e produtos químicos a alta pressão) vem sendo usada no país há mais de 50 anos, mas com pouca intensidade. A forte concorrência energética dos Estados Unidos e as dúvidas sobre a garantia de suprimento de gás da Ucrânia vêm levando as companhias energéticas a pressionar o governo alemão para dinamizar a exploração.
O outro lado
Na outra ponta, estão os organismos ambientalistas e as cervejarias que vêm fazendo forte campanha contra, porque temem a contaminação dos lençóis freáticos.
Vai parar?
O governo alemão parece mais propenso a suspender as perfurações até que estudos mais aprofundados verifiquem os riscos do processo ou que novas tecnologias mais seguras substituam a atual.
Livre escolha - KÁTIA ABREU
FOLHA DE SP - 05/07
Transgênicos, convencionais ou orgânicos, é o consumidor quem faz sua opção --e paga o preço da escolha
Há cerca de três anos, dois gurus em estratégia de competitividade, Michael Porter e Mark Kramer, criaram o conceito de valor compartilhado, concluindo que o capitalismo passou por grandes transformações.
Hoje, quem mais lucra são os que, em suas atividades, incorporam valores da sociedade. Não se trata, aqui, de caridade ou apenas de responsabilidade social corporativa, ações que ajudam a solidificar a boa reputação da empresa, mas não têm conexão direta com a atividade-fim.
O que tem motivado as empresas a incorporar valores da sociedade à sua estratégia comercial é a conclusão de que, nos tempos atuais, a eficiência econômica está associada ao progresso social. Promover o progresso social impulsiona a inovação, a produtividade e a competitividade. É o que move o desenvolvimento neste século 21.
Essa transformação não chegou apenas aos grandes centros urbanos e parques industriais. Está, também, presente no campo e na agroindústria. Nos próximos 30 anos, o mundo terá de alimentar 9 bilhões de pessoas. As estimativas indicam que a população global vai aumentar em número e renda.
A consultoria McKinsey calcula que, em oito anos, só a China será responsável por uma nova classe média de 630 milhões de pessoas. Quase a totalidade das populações atuais do Brasil e dos Estados Unidos. Como se vê, os desafios vão se multiplicar.
O mundo terá que produzir tanto para combater a fome como para atender a esses novos consumi- dores que terão acesso a proteínas de origem animal, como carnes, leite e ovos --e também mais fibras e energia.
Os empreendedores da agropecuária brasileira já estão conscientes de que inovar é contribuir para a preservação do planeta, e não apenas fornecer comida às pessoas. É produzir mais com menos: sem expandir a área plantada e protegendo seus mananciais.
Para o agronegócio brasileiro, o conceito de sustentabilidade compartilha, assim, os valores econô- micos, sociais e ambientais. São esses os maiores valores da sociedade moderna.
Nesse contexto, o papel da biotecnologia ganha relevo. O Brasil e os Estados Unidos são líderes mundiais nesse campo. O uso de sementes geneticamente modificadas no Brasil é seguro e fundamentado em critérios científicos comprovados.
O que adversários do uso de transgênicos desconhecem --ou fingem desconhecer-- é que a semente do milho resistente à lagarta do cartucho, por exemplo, é desenvolvida a partir da mesma bactéria --o Bacillus thuringiensis--, que, na produção de alimentos orgânicos, é utilizada no controle biológico de pragas.
Esse milho geneticamente modificado é plantado há quase duas décadas no país e não oferece risco à saúde dos consumidores. Apenas contém uma proteína que destrói o intestino da lagarta que ataca as folhas do milho, dispensando o uso de agroquímicos.
O fato incontestável é que as lavouras transgênicas são manejadas usando menos defensivos agrícolas. De acordo com o Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (Isaa, na sigla em inglês), o plantio de transgênicos no mundo já eliminou a necessidade de utilização de 497 mil toneladas de ingrediente ativo de agroquímicos.
Isso significa menos liberação de resíduos no ambiente, menos risco de contaminação por uso inadequado dos produtos, redução de uso de maquinário para pulverização das lavouras e, consequentemente, menos consumo de combustível fóssil, de emissão de gases de efeito estufa e de compactação do solo.
Embora o cultivo com transgênicos ofereça diversos ganhos, não se defende o uso exclusivo dessa tecnologia. No Brasil, os sistemas de produção orgânico, convencional e transgênico convivem, de forma harmônica. E os insumos biológicos e químicos podem ser utilizados de forma complementar, em que o produtor aproveita o que de melhor cada tecnologia oferece.
A agropecuária brasileira trabalha para que a nutrição seja uma escolha, ofertando sabor e qualidade em alimentos seguros, por um preço competitivo. Transgênicos, convencionais ou orgânicos, é o consumidor quem faz sua opção --e paga o preço da escolha.
Transgênicos, convencionais ou orgânicos, é o consumidor quem faz sua opção --e paga o preço da escolha
Há cerca de três anos, dois gurus em estratégia de competitividade, Michael Porter e Mark Kramer, criaram o conceito de valor compartilhado, concluindo que o capitalismo passou por grandes transformações.
Hoje, quem mais lucra são os que, em suas atividades, incorporam valores da sociedade. Não se trata, aqui, de caridade ou apenas de responsabilidade social corporativa, ações que ajudam a solidificar a boa reputação da empresa, mas não têm conexão direta com a atividade-fim.
O que tem motivado as empresas a incorporar valores da sociedade à sua estratégia comercial é a conclusão de que, nos tempos atuais, a eficiência econômica está associada ao progresso social. Promover o progresso social impulsiona a inovação, a produtividade e a competitividade. É o que move o desenvolvimento neste século 21.
Essa transformação não chegou apenas aos grandes centros urbanos e parques industriais. Está, também, presente no campo e na agroindústria. Nos próximos 30 anos, o mundo terá de alimentar 9 bilhões de pessoas. As estimativas indicam que a população global vai aumentar em número e renda.
A consultoria McKinsey calcula que, em oito anos, só a China será responsável por uma nova classe média de 630 milhões de pessoas. Quase a totalidade das populações atuais do Brasil e dos Estados Unidos. Como se vê, os desafios vão se multiplicar.
O mundo terá que produzir tanto para combater a fome como para atender a esses novos consumi- dores que terão acesso a proteínas de origem animal, como carnes, leite e ovos --e também mais fibras e energia.
Os empreendedores da agropecuária brasileira já estão conscientes de que inovar é contribuir para a preservação do planeta, e não apenas fornecer comida às pessoas. É produzir mais com menos: sem expandir a área plantada e protegendo seus mananciais.
Para o agronegócio brasileiro, o conceito de sustentabilidade compartilha, assim, os valores econô- micos, sociais e ambientais. São esses os maiores valores da sociedade moderna.
Nesse contexto, o papel da biotecnologia ganha relevo. O Brasil e os Estados Unidos são líderes mundiais nesse campo. O uso de sementes geneticamente modificadas no Brasil é seguro e fundamentado em critérios científicos comprovados.
O que adversários do uso de transgênicos desconhecem --ou fingem desconhecer-- é que a semente do milho resistente à lagarta do cartucho, por exemplo, é desenvolvida a partir da mesma bactéria --o Bacillus thuringiensis--, que, na produção de alimentos orgânicos, é utilizada no controle biológico de pragas.
Esse milho geneticamente modificado é plantado há quase duas décadas no país e não oferece risco à saúde dos consumidores. Apenas contém uma proteína que destrói o intestino da lagarta que ataca as folhas do milho, dispensando o uso de agroquímicos.
O fato incontestável é que as lavouras transgênicas são manejadas usando menos defensivos agrícolas. De acordo com o Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (Isaa, na sigla em inglês), o plantio de transgênicos no mundo já eliminou a necessidade de utilização de 497 mil toneladas de ingrediente ativo de agroquímicos.
Isso significa menos liberação de resíduos no ambiente, menos risco de contaminação por uso inadequado dos produtos, redução de uso de maquinário para pulverização das lavouras e, consequentemente, menos consumo de combustível fóssil, de emissão de gases de efeito estufa e de compactação do solo.
Embora o cultivo com transgênicos ofereça diversos ganhos, não se defende o uso exclusivo dessa tecnologia. No Brasil, os sistemas de produção orgânico, convencional e transgênico convivem, de forma harmônica. E os insumos biológicos e químicos podem ser utilizados de forma complementar, em que o produtor aproveita o que de melhor cada tecnologia oferece.
A agropecuária brasileira trabalha para que a nutrição seja uma escolha, ofertando sabor e qualidade em alimentos seguros, por um preço competitivo. Transgênicos, convencionais ou orgânicos, é o consumidor quem faz sua opção --e paga o preço da escolha.
À sombra dos imortais - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 05/07
Doeu em nós, em cada um de nós. E, ao fim do jogo contra a Colômbia, já nas quartas de final, o Brasil ainda não respirava aliviado com medo da dor que viu no rosto do garoto que, imprevisível, é capaz de tudo. Até mesmo de não fazer uma boa partida, como ontem. A notícia dos médicos foi a que temíamos: Neymar, vértebra fraturada, e fora da Copa.
Passei o dia visitando textos que estão longe do meu campo. O que diria de um jogo como o de ontem um cronista como Nelson Rodrigues? Jogo cuja notícia mais dramática veio após encerrada a partida e foi dada pelos médicos.
Que mistério têm certos cronistas esportivos brasileiros que deixaram obras imortais? Textos sobre um fato conjuntural viram peças literárias lidas com prazer, décadas depois. Revisitei poesias e crônicas do futebol para me espantar, de novo, com sua perenidade. Embalada pelos clássicos, apreciei o jogo dos zagueiros: o capitão Thiago Silva e David Luiz. Até o momento em que Neymar caiu em dores.
Meu hóspede, o jornalista finlandês, me surpreendeu dia desses pedindo para consultar meus livros de Nelson Rodrigues. Separados deles temporariamente - em hora errada, confesso - tive que me socorrer de amigos. Pergunto a uma sobrinha: “Cadê o seu ‘À sombra’?” Nem preciso dizer “das chuteiras imortais”. A pátria de chuteiras sabe de que livro estou falando. “Os jogadores já partiram e o Brasil vacila entre o pessimismo mais obtuso e a esperança mais frenética”, escreveu Nelson na última crônica antes da Copa de 1958. E 56 anos, e cinco títulos depois, ainda estamos assim flutuantes e polares em nosso humor e confiança na seleção.
Um amigo me empresta outros livros, do Nelson, Saldanha, Paulo Mendes Campos. Eles chegam lidos, usados, suados como jogadores ao fim da partida. Ficam mais lindos assim tão lidos.
"O Gol é Necessário" diz o título do livro de Paulo Mendes Campos que de tão bonito nem quero devolver mais ao seu legítimo dono. "A bola, rápida, cai/Passando/ Por entre braços erguidos/Do garboso jogador. Palmas, delírio–grandeza!?/Alguém atira uma rosa/Para os "onze" vencedores/ E ao longe o sol agoniza/ – Numa boêmia de cores". O título do poema de Paulo Mendes Campos é uma afirmação: "Poesia é necessária, mas foi frango". Não é preciso saber quando foi, que jogo era aquele, quem engoliu o frango. Basta saber o quanto o futebol, em seus pequenos detalhes, inspira os poetas. Que poema ele escreveria para o menino Neymar, nossa maior esperança, agora fora da Copa do Brasil?
Mas por que esta coluna joga a economia para escanteio e invoca os imortais das letras esportivas? Espero ter a compreensão dos leitores para o fato de que ontem foi uma sexta diferente. Após semanas de jogos memoráveis, dois enfrentamentos inesquecíveis. França e Alemanha, a terceira guerra mundial, felizmente travada nos pacíficos gramados do Maracanã. Melhor, para a Alemanha nesta guerra. E agora é ela que enfrentaremos em terras mineiras. Depois, vencemos o nosso jogo. “Eis a verdade: o Brasil estava devendo a todos nós uma vitória como a de ontem”, diz Nelson Rodrigues em 28 de junho de 1958. A vitória de ontem nos deixou em pânico. Não pelo jogo. Ele foi difícil mas vencemos. A derrota maior veio depois.
Alguém pode perguntar, como é que Nelson Rodrigues, nunca traduzido, chegou ao conhecimento de um jornalista finlandês? Ele me disse que precisa entender a cultura brasileira do futebol. Eis mais um mistério de certos cronistas esportivos. Seus textos ficam e são eles que nos explicam. Os imortais, o que diriam da vértebra quebrada que pesa sobre cada um de nós?
Fim de festa - ANDRÉ GUSTAVO STUMPF
CORREIO BRAZILIENSE - 05/07
No próximo sábado, duas equipes disputarão o terceiro e o quarto lugares na Copa do Mundo. Não é um título vistoso, mas conta pontos para o ranking da Fifa. Dia seguinte, haverá a final no Maracanã, no Rio de Janeiro, a catedral gótica do futebol brasileiro. É pena que falte apenas uma semana para o campeonato terminar. Alguns turistas vão esticar as férias. A maioria vai colocar o pé na estrada, no avião, no navio ou no automóvel e voltar para a casa.
A festa vai acabar. Depois virá o vazio dos dias sem jogo, sem discussões intermináveis dos muitos técnicos de futebol que apareceram subitamente em todos os canais de televisão. A época do nervosismo, da ansiedade, do sofrimento com prorrogações e penalidades máximas vai terminar. Ficará a memória da Copa do Brasil, de seus jogos espetaculares, viradas sensacionais e jogadas magistrais, como o gol de Van Persie. E aí o brasileiro vai bater de cara com a realidade: eleição presidencial, que não provoca sensações iguais às do futebol e tem o dom de irritar o espectador.
A Copa termina e a campanha já estará nas ruas. O pessoal ainda estará curtindo a ressaca do futebol e a publicidade eleitoral já estará em campo. Ela é permitida pela lei a partir de amanhã, 6 de julho. No próximo mês, entra no ar a famosa propaganda eleitoral gratuita que modifica todos os horários dos programas de televisão e acrescenta pouco ao candidato. Somente aqueles que disputam a eleição majoritária podem se beneficiar. O resto fica exposto ao enorme desfilar de votos e propostas sem o necessário fundamento.
A discussão é se a televisão - no caso, com o rádio - pode modificar a preferência do eleitor. Na eleição de 1989 - que foi solteira, ou seja só o cargo de presidente estava em jogo - o então candidato Fernando Collor mandou muito bem. Aparecia na tevê à frente de paisagens maravilhosas, sempre muito bem vestido e com um discurso duro e inflexível no sentido de abrir a economia nacional e perseguir os marajás. Collor era candidato de um partido pequeno, com pouco tempo na televisão. Ulysses Guimarães, ao contrário, presidente do PMDB, dispunha de uma enormidade de tempo. Não passou para o segundo turno.
Collor e Lula disputaram a final e o alagoano venceu depois de duelo fascinante no debate diante das câmeras de televisão. Lula precisou se candidatar outras duas vezes - e perder - antes de encontrar um articulador político, chamado José Dirceu, para fazer alianças e abrir o arco de apoios ao PT. Essa política se expandiu até o limite em que se encontra hoje. Um partido de pouca expressão como o PR coloca a presidente contra a parede, exige e consegue trocar ministros. Tudo por causa de um minuto e dois segundos no horário eleitoral gratuito.
Estão em campo hoje dois times com estilos diferentes. Aécio Neves herdou do avô, Tancredo, o gosto pela negociação. Ele complicou o cenário paulista ao convidar para vice-presidente o senador Aloysio Nunes Ferreira, amigo de Serra e ex-militante da ALN. Lutou com Marighela contra os militares. Viveu anos na Europa. O PSDB ficou unido no maior colégio eleitoral do país. No segundo maior, Minas Gerais, Aécio indicou seu amigo Pimenta da Veiga, que estava distante da política. Os dois trabalham para abrir boa vantagem de votos sobre Dilma Rousseff.
Andou também pelo Rio de Janeiro e provocou uma tremenda confusão. Sérgio Cabral abandonou a disputa ao Senado. Assumiu seu lugar o ex-prefeito César Maia. Pezão, o candidato ao governo, terá apoio do PMDB, que nega dar suporte ao candidato de Dilma Rousseff no estado, Lindbergh Farias. A candidatura Dilma Rousseff é produto de laboratório. O ex-presidente Lula conseguiu, com o simples apontar o dedo, eleger Dilma para a Presidência, Fernando Haddad para prefeito em São Paulo e agora tenta Padilha para o governo do estado.
A Copa do Mundo auxiliou Dilma. Sua popularidade parou de cair. Mas os números da economia são ruins. As montadoras de veículos começaram a demitir. A inflação incomoda. O mercado de trabalho tornou-se restritivo. A ela resta o caminho da negociação de cargos. A produção industrial brasileira acumula perda de 4,5% desde outubro do ano passado. Se a política econômica da presidente não a auxilia, o Programa Bolsa Família ajuda nos grotões. É nesse apoio que ela se pendura. E viaja sem parar. Inaugura o que encontra pela frente. Estilos diferentes, mas objetivos iguais. É a luta pelo poder.
Cristianização - MIGUEL REALE JÚNIOR
O ESTADO DE S. PAULO - 05/07
As múltiplas composições eleitorais só podem deixar perplexo o eleitor, que se surpreende com junções nunca dantes imaginadas, contestadas mesmo por seus atores até a undécima hora, ou defecções que contrariam neste ou naquele Estado a linha adotada pelo partido no plano nacional.
Assustadoramente, em bom estilo do PCC, político comandou de dentro do presídio o caminho a ser seguido por seu partido, o PR, impondo à presidente da República a destituição de um seu ministro, que cometera o pecado mortal de não atender parlamentares da sigla. Feita a vontade do mensaleiro, o PR decidiu apoiar oficialmente a reeleição da presidente. Esse fato demonstra o terreno pantanoso em que se arrima a nossa democracia.
De outra parte, há imperativos de ordem pessoal ou busca de sintonia com o eleitorado, cuja tendência orienta os candidatos a deputado e a governador, que se sobrepõem aos compromissos oficiais firmados pelos partidos. A história de nossa vida política bem revela como essas preferências pessoais e de conveniência eleitoral pesam muito mais do que a adoção de uma candidatura em convenção nacional do partido.
Em 1950 Getúlio Vargas, candidato dos trabalhadores pelo PTB, recebeu o apoio concreto do PSD, partido de centro-direita, que abandonou no correr da disputa o seu candidato a presidente, Cristiano Machado, orientando firmemente a vontade eleitoral em favor do antigo ditador. Nasce daí o termo "cristianização", que significa a crucificação de um candidato por seus correligionários.
Em janeiro de 1985 Paulo Maluf foi derrotado no colégio eleitoral, apesar de ser o candidato (a presidente da República) do partido majoritário, base política do regime militar, o PDS, sucessor da Arena, em vista de defecções em favor do candidato do partido de oposição à ditadura, o PMDB. Tancredo Neves, na eleição indireta então existente, no mesmo colégio eleitoral, órgão composto por parlamentares federais e representantes de Assembleias Legislativas, ganhou com os votos do partido adversário, inclusive tendo por candidato a vice um recém-egresso da presidência do PDS, o sempre presente José Sarney.
Chegou-se a discutir, à época, se caberia ao PDS fixar como questão fechada, a ser seguida por seus membros, o voto obrigatório no candidato do partido na eleição pelo colégio eleitoral, sob pena de, em caso de desrespeito, exclusão da legenda, por infidelidade. Ponderou-se, então, que questão fechada apenas teria lugar no Congresso Nacional, e não no colégio eleitoral. Era uma importante questiúncula, que foi básica para Paulo Maluf ser cristianizado. A consagração de Maluf na convenção como candidato do seu partido a presidente não resistiu aos ares da redemocratização.
Malgrado ter, em convenção nacional, reafirmado o apoio oficial à reeleição da presidente Dilma Rousseff e ocupar na chapa o cargo de vice-presidente, em vários Estados, especialmente do Nordeste, o PMDB vai cristianizando a sua candidata. Como explicar tal fenômeno?
Primeiramente, é fato notório não ter existido de 1946 a esta parte vida partidária consistente na política brasileira. Em 1965, após o golpe, ainda permaneciam existindo 13 partidos que haviam, nos anos 60, começado a consolidar-se, tais como o PSD, o PTB, a UDN, o PSP, o PDC, quando o Ato Institucional n.º 2 os dissolveu, formando forçosamente dois partidos, Arena e MDB.
A reunião imposta de diversas linhas dentro de um mesmo partido não resistiu à realidade, criando-se, então, o subterfúgio das sublegendas. As conveniências pessoais ditaram o surgimento de partidos dentro dos partidos.
Além da falta de tradição partidária, é necessário reconhecer formarem-se as opções eleitorais em vista de idiossincrasias e disputas locais, constituindo estas imperativos enfraquecedores das orientações emanadas pela cúpula. Assim, o PMDB começou o processo de "cristianização" de Dilma. Seja porque os ventos apontam no sentido contrário à sua candidatura, cuja rejeição não se limita à elite branca, como no primeiro momento o guru Lula explorara, seja por dificuldades de convivência ou mesmo conflitos entre as siglas PT e PMDB em muitos municípios cujos líderes políticos, prefeitos e deputados, no dia a dia vão propagar apoio a candidatos de oposição.
Essa é a situação no Rio de Janeiro, onde o candidato do PMDB ao governo chegou a dizer que seu palanque abrigaria Dilma, Aécio Neves e o pastor Everaldo. Cobrado por Gilberto Carvalho, Pezão voltou atrás ao declarar apoio a Dilma. Prevalecerá, contudo, o Aezão, união entre Aécio e Pezão, pois assim vão agir, como se noticia, prefeitos e deputados.
No Ceará o PMDB, com seu candidato ao governo, Eunício de Oliveira, firmou acordo com o PSDB e compôs, conjuntamente com o DEM, chapa única para governador, vice e senador. O palanque do PMDB no Ceará será de Aécio. O mesmo sucederá na Bahia, em coligação na qual o candidato ao governo será do DEM, o vice, do PSDB e ao Senado, do PMDB, com palanque aberto para Aécio.
O que sucede com o PMDB ocorre igualmente com o PP, cuja Executiva, em reunião fechada, decidiu consagrar apoio à candidatura de Dilma, mas essa posição foi fortemente contestada na base partidária, especialmente nos Estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
Destarte, o já conhecido processo de cristianização só tende a aumentar graças a um conjunto de fatores: a antipatia gerada pela figura presidencial; a marca da corrupção; os rumos desfavoráveis da economia; as posições contrárias, por razões múltiplas, à presidente em diversos Estados, pelos membros de partidos oficialmente apoiadores da reeleição.
Resta esperar que os candidatos da oposição não se limitem a usufruir a rejeição crescente à presidente, pois devem trazer o alento de novos tempos com propostas concretas de reorganização econômica e política, sem o que teremos mais do mesmo, sob outra etiqueta.
As múltiplas composições eleitorais só podem deixar perplexo o eleitor, que se surpreende com junções nunca dantes imaginadas, contestadas mesmo por seus atores até a undécima hora, ou defecções que contrariam neste ou naquele Estado a linha adotada pelo partido no plano nacional.
Assustadoramente, em bom estilo do PCC, político comandou de dentro do presídio o caminho a ser seguido por seu partido, o PR, impondo à presidente da República a destituição de um seu ministro, que cometera o pecado mortal de não atender parlamentares da sigla. Feita a vontade do mensaleiro, o PR decidiu apoiar oficialmente a reeleição da presidente. Esse fato demonstra o terreno pantanoso em que se arrima a nossa democracia.
De outra parte, há imperativos de ordem pessoal ou busca de sintonia com o eleitorado, cuja tendência orienta os candidatos a deputado e a governador, que se sobrepõem aos compromissos oficiais firmados pelos partidos. A história de nossa vida política bem revela como essas preferências pessoais e de conveniência eleitoral pesam muito mais do que a adoção de uma candidatura em convenção nacional do partido.
Em 1950 Getúlio Vargas, candidato dos trabalhadores pelo PTB, recebeu o apoio concreto do PSD, partido de centro-direita, que abandonou no correr da disputa o seu candidato a presidente, Cristiano Machado, orientando firmemente a vontade eleitoral em favor do antigo ditador. Nasce daí o termo "cristianização", que significa a crucificação de um candidato por seus correligionários.
Em janeiro de 1985 Paulo Maluf foi derrotado no colégio eleitoral, apesar de ser o candidato (a presidente da República) do partido majoritário, base política do regime militar, o PDS, sucessor da Arena, em vista de defecções em favor do candidato do partido de oposição à ditadura, o PMDB. Tancredo Neves, na eleição indireta então existente, no mesmo colégio eleitoral, órgão composto por parlamentares federais e representantes de Assembleias Legislativas, ganhou com os votos do partido adversário, inclusive tendo por candidato a vice um recém-egresso da presidência do PDS, o sempre presente José Sarney.
Chegou-se a discutir, à época, se caberia ao PDS fixar como questão fechada, a ser seguida por seus membros, o voto obrigatório no candidato do partido na eleição pelo colégio eleitoral, sob pena de, em caso de desrespeito, exclusão da legenda, por infidelidade. Ponderou-se, então, que questão fechada apenas teria lugar no Congresso Nacional, e não no colégio eleitoral. Era uma importante questiúncula, que foi básica para Paulo Maluf ser cristianizado. A consagração de Maluf na convenção como candidato do seu partido a presidente não resistiu aos ares da redemocratização.
Malgrado ter, em convenção nacional, reafirmado o apoio oficial à reeleição da presidente Dilma Rousseff e ocupar na chapa o cargo de vice-presidente, em vários Estados, especialmente do Nordeste, o PMDB vai cristianizando a sua candidata. Como explicar tal fenômeno?
Primeiramente, é fato notório não ter existido de 1946 a esta parte vida partidária consistente na política brasileira. Em 1965, após o golpe, ainda permaneciam existindo 13 partidos que haviam, nos anos 60, começado a consolidar-se, tais como o PSD, o PTB, a UDN, o PSP, o PDC, quando o Ato Institucional n.º 2 os dissolveu, formando forçosamente dois partidos, Arena e MDB.
A reunião imposta de diversas linhas dentro de um mesmo partido não resistiu à realidade, criando-se, então, o subterfúgio das sublegendas. As conveniências pessoais ditaram o surgimento de partidos dentro dos partidos.
Além da falta de tradição partidária, é necessário reconhecer formarem-se as opções eleitorais em vista de idiossincrasias e disputas locais, constituindo estas imperativos enfraquecedores das orientações emanadas pela cúpula. Assim, o PMDB começou o processo de "cristianização" de Dilma. Seja porque os ventos apontam no sentido contrário à sua candidatura, cuja rejeição não se limita à elite branca, como no primeiro momento o guru Lula explorara, seja por dificuldades de convivência ou mesmo conflitos entre as siglas PT e PMDB em muitos municípios cujos líderes políticos, prefeitos e deputados, no dia a dia vão propagar apoio a candidatos de oposição.
Essa é a situação no Rio de Janeiro, onde o candidato do PMDB ao governo chegou a dizer que seu palanque abrigaria Dilma, Aécio Neves e o pastor Everaldo. Cobrado por Gilberto Carvalho, Pezão voltou atrás ao declarar apoio a Dilma. Prevalecerá, contudo, o Aezão, união entre Aécio e Pezão, pois assim vão agir, como se noticia, prefeitos e deputados.
No Ceará o PMDB, com seu candidato ao governo, Eunício de Oliveira, firmou acordo com o PSDB e compôs, conjuntamente com o DEM, chapa única para governador, vice e senador. O palanque do PMDB no Ceará será de Aécio. O mesmo sucederá na Bahia, em coligação na qual o candidato ao governo será do DEM, o vice, do PSDB e ao Senado, do PMDB, com palanque aberto para Aécio.
O que sucede com o PMDB ocorre igualmente com o PP, cuja Executiva, em reunião fechada, decidiu consagrar apoio à candidatura de Dilma, mas essa posição foi fortemente contestada na base partidária, especialmente nos Estados de Minas Gerais e Rio Grande do Sul.
Destarte, o já conhecido processo de cristianização só tende a aumentar graças a um conjunto de fatores: a antipatia gerada pela figura presidencial; a marca da corrupção; os rumos desfavoráveis da economia; as posições contrárias, por razões múltiplas, à presidente em diversos Estados, pelos membros de partidos oficialmente apoiadores da reeleição.
Resta esperar que os candidatos da oposição não se limitem a usufruir a rejeição crescente à presidente, pois devem trazer o alento de novos tempos com propostas concretas de reorganização econômica e política, sem o que teremos mais do mesmo, sob outra etiqueta.
Aberração religiosa - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 05/07
SÃO PAULO - A Suprema Corte dos EUA, em decisão que redefine as fronteiras entre liberdade religiosa e obrigações legais de empresas, estabeleceu que pequenas firmas familiares podem recusar-se a pagar a seus funcionários seguros de saúde que cubram métodos contraceptivos aos quais façam restrições morais.
Embora eu seja um defensor intransigente das liberdades em geral, considero essa decisão um tanto bizarra. Planos de saúde, afinal, são mais bem descritos como uma modalidade de salário indireto do que como benefícios discricionários que patrões oferecem a empregados. Se a moda pega, empresas dirigidas por evangélicos poderiam exigir que seus funcionários não utilizassem seus vencimentos para consumir álcool ou comprar pornografia.
E, mesmo quem entende o seguro saúde como um pacote de favores que companhias concedem a seus colaboradores, é complicado vincular questões de saúde a visões religiosas. Pela lógica da maioria dos ministros da corte, uma firma comandada por testemunhas de Jeová, por exemplo, teria o direito de excluir procedimentos médicos que envolvam transfusões sanguíneas.
Faz muito mais sentido apenas exigir que as empresas paguem o plano e deixar que autoridades sanitárias, que combinam o saber técnico com certa legitimidade política (elas são nomeadas por gestores eleitos), definam o que ele deve incluir.
Mesmo para um ateu, a liberdade religiosa é um valor a preservar. Mas ela é só materializa de forma democrática quando fica restrita à esfera do estritamente pessoal. Isso significa que esse gênero de liberdade deve ser forte no que diz respeito a escolhas individuais, mas perde toda legitimidade quando se transforma em imposições a terceiros. É perfeitamente razoável que o dono da empresa não queira usar determinados métodos contraceptivos, mas não que pretenda estender suas escolhas a seus empregados.
SÃO PAULO - A Suprema Corte dos EUA, em decisão que redefine as fronteiras entre liberdade religiosa e obrigações legais de empresas, estabeleceu que pequenas firmas familiares podem recusar-se a pagar a seus funcionários seguros de saúde que cubram métodos contraceptivos aos quais façam restrições morais.
Embora eu seja um defensor intransigente das liberdades em geral, considero essa decisão um tanto bizarra. Planos de saúde, afinal, são mais bem descritos como uma modalidade de salário indireto do que como benefícios discricionários que patrões oferecem a empregados. Se a moda pega, empresas dirigidas por evangélicos poderiam exigir que seus funcionários não utilizassem seus vencimentos para consumir álcool ou comprar pornografia.
E, mesmo quem entende o seguro saúde como um pacote de favores que companhias concedem a seus colaboradores, é complicado vincular questões de saúde a visões religiosas. Pela lógica da maioria dos ministros da corte, uma firma comandada por testemunhas de Jeová, por exemplo, teria o direito de excluir procedimentos médicos que envolvam transfusões sanguíneas.
Faz muito mais sentido apenas exigir que as empresas paguem o plano e deixar que autoridades sanitárias, que combinam o saber técnico com certa legitimidade política (elas são nomeadas por gestores eleitos), definam o que ele deve incluir.
Mesmo para um ateu, a liberdade religiosa é um valor a preservar. Mas ela é só materializa de forma democrática quando fica restrita à esfera do estritamente pessoal. Isso significa que esse gênero de liberdade deve ser forte no que diz respeito a escolhas individuais, mas perde toda legitimidade quando se transforma em imposições a terceiros. É perfeitamente razoável que o dono da empresa não queira usar determinados métodos contraceptivos, mas não que pretenda estender suas escolhas a seus empregados.
Trégua da Copa - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 05/07
Mesmo sendo o Brasil "o país do futebol", os resultados das Copas do Mundo nunca influenciaram as eleições para presidente da República, que de quatro em quatro anos coincidem com os campeonatos desde 1994.
Sendo este ano realizado no Brasil, sabia-se que, desta vez, seria um pouco diferente, pelo impacto do resultado dos jogos no ânimo dos brasileiros, e também pela organização do campeonato em si.
A presidente Dilma lançou equivocadamente um slogan, "a Copa das Copas", como se o governo tivesse o condão de transformar pela propaganda a competição em mais uma realização petista. Mesmo sendo evidente que, se dentro do campo os muitos gols e partidas emocionantes podem transformá-la numa das melhores Copas já disputadas, fora dos estádios o que justificaria o epíteto nada tem a ver com o governo: a simpatia do povo brasileiro, a alegria dos estrangeiros pelas praias ensolaradas, a comemoração pelas ruas do país numa confraternização que é característica do brasileiro.
Não será a Copa das Copas pela organização, nem pelos estádios, embora tudo tenha funcionado a contento dentro de um esforço extraordinário de segurança que transformou os arredores dos estádios e as principais vias das sedes em verdadeiras praças de guerra.
Melhor assim do que o contrário, mas o funcionamento do que era falho só foi razoável porque saímos da normalidade, e isso muito se deve às críticas quanto aos atrasos e ao desleixo com que a organização da Copa foi tratada pelos governantes.
Depois da democratização, não houve governo que quisesse se aproveitar das campanhas da seleção para ganhar popularidade. Durante a ditadura militar, sim, governos tentaram interferir até mesmo na escalação da seleção. A vontade do então presidente Médici de escalar Dario na seleção de Saldanha é uma das versões que persistem sobre a Copa de 1970, que teve no México uma atuação perfeita para trazer o tri sob o comando de Zagallo.
Desgastes diversos, com autoridades e jornalistas, e sua ligação com o Partido Comunista Brasileiro levaram Saldanha a ter que deixar o comando da seleção. Também é conhecida a tentativa, no governo Geisel, de convencer Pelé a voltar à seleção em 1974, o que ele rejeitou sabiamente.
Os governos do PT montaram a Copa do Mundo no Brasil com um olho na popularidade e outro na eleição deste ano. O que deveria ser a apoteose de um projeto iniciado há sete anos, quando a Fifa escolheu o país do futebol para sediar a Copa, transformou- se em um pesadelo para o governo e para a Fifa enquanto a bola não rolava, e mostrou que o povo brasileiro não é exatamente o que pensavam que era: acrítico diante da possibilidade de ver os principais craques do mundo da bola ao vivo em suntuosos estádios.
O povo brasileiro vai dando um exemplo de como é possível separar as coisas sem perder a naturalidade. Adora futebol, está apoiando a seleção brasileira, mas nada indica que tenha ânimo de esquecer seus problemas apenas por causa do futebol.
Por isso, o governo volta a cometer um erro primário se interpretar a pausa que a Copa está dando aos brasileiros, que resultou no desanuviamento do ambiente político, como sinal de que os problemas da vida real estão superados. Tudo indica que, passada a trégua proporcionada pela festa do futebol, qualquer tentativa de usar o patriotismo inerente ao povo brasileiro em galardão político pode ser rechaçada pela população.
A pesquisa Datafolha que recolocou a presidente Dilma no patamar que todas as demais pesquisas lhe dão, entre 38% e 40%, demonstra a resiliência de sua candidatura, sinal de que, especialmente no Nordeste, a máquina partidária e de propaganda do governo tem condições de mantê-la como favorita mesmo em situações adversas, como a que vivemos na economia nos últimos quatro anos.
A partir de agora, a propaganda oficial está proibida, e o noticiário político terá que tratar igualmente os candidatos, o que dará mais espaço aos de oposição e reduzirá a exposição da presidente, que busca a reeleição. A gordura que ela conservou durante os primeiros meses de campanha ainda é suficiente para colocá-la em posição de liderança na corrida sucessória, mas, depois da efêmera pacificação que a Copa está dando ao ambiente político, a realidade do dia a dia voltará a ser encarada pelo eleitorado.
Mesmo sendo o Brasil "o país do futebol", os resultados das Copas do Mundo nunca influenciaram as eleições para presidente da República, que de quatro em quatro anos coincidem com os campeonatos desde 1994.
Sendo este ano realizado no Brasil, sabia-se que, desta vez, seria um pouco diferente, pelo impacto do resultado dos jogos no ânimo dos brasileiros, e também pela organização do campeonato em si.
A presidente Dilma lançou equivocadamente um slogan, "a Copa das Copas", como se o governo tivesse o condão de transformar pela propaganda a competição em mais uma realização petista. Mesmo sendo evidente que, se dentro do campo os muitos gols e partidas emocionantes podem transformá-la numa das melhores Copas já disputadas, fora dos estádios o que justificaria o epíteto nada tem a ver com o governo: a simpatia do povo brasileiro, a alegria dos estrangeiros pelas praias ensolaradas, a comemoração pelas ruas do país numa confraternização que é característica do brasileiro.
Não será a Copa das Copas pela organização, nem pelos estádios, embora tudo tenha funcionado a contento dentro de um esforço extraordinário de segurança que transformou os arredores dos estádios e as principais vias das sedes em verdadeiras praças de guerra.
Melhor assim do que o contrário, mas o funcionamento do que era falho só foi razoável porque saímos da normalidade, e isso muito se deve às críticas quanto aos atrasos e ao desleixo com que a organização da Copa foi tratada pelos governantes.
Depois da democratização, não houve governo que quisesse se aproveitar das campanhas da seleção para ganhar popularidade. Durante a ditadura militar, sim, governos tentaram interferir até mesmo na escalação da seleção. A vontade do então presidente Médici de escalar Dario na seleção de Saldanha é uma das versões que persistem sobre a Copa de 1970, que teve no México uma atuação perfeita para trazer o tri sob o comando de Zagallo.
Desgastes diversos, com autoridades e jornalistas, e sua ligação com o Partido Comunista Brasileiro levaram Saldanha a ter que deixar o comando da seleção. Também é conhecida a tentativa, no governo Geisel, de convencer Pelé a voltar à seleção em 1974, o que ele rejeitou sabiamente.
Os governos do PT montaram a Copa do Mundo no Brasil com um olho na popularidade e outro na eleição deste ano. O que deveria ser a apoteose de um projeto iniciado há sete anos, quando a Fifa escolheu o país do futebol para sediar a Copa, transformou- se em um pesadelo para o governo e para a Fifa enquanto a bola não rolava, e mostrou que o povo brasileiro não é exatamente o que pensavam que era: acrítico diante da possibilidade de ver os principais craques do mundo da bola ao vivo em suntuosos estádios.
O povo brasileiro vai dando um exemplo de como é possível separar as coisas sem perder a naturalidade. Adora futebol, está apoiando a seleção brasileira, mas nada indica que tenha ânimo de esquecer seus problemas apenas por causa do futebol.
Por isso, o governo volta a cometer um erro primário se interpretar a pausa que a Copa está dando aos brasileiros, que resultou no desanuviamento do ambiente político, como sinal de que os problemas da vida real estão superados. Tudo indica que, passada a trégua proporcionada pela festa do futebol, qualquer tentativa de usar o patriotismo inerente ao povo brasileiro em galardão político pode ser rechaçada pela população.
A pesquisa Datafolha que recolocou a presidente Dilma no patamar que todas as demais pesquisas lhe dão, entre 38% e 40%, demonstra a resiliência de sua candidatura, sinal de que, especialmente no Nordeste, a máquina partidária e de propaganda do governo tem condições de mantê-la como favorita mesmo em situações adversas, como a que vivemos na economia nos últimos quatro anos.
A partir de agora, a propaganda oficial está proibida, e o noticiário político terá que tratar igualmente os candidatos, o que dará mais espaço aos de oposição e reduzirá a exposição da presidente, que busca a reeleição. A gordura que ela conservou durante os primeiros meses de campanha ainda é suficiente para colocá-la em posição de liderança na corrida sucessória, mas, depois da efêmera pacificação que a Copa está dando ao ambiente político, a realidade do dia a dia voltará a ser encarada pelo eleitorado.
Triunfalistas F.C. vs. Derrotistas F.R. - ALBERTO DINES
GAZETA DO POVO - PR - 05/07
Vencer sem convencer – poderia ser pior. Vitórias e derrotas têm gradações, tons, nuances, diferentes sabores. O placar de ontem no Castelão não é definitivo. As vitórias de Pirro, há 2.280 anos, também deixaram gosto amargo. Malogros e perdas podem ser moralmente superiores a logros e ganhos. E vice-versa.
O êxito é inconfiável, ambíguo: deriva de exit, sair, morrer, porém é mais lembrado no outro extremo, como sucesso – que, antecipado por um minúsculo prefixo negativo, transforma-se em insucesso.
Perversa relatividade, impiedoso relativismo: destroem diferenças, definições, conclusões, tudo fica móvel, provisório. Com apenas duas ou três letras reverte-se e se desmancha o que parece sólido, definitivo, inequívoco – ventura é quase desventura, graça é quase desgraça.
O sofrido resultado ontem no Castelão só vale até a próxima terça e, caso continue, precisará ser consagrado na catedral do Maracanã. Qualquer que seja o vencedor da grand finale, o delírio vitorioso será passageiro, fugaz a dor do vencido. O Day After é um pêndulo inexorável, insaciável, imponderável, instância mais do que suprema.
Os triunfalistas de agora se sentiam derrotados ao começar o torneio mundial de futebol, o espectro do #nãovaitercopa impunha-se às esperanças de um maravilhoso evento. Teve Copa, os visitantes estão adorando, imaginavam que seria pior. Tudo bem, OK. Ma non troppo: para festeiros qualquer festa é boa, algumas poderiam ser melhores, sobretudo quando o custo fica abaixo dos benefícios.
Uma nação estável, estruturada, necessita tanto dos otimistas quanto dos pessimistas. Em porções rigorosamente iguais. A função dos derrotistas é sacudir os arrogantes, alertar para a falibilidade dos infalíveis. Dos triunfalistas espera-se animação, impulso, superação.
Neste panorama pouco edificante, acrescenta-se o deplorável jogo de empurra para chegar aos responsáveis pelo desabamento do viaduto em Belo Horizonte, perto do Mineirão onde será disputada a semifinal da Copa. A obra estava incluída no PAC da Mobilidade Urbana, mas executada pela prefeitura da capital. A tentativa de incriminar o governo federal ou o municipal para obter dividendos eleitorais é um escárnio às vítimas. Só serve para desqualificar nosso processo político e nossa aversão a qualquer modalidade de convivência e coabitação.
Horas antes do pífio espetáculo em Fortaleza (que um pusilânime árbitro espanhol conseguiu piorar), a Alemanha eliminou a França, sua adversária em três sangrentas guerras de verdade e dezenas de confrontos desportivos de alto nível. O placar do Maracanã só registrou um único gol, porém no quesito fair play e esportividade foi uma goleada de 10 a 10.
Prossegue a Copa das Copas, as zebras ainda podem aprontar surpresas. O mais importante é anular este fla-flu de várzea entre o Triunfalistas Futebol Clube e seu rival, o Derrotistas Futebol e Regatas. Nele todos perdem.
Vencer sem convencer – poderia ser pior. Vitórias e derrotas têm gradações, tons, nuances, diferentes sabores. O placar de ontem no Castelão não é definitivo. As vitórias de Pirro, há 2.280 anos, também deixaram gosto amargo. Malogros e perdas podem ser moralmente superiores a logros e ganhos. E vice-versa.
O êxito é inconfiável, ambíguo: deriva de exit, sair, morrer, porém é mais lembrado no outro extremo, como sucesso – que, antecipado por um minúsculo prefixo negativo, transforma-se em insucesso.
Perversa relatividade, impiedoso relativismo: destroem diferenças, definições, conclusões, tudo fica móvel, provisório. Com apenas duas ou três letras reverte-se e se desmancha o que parece sólido, definitivo, inequívoco – ventura é quase desventura, graça é quase desgraça.
O sofrido resultado ontem no Castelão só vale até a próxima terça e, caso continue, precisará ser consagrado na catedral do Maracanã. Qualquer que seja o vencedor da grand finale, o delírio vitorioso será passageiro, fugaz a dor do vencido. O Day After é um pêndulo inexorável, insaciável, imponderável, instância mais do que suprema.
Os triunfalistas de agora se sentiam derrotados ao começar o torneio mundial de futebol, o espectro do #nãovaitercopa impunha-se às esperanças de um maravilhoso evento. Teve Copa, os visitantes estão adorando, imaginavam que seria pior. Tudo bem, OK. Ma non troppo: para festeiros qualquer festa é boa, algumas poderiam ser melhores, sobretudo quando o custo fica abaixo dos benefícios.
Uma nação estável, estruturada, necessita tanto dos otimistas quanto dos pessimistas. Em porções rigorosamente iguais. A função dos derrotistas é sacudir os arrogantes, alertar para a falibilidade dos infalíveis. Dos triunfalistas espera-se animação, impulso, superação.
Neste panorama pouco edificante, acrescenta-se o deplorável jogo de empurra para chegar aos responsáveis pelo desabamento do viaduto em Belo Horizonte, perto do Mineirão onde será disputada a semifinal da Copa. A obra estava incluída no PAC da Mobilidade Urbana, mas executada pela prefeitura da capital. A tentativa de incriminar o governo federal ou o municipal para obter dividendos eleitorais é um escárnio às vítimas. Só serve para desqualificar nosso processo político e nossa aversão a qualquer modalidade de convivência e coabitação.
Horas antes do pífio espetáculo em Fortaleza (que um pusilânime árbitro espanhol conseguiu piorar), a Alemanha eliminou a França, sua adversária em três sangrentas guerras de verdade e dezenas de confrontos desportivos de alto nível. O placar do Maracanã só registrou um único gol, porém no quesito fair play e esportividade foi uma goleada de 10 a 10.
Prossegue a Copa das Copas, as zebras ainda podem aprontar surpresas. O mais importante é anular este fla-flu de várzea entre o Triunfalistas Futebol Clube e seu rival, o Derrotistas Futebol e Regatas. Nele todos perdem.
A erosão do núcleo duro - CLÁUDIO COUTO
O ESTADO DE S.PAULO - 05/07
Nos últimos dias, muito se falou da recuperação da presidente Dilma Rousseff na pesquisa Datafolha. Após meses de queda contínua, a candidata à reeleição recobrou quatro pontos porcentuais (acima, portanto, da margem de erro), acompanhada de modo menos destacado por seus principais oponentes - Aécio Neves e Eduardo Campos. Até o liliputiano José Maria (PSTU) oscilou positivamente.
As intenções de voto que causaram esse crescimento generalizado provieram principalmente dos eleitores antes sem candidato. Esses eram 30% no início de junho, declinando para 24% agora. Contudo, como o crescimento de todos os postulantes somou 11%, há uma diferença de 5% difícil de se explicar graças aos arredondamentos.
Apesar da discrepância, que mereceria mais esclarecimentos, a pesquisa parece detectar uma alteração no cenário eleitoral, apontada pela maioria dos analistas como decorrente da mudança nas percepções sobre a Copa do Mundo. Virou sucesso o que antes era amplamente anunciado como fiasco certo. E como há poucas coisas capazes de criar tanto contentamento quanto um desfecho feliz para o que prometia ser um desastre, temos aí uma boa explicação para a mudança do humor popular.
O problema é que o mau humor social não parece advir unicamente de expectativas e avaliações sobre a Copa. Ele vem de um paulatino aumento de insatisfação que não apenas recrudesceu após junho de 2013, mas possibilitou junho de 2013. Para isto, talvez sejam mais reveladores alguns dados da pesquisa CNI-Ibope de meados de junho último. Mais que as apreciações genéricas sobre a presidente e seu governo, chamam a atenção ali percepções sobre certas áreas de políticas públicas. Em todas há um claro declínio da satisfação popular.
No caso da educação, até junho de 2013 a desaprovação era preponderante, mas em patamar próximo à aprovação - enquanto a primeira ficava sempre pouco acima dos 50%, a segunda ficava sempre um pouco abaixo. Com o tempo, a "boca" do gráfico foi se abrindo e hoje verificamos uma desaprovação que beira os 70%, contra 30% de aprovação. Já no caso da saúde, da segurança pública e dos impostos, o cenário é algo distinto, pois embora os patamares de desaprovação tenham crescido e sejam maiores que os da educação, eles já eram significativamente maiores. Assim, para estas áreas a avaliação piorou, mas não mudou de natureza.
Houve também piora da apreciação de aspectos centrais da gestão macroeconômica, como combate à inflação e política de juros. Depois de um momento bastante alentador para o governo, em 2012, a "boca" do gráfico se abriu, com a desaprovação ultrapassando os 70% em ambos os casos. Talvez resida exatamente aí, na inflação (nem tão alta, mas persistente), a explicação principal para a difusão social do mau humor.
Os dados mais impressionantes, contudo, vêm das percepções populares sobre duas áreas que foram os grandes trunfos dos governos petistas desde meados da década passada: os combates à fome e à pobreza, bem como ao desemprego. No caso da primeira política, o declínio das apreciações ao seu respeito se iniciou justamente em junho de 2013, sendo que desde março de 2014 temos uma avaliação negativa que supera a aprovação - hoje, por uma margem de 12%. Já no caso da segunda, apesar dos níveis recorde de emprego, a reprovação supera a aprovação desde setembro - hoje, por uma margem de 20%.
Quando as percepções populares sobre um governo começam a erodir justamente no que pode ser considerado seu núcleo distintivo, há motivos para que ele se preocupe e seus adversários se animem. Há mais coisas envolvidas numa eleição - como as articulações regionais, por exemplo -, mas é na aprovação a políticas sensíveis que lhe distinguem que um governo se faz. E se desfaz.
Nos últimos dias, muito se falou da recuperação da presidente Dilma Rousseff na pesquisa Datafolha. Após meses de queda contínua, a candidata à reeleição recobrou quatro pontos porcentuais (acima, portanto, da margem de erro), acompanhada de modo menos destacado por seus principais oponentes - Aécio Neves e Eduardo Campos. Até o liliputiano José Maria (PSTU) oscilou positivamente.
As intenções de voto que causaram esse crescimento generalizado provieram principalmente dos eleitores antes sem candidato. Esses eram 30% no início de junho, declinando para 24% agora. Contudo, como o crescimento de todos os postulantes somou 11%, há uma diferença de 5% difícil de se explicar graças aos arredondamentos.
Apesar da discrepância, que mereceria mais esclarecimentos, a pesquisa parece detectar uma alteração no cenário eleitoral, apontada pela maioria dos analistas como decorrente da mudança nas percepções sobre a Copa do Mundo. Virou sucesso o que antes era amplamente anunciado como fiasco certo. E como há poucas coisas capazes de criar tanto contentamento quanto um desfecho feliz para o que prometia ser um desastre, temos aí uma boa explicação para a mudança do humor popular.
O problema é que o mau humor social não parece advir unicamente de expectativas e avaliações sobre a Copa. Ele vem de um paulatino aumento de insatisfação que não apenas recrudesceu após junho de 2013, mas possibilitou junho de 2013. Para isto, talvez sejam mais reveladores alguns dados da pesquisa CNI-Ibope de meados de junho último. Mais que as apreciações genéricas sobre a presidente e seu governo, chamam a atenção ali percepções sobre certas áreas de políticas públicas. Em todas há um claro declínio da satisfação popular.
No caso da educação, até junho de 2013 a desaprovação era preponderante, mas em patamar próximo à aprovação - enquanto a primeira ficava sempre pouco acima dos 50%, a segunda ficava sempre um pouco abaixo. Com o tempo, a "boca" do gráfico foi se abrindo e hoje verificamos uma desaprovação que beira os 70%, contra 30% de aprovação. Já no caso da saúde, da segurança pública e dos impostos, o cenário é algo distinto, pois embora os patamares de desaprovação tenham crescido e sejam maiores que os da educação, eles já eram significativamente maiores. Assim, para estas áreas a avaliação piorou, mas não mudou de natureza.
Houve também piora da apreciação de aspectos centrais da gestão macroeconômica, como combate à inflação e política de juros. Depois de um momento bastante alentador para o governo, em 2012, a "boca" do gráfico se abriu, com a desaprovação ultrapassando os 70% em ambos os casos. Talvez resida exatamente aí, na inflação (nem tão alta, mas persistente), a explicação principal para a difusão social do mau humor.
Os dados mais impressionantes, contudo, vêm das percepções populares sobre duas áreas que foram os grandes trunfos dos governos petistas desde meados da década passada: os combates à fome e à pobreza, bem como ao desemprego. No caso da primeira política, o declínio das apreciações ao seu respeito se iniciou justamente em junho de 2013, sendo que desde março de 2014 temos uma avaliação negativa que supera a aprovação - hoje, por uma margem de 12%. Já no caso da segunda, apesar dos níveis recorde de emprego, a reprovação supera a aprovação desde setembro - hoje, por uma margem de 20%.
Quando as percepções populares sobre um governo começam a erodir justamente no que pode ser considerado seu núcleo distintivo, há motivos para que ele se preocupe e seus adversários se animem. Há mais coisas envolvidas numa eleição - como as articulações regionais, por exemplo -, mas é na aprovação a políticas sensíveis que lhe distinguem que um governo se faz. E se desfaz.
Copa e largada eleitoral - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 05/07
BRASÍLIA - A seleção brasileira de futebol venceu por 2 a 1 nesta sexta-feira (4) a da Colômbia. Prolonga-se a sensação de alegria geral. Mas mesmo que o resultado tivesse sido adverso, a festa só duraria um pouco mais. No domingo, dia 13, será disputada a partida final do torneio.
Depois de um pouco de festa, sempre haverá uma certa ressaca, com ou sem o título. Milhares de estrangeiros vão embora. Acabam os dias de semiferiado para assistir aos jogos. As partidas do Campeonato Brasileiro voltarão a ter estádios vazios e futebol sofrível. E começa para valer a campanha eleitoral.
A linha de largada da corrida presidencial oferece algumas pistas sobre o que pode acontecer. Sobretudo porque o Brasil já acumula várias eleições e um histórico democrático que permite comparações.
Hoje, neste início de julho, Dilma Rousseff (PT) tem 38%. Aécio Neves (PSDB) pontua 20%. Eduardo Campos (PSB) está em 9%.
A líder Dilma está agora no patamar em que esteve Fernando Henrique Cardoso (PSDB) neste mesmo mês em 1998, quando tinha 40% e ganhou a reeleição. Em julho de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) registrava 38%, no início de sua primeira caminhada vitoriosa ao Planalto. A própria Dilma, há quatro anos, em 2010, marcava 38%.
O oposicionista Aécio está no limite mínimo de outros segundos colocados nesta fase do ciclo eleitoral. Vários concorrentes em disputas passadas já conseguiam colocações melhores a esta altura. O tucano pode sempre se comparar a FHC em 1994 --que em julho daquele ano tinha 21% contra 38% de Lula, mas acabou virando o jogo e vencendo.
Só que o Brasil em 1994 era outro. FHC encarnava o Plano Real. Dizimou a oposição petista em menos de 60 dias. Não está claro qual poderia ser o fato que Aécio criaria agora para ser o seu "Plano Real".
Sem medidas de impacto, as eleições se tornam mais previsíveis.
BRASÍLIA - A seleção brasileira de futebol venceu por 2 a 1 nesta sexta-feira (4) a da Colômbia. Prolonga-se a sensação de alegria geral. Mas mesmo que o resultado tivesse sido adverso, a festa só duraria um pouco mais. No domingo, dia 13, será disputada a partida final do torneio.
Depois de um pouco de festa, sempre haverá uma certa ressaca, com ou sem o título. Milhares de estrangeiros vão embora. Acabam os dias de semiferiado para assistir aos jogos. As partidas do Campeonato Brasileiro voltarão a ter estádios vazios e futebol sofrível. E começa para valer a campanha eleitoral.
A linha de largada da corrida presidencial oferece algumas pistas sobre o que pode acontecer. Sobretudo porque o Brasil já acumula várias eleições e um histórico democrático que permite comparações.
Hoje, neste início de julho, Dilma Rousseff (PT) tem 38%. Aécio Neves (PSDB) pontua 20%. Eduardo Campos (PSB) está em 9%.
A líder Dilma está agora no patamar em que esteve Fernando Henrique Cardoso (PSDB) neste mesmo mês em 1998, quando tinha 40% e ganhou a reeleição. Em julho de 2002, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) registrava 38%, no início de sua primeira caminhada vitoriosa ao Planalto. A própria Dilma, há quatro anos, em 2010, marcava 38%.
O oposicionista Aécio está no limite mínimo de outros segundos colocados nesta fase do ciclo eleitoral. Vários concorrentes em disputas passadas já conseguiam colocações melhores a esta altura. O tucano pode sempre se comparar a FHC em 1994 --que em julho daquele ano tinha 21% contra 38% de Lula, mas acabou virando o jogo e vencendo.
Só que o Brasil em 1994 era outro. FHC encarnava o Plano Real. Dizimou a oposição petista em menos de 60 dias. Não está claro qual poderia ser o fato que Aécio criaria agora para ser o seu "Plano Real".
Sem medidas de impacto, as eleições se tornam mais previsíveis.
Mais energia para a inflação - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADO DE S.PAULO - 05/07
Mais um sinal de alerta para a inflação acaba de soar no mercado. Os consumidores, principalmente os de baixa renda, estão mais pessimistas que o pessoal do mercado financeiro e das consultorias quanto à evolução dos preços até o meio do próximo ano. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), os consumidores projetam uma inflação de 7,4% para os 12 meses até junho de 2015. Para o mesmo período, a mediana das projeções do mercado ficou em 5,91% na pesquisa Focus do Banco Central (BC) divulgada na última segunda-feira. Essa pesquisa é realizada semanalmente com cerca de 100 economistas do mercado financeiro e de consultorias independentes. Os cálculos do BC para os 12 meses até o meio do próximo ano apontam uma alta de 5,9% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para a política monetária. Como a expectativa é considerada um fator inflacionário pelos especialistas, o ministro da Fazenda e os dirigentes do BC deveriam ficar de prontidão: os donos do julgamento final sobre a alta de preços estão prevendo dias muito ruins.
De fato, nem os dirigentes do BC, responsáveis principais pela política anti-inflacionária, se mostram muito otimistas quanto à evolução de preços e tarifas nos próximos dois anos. Segundo suas estimativas, o IPCA ainda subirá 5,7% em 2014 e 5,1% nos 12 meses até junho de 2016. O ritmo continuará, portanto, muito acima dos 4,5% fixados como meta oficial. Mas o esforço maior, por enquanto, é para impedir a superação, no ano gregoriano, do limite de tolerância, 6,5%. Esse limite, no entanto, será superado neste mês ou no próximo, segundo projeções de vários especialistas.
O risco se eleva com os novos aumentos da conta de luz. A Eletropaulo, responsável pelo abastecimento da capital paulista e de 24 municípios da região metropolitana, foi autorizada a cobrar 18,06% a mais dos consumidores residenciais e 19,93% das indústrias. Como os números de São Paulo têm grande peso na formação do IPCA, o estouro do limite de tolerância se torna quase certo.
Outras 14 distribuidoras foram também autorizadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a aumentar suas tarifas. O maior reajuste, 35,05%, foi atribuído à Copel, mas a empresa, atendendo o governo do Estado, pediu a suspensão do aumento. Sobraram três companhias com autorização para aumentos médios superiores ao da Eletropaulo: AES Sul (29,54%), RGE (22,77%) e Vale Paranapanema (19,66%).
Com esses ajustes, parte do impacto antes previsto para 2015 deve ocorrer neste ano. O efeito teria sido possivelmente menor - mais diluído no tempo - se os aumentos de tarifas tivessem ocorrido a partir do ano passado. Isso teria facilitado o repasse dos custos maiores da energia fornecida pelas centrais térmicas. Mas a presidente Dilma Rousseff preferiu congelar os preços, em mais um esforço para administrar os índices de inflação. Com esse mesmo objetivo o governo federal negociou com municípios e Estados o congelamento das tarifas de transporte público. O controle de preços de combustíveis, com grande custo financeiro para a Petrobrás, é parte da política oficial há mais tempo e foi mantido pelo atual governo.
Nenhum desses truques produz efeitos por muito tempo. Além disso, todos produzem danos importantes. Prejudicam o fluxo de caixa e a rentabilidade das companhias afetadas, derrubam o valor de suas ações, diminuem sua capacidade de investir e transmitem sinais distorcidos ao mercado - por exemplo, estimulando na hora errada o consumo de certos bens ou serviços. Além disso, a manobra resulta muitas vezes em custo para o Tesouro, como no caso das tarifas de eletricidade.
Não se combate a inflação com o controle de preços e a maquiagem dos índices. Políticas desse tipo apenas adiam as soluções necessárias e agravam os problemas. Governos sérios controlam a inflação com aumento de juros e outras medidas monetárias e também com austeridade fiscal e incentivos à produção e à expansão da oferta. Os erros cometidos pelo governo brasileiro nem sequer são originais. Nem todos aprendem com as lições da história.
Mais um sinal de alerta para a inflação acaba de soar no mercado. Os consumidores, principalmente os de baixa renda, estão mais pessimistas que o pessoal do mercado financeiro e das consultorias quanto à evolução dos preços até o meio do próximo ano. Segundo pesquisa da Fundação Getúlio Vargas (FGV), os consumidores projetam uma inflação de 7,4% para os 12 meses até junho de 2015. Para o mesmo período, a mediana das projeções do mercado ficou em 5,91% na pesquisa Focus do Banco Central (BC) divulgada na última segunda-feira. Essa pesquisa é realizada semanalmente com cerca de 100 economistas do mercado financeiro e de consultorias independentes. Os cálculos do BC para os 12 meses até o meio do próximo ano apontam uma alta de 5,9% para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), usado como referência para a política monetária. Como a expectativa é considerada um fator inflacionário pelos especialistas, o ministro da Fazenda e os dirigentes do BC deveriam ficar de prontidão: os donos do julgamento final sobre a alta de preços estão prevendo dias muito ruins.
De fato, nem os dirigentes do BC, responsáveis principais pela política anti-inflacionária, se mostram muito otimistas quanto à evolução de preços e tarifas nos próximos dois anos. Segundo suas estimativas, o IPCA ainda subirá 5,7% em 2014 e 5,1% nos 12 meses até junho de 2016. O ritmo continuará, portanto, muito acima dos 4,5% fixados como meta oficial. Mas o esforço maior, por enquanto, é para impedir a superação, no ano gregoriano, do limite de tolerância, 6,5%. Esse limite, no entanto, será superado neste mês ou no próximo, segundo projeções de vários especialistas.
O risco se eleva com os novos aumentos da conta de luz. A Eletropaulo, responsável pelo abastecimento da capital paulista e de 24 municípios da região metropolitana, foi autorizada a cobrar 18,06% a mais dos consumidores residenciais e 19,93% das indústrias. Como os números de São Paulo têm grande peso na formação do IPCA, o estouro do limite de tolerância se torna quase certo.
Outras 14 distribuidoras foram também autorizadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a aumentar suas tarifas. O maior reajuste, 35,05%, foi atribuído à Copel, mas a empresa, atendendo o governo do Estado, pediu a suspensão do aumento. Sobraram três companhias com autorização para aumentos médios superiores ao da Eletropaulo: AES Sul (29,54%), RGE (22,77%) e Vale Paranapanema (19,66%).
Com esses ajustes, parte do impacto antes previsto para 2015 deve ocorrer neste ano. O efeito teria sido possivelmente menor - mais diluído no tempo - se os aumentos de tarifas tivessem ocorrido a partir do ano passado. Isso teria facilitado o repasse dos custos maiores da energia fornecida pelas centrais térmicas. Mas a presidente Dilma Rousseff preferiu congelar os preços, em mais um esforço para administrar os índices de inflação. Com esse mesmo objetivo o governo federal negociou com municípios e Estados o congelamento das tarifas de transporte público. O controle de preços de combustíveis, com grande custo financeiro para a Petrobrás, é parte da política oficial há mais tempo e foi mantido pelo atual governo.
Nenhum desses truques produz efeitos por muito tempo. Além disso, todos produzem danos importantes. Prejudicam o fluxo de caixa e a rentabilidade das companhias afetadas, derrubam o valor de suas ações, diminuem sua capacidade de investir e transmitem sinais distorcidos ao mercado - por exemplo, estimulando na hora errada o consumo de certos bens ou serviços. Além disso, a manobra resulta muitas vezes em custo para o Tesouro, como no caso das tarifas de eletricidade.
Não se combate a inflação com o controle de preços e a maquiagem dos índices. Políticas desse tipo apenas adiam as soluções necessárias e agravam os problemas. Governos sérios controlam a inflação com aumento de juros e outras medidas monetárias e também com austeridade fiscal e incentivos à produção e à expansão da oferta. Os erros cometidos pelo governo brasileiro nem sequer são originais. Nem todos aprendem com as lições da história.
Falta de confiança paralisa economia - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 05/07
Do ponto de vista dos empresários e consumidores, 2014 é um ano que já acabou. Resta, agora, esperar pelas eleições de outubro e seus desdobramentos
A última tentativa do governo de reanimar a economia, por meio da prorrogação do IPI reduzido sobre veículos novos e móveis, foi mais do mesmo. Atendeu a pedidos, principalmente do setor automobilístico, em mau momento, muito em função da crise argentina. Pode evitar que o esfriamento das vendas aumente, mas não resgatará as montadoras das dificuldades. As famílias estão endividadas e apenas uma minoria troca de carro todo ano.
Há tempos se sabe que o ciclo de crescimento econômico puxado pelo consumo se esgotou. E só os investimentos serão capazes de acelerar as engrenagens da produção. O governo sabe disso, tanto que, passando por cima de preconceitos ideológicos, atrai o capital privado para projetos de infraestrutura.
Elevar, portanto, a indigente taxa de investimentos — de 18% do PIB, quando são necessários 25% — implica fazer muito mais do que propagandear a vontade de fazê-lo, e não apenas na infraestrutura. É preciso, nos termos de Adam Smith, atiçar o “instinto animal” do empreendedor, para que ele decida correr riscos e investir. Mas, sem confiança, ele não se moverá. Como já não se move.
Acreditar no futuro, próximo e distante, é vital para decisões de consumo e investimento. E consumidor e empresário não estão de bom humor. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o índice de confiança do consumidor, em maio, caiu 3,3%, maior queda desde agosto de 2011, quando a retração atingiu 5%. O indicador se encontra próximo do nível do final de 2008, momento em que o mundo era tragado pelo buraco negro da crise financeira deflagrada a partir dos Estados Unidos.
Para o consumidor, preocupa a persistência de uma inflação elevada, na faixa superior aos 6%, muito acima da meta de 4,5%, por leniência do governo. O empresário, por sua vez, tem várias preocupações. Diante do evidente fracasso da política do “novo marco macroeconômico” — câmbio desvalorizado, juros baixos e gastos públicos em alta —, é lógico que empresas repensem planos de crescimento, engavetem projetos.
Outro fator negativo é a insegurança jurídica, agravada pelo estilo mais intervencionista do governo Dilma Rousseff, do qual a grande mostra é a desestabilização financeira do setor elétrico, devido a uma medida provisória baixada para cortar o custo da energia em 20%. A redução da conta de luz virou arma eleitoral, e se converte num bilionário “esqueleto” fiscal, pois o Tesouro tem financiado os rombos no sistema.
Para agravar temores, o governo deixa claro, de forma implícita, que não conseguirá cumprir a meta fiscal de superávit de 1,9% do PIB sem recorrer a receitas extraordinárias e, é provável, novas doses de contabilidade criativa. Não se confia mais na contabilidade pública.
Sendo assim, do ponto de vista da economia e dos negócios, 2014 é um ano que já acabou. Trata-se, agora, de esperar as eleições de outubro e desdobramentos.
Do ponto de vista dos empresários e consumidores, 2014 é um ano que já acabou. Resta, agora, esperar pelas eleições de outubro e seus desdobramentos
A última tentativa do governo de reanimar a economia, por meio da prorrogação do IPI reduzido sobre veículos novos e móveis, foi mais do mesmo. Atendeu a pedidos, principalmente do setor automobilístico, em mau momento, muito em função da crise argentina. Pode evitar que o esfriamento das vendas aumente, mas não resgatará as montadoras das dificuldades. As famílias estão endividadas e apenas uma minoria troca de carro todo ano.
Há tempos se sabe que o ciclo de crescimento econômico puxado pelo consumo se esgotou. E só os investimentos serão capazes de acelerar as engrenagens da produção. O governo sabe disso, tanto que, passando por cima de preconceitos ideológicos, atrai o capital privado para projetos de infraestrutura.
Elevar, portanto, a indigente taxa de investimentos — de 18% do PIB, quando são necessários 25% — implica fazer muito mais do que propagandear a vontade de fazê-lo, e não apenas na infraestrutura. É preciso, nos termos de Adam Smith, atiçar o “instinto animal” do empreendedor, para que ele decida correr riscos e investir. Mas, sem confiança, ele não se moverá. Como já não se move.
Acreditar no futuro, próximo e distante, é vital para decisões de consumo e investimento. E consumidor e empresário não estão de bom humor. Segundo a Fundação Getúlio Vargas, o índice de confiança do consumidor, em maio, caiu 3,3%, maior queda desde agosto de 2011, quando a retração atingiu 5%. O indicador se encontra próximo do nível do final de 2008, momento em que o mundo era tragado pelo buraco negro da crise financeira deflagrada a partir dos Estados Unidos.
Para o consumidor, preocupa a persistência de uma inflação elevada, na faixa superior aos 6%, muito acima da meta de 4,5%, por leniência do governo. O empresário, por sua vez, tem várias preocupações. Diante do evidente fracasso da política do “novo marco macroeconômico” — câmbio desvalorizado, juros baixos e gastos públicos em alta —, é lógico que empresas repensem planos de crescimento, engavetem projetos.
Outro fator negativo é a insegurança jurídica, agravada pelo estilo mais intervencionista do governo Dilma Rousseff, do qual a grande mostra é a desestabilização financeira do setor elétrico, devido a uma medida provisória baixada para cortar o custo da energia em 20%. A redução da conta de luz virou arma eleitoral, e se converte num bilionário “esqueleto” fiscal, pois o Tesouro tem financiado os rombos no sistema.
Para agravar temores, o governo deixa claro, de forma implícita, que não conseguirá cumprir a meta fiscal de superávit de 1,9% do PIB sem recorrer a receitas extraordinárias e, é provável, novas doses de contabilidade criativa. Não se confia mais na contabilidade pública.
Sendo assim, do ponto de vista da economia e dos negócios, 2014 é um ano que já acabou. Trata-se, agora, de esperar as eleições de outubro e desdobramentos.
Comícios em série - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP-05/07
Às vésperas de encerrar-se o prazo legal, governantes que disputarão cargos eletivos inauguram o que podem, do jeito que for possível
Formou-se, como costuma dizer a mídia esportiva, uma rede nacional para que --"todos juntos, um só coração"-- fosse possível assistir ao espetáculo. Não se tratava, porém, de um jogo da Copa. O que motivou tanto empenho das autoridades, nestes últimos dias, foi o calendário eleitoral.
Encerrando-se o prazo para participar de inaugurações de obras, a presidente Dilma Rousseff (PT) assumiu o papel de âncora, digamos, de uma cerimônia para a entrega de moradias à população de baixa renda. Eram 5.460 unidades do programa Minha Casa Minha Vida, distribuídas em 11 cidades.
Ainda que os aeroportos estivessem "impecáveis", como afirmou a presidente neste momento de relativa bonança logístico-organizacional, seriam municípios demais para Dilma visitar de uma vez só. Restringiu-se, pois, a um evento no Distrito Federal, enviando ministros diversos para reproduzir a solenidade nos demais cenários.
Graças a um telão, as imagens e as palavras da presidente se avantajaram aos olhos do público presente em todos os comícios, espalhados de Duque de Caxias a Juazeiro do Norte, de Joinville a Jequié.
Terá sido por esse milagre da ubiquidade eletrônica que, para a celebração em Betim (MG), foi convocado o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação? Clelio Campolina acedeu à missão, inédita para alguém com suas atribuições.
Há pressa --ao menos para inaugurar. Disputando a reeleição, o governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), também via acabar o prazo para dar por concluído o que havia por perto --a saber, um novo trecho do Rodoanel.
Pintavam-se ainda as faixas de trânsito, e quase todos os postes de iluminação estavam sem lâmpadas; pormenores, para o governo estadual, perto do que importava comemorar e do que era melhor considerar menos importante.
A obra deveria ter sido concluída em março, mas a empresa concessionária atrasou sua construção. Outro segmento, de quase seis quilômetros, só em setembro estará disponível para o motorista. O setor norte do Rodoanel, segundo se prevê, ficará pronto em 2016. Ou em 2018? Novas eleições imporão a necessidade de repetir o ritual.
No fundo, talvez não passe disso mesmo: um ritual, remanescente do tempo em que a presença física do candidato e do cidadão compunha o evento básico de uma campanha eleitoral. O comício era o momento de distribuir benefícios, numa visão de mundo paternalista.
Hoje, inaugurações subsistem mais como gestos rotineiros, em contextos dominados tanto pelo profissionalismo dos marqueteiros como pela falta de originalidade nas propostas de campanha. A parafernália dos telões nada faz para alterar esse quadro tão repetitivo.
Às vésperas de encerrar-se o prazo legal, governantes que disputarão cargos eletivos inauguram o que podem, do jeito que for possível
Formou-se, como costuma dizer a mídia esportiva, uma rede nacional para que --"todos juntos, um só coração"-- fosse possível assistir ao espetáculo. Não se tratava, porém, de um jogo da Copa. O que motivou tanto empenho das autoridades, nestes últimos dias, foi o calendário eleitoral.
Encerrando-se o prazo para participar de inaugurações de obras, a presidente Dilma Rousseff (PT) assumiu o papel de âncora, digamos, de uma cerimônia para a entrega de moradias à população de baixa renda. Eram 5.460 unidades do programa Minha Casa Minha Vida, distribuídas em 11 cidades.
Ainda que os aeroportos estivessem "impecáveis", como afirmou a presidente neste momento de relativa bonança logístico-organizacional, seriam municípios demais para Dilma visitar de uma vez só. Restringiu-se, pois, a um evento no Distrito Federal, enviando ministros diversos para reproduzir a solenidade nos demais cenários.
Graças a um telão, as imagens e as palavras da presidente se avantajaram aos olhos do público presente em todos os comícios, espalhados de Duque de Caxias a Juazeiro do Norte, de Joinville a Jequié.
Terá sido por esse milagre da ubiquidade eletrônica que, para a celebração em Betim (MG), foi convocado o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação? Clelio Campolina acedeu à missão, inédita para alguém com suas atribuições.
Há pressa --ao menos para inaugurar. Disputando a reeleição, o governador paulista, Geraldo Alckmin (PSDB), também via acabar o prazo para dar por concluído o que havia por perto --a saber, um novo trecho do Rodoanel.
Pintavam-se ainda as faixas de trânsito, e quase todos os postes de iluminação estavam sem lâmpadas; pormenores, para o governo estadual, perto do que importava comemorar e do que era melhor considerar menos importante.
A obra deveria ter sido concluída em março, mas a empresa concessionária atrasou sua construção. Outro segmento, de quase seis quilômetros, só em setembro estará disponível para o motorista. O setor norte do Rodoanel, segundo se prevê, ficará pronto em 2016. Ou em 2018? Novas eleições imporão a necessidade de repetir o ritual.
No fundo, talvez não passe disso mesmo: um ritual, remanescente do tempo em que a presença física do candidato e do cidadão compunha o evento básico de uma campanha eleitoral. O comício era o momento de distribuir benefícios, numa visão de mundo paternalista.
Hoje, inaugurações subsistem mais como gestos rotineiros, em contextos dominados tanto pelo profissionalismo dos marqueteiros como pela falta de originalidade nas propostas de campanha. A parafernália dos telões nada faz para alterar esse quadro tão repetitivo.
Contradição evidente - EDITORIAL ZERO HORA
ZERO HORA - 05/07
Ao mesmo tempo em que o ministro da Fazenda anuncia um novo pacote de incentivos à indústria automobilística, administradores das cidades de maior porte se empenham em desestimular o uso do automóvel e em valorizar o transporte coletivo. O país não tem como fechar os olhos às quedas sucessivas na produção da indústria automobilística, que representa cerca de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) industrial do país. Até mesmo cidades de médio porte, porém, não comportam mais o tráfego de veículos particulares, nem dispõem de espaço para estacionamento. Encontrar um meio-termo, que ao menos sirva para atenuar essa contradição, é um desafio para os gestores públicos que ganha ainda mais destaque nesta largada oficial de campanha.
Num país historicamente voltado para o transporte rodoviário, tanto no caso de cargas quanto de passageiros, a adoção de um modelo mais diversificado exige acima de tudo uma profunda transformação cultural. A ênfase dada à questão da mobilidade urbana nas manifestações de rua a partir de junho do ano passado vem contribuindo para manter o tema em evidência. Mas há necessidade de um debate de forma continuada, que ajude a conciliar melhor os interesses de quem se vale do transporte individual e do coletivo para se deslocar no cotidiano. A eficiência de um e outro é um pressuposto para facilitar o trânsito, evitando os transtornos que se incorporaram à rotina nos centros urbanos.
A elevada dependência que o país tem da indústria automobilística na geração de riqueza e emprego não pode restringir a busca de alternativas na área da mobilidade. O uso de veículos particulares nas proporções de hoje exige contrapartidas de investimentos em infraestrutura que o país não tem como bancar. Em consequência, ampliam-se a cada dia as dificuldades tanto para quem tenta circular sozinho no conforto de seus veículos particulares quanto em precários ônibus, normalmente lotados, principalmente onde não há corredores específicos.
O país paga um custo elevado demais para as suas deficiências de transporte. Os prejuízos vão desde os relacionados ao tempo em que se fica parado no trânsito até as renúncias fiscais na tentativa de conter as sucessivas quedas nas vendas de veículos. É preciso investir na diversificação de forma gradativa, mas com base em políticas que acenem com alternativas concretas a médio e longo prazos.
Ao mesmo tempo em que o ministro da Fazenda anuncia um novo pacote de incentivos à indústria automobilística, administradores das cidades de maior porte se empenham em desestimular o uso do automóvel e em valorizar o transporte coletivo. O país não tem como fechar os olhos às quedas sucessivas na produção da indústria automobilística, que representa cerca de um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) industrial do país. Até mesmo cidades de médio porte, porém, não comportam mais o tráfego de veículos particulares, nem dispõem de espaço para estacionamento. Encontrar um meio-termo, que ao menos sirva para atenuar essa contradição, é um desafio para os gestores públicos que ganha ainda mais destaque nesta largada oficial de campanha.
Num país historicamente voltado para o transporte rodoviário, tanto no caso de cargas quanto de passageiros, a adoção de um modelo mais diversificado exige acima de tudo uma profunda transformação cultural. A ênfase dada à questão da mobilidade urbana nas manifestações de rua a partir de junho do ano passado vem contribuindo para manter o tema em evidência. Mas há necessidade de um debate de forma continuada, que ajude a conciliar melhor os interesses de quem se vale do transporte individual e do coletivo para se deslocar no cotidiano. A eficiência de um e outro é um pressuposto para facilitar o trânsito, evitando os transtornos que se incorporaram à rotina nos centros urbanos.
A elevada dependência que o país tem da indústria automobilística na geração de riqueza e emprego não pode restringir a busca de alternativas na área da mobilidade. O uso de veículos particulares nas proporções de hoje exige contrapartidas de investimentos em infraestrutura que o país não tem como bancar. Em consequência, ampliam-se a cada dia as dificuldades tanto para quem tenta circular sozinho no conforto de seus veículos particulares quanto em precários ônibus, normalmente lotados, principalmente onde não há corredores específicos.
O país paga um custo elevado demais para as suas deficiências de transporte. Os prejuízos vão desde os relacionados ao tempo em que se fica parado no trânsito até as renúncias fiscais na tentativa de conter as sucessivas quedas nas vendas de veículos. É preciso investir na diversificação de forma gradativa, mas com base em políticas que acenem com alternativas concretas a médio e longo prazos.
Argentina erra ao ideologizar dívida externa - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 05/07
É de fato falho um sistema no qual uma sentença da Justiça de um estado nacional interfere na renegociação entre países e credores
A decisão da Justiça americana favorável a dois fundos especializados em títulos podres levou a Argentina à beira de uma nova moratória — também devido à reação da Casa Rosada. E abriu um perigoso precedente: se renegociações de dívida externa, multilaterais, podem ser revistas pela Justiça de um estado nacional, passa a haver enorme insegurança no mercado de dívidas soberanas. Daí a preocupação manifestada por Casa Branca, FMI, França, Brasil e outros diante da situação da Argentina.
Questões relativas a dívidas soberanas são tratadas em tribunais de Nova York e/ou Londres, a depender de entendimento prévio. O caso argentino leva especialistas a defender a criação de um mecanismo internacional para questões de reestruturação da dívida, algo também defendido por Buenos Aires. É um caminho que merece atenção.
O problema da Argentina se agrava com o comportamento do governo kirchnerista. Em reunião sobre o assunto na OEA, tanto o chanceler Timerman quanto o ministro da Economia Kicillof insistiram que o país só negociará com os fundos nas mesmas condições das reestruturações da dívida de 2005 e 2010, que tiveram a adesão de 92,4% dos credores. Ora, isso significa não querer negociação, e sem estar numa posição de força.
As agruras de agora ainda são reflexo da moratória de 2001, quando o país afundou numa das crises mais sérias de sua história, com hiperinflação e cinco presidentes em uma semana. Quando alguém finalmente conseguiu se firmar no poder, era Néstor Kirchner. E logo se conheceu seu estilo arrogante e populista. Ele ditou as regras da renegociação, com um deságio de 70% do valor dos papéis. Pressionados, 92,4% dos credores aceitaram. Alguns fundos compraram títulos argentinos dos credores, com enorme deságio, ficaram de fora do acordo, e entraram na Justiça americana reclamando seus direitos. É do jogo, e Buenos Aires perdeu. Ao governo Cristina Kircher só resta a alternativa de negociar imediata e intensivamente com fundos, credores, com o juiz americano e com o mediador nomeado por ele.
Mas, ao contrário, o que se vê é o governo argentino, de pedigree chavista, politizando o problema. Envia emissários à ONU e à OEA para discursos exaltados e estimula passeatas de protesto em Buenos Aires. Na OEA, foi aprovada declaração de apoio aos esforços argentinos, apresentada por Brasil e Uruguai. Os EUA, porém, fizeram a ressalva de que não a apoiariam, pois a questão está no Judiciário, o poder é independente.
O Brasil, que agiu de forma diferente da Argentina, negociando em todas as instâncias com sucesso, deveria assessorar melhor o vizinho. Deve-se mesmo construir uma fórmula para que, no futuro, países endividados não venham a ser encurralados por uma minoria de credores nos tribunais de um país. Mas, antes, é preciso apoiar as negociações sérias, e não pajelanças de cunho ideológico. As tentativas de se promover um levante contra a comunidade financeira internacional só levam a Argentina, mais e mais, ao isolamento.
É de fato falho um sistema no qual uma sentença da Justiça de um estado nacional interfere na renegociação entre países e credores
A decisão da Justiça americana favorável a dois fundos especializados em títulos podres levou a Argentina à beira de uma nova moratória — também devido à reação da Casa Rosada. E abriu um perigoso precedente: se renegociações de dívida externa, multilaterais, podem ser revistas pela Justiça de um estado nacional, passa a haver enorme insegurança no mercado de dívidas soberanas. Daí a preocupação manifestada por Casa Branca, FMI, França, Brasil e outros diante da situação da Argentina.
Questões relativas a dívidas soberanas são tratadas em tribunais de Nova York e/ou Londres, a depender de entendimento prévio. O caso argentino leva especialistas a defender a criação de um mecanismo internacional para questões de reestruturação da dívida, algo também defendido por Buenos Aires. É um caminho que merece atenção.
O problema da Argentina se agrava com o comportamento do governo kirchnerista. Em reunião sobre o assunto na OEA, tanto o chanceler Timerman quanto o ministro da Economia Kicillof insistiram que o país só negociará com os fundos nas mesmas condições das reestruturações da dívida de 2005 e 2010, que tiveram a adesão de 92,4% dos credores. Ora, isso significa não querer negociação, e sem estar numa posição de força.
As agruras de agora ainda são reflexo da moratória de 2001, quando o país afundou numa das crises mais sérias de sua história, com hiperinflação e cinco presidentes em uma semana. Quando alguém finalmente conseguiu se firmar no poder, era Néstor Kirchner. E logo se conheceu seu estilo arrogante e populista. Ele ditou as regras da renegociação, com um deságio de 70% do valor dos papéis. Pressionados, 92,4% dos credores aceitaram. Alguns fundos compraram títulos argentinos dos credores, com enorme deságio, ficaram de fora do acordo, e entraram na Justiça americana reclamando seus direitos. É do jogo, e Buenos Aires perdeu. Ao governo Cristina Kircher só resta a alternativa de negociar imediata e intensivamente com fundos, credores, com o juiz americano e com o mediador nomeado por ele.
Mas, ao contrário, o que se vê é o governo argentino, de pedigree chavista, politizando o problema. Envia emissários à ONU e à OEA para discursos exaltados e estimula passeatas de protesto em Buenos Aires. Na OEA, foi aprovada declaração de apoio aos esforços argentinos, apresentada por Brasil e Uruguai. Os EUA, porém, fizeram a ressalva de que não a apoiariam, pois a questão está no Judiciário, o poder é independente.
O Brasil, que agiu de forma diferente da Argentina, negociando em todas as instâncias com sucesso, deveria assessorar melhor o vizinho. Deve-se mesmo construir uma fórmula para que, no futuro, países endividados não venham a ser encurralados por uma minoria de credores nos tribunais de um país. Mas, antes, é preciso apoiar as negociações sérias, e não pajelanças de cunho ideológico. As tentativas de se promover um levante contra a comunidade financeira internacional só levam a Argentina, mais e mais, ao isolamento.
A novela da dívida - EDITORIAL O ESTADÃO
O ESTADO DE S.PAULO - 05/07
A novela da renegociação da dívida de Estados e municípios com a União - que interessa em especial à Prefeitura de São Paulo, pela sua situação particularmente difícil nesse caso - não parece próxima do fim. Nos termos atuais, o seu pagamento cria de fato sérias dificuldades para os devedores e por isso todos concordam que alguma coisa precisa ser feita - mais especificamente a mudança do indexador. Mas as divergências sobre o momento em que isso deve ser feito, e em que termos, têm impedido que se avance na solução do problema.
De todos os envolvidos no caso, é o prefeito Fernando Haddad que se mostra mais inquieto, e isso desde que tomou posse, há um ano e meio. Para se eleger, ele fez promessas que para serem cumpridas dependiam em larga medida da folga financeira propiciada pela renegociação. Sabia, portanto, o que o esperava, mas hoje se vê que confiou demais na ajuda que contava receber da presidente Dilma Rousseff, esquecendo-se de que ela também tem suas dificuldades e limitações para atender seus aflitos e imprudentes correligionários.
A renegociação se arrasta e a dívida, que era de R$ 53,2 bilhões no início do governo Haddad, já atinge R$ 61,3 bilhões. São Paulo vem comprometendo 13% de sua receita líquida real com o pagamento à União. Foram R$ 2,5 bilhões no ano passado, em números absolutos, o que representou mais da metade dos recursos investidos na cidade em 2013, como mostrou reportagem do Estado (30/6). Isso dá uma ideia do peso da dívida e das dificuldades que ela cria para a solução dos graves problemas enfrentados por São Paulo.
E também explica por que a renegociação, com a mudança do indexador, tem sido um objetivo dos últimos prefeitos. Não é exclusividade de Haddad. Mas é preciso lembrar, mais uma vez, o papel desempenhado pela ex-prefeita Marta Suplicy - e indiretamente por Haddad, que integrava sua equipe de governo -, porque ele foi determinante para o agravamento da situação da dívida.
Em 2002, a ex-prefeita deveria ter amortizado R$ 3 bilhões da dívida e, por não ter feito isso, o indexador, que era IGP-DI + 6%, passou para IGP-DI + 9%, um aumento considerável, como se vê, o que fez o saldo da dívida crescer rapidamente. Tudo indica que ela assim agiu por acreditar que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva a ajudaria a superar suas dificuldades com o pagamento da dívida. Lula não fez isso - e nesse caso com toda razão, pois tal atitude, que não se poderia limitar a São Paulo, teria graves repercussões sobre a situação fiscal do País - e o resultado é que as condições da dívida paulistana se tornaram especialmente difíceis, em comparação com as dos demais devedores.
Haddad, que jamais, é claro, toca nesse caso, sustenta que o IGP-DI + 9% é um indexador que torna a dívida "impagável". Exageros retóricos à parte, a situação é mesmo difícil. Segundo o secretário adjunto de Finanças, Antônio Paulo Vogel de Medeiros, se nada for feito para mudar esse quadro, a partir de 2017 o valor da dívida ultrapassará o limite de endividamento imposto pelo Senado. Com isso, a capacidade de investimento da Prefeitura, que já está comprometida, se reduzirá ainda mais, com sério prejuízo para a cidade.
A solução está em projeto de lei que tramita no Senado. Ele muda o indexador atual - IGP-DI acrescido de 6% a 9% (caso de São Paulo) - pelo IPCA + 4% ao ano, limitado à taxa Selic. Ele está parado, não por obstrução da oposição - governadores e prefeitos oposicionistas têm igualmente interesse na mudança -, mas porque a presidente Dilma Rousseff acredita que no momento não pode abrir mão dos pagamentos à União de acordo com a regra atual. Se Haddad, tal como Marta Suplicy no passado, acreditava que o governo federal, só por estar nas mãos do PT, iria ajudá-lo, enganou-se. Deve aprender agora o quanto saem caro as promessas mirabolantes.
Mas um dia isso terá de ser feito, embora se deva excluir a hipótese, desastrosa para as finanças da União, de a mudança ser retroativa. E a solução em discussão, do indexador de IPCA + 4%, é considerada razoável para ambas as partes.
A novela da renegociação da dívida de Estados e municípios com a União - que interessa em especial à Prefeitura de São Paulo, pela sua situação particularmente difícil nesse caso - não parece próxima do fim. Nos termos atuais, o seu pagamento cria de fato sérias dificuldades para os devedores e por isso todos concordam que alguma coisa precisa ser feita - mais especificamente a mudança do indexador. Mas as divergências sobre o momento em que isso deve ser feito, e em que termos, têm impedido que se avance na solução do problema.
De todos os envolvidos no caso, é o prefeito Fernando Haddad que se mostra mais inquieto, e isso desde que tomou posse, há um ano e meio. Para se eleger, ele fez promessas que para serem cumpridas dependiam em larga medida da folga financeira propiciada pela renegociação. Sabia, portanto, o que o esperava, mas hoje se vê que confiou demais na ajuda que contava receber da presidente Dilma Rousseff, esquecendo-se de que ela também tem suas dificuldades e limitações para atender seus aflitos e imprudentes correligionários.
A renegociação se arrasta e a dívida, que era de R$ 53,2 bilhões no início do governo Haddad, já atinge R$ 61,3 bilhões. São Paulo vem comprometendo 13% de sua receita líquida real com o pagamento à União. Foram R$ 2,5 bilhões no ano passado, em números absolutos, o que representou mais da metade dos recursos investidos na cidade em 2013, como mostrou reportagem do Estado (30/6). Isso dá uma ideia do peso da dívida e das dificuldades que ela cria para a solução dos graves problemas enfrentados por São Paulo.
E também explica por que a renegociação, com a mudança do indexador, tem sido um objetivo dos últimos prefeitos. Não é exclusividade de Haddad. Mas é preciso lembrar, mais uma vez, o papel desempenhado pela ex-prefeita Marta Suplicy - e indiretamente por Haddad, que integrava sua equipe de governo -, porque ele foi determinante para o agravamento da situação da dívida.
Em 2002, a ex-prefeita deveria ter amortizado R$ 3 bilhões da dívida e, por não ter feito isso, o indexador, que era IGP-DI + 6%, passou para IGP-DI + 9%, um aumento considerável, como se vê, o que fez o saldo da dívida crescer rapidamente. Tudo indica que ela assim agiu por acreditar que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva a ajudaria a superar suas dificuldades com o pagamento da dívida. Lula não fez isso - e nesse caso com toda razão, pois tal atitude, que não se poderia limitar a São Paulo, teria graves repercussões sobre a situação fiscal do País - e o resultado é que as condições da dívida paulistana se tornaram especialmente difíceis, em comparação com as dos demais devedores.
Haddad, que jamais, é claro, toca nesse caso, sustenta que o IGP-DI + 9% é um indexador que torna a dívida "impagável". Exageros retóricos à parte, a situação é mesmo difícil. Segundo o secretário adjunto de Finanças, Antônio Paulo Vogel de Medeiros, se nada for feito para mudar esse quadro, a partir de 2017 o valor da dívida ultrapassará o limite de endividamento imposto pelo Senado. Com isso, a capacidade de investimento da Prefeitura, que já está comprometida, se reduzirá ainda mais, com sério prejuízo para a cidade.
A solução está em projeto de lei que tramita no Senado. Ele muda o indexador atual - IGP-DI acrescido de 6% a 9% (caso de São Paulo) - pelo IPCA + 4% ao ano, limitado à taxa Selic. Ele está parado, não por obstrução da oposição - governadores e prefeitos oposicionistas têm igualmente interesse na mudança -, mas porque a presidente Dilma Rousseff acredita que no momento não pode abrir mão dos pagamentos à União de acordo com a regra atual. Se Haddad, tal como Marta Suplicy no passado, acreditava que o governo federal, só por estar nas mãos do PT, iria ajudá-lo, enganou-se. Deve aprender agora o quanto saem caro as promessas mirabolantes.
Mas um dia isso terá de ser feito, embora se deva excluir a hipótese, desastrosa para as finanças da União, de a mudança ser retroativa. E a solução em discussão, do indexador de IPCA + 4%, é considerada razoável para ambas as partes.
Pavio aceso no Oriente - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 05/07
A iminência de uma ofensiva militar israelense contra o território palestino da Faixa de Gaza, em represália pelo assassinato de três adolescentes judeus sequestrados duas semanas atrás na Cisjordânia, representa mais do que uma nuvem escura e carregada pairando sobre o agonizante processo de paz entre os dois povos. A nova escalada no conflito que muitos veem como o nó górdio da instabilidade crônica no Oriente Médio coincide com um panorama sombrio que se estende pela região do Mediterrâneo ao Golfo Pérsico, com Síria e Iraque em guerra civil e grupos extremistas - afiliados à rede Al-Qaeda ou aparentados a ela na ideologia jihadista - controlando vastas porções de território.
É a lógica entranhada e persistente da vingança, expressa no princípio do "olho por olho", que alimenta mais uma espiral de violência entre israelenses e palestinos. O sequestro e o assassinato de um adolescente árabe, em aparente revide por parte de extremistas judeus, forneceram o ingrediente que faltava para a frustração palestina irromper novamente.
Passadas já duas décadas do estabelecimento da Autoridade Palestina (AP), como entidade autônoma em Gaza e na Cisjordânia, a população dos territórios segue em um limbo do ponto de vista de cidadania. A AP não goza de reconhecimento internacional como Estado soberano, mas Israel já não exerce plenamente o papel de força de ocupação, embora tenha poderio militar para aplicar represálias quando se considera sob agressão. No mais das vezes, a retaliação tem vindo na forma da punição coletiva aos palestinos, o que apenas ajuda a fermentar o ressentimento, nutrido também pela incessante e progressiva colonização judaica na Cisjordânia.
Salvar o processo de paz iniciado com os Acordos de Oslo, firmados sob os auspícios dos Estados Unidos, em 1993 e 1995, parece já um desafio além das capacidades da comunidade internacional. Seguidos e repetidos esforços diplomáticos, encabeçados por ao menos três presidentes norte-americanos, foram vãos na tentativa de levar os palestinos à terra prometida do Estado soberano que almejam desde a primeira guerra árabe-israelense, em 1948. Quanto ao Estado judeu, fundado naquele ano, continua se vendo cercado de uma vizinhança que percebe como hostil - e segue desenvolvendo uma estratégia que consiste em preservar ou mesmo ampliar a supremacia militar.
Se resta esperança para uma solução pacífica, ela reside agora na engenhosidade política dos dois povos. O processo de Oslo foi iniciado por estadistas que personificavam uma geração temperada por três guerras: Yitzhak Rabin e Shimon Peres, pelo lado de Israel, e o patriarca Yasser Arafat, pela parte palestina. Tinham, entre seus liderados, a autoridade requerida para fazer concessões, dolorosas porém incontornáveis, em nome de viabilizar a única saída possível: a convivência entre dois Estados.
A dinâmica atual solapa o terreno sob os pés dos que advogam esse caminho, de ambos os lados. Israelenses e palestinos têm diante de si um enigma a decifrar, o de construir uma liderança política comprometida com a via pacífica e sagaz o suficiente para levá-la até o sucesso. Sem esse elemento, restará à comunidade internacional apenas o papel de apagar incêndios, de tempos em tempos, e assistir à demolição final de um edifício que nem chegou a ser completado.
É a lógica entranhada e persistente da vingança, expressa no princípio do "olho por olho", que alimenta mais uma espiral de violência entre israelenses e palestinos. O sequestro e o assassinato de um adolescente árabe, em aparente revide por parte de extremistas judeus, forneceram o ingrediente que faltava para a frustração palestina irromper novamente.
Passadas já duas décadas do estabelecimento da Autoridade Palestina (AP), como entidade autônoma em Gaza e na Cisjordânia, a população dos territórios segue em um limbo do ponto de vista de cidadania. A AP não goza de reconhecimento internacional como Estado soberano, mas Israel já não exerce plenamente o papel de força de ocupação, embora tenha poderio militar para aplicar represálias quando se considera sob agressão. No mais das vezes, a retaliação tem vindo na forma da punição coletiva aos palestinos, o que apenas ajuda a fermentar o ressentimento, nutrido também pela incessante e progressiva colonização judaica na Cisjordânia.
Salvar o processo de paz iniciado com os Acordos de Oslo, firmados sob os auspícios dos Estados Unidos, em 1993 e 1995, parece já um desafio além das capacidades da comunidade internacional. Seguidos e repetidos esforços diplomáticos, encabeçados por ao menos três presidentes norte-americanos, foram vãos na tentativa de levar os palestinos à terra prometida do Estado soberano que almejam desde a primeira guerra árabe-israelense, em 1948. Quanto ao Estado judeu, fundado naquele ano, continua se vendo cercado de uma vizinhança que percebe como hostil - e segue desenvolvendo uma estratégia que consiste em preservar ou mesmo ampliar a supremacia militar.
Se resta esperança para uma solução pacífica, ela reside agora na engenhosidade política dos dois povos. O processo de Oslo foi iniciado por estadistas que personificavam uma geração temperada por três guerras: Yitzhak Rabin e Shimon Peres, pelo lado de Israel, e o patriarca Yasser Arafat, pela parte palestina. Tinham, entre seus liderados, a autoridade requerida para fazer concessões, dolorosas porém incontornáveis, em nome de viabilizar a única saída possível: a convivência entre dois Estados.
A dinâmica atual solapa o terreno sob os pés dos que advogam esse caminho, de ambos os lados. Israelenses e palestinos têm diante de si um enigma a decifrar, o de construir uma liderança política comprometida com a via pacífica e sagaz o suficiente para levá-la até o sucesso. Sem esse elemento, restará à comunidade internacional apenas o papel de apagar incêndios, de tempos em tempos, e assistir à demolição final de um edifício que nem chegou a ser completado.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
PESQUISA MOSTRA AÉCIO E DILMA EMPATADOS NO DF
Pesquisa do Instituto Dados mostra empate técnico entre a presidente Dilma Rousseff (PT) e o candidato a presidente do PSDB, Aécio Neves, entre os eleitores do Distrito Federal. Dilma aparece com 20,5% das intenções de votos contra 20,1% do tucano Aécio. Eduardo Campos (PSB) tem 9,3% e a “zebra” Pastor Everaldo (PSC) 2,4%. A soma daqueles que não sabem em quem votar com brancos e nulos é 46%.
COMPARATIVO
Em maio, Aécio Neves liderava com 24,5% contra 18,9% de Dilma Rousseff. Eduardo tinha 10% e Everaldo 2,9%.
TERCEIRA IDADE
A maior diferença entre a presidente Dilma e Aécio está entre os eleitores com mais de 60 anos: a petista tem 22,1%, enquanto o tucano soma 30,1%.
JOVENS ADULTOS
A maior liderança de Dilma no DF está entre os eleitores entre 35 e 39 anos: 21,1% contra 16,2% das intenções de voto para Aécio Neves.
REGISTRO
A pesquisa do Instituto Dados foi realizada entre os dias 21 e 28 de junho, com 3 mil eleitores, e está registrada no TSE sob o nº 189/2014.
DIRCEU É LIVRE PARA ARTICULAR SUCESSOR DE JOAQUIM
A saída de José Dirceu da Papuda devolveu ao governo um dos seus principais articuladores nos bastidores, para decisões importantes, como indicações para o Supremo Tribunal Federal. Fora da cadeia e num escritório de advocacia, ele ajudará a fazer a presidente Dilma escolher o favorito dos petistas para a vaga de Joaquim Barbosa no STF: o atual ministro da Justiça, advogado José Eduardo Cardozo.
ARREPENDIMENTO
Dirceu, certa vez, revelou a esta coluna que a escolha de Joaquim é um dos maiores fatores de arrependimento do ex-presidente Lula.
SEM VASSALAGEM
Ministros nomeados por Lula, que não lhe prestaram vassalagem, como Ayres Britto e Cezar Peluso, são criticados pelos mensaleiros.
INDEPENDÊNCIA, NÃO
José Dirceu também reclamou da independência do ministro Luiz Fux, que, nomeado por Dilma, votou pela condenação dos réus do mensalão.
MAL NA FITA
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL) acredita que será árdua a tarefa da esquerda de reeleger o governador Camilo Capiberibe (PSB-AP), que apresenta rejeição de mais de 70%: “Tentaremos juntar os cacos”.
BATEU RECORDE
Alvo de chacota no Congresso pela defesa dos animais, Ricardo Tripoli (SP) se tornou esta semana o deputado federal tucano com maior audiência nas redes sociais, com quase 170 mil curtidas no Facebook.
DIFÍCIL GANHAR ESPAÇO
O deputado Daniel Almeida (PCdoB) compara a disputa da senadora Lídice da Mata (PSB) ao governo da Bahia com a de Eduardo Campos (PSB), que enfrentará nacionalmente a polarização entre PT e PSDB.
CINE PASTELÃO
Uma produtora de Hollywood vai filmar o pastelão do jatinho com US$ 3 milhões aos jogadores de Gana, que ameaçavam não jogar contra Portugal. Tudo isso sob os auspícios da Receita Federal.
VESTIU A CAMISA
O presidente do Solidariedade, Paulo da Força (SP), decidiu enquadrar os dirigentes estaduais do partido a fim de manter nos Estados apoio nacional à candidatura do tucano Aécio Neves (MG) à Presidência.
CORRENDO POR FORA
Sem acesso às imagens da Copa, a TV Cultura, de São Paulo, investiu em programas com personagens polêmicos, e o Jornal da Cultura chegou à liderança da audiência adulta. “O público está mais exigente e quer mais opiniões”, afirma o âncora da Cultura, Willian Corrêa.
TRAJETÓRIA
Vem aí mais um filme bancado pela renúncia tributária das empresas ao governo, com a Lei Rouanet: Filha, mãe, avó e puta. O problema será exibir o título nos letreiros.
OPERAÇÃO VAPT-VUPT
O jatinho do presidente de Gana, que em 24h diz ter “contratado” 72 policiais militares, 19 guardas municipais e 14 militares para a operação de escolta da mala de dólares para jogadores da seleção, em Brasília.
PRORROGAÇÃO
Com a intenção de votos ancorada na Copa, diz pequisa Datafolha, a eleição de Dilma pode ir aos pênaltis no domingo, 13 de julho.
PODER SEM PUDOR
LAMA E DESERTO
Leonel Brizola estava em Natal (RN), em campanha para presidente. No palanque, o candidato do PDT abusava de figuras de linguagem:
- O Brasil está no atoleiro e precisa de alguém para tirá-lo da lama!
Nesse dia, Brizola parecia estar sem ideias e repetia, exaustivamente, que o Brasil estava "atolado na lama". Um bêbado que assistia a tudo, sempre há um deles em comícios, gritou impaciente:
- O senhor, afinal, é candidato a presidente ou a trator?
Como estava mesmo sem inspiração, Brizola levou um bom tempo respondendo à provocação.
Pesquisa do Instituto Dados mostra empate técnico entre a presidente Dilma Rousseff (PT) e o candidato a presidente do PSDB, Aécio Neves, entre os eleitores do Distrito Federal. Dilma aparece com 20,5% das intenções de votos contra 20,1% do tucano Aécio. Eduardo Campos (PSB) tem 9,3% e a “zebra” Pastor Everaldo (PSC) 2,4%. A soma daqueles que não sabem em quem votar com brancos e nulos é 46%.
COMPARATIVO
Em maio, Aécio Neves liderava com 24,5% contra 18,9% de Dilma Rousseff. Eduardo tinha 10% e Everaldo 2,9%.
TERCEIRA IDADE
A maior diferença entre a presidente Dilma e Aécio está entre os eleitores com mais de 60 anos: a petista tem 22,1%, enquanto o tucano soma 30,1%.
JOVENS ADULTOS
A maior liderança de Dilma no DF está entre os eleitores entre 35 e 39 anos: 21,1% contra 16,2% das intenções de voto para Aécio Neves.
REGISTRO
A pesquisa do Instituto Dados foi realizada entre os dias 21 e 28 de junho, com 3 mil eleitores, e está registrada no TSE sob o nº 189/2014.
DIRCEU É LIVRE PARA ARTICULAR SUCESSOR DE JOAQUIM
A saída de José Dirceu da Papuda devolveu ao governo um dos seus principais articuladores nos bastidores, para decisões importantes, como indicações para o Supremo Tribunal Federal. Fora da cadeia e num escritório de advocacia, ele ajudará a fazer a presidente Dilma escolher o favorito dos petistas para a vaga de Joaquim Barbosa no STF: o atual ministro da Justiça, advogado José Eduardo Cardozo.
ARREPENDIMENTO
Dirceu, certa vez, revelou a esta coluna que a escolha de Joaquim é um dos maiores fatores de arrependimento do ex-presidente Lula.
SEM VASSALAGEM
Ministros nomeados por Lula, que não lhe prestaram vassalagem, como Ayres Britto e Cezar Peluso, são criticados pelos mensaleiros.
INDEPENDÊNCIA, NÃO
José Dirceu também reclamou da independência do ministro Luiz Fux, que, nomeado por Dilma, votou pela condenação dos réus do mensalão.
MAL NA FITA
O senador Randolfe Rodrigues (PSOL) acredita que será árdua a tarefa da esquerda de reeleger o governador Camilo Capiberibe (PSB-AP), que apresenta rejeição de mais de 70%: “Tentaremos juntar os cacos”.
BATEU RECORDE
Alvo de chacota no Congresso pela defesa dos animais, Ricardo Tripoli (SP) se tornou esta semana o deputado federal tucano com maior audiência nas redes sociais, com quase 170 mil curtidas no Facebook.
DIFÍCIL GANHAR ESPAÇO
O deputado Daniel Almeida (PCdoB) compara a disputa da senadora Lídice da Mata (PSB) ao governo da Bahia com a de Eduardo Campos (PSB), que enfrentará nacionalmente a polarização entre PT e PSDB.
CINE PASTELÃO
Uma produtora de Hollywood vai filmar o pastelão do jatinho com US$ 3 milhões aos jogadores de Gana, que ameaçavam não jogar contra Portugal. Tudo isso sob os auspícios da Receita Federal.
VESTIU A CAMISA
O presidente do Solidariedade, Paulo da Força (SP), decidiu enquadrar os dirigentes estaduais do partido a fim de manter nos Estados apoio nacional à candidatura do tucano Aécio Neves (MG) à Presidência.
CORRENDO POR FORA
Sem acesso às imagens da Copa, a TV Cultura, de São Paulo, investiu em programas com personagens polêmicos, e o Jornal da Cultura chegou à liderança da audiência adulta. “O público está mais exigente e quer mais opiniões”, afirma o âncora da Cultura, Willian Corrêa.
TRAJETÓRIA
Vem aí mais um filme bancado pela renúncia tributária das empresas ao governo, com a Lei Rouanet: Filha, mãe, avó e puta. O problema será exibir o título nos letreiros.
OPERAÇÃO VAPT-VUPT
O jatinho do presidente de Gana, que em 24h diz ter “contratado” 72 policiais militares, 19 guardas municipais e 14 militares para a operação de escolta da mala de dólares para jogadores da seleção, em Brasília.
PRORROGAÇÃO
Com a intenção de votos ancorada na Copa, diz pequisa Datafolha, a eleição de Dilma pode ir aos pênaltis no domingo, 13 de julho.
PODER SEM PUDOR
LAMA E DESERTO
Leonel Brizola estava em Natal (RN), em campanha para presidente. No palanque, o candidato do PDT abusava de figuras de linguagem:
- O Brasil está no atoleiro e precisa de alguém para tirá-lo da lama!
Nesse dia, Brizola parecia estar sem ideias e repetia, exaustivamente, que o Brasil estava "atolado na lama". Um bêbado que assistia a tudo, sempre há um deles em comícios, gritou impaciente:
- O senhor, afinal, é candidato a presidente ou a trator?
Como estava mesmo sem inspiração, Brizola levou um bom tempo respondendo à provocação.
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