O Estado de S. Paulo - 17/02
Na Bancoop, os dirigentes pintaram e bordaram, deixando centenas de famílias a ver navios e tríplex no Guarujá. No Petros (Petrobrás), no Postalis (Correios), na Previ (BB) e na Funcef (CEF), os presidentes e diretores também fizeram a maior farra, deixando milhares de funcionários com uma aposentadoria incerta e uma dívida já estimada em R$ 46 bilhões.
O que uma cooperativa de bancários de São Paulo tem a ver com os fundos de pensão das principais estatais brasileiras? Todas viveram o mesmo aparelhamento, com o mesmo modo de fazer as coisas e personagens que têm origens parecidas: os presidentes da Bancoop e dos fundos de pensão eram do PT, ou indicados pelo partido de Lula, e fizeram carreira em sindicatos. Exemplo: João Vaccari Neto, da Bancoop, ex-tesoureiro do PT e hoje preso na Lava Jato.
É preciso reconstituir essa história e mostrar o que há de tão intrigantemente igual na escolha dos dirigentes, na origem sindical e partidária de cada um, na ausência de limites entre público e privado, na forma invertida de tirar da maioria para favorecer a minoria do poder. Como lembrou o chefe da Casa Civil, o também petista Jaques Wagner, “quem nunca comeu melado, quando come...” A turma encheu a pança.
Há muitos detalhes cruéis nessa trama, mas o principal deles é que os governos passam, os partidos passam, os presidentes dos fundos de pensão passam, mas as vítimas ficam e se tornam vítimas para sempre. Aí, entra uma curiosidade, resvalando para uma cobrança: como tudo isso pôde acontecer, durante tanto tempo, atingindo tanta gente, prejudicando tantas instituições, e ninguém meteu a boca no trombone?
Funcionários do Banco do Brasil, da Petrobrás, dos Correios, da Caixa Econômica Federal são historicamente reconhecidos e admirados por vestirem a camisa e defenderem suas instituições. Por que, depois da posse de Luiz Inácio Lula da Silva, eles passaram a também não ver, não ouvir, não saber e não falar? Um mistério.
Vejamos a Petrobrás. O desastre e o escândalo que marcaram para sempre a história da maior empresa brasileira refletiram diretamente sobre a gestão do fundo de pensão dos funcionários, desenrolando-se dia após dia, semana após semana, anos após anos, à luz do sol, envolvendo bilhões de reais, dólares, euros. E não havia um só diretor, gerente, engenheiro, secretária, telefonista, garçom, servente, motorista, para defender a companhia e impedir que o Titanic afundasse?
A bem da verdade, registro aqui que, em outubro de 2011, dois anos e meio antes do início da Lava Jato, recebi o e-mail de um engenheiro da Petrobrás que, obviamente, assinava com um pseudônimo, “Miamoto Kojuro”: “Causa espanto o que vem acontecendo nas obras de expansão das refinarias e de construção das novas, na verdade, em praticamente todos os empreendimentos que levam o nome Petrobrás”.
Segundo esse engenheiro, “se a corrupção no Ministério dos Transportes chocou a opinião pública, levando a uma pseudo faxina do governo, motivada por denúncias da imprensa, o que acontece na Petrobrás excede em muito as irregularidades dos Transportes”. E acrescentava algo que o juiz Sérgio Moro agora diz claramente: “Notadamente empresas doadoras de campanha para o PT são bem aquinhoadas na Petrobrás. (...) Mesmo que orcem as obras baixo, elas nunca perdem dinheiro mediante os mais diversos expedientes”.
“Kojuro”, se você estiver me lendo, entre em contato, por favor! Aliás, senhores funcionários da Petrobrás e da Petros, do BB e da Previ, da ECT e do Postalis, da CEF e da Funcef, é hora de falar. Além das suas instituições, os atingidos são o País e cada um de vocês. Como ensinou Martin Luther King Jr. (1929-1968), o pior não é o grito dos violentos, corruptos, desonestos e sem caráter. “O que preocupa é o silêncio dos bons.”
GLOBO - 17/02
Vivemos uma queda que ainda não chegou ao fim e que muito provavelmente será a pior recessão da nossa história. No biênio 2015- 2016, o PIB está contraindo algo em torno de 7,7%. As vendas do varejo ampliado caíram 8,6% no ano passado, segundo o IBGE divulgou ontem. Mesmo assim, como tudo na economia, há dois lados nesta moeda. E da forma mais amarga possível está sendo feito um ajuste.
Um dos lados é a coleção dos efeitos que se pode chamar de positivos da queda do consumo, como a redução do ritmo da inflação, o afastamento de riscos, como o apagão, e a melhora externa. Não serve de consolo. Todos os bons resultados poderiam ser conseguidos com boa administração da política econômica. A recessão é sempre um momento doloroso, mas é nela que o diretor do Banco Central Altamir Lopes se baseia para dizer que a inflação pode cair mais do que o mercado está calculando e ficar em 6,5%. Segundo ele, a recessão permitirá que a taxa de 2016 fique no teto da meta. A previsão das instituições financeiras, ouvidas pelo Boletim Focus, está acima de 7,5%.
É triste a situação de esperar que a má notícia traga a boa, mas é isso que tem acontecido. Houve uma redução forte do consumo de energia provocada pela recessão, que derrubou a produção industrial, e pelo tarifaço, que reduziu a demanda das famílias. Isso fez com que o país superasse o risco do apagão. O governo se vangloria de ter evitado o pior, mas não foi por gerenciar bem a crise. Foi decorrência da maior queda da produção industrial da série histórica e do corte no consumo familiar. O certo teria sido a presidente Dilma Rousseff admitir em 2013 que errara ao baixar a tarifa em 2012. Isso permitiria uma correção mais suave e uma adaptação ao período de baixo nível de chuvas. A correção foi adiada por razões eleitorais. Por isso, e só por isso, o país foi atingido pelo tarifaço de 2015.
O ajuste externo também é resultado em parte do encolhimento da economia brasileira. A queda da importação é maior do que a diminuição da exportação, e o superávit comercial nasceu por disso. As importações de petróleo foram reduzidas como resultado do petróleo reequilibrando a balança setorial, que estava com um rombo explosivo.
Não precisávamos estar na situação de contar com a recessão para fazer o trabalho de reduzir um pouco a pressão inflacionária, diminuir o consumo de energia e reequilibrar as contas externas. Tudo poderia ter sido feito pela forma correta. As tarifas de energia não deveriam ter servido para uma demagogia eleitoreira, os preços dos combustíveis não deveriam ter ficado defasados, quando o petróleo estava subindo para além de US$ 100. Se o governo não tivesse cometido esses erros, a Petrobras não teria tido o prejuízo calculado pelos especialistas entre U$ 50 bilhões a U$ 60 bilhões importando combustíveis a preços mais altos do que os que podia vender no mercado interno. As empresas distribuidoras de energia não teriam enfrentado o desequilíbrio financeiro que as fez tomar empréstimos bancários para cobrir dificuldades de caixa.
Hoje, o país poderia aproveitar a onda deflacionária na área de energia, que reduziu a inflação em todos os países do mundo. Pelos erros do passado, o mundo inteiro está com deflação no setor energético, pela queda dos preços do petróleo, mas só o Brasil tem justamente na energia o mais importante fator a elevar a inflação.
A alta de preços agravou a recessão, ao tirar poder de compra das famílias e reduzir a confiança para os investimentos dos empresários. E não é garantido que a queda do PIB reduza a pressão inflacionária. O índice está tão alto que qualquer choque que ocorra, qualquer piora das expectativas, qualquer nova desvalorização cambial vai continuar mantendo a inflação elevada.
O mundo estava ajudando nos últimos anos com a economia americana se recuperando, a Europa saindo da crise e a China crescendo. Houve uma piora rápida das expectativas em relação ao cenário mundial. Se o Brasil piorou quando o mundo estava melhorando, o que acontecerá agora que a situação se agrava aqui e fica mais instável nas principais economias do mundo?
A recessão acaba corrigindo alguns desequilíbrios, mas é a pior forma de ajustar uma economia.
O ESTADO DE S. PAULO - 17/02
De acordo com relato de seus companheiros, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva fez um desabafo na reunião do conselho político do PT: “Não aguento mais falar disso”. Não aguenta? Diz como se alguma coisa estivesse falando a respeito das quatro investigações das quais é alvo no Ministério Público e na Polícia Federal.
Na realidade nua e muito crua o que ele não suporta é ser questionado por correligionários que lhe pedem uma orientação sobre como enfrentar o assunto perante a sociedade. Lula (agora e sempre) quer apenas que o defendam. O problema é que não lhes fornece argumentos consistentes e suficientes para tal. Sendo assim, os pobres fiéis não têm alternativa: vestem a saia-justa e deixam que as batatas quentes lhes queimem as mãos, pagando o preço do constrangimento público.
Ocorreu com a presidente Dilma Rousseff, com o presidente do PT, Rui Falcão, com os ministros da Casa Civil e da Justiça, para citar só os de patente mais alta. Constrangida entre o dever de ofício petista e as obrigações de chefe de Estado, Dilma equilibrou-se nessa corda bamba dizendo que o antecessor é vítima de “grande injustiça”. Qual violação de direitos mesmo? A presidente não pode detalhar sem incorrer no risco de desqualificar o trabalho das instituições do País a que comanda.
Em situação embaraçosa semelhante viram-se envolvidos os ministros Jaques Wagner (Casa Civil) e José Eduardo Cardozo (Justiça). À falta de argumentos objetivos, pronunciaram-se como se acabassem de descobrir a pólvora. Wagner apontou a existência de uma “caçada” por comprovações do envolvimento de Lula em procedimentos ilícitos – criminal e eticamente falando. Já José Eduardo Cardozo constatou o “interesse” da oposição em macular a imagem do líder petista.
Limitaram-se, ambos, a fazer cair chuva no molhado. Tal seria se à oposição interessasse endeusar a figura do adversário que tanto a demonizou enquanto estava com cacife alto. Quanto à referida “caça”, o que existe é a busca por elementos de prova por parte do MP, da PF e do Poder Judiciário na estrita observância do dever de esclarecer se as suspeitas em torno de Lula e companhia são verdadeiras ou falsas, se ele – na condição de beneficiário maior – tinha ou não o domínio sobre os fatos infratores.
Perdido nesse espaço de pouca luz e muitas sombras esteve também o presidente do PT, Rui Falcão, que anunciou a discussão sobre a situação de Lula como pauta principal do encontro do conselho do partido, para ser logo desmentido pelo chefe, indisposto que estava para discutir “questões pessoais” naquele encontro. A pauta, por escolha dele, foi o governo da sucessora.
E o conteúdo, claro, as agruras pelas quais não se sente minimamente responsável. “Se persistir a crise, o povo não defenderá o governo”, ponderou no intuito evidente de desviar o debate e se postar no papel daquele que soluciona, quando, hoje, é o que produz problemas.
É de se perguntar até quando os petistas vão achar interessante (e, sobretudo, producente) celebrar o comandante que só pensa em si, na hora do naufrágio, deixa cada um por si.
Falso brilhante. A liberação de ministros e secretários por parte de presidente e governadores, para assumir os mandatos parlamentares e votar na eleição da liderança na bancada de partidos não deixa de ser uma fraude.
Eles votam, elegem quem seus “donos” determinam, voltam para suas atividades e não participam como integrantes de fato do grupo de deputados representantes dos eleitores.
FOLHA DE SP - 17/02
Contrariamente ao anunciado poucas horas antes, nada se deliberou na reunião do Conselho Político do PT a respeito das acusações envolvendo o ex-presidente Lula e as empreiteiras OAS e Odebrecht.
Pelo menos, foi o que afirmou o presidente do partido, Rui Falcão, ao fim do encontro realizado nesta segunda-feira (15) em São Paulo.
Talvez não houvesse mesmo grandes explicações a dar sobre o sítio de Atibaia e o tríplex do Guarujá. Falcão limitou-se a negar fundamento às acusações.
Argumentou que o sítio não é formalmente propriedade de Lula, sem abordar a questão, entretanto inevitável, de quem teria financiado as reformas na propriedade, e por que teriam duas grandes empresas de obras públicas interesse em prestar gentilezas desse tipo.
Marco Aurélio Garcia, assessor da Presidência, teve atitude mais amena, em entrevista à Folha antes da reunião. "Se formos falar desse tríplex, ele é bem fubango, não é?", perguntou; "considero meu apartamento melhor".
Concordando ou não com esse julgamento, o fato é que os demais membros do Conselho Político teriam, portanto, segundo a versão oficial, discutido assuntos mais elevados do que uma simples cobertura no Guarujá, e não tão prosaicos quanto pescarias e passeios de pedalinho.
Tratou-se, assim, da necessidade de um "plano nacional de emergência" para responder à crise econômica, propondo alternativas ao receituário "neoliberal".
As dificuldades do PT, nessa seara, tendem a ser consideráveis do ponto de vista político. Apesar das próprias relutâncias, o governo Dilma Rousseff tem insistido na necessidade de cortar de gastos, reformar a Previdência e retomar a cobrança da famigerada CPMF.
Ao mesmo tempo em que defende a presidente, o partido busca todavia afastar-se do pouco que a atual administração ainda mantém de acertado em seus caminhos.
Na defesa do ex-presidente, não se esconde o mal-estar: o apartamento é mixuruca. Aliás nunca foi de Lula. Mais ainda, favores como os das empreiteiras são normais, como sugeriu o ex-ministro Gilberto Carvalho recentemente.
Para utilizar uma expressão popular, é como se o partido estivesse órfão de pai e mãe: Lula e Dilma não são mais o que eram, e o "plano de emergência" para a economia talvez valha tanto quanto as explicações sobre Atibaia.
Elabore-se algum arrazoado, jurídico ou financeiro, para ganhar tempo. Contabilizem-se os votos que já foram perdidos de qualquer modo, e que o resto se arranje até 2018. A tática é bem "fubanga", seja lá o que isso signifique, mas é o que o PT tem a oferecer.
FOLHA DE SP - 17/02
Sou repetitivo. Há, confesso, temas que recorrem neste espaço bem mais que gostaria, mas, mesmo admitindo minhas obsessões, o problema maior é com o país, que insiste em ser ainda mais repetitivo do que eu.
Veja agora o pleito de governadores por mais uma rodada de renegociação de suas dívidas com a União. Desde que o governo federal assumiu as dívidas estaduais, na segunda metade dos anos 1990, governadores (e também prefeitos) vêm brigando para não pagar o que devem. O que ocorre agora não é diferente, exceto que, desta vez, parece que irão vencer, com consequências potencialmente desastrosas para as finanças públicas.
A narrativa é conhecida: como as dívidas com o governo federal são tipicamente indexadas ao IGP, pagando ainda uma taxa de juros elevada, governadores reclamam que se tornaram impagáveis, em geral comparando a dívida anos atrás com a atual. Por exemplo, o conjunto das dívidas interna e externa dos Estados atingia R$ 216 bilhões em dezembro de 2001; já em dezembro de 2015 esse valor havia subido para R$ 646 bilhões, praticamente três vezes maior do que em 2001 e, portanto, impagável.
Ou não. Quem costuma apresentar os números dessa forma espertamente deixa de mencionar que o PIB e as receitas estaduais cresceram no período, pela força combinada da inflação e da expansão real da atividade econômica. O PIB nominal (sem a correção pela inflação) aumentou 4,5 vezes, praticamente a mesma magnitude de crescimento das receitas, seja pelo lado da arrecadação, seja pelas transferências federais.
Assim a dívida estadual –que era equivalente a 15,5% do PIB em 2001– caiu para 11% do PIB em 2015. Da mesma forma, a dívida equivalia a 1,5 ano de receitas em 2001, caindo para 1 ano em 2015.
Isso dito, a comparação acima (2015 contra 2001) não captura a piora observada a partir de meados de 2014, quando a dívida estadual saiu de 9% do PIB para os atuais 11% do PIB. O notável, porém, é que esse aumento não resultou das dívidas reestruturadas nos anos 1990, isto é, do que é devido ao governo federal, mas principalmente de outras duas modalidades: a dívida com bancos locais (+0,6% do PIB) e dívida externa (+1,0%), esta última em parte impulsionada pela valorização do dólar no período.
Posto de outra forma, o aumento observado nos últimos 18 meses não parece ter resultado das regras associadas à dívida com o governo federal, mas da assunção de novas dívidas, devidamente autorizadas pelos (ir)responsáveis de plantão.
Embora, ao menos em tese, Estados possam ter incorrido em novas dívidas para pagar à União, na prática esse pagamento se manteve constante como proporção da receita líquida dos Estados, sugerindo que o endividamento adicional ocorreu por outros motivos, a saber, gastos mais altos, em especial associados ao funcionalismo. Em alguns casos as perspectivas de receitas mais elevadas, por exemplo, royalties da exploração de petróleo, induziram governadores a gastar por conta, contando com o proverbial ovo já na galinha.
Apesar do comportamento gastão, o governo federal agora acena com a possibilidade de novamente resgatar os pródigos, gerando incentivos para mais irresponsabilidade à frente. E mais uma coluna apontando os erros dessa política...
ESTADÃO - 17/02
O PT sofre uma afecção grave, cujo sintoma é a tendência à alienação da realidade, substituída pela visão de um mundo paralelo que melhor se conforma a seus anseios e conveniências. Uma demonstração contundente desse comportamento mórbido foi a reunião de um tal “conselho consultivo” da presidência do PT realizada na manhã de segunda-feira num hotel em São Paulo. Lula e Rui Falcão, presidente nacional da legenda, não chegaram exatamente, pelo que se apurou, a consultar os consultores sobre nada, mas explicaram tudo em que devem acreditar a respeito dos problemas políticos e econômicos que o Brasil enfrenta, e como resolvê-los.
Fora do roteiro previamente imaginado por Falcão para o encontro ficou apenas a questão da “tarefa muito especial” da “montagem de uma poderosa bateria de ações, recursos, debates e mobilizações de solidariedade a Lula”, vítima da “escalada de ataques” da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da “mídia golpista”. Mas Falcão, que anunciara esse tema da pauta uma hora antes do encontro, não deve ter consultado previamente o chefe, pois logo após a reunião se desmentiu: “Isso não ocorreu. Isso não foi mencionado. Isso não estava na pauta”. De acordo com participantes do encontro, Lula foi categórico sobre esse assunto: “Não aguento mais falar disso”. Reação tipicamente nervosa, reveladora de um quadro de óbvia disfunção. Afinal, ele não consegue dar explicações razoáveis e consistentes a respeito do sítio de Atibaia que está à sua disposição – e por isso se exaspera.
Mas tem imaginação para ditar cátedra sobre como resolver a crise econômica – embora sobre a crise política e, sobretudo, moral em que a tigrada mergulhou o País ele prefira nada falar. Chegou até a dar um prazo para que o governo de sua pupila Dilma Rousseff comece a apresentar resultados positivos na economia: o fim deste semestre. Se isso não acontecer, previu o Oráculo petista, a partir do segundo semestre os indicadores econômicos e sociais, que avançaram durante sua gestão, poderão regredir aos índices do final do governo FHC: “Aí não vai ter povo para defender”.
Sobre a questão econômica foi apresentado durante a reunião um documento, obviamente sacramentado por Lula, que cobra do governo a adoção de medidas para a retomada do crescimento econômico. Os termos desse documento são um magnífico exemplo do voluntarismo petista, que parte do pressuposto de que tudo o que precisa ser feito é óbvio e depende exclusivamente de vontade política. Ou seja, se até agora Dilma Rousseff não implementou essas medidas foi porque não quis.
Afirma o documento petista: “Não se pode aguardar mais para inaugurar medidas que retomem o crescimento econômico sustentável, com inclusão social, geração de empregos, distribuição de renda, controle da inflação, melhoria dos serviços públicos, investimentos em infraestrutura”. Tudo muito simples e fácil. Afinal, quem não é a favor de tudo isso, e ainda da paz mundial, da descoberta da cura do câncer, do extermínio do Aedes aegypti, da extinção da fome no planeta, de fins de semana ensolarados...
A triste realidade, que a morbidez em estado avançado impede os petistas de enxergar, é que durante os oito anos de Lula nada foi feito de concreto para estimular e garantir um “crescimento econômico sustentável”. Em vez disso, torrou-se o dinheiro público, por exemplo, em programas socialmente necessários, mas equivocados, porque sem o amparo de medidas econômicas que lhes garantissem sustentabilidade no longo prazo. É claro, e até Lula sabe disso hoje, que o primeiro mandato de Dilma foi catastrófico porque, embalado pelo voluntarismo estatista da “nova matriz econômica”, foi incapaz de criar mecanismos de proteção da economia brasileira, de modo especial a produção industrial, das ameaças de uma conjuntura adversa. O resultado dessa incúria se colhe agora. Mas o lulopetismo, obcecado pela ideia de sobreviver numa realidade paralela, é incapaz de fazer autocrítica e propor medidas renovadoras, reestruturantes, para o governo que elegeu. Insiste em continuar tocando música para os ouvidos de eleitores que, na verdade, já perdeu.
ESTADO DE MINAS - 17/02
Dilma acha que o crescimento da economia depende de crédito público subsidiado a empresários e empresas estatais, além de crédito ao consumidor, já exausto de prestações a pagar. Nem uma coisa nem outra. As empresas estatais são ineficientes e corruptas, como estamos a ver. "O que é do Estado não é de ninguém" no dizer dos anarquistas, movimento político que desapareceu depois de Kropotkin (forte na Rússia, na Espanha e em São Paulo do início do século 20).
Um país com uma taxa de juros básica de 14,25%, que é o preço que o Tesouro brasileiro paga para se endividar, tomando dinheiro do investidor financeiro, não deve obrigar bancos oficiais a emprestar dinheiro aos empreendedores a 6% ou 7% (a diferença aumenta a dívida pública bruta, pois a conta do subsídio é bancada pelo Tesouro). Vejam os EUA, os países da UE, Japão e China. A taxa básica é zero, um pouco acima de zero ou mesmo negativa. É como estimulam as pessoas a gastar na compra de bens e serviços, reanimando a produção, em vez de investirem no mercado financeiro, cujas aplicações rendem pouco (política monetária).
Outra coisa é a política fiscal, que segue de perto a economia doméstica. Não se deve gastar mais do que se arrecada com os tributos, que são, digamos assim, o "salário" dos governos. É claro que, além do seu "salário", o Tesouro pode pegar dinheiro emprestado no país e no exterior ou de estrangeiros, como vimos há pouco. O que não se pode é aumentar a dívida pública, que tem que ser paga sob pena de, não o fazendo, perder eficácia e confiança. Ela acaba de alcançar 70% do PIB e segue crescendo. Até quando?
O Brasil está pelo avesso. Taxas altas de juros são usadas para atrair investidores e esfriar o consumo aquecido de bens e serviços, que geram inflação de preços (inflação de demanda). Mas, entre nós, o consumo e a renda estão em baixa, recessão.
Existe inflação por causa de dois fatores: indexação de salários, de contratos, do funcionalismo e aumento do preço unitário do bem ou serviço para compensar a perda das vendas (o normal é ganhar no volume, na escala, e não por unidade de produto ou serviço vendido). Os agentes econômicos defendem a sua margem de lucro ou quebram, daí o paradoxo nacional de inflação com recessão, pois a tributação é muito alta (inflação de custos). Onde já se viu um país em recessão com inflação alta? É o Brasil (com suas jabuticabas).
Acontece o paradoxo em razão de o governo aumentar, por decreto, o salário mínimo acima da produtividade do trabalho, que, por sua vez, é indexador de outras obrigações: pensões, aposentadorias, etc. Além disso, o governo resiste a liquidar de vez com a "cultura da indexação": aluguéis, contratos civis e comerciais e outros preços automaticamente reajustados baseados em índices, como o IGPM, IPCA etc. "Carry over", um arrasto contínuo (inflação inercial, retroalimentada). Acresçam-se a essa estupidez os altos custos dos tributos (37% do PIB), a incidir sobre a folha de pagamento e lucro bruto antes de deduzir as despesas incorridas para obtê-lo. Tributo é custo como os salários e energia elétrica. A nossa inflação é de custos, e não de demanda.
O governo pendura sobre o faturamento diversas contribuições, PIS, Cofins, e sobre a folha etc. Sobre o lucro líquido, faz incidir o imposto sobre a renda e a CSSL (um adicional do Imposto de Renda), sem contar o IPI e o ICMS. Ponha tudo isso no liquidificador e obtenha o suco do preço inflado pela tributação sobre os custos de produção e circulação de bens e serviços.
As receitas são simples: diminuir a carga tributária sobre a produção (reforma tributária). O Departamento Nacional de Produção Mineral só tem quatro fiscais em Minas, mas cobra taxas e licenças por qualquer ato do particular minerador. Deixar que patrões e empregados exercitem a livre negociação (reforma da CLT caduca), liberalizar, enfim, a economia, privatizar tudo. Todos os preços devem ser negociados, e não indexados (livre mercado).
Desde a Constituição de 1988, de viés assistencialista, os orçamentos ficaram vinculados a determinadas despesas. Temos que desvincular. Quem vincula são o Executivo e o Legislativo. Acudir em cada momento o que merece ser acudido. A fórmula rígida da Constituição não resolveu problema nenhum. Logo deve ser mudada.
Se, em cima disso, há governos incompetentes como o de Dilma, a desgraça está feita. Em vez de investir em infraestrutura, o PT gasta fortunas para transpor as águas minguadas do São Francisco e dá bolsa às famílias das "facções criminosas", por filho. Até o bônus demográfico está passando: nascem poucos e outros pararam de morrer, daí as despesas crescentes com aposentadorias e pensões. Quando podia, Lula não tocou na Previdência. Dilma o fará? Há que planejar. Desde quando o PT ouviu falar nessa palavra?