terça-feira, novembro 20, 2012
Dosimetria relativa - TUTTY VASQUES
O Estado de S.Paulo - 20/11
Com um "julgamento-mais-aguardado-dos-últimos-anos" atrás do outro no noticiário nacional, o brasileiro já se considera entendido no assunto para condenar sem demora um tipo de culpado genérico muito em voga nos tribunais do País.
Esta semana mesmo, antecipando-se ao veredicto do júri popular inaugurado ontem no Fórum de Contagem (MG), o povo começou de véspera a calcular nos pontos de ônibus de todo o Brasil a dosimetria do goleiro Bruno.
Desde a divulgação da sentença de José Dirceu - ou seja, há quase 10 dias -, não aparecia alguém tão sem defesa no banco dos réus da esquina.
A tese de que sem corpo não há crime é, mal comparando, tão convincente quanto a negação do mensalão por falta de impressões digitais.
Uma coisa não tem nada a ver diretamente com a outra, mas, depois que o ex-ministro pegou 10 anos e 10 meses de cadeia, que pena será mais justa para o goleiro?
Periga a situação dele se agravar agora que o Ministério Público Federal pediu 80 anos de prisão para outro célebre culpado da atualidade, o bicheiro Carlinhos Cachoeira.
Se bem que toda regra tem exceção, taí o Maluf rindo à toa que não me deixa mentir.
Rumo a Tóquio
Nem tudo está perdido para a torcida do Palmeiras: um fiasco do Corinthians no Mundial de Clubes pode salvar o ano da galera!
Na mira
A quantas anda em Ramallah a exumação de Yasser Arafat? Antes que se esclareçam as circunstâncias da morte do líder palestino, seu corpo corre agora o risco de ir pelos ares em bombardeios à Cisjordânia!
Muro da Daslu
A nova classe média brasileira não chegou ao mercado a tempo de frequentar a Daslu, mas já pode comprar na região da 25 de Março pequenos destroços da demolição do mais famoso império do luxo no País. Os camelôs anunciam o produto como "lembrança do muro de Berlim do consumo paulistano".
Não tem erro
O cantor e compositor Belchior teve bons motivos para sumir de novo, desta vez no Uruguai: só assim ele aparece no Fantástico!
A grosso modo...
Justiça seja feita ao advogado do goleiro Bruno, os defensores de Macarrão e do Bola são muito mais falastrões. Repara só!
Mal comparando
O brasileiro reclama de barriga cheia! Dilma Rousseff desembarca hoje em Brasília horrorizada com o mundo lá fora!
Tudo a ver
Os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski ainda não confirmaram participação na campanha Conte até 10, de prevenção à violência decorrente de desentendimentos banais.
Boato infame
Djavan confirmou presença na posse de Joaquim Barbosa na presidência do STF, mas, ao contrário do que andam dizendo nas redes sociais, o artista não vai cantar "o amor é azulzinho" no encerramento da cerimônia. E não se fala mais nisso, ok?
A voz do Brasil é baixa demais - CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP - 20/11
O país tem "soft power" para ser ouvido no horror do Oriente Médio, mas está sendo muito tímido
MADRI - A presidente Dilma Rousseff falou um pouco ontem sobre a voz do Brasil no mundo, para dizer que "a política do Brasil será a de um país que não cultiva inimigos nem projeta intolerância".
É verdade, mas é pena que o atual governo pareça tímido em fazer ouvir a sua voz, especialmente em momentos agudos como, para ficar apenas na atualidade imediata, a violência entre Israel e o Hamas.
Pena não só porque um país que está em paz com o mundo e não é intolerante tem o "soft power" para ajudar a desarmar crises, mas também porque a posição brasileira sobre a situação em curso na Palestina é correta.
"Só haverá paz na região se houver dois Estados legitimamente consolidados [Israel e o Estado Palestino]", disse Dilma ontem.
É essa a razão de fundo para o conflito que agora subiu de novo às manchetes gerando "o horror que sensibiliza qualquer ser humano", como disse, ao lado de Dilma, Mariano Rajoy, presidente do governo espanhol.
De fato, a foto na capa da Folha de ontem de uma criancinha palestina morta por um ataque israelense na faixa de Gaza supera qualquer limite do horror.
É correto também o apelo de Dilma ao secretário-geral das Nações Unidas para convocar o Conselho de Segurança, de forma a discutir e impor um cessar-fogo, primeiro e indispensável passo para brecar o horror.
Note, leitor, que a presidente, ao apontar a necessidade de dois Estados consolidados legitimamente não está tomando partido, não está apontando o dedo acusador para ninguém, nem para o Hamas, que ataca Israel, nem para Israel, que responde com uma força desproporcional.
Rajoy, embora muito mais cauteloso e moderado que Dilma, é mais incisivo nesse ponto. Diz que "Israel tem direito à legítima defesa, mas nós solicitamos contenção na resposta, para que a situação não degenere em conflito aberto".
Quando digo que o governo é tímido, refiro-me à política de comunicação de Dilma e de seu chanceler, Antonio Patriota, não às posições deles.
Seguinte: Dilma só falou sobre o assunto que domina todo o noticiário internacional quando provocada por uma pergunta de André Luiz Azevedo (Rede Globo), na entrevista que concedeu ao lado do líder espanhol, após o encontro bilateral.
A presidente e seu chanceler não tomaram a iniciativa de apresentar-se, uma ou o outro, espontaneamente, para falar aos jornalistas -e, de preferência, não apenas aos brasileiros.
Em Cádiz, durante a 22ª Cúpula Ibero-Americana, havia espaço para que os líderes presentes falassem a um grupo enorme de jornalistas.
Espaço que usaram Durão Barroso, o presidente da Comissão Europeia, e os quatro presidentes da Aliança do Pacífico (México, Colômbia, Peru e Chile), para não mencionar Vanda Pignato, a primeira-dama (brasileira) de El Salvador, que falou sobre o combate à violência contra a mulher.
Uma tribuna imperdível para um país sem inimigos e sem intolerância, numa hora em que a intolerância leva ao horror.
Se continuar a falar baixo, o Brasil nunca será cachorro grande na cena internacional.
O país tem "soft power" para ser ouvido no horror do Oriente Médio, mas está sendo muito tímido
MADRI - A presidente Dilma Rousseff falou um pouco ontem sobre a voz do Brasil no mundo, para dizer que "a política do Brasil será a de um país que não cultiva inimigos nem projeta intolerância".
É verdade, mas é pena que o atual governo pareça tímido em fazer ouvir a sua voz, especialmente em momentos agudos como, para ficar apenas na atualidade imediata, a violência entre Israel e o Hamas.
Pena não só porque um país que está em paz com o mundo e não é intolerante tem o "soft power" para ajudar a desarmar crises, mas também porque a posição brasileira sobre a situação em curso na Palestina é correta.
"Só haverá paz na região se houver dois Estados legitimamente consolidados [Israel e o Estado Palestino]", disse Dilma ontem.
É essa a razão de fundo para o conflito que agora subiu de novo às manchetes gerando "o horror que sensibiliza qualquer ser humano", como disse, ao lado de Dilma, Mariano Rajoy, presidente do governo espanhol.
De fato, a foto na capa da Folha de ontem de uma criancinha palestina morta por um ataque israelense na faixa de Gaza supera qualquer limite do horror.
É correto também o apelo de Dilma ao secretário-geral das Nações Unidas para convocar o Conselho de Segurança, de forma a discutir e impor um cessar-fogo, primeiro e indispensável passo para brecar o horror.
Note, leitor, que a presidente, ao apontar a necessidade de dois Estados consolidados legitimamente não está tomando partido, não está apontando o dedo acusador para ninguém, nem para o Hamas, que ataca Israel, nem para Israel, que responde com uma força desproporcional.
Rajoy, embora muito mais cauteloso e moderado que Dilma, é mais incisivo nesse ponto. Diz que "Israel tem direito à legítima defesa, mas nós solicitamos contenção na resposta, para que a situação não degenere em conflito aberto".
Quando digo que o governo é tímido, refiro-me à política de comunicação de Dilma e de seu chanceler, Antonio Patriota, não às posições deles.
Seguinte: Dilma só falou sobre o assunto que domina todo o noticiário internacional quando provocada por uma pergunta de André Luiz Azevedo (Rede Globo), na entrevista que concedeu ao lado do líder espanhol, após o encontro bilateral.
A presidente e seu chanceler não tomaram a iniciativa de apresentar-se, uma ou o outro, espontaneamente, para falar aos jornalistas -e, de preferência, não apenas aos brasileiros.
Em Cádiz, durante a 22ª Cúpula Ibero-Americana, havia espaço para que os líderes presentes falassem a um grupo enorme de jornalistas.
Espaço que usaram Durão Barroso, o presidente da Comissão Europeia, e os quatro presidentes da Aliança do Pacífico (México, Colômbia, Peru e Chile), para não mencionar Vanda Pignato, a primeira-dama (brasileira) de El Salvador, que falou sobre o combate à violência contra a mulher.
Uma tribuna imperdível para um país sem inimigos e sem intolerância, numa hora em que a intolerância leva ao horror.
Se continuar a falar baixo, o Brasil nunca será cachorro grande na cena internacional.
Vergonha nacional - LUIZ GARCIA
O GLOBO - 20/11
Foi proposto pelo Poder Executivo em 2010. Infelizmente, ele dorme numa comissão especial da Câmara dos Deputados há mais de um ano.
Isso se deve, segundo informam deputados da própria comissão, a um lobby sustentado por empresas de engenharia e de construção civil. Não são conhecidos os argumentos usados pelos lobistas. Mas a turma da arquibancada, também conhecida como opinião pública, ainda não tomou conhecimento do assunto.
Há pouco tempo, a arquibancada tomou conhecimento das estripulias do banqueiro de bicho Carlinhos Cachoeira, e isso foi decisivo para a prisão de Carlinhos. A lei contra a corrupção, se já estivesse em vigor, aumentaria consideravelmente o número de companheiros dele na cadeia.
Faz falta um movimento popular que torne isso possível. Seria o lobby da opinião pública contra o lobby das empresas. A sua meta seria uma pressão sobre o Legislativo para levar adiante a tramitação da lei contra a corrupção. Deputados e senadores dificilmente resistiriam a uma forte manifestação da vontade dos eleitores.
Seria muito difícil para os representantes do povo resistirem a uma manifestação firme da vontade dos cidadãos que lhes concederam a representação. Principalmente porque a nova lei significaria a obediência do Brasil ao compromisso assumido pelo seu governo, há 12 anos, quando ratificou uma convenção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico contra o suborno. Há pouco tempo, levamos um puxão de orelhas da OCDE, acompanhado da ameaça de uma recomendação a empresas dos seus países-membros, no sentido de que suspendessem seus negócios com o Brasil.
É de envergonhar. Será preciso que o povo volte às ruas, para cobrar decência de seus representantes?
A conexão egípcia - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 20/11
SÃO PAULO - No pressuposto bastante razoável de que nem israelenses conseguirão eliminar os palestinos, nem palestinos serão capazes de empurrar os israelenses para o mar, os dois lados deveriam empenhar-se mais seriamente em buscar um "modus vivendi" menos letal.
As linhas gerais do acordo a que precisam chegar são conhecidas: dois Estados, um regime especial pelo qual Jerusalém possa ser a capital de ambos e uma solução negociada, provavelmente com base em indenizações, para a questão dos refugiados palestinos. Apesar da clareza do diagnóstico, faz seis décadas que tudo dá errado. Ninguém jamais perdeu dinheiro por ter apostado contra iniciativas de paz para a região.
Mesmo assim, a menos que imaginemos que o fim das hostilidades seja uma impossibilidade cósmica, é preciso explorar as alternativas que se abrem. E, hoje, a mais interessante delas é o novo governo egípcio, liderado pelo presidente Muhammad Mursi, da Irmandade Muçulmana.
O grupo tem fortes ligações com o Hamas. Ao mesmo tempo, Mursi não tem interesse em romper os acordos de paz com Israel. Depende disso para continuar recebendo os bilhões de dólares de ajuda que os EUA dão ao Egito e para manter o relativo equilíbrio com os militares, que ainda são a segunda força política no país.
No momento, a diplomacia egípcia está empenhada em negociar um cessar-fogo imediato. Se der certo, podemos imaginar a ampliação dos entendimentos para uma trégua permanente e daí quem sabe para uma situação em que o Hamas reconheceria claramente o direito de Israel à existência -a Irmandade, que é uma espécie de irmã mais velha já deu esse passo- obtendo em contrapartida o fim do embargo a Gaza. Não é a solução, mas seria um bom começo.
A novidade aqui é que a Irmandade, ao contrário do finado governo Mubarak, tem ascendência real sobre o Hamas e motivos para querer ver a disputa resolvida.
SÃO PAULO - No pressuposto bastante razoável de que nem israelenses conseguirão eliminar os palestinos, nem palestinos serão capazes de empurrar os israelenses para o mar, os dois lados deveriam empenhar-se mais seriamente em buscar um "modus vivendi" menos letal.
As linhas gerais do acordo a que precisam chegar são conhecidas: dois Estados, um regime especial pelo qual Jerusalém possa ser a capital de ambos e uma solução negociada, provavelmente com base em indenizações, para a questão dos refugiados palestinos. Apesar da clareza do diagnóstico, faz seis décadas que tudo dá errado. Ninguém jamais perdeu dinheiro por ter apostado contra iniciativas de paz para a região.
Mesmo assim, a menos que imaginemos que o fim das hostilidades seja uma impossibilidade cósmica, é preciso explorar as alternativas que se abrem. E, hoje, a mais interessante delas é o novo governo egípcio, liderado pelo presidente Muhammad Mursi, da Irmandade Muçulmana.
O grupo tem fortes ligações com o Hamas. Ao mesmo tempo, Mursi não tem interesse em romper os acordos de paz com Israel. Depende disso para continuar recebendo os bilhões de dólares de ajuda que os EUA dão ao Egito e para manter o relativo equilíbrio com os militares, que ainda são a segunda força política no país.
No momento, a diplomacia egípcia está empenhada em negociar um cessar-fogo imediato. Se der certo, podemos imaginar a ampliação dos entendimentos para uma trégua permanente e daí quem sabe para uma situação em que o Hamas reconheceria claramente o direito de Israel à existência -a Irmandade, que é uma espécie de irmã mais velha já deu esse passo- obtendo em contrapartida o fim do embargo a Gaza. Não é a solução, mas seria um bom começo.
A novidade aqui é que a Irmandade, ao contrário do finado governo Mubarak, tem ascendência real sobre o Hamas e motivos para querer ver a disputa resolvida.
Coalizão condenada - ANTÔNIO CARLOS DE MEDEIROS
O GLOBO - 20/11
STF precisa ser coerente e reduzir o número de partidos no Congresso, com a cláusula de barreira, que o tribunal rechaçou
No julgamento da Ação Penal 470, a do mensalão do PT, o Supremo Tribunal Federal condenou o presidencialismo de coalizão e o funcionamento do sistema político-eleitoral brasileiros. Nas democracias, decisão da Justiça é para ser cumprida. Portanto, o STF precisa agora ser coerente e contribuir, por exemplo, para a redução do número de partidos com representação no Congresso através da adoção da chamada cláusula de barreira, que o próprio tribunal já rechaçou recentemente. Assim como o próprio Congresso Nacional precisa ter ousadia política para articular e votar uma reforma política corajosa, mirando o sistema eleitoral e o sistema partidário e, particularmente, a questão das coligações partidárias.
Wanderley Guilherme dos Santos foi cirúrgico ao mostrar (no “Valor”, 17/8) que as normas estabelecidas pelo próprio Legislativo e pelo próprio Superior Tribunal Eleitoral, com o propósito de reduzir a influência do poder econômico, acabaram gerando uma indústria de eleições com a criação do multimilionário mercado da “marquetagem eleitoral” e a “transformação do tempo de televisão em ativo eleitoral negociável. Com a expulsão das campanhas das ruas, a legislação elevou a televisão a canal virtualmente exclusivo de comunicação com grandes massas”
O tempo de televisão é irmão siamês das coligações ilimitadas, gerando pressões financeiras sobre os partidos. É a indústria das eleições. Sociologicamente, este é um efeito perverso das normas do Legislativo e do Judiciário. Este é o ponto.
O STF ainda vai chegar aos julgamentos das ações dos chamados “mensalão de Minas” (PSDB) e “mensalão do DEM” (Brasília). Para ser coerente, precisa cuidar de garantir institutos como a cláusula de barreira e a fidelidade partidária.
E o Congresso Nacional precisa pautar a articulação e votação de uma reforma política corajosa. Tratar dos temas do sistema eleitoral, com a adoção do voto distrital misto para melhorar a inteligibilidade e proporcionalidade do nosso sistema. Tratar do sistema partidário para diminuir o grave problema da fragmentação partidária e das oligarquias partidárias. O Brasil precisa e deve ter pluralidade partidária. Mas há partidos regionais e nacionais.
E aí vem o problema do financiamento de campanhas. Na prática, já existe. É mais simples e mais democrático regulamentar melhor a possibilidade de contribuições eleitorais aos partidos e aos candidatos pela internet, diminuindo o peso do poder econômico.
O Judiciário está no centro do debate político. É normal. E é sob o império da lei e da coerência institucional que a Suprema Corte precisa agora cuidar de institutos que contribuam para a melhoria da representação política no Brasil, construindo caminhos para que o presidencialismo de coalizão, que ela condenou, possa superar os seus paradoxos e o seu convívio permanente com as fronteiras da ingovernabilidade.
STF precisa ser coerente e reduzir o número de partidos no Congresso, com a cláusula de barreira, que o tribunal rechaçou
No julgamento da Ação Penal 470, a do mensalão do PT, o Supremo Tribunal Federal condenou o presidencialismo de coalizão e o funcionamento do sistema político-eleitoral brasileiros. Nas democracias, decisão da Justiça é para ser cumprida. Portanto, o STF precisa agora ser coerente e contribuir, por exemplo, para a redução do número de partidos com representação no Congresso através da adoção da chamada cláusula de barreira, que o próprio tribunal já rechaçou recentemente. Assim como o próprio Congresso Nacional precisa ter ousadia política para articular e votar uma reforma política corajosa, mirando o sistema eleitoral e o sistema partidário e, particularmente, a questão das coligações partidárias.
Wanderley Guilherme dos Santos foi cirúrgico ao mostrar (no “Valor”, 17/8) que as normas estabelecidas pelo próprio Legislativo e pelo próprio Superior Tribunal Eleitoral, com o propósito de reduzir a influência do poder econômico, acabaram gerando uma indústria de eleições com a criação do multimilionário mercado da “marquetagem eleitoral” e a “transformação do tempo de televisão em ativo eleitoral negociável. Com a expulsão das campanhas das ruas, a legislação elevou a televisão a canal virtualmente exclusivo de comunicação com grandes massas”
O tempo de televisão é irmão siamês das coligações ilimitadas, gerando pressões financeiras sobre os partidos. É a indústria das eleições. Sociologicamente, este é um efeito perverso das normas do Legislativo e do Judiciário. Este é o ponto.
O STF ainda vai chegar aos julgamentos das ações dos chamados “mensalão de Minas” (PSDB) e “mensalão do DEM” (Brasília). Para ser coerente, precisa cuidar de garantir institutos como a cláusula de barreira e a fidelidade partidária.
E o Congresso Nacional precisa pautar a articulação e votação de uma reforma política corajosa. Tratar dos temas do sistema eleitoral, com a adoção do voto distrital misto para melhorar a inteligibilidade e proporcionalidade do nosso sistema. Tratar do sistema partidário para diminuir o grave problema da fragmentação partidária e das oligarquias partidárias. O Brasil precisa e deve ter pluralidade partidária. Mas há partidos regionais e nacionais.
E aí vem o problema do financiamento de campanhas. Na prática, já existe. É mais simples e mais democrático regulamentar melhor a possibilidade de contribuições eleitorais aos partidos e aos candidatos pela internet, diminuindo o peso do poder econômico.
O Judiciário está no centro do debate político. É normal. E é sob o império da lei e da coerência institucional que a Suprema Corte precisa agora cuidar de institutos que contribuam para a melhoria da representação política no Brasil, construindo caminhos para que o presidencialismo de coalizão, que ela condenou, possa superar os seus paradoxos e o seu convívio permanente com as fronteiras da ingovernabilidade.
O amanhã de Haddad - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 20/11
Ansiosos por natureza, uma vez que enfrentam eleições a cada quatro anos, os políticos não ficam um mês sem avaliar os movimentos de aliados e adversários e, assim, projetar o futuro. Nesse exercício, um dos personagens mais observados no momento é o prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad. A escolha dos primeiros nomes para o secretariado deu o que falar e o que pensar nos bastidores de Brasília. A conclusão de muitos é a de que Haddad se prepara para tentar unir o partido na maior cidade do país — algo inédito em se tratando do PT. E, se tudo der certo, partir da esfera paulistana em busca de um voo mais alto antes de terminada esta década.
Para quem foi apresentado ao eleitor como um personagem fora do cenário político tradicional, Haddad começa mostrando uma certa habilidade em lidar com as nuances do jogo político. Os secretários anunciados até agora trazem a certeza de que ele está “colando” o PT à sua gestão. Apenas para reavivar a memória, levou, por exemplo, o tesoureiro da campanha de Dilma, o deputado José di Fillipi Jr, para a Secretaria de Saúde. Chamou ainda o líder do partido na Câmara, Jimar Tatto, para a Secretaria de Transportes. Assim, abrirá vagas para levar outros petistas ao Congresso — inclusive o ex-deputado José Genoino, condenado pelo Supremo Tribunal Federal no escândalo do mensalão.
Para o cidadão comum, a ação de Haddad que pode guindar Genoino ao Congresso pode ser considerada absurda, uma vez que abriga no Legislativo alguém condenado pela mais alta Corte do país. Mas, dentro de um partido que, há alguns dias, lançou uma dura e corajosa nota contra o STF, a ação de Haddad é bem recebida.
Em todos os aspectos, os nomes escolhidos até agora por Haddad ajudam a colar o mosaico do PT paulistano. Marta Suplicy, por exemplo, teve vários integrantes de sua equipe incluídos na composição do secretariado de Haddad. Nunca é demais lembrar que, quando Lula lançou o nome do ex-ministro da Educação como candidato, no início do ano, Marta espumou. Jilmar Tatto desistiu da pré-candidatura meio a contragosto. Agora, ela foi apontada como uma das construtoras da vitória. E Tatto ganhou uma vitrine na capital paulista. Se der certo, pode inclusive se preparar outros projetos dentro do partido.
No geral, até por esses movimentos, Haddad entra em campo a partir de janeiro com jeito de personagem promissor e se mostrando generoso com o próprio partido. Se emplacar e for bem sucedido do ponto de vista administrativo, representará logo ali na frente a nova cara do “lulismo”, pronta para alçar outros voos.
Por falar em outros voos…
Todos esses movimentos do prefeito eleito de São Paulo são avaliados com uma lupa por aliados e adversários. Da parte dos aliados, há a clara sensação de que Haddad será preparado por Lula para ser o candidato a presidente da República ainda nesta década. E a “colagem” do PT ao governo municipal faz parte desse processo. Por conta dessa desconfiança, já tem gente no PSB defendendo que o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, saia da toca logo em 2014, dando ao campo político que toma conta do país desde janeiro de 2003 duas opções contra a única que se coloca na oposição, o senador Aécio Neves (PSDB-MG). Se Eduardo perder, espremido pelo PT e pelo PSDB, terá se tornado mais conhecido, ganhando um novo patamar no cenário nacional.
Enquanto isso, na sala da CPI…
A semana é da CPI do Cachoeira e da posse de Joaquim Barbosa no STF. Quanto à CPI, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) avisa que, antes de apresentar qualquer relatório em separado, é preciso ver o que virá da parte do relator Odair Cunha (PT-MG), na quarta-feira. “Nem se conhece o principal e já está se falando no paralelo. Não acredito que o relator vai querer ocultar qualquer coisa. Vamos conhecer primeiro”, diz o pedetista.
Sobre a era medieval - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 20/11
A parte mais sensível do corpo humano é o bolso. Valendo esse "princípio", nos crimes contra o patrimônio público, mais importante do que colocar o meliante na cadeia é "recuperar os valores desviados". Por isso, em vez de mandar para a prisão os condenados no escândalo do mensalão, o STF deveria se preocupar em impor-lhes pesadas multas pecuniárias e a obrigação de devolver aos cofres públicos os valores desviados. Trata-se de uma visão "contemporânea" do direito penal, em oposição à prática "medieval" de privar da liberdade quem não cometeu nenhum ato de violência física contra terceiros, limitando-se a meter a mão no que não lhe pertence. É no que acredita o ministro Dias Toffoli, que, depois de, durante três meses e meio, ter-se limitado a dizer "acompanho o revisor" para absolver ou amenizar as penas dos réus da Ação Penal 470 - inclusive de seu antigo chefe José Dirceu e dos demais ligados ao PT -, em sessão plenária da semana passada se propôs a iluminar a mentalidade retrógrada da maioria de seus pares, exortando-os a se darem conta de que "as penas restritivas da liberdade que estão sendo impostas neste processo não têm parâmetros contemporâneos no Judiciário brasileiro".
Numa demonstração de generosa tolerância com o papel desempenhado por seu jovem e até então silente par no processo do mensalão, nenhum ministro se deu ao trabalho de apartear ou aduzir considerações à extravagante manifestação. Mas alguém deveria ter chamado a atenção para o fato de que o vibrante libelo poderia ser interpretado não como um sopro de contemporaneidade, mas como a reafirmação da crença arraigada na mentalidade das "elites" de que "gente importante não vai para a cadeia". De fato, seria o melhor dos mundos para os corruptos travestidos em homens públicos a definitiva consagração, pela ordem jurídica, do princípio de que, uma vez apanhados com a boca na botija, basta arcar com pesadas multas e o ressarcimento dos desfalques para que a justiça seja feita e eles continuem livres para locupletar-se com negócios escusos. Quanto aos ladrões de galinha, dura lex, sed lex...
A intervenção de Dias Toffoli insere-se num contexto inegavelmente político em que o PT, na tentativa de se eximir de culpa pelo escândalo do mensalão, articula pronunciamentos individuais destinados a transferir para o "sistema" a responsabilidade por todos os males que assolam o País.
Não terá sido mera coincidência o fato de, no momento em que a exacerbação da violência urbana intranquiliza São Paulo, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, ter usado a mesma expressão utilizada pelo ministro Toffoli - "medieval" - para criticar o sistema penitenciário, por cuja precariedade o governo federal também é responsável, ao lado das administrações estaduais. Ao proclamar dramaticamente que preferiria morrer a ter que cumprir pena nas prisões brasileiras, Cardozo expôs um quadro certamente realista das condições do aparato prisional em todo o País, mas furtou-se a entrar em detalhes quanto à responsabilidade de seu próprio Ministério que, como revelou o Estado (15/11), investe no problema menos de 1% dos recursos orçamentários previstos para esse fim.
De qualquer modo, o perfil "medieval" de muitas das instituições nacionais que tanto escandaliza Toffoli e Cardozo - pois essa condição não é exclusividade de aspectos do ordenamento jurídico ou da rede penitenciária - não pode ser dissociado do fato de que há quase 10 anos o PT exerce ampla hegemonia política no plano federal. Esses males têm raízes solidamente fincadas na persistência entre nós de um enorme déficit de consciência política sobre o qual é enorme a responsabilidade de um governo que prefere botar a culpa de todos os males nas "elites", onde hoje tem seus principais aliados. O lulopetismo prefere trabalhar na sempre desejável proliferação de consumidores - o que dá voto - do que na indispensável formação de verdadeiros cidadãos, o que só é possível com pesados investimentos de longo prazo em educação - e bons exemplos. O mais é, de fato, tudo muito "medieval", como querem os petistas.
Correto demais - VLADIMIR SAFATLE
FOLHA DE SP - 20/11
Em Paris, neste final de semana, houve uma passeata contra o projeto do governo de permitir o casamento entre homossexuais. Depois de agressões a grupos feministas e a jornalistas, alguns manifestantes se voltaram contra a "ditadura do politicamente correto".
Há alguns meses, na época da Olimpíada, uma atleta grega foi suspensa da equipe de seu país por comentários racistas em sua conta do Facebook. À notícia na imprensa europeia, seguiam-se necessariamente centenas de posts denunciando a "ditadura do politicamente correto" que impedia a atleta de enunciar suas opiniões sobre a quantidade de imigrantes em seu país.
No Brasil, discussões sobre o conteúdo racista de um livro de Monteiro Lobato degeneraram, por sua vez, em denúncias violentas contra a mesma "ditadura do politicamente correto" que, ao que parece, deve ser o resultado de um grande complô mundial contra livres pensadores travestidos de atletas gregas, manifestantes que gostam de agredir feministas e defensores da clarividência política de Lobato.
Na verdade, por trás da defesa de tal modalidade de "livre expressão" há o desejo mal escondido de continuar repetindo os mesmos velhos preconceitos e a mesma violência contra os grupos vulneráveis de sempre.
Por trás da atitude do adolescente que parece se deleitar com a descoberta de que é capaz de enunciar, à mesa do jantar, comentários "chocantes" que fazem seus pais liberais revirarem-se, há a tentativa de travestir desprezo social com a maquiagem da revolta do homem comum contra a ditadura dos intelectuais. Não por acaso, essa era uma estratégia clássica para dar direito de cidade a comentários antissemitas.
No entanto, é bom lembrar que uma democracia sabe separar a opinião do preconceito. Uma opinião é aquilo que é, por definição, indiferente. Ela abre um espaço de indiferença a respeito de enunciados e discursos. Mas há enunciações que não podem ser recebidas em indiferença, já que trazem, atrás de si, as marcas da violência que produziram ao serem enunciados. Uma sociedade tem a obrigação moral de defender-se deles.
Colocar uma advertência em um livro por ter conteúdo que pode ser sentido por minorias raciais como violência, impedir que pessoas escarneçam de grupos socialmente vulneráveis é condição para um vínculo social mínimo.
Claro, tais pessoas que julgam normal fazer piadas com negros nunca mudarão de ideia. Mas elas devem saber que há certas coisas que não se diz impunemente.
A falsa revolta é apenas mais uma arma daqueles que querem continuar com as exclusões de sempre.
Em Paris, neste final de semana, houve uma passeata contra o projeto do governo de permitir o casamento entre homossexuais. Depois de agressões a grupos feministas e a jornalistas, alguns manifestantes se voltaram contra a "ditadura do politicamente correto".
Há alguns meses, na época da Olimpíada, uma atleta grega foi suspensa da equipe de seu país por comentários racistas em sua conta do Facebook. À notícia na imprensa europeia, seguiam-se necessariamente centenas de posts denunciando a "ditadura do politicamente correto" que impedia a atleta de enunciar suas opiniões sobre a quantidade de imigrantes em seu país.
No Brasil, discussões sobre o conteúdo racista de um livro de Monteiro Lobato degeneraram, por sua vez, em denúncias violentas contra a mesma "ditadura do politicamente correto" que, ao que parece, deve ser o resultado de um grande complô mundial contra livres pensadores travestidos de atletas gregas, manifestantes que gostam de agredir feministas e defensores da clarividência política de Lobato.
Na verdade, por trás da defesa de tal modalidade de "livre expressão" há o desejo mal escondido de continuar repetindo os mesmos velhos preconceitos e a mesma violência contra os grupos vulneráveis de sempre.
Por trás da atitude do adolescente que parece se deleitar com a descoberta de que é capaz de enunciar, à mesa do jantar, comentários "chocantes" que fazem seus pais liberais revirarem-se, há a tentativa de travestir desprezo social com a maquiagem da revolta do homem comum contra a ditadura dos intelectuais. Não por acaso, essa era uma estratégia clássica para dar direito de cidade a comentários antissemitas.
No entanto, é bom lembrar que uma democracia sabe separar a opinião do preconceito. Uma opinião é aquilo que é, por definição, indiferente. Ela abre um espaço de indiferença a respeito de enunciados e discursos. Mas há enunciações que não podem ser recebidas em indiferença, já que trazem, atrás de si, as marcas da violência que produziram ao serem enunciados. Uma sociedade tem a obrigação moral de defender-se deles.
Colocar uma advertência em um livro por ter conteúdo que pode ser sentido por minorias raciais como violência, impedir que pessoas escarneçam de grupos socialmente vulneráveis é condição para um vínculo social mínimo.
Claro, tais pessoas que julgam normal fazer piadas com negros nunca mudarão de ideia. Mas elas devem saber que há certas coisas que não se diz impunemente.
A falsa revolta é apenas mais uma arma daqueles que querem continuar com as exclusões de sempre.
A propósito de 'Avenida Brasil' - A. P. QUARTIM, DE MORAES
O Estado de S.Paulo - 20/11
O fenômeno do estrondoso sucesso da novela Avenida Brasil tem merecido a atenção de críticos e especialistas, mas entendo que há um ângulo pelo qual ainda não foi devidamente considerado. Não se trata apenas do êxito excepcional de um exemplar do gênero literário que há muito se consagrou no Brasil: a teledramaturgia, que domina, em termos de audiência, o horário nobre de nossa TV aberta. O sucesso da telenovela de João Emanuel Carneiro evidencia claramente a importância que a boa literatura de ficção tem como o espelho d'alma no qual nos reconhecemos e ao universo que nos cerca. E é exatamente por cumprir esse papel que ela é fundamental para a formação cultural das gentes.
Logo no primeiro capítulo da Introdução à sua obra seminal Formação da Literatura Brasileira, Antonio Candido alude aos principais denominadores comuns que permitem reconhecer uma determinada fase literária e "que se manifestam historicamente e fazem da literatura aspecto orgânico da civilização". O mestre destaca três desses denominadores comuns: os escritores - "a existência de um conjunto de produtores literários"; os leitores - "um conjunto de receptores (...) sem os quais a obra não vive"; e "um mecanismo transmissor (de modo geral, uma linguagem, traduzida em estilos), que liga uns a outros". E acrescenta que esse conjunto de três elementos "dá lugar a um tipo de comunicação inter-humana, a literária, que aparece sob este ângulo como sistema simbólico, por meio do qual as veleidades mais profundas do indivíduo se transformam em elementos de contato entre os homens, e de interpretação das diferentes esferas da realidade".
Neste mundo globalizado do início do terceiro milênio da era cristã, a transformação (é prudente evitar o termo "evolução") dos usos e costumes que são causa/efeito da extraordinária evolução, aí, sim, tecnológica do último século - essa transformação nos coloca no mundo digital, em plena sociedade do consumo, da imagem, do espetáculo, das celebridades, do ritmo vertiginoso de vida que frequentemente mais parece um fim em si mesmo do que um meio de fazer o ser humano feliz e realizado. É claro, portanto, que a literatura, esse "aspecto orgânico da civilização", vive necessária e inevitavelmente uma fase diferente da de décadas atrás, no que diz respeito tanto a autores quanto a leitores, mas, de modo muito especial e radicalmente distinto, no que se refere a seu "mecanismo transmissor", que não se refere apenas à palavra, à linguagem e seus estilos, mas também ao veículo, à plataforma concreta que constitui o mecanismo material, o instrumento da transmissão.
A esse respeito há uma falsa questão recorrentemente colocada, que especula sobre o "fim do livro" diante da "ameaça" das novas mídias digitais. Pura bobagem, que só deve preocupar os negociantes de livros. Livro é, essencialmente, conteúdo. No dia em que o avanço da tecnologia digital conseguir consagrar uma nova forma para ele, esta passará a predominar na veiculação dos conteúdos literários, até agora predominantemente feita pelo livro. Poderá resultar até, em futuro imprevisível, na extinção do livro impresso. Mas o mais provável é que este, até onde a vista alcança, sobreviva em harmônica convivência com o digital.
Uma questão realmente importante quando se trata de conteúdo literário diz respeito ao fato de que, em medida variável, mas inevitável, a forma condiciona o conteúdo. Por definição, a literatura é escrita para ser lida. A dramaturgia, para ser encenada ao vivo. A teledramaturgia, na forma específica e dominante do folhetim (exibição seriada), para ser massificada por meio da televisão. Todas essas manifestações literárias, que frequentemente se interpenetram, compõem o amplo elenco das obras ficcionais que nos exprimem. E é natural que a teledramaturgia, veiculada por uma mídia com enorme capacidade de massificação, se tenha transformado, em nosso país, em via predominante de acesso àquele tipo de comunicação inter-humana mencionado por Antonio Candido.
Até aí, tudo bem. Até porque, apesar de não ser regra geral, a teledramaturgia brasileira conquistou um nível de qualidade formal e de conteúdo que é hoje reconhecida no mundo inteiro. Mas é claro que, quando se trata de fazer o papel de espelho d'alma de uma sociedade - especialmente de uma sociedade tão ampla, complexa, heterogênea e culturalmente frágil como a brasileira -, a novela de televisão só consegue chegar até certo ponto. É na leitura que o necessário aprofundamento das reflexões suscitadas pela boa ficção literária encontra seu melhor instrumento. E é claro também que é na ficção brasileira, e não da estrangeira, que se encontram subsídios essenciais à discussão de nossa identidade cultural.
E é por aí que a coisa se complica entre nós, uma vez que os escritores e a boa literatura de ficção nacionais têm cada vez menos espaço em nosso mercado editorial. Confiram-se as listas de mais vendidos na categoria de ficção. É território praticamente interditado para obras brasileiras, devido à culturalmente suicida política de perseguição incondicional ao best-seller praticada pelos fundamentalistas do mercado que hoje decidem o que deve ou não ser publicado pelo big business editorial. A situação só não é pior graças a um punhado de pequenos e médios editores conscientes que ainda se empenham em encontrar o ponto de equilíbrio entre a qualidade de conteúdo e o potencial comercial de seus catálogos.
Menos mal, de qualquer modo, que novelas dominam o horário nobre da televisão aberta. Se essa programação fosse montada com a mesma mentalidade dos donos do big business editorial, em vez de Avenida Brasil, estaríamos hoje assistindo a Lost, Sex and the City e que tais na hora do jantar.
Dando um limite às paixões - EDITORIAL O GLOBO
O Globo - 20/11
Entrevistada pelo jornal espanhol "El País", a presidente Dilma Rousseff afirmou que acata e não discute as decisões do Supremo Tribunal Federal, mas acrescentou que "ninguém está acima dos erros e das paixões humanas", sobretudo as relacionadas com a política.
Dependendo da posição política de cada um, haverá quem leia nisso uma crítica velada ao Supremo, que, ao votar, teria sofrido a contaminação da paixão política. Mas há outra leitura, mais substantiva e mais importante: a de que é exatamente a presença sempre perigosa da paixão política que dá todo o seu valor ao edifício das instituições, em cujo andar mais alto está o Supremo.
Paixão política, sem nenhum disfarce, é o que tem mostrado até agora a cúpula do PT, com seus manifestos que representam um desrespeito à própria evolução política do Brasil moderno. É um tipo de postura que beira o ridículo, na medida em que a maioria dos ministros que hoje compõem o Supremo foi nomeada pelo ex-presidente Lula.
Mas paixão é paixão; e neste sentido, melhor é que o ex-presidente, num assunto que definitivamente mexe com as suas emoções, prefira dizer que não viu, não ouviu, não cheirou.
O ano de 2012 vai ficar marcado por um julgamento que fez e faz história, e que configura um avanço institucional concreto. Quem acompanhou os seus muitos capítulos não viu, de maneira geral, demonstrações de interesses pessoais. Dentro das inevitáveis diferenças de opinião (às vezes gritantes), o que a opinião pública identificou foi a tentativa de destrinchar, da melhor maneira possível, um assunto tenebroso que tinha a ver com o próprio miolo das instituições. O que veio à tona, nos menores detalhes, foi a tentativa de tornar um dos poderes da República subordinado a outro, através de expedientes deletérios. Da gravidade desses fatos - e não da paixão política - é que veio a dramaticidade das sessões, acompanhadas pelo mais vasto público que já assistiu a um julgamento neste país.
O resultado disso é um passo à frente numa história que vem se desdobrando pelos últimos 27 anos, e que teve outros momentos de tensão extrema. Foi a aposta nas instituições que permitiu, pouco tempo depois da redemocratização, o impeachment e substituição de um presidente que perdera a noção da dignidade do cargo. Foi o vigor institucional que permitiu a tranquilíssima transição do ciclo Fernando Henrique para o ciclo lulista - e, por isso, nunca esteve tão longe da verdade o ex-presidente Lula quando disse que recebera do antecessor uma herança maldita. Recebeu, sim, a melhor de todas as heranças: a possibilidade de construir um projeto político sem precisar procurar inimigos atrás de cada porta. É esse processo que agora sobe um degrau com o momentoso julgamento do mensalão.
Entrevistada pelo jornal espanhol "El País", a presidente Dilma Rousseff afirmou que acata e não discute as decisões do Supremo Tribunal Federal, mas acrescentou que "ninguém está acima dos erros e das paixões humanas", sobretudo as relacionadas com a política.
Dependendo da posição política de cada um, haverá quem leia nisso uma crítica velada ao Supremo, que, ao votar, teria sofrido a contaminação da paixão política. Mas há outra leitura, mais substantiva e mais importante: a de que é exatamente a presença sempre perigosa da paixão política que dá todo o seu valor ao edifício das instituições, em cujo andar mais alto está o Supremo.
Paixão política, sem nenhum disfarce, é o que tem mostrado até agora a cúpula do PT, com seus manifestos que representam um desrespeito à própria evolução política do Brasil moderno. É um tipo de postura que beira o ridículo, na medida em que a maioria dos ministros que hoje compõem o Supremo foi nomeada pelo ex-presidente Lula.
Mas paixão é paixão; e neste sentido, melhor é que o ex-presidente, num assunto que definitivamente mexe com as suas emoções, prefira dizer que não viu, não ouviu, não cheirou.
O ano de 2012 vai ficar marcado por um julgamento que fez e faz história, e que configura um avanço institucional concreto. Quem acompanhou os seus muitos capítulos não viu, de maneira geral, demonstrações de interesses pessoais. Dentro das inevitáveis diferenças de opinião (às vezes gritantes), o que a opinião pública identificou foi a tentativa de destrinchar, da melhor maneira possível, um assunto tenebroso que tinha a ver com o próprio miolo das instituições. O que veio à tona, nos menores detalhes, foi a tentativa de tornar um dos poderes da República subordinado a outro, através de expedientes deletérios. Da gravidade desses fatos - e não da paixão política - é que veio a dramaticidade das sessões, acompanhadas pelo mais vasto público que já assistiu a um julgamento neste país.
O resultado disso é um passo à frente numa história que vem se desdobrando pelos últimos 27 anos, e que teve outros momentos de tensão extrema. Foi a aposta nas instituições que permitiu, pouco tempo depois da redemocratização, o impeachment e substituição de um presidente que perdera a noção da dignidade do cargo. Foi o vigor institucional que permitiu a tranquilíssima transição do ciclo Fernando Henrique para o ciclo lulista - e, por isso, nunca esteve tão longe da verdade o ex-presidente Lula quando disse que recebera do antecessor uma herança maldita. Recebeu, sim, a melhor de todas as heranças: a possibilidade de construir um projeto político sem precisar procurar inimigos atrás de cada porta. É esse processo que agora sobe um degrau com o momentoso julgamento do mensalão.
Petrobras e Eletrobras, as "vilãs" da bolsa - ANDRÉ ROCHA
Valor Econômico - 20/11
As ações das estatais Petrobras e Eletrobras estão nos holofotes por uma razão nada louvável: o mau desempenho dessas companhias na bolsa. Atitudes açodadas do governo, má comunicação com o mercado, visão estreita do que é função social derrubam o preço desses papéis, que são referência para o investidor. Isso não contribui para a formação de uma nova geração de investidores. A boa notícia é que existem excelentes alternativas entre as empresas privadas.
Historicamente, empresas públicas ou de capital misto tiveram participação relevante em nossa formação econômica, começando no século XIX, com o Banco do Brasil. Logo, é natural que ações de estatais povoem o Ibovespa.
Começo pela Petrobras. Ela é onipresente na vida dos brasileiros. Se vamos ao cinema, é provável que vejamos seu logotipo no início de filmes nacionais. Quem tem carro ou moto já deve ter abastecido o tanque em seus postos. Para muitos, Petrobras é sinônimo de bolsa de valores. Não é para menos. Estamos falando da maior empresa nacional, com valor de mercado de R$ 271,8 bilhões e forte presença no principal índice de nossa bolsa. As ações ordinárias (PETR3) representam 2,5% do Ibovespa e as preferenciais (PETR4), 8,2%.
Essa associação da bolsa brasileira com a Petrobras não é boa. Primeiro, seu objeto social sendo uma empresa estatal extrapola a simples lucratividade. Desenvolvimento regional, política industrial e controle da inflação também fazem parte da dinâmica operacional da companhia, o que desagrada os investidores privados. E, segundo, por ser uma produtora de commodities, seus resultados são (ou deveriam ser) relacionados aos ciclos econômicos, o que traz uma maior volatilidade ao Ibovespa.
Durante a capitalização da companhia, ficou claro para boa parte dos investidores institucionais que os resultados lucrativos ficariam postergados para o início da operação do pré-sal, previsto para meados de 2014. Assim, venderam suas participações na companhia e buscaram outras opções de investimento. Contudo, essa estratégia não foi adotada pela maioria das pessoas físicas. Assim, cada trimestre de resultados fracos (que em grande medida já eram esperados desde 2010) faz aumentar o pessimismo com as ações da companhia, contaminando o Ibovespa e, por consequência, o sentimento em relação ao mercado acionário brasileiro. Por ironia, a Petrobras, que é uma das empresas com maior orçamento para dispêndios com propaganda, acaba indiretamente sendo um ator negativo para a publicidade de nossa bolsa junto ao investidor individual.
Outra estatal que tem provocado calafrios nos investidores é Eletrobras (ELET6). O governo editou medida provisória com regras para a renovação das concessões de geração e transmissão vincendas entre 2015 e 2017. Assim, os ativos ainda não amortizados serão indenizados pela União. Até aí, nada demais. O problema é que há uma divergência significativa entre os valores apresentados nas demonstrações contábeis das companhias e aqueles propostos pelo governo. Com isso, as ações do setor, inclusive as de Eletrobras, apresentaram forte queda desde o anúncio das medidas. Sem entrar na discussão se o valor sugerido pelo governo é justo, cabe a pergunta: a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) já não conhecia os números contabilizados pelas empresas há muito tempo? São dados públicos. Por que não chamou as companhias para discutir esses valores e as premissas adotadas antes? Seria uma forma de alinhar expectativas. Precisava fazer tudo de forma açodada, em menos de dois meses? O presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, disse: "Quem se surpreendeu com os valores anunciados não fez a lição de casa". Interessante que a própria empresa do governo, a Eletrobras, também é ruim em cálculos, pois tinha ativos de R$ 30 bilhões em seu balanço e receberá apenas R$ 14 bilhões.
Esses exemplos de Petrobras e Eletrobras mostram que o governo não compreende como funciona o mercado de capitais, o que pode comprometer uma importante via de capitalização para as companhias. O mercado acionário também possui função social ao diversificar as fontes de financiamento para além do BNDES. Nessa linha, Mauro Cunha, presidente do Conselho Deliberativo da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), defende que a perda do valor de mercado das empresas estatais derivada de operações patrocinadas pelo governo deve ser levada em conta na elaboração de políticas públicas. Está correto, pois a incerteza eleva a taxa de desconto pedida pelos investidores. Isso é um custo como qualquer outro.
Essa situação descrita acima é triste, mas há investidores que não têm motivos para chorar. Os fundos de ações como os de carteira livre e os de "small caps", nos quais o gestor tem maior discricionariedade para selecionar os ativos, apresentam boa remuneração média no ano, superando com larga folga ELET6, PETR4 e o Ibovespa. Há vida na bolsa além das estatais. Ainda bem, basta procurar.
Tática de combate - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 20/11
Joaquim Barbosa diz a aliados que uma de suas primeiras medidas à frente do Conselho Nacional de Justiça será enfrentar a advocacia de filhos e cônjuges de magistrados de tribunais superiores. Como presidente do órgão, o ministro não pode impor regras, mas quer sugerir a proibição dessas atividades. Com isso, forçaria posicionamento dos conselheiros. Segundo assessores, Barbosa acredita que persuadirá os 15 integrantes do colegiado, mas prevê reação ostensiva da OAB.
Na carne Entre os possíveis afetados pelas mudanças nas normas estão filhos do atual corregedor do CNJ, ministro Francisco Falcão.
Pires No encontro com Dilma Rousseff, semana passada, o novo presidente do STF não sugeriu nomes para a vaga aberta na corte. Mas pediu apoio para o reajuste pretendido pelo Judiciário. Ouviu como resposta que este ano seria impossível.
Peito... Embora a eventual aplicação de atenuantes praticamente elimine as chances de Roberto Jefferson, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no mensalão, cumprir parte da pena em regime fechado, sua defesa decidiu que não fará esse pedido.
... aberto A avaliação do advogado Luiz Francisco Corrêa Barbosa é a de que, ao reivindicar tal benefício, o petebista assumiria a condição de delator -o que ele nega.
Paparazzi O flagrante de José Dirceu descansando em Camaçari (BA) no feriado preocupou petistas. A imagem, segundo aliados do ex-ministro, reforça a tese daqueles que defendem que a pena de prisão comece a ser cumprida antes mesmo da publicação do acórdão do julgamento.
Blitz Munidos de faixas e cartazes, militantes da Força Sindical pretendem cercar hoje o gabinete de Marco Maia (PT-RS) para pressioná-lo a colocar em votação o projeto do fator previdenciário.
Aditivo Em acordo fechado com a equipe de Fernando Haddad, a Prefeitura de São Paulo prorrogará a contratação do advogado Andrew Witts, do escritório britânico Lawrence Graham, responsável pela defesa do município no processo que corre em Jersey contra empresas atribuídas à família de Paulo Maluf.
Sem trégua Ao prolongar até fevereiro o contrato, que venceria este mês, o governo quer evitar descontinuidade no acompanhamento do caso no paraíso fiscal. A ação visa repatriar US$ 22 milhões que teriam sido desviados na gestão do ex-prefeito, hoje aliado de Haddad.
Na ponta... Relatório entregue a Gilberto Kassab pelo secretário Rubens Chammas (Planejamento) indica que a atual administração concluirá 85% do seu plano de metas. Balanço parcial de julho mostrava 63% de execução.
... do lápis O índice, embora contestado por ONGs que monitoram as ações do governo, é considerado satisfatório pelo prefeito, que pretende anunciá-lo com pompa e circunstância como um dos derradeiros atos do mandato.
Pluviômetro Derrotado por Márcio Lacerda (PSB) no primeiro turno, Patrus Ananias (PT) está empenhado em liderar a oposição em Belo Horizonte. A primeira frente do petista será a crítica à política de prevenção contra as chuvas, que afetam a capital mineira desde quinta-feira.
De saída O delegado-geral Marcos Carneiro, chefe da Polícia Civil de São Paulo, diz que colocará seu cargo à disposição do governo tão logo seja notificado judicialmente da ação do Ministério Público que o acusa de improbidade. "Sou inocente, mas não posso ficar nesta função se pairar desconfiança sobre mim."
com FÁBIO ZAMBELI e BRENO COSTA
tiroteio
"Temo certa irresponsabilidade fiscal, seja pela desoneração de impostos, pelo controle artificial de preços ou por excesso de gastos."
DO SENADOR CRISTOVAM BUARQUE (PDT-DF), sobre as críticas feitas por Dilma Rousseff à austeridade adotada por líderes europeus para enfrentar a crise.
contraponto
Pode vir quente
Polarizando com o relator Joaquim Barbosa em diversos momentos do julgamento do mensalão, o ministro Marco Aurélio Mello conversava sobre futebol com um grupo de advogados antes do início de uma das sessões no STF, quando resolveu brincar com os defensores:
-Vocês têm de tomar cuidado para não apreenderem os passaportes dos advogados também.
Paulo Sérgio Abreu e Silva, que defende Rogério Tolentino, prontamente respondeu, rindo:
-O meu é falso. É de Governador Valadares. Lá tem mais passaporte falso que metro quadrado.
PSB começa a se armar - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 20/11
2014 vem aí
A presidente Dilma fará megaevento em fevereiro para os 5.565 prefeitos eleitos. Quer orientá-los sobre gestão, dizer o que o governo tem à disposição dos municípios, pedir apoio ao seu governo, ou seja, aproximar-se politicamente dos novos gestores. Está em estudo o lançamento de um pacote de medidas. Dilma queria marcar o ato para a primeira quinzena de janeiro, mas o local escolhido, o Centro de Convenções Ulysses Guimarães, estará em reforma. Deixará para fevereiro. O evento terá estandes dos bancos estatais e dos ministérios para tirar dúvidas dos prefeitos sobre financiamentos e programas disponíveis para convênios.
“Não será batalha fácil. O Marco Civil da Internet impedirá que provedores de conexão ganhem bilhões vendendo informações”
Alessandro Molon Deputado (PT-RJ)
Brasil no comando
O brasileiro Benedito Braga é o novo presidente do Conselho Mundial da Água. Ele é professor de Engenharia Ambiental da USP e substituirá o francês Loïc Fauchon. É a primeira vez que um brasileiro ocupa o cargo. Logo após sua eleição, Braga telefonou para a ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente), que ficou eufórica com a novidade.
Para ficar menos pior
Senadores querem aprovar mudanças no Fundo de Participação dos Estados mesmo que sejam radicalmente alteradas na Câmara. É só pretexto para não ficar ainda mais constrangedor o pedido de prorrogação das regras do fundo ao STF.
Como é a vida
Joaquim Barbosa, novo presidente do STF, chegou à mais alta Corte com apoio do então ministro José Dirceu (Casa Civil). Eles foram apresentados em 2003 pelo advogado Antonio Carlos de Almeida Castro e jantaram no Piantella.
O choro é livre
O senador Lindbergh Farias e o deputado Alessandro Molon (PT-RJ) apresentaram requerimento com pedido de informações ao Ministério de Minas e Energia e à Agência Nacional de Energia Elétrica sobre o reajuste médio de 12,2% na conta de luz feito pela Light. Querem a suspensão da cobrança, mas não há chance de terem o pedido atendido.
Dividindo holofotes
Tudo o que os integrantes da CPI do Cachoeira não queriam vai acontecer: com a leitura do relatório adiada para amanhã, o Congresso terá que dividir os holofotes com a primeira sessão do mensalão presidida por Joaquim Barbosa.
Sem mordomias
O príncipe Guilherme Alexandre e a princesa Máxima, da Holanda, que estão no Brasil para encontros com empresários e integrantes do governo, viajaram da Europa a São Paulo em voo de carreira da KLM e, para Brasília, de Gol.
A Abin enviou ao Ministério da Justiça, uma semana antes do início da onda de violência, estudo que aponta problemas de segurança em Santa Catarina.
AINDA É O AMOR - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 20/11
BOLSO CHEIO
Condenado em setembro nos EUA, o banco americano Merrill Lynch já desembolsou a indenização que devia à brasileira Camelia Nasser de Kassin, que perdeu dinheiro em aplicações feitas pela instituição no mercado financeiro. Ela recebeu US$ 3,6 milhões.
QUASE NADA
Sobrinha do banqueiro Edmond Safra, Camelia diz que os recursos não serviram para quase nada. "O que me deram é uma bobagem. Serviu para pagar advogados. Não sobrou nada para mim", diz ela, que havia pedido US$ 21 milhões no processo contra o banco.
RODA VIVA
A família Nasser move outras três ações contra a Merrill Lynch. No total, foram movimentados quase US$ 400 milhões no banco.
MIRA VIRTUAL
A equipe de Lady Gaga no Brasil chegou a acionar a polícia por causa de ameaças que ela recebeu em redes sociais quando estava no país. O pedido foi encaminhado por Jânio Quadros Neto. Ele não se manifesta.
FANTASMA
Depois de certo alvoroço, a produção da cantora americana concluiu que um mesmo internauta, usando apelidos diferentes, fazia as ameaças. Mas não foi possível até agora identificá-lo.
BOA VIZINHANÇA
Joaquim Barbosa, que assume a presidência do STF (Supremo Tribunal Federal) na quinta, tem dito a interlocutores que achou a conversa que teve com Dilma Rousseff "excelente".
A presidente o recebeu com simpatia e os dois trocaram ideias sobre o Judiciário.
NÃO FOI BEM ASSIM
Autor da denúncia de que motéis de Manaus estariam aceitando reservas para turistas interessados em programas com crianças e adolescentes na Copa do Mundo, o vereador Elias Emanuel Rebouças de Lima (PSB) não sustentou a acusação na CPI da Exploração Sexual da Câmara dos Deputados.
NÃO EXISTE
Ao depor, o presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da Câmara Municipal de Manaus voltou atrás e declarou que não existe turismo sexual lá. Membros da CPI vão fazer diligências no Estado para investigar também denúncias de leilão de garotas indígenas virgens, por lances de R$ 20, no município de São Gabriel da Cachoeira.
EM FAMÍLIA
Depois de anunciar a separação, Zezé di Camargo dedicou o show da última sexta para a ex-mulher, Zilu, que estava na plateia. Ela embarcou de volta para Miami, onde mora, no domingo. E retorna antes do Natal. Passa a ceia com os sogros, Francisco e Helena. O Réveillon será com Zezé e os filhos na fazenda É o Amor, em Goiás.
QUATRO ALIANÇAS
O apresentador Tiago Leifert se casou com a repórter Daiana Garbin no sábado em SP. Na mesma cerimônia, a irmã de Tiago, Marcela, se casou com o diretor do "Programa do Jô", Willem van Weerelt. Entre os convidados que foram ao hotel Unique estavam os jornalistas Carla Vilhena e Abel Neto, o apresentador Serginho Groisman e o padre Juarez.
BILHETE AÉREO
Começou a ser veiculada em Los Angeles campanha de promoção do longa "O Palhaço", candidato brasileiro à vaga de um dos cinco concorrentes ao Oscar de melhor filme estrangeiro. Foram espalhados pela cidade cartazes e outdoors com o mote "Comece a sua viagem ao Brasil pelo cinema". A campanha é da Embratur e do Ministério da Cultura.
ARTE É MODA
Artur Slama, 22, herdou a veia artística do pai, o estilista Amir Slama; obras dele e de outros dez artistas serão levadas por Bia Duarte para o salão "Art en Capital", que acontece no Grand Palais, em Paris
CURTO-CIRCUITO
Miro inaugura a mostra de fotos "Pérolas Negras", às 13h, no Museu Afro Brasil.
A CPFL promove o show "100 Anos de Luz & Som", às 19h30, no teatro Alfa.
O Graac receberá o faturamento líquido do estacionamento do shopping Cidade Jardim nesta sexta.
O pianista Paulo Braga, o baterista Edu Ribeiro, o flautista Edu Neves e o baixista Marinho Andreotti se apresentam hoje no Carnegie Hall, em Nova York.
Apagão da Eletrobras - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 20/11
COM ALVARO GRIBEL E VALÉRIA MANIERO
As ações da Eletrobras estão sofrendo apagão nas bolsas. Caíram 12% na sexta-feira e 15% ontem. No mês, a queda é de 40% e no ano chega a 60%. O banco inglês Barclay reduziu o preço-alvo da ação para R$ 1. Os analistas dizem que a empresa terá problemas de solvência, caso não seja capitalizada. As perdas com a mudança nas regras do setor elétrico podem passar de R$ 35 bilhões.
As ações da Eletrobras fecharam ontem em R$ 9,8. Ninguém acredita que chegarão a R$ 1, como projetou o Barclay, mas a queda do preço-alvo ilustra o humor dos investidores com o principal grupo de energia do país, responsável por quase 40% da geração e 56% das linhas de transmissão. Alguns estão jogando a toalha.
No início do ano, o valor de mercado da Eletrobras era de R$ 26 bilhões. Ontem, fechou em R$ 11,3 bilhões. A empresa já não vinha tendo bons resultados operacionais, mas o que realmente azedou a relação com os investidores foi a MP 579 que, para reduzir o valor da conta de luz de consumidores e empresas, mexe com a rentabilidade das companhias do setor elétrico.
A Eletrobras é controlada pela União, por isso, deve aceitar as novas regras, apesar das perdas de receita que terá e do prejuízo para os minoritários. A importância da empresa para o setor é enorme: controla 12 subsidiárias e detém 50% de Itaipu.
São duas as frentes de perdas. A primeira, via indenizações, chega a R$ 17 bilhões. A segunda, via receitas, pode passar de R$ 20 bilhões até 2017.
A Eletrobras contabilizava em seu balanço R$ 31 bilhões em indenizações a receber por investimentos já feitos e ainda não amortizados. Com a MP 579, a União disse que pagará R$ 14 bilhões. A empresa, então, terá que dar baixa dessa diferença.
Segundo o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales, se a Eletrobras aceitar a proposta de antecipar a renovação das concessões, o grupo deixará de arrecadar mais de R$ 20 bi até 2017.
- Analisamos usina a usina, com o vencimento de contrato de cada uma, até 2017. Chegamos a uma perda acumulada de R$ 20 bilhões. Tanto para geração quanto para transmissão. É totalmente antieconômico, a Eletrobras estará praticamente quebrada - disse Sales.
A receita operacional da empresa cairá a zero no ano que vem. Ou seja, o que entrar de caixa não será suficiente para pagar a operação dela própria.
Para a analista Karina Freitas, não haverá outra alternativa a não ser a capitalização do grupo:
- A Eletrobras terá que ser capitalizada, seja por meio do Tesouro ou por oferta de ações. O problema é que o mercado está fechado para ela. O próprio grupo já adiou uma emissão de debêntures que estava programada para este mês, no valor de R$ 2 bilhões, para o ano que vem.
Elétricas para segurar a inflação
A inflação alta é o pano de fundo da MP 579, que antecipa a renovação de contratos do setor elétrico. Da mesma forma como vem segurando o preço da gasolina nas bombas, causando prejuízo à Petrobras, o governo vai usar a conta de luz para ajudar o Banco Central no combate à alta dos preços. Por isso, contratos de geração, distribuição e transmissão de energia que venceriam entre 2015 e 2017 serão antecipados para janeiro de 2013. As empresas não esperavam por essa mudança - a MP é de 11 de setembro, tem pouco mais de 60 dias - e trabalhavam com os prazos originais. Esse calendário apertado tem gerado insegurança e provocado volatilidade nas bolsas.
MAU SINAL. A projeção para o PIB brasileiro de 2013 caiu abaixo de 4% pela primeira vez na pesquisa Focus, feita pelo BC. Foi a 3,96%. Já a estimativa para a produção industrial parece otimista demais: alta de 4,15%. Se a indústria decepcionar novamente, no ano que vem, o PIB cairá junto.
Dever de casa feito. A troica conferiu as contas de Portugal e o país vai, sim, receber mais uma parcela do resgate, no valor de € 2,5 bilhões. Não foram poucos os esforços feitos pelos portugueses.
Palmeiras! 50 tons de bacon! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 20/11
Voltei da Bahia! Tomei banho de sol ao lado do Zé Dirceu! No próximo não quero estar presente
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Voltei da Bahia! Onde fui vizinho do Zé Dirceu! É verdade! Ele tava na praia ao lado! Tomei banho de sol ao lado do Zé Dirceu! Espero que tenha sido o último! No próximo não quero estar presente. Rarará!
E hoje é Dia da Consciência Negra! E amanhã podia ser Dia da Consciência Pesada: pra políticos, assaltantes, pro gerente do banco que negou empréstimo e pro motoboy que quebrou o retrovisor do meu carro!
E o Palmeiras? Domingo foi Dia do Alívio Suíno! Ninguém aguentava mais a agonia do porco! Ô porco difícil de assar. Acho que esse porco foi cozido no bafo.
E como se diz em velórios: "parou de sofrer"! Rarará! Flamengo X Palmeiras! Porco com Urubu! O jogo devia ter sido no lixão! Direto de Volta Redonda!
Mas a volta do Palmeiras foi quadrada! A Volta Quadrada! Culpa do Vagner Love. Ops, Vagner Engov! "Vagner Love, Vagner Love/ se botar teu amor na vitrine/ não vale R$ 1,99". E diz que um corintiano ligou pra série A: "O Palmeiras tá aí?". Aí a linha caiu! Rarará!
E esta: "SPFC em festa! O Ganso entrou". Rarará! E o novo best-seller do Palmeiras: "50 Tons de Bacon". Rarará!
E a Bagurança Pública! Olha essa piada pronta: "Alckmin atribui números da violência ao tamanho da população". Então na China seria um genocídio por dia! É isso? Pode, Arnaldo?!
E adorei a charge do Pelicano: um cidadão no ponto de ônibus com um extintor de incêndio! Agora em São Paulo e Santa Catarina tem que ter bilhete único e extintor de incêndio.
Podiam lançar o Extintor Único. Viaje de São Paulo a Florianópolis pela Viação São João! Fora de época! Rarará!
E Israel e Palestina? Não pode ter uma ameaça de paz que eles saem brigando! Toda vez que tem guerra eu me lembro da frase do Bronco Ronald Golias: "a civilização não se comportou!". É mole? É mole, mas sobe!
E eu voltei da Bahia porque botaram a rede pra lavar. Fui despejado da rede. E a Bahia é bilíngue: "Barbearia Arembepe Barbershop".
E agora tchau, que trabalhar em feriadão dá entojo, ziquizira, calo seco, ovo virado e dor nas costas que responde no pé! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza! Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Voltei da Bahia! Tomei banho de sol ao lado do Zé Dirceu! No próximo não quero estar presente
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
Voltei da Bahia! Onde fui vizinho do Zé Dirceu! É verdade! Ele tava na praia ao lado! Tomei banho de sol ao lado do Zé Dirceu! Espero que tenha sido o último! No próximo não quero estar presente. Rarará!
E hoje é Dia da Consciência Negra! E amanhã podia ser Dia da Consciência Pesada: pra políticos, assaltantes, pro gerente do banco que negou empréstimo e pro motoboy que quebrou o retrovisor do meu carro!
E o Palmeiras? Domingo foi Dia do Alívio Suíno! Ninguém aguentava mais a agonia do porco! Ô porco difícil de assar. Acho que esse porco foi cozido no bafo.
E como se diz em velórios: "parou de sofrer"! Rarará! Flamengo X Palmeiras! Porco com Urubu! O jogo devia ter sido no lixão! Direto de Volta Redonda!
Mas a volta do Palmeiras foi quadrada! A Volta Quadrada! Culpa do Vagner Love. Ops, Vagner Engov! "Vagner Love, Vagner Love/ se botar teu amor na vitrine/ não vale R$ 1,99". E diz que um corintiano ligou pra série A: "O Palmeiras tá aí?". Aí a linha caiu! Rarará!
E esta: "SPFC em festa! O Ganso entrou". Rarará! E o novo best-seller do Palmeiras: "50 Tons de Bacon". Rarará!
E a Bagurança Pública! Olha essa piada pronta: "Alckmin atribui números da violência ao tamanho da população". Então na China seria um genocídio por dia! É isso? Pode, Arnaldo?!
E adorei a charge do Pelicano: um cidadão no ponto de ônibus com um extintor de incêndio! Agora em São Paulo e Santa Catarina tem que ter bilhete único e extintor de incêndio.
Podiam lançar o Extintor Único. Viaje de São Paulo a Florianópolis pela Viação São João! Fora de época! Rarará!
E Israel e Palestina? Não pode ter uma ameaça de paz que eles saem brigando! Toda vez que tem guerra eu me lembro da frase do Bronco Ronald Golias: "a civilização não se comportou!". É mole? É mole, mas sobe!
E eu voltei da Bahia porque botaram a rede pra lavar. Fui despejado da rede. E a Bahia é bilíngue: "Barbearia Arembepe Barbershop".
E agora tchau, que trabalhar em feriadão dá entojo, ziquizira, calo seco, ovo virado e dor nas costas que responde no pé! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza! Hoje só amanhã. Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Dando um limite às paixões - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 20/11
Entrevistada pelo jornal espanhol “El País”, a presidente Dilma Rousseff afirmou que acata e não discute as decisões do Supremo Tribunal Federal, mas acrescentou que “ninguém está acima dos erros e das paixões humanas”, sobretudo as relacionadas com a política.
Dependendo da posição política de cada um, haverá quem leia nisso uma crítica velada ao Supremo, que, ao votar, teria sofrido a contaminação da paixão política. Mas há outra leitura, mais substantiva e mais importante: a de que é exatamente a presença sempre perigosa da paixão política que dá todo o seu valor ao edifício das instituições, em cujo andar mais alto está o Supremo.
Paixão política, sem nenhum disfarce, é o que tem mostrado até agora a cúpula do PT, com seus manifestos que representam um desrespeito à própria evolução política do Brasil moderno. É um tipo de postura que beira o ridículo, na medida em que a maioria dos ministros que hoje compõem o Supremo foi nomeada pelo ex-presidente Lula.
Mas paixão é paixão; e neste sentido, melhor é que o ex-presidente, num assunto que definitivamente mexe com as suas emoções, prefira dizer que não viu, não ouviu, não cheirou.
O ano de 2012 vai ficar marcado por um julgamento que fez e faz história, e que configura um avanço institucional concreto. Quem acompanhou os seus muitos capítulos não viu, de maneira geral, demonstrações de interesses pessoais. Dentro das inevitáveis diferenças de opinião (às vezes gritantes), o que a opinião pública identificou foi a tentativa de destrinchar, da melhor maneira possível, um assunto tenebroso que tinha a ver com o próprio miolo das instituições. O que veio à tona, nos menores detalhes, foi a tentativa de tornar um dos poderes da República subordinado a outro, através de expedientes deletérios. Da gravidade desses fatos — e não da paixão política — é que veio a dramaticidade das sessões, acompanhadas pelo mais vasto público que já assistiu a um julgamento neste país.
O resultado disso é um passo à frente numa história que vem-se desdobrando pelos últimos 27 anos, e que teve outros momentos de tensão extrema. Foi a aposta nas instituições que permitiu, pouco tempo depois da redemocratização, o impeachment e substituição de um presidente que perdera a noção da dignidade do cargo. Foi o vigor institucional que permitiu a tranquilíssima transição do ciclo Fernando Henrique para o ciclo lulista — e por isso, nunca esteve tão longe da verdade o ex-presidente Lula quando disse que recebera do antecessor uma herança maldita. Recebeu, sim, a melhor de todas as heranças: a possibilidade de construir um projeto político sem precisar procurar inimigos atrás de cada porta. É esse processo que agora sobe um degrau com o momentoso julgamento do mensalão.
Entrevistada pelo jornal espanhol “El País”, a presidente Dilma Rousseff afirmou que acata e não discute as decisões do Supremo Tribunal Federal, mas acrescentou que “ninguém está acima dos erros e das paixões humanas”, sobretudo as relacionadas com a política.
Dependendo da posição política de cada um, haverá quem leia nisso uma crítica velada ao Supremo, que, ao votar, teria sofrido a contaminação da paixão política. Mas há outra leitura, mais substantiva e mais importante: a de que é exatamente a presença sempre perigosa da paixão política que dá todo o seu valor ao edifício das instituições, em cujo andar mais alto está o Supremo.
Paixão política, sem nenhum disfarce, é o que tem mostrado até agora a cúpula do PT, com seus manifestos que representam um desrespeito à própria evolução política do Brasil moderno. É um tipo de postura que beira o ridículo, na medida em que a maioria dos ministros que hoje compõem o Supremo foi nomeada pelo ex-presidente Lula.
Mas paixão é paixão; e neste sentido, melhor é que o ex-presidente, num assunto que definitivamente mexe com as suas emoções, prefira dizer que não viu, não ouviu, não cheirou.
O ano de 2012 vai ficar marcado por um julgamento que fez e faz história, e que configura um avanço institucional concreto. Quem acompanhou os seus muitos capítulos não viu, de maneira geral, demonstrações de interesses pessoais. Dentro das inevitáveis diferenças de opinião (às vezes gritantes), o que a opinião pública identificou foi a tentativa de destrinchar, da melhor maneira possível, um assunto tenebroso que tinha a ver com o próprio miolo das instituições. O que veio à tona, nos menores detalhes, foi a tentativa de tornar um dos poderes da República subordinado a outro, através de expedientes deletérios. Da gravidade desses fatos — e não da paixão política — é que veio a dramaticidade das sessões, acompanhadas pelo mais vasto público que já assistiu a um julgamento neste país.
O resultado disso é um passo à frente numa história que vem-se desdobrando pelos últimos 27 anos, e que teve outros momentos de tensão extrema. Foi a aposta nas instituições que permitiu, pouco tempo depois da redemocratização, o impeachment e substituição de um presidente que perdera a noção da dignidade do cargo. Foi o vigor institucional que permitiu a tranquilíssima transição do ciclo Fernando Henrique para o ciclo lulista — e por isso, nunca esteve tão longe da verdade o ex-presidente Lula quando disse que recebera do antecessor uma herança maldita. Recebeu, sim, a melhor de todas as heranças: a possibilidade de construir um projeto político sem precisar procurar inimigos atrás de cada porta. É esse processo que agora sobe um degrau com o momentoso julgamento do mensalão.
Gaza, de novo - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 20/11
Hamas deflagra mais um confronto com Israel, que responde com força; novo governo do Egito pode ajudar em solução diplomática
Mais uma vez, forças do Exército de Israel e militantes do Hamas se enfrentam, provocando dezenas de mortes, a maioria de palestinos. Teme-se que o governo do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, lance ofensiva terrestre na hiperpopulosa Gaza, o que elevaria ainda mais a estatística fúnebre.
As ações do Estado judeu são uma resposta ao lançamento de foguetes contra alvos israelenses por parte de extremistas palestinos em Gaza. Tais disparos são de fato inadmissíveis. Nenhum país deve tolerar que um território vizinho jogue continuamente saraivadas de mísseis -mesmo que de baixa letalidade- contra seus cidadãos.
Contudo, até de um ponto de vista pragmático, o caminho marcial não é a melhor resposta. Israel já tentou resolver essa situação "manu militari" em 2008, na Guerra de Gaza, e não obteve sucesso.
O saldo daquele confronto foi de cerca de 1.300 mortos, 99% dos quais palestinos, mas a capacidade do Hamas e de outros grupos de atacar Israel com foguetes não foi reduzida. Ao contrário, os bólidos hoje alcançam alvos mais distantes, como Tel Aviv e Jerusalém.
A atual campanha israelense pode não passar de mera expedição punitiva a fim de demonstrar a força de um governo que enfrentará eleições dentro de dois meses. Outra possibilidade é que os israelenses calculem que a melhor forma de lidar com o Hamas é promover a cada quadriênio uma grande poda em sua infraestrutura militar.
Nada disso, porém, atende aos fins de longo prazo de Israel. Se o país pretende um dia viver em paz com seus vizinhos, precisa cuidar para que surjam lideranças palestinas dispostas a discutir um acordo.
Paradoxalmente, a queda do ditador egípcio Hosni Mubarak e sua substituição por um governo da Irmandade Muçulmana -ideologicamente muito próxima do Hamas- pode ser uma boa oportunidade para mudar um pouco o jogo.
A Irmandade Muçulmana não deve rever os acordos de paz que o Egito assinou com Israel em 1979. Não lhe interessa, aparentemente, acirrar o conflito entre o Hamas e os israelenses, o que poderia arrastá-la para a disputa.
Por outro lado, se conseguisse promover uma trégua duradoura ou, melhor ainda, levar Israel e o Hamas para a mesa de negociações, ganharia preciosos pontos com os países ocidentais, que veem com desconfiança a origem islâmica do novo governo egípcio.
Para o Hamas, uma concessão intermediada pela Irmandade seria menos amarga que uma arrancada por outros atores. Já Israel, cada vez mais isolado na região, não poderá agir indefinidamente como se não houvesse uma questão palestina a ser resolvida por meio de negociações sérias.
Resta esperar que a presente conflagração seja a tempestade que antecede a calmaria. Tratando-se do Oriente Médio, todo ceticismo é pouco.
Hamas deflagra mais um confronto com Israel, que responde com força; novo governo do Egito pode ajudar em solução diplomática
Mais uma vez, forças do Exército de Israel e militantes do Hamas se enfrentam, provocando dezenas de mortes, a maioria de palestinos. Teme-se que o governo do premiê israelense, Binyamin Netanyahu, lance ofensiva terrestre na hiperpopulosa Gaza, o que elevaria ainda mais a estatística fúnebre.
As ações do Estado judeu são uma resposta ao lançamento de foguetes contra alvos israelenses por parte de extremistas palestinos em Gaza. Tais disparos são de fato inadmissíveis. Nenhum país deve tolerar que um território vizinho jogue continuamente saraivadas de mísseis -mesmo que de baixa letalidade- contra seus cidadãos.
Contudo, até de um ponto de vista pragmático, o caminho marcial não é a melhor resposta. Israel já tentou resolver essa situação "manu militari" em 2008, na Guerra de Gaza, e não obteve sucesso.
O saldo daquele confronto foi de cerca de 1.300 mortos, 99% dos quais palestinos, mas a capacidade do Hamas e de outros grupos de atacar Israel com foguetes não foi reduzida. Ao contrário, os bólidos hoje alcançam alvos mais distantes, como Tel Aviv e Jerusalém.
A atual campanha israelense pode não passar de mera expedição punitiva a fim de demonstrar a força de um governo que enfrentará eleições dentro de dois meses. Outra possibilidade é que os israelenses calculem que a melhor forma de lidar com o Hamas é promover a cada quadriênio uma grande poda em sua infraestrutura militar.
Nada disso, porém, atende aos fins de longo prazo de Israel. Se o país pretende um dia viver em paz com seus vizinhos, precisa cuidar para que surjam lideranças palestinas dispostas a discutir um acordo.
Paradoxalmente, a queda do ditador egípcio Hosni Mubarak e sua substituição por um governo da Irmandade Muçulmana -ideologicamente muito próxima do Hamas- pode ser uma boa oportunidade para mudar um pouco o jogo.
A Irmandade Muçulmana não deve rever os acordos de paz que o Egito assinou com Israel em 1979. Não lhe interessa, aparentemente, acirrar o conflito entre o Hamas e os israelenses, o que poderia arrastá-la para a disputa.
Por outro lado, se conseguisse promover uma trégua duradoura ou, melhor ainda, levar Israel e o Hamas para a mesa de negociações, ganharia preciosos pontos com os países ocidentais, que veem com desconfiança a origem islâmica do novo governo egípcio.
Para o Hamas, uma concessão intermediada pela Irmandade seria menos amarga que uma arrancada por outros atores. Já Israel, cada vez mais isolado na região, não poderá agir indefinidamente como se não houvesse uma questão palestina a ser resolvida por meio de negociações sérias.
Resta esperar que a presente conflagração seja a tempestade que antecede a calmaria. Tratando-se do Oriente Médio, todo ceticismo é pouco.
Ayres Britto fará falta - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 20/11
Foi uma homenagem a uma convicção sustentada durante longo tempo. Na última sessão de que participou no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há uma semana, o seu presidente, Carlos Ayres Britto, que exercia o cargo em virtude de sua condição de titular do Supremo Tribunal Federal (STF), viu aprovada uma ideia que trouxera consigo para o colegiado - a de fazê-lo acompanhar os processos que envolvem o exercício da liberdade de imprensa. Criado para aperfeiçoar o sistema judiciário brasileiro, o CNJ, no entender de Britto, "não podia deixar de se interessar" pelo modo como as relações entre a imprensa e o sistema democrático "são cotidianamente equacionadas" pela Justiça brasileira.
O interesse tomará a forma de uma comissão denominada Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade. Presidido por um membro do CNJ, dele farão parte outros conselheiros, representantes da magistratura federal e estadual, da OAB e de entidades da área da comunicação. Evidentemente, Ayres Britto deixa claro, o Fórum não terá "nenhuma interferência na autonomia técnica dos magistrados" no exame de litígios que envolvam a liberdade de expressão. Ao criar um banco de dados desses julgamentos, o que lhe permitirá fornecer informações objetivas aos tribunais para suplementar a tomada de suas decisões, o Fórum poderá verificar, de acordo com o seu inspirador, o cumprimento da sentença do STF que extinguiu, por inconstitucional, a Lei de Imprensa do regime militar.
Numerosos membros da alta magistratura decerto têm, ou tiveram a seu tempo, a mesma inabalável convicção de Ayres Britto sobre o "vínculo umbilical", como diz, entre o direito à informação e a livre manifestação do pensamento, de um lado, e a democracia, de outro. Mas dificilmente algum deles o terá superado em matéria de zelo - juridicamente alicerçado - em defesa da liberdade fundamental nas sociedades civilizadas. Quanto mais não fosse, o seu voto pela eliminação do entulho autoritário configurado na Lei de Imprensa deixou cravada na pedra uma passagem luminosa da trajetória da mais alta Corte do País - e da presença, nela, de um ministro que não inspirava expectativas dignas de nota quando o presidente Lula o nomeou em 2003 para a primeira vaga que se abria no seu mandato.
Aposentado compulsoriamente no domingo, quando alcançou a idade-limite de 70 anos, esse sergipano de Propriá havia ocupado algumas das mais respeitadas funções no Judiciário de seu Estado, escrito um punhado de livros de poesia - e tentado, em vão, eleger-se deputado federal pelo PT, ao qual esteve filiado por 18 anos. Assumiu a sua cadeira no STF praticamente dois anos antes de um acontecimento que mudaria a sua vida e a dos pares de quem se despediu na semana passada dizendo que o Judiciário está "transformando o País". Foi a entrevista em que o então deputado Roberto Jefferson denunciou o esquema de compra de apoio parlamentar ao governo Lula, fazendo rebentar o escândalo do mensalão. Nos breves sete meses em que lhe tocou presidir o Supremo, a contar de abril último, Ayres Britto teve papel decisivo para impedir que o julgamento do caso ficasse para o dia de São Nunca.
Durante os trabalhos, impressionou pela mansidão o grande público que não tinha acesso aos bastidores da Corte para saber que ele punha a placidez a serviço da firmeza a fim de que nada tirasse do prumo o fecho da mais importante ação penal da história do STF. A expressão "algodão entre cristais", tanto usada para descrever a sua atitude diante da troca de desaforos entre os ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski, não conta tudo. O exercício do apaziguamento em nenhum momento o levou a abrandar a sua preocupação primeira com a estrita obediência à Constituição. "O Supremo", ensinou, "interfere mais e mais no curso da vida, como deve ser, como fiel intérprete de uma Constituição concretista (que não se atém ao enunciado de princípios gerais e abstratos)."
A lhaneza, a contenção do ego em um ambiente que não se caracteriza propriamente pela modéstia de seus ocupantes tampouco o inibiram de disparar na despedida uma ardida lição aos remanescentes: "Derramamento de bílis não combina com a produção de neurônios". Fará falta.
O lado bom da tragédia - ARNALDO JABOR
O Estado de S.Paulo - 20/11
Às vezes, sonho com um supercrash do capitalismo. Maior do que o atual. Em dias de ódio e tédio com o mundo fora dos eixos, desejo o mal: "Que quebre tudo logo, vamos recomeçar do zero!" Sonho, às vezes, como um bolchevista louco ou um homem-bomba querendo a morte dos cães infiéis - que somos nós. Um 'supercrash' seria bom. Dar-nos-ia uma consciência mais humilde de limites. Em meu delírio, chego a desejar que alguma catástrofe aconteça, para nos despertar desta suja esperança, desta sórdida alegria obrigatória que nos impingem.
O crash traria uma nova era; terrível ou não, alguma verdade surgiria… Como chamá-la? A pós-pós-modernidade? O pós-apocalipse? A "desglobalização"? A única coisa que não será "pós" é a burguesia, claro. Não há "pós-burguesia".
O supercrash seria bom para fracassados, pois estão desculpados, mas seria ruim para catastrofistas - que ficariam sem anátemas e protestos nos bares. Uma crise é boa para o contato com o absurdo. Nesse sentido, uma crise radical seria 'filosófica', porque o mal ficaria banalizado e o bem, um luxo ridículo, um hobby.
Ficaríamos mais espiritualizados com uma supercrise. Num primeiro momento, o horror, bolsas caindo, grana sumindo. Depois, a paz do inevitável, a calma da desgraça assumida - vejam o rosto pacífico dos famintos do Sudão. A fome traz uma paz desesperançada. Uma super-recessão muito maior que em 29 pode mostrar que a voracidade consumista não é a única maneira de viver. Seríamos mais magros e mais frugais; ficaríamos mais elegantes com um crash. 'Crash chic'.
Um supercrash apaga o sorriso dos colunáveis nas revistas. Um crash fecha a Caras e provoca uma onda de suicídios de milionários e instilaria humildade nas almas yuppies. Acabariam suspensórios floridos e gravatas de pintinhas. Das salas ricas, sumiriam elefantes de prata, lustres de cristal e tapetes de zebra.
Voltariam os hippies, as drogas lisérgicas, o artesanato de couro, a poesia, a arte, a lenta reflexão, "slow life". Toda crise é uma renascença. Haveria uma estética do crash. O crash criaria escolas filosóficas: o 'pirronismo' absoluto, um neoniilismo pragmático e a escatologia escatológica: "a merda está no fim da história", uma espécie de Hegel de marcha à ré.
Os intelectuais encheriam a cara nos bares, cheios de esperançoso pessimismo. Os bondosos de carteirinha, os cafetões da miséria, santos oportunistas, ficariam todos em pânico: "Se não houver um mal claro, como seremos bons?"
O mundo se 'balcanizaria' em ilhas culturais e psicológicas; o mundo se espalharia em esponjas, em vazios, em avessos, em 'buracos brancos' que se alargam enquanto o tecido da sociedade se esgarça. Não seriam 'células de resistência', mas 'buracos de desistência'.
Os filmes americanos ficarão felizes e haverá musicais para nos alegrar, como no tempo do crash de 29 . Fred Astaire vai dançar com Ginger Rogers de novo. O crash acaba com os filmes de grande produção. O crash vai nos livrar dos grandes shows de rock, das milionárias bandas revoltadas, dos best-sellers de autoajuda (pois não haverá salvação possível), das supercervejarias, dos canecões. Diminuiria muito nossa ansiedade patológica e teríamos a depressão, que é muito melhor porque, ao menos, descansamos caídos na cama.
Com a nova guerra fria entre russos e americanos e, talvez, uma guerra quente no Oriente Médio, teríamos a restauração da beleza da morte e não mais sua banalização pelos videogames letais. Uma 'supercrise' traria um novo sabor de verdade a esta ópera-bufa que vivemos. Acaba o pastelão e começa a tragédia real. O crash será um 'thrill' para nossas vidas. A paz é chata; parece filme iraniano. A guerra é que é legal, como um filme de ação. O crash também revitalizaria o inútil, a importância do nada, a ausência de urgências, uma saudável tristeza vil. Acabaria com a folga arrogante do capitalismo financeiro, com seus imensos casinos do Mal.
Um crash pode nos dar o frisson de sermos vítimas, a luz negra excitante da paixão. Pode acabar com este bom senso insuportável que nos rege. Acabarão os países emergentes, pois todos seremos reemergentes. Sem consumo, haverá um grande estímulo para o sexo... já que não teremos nada a fazer. O crash vai parir 'babycrashers'. E também vai justificar broxadas: "minha filha... desculpe... é o crash..." O crash vai acabar com o grande movimento em aeroportos e diminuirá sensivelmente o número de barrigudos falando alto em celulares. O crash fecha Miami. Vão acabar palavras como 'globalização', livre mercado, competitividade, desregulamentação, qualidade total, inovação. Como se diz hoje, o mundo terá um "downsizing".
O crash pode vir a ser retrô, delicioso - voltaremos aos anos 50, de onde nunca saímos, na verdade. Ficaríamos livres da euforia gratuita e teríamos um sadio desalento. Acabaria o vício do passadismo rancoroso, com a desistência da esperança regressista, acabaria a nostalgia de torturas, heranças malditas, ossadas do Araguaia. Acabaria um sonho de futuro. Só teríamos o presente incessante.
O crash vai ser bom para o Brasil conhecer o caos. Há anos que falamos nele sem saboreá-lo, se bem que não temos competência nem para o caos, que é mais 'anglo-saxônico'. Teremos o pântano, o brejo (para a onde a vaca vai), coisa mais 'nossa', mais 'saudades do matão' com sapos coaxando. O pântano é mais Brasil. O único problema do crash é que ele pode revitalizar os fascismos. E isso, naturalmente, poderá causar uma guerra total, na qual morreremos todos, derretidos, adubando o solo para novas espécies. Mas, já que o espetáculo da história humana foi esse vexame milenar em busca de poder e de esperanças vãs, também isso pode ser bom. O crash seria bom para acabar conosco, esta raça daninha que atrapalhou o livre curso da natureza. Logo, não se preocupe.
No vermelho - ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SP - 20/11
BRASÍLIA - Se os ministros têm rasgos de sinceridade e são os primeiros a reconhecer que as coisas não andam como deveriam, quem somos nós para discordar?
Miriam Belchior, do Planejamento, admitiu que atrasos são "a regra do jogo", enquanto apresentava um cronograma de obras prioritárias cheio de sinais verdes duvidosos. E José Eduardo Cardozo, da Justiça, já disse que as prisões são medievais -prefere morrer a ficar preso.
O Planejamento cuida do PAC, programa que mereceu incontáveis apresentações midiáticas e alavancou a candidatura Dilma Rousseff à Presidência. Já o Ministério da Justiça é responsável pelo sistema penitenciário e pela guarda de presos em condições humanas e dignas. E Belchior e Cardozo são do partido que completa dez anos no poder.
Suas falas não caíram no vazio. Neste mesmo espaço, pela ordem, Valdo Cruz, eu, Melchiades Filho e Fernando Rodrigues apontamos o descompasso entre a imagem de eficiência e a eficiência real do governo.
Exemplos: as vencedoras das licitações dos aeroportos tinham experiência, sei lá, no Butão e na Conchinchina; as novas concessões subiram no telhado; o programa dos portos encalhou; o mercado reclama de "quebra de contrato" na energia elétrica; o setor aéreo pinta e borda; os apagões são rotineiros; a Petrobras só dá más notícias.
Mas, apesar dessas e outras, o governo é muito bem avaliado desde o início e Dilma continua concorrendo com Lula em popularidade.
Para Gustavo Patu, um dos autores da reportagem de hoje sobre PAC e atrasos, há duas explicações para o descompasso entre imagem e realidade: o marketing excelente, herdado de Lula, e os dados de emprego, que são, de fato, muito bons.
A "gerentona" Dilma não deve se contentar só com isso. Tem de descobrir o que está errado. Um bom começo seria ouvir ou demitir os seus ministros -e não só gritar com eles.
BRASÍLIA - Se os ministros têm rasgos de sinceridade e são os primeiros a reconhecer que as coisas não andam como deveriam, quem somos nós para discordar?
Miriam Belchior, do Planejamento, admitiu que atrasos são "a regra do jogo", enquanto apresentava um cronograma de obras prioritárias cheio de sinais verdes duvidosos. E José Eduardo Cardozo, da Justiça, já disse que as prisões são medievais -prefere morrer a ficar preso.
O Planejamento cuida do PAC, programa que mereceu incontáveis apresentações midiáticas e alavancou a candidatura Dilma Rousseff à Presidência. Já o Ministério da Justiça é responsável pelo sistema penitenciário e pela guarda de presos em condições humanas e dignas. E Belchior e Cardozo são do partido que completa dez anos no poder.
Suas falas não caíram no vazio. Neste mesmo espaço, pela ordem, Valdo Cruz, eu, Melchiades Filho e Fernando Rodrigues apontamos o descompasso entre a imagem de eficiência e a eficiência real do governo.
Exemplos: as vencedoras das licitações dos aeroportos tinham experiência, sei lá, no Butão e na Conchinchina; as novas concessões subiram no telhado; o programa dos portos encalhou; o mercado reclama de "quebra de contrato" na energia elétrica; o setor aéreo pinta e borda; os apagões são rotineiros; a Petrobras só dá más notícias.
Mas, apesar dessas e outras, o governo é muito bem avaliado desde o início e Dilma continua concorrendo com Lula em popularidade.
Para Gustavo Patu, um dos autores da reportagem de hoje sobre PAC e atrasos, há duas explicações para o descompasso entre imagem e realidade: o marketing excelente, herdado de Lula, e os dados de emprego, que são, de fato, muito bons.
A "gerentona" Dilma não deve se contentar só com isso. Tem de descobrir o que está errado. Um bom começo seria ouvir ou demitir os seus ministros -e não só gritar com eles.
Inversão de valor - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 20/11
A nota oficial que o PT divulgou na quarta-feira passada para marcar posição sobre as decisões do Supremo Tribunal Federal no processo do mensalão incorpora como argumento central uma tese muito em voga.
A teoria segundo a qual o Brasil de agora em diante é uma terra sem lei, a República do guarda da esquina onde não há mais garantias legais e os direitos individuais foram todos para o espaço.
Empresários, banqueiros, políticos, advogados manifestam seus receios traçando um quadro de pré-barbárie jurídica. A nota do PT resume bem esse estado de espírito ao dizer que o tribunal apontou para "o fim do garantismo, o rebaixamento do direito de defesa, do avanço da noção de presunção de culpa em vez de inocência". É o que se ouve em toda parte.
Por essa ótica, bem melhor e "garantista" era aquele País que muito recentemente externava desconfiança plena na punição dos réus.
Não porque os considerasse inocentes - os dados de pesquisa mostravam convicção de culpa diante da narrativa feita pela acusação -, mas porque eram pessoas importantes, cidadãos até então tidos como fora do alcance da lei.
Nessa perspectiva, compartilhada por muita gente boa e até bem intencionada, segurança jurídica existia mesmo quando a referida quadrilha cometia os mais diversos atentados ao Código Penal.
Para registro de incoerência: no mesmo momento em que divulgou o documento acusando o STF de interpretar a lei de maneira única (ou seja, como exceção) para "atender à conveniência de condenar pessoas específicas e indiretamente atingir o partido", o presidente do PT, Rui Falcão, disse que o aspecto positivo do julgamento foi a demonstração de que "as instituições estão funcionamento legalmente".
Falcão não explicou como se coadunam os dois conceitos, mas vamos em frente.
Os adeptos da tese da exceção alegam agressão a todos os parâmetros enquanto os adeptos das decisões do Supremo como fator de avanço acreditam que esse julgamento servirá de exemplo em processos de crimes contra a administração pública.
Na opinião do ex-ministro Carlos Ayres Britto, isso depende. Há exageros de ambos os lados, conforme dizia na véspera de deixar a presidência e sua cadeira no Supremo.
Segundo ele, nada muda substancialmente porque o tribunal não inovou, "apenas decidiu de acordo com as exigências da causa".
O mesmo raciocínio se aplica em sentido oposto: "Se acontecer outro caso delituoso com as mesmas características centrais na ação 470, aí sim se pode considerar que esse julgamento servirá como parâmetro".
Noves fora, o melhor remédio para os que estão receosos é andar nos trilhos da lei.
Sem chance. A avaliação no Supremo é a de que os réus não terão sucesso nas duas vertentes de contestação às sentenças: o foro internacional e os embargos infringentes, que dão o direito de pedir revisão quando há quatro votos pela absolvição na decisão condenatória.
Em relação às cortes internacionais, porque estão cada vez mais rigorosas quanto ao tema da corrupção.
Já os embargos - em tese poderiam beneficiar 16 dos 25 condenados no processo -, a base para a rejeição está no fato de a Constituição de 1988 não ter abrigado esse instituto da Carta anterior.
Estão previstos no regimento do STF, mas não constam de nenhuma lei posterior à Constituinte.
Levantamento feito pela Fundação Getúlio Vargas e publicado pela Folha de S. Paulo mostra que, de lá para cá, dos 54 embargos infringentes apresentados no Supremo apenas um obteve sucesso na mudança da sentença.
Foi em 2003 no embargo a uma decisão tomada sete anos antes em ação direta de inconstitucionalidade contra ato do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho.
A nota oficial que o PT divulgou na quarta-feira passada para marcar posição sobre as decisões do Supremo Tribunal Federal no processo do mensalão incorpora como argumento central uma tese muito em voga.
A teoria segundo a qual o Brasil de agora em diante é uma terra sem lei, a República do guarda da esquina onde não há mais garantias legais e os direitos individuais foram todos para o espaço.
Empresários, banqueiros, políticos, advogados manifestam seus receios traçando um quadro de pré-barbárie jurídica. A nota do PT resume bem esse estado de espírito ao dizer que o tribunal apontou para "o fim do garantismo, o rebaixamento do direito de defesa, do avanço da noção de presunção de culpa em vez de inocência". É o que se ouve em toda parte.
Por essa ótica, bem melhor e "garantista" era aquele País que muito recentemente externava desconfiança plena na punição dos réus.
Não porque os considerasse inocentes - os dados de pesquisa mostravam convicção de culpa diante da narrativa feita pela acusação -, mas porque eram pessoas importantes, cidadãos até então tidos como fora do alcance da lei.
Nessa perspectiva, compartilhada por muita gente boa e até bem intencionada, segurança jurídica existia mesmo quando a referida quadrilha cometia os mais diversos atentados ao Código Penal.
Para registro de incoerência: no mesmo momento em que divulgou o documento acusando o STF de interpretar a lei de maneira única (ou seja, como exceção) para "atender à conveniência de condenar pessoas específicas e indiretamente atingir o partido", o presidente do PT, Rui Falcão, disse que o aspecto positivo do julgamento foi a demonstração de que "as instituições estão funcionamento legalmente".
Falcão não explicou como se coadunam os dois conceitos, mas vamos em frente.
Os adeptos da tese da exceção alegam agressão a todos os parâmetros enquanto os adeptos das decisões do Supremo como fator de avanço acreditam que esse julgamento servirá de exemplo em processos de crimes contra a administração pública.
Na opinião do ex-ministro Carlos Ayres Britto, isso depende. Há exageros de ambos os lados, conforme dizia na véspera de deixar a presidência e sua cadeira no Supremo.
Segundo ele, nada muda substancialmente porque o tribunal não inovou, "apenas decidiu de acordo com as exigências da causa".
O mesmo raciocínio se aplica em sentido oposto: "Se acontecer outro caso delituoso com as mesmas características centrais na ação 470, aí sim se pode considerar que esse julgamento servirá como parâmetro".
Noves fora, o melhor remédio para os que estão receosos é andar nos trilhos da lei.
Sem chance. A avaliação no Supremo é a de que os réus não terão sucesso nas duas vertentes de contestação às sentenças: o foro internacional e os embargos infringentes, que dão o direito de pedir revisão quando há quatro votos pela absolvição na decisão condenatória.
Em relação às cortes internacionais, porque estão cada vez mais rigorosas quanto ao tema da corrupção.
Já os embargos - em tese poderiam beneficiar 16 dos 25 condenados no processo -, a base para a rejeição está no fato de a Constituição de 1988 não ter abrigado esse instituto da Carta anterior.
Estão previstos no regimento do STF, mas não constam de nenhuma lei posterior à Constituinte.
Levantamento feito pela Fundação Getúlio Vargas e publicado pela Folha de S. Paulo mostra que, de lá para cá, dos 54 embargos infringentes apresentados no Supremo apenas um obteve sucesso na mudança da sentença.
Foi em 2003 no embargo a uma decisão tomada sete anos antes em ação direta de inconstitucionalidade contra ato do Conselho Superior do Ministério Público do Trabalho.
Um juiz na História - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 20/11
Quando retomar amanhã o julgamento do mensalão, o Supremo já não terá a presidi-lo o juiz que foi o responsável direto pela sua realização. Aposentado compulsoriamente aos 70 anos, Ayres Britto já deixou, porém, suas marcas não só neste que foi certamente o mais complexo da história recente do STF, mas também em outras decisões históricas como a derrubada da Lei de Imprensa dos tempos da ditadura, que, na sua opinião, foi, essa sim, a decisão mais importante da qual participou, por ter permitido a plenitude da liberdade de imprensa no país, inviabilizando qualquer tipo de censura.
“Quem quer que seja pode dizer o que quer que seja. Responde pelos excessos que cometer, mas não pode ser podado por antecipação.” Seu último ato como presidente do Conselho Nacional de Justiça foi criar uma comissão para acompanhar processos que tratam da liberdade de imprensa. O Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade fará uma estatística das decisões e acompanhará acusações que tratem diretamente do tema. “As relações de imprensa são da mais elevada estatura constitucional pelo seu umbilical vínculo com a democracia”, justificou. Pelo menos uma vez por ano, a comissão fará um encontro nacional para discutir o tema. Para Ayres Britto, “cortar esse cordão umbilical entre a democracia e a liberdade de imprensa é matar as duas.”
Britto também se posicionou favoravelmente ao aborto em casos de anencefalia e justificou seu voto com rasgos de poesia, como faz sempre que cabível: “Dar à luz a vida é dar vida e não dar a morte”. Ficou famosa sua frase sobre o órgão sexual no julgamento sobre união civil de homossexuais: “O órgão sexual é um ‘plus’, um bônus, um regalo da natureza. Não é um ônus, um peso, um estorvo, menos ainda uma reprimenda dos deuses”.
Na votação da Ficha Limpa, Ayres Britto definiu que existem três valores consagrados: a democracia, o meio ambiente equilibrado e a moralidade da vida pública. “Valores que todo povo que se preze consagra na sua experiência histórica.” Defendeu a tese de que a Constituição mandou considerar a vida pregressa do candidato, “que não pode estar imersa em nebulosidade no plano ético”, pois a palavra “candidatura” vem de “cândido”, “limpo”. Para ele, a Ficha Limpa ambiciona implantar “uma qualidade de vida política e acabar com uma cultura perniciosa”
Foi também o relator também do processo da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, onde vivem 18 mil índios das etnias Macuxi, Wapichana, Patamona, Ingaricó e Taurepang. Para ele, “ninguém conhece as entranhas do país, as fronteiras do Brasil, melhor do que os índios. É preciso inculcar neles aquilo para o que já têm predisposição, o sentimento de brasilidade, tratá-los como brasileiros que são".
No processo do mensalão, que ele viabilizou também pela mediação dos conflitos na Corte, o Ayres Britto preocupou-se, em seus votos, em unir a parte técnica com a defesa de valores democráticos: “Formação argentária, pecuniária, de maioria, com base na propina, no suborno e na corrupção é repudiada pela ordem jurídica brasileira”, disse ele sobre o mensalão. Para condenar por formação de quadrilha, ele baseou sua decisão no convencimento de que a paz pública foi afetada e que é preciso condenar os culpados para que a sociedade não perca a crença de que o Estado dará a resposta adequada.
"A paz pública é essa sensação coletiva em que o povo nutre a segurança em seu Estado. Dessa confiança coletiva no controle estatal é que me parece vir a paz pública”. Como presidente do STF, Ayres Britto teve ocasião de explicitar com bastante clareza o método que estava sendo utilizado durante o julgamento, rebatendo as críticas sobre os critérios utilizados: “(…) Prova direta, válida e obtida em juízo. Prova indireta ou indiciária ou circunstancial, colhida em inquéritos policiais, parlamentares e em processos administrativos abertos e concluídos em outros poderes públicos, como Instituto Nacional de Criminalística e o Banco Central da República”. (…) Provas circunstanciais indiretas, porém, conectadas com as provas diretas”
Se pegarmos seus votos no processo do mensalão e compararmos com outros, de igual importância para a consolidação da democracia, constataremos sempre a preocupação humanista a embasá-los.
Quando retomar amanhã o julgamento do mensalão, o Supremo já não terá a presidi-lo o juiz que foi o responsável direto pela sua realização. Aposentado compulsoriamente aos 70 anos, Ayres Britto já deixou, porém, suas marcas não só neste que foi certamente o mais complexo da história recente do STF, mas também em outras decisões históricas como a derrubada da Lei de Imprensa dos tempos da ditadura, que, na sua opinião, foi, essa sim, a decisão mais importante da qual participou, por ter permitido a plenitude da liberdade de imprensa no país, inviabilizando qualquer tipo de censura.
“Quem quer que seja pode dizer o que quer que seja. Responde pelos excessos que cometer, mas não pode ser podado por antecipação.” Seu último ato como presidente do Conselho Nacional de Justiça foi criar uma comissão para acompanhar processos que tratam da liberdade de imprensa. O Fórum Nacional do Poder Judiciário e Liberdade fará uma estatística das decisões e acompanhará acusações que tratem diretamente do tema. “As relações de imprensa são da mais elevada estatura constitucional pelo seu umbilical vínculo com a democracia”, justificou. Pelo menos uma vez por ano, a comissão fará um encontro nacional para discutir o tema. Para Ayres Britto, “cortar esse cordão umbilical entre a democracia e a liberdade de imprensa é matar as duas.”
Britto também se posicionou favoravelmente ao aborto em casos de anencefalia e justificou seu voto com rasgos de poesia, como faz sempre que cabível: “Dar à luz a vida é dar vida e não dar a morte”. Ficou famosa sua frase sobre o órgão sexual no julgamento sobre união civil de homossexuais: “O órgão sexual é um ‘plus’, um bônus, um regalo da natureza. Não é um ônus, um peso, um estorvo, menos ainda uma reprimenda dos deuses”.
Na votação da Ficha Limpa, Ayres Britto definiu que existem três valores consagrados: a democracia, o meio ambiente equilibrado e a moralidade da vida pública. “Valores que todo povo que se preze consagra na sua experiência histórica.” Defendeu a tese de que a Constituição mandou considerar a vida pregressa do candidato, “que não pode estar imersa em nebulosidade no plano ético”, pois a palavra “candidatura” vem de “cândido”, “limpo”. Para ele, a Ficha Limpa ambiciona implantar “uma qualidade de vida política e acabar com uma cultura perniciosa”
Foi também o relator também do processo da demarcação da reserva Raposa Serra do Sol, onde vivem 18 mil índios das etnias Macuxi, Wapichana, Patamona, Ingaricó e Taurepang. Para ele, “ninguém conhece as entranhas do país, as fronteiras do Brasil, melhor do que os índios. É preciso inculcar neles aquilo para o que já têm predisposição, o sentimento de brasilidade, tratá-los como brasileiros que são".
No processo do mensalão, que ele viabilizou também pela mediação dos conflitos na Corte, o Ayres Britto preocupou-se, em seus votos, em unir a parte técnica com a defesa de valores democráticos: “Formação argentária, pecuniária, de maioria, com base na propina, no suborno e na corrupção é repudiada pela ordem jurídica brasileira”, disse ele sobre o mensalão. Para condenar por formação de quadrilha, ele baseou sua decisão no convencimento de que a paz pública foi afetada e que é preciso condenar os culpados para que a sociedade não perca a crença de que o Estado dará a resposta adequada.
"A paz pública é essa sensação coletiva em que o povo nutre a segurança em seu Estado. Dessa confiança coletiva no controle estatal é que me parece vir a paz pública”. Como presidente do STF, Ayres Britto teve ocasião de explicitar com bastante clareza o método que estava sendo utilizado durante o julgamento, rebatendo as críticas sobre os critérios utilizados: “(…) Prova direta, válida e obtida em juízo. Prova indireta ou indiciária ou circunstancial, colhida em inquéritos policiais, parlamentares e em processos administrativos abertos e concluídos em outros poderes públicos, como Instituto Nacional de Criminalística e o Banco Central da República”. (…) Provas circunstanciais indiretas, porém, conectadas com as provas diretas”
Se pegarmos seus votos no processo do mensalão e compararmos com outros, de igual importância para a consolidação da democracia, constataremos sempre a preocupação humanista a embasá-los.
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