quarta-feira, maio 13, 2020

Exames de Bolsonaro: resultado vale nota R$ 3. Questão legal era relevante - REINALDO AZEVEDO

UOL - 13/05


Quanto valem os exames apresentados por Jair Bolsonaro? Uma nota de R$ 3. Com todas as vênias ao laboratório Sabin.


Nem quero perder tempo debatendo se são falsos ou verdadeiros os resultados dos exames de Jair Bolsonaro. Vejam os textos que escrevi a respeito. O que sempre me interessou foi a questão legal. E em tese. Tem ou não um presidente da República, nas circunstâncias dadas, a obrigação de apresentar o exame, dado o que está escrito na Constituição e na Lei de Acesso à Informação, a 12.527? Eu nem pensava no Jair. Até gostava de pensar que não era ele...

Uma juíza federal, o TRF-3 e eu achamos que sim. João Otávio de Noronha, presidente do STJ, que não. Acho que os argumentos em favor do "sim" se ancoram na lei. Os argumentos em favor do "não", para mim, têm cara de feitiçaria jurídica. Isso me interessava.

O resultado em si? Com mais um pouco de vênias, digo: não sustento que os resultados são falsos. Digo apenas que me reservo o direito de dizer que, em si, não passam de papelada. De toda sorte, fazendo de conta que valem por um fato, então o GSI está com um problema. Já chego lá.

NOMES FALSOS

Jair Messias Bolsonaro vive seus dias de militante de esquerda na clandestinidade. Tem codinome. Mais de um: pode ser Airton Guedes ou Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz. Dois dos exames com resultado negativo para detecção de coronavírus aparecem com esses respectivos nomes. Há um terceiro em que o titular é Zé Ninguém, um sem-nome.

"Olá, Airton e Rafael! Eu me chamo Fausto".

Era o meu nome num grupo de esquerda clandestino, quando eu era quase criança. Sabem como é: não dava pra dar mole em 1977. O AI-5 só seria extinto no ano seguinte. Manuel Fiel Filho tinha sido assassinado no ano anterior, no DOI-CODI. Uma das "Marias" que choram na música "O Bêbado e o Equilibrista", de Aldir Blanc e João Bosco é mulher de Fiel Filho. Em dezembro de 1976, o Exército havia matado três dirigentes do Comitê Central do PCdoB, um sob tortura — João Batista Franco Drummond — e dois outros numa incursão ao imóvel da Rua Pio XI, nº 767: Ângelo Arroyo e Pedro Pomar. Sem chance de defesa. Não era para prender. Era para matar.

Os tempos ainda eram sombrios. Até dava para dizer: "Oi, eu sou Jair Parmito, o Cavalão". Mas sou "Reinaldo de tal" ainda comportava certo risco, como se vê — embora eu só fosse um molecote. Mesmo assim, fui importunado pelo Dops. Mas deixemos isso pra lá.

Jair agora tem codinome no laboratório Sabin...

O CPF e o RG são dele, mas os nomes são obviamente falsos. Não sei a quantos o laboratório presta esse favor. Há uma norma interna só para "otoridades" ou se pode esconder a identidade de quem faz exame também de artistas e celebridades da Internet, por exemplo.

Fizeram com o presidente o que meu laboratório faz comigo, embora a moça que colhe meu sangue me conheça — a saber: ela pede o RG, confere a foto com a minha cara e o número com a pulseira do meu braço e com o registro do frasco?

Entendo que, sendo possível pôr um nome qualquer no exame que dizem ser do presidente, também a amostra que foi entregue para teste passou por controles tais de, digamos, segurança, que, a rigor, tudo é possível. No laboratório em que faço exames de sangue não há menos possibilidade de isso acontecer. Tudo começa pelo CPF. Depois vêm os outros controles de identidade.

Com Jair, como se nota, um mesmo CPF, no laboratório, pode remeter a dois nomes. E finalmente se pode fazer um teste para um tal "Zero Cinco"...

Convenham: tudo é um pouco ridículo. Vá lá: muito ridículo!

GSI

Aliás, quem está com um problema é o GSI (Gabinete da Segurança Institucional), sob comando do general Augusto Heleno. Segundo a 13.844, no "Item 1" da "Alínea a" do Inciso VI do Artigo 10 da referida lei, cumpre ao GSI fazer a segurança do presidente.

Se ele é mesmo virgem em matéria de coronavírus, então nem desenvolveu anticorpos contra a doença e, pois, não deveria se expor como se expõe. Não diz respeito à sua segurança como indivíduo, mas à segurança do presidente da República como encarnação do Poder Executivo.

Numa República, o Estado garante a segurança de quem ocupa o cargo, não do indivíduo. Logo, Bolsonaro não deveria se expor.

Mas, convenham, se o presidente pode ser Airton Guedes, Rafael Augusto ou Zero Cinco, então tudo é permitido.

Esse resultado não tem a menor importância. É uma pantomima. A questão legal era relevante. E, nesse caso, prevaleceu a lei. Ainda que o exame oferecido tenha a seriedade do que se chamava antigamente "papel de pão"...

Agenda de outono - LEANDRO KARNAL

ESTADÃO - 13/05

Uma boa alternativa da estação: ler mais. Ler é esperança pura!

O mês de maio tem inúmeras qualidades. O céu é claro com frequência, as temperaturas não estão elevadíssimas e escasseiam frios rigorosos. Algumas despesas fortes (IPVA, IPTU, Imposto de Renda, matrícula, material escolar, etc.) já foram pagas ou, se parceladas, deixaram de causar impacto psicológico da novidade. Um elemento subjetivo importante: estamos mais ou menos equidistantes das festas que dissolvem decisões de reflexão ou trabalho: Natal, Ano-Novo e carnaval. Mesmo a Páscoa, mais neutra, já passou. Temperaturas convidativas, depressão financeira parcialmente superada e sem blocos passando ou cheiro de panetone no ar, floresce uma boa alternativa de outono: ler mais.

Ler é uma decisão e insistir em textos pode produzir um hábito. Para voar no mundo das letras, é importante saber a força das asas de cada um. Ambições elevadas demais podem estragar o projeto. Metas baixas induzem ao tédio. Se o seu desejo/hábito por livros for pequeno, comece de forma mais simples. Estabeleça uma meta menos ousada: cinco páginas por dia, por exemplo. Mantenha-se firme e, em uma semana, você pode ter conseguido ler dois contos ou um pequeno romance. Se os próximos meses confirmarem que você atende bem ao estipulado, vá aumentando mensalmente. Como eu digo aos alunos, decisões ambiciosas demais nos aproximam dos atletas amadores da prova de São Silvestre: saem em disparada e, poucos quarteirões após a largada, estão sentados no meio-fio, exaustos e fora da disputa. Corredores profissionais sabem da importância do ritmo constante. Fora as leituras obrigatórias de cada ramo, um ritmo acima do fraco e bem abaixo do perfeito seria de dois livros por mês. Esse “combustível” permite que você reflita, atualize e mantenha seu cérebro funcionando. Como eu disse, é abaixo do perfeito, mas quem trabalha com a ideia da perfeição nunca lê e, provavelmente, jamais casará.

Um exemplo banal de como a leitura muda nossa visão de mundo. As pessoas comentam em casa ou no bar que o tempo está passando rápido demais? Dizem coisas de senso comum como “daqui a pouco estaremos no final do ano novamente”? Bem, Allan Burdick fez uma investigação sobre o tema em Por Que o Tempo Voa (São Paulo, ed. Todavia, 2020). A escrita é excelente (tradução de Paulo Geiger) e sua noção sobre o tempo e sua aceleração (e seu uso prático) darão uma reviravolta em seu entendimento do assunto. Aqui você começa a se separar do senso comum e a perceber argumentos muito inovadores para sua cabeça e, eventualmente, suas conversas.

Santo Agostinho citou, Shakespeare conheceu e quase todos os intelectuais clássicos leram. Refiro-me a um livro fundamental: O Asno de Ouro, de Apuleio. A nova edição bilíngue da 34 está ótima (tradução, prefácio e notas de Ruth Guimarães, apresentação e notas adicionais de Adriane da Silva Duarte). O autor (segundo século da nossa era) nasceu na região romanizada da atual Argélia. Culto, foi influenciado/guiado pela obra de Ovídio, As Metamorfoses. O modelo é tão forte que a obra, originalmente, apresentava o mesmo título. Foi um autor cristão, o já citado Agostinho, que batizou a obra de Asinus Aureus (O Asno de Ouro). O texto picaresco conheceu enorme difusão, dos já citados ao nosso Machado de Assis, de Monteiro Lobato a Ricardo Azevedo, como nos informa Adriane da Silva Duarte na apresentação. É uma obra seminal e de referência.

Por que ler um clássico? Porque ele transforma nossa maneira de pensar, fornece vocabulário, mostra raízes, disseca influências e faz um upgrade poderoso na caixa encefálica. Lembre-se ao encarar o Asno de Ouro: não é um best-seller que facilite tudo ao leitor para cativar audiência.

Um livro que ganhei e gostei muito, ainda sem tradução: Life 3.0 – Being Human in the Age of Artificial Intelligence (Penguin, 2017). Max Tegmark passa por temas como a definição da inteligência e uma análise dos próximos... dez mil anos. O livro abre a imaginação, analisa um mundo novo e sempre admirável no que o futuro apresenta de terrível e fascinante. Talvez muitos gostem de uma questão em particular: como ficarão os empregos no brave new world?

O tema da felicidade foi tratado por Aristóteles, Epicuro, Epicteto e Shakespeare. Porém, hoje parece que a simples menção ao conceito já faz todo mundo dizer que é autoajuda. Nada mais enganador. Dois livros recentes dialogam com pesquisas, filosofia e reflexão distinta de fórmulas prontas. Um é sucesso de um professor de Harvard: Shawn Achor. O livro saiu pela Saraiva/Benvirá: O Jeito Harvard de Ser Feliz (tradução de Cristina Yamagami do original The Happiness Advantage). O outro é do escritor brasileiro que estuda pesquisas científicas sobre realização e felicidade: Luiz Gaziri. Tive o privilégio de fazer o prefácio da obra mais recente: Os Sete Princípios da Felicidade (Faro Editorial).

Clássicos, temas ligados à existência e à felicidade, romances, poesias: um livro é uma alavanca e possibilita erguer o mundo, ao menos o seu mundo. Um pequeno conto de Machado, um texto de Clarice Lispector, uma peça de teatro de Nelson Rodrigues: ninguém sai igual da imersão na inteligência. Sem ler, não existe esperança de melhora. Você odeia o político A ou B? Ambos têm uma característica em comum: a falta de leitura. Boa pista para hoje. Ler é esperança pura!

Uma acusação que avança - MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 13/05

As respostas sem sentido de Bolsonaro diante das suspeitas de interferência na PF só aumentam os indícios em torno dele


Todos os indícios mostram que o presidente da República tentou, diversas vezes, inclusive constrangendo publicamente o então ministro da Justiça, interferir na Polícia Federal para que ela servisse aos seus propósitos. O presidente deu várias respostas, todas contraditórias, para tentar se defender dessa acusação que ganha contornos cada vez mais sólidos. O procurador-geral da República, Augusto Aras, tem o poder de arquivar esse inquérito que ele mesmo pediu para abrir, mas quanto mais transparente for cada etapa da investigação mais difícil será dizer que nada de errado aconteceu.

Ontem, ao fim da sessão de exibição do vídeo para procuradores, policiais federais, PGR, o ex-ministro Sergio Moro e o advogado-geral da União, houve duas versões. Quem assistiu disse a jornalistas que era uma prova definitiva da interferência na Polícia Federal, e o presidente , em entrevista mambembe, de cima da rampa no Planalto, negou:

– A preocupação, desde a facada, foi com a segurança minha e da minha família. Em Juiz de Fora, o Adélio cercou meu filho, no vídeo, no meu entender, talvez quisesse assassiná-lo ali. A segurança da minha família é uma coisa, não estou preocupado com a Polícia Federal, a Polícia Federal nunca investigou ninguém da minha família.

É natural que depois de passar pelo que ele passou em Juiz de Fora ele se preocupasse mais com a proteção da família. Nada disso tem a ver com o ministro da Justiça. Bastava falar com o ministro que comanda o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, das suas apreensões. Certamente a segurança seria reforçada para a tranquilidade do presidente.

Mas todo o conflito foi com o então ministro da Justiça, toda a pressão foi para tirar o diretor-geral da Polícia Federal Maurício Valeixo, porque queria outro com quem ele tivesse mais “afinidade”, e o fim último era trocar o superintendente no Rio de Janeiro. Não faz sentido, se a preocupação era a segurança da família.

Dentro do governo argumentam em favor do presidente certas minúcias. Aí é que está. Esse tipo de argumentação de detalhes só mostra a posição de fragilidade em que já se encontra o governo. O argumento de que Valeixo disse que nunca ocorreu interferência enquanto ele estava lá só confirma que Moro e Valeixo foram impedimentos para que Bolsonaro realizasse seu projeto e por isso eles precisaram ser removidos.

Não fica de pé o argumento que Bolsonaro usou ontem de que não falou em “Polícia Federal” durante a reunião. Nem precisava. Se a bronca era sobre Moro, que era o chefe hierárquico da Polícia Federal, de que outro órgão ele estaria falando? E os fatos que se seguiram à reunião do dia 22 mostraram que era isso mesmo que ele queria que acontecesse, tirar um diretor sem qualquer motivo aparente, mesmo que para isso precisasse derrubar um ministro, para assim nomear seu amigo Alexandre Ramagem. E trocar o superintendente do Rio.

Todos os outros argumentos que Bolsonaro usou ontem são sem sentido, como o de que ele poderia destruir a fita. Não poderia. Seria obstrução de Justiça, destruição de prova. Ele estaria muito mais encrencado ainda.

A maneira absurda e criminosa com que Bolsonaro está agindo durante esta crise, que só no dia de ontem matou 881 pessoas, já é motivo suficiente para o afastamento do presidente. Ele não conseguiu entender até este momento, diante de 12.400 mortos, que riscos os brasileiros correm diariamente. Ainda ameaça quem não cumprir seus decretos desprovidos de razão, como o da liberação de academias e salões, e defende a tese de que não precisa ouvir o Ministério da Saúde.

No meio desta pandemia que nos sangra, com uma crise econômica brutal, o país é exaurido em suas forças pelos problemas criados pelo presidente. Tanto a demissão de Mandetta quanto a de Moro foram crises que ele inventou para tumultuar ainda mais a situação do país.

A soma dos indícios que já se acumulam em torno dele mostra que Bolsonaro gastará os próximos meses se defendendo, na PGR ou no Congresso. Suas únicas saídas são a de Aras preparar uma pizza ou de o centrão evitar seu naufrágio. Nesse último caso, nada sobrará da política econômica com a qual o ministro Paulo Guedes defendeu sua eleição junto aos agentes econômicos.

Em nome dos filhos - BERNARDO MELLO FRANCO

O Globo - 13/05

Bolsonaro se elegeu com a promessa de defender a família. Faltou dizer que se referia à própria. O presidente vê o Estado como um bife a ser repartido entre os filhos



Jair Bolsonaro se elegeu com a promessa de defender a família. Faltou dizer que se referia à própria. O capitão sempre usou o poder para proteger e engordar os herdeiros. É assim desde os tempos de deputado, quando ele pendurou dois filhos na folha de pagamento da Câmara.

Na Presidência, o patriarca farejou boquinhas melhores para o clã. No ano passado, ele tentou emplacar o caçula Eduardo, cuja experiência internacional se resumia a fritar hambúrgueres, como embaixador do Brasil em Washington. Ao defender o indefensável, pronunciou duas frases memoráveis. “Pretendo beneficiar um filho meu, sim. Se eu puder dar filé mignon pro meu filho, eu dou”, afirmou.

A visão do Estado como um bife suculento explica a gula de Bolsonaro pela Polícia Federal. Ele queria espetar o garfo no órgão para reparti-lo entre os filhos. Ao que tudo indica, seu principal objetivo era interferir nas investigações sobre desvio de verbas parlamentares e fábricas de fake news.

A se confirmarem os relatos de ontem, o presidente admitiu o plano na fatídica reunião ministerial que antecedeu a saída de Sergio Moro. A versão de que ele se referia à segurança da família soa como conversa fiada. Quem cuida do assunto é o Gabinete de Segurança Institucional, não o Ministério da Justiça.

Além da confissão presidencial, o vídeo registra outras duas passagens que complicam o governo. Numa delas, o ministro Abraham Weintraub teria defendido a prisão de ministros do Supremo. Em outra, a ministra Damares Alves estendeu a ideia a prefeitos e governadores. As falas ilustram o desembaraço com que o bolsonarismo conspira contra a democracia. E tornam mais urgente a divulgação da íntegra da fita, que está nas mãos do ministro Celso de Mello.

O presidente não vai mudar enquanto não for parado, seja por uma denúncia criminal ou por um processo de impeachment. Ontem ele disse que a gravação que pode incriminá-lo “era para ser destruída”. “O vídeo é meu”, afirmou, como se fosse o dono do governo e das provas do inquérito que o investiga.

No país de Bolsoshenko - ZUENIR VENTURA

O Globo - 13/05

Bolsonaro tem afinidade com ditador da Bielorrúsia



Eles se juntam por afinidade de opinião. O presidente do Brasil e o ditador da Bielorrússia são contrários às medidas de isolamento social para combater o novo coronavírus. Os dois as consideram exageradas, apesar de o mal já ter exterminado mais de 11 mil pessoas entre nós. Bolsonaro classifica a preocupação com a pandemia de “neurose” e Lukashenko, de “psicose”.

Eles não devem saber muito bem o que os termos significam, mas os empregam como xingamentos. Um debocha chamando-a de gripezinha inofensiva, o outro receita “beber vodca, frequentar sauna e dirigir caminhão”. Bolsonaro prefere dirigir jet ski no dia em que o país contabilizava 10 mil vítimas fatais da pandemia — com certeza para espairecer.

O resultado é que o Brasil tem mais casos de infectados do que todos os países da América do Sul juntos. Argentina, Colômbia e Paraguai nos servem hoje de exemplos. O mais humilhante é ter que ouvir calado o presidente argentino, Alberto Fernández, declarar a uma rádio que somos “um risco muito grande, uma ameaça”.

Não se trata da provocação de um hermano. O que ele disse foi confirmado pelo ex-economista-chefe do FMI e professor da Universidade da Califórnia, Maurice Obstfeld, que advertiu que a nossa resposta “desdenhosa à doença vai custar caro tanto em termos de vida como de renda”.

Pelo jeito, a interferência do presidente no Ministério da Saúde, que levou à demissão do ministro anterior, Luiz Henrique Mandetta, se repete de certa maneira agora e pôde ser observada pelos espectadores do “Jornal Nacional” de anteontem, quando Nelson Teich, em plena entrevista, não conseguiu esconder a surpresa e até incredulidade ao saber que era ministro de um país onde salões de beleza, barbearias e academias de ginástica passaram a ser atividades essenciais por decreto presidencial.

Restou-lhe perguntar ao repórter que lhe dera a informação: “Saiu hoje? Falou agora?

Só vendo a cara de desânimo.

E se Bolsonaro pegar Covid-19? - RUY CASTRO

Folha de S. Paulo - 13/05

Se, como diz, seus exames deram negativo, significa que ele ainda pode ser infectado



Jair Bolsonaro anunciou para seu gado que só sairá da Presidência no dia 1º de janeiro de 2027. Se se confirmar, será um alívio. Pelo que fez até agora e continua impune, é tocante sua benevolência de contentar-se com uma única reeleição —esta, já dada de barato. Mas o que o impedirá de, a qualquer momento, decretar-se eterno no poder? Se fizer isso —e não precisaria nem esperar pela reeleição—, é porque sabe que poderá contar com a impotência e o aval bovino dos demais Poderes.

Sua certeza se baseia no sucesso de sua tática, aprendida com os amigos milicianos, de governar pela bofetada. Simbólico ou não, é o tapa na cara. Bolsonaro bate e ninguém reage. Esbofeteia ministros —Sergio Moro, por exemplo, enquanto no cargo, tomou tanto na cara que parecia gostar—, aliados de primeira hora, servidores de carreira, cientistas, juristas. Dias Toffoli viu-o reduzir o STF a palanque e ficou firme, mas, sem a barba, sua face avermelhada acusava a marca da mão aberta. Quanto ao Exército, Bolsonaro pode, por enquanto, recolher a palma. Compra-o a prestações dando-lhe empregos, oficialzinho por oficialzinho.

A palavra impeachment está em todas as bocas, mas, se você esperar pelo Congresso, espere sentado. A maioria de seus membros tem motivo para manter Bolsonaro no trono: o centrão, a que pertencem Rodrigo Maia e David Alcolumbre, por estar lhe vendendo proteção, e a oposição, leia-se o PT, por preferir que Bolsonaro "sangre" até 2022 —se houver 2022. Nas horas vagas, por esporte, Bolsonaro esbofeteia os heróis da saúde, os mortos do coronavírus e os coveiros.

Donde, se não há como remover Bolsonaro pela lei ou pela força, só parece restar um recurso: sua morte. Por Covid.

Se for verdade, como afirma, que seus exames deram negativo, significa que ele ainda pode ser infectado. De preferência, por um seguidor. Deus é grande.


Mascaradas - ROBERTO DAMATTA

O GLOBO/ESTADÃO - 13/05

Estamos todos vivendo num mundo um tanto incômodo e obrigatoriamente anônimo com suas drásticas e dramáticas consequências

Fosse essa crônica publicada no último final de ano, muitos leitores iriam pensar que eu estava antecipando o clima da festa da vida: o carnaval brasileiro. Esse rito afim das fantasias, nas quais as máscaras davam licença para todo tipo de comportamento impróprio. Já se disse que mascarar-se é a coisa mais próxima da invisibilidade e do anonimato.

Uma experiência, aliás, difícil de ser vivida neste país onde ser famoso, conhecido ou autoridade (obviamente uma máscara) faz com que se tenha licença para ignorar regras. Se eu não sabia com quem falava, agora – com a obrigatoriedade de usar a máscara contra o vírus – existe um anonimato contrário ao nosso estilo de vida. Um estilo que, conforme adiantei em minha obra e nesta coluna, faz com que o abraço, o cheiro, o contato corporal, seja uma prova de reconhecimento, carinho, afeto e consideração.

Agora, ninguém deve mesmo saber com quem está falando porque nossas “caras” (que só mamãe botaria a mão) estão encobertas e escondidas. Além disso, a semi-invisibilidade social cria uma semelhança oculta entre o vírus e um dos seus remédios mais eficazes.

Estamos todos vivendo num mundo um tanto incômodo e obrigatoriamente anônimo com suas drásticas e dramáticas consequências. A mais pungente delas talvez seja a de não podermos nos despedir dos nossos entes queridos quando eles confirmam a sua transitoriedade e seguem para o túmulo; sobretudo a vala comum numa brutal e imerecida equanimidade.

É triste demais não estar com um ente amado na sua hora final (que é também um pedaço da nossa). Esse que vimos nascer ou que nos trouxe ao mundo, demandando lágrimas de felicidade ou de dor, pois tanto as entradas quanto as saídas são inevitavelmente marcadas, tal como a primeira e a última vez.

A pandemia nos apresenta e atropela com a presença da passagem, do episódico e da transitoriedade. Com um horrível detalhe: o vírus, logo a doença, não tem propósito ou intenção. Ele produz tanto a imensa dor quanto uma prova desagradável de que somos permanentemente rondados pelo infortúnio e pelo aleatório. Apesar dos anúncios de uma superinteligência artificial, nossa capacidade de previsão, mesmo as mais técnicas, está sempre sujeita ao imprevisto e nada do que traz plenitude emocional – amor, felicidade, dinheiro, poder, fama, beleza, inteligência e energia – é permanente. Somos todos, conforme ensinou Freud pelos idos de 1915, sensíveis à severa ausência do permanente e do eterno.

Perdemos a nossa inocência e ficamos cínicos e velhos. Nossos entes amados morrem vitimados por um vírus não previsto ou num acidente. De um lado, é uma irreparável perda, mas, como remarca Freud, todo luto engendra uma oportunidade de descobrir novos caminhos e outros objetos e sujeitos preciosos. Graças à transitoriedade, a vida e a saúde acabam sendo maiores do que a doença e a morte.

Talvez o nosso dever, como diz outro mestre – Thomas Mann –, seja o de compreender que sem a passagem e a transitoriedade (essa relativização da eternidade) jamais seríamos humanos. Mais: todas as vezes que desejamos superar o humano, criando uma fórmula ou um sistema definitivo, abraçamos o vírus da intolerância, do orgulho, da morte e, sobretudo, da injustiça porque negamos aquilo que só nós, humanos, possuímos: a consciência dolorosa e benfazeja de que, se a beleza passa, o mal, a burrice, a intolerância e a doença também se vão no inevitável desenrolar do tempo, o senhor da vida.

A “mascarada” defensiva não é festiva. É um sinal de perigo, guerra, morte e contágio. Uma espécie de respeito desagradável ao poder inexorável da morte, que é o marco definitivo da igualdade neste mundo. E hoje símbolo da doença mortal que – esperamos – seja como a dor e o prazer, episódica. Como todos nós, comuns ou famosos, fracos ou fortes, com ou sem máscaras, diante da pandemia, que obriga a usar máscaras, resta buscar a tarefa de vestir e, tanto quanto possível, diminuir a crueza dessa imensa desigualdade constitutiva do Brasil.

O que fazer quando morrem tantos ao mesmo tempo? Quando perdemos gigantes da literatura, da música, do jornalismo e da dramaturgia ao lado de pessoas comuns que, no entanto, viveram suas epopeias e sofreram o humano desequilíbrio de felicidade e infortúnio. É dolorosa essa experiência de ver a morte, que deveria ser exceção, virar uma pavorosa rotina. Quando os mortos ultrapassam a capacidade dos cemitérios, sabemos que a pandemia é, num plano profundo, uma mascarada fúnebre.

 

O centrão vê a economia na crise de Bolsonaro - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 13/05

Não há impulso para impeachment, mas economia vai mudar, diz um líder do bloco

O governo falou muito, mostrou “boa vontade”, mas entregou pouco até agora, dizia nesta terça-feira (12) um deputado líder do centrão que negocia aliança e cargos com o Planalto. O parlamentar falava no começo da noite de todos os rumores sobre o vídeo da reunião ministerial em que Jair Bolsonaro teria ficado, mais do que nu, em carne viva —ou morta, a depender do boato e do ânimo crítico do espectador.

E daí? Daí que o vídeo degradaria a situação política de Bolsonaro, óbvio. Ainda não parece “tiro na cara”, como diz o deputado, mas o presidente precisaria de mais gente firme na Câmara para se segurar na cadeira e “governar com estabilidade” (sic).

Continua não haver risco de processo de impeachment, por ora, na opinião do deputado, para quem, no entanto, que está muito difícil medir a temperatura do Congresso e do país em geral, por causa do distanciamento provocado pelo vírus.

Por enquanto, “sem uma bomba grande”, não haveria impulso grande para criar um movimento relevante para depor Bolsonaro. Nem as pesquisas de opinião mostram descalabro do prestígio presidencial nem “as bases” dele e de parlamentares próximos pressionam por alguma movimentação. Nem mesmo os governadores, diz.

Mas o governo piscou, porque está mais fraco. Ainda não sabe fazer o básico da articulação no Congresso, apesar da boa vontade dos generais do Planalto, diz o deputado.

E daí? A crise renovada a cada dia pode levar a mudança substancial de planos do Ministério da Economia, como se especula?

Não muda grande coisa, diz o deputado. Primeiro, porque o Congresso está mais devagar, com outras prioridades e daqui a pouco vai ter de pensar o que fazer da eleição (datas e campanhas). Segundo, porque o centrão ou pelo menos seu partido tem compromisso com “as reformas”, afirma. Mas o governo vai ter de mostrar mais “sensibilidade”.

O quer quer dizer “sensibilidade”? Não se trata apenas de cargos ou ministérios, diz o deputado. O governo teria de olhar mais para os pobres e para as empresas que estão quebrando, muito pequeno negócio. Apresentar um plano para o país ter esperança de sair da crise, ter uma relação mais estável com os deputados. Pensar um modo “inteligente” de lidar com a eleição do próximo presidente da Câmara. Tem de ajudar a formar a base, mas não pode querer decidir resultado.

Objetivamente, poderia vir mudança mais essencial, tal como mexer no teto de gastos, por exemplo? Ninguém fala disso, no sentido de que não é nem assunto de discussão grande. O teto não impediu o aumento de gasto extraordinário neste ano, argumenta. Não quer dizer que o gasto extraordinário vá continuar no ano que vem. Mas vai ser preciso rediscutir o caso a cada avaliação que houver da economia e da “crise social”.

Com uma queda grande da economia, a vida estará difícil também em 2021. Não será possível cortar a ajuda de uma hora para outra e não é possível ficar apenas na ajuda (como o auxílio emergencial). Vai ser preciso criar emprego, diz. Como fazer, é uma questão.

Essa história de que o centrão quer logo um plano de obras e gastança seria conversa. Ninguém sabe direito o que fazer nem tem ainda articulação para fazer uma mudança: “O pessoal está meio na muda, quieto, olha até o Rodrigo [Maia, presidente da Câmara]”. Mas a situação mudou, daqui a pouco vai aparecer uma ideia de mudar também alguma coisa da política econômica, como já mudou e não tem muita volta.

Que Mello divulgue vídeo inteiro. Há algo mais sério do que eventual crime - REINALDO AZEVEDO

UOL - 13/05


O ministro Celso de Mello, relator do inquérito que investiga se o presidente Jair Bolsonaro mudou o comando da Polícia Federal em razão de interesses políticos e pessoais, deu 48 horas para que a Procuradoria Geral da República, a Advocacia Geral da União e a defesa de Sergio Moro se manifestem sobre a divulgação total ou parcial do vídeo com a reunião ministerial do dia 22 de abril. Que seja liberado. Há lá algo até mais importante do que o eventual crime cometido pelo presidente.

A defesa de Moro e o próprio ex-juiz já se manifestaram. Querem a divulgação na íntegra. Para Rodrigo Sánchez Rios, que representa o ex-juiz, a gravação confirma as declarações de seu cliente no pronunciamento público e no depoimento prestado à PF. Assim, o vídeo deixaria claro, então, que foi pressionado a fazer as mudanças na Polícia Federal.

Bem, isso o próprio Bolsonaro admitiu no dia mesmo da demissão de Moro. O xis da questão é outro: Bolsonaro explicitou ou não que a pressão se deveria a assuntos de seu interesse pessoal, como proteger a sua família? O presidente e os militares ouvidos dizem que não. O vazamento sustenta que sim...

A Advocacia Geral da União já havia pedido autorização para entregar só a parte da reunião que trata do entrevero com Moro. Desistiu da ideia. O vídeo foi repassado na íntegra. Mello pediu a sua transcrição. Augusto Aras ainda não se manifestou.

O advogado de Moro nega que haja ali o chamado "material sensível", como alerta o governo. Vamos ver o que vai dizer Aras. O procurador-geral está numa situação nada invejável. É chapa e parça de Jair. Por outro lado, depois de tudo o que já se vazou sobre o vídeo, como defender que sejam mantidos em sigilo mesmo os trechos que não dizem respeito diretamente ao caso?

SIGILO E LEIS

A questão é espinhosa, sim -- lembrando sempre que Celso de Mello já havia decidido pela publicidade do inquérito. O governo não é obrigado a gravar as reuniões. Aliás, eis aí um procedimento a ser adotado. Que se grave tudo para a história, impondo um tempo de sigilo. Não há legislação para esses casos. Como a gravação existe, como há a suspeita ou indício -- vamos ver -- de que um crime foi cometido; como a fala de Bolsonaro, no que respeita a Moro, não se descola do clima geral da reunião, criou-se uma óbvia demanda pública em favor da transparência.

Se Mello opta pelo sigilo, resta a suspeita de que o ministro está tentando esconder um malfeito do governo. Como o princípio que a Constituição consagra é o da publicidade e como o caso remete a um dos pilares da República e do estado de direito, não vejo como isso possa ficar escondido.

Para o caso, o que interessa é mesmo a fala que Bolsonaro teria dirigido a (ou contra) Moro. O resto constitui o ambiente em que os outrora chamados "interesses mais elevados da nação" são debatidos. É mesmo verdade que um ministro da educação defende a prisão de todos os integrantes do Supremo? É do interesse público. Trata-se de um bolsonarista-raiz e tem sob seu controle a segunda verba do Orçamento.

Damares Alves, por usa vez, teria pregado a prisão de prefeitos e governadores, o que ela confirma no Twitter, embora tentando emprestar uma motivação nobre para o seu comentário:
"Quem me acompanha sabe que os pedidos de punição a gestores violadores de direitos ou que desviam verba pública (corruptos) não são novidade. Se em nome de quarentena alguém agredir idoso, mulher ou qualquer outro na rua, vou pedir justiça, sim. E se houve crime, que seja preso".

A ministra poderia ao menos ter escrito: "Se houve crime, que seja julgado e punido". Mas não consta que o contexto tenha sido esse.

E A CHINA?

"Ah, mas e a China? E se Bolsonaro e Ernesto Araújo falaram mal da China, o maior parceiro comercial do Brasil? Bem, meus caros, não deve ser coisa muito pior do que aquilo que o chanceler escreveu em seu blog, quando chamou o coronavírus de "comunavírus", numa alusão aos supostos benefícios que o país asiático teria com a pandemia, associando o distanciamento social a campo de concentração.

Mello há de compreender que ninguém está querendo dar uma espiadinha nas entranhas putrefatas do governo. Se há o vídeo e se inexiste dispositivo legal que o torne sigiloso, a eventual gravidade da coisa está em ter acontecido, não na sua publicidade. "Ah, mas a reunião não foi feita para que todos soubessem". Sim, é verdade. Mas o fato é que pessoas púbicas se reuniram num espaço também público para tratar de assuntos do público. Tivessem todos seguido a lei e as regras do decoro, nada de ruim teria acontecido por lá, e ninguém estaria interessado em acompanhar minudências de um encontro como esse.

O MAIS IMPORTANTE

Acontece que não foi assim que seu deu, não é? Não havendo lei que vete ou que imponha o sigilo, prevalece o princípio da publicidade, consagrado no Artigo 37 da Constituição. Trata-se, ademais, de providência didática. Será mesmo aceitável, então, que "material sensível" para o país, a ponto de merecer sigilo, deve ser tratado em meio a palavrões que podem ficar bem em boteco ou em vestiário, mas nunca num ambiente em que, então, os altos interesses da nação deveriam estar sendo debatidos? A resposta parece óbvia.

Que Mello pense bem. Já há delinquentes acampados em Brasília fazendo "treinamento", como dizem, com o intuito de desmoralizar as autoridades. Entre eles, há pessoas que foram ou são assessores de parlamentares que dão suporte ao governo. O endereço é secreto, e uma das lideranças admite que há pessoas armadas — só para a autodefesa, claro!

Acontece, meus caros, que esse clima de baderna fascistoide, como se pode ver, está indo parar nos salões em que os Varões e as Varoas de Plutarco se reúnem.

Parlamentares se mobilizam cobrando acesso ao vídeo. Espero que Mello contribua para a elucidação de um tempo. Talvez Bolsonaro tenha cometido um crime, vamos ver. Mas me ocorre agora que, para o longo prazo, ainda mais importante do que isso, é termos clareza do modo como o país é governado. Os brasileiros merecem isso. Inclusive as famílias dos mais de 12 mil mortos. Inclusive os vivos que estão na fila dos cadáveres a haver. Inclusive os que restarmos.

Já é outro dia - ROSÂNGELA BITTAR

O Estado de S.Paulo - 13/05

Os militares morrerão por um governo alvo de investigação, imerso em isolamento?



Na linha do tempo, já é outro dia. O vídeo da reunião que expôs as vísceras de um governo em decomposição, principalmente pela atuação do presidente Jair Bolsonaro e os discursos do chanceler Ernesto (bobo da corte) Araújo e Abraham (pior ministro) Weintraub, foi entregue na sua integralidade e visto por algozes e réus. Permanecerá nos arquivos como uma marca definitiva de um time perdido, sem líder ou objetivo, eira ou beira. Um alto encontro de baixo propósito. Desdobramentos são, por enquanto, imperscrutáveis. Os fatos registrados podem dar em tudo, como identificar o crime de que é suspeito o presidente, ou nada, se o procurador-geral da República assim entender.

O segundo vendaval que atravessou a semana transportou o País, machucado por doença e mortes, a outra situação indefinida. Como ficamos depois do depoimento dos três ministros do governo Jair Bolsonaro, em cargos civis e políticos na Presidência, sobre as denúncias do então ministro da Justiça, Sérgio Moro. Já terão tido o seu efeito e será preciso superar a fusão que se tentou fazer de seu desgosto por esta convocação com a adesão das Forças Armadas aos propósitos pessoais do presidente da República.

Pularam o Rubicão e o mundo não acabou, como previam. Os seus desdobramentos, porém, ainda estão embaralhados.

Inspirados por um incendiário contumaz que habita o cerrado, fizeram tempestade em copo d’água. Exagero diante de um termo do jargão convocatório da Justiça, revelando insegurança e o infortúnio de estarem, como únicos avalistas, em um governo de que não se sabe, nem eles, absolutamente nada.

Entregaram o vídeo, que foi visto, deram seu testemunho e a investigação segue. Como ela, também segue procurando seu eixo o movimento dos militares diante de proposta de participação política mais efetiva e adesão incondicional ao presidente.

Baixou a temperatura na área militar, mas ainda há brasas acesas. O presidente Jair Bolsonaro mistura propositalmente os problemas para obter as soluções também misturadas, uma pela outra.
O governo não se curou da aposta no aprofundamento da divisão entre a reserva, os comandos e as tropas.

A intervenção militar que paira como ameaça não encontra ressonância, por enquanto. Os comandos não veem condição de participar de outros projetos que não sejam o combate à pandemia, interna e externamente, e sua sobrevivência. Mas o governo é autossuficiente e o código deste problema já se apagou.

As prioridades das tropas são as mesmas do conjunto do planeta, preservar a vida. É conhecida a posição de Bolsonaro sobre a covid-19, desdenha e desvia o assunto, e mantém sob pressão o comandante Edson Leal Pujol, do Exército.

O ambiente dos quartéis é propício ao contágio e já há mortes. É como se houvesse um confinamento de milhares de pessoas que se alojam, almoçam, dormem, viajam e trabalham juntas. O presidente pretende que sejam destemidos como seus ministros que considera exemplares, a quem dá fôlego e que o fazem rir. Gostaria, certamente, que todos seguissem Weintraub e Araújo. Não é por acaso que se conectaram os dramas da entrega do vídeo e dos depoimentos dos ministros.

O que agride, nesta estirpe mais chegada a Bolsonaro, cuja performance se espelha no mestre de todo o grupo, não é uma questão ideológica ou política. É a ausência de decência. Não se imaginam os militares seguindo uma liderança com este comportamento.

Morrerão por um governo alvo de investigação, imerso em isolamento político, cultural, social, embalado no discurso do achincalhe?

O mais provável, superada a valentia que antecedeu a decisão de depor ao Supremo, é que os ministros passem a viver mais a realidade.

E esta é o aumento das mortes pela covid-19, inclusive nos quartéis, e o presidente Jair Bolsonaro na mão do Centrão.

Brasil não consegue superar modelo dos 80 - CRISTIANO ROMERO

Valor Econômico - 13/05

Brasil demorou para superar inflação e crise da dívida


Depois de ter sido o país que mais cresceu entre as décadas de 1950 e 1970, o Brasil perdeu todos os “bondes” da história desde então, tornando-se uma economia de baixo crescimento. Demorou muito para superar a crise da dívida e livrar-se do processo hiperinflacionário, dois problemas que assolaram de forma indistinta nações subdesenvolvidas no início da década de 1980. Na verdade, foi justamente por não aceitar o fim do modelo de substituição de importações que a Ilha de Vera Cruz nunca mais se reconciliou com o crescimento acelerado.

Uma medida da “estagnação” está na comparação com os Estados Unidos. Dados do FMI mostram que em 1980, ano em que crescemos 9,2%, o PIB do Brasil, a preços correntes e pelo Poder de Paridade Compra (PPP, na sigla em inglês), era de US$ 590,9 bilhões. Naquele ano, pelo mesmo critério, o dos EUA era de US$ 2,857 trilhões, portanto, 4,8 vezes o brasileiro. No ano passado, segundo estimativa do FMI, a relação aumentou para 6,22 vezes - respectivamente, PIB (PPP) de US$ 3,479 trilhões e US$ 21,665 trilhões.

Em 1980, a China, ainda um gigante adormecido, mas com despertador programado para acordá-lo logo mais, tinha um PIB, também pelo critério usado pelo FMI, de US$ 304,3 bilhões, quase metade do brasileiro. Bem, 40 anos depois, os chineses já registram PIB, medido pelo PPP, superior ao dos EUA - US$ 30,9 trilhões, quase nove vezes o do Brasil. Uma observação importante: isso não faz da China nação mais rica que os EUA, afinal, seu PIB per capita, estima o FMI, chegou a US$ 20 mil no ano passado, enquanto o dos americanos é de US$ 67,7 mil.

Uma curiosidade da série “quando-é-que-nosso-despertador-vai-tocar”: em 2020, pela primeira vez, o PIB per capita chinês (pelo critério de PPP) superou o brasileiro, estacionado (ou atolado) em US$ 18,7 mil. Em 1980, o dos chineses estava em US$ 302,3 e o nosso, em US$ 4,8 mil.

Motivada por interesses de grupos específicos, principalmente de seus maiores beneficiários, a negação de que o velho modelo de desenvolvimento é obsoleto e insustentável nos fez perder a revolução tecnológica que se deu, primeiro, no Japão, depois nos chamados tigres asiáticos e nos EUA e, mais recentemente, na China. Quase 40 anos depois da falência daquele modelo, nossa economia continua bastante fechada e o Estado brasileiro, falido desde aquela época, continua ajudando e custeando alguns de seus beneficiários.

Para que o leitor não acuse este humilde repórter de omissão, aqui vai o maior exemplo de resistência ao fim do regime de substituição de importações: a indústria automobilística, toda ela multinacional. Além de se beneficiar de barreiras tarifárias e não tarifárias contra a competição internacional, tem direito a incentivos fiscais e subsídio creditício desde que chegou por aqui, há quase 70 anos. Agora mesmo, em meio à pandemia e à evidente escassez de recursos públicos para o enfrentamento da mais grave crise da história, movimenta-se em Brasília para receber algum socorro financeiro. O discurso não muda nem neste pandemônio - se o governo não ajudar, ameaçam os executivos, as montadoras deixarão o mercado brasileiro. Eles pedem dinheiro aqui, sendo que, na maioria dos países onde estão suas matrizes, a liquidez é farta e o juro real (descontada a inflação), negativo.

A Ilha de Vera Cruz não atolou sozinha. Na década de 1980, o Ocidente constatou que a produtividade da economia japonesa era assombrosamente superior à de suas economias e que o despertador da China já tinha tocado. Foi aí que os EUA de Ronald Reagan e a Inglaterra de Margaret Thatcher adotaram uma série de medidas para desregulamentar, isto é, diminuir a presença do Estado na produção de bens e serviços, abrindo espaço para que o setor privado, por definição mais eficiente, assumisse protagonismo.

Enquanto isso, na Terra de Santa Cruz, deu-se o seguinte:

1. Fernando Collor confiscou poupança, outras aplicações financeiras e até depósito à vista, mas, com um voluntarismo típico de um “outsider”, coisa que na verdade ele não era, decretou, no segundo dia de gestão, a 16 de março de 1990, o fechamento de dezenas de estatais (esquisitices como Siderbrás, Portobrás, cuja falta a sociedade jamais sentiu); demitiu 108 mil funcionários sem estabilidade no emprego, dentre os quais, empregados das estatais extintas; colocou milhares de servidores da ativa em disponibilidade (possibilidade prevista pela Constituição em caso de calamidade, justificado pelo fato de a inflação ter alcançado 89% em apenas um mês, fevereiro de 1990); iniciou as privatizações; começou a abrir lentamente a economia e lançou agenda para desregulamentar diversos setores; como, a exemplo de Bolsonaro, Collor chegou a Brasília sem base de apoio no Congresso, seu capital político esvaiu-se após o fracasso do confisco - a “bala de prata” contra a inflação, disse o então presidente - e, justamente quando se rendeu aos partidos, seu governo desmoronou a partir de denúncias feitas pelo próprio irmão, levando-o ao impeachment; a agenda de Collor tinha, sim, cunho liberal, mas, antes de mais nada, atendia à aritmética - o Estado tornou-se insolvente, a dívida pública, inadministrável, e, consequentemente, a inflação era altíssima (e, por essa razão, um pesado imposto sobre os mais pobres), logo, as medidas se destinavam a encaixar o setor público dentro do PIB;

2. Itamar Franco, o vice, assumiu em outubro de 1992 e deu sequência à agenda do antecessor; foi ele quem, fazendo muxoxo, privatizou em 1993 a CSN; esperava-se do presidente, porém, que lançasse logo um plano para debelar a inflação, que àquela altura já estava em quatro dígitos ao ano; teimoso que só ele, nomeou e demitiu três ministros da Fazenda no espaço de apenas sete meses, antes de dar ao cargo a Fernando Henrique Cardoso.

Esta é a terceira coluna dedicada a relatar e discutir o passado recente da história econômica do país. O objetivo é humildemente tentar entender onde estamos, uma vez que, há sete anos, nosso PIB parece preso numa espécie de areia movediça. Na próxima semana, tem mais, mas, antes, um registro para mostrar como o patrimonialismo, isto é, o hábito secular de grupos sociais de ver a coisa pública como algo que lhes pertença, é uma característica mais forte entre nós do que o populismo: 30 anos depois do Plano Collor, congressistas e Judiciário ainda tomam medidas para compensar servidores públicos que, sem estabilidade constitucional, foram demitidos na ocasião.

Bolsonaro caiu na mão dos camaleões da política - XICO GRAZIANO

PODER 360 - 13/05


Bob Jefferson apoiou governo tucano

Combateu Partido dos Trabalhadores

Apareceu de mãos dadas com Lula

Agora, se alinha a Bolsonaro



“Jair Bolsonaro precisa demitir os 11 ministros do STF. Se não o fizer, cai.”

O terrível, e maluco, vaticínio foi feito por Roberto Jefferson, personagem peculiar da política brasileira.

Meio sumido desde que andou preso, protagonista do mensalão, Bob Jefferson reapareceu com a tocha acesa graças à recente aproximação de Bolsonaro com o Centrão. Virou líder da tropa de choque que defende com unhas e dentes o governo.

Curioso é que ele cumpriu o mesmo papel, há 20 anos, no governo Collor. Naquela época, enquanto diziam caçar marajás do serviço público, se locupletavam na corrupção. Durante o processo de impeachment, Bob bradava, espumando de raiva. Nada adiantou.

Perdeu, mas não caiu. Com a eleição de Fernando Henrique Cardoso, Bob Jefferson passou a apoiar firmemente o governo tucano. Defendeu o Plano Real e combateu ferozmente o PT. Dono de excelente discurso, irônico, emparedava a esquerda.

Quando mudou o governo, eis que Bob Jefferson aparece de mãos dadas com Lula. Sim, com Lula. E feliz da vida passeava com Zé Dirceu. Incrível. Rapidinho colocou seu partido, o PTB, na base do governo vermelho. Parecia amigo de infância do PT.

Surpreendentemente, porém, ele denuncia a existência do esquema de compra de votos no Congresso. Estourou o mensalão. Cassado pela Câmara dos Deputados, tomou 7 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal.

Adoecido por grave moléstia, afastou-se uns anos, ficando distante do período Dilma e Temer. Voltou à ativa nas eleições presidenciais de 2018, quando fez de tudo para eleger… Geraldo Alkmin. Não vingou. Recolheu-se.

Aguardou como um sábio o momento do retorno. Num certeiro golpe, empunhou uma metralhadora para se alinhar com Jair Bolsonaro. Logo de cara, passou a acusar FHC de gênio do mal.

Este é Bob Jefferson. O ex-deputado faz parte de um time especial, super capacitado, de políticos que adula e serve ao poder –e dele se serve– qualquer que seja o titular na cadeira do Planalto. São os camaleões profissionais da política nacional. Não se trata de baixo clero. São pesos pesados, foram ministros, ou os indicaram.

Entra governo, sai governo, e eles estão lá. Pouco importa a ideologia, esquerda ou direita, tanto faz o partido ou o programa. Isso é o de menos: importante é estar ao lado do governo federal. E dele, óbvio, se beneficiar. Em nome, claro, do povo.

Os camaleões da política viraram uma receita inequívoca de sucesso. Esta é a desgraça da política brasileira, o pecado original da República instalada após a Constituição de 1988. Uns o denominaram de presidencialismo de coalização, outros de cooptação. Por mim, mais apropriado seria: presidencialismo de corrupção.

Sinceramente, eu acreditava que Bolsonaro, logo ao montar seu governo, escaparia dessa cilada montada no Congresso. Afinal, ele viveu lá longos 28 anos. Conhece as virtudes e a podridão existentes naquela Casa. Bastaria ter negociado, claramente, com os grandes partidos, com eles compondo, abertamente, espaços do poder. Mas não.

Mal tomou posse, partiu para a porrada. Pouco se importou com apoios sociais, políticos ou institucionais. Bateu, como nunca ninguém o fez, na mídia televisiva e na imprensa escrita. Agradou, é verdade, ao seu exército. Elevou perigosamente, porém, o número de inimigos.

Resumindo: Bolsonaro não entendeu, ou não aceitou, que vencer uma eleição é diferente de governar uma nação. Aos trancos e barrancos, durante um ano foi temperando a esperança do brasileiro acreditando, talvez, que a economia fosse sua âncora firme. Até que chegou a pandemia.

Acuado pela política e transtornado pelo coronavirús, Bolsonaro viu aumentarem as encrencas contra si. Perdeu capital político, erodiu sua imagem. Tudo piorou. Daí recorreu ao Centrão, fazendo acordos por debaixo do pano, preocupado em salvar sua pele. Caiu na mão dos camaleões.

Não consigo imaginar o final dessa história. Talvez Roberto Jefferson o saiba.

Luz do sol - VERA MAGALHÃES

ESTADÃO - 13/05

Só transparência total vai resolver impasse duplo que inquieta o País


Não é só a vitamina D, tão necessária nesses tempos em que vivemos confinados, que precisa da luz do sol para ser ativada. Só a claridade vai tirar o Brasil do impasse cada vez mais grave em que Jair Bolsonaro joga o País.

O agente capaz de escancarar as janelas e cortinas e iluminar dois cômodos que o presidente gostaria de manter nas trevas é o mesmo: o Supremo Tribunal Federal.

O presidente da Corte, José Antonio Dias Toffoli, bem que demonstrou, em sua densa, porém cautelosa, entrevista ao Roda Viva, minimizar os riscos para a democracia que Bolsonaro representa com seus atos e palavras. Apostou em diálogo e união de todos os Poderes para enfrentar a crise.

Menos de 24 horas depois, a sessão de cinema determinada pelo decano Celso de Mello parece ter entornado a pipoca da concertação nacional: segundo relatos em off de alguns dos espectadores, a reunião ministerial de 22 de abril se assemelhou mais a um filme de gângsteres.

Dada a gravidade dos spoilers de quem viu o filme, Celso de Mello precisa torná-lo público. Se há exortações à prisão de membros da mais alta Corte da Justiça e de governadores por parte de ministros e a explicitação verbal pelo próprio chefe de governo de que quer proteção da Polícia Federal para familiares e aliados, além da admissão de que a revelação de seu exame para covid-19 poderia alimentar um impeachment, as razões de segurança nacional obrigam à publicidade total da reunião, e não à manutenção de seu sigilo, como insiste o Executivo.

A outra persiana de informação pública que precisa ser erguida é justamente a do exame, ou dos exames, de Bolsonaro para o novo coronavírus. Quando o surto ainda não começara no Brasil, o presidente foi com uma grande comitiva à Flórida para confraternizar com Donald Trump. Boa parte da trupe testou positivo para covid-19. Outros que tiveram contato com os descuidados viajantes foram acometidos depois.

Bolsonaro disse ter testado negativo, mas tripudiou: mesmo que pegasse, para ele seria só uma “gripezinha” ou “resfriadinho”, dado seu “histórico de atleta”.

Uma coisa é dizer que foi acometido pelo vírus e ficou assintomático, algo comum. Outra completamente diferente, e de extrema gravidade em se tratando de um chefe de Estado em meio a uma crise de calamidade pública decretada a seu próprio pedido, é mentir sobre o resultado de um teste enquanto fura a necessária quarentena e prega contra as medidas de isolamento social recomendadas pelas autoridades de saúde.

Não se sabe se Bolsonaro fez isso. Mas a insistência em esconder resultados de um simples exame (negativo!) por parte de alguém que, há alguns anos, exibia orgulhoso uma bolsa de colostomia, aliada à frase dita por ele na reunião ministerial, segundo os relatos, deveria fazer o STF obrigar a Presidência a divulgar o resultado dos testes, sem essa história de nome falso ou de sigilo.

Na mesma linha da mentira de Estado, Bolsonaro se jacta de ter entregado a fita da reunião, sendo que poderia tê-la “destruído”, se quisesse. Balela! A partir do momento em que um depoente em um inquérito afirma, após jurar dizer a verdade, que um documento oficial existe e pode provar infrações, sua destruição é crime.

Episódios anteriores como o áudio de Joesley Batista com Michel Temer mostram a importância de se ver e ouvir esse tipo de documento antes de cravar conclusões. Naquela ocasião, fui dos que acharam que a fala de Temer não permitia chancelar a conclusão de que ele avalizou o suborno a Eduardo Cunha.

Agora, só a luz do sol sem filtro permitirá que se saiba se o que ocorreu em 22 de abril foi uma reunião de trabalho de um governo democraticamente eleito ou uma conspiração contra os preceitos do estado democrático.

Antes de mudar linha de defesa, Bolsonaro já admitiu ter problemas com a PF - BRUNO BOGHOSSIAN

FOLHA DE SP - 13/05

Presidente busca novo foco de discussão, mas o vídeo da reunião ministerial só conta uma parte da história


O governo organizou uma sessão de cinema antes de entregar ao STF o vídeo da reunião ministerial de 22 de abril. Ao estudar o conteúdo da gravação, Jair Bolsonaro decidiu bater na tecla de que não usou as palavras "Polícia Federal" ou "superintendência" naquela conversa.

O objetivo do presidente é dizer que aquelas imagens não provam nenhuma tentativa de interferência, mas a fita só conta uma parte da história. Antes de adotar a nova linha de defesa, Bolsonaro já havia afirmado publicamente que tinha problemas particulares com a PF.

Há oito dias, o presidente parou na portaria do Palácio da Alvorada para rebater o depoimento de Sergio Moro sobre o caso. Bolsonaro admitiu que tinha interesse em trocar o chefe do órgão no Rio e justificou: "tentaram colocar na conta" dele e de seus filhos Flávio e Carlos o assassinato de Marielle Franco —e a PF não teria investigado o assunto.

O presidente não explicou por que aquele seria um motivo para mexer na superintendência, em vez de esperar a conclusão das apurações. Ele também não quis esclarecer por que havia confrontado Moro com a notícia de uma investigação contra deputados aliados com a mensagem: "mais um motivo para a troca".

Bolsonaro quer mudar o ambiente dessa discussão. Preventivamente, ele passou a insinuar que seu grupo político sofre perseguição. Soa irônico que, na posse do novo ministro da Justiça, ele tenha adotado uma visão exageradamente positiva da PF ao dizer que o órgão "não persegue ninguém, a não ser bandidos".

Depois que o vídeo da reunião de abril foi exibido aos investigadores, Bolsonaro alegou que só se referiu a sua família para demonstrar preocupação com a segurança dos parentes. É uma versão nova, que não havia aparecido em outras explicações.

O presidente lembrou que a interpretação dessas declarações "vai da cabeça de cada um". O governo só se importa com uma, a de Augusto Aras. Nos últimos dias, o presidente sugeriu a auxiliares que pode indicar o procurador-geral para o STF.

Bruno Boghossian
Jornalista, foi repórter da Sucursal de Brasília. É mestre em ciência política pela Universidade Columbia (EUA).

Fogo morto - PAULO DELGADO

ESTADÃO - 13/05

Presidente como coronel de engenho queimando seu poder no bagaço das perfídias em extinção


Como um Ranger no Vietnã, sem estratégia, subestimando adversário e adepto do comando sem controle, o presidente não liga para a relação entre aceleração e derrapagem. No jogo das cartas ocultas se sente o controlador que opera com inteligência falsa para ativar análises estapafúrdias sobre ele: importante não é o que faço, é como os outros reagem ao que faço.

O coronavírus desmilitarizou o patriotismo e fez da área da saúde o lugar onde a Pátria observa seus heróis. O soldado, sem capacidade crítica, levou para o lado pessoal e afogou o médico no rio do ciúme eleitoral. Para chegar à outra margem sem processar a frustração de não mandar, xingou o juiz, ameaçando seu reino por um cavalo de Troia na PF-RJ – onde condomínio, porto, milhões e facções, mais hackers familiares, formam os nós da rede que o atormenta.

Cada reação de um Poder contra o outro o ajuda a compor o rosto Frankenstein da democracia como a concebe. Não é nada sofisticado, nem exige força bruta aparente. O que observa é a água que ferve, não o fogo que a estimula. E vê a umidade infiltrar-se na casa velha do presidencialismo como um teste para calibrar o grau de imunidade à lei que precisa alcançar. Dança na chuva: não é dilúvio, também não é garoa.

A tática que adota é crua e combina autoconfiança e afronta. Já tossiu na frente de apoiadores, agride jornalistas com frequência, berrou impropérios em frente ao Quartel-General, entrou no Supremo sem bater na porta, passa na conversa terno, farda, paisano. Testou a frieza do coração sem luto propondo disfarçar a morte em churrasco funerário. Cancelou, trocou por pedalinho. O ritual perverso transcendia a necessidade de comer o outro.

Procura, obstinadamente, compartilhar o estopim: como é inútil para o mau agir se não puder confiar nos bons.

O presidente é o mais ostensivo usuário dos defeitos do presidencialismo no período democrático. Seu governo, um círculo de giz sobre a cabeça da Nação, é uma equação ainda obscura para a maioria: só é possível alguém agir assim em regime não sério assim. Ele finge querer mudar o padrão que a cada governo acrescenta uma doença. Conhece a lógica da coisa: conduz todos para a cozinha e os submete ao tempero do poder. Busca convencer os comensais a não ler o cardápio constitucional.

Como todos estão vendo, ele está desatarraxando devagar o parafuso da porca dos costumes como antidemocrata tarimbado, calculadamente. A Justiça, que alimenta os seus com suas férias de três meses, nada sabe dos males que a ferrugem dos privilégios na engrenagem dos tribunais provoca. Juiz de televisão costuma ser raso em equidade e temperança, usa mal a chave de fenda que aperta a porca do parafuso do arbítrio. Para se precaver a Câmara, ajuizada, deixa o Supremo escrever o roteiro do enredo.

O estilo ultrarrealista que pratica tem uma fermentação que apodrece o ambiente a que se dirige. Em especial quando acaba destampando o código secreto por trás das coisas em que mete o nariz. Realmente, “amor à primeira vista” parece ser um código. Porque não tem preço a sensação de receber do STJ a aprazível sentença de que presidente da República é simples e do povo e não deve satisfação sobre sua vida. Um Meu Pé de Laranja Lima judicial é o melhor laissez-passer para quem quer mobilidade para agir sem ser incomodado.

Aparentemente, não há padrão. Mas para analisar as reações que provoca ele indica o alvo e personifica o ataque. Entender o porquê da escolha desses alvos não é a linha da análise mais correta. Os alvos – imprensa, Congresso, Forças Armadas, Supremo, empresários, governadores, oposição, economia, coronavírus – dizem menos sobre ele do que sobre as coisas e as reações que provoca quando ataca, elogia, insinua, recua, desconversa.

Ele quer ter o controle da resposta no mesmo lugar ou situação onde acha que pode ser paralisado. O déficit de moralidade que procura nas instituições é necessário ao seu controle. Ele sente que precisa de mais acesso aos detentores de cargo público, um grupo específico que conhece bem e tende à incoerência a cada eleição.

Está atrás de fragmentos naqueles lugares da capital que fedem à dissidência política onde são costurados os pecados e que poderiam compor o padrão dos usuários do Estado, essencial para montar seu quebra-cabeças. Precisa agir rápido para que o oportunismo veja mais vantagens em aderir a ele do que ser engolfado pelas vantagens que a distorções da democracia presidencialista oferecem.

O presidencialismo é um prédio condenado, pichado, onde cada um que entra nele se instala em seu andar lixando-se para a opinião pública. É desse imóvel reformado, que vem desabando pouco a pouco, que o País é dirigido há mais de 30 anos. Foi ali que o humano-inesperado esbarrou no muro do coronavírus e encontrou como síndico do espigão um presidente ambicioso que roda como biruta.

Um presidente ardendo em fogo morto, misturado nas cinzas do arcaico presidencialismo brasileiro, como se fosse um coronel dos velhos engenhos de cana queimando seu poder no bagaço das perfídias em extinção.


Bolsonaro falava de segurança familiar? Lorota! É tarefa do GSI, não da PF - REINALDO AZEVEDO

UOL - 13/05

Bolsonaro ensaia explicação na rampa: "Nem falei Polícia Federal". Não agrediu os jornalistas!!! Olhem os coleguinhas aglomerados. Cuidado com o vírus!


Sei lá que malabarismo verbal vão tentar para evidenciar que, na reunião-tarja-preta no dia 22 de abril, ao falar sobre sua família, o presidente Jair Bolsonaro estaria preocupado, na verdade, com a segurança pessoal da turma. Na entrevista que concedeu a jornalistas no alto da rampa — cuidado com o corona, moçada! —, o presidente insistiu que não pronunciou a expressão "Polícia Federal" naquela oportunidade. Temos de assistir ao vídeo, não é mesmo? Em seus respectivos depoimentos, os generais Braga Netto (Chefe da Casa Civil) e Augusto Heleno (Gabinete da Segurança Institucional) dizem não ter percebido a pressão sobre Sérgio Moro e endossam a versão de que Bolsonaro estava preocupado com familiares.

Sim, é complicado falar sem ver o vídeo. Agora, a coisa não faz sentido. Quando, ao tratar do assunto, o presidente ameaçou demitir todo mundo, inclusive o ministro, estava, afinal, a falar com quem? Essa pergunta é importante em razão de um fato concreto.

GSI FAZ SEGURANÇA DA FAMÍLIA, NÃO PF

A Polícia Federal nada tem a ver com a segurança dos familiares do presidente. O que Moro tem com isso além de nada? Essa é uma atribuição do Gabinete da Segurança Institucional. Assim já era no governo Temer, com a Lei 13.402, de 1º de novembro de 2017. Ela foi inteiramente revogada pela Lei 13.844, de 18 de junho de 2019 -- já sob o governo Bolsonaro.

E o zelo com a segurança de presidente e familiares continuou com o GSI. Está precisamente no "Item 2" da "Alínea a" do Inciso VI do Artigo 10 da referida lei. Assim, pergunta-se: se Bolsonaro deu algum chilique, preocupado com a segurança de familiares, ameaçando com demissão, então o ameaçado era o general Heleno? Não, ne?

O que parece é que se está diante de uma linha de defesa, não é? Sem ver a fita, dá para a gente fazer algumas ilações consistentes. Todo mundo sabe que Bolsonaro é o rei do "cogitus interruptus". Suas conversas não costumam ter muito foco. Ele dá saltos lógicos no que respeita à linguagem, mistura tempos, eventos, coisas de naturezas distintas. Trabalhar com ele deve ser um inferno, especialmente quando tem alguma cisma.

É possível que tenha tido um desses ataques, que vão largando palavras soltas pelo meio do caminho. Exceção feita aos respectivos depoimentos dos militares e ao próprio Bolsonaro, os que se lembram daquela reunião entenderam que o alvo da sua bronca era Moro. E que, quando empregou o verbo "foder" para significar "pôr sua família em risco", estava se referindo à Polícia Federal. O presidente se apega agora ao que seria um detalhe: não teria pronunciado a expressão.

O ministro Celso de Mello, relator do caso no Supremo, terá acesso à transcrição da reunião. Há o risco de que, sem ver o filme, não consiga entender direito o que aconteceu. De toda sorte, há esta questão primária: o que tinha a PF a ver com seus filhos, além de nada? O que há no Rio, aí sim, é a investigação do caso Marielle e a da rachadinha da Assembleia. Mas ambas são conduzidas pela Polícia Civi.

PARANOIA

É notória, no entanto, a paranoia do presidente, especialmente depois que passou a desconfiar -- e com razão nesse caso -- que Moro quer para si a cadeira em que ele senta. Depois de entregar ao ex-juiz poderes que um ministro da Justiça nunca teve, Bolsonaro começou a ficar com medo de ser investigado na surdina. O "foder" a família, no caso, tem tudo para ser o temor de que, de súbito, pudesse eclodir uma operação da Polícia Federal tendo filhos ou aliados seus como alvos.

Exceção feita a Carlos, que é vereador do Rio fora do Rio, os outros dois políticos da família têm foro no Supremo; o deputado Eduardo e o senador Flávio. E qualquer ação que envolvesse, por exemplo, mandado de busca e apreensão contra a dupla teria de contar com a autorização de um ministro do Supremo. Não podem, de resto, ser presos a não ser em flagrante de crime inafiançável (Parágrafo 2º do Artigo 53). Ocorre que Bolsonaro acredita que há um núcleo de conspiração contra ele também no Supremo.

Será muito difícil ao presidente convencer o distinto público de que se referia à segurança pessoal de seus familiares. Há uma lei a respeito. Elaborada pelo próprio gabinete de Bolsonaro e aprovada pelo Congresso. E quem cuida da área é o GSI do general Heleno, não a ex-Polícia Federal de Moro. Ou a Polícia Federal do ex-Moro. Ou a ex-Polícia Federal do ex-Moro.

Bolsonaro revela-se um chefe de organização familiar - JOSIAS DE SOUZA

UOL - 13/05




Imagem: Roberto Jayme/Ascom/TSE


Jair Bolsonaro chegou à Presidência surfando a irritação do eleitorado com as organizações criminosas que saquearam o Estado brasileiro. Prevaleceu no tranco, sem máquina partidária. No poder, revelou-se chefe de uma organização familiar. Desfiliou-se do PSL. Seu partido é a família.

Durante a campanha, quando questionado sobre planos de governo, Bolsonaro repetia um versículo do Evangelho de João: "Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará." O caso da PF traz à tona uma verdade dura de roer: a agenda secreta do presidente é o favorecimento do seu clã.

Confirmou-se o que revelara Sergio Moro, autoconvertido em delator à espera de receber um prêmio em 2022. Bolsonaro foi mesmo gravado em reunião ministerial trombando com seu ministro da Justiça para trocar o chefe da Polícia Federal no Rio de Janeiro.

Transgressor didático, Bolsonaro abdicou dos métodos tradicionais de ocultamento. Espalhou as pistas que agora facilitam a reconstituição dos seus movimentos. Agiu com espalhafato.

Na reunião ministerial de 22 de abril, diante das câmeras e de três dezenas de autoridades, o presidente sapecou um palavrão. E declarou que não esperaria que sua família e seus amigos fossem prejudicados para trocar a chefia da PF no Rio, berço de suas aflições.

Em vez de libertar, a verdade das urnas acorrentou o país ao líder de uma dinastia com a imagem já bem rachadinha. Gente amiga de um tal Fabrício Queiroz, que tem conhecidos no ramo das milícias, muito pujante no Rio.

Desde o ano passado, Bolsonaro emitia sinais de que não mediria esforços para continuar sendo, à sua maneira, um ótimo pai. Não chegou a fornecer bons exemplos. Mas espalhou fabulosos avisos.

"Lógico, pretendo beneficiar filho meu, sim. Pretendo, se puder, dar filé mignon", declarou o capitão, na época em que tentou emplacar o Zero Três Eduardo na poltrona de embaixador do Brasil em Whashington.

Num esforço para proteger o Zero Um Flávio, o capitão desligou o Coaf da tomada, transferindo-o das mãos de Sergio Moro para os fundões do Banco Central.

Ultimamente, Bolsonaro anda inquieto com um inquérito sobre fake news, que roça os calcanhares do Zero Dois Carlos no Supremo Tribunal Federal. Coisa relatada pelo ministro Alexandre de Moraes.

A família é como varíola, ensinou Jean-Paul Sartre. "A gente tem quando criança e fica marcado para o resto da vida." Na organização familiar dos Bolsonaro, quem sai aos seus não endireita.

O pai abriu caminho na política. Vieram os filhos: um vereador, um deputado e um senador. Está no forno a candidatura do Zero Quatro Renan. Na filhocracia, os Bolsonaro não se sentem pessoas públicas. O país é que lhes atrapalha a vida privada, 100% bancada pelo patrimonialismo.

A democracia apodrece na república dos poltrões - JOSÉ NÊUMANNE

ESTADÃO - 13/05

Bolsonaro dá sinais de que quer autogolpe, mas falsos democratas só reagem em notas inócua


Em 19 de abril, Dia do Exército, o presidente da República tomou café com os filhos 01, 02 e 03 e foi ao Quartel-General da Força, à frente do qual discursou para manifestantes que carregavam cartazes, entre os quais um clamava: “Intervenção militar já com Bolsonaro”. O ato reivindicava novo Ato Institucional n.º 5 para fechar o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF). Ali, entre acessos de tosse, afirmou: “Eu estou aqui porque acredito em vocês”. A Polícia do Exército garantiu a segurança dos presentes. E nenhum golpista foi preso em flagrante. O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu e o STF autorizou inquérito para investigar quem organizou, financiou e compareceu ao ato, mas omitiu o nome dele. Ninguém foi processado e preso por ter violado a Lei da Segurança Nacional, incorporada à ordem legal vigente. No dia seguinte, parodiou Luís XIV: “Eu sou a Constituição”.

Em 30 de abril, proibido de empossar na chefia da Polícia Federal (PF) Alexandre Ramagem, seu segurança na campanha e amigo de seu filho 02, por liminar dada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, Bolsonaro chamou a decisão de “canetada política”, em insulto inédito de chefe de um Poder a ocupante de outra instituição sediada na Praça dos Três Poderes.

Em 3 de maio, profissionais da saúde protestaram em silêncio naquela praça contra a inércia do governo federal em relação à pandemia de covid-19. Marluce Gomes fez parte do grupo de bolsonaristas que reagiu à manifestação e insultou uma de suas participantes: “Quando a gente sente o cheiro de quem não passou perfume, a gente entende o tipo de pessoa que você é”. Identificada pelo Conselho Federal de Enfermagem, ela foi processada. Na terça-feira 5, ela iria ao cercadinho, que o chefe do governo usa como tribuna de fala do trono, para homenageá-lo em altos brados. No ataque aos heróis populares, que, ao contrário do “Mito”, arriscam a vida para enfrentar o contágio do novo coronavírus, ela teve a companhia de Renan Sena. Este agrediu um manifestante e é empregado de uma empresa que presta serviços ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (!), de Damares Alves, por R$ 20 milhões. O empresário Gustavo Gayer completa o trio identificado. Não há notícia de que seu idolatrado condottiere os tenha recriminado.

No dia seguinte, domingo 4 de maio, Sua Excelência voltou a se dirigir a manifestantes antidemocráticos da rampa do Palácio do Planalto, símbolo do poder nesta insana República. Mais uma vez, os golpistas não foram abordados pela polícia, cujo superior hierárquico é Ibaneis Rocha, advogado trabalhista e governador do Distrito Federal, que decretou isolamento social e passou um fim de semana em Maceió (AL) com um grupo de amigos. Uma vez mais, o procurador-geral da República não incluiu o nome de Jair Messias no inquérito, autorizado pelo STF.

Na segunda-feira 8 de maio, o chefe do Poder Executivo arrebanhou um grupo de dirigentes de associações sindicais de industriais, que compareceu a seu gabinete para cobrar medidas por ele prometidas três semanas antes à Confederação Nacional da Indústria para uma saída organizada do isolamento social. Em vez de lhes dar satisfação, liderou uma caravana até o outro lado da praça, numa réplica da Marcha sobre Roma, com que Benito Mussolini instalou a ditadura fascista na Itália, em 1922. Foi recebido pelo amigão Dias Toffoli na presidência do STF e este lhe avisou que a responsabilidade sobre o pedido dos empresários era do presidente da República, e não da Justiça. A invasão da cúpula do Judiciário foi transmitida ao vivo em live em rede social.

Ontem, por decisão do decano do STF, Celso de Mello, autoridades e advogados representando o presidente da República, a PGR, a PF, o STF e o ex-ministro da Justiça Sergio Moro viram o vídeo de uma reunião do tal Conselho de Governo, com 30 membros, como parte do inquérito aberto a partir de acusações que o ex-auxiliar lhe havia feito ao pedir demissão. Não faltam vexames: o presidente ameaçando o ex-ministro de demissão, o ministro da (falta de) Educação insultando as homenageadas no domingo 10 pelos membros do STF, o chanceler acusando a China de ter usado o novo “comunavírus” para dominar o mundo e o chefão de todos cobrando de Moro não ter falsificado o atestado de óbito de um agente da Polícia Rodoviária Federal morto por covid-19.

Sua obsessão em debochar da pandemia chegou ao extremo de anunciar um churrasco no sábado 9 de maio, quando o total oficial de óbitos ultrapassou 10 mil. E depois dizer que foi um anúncio fake para desmoralizar repórteres “idiotas”. E passeou de jet ski no Lago Paranoá, enquanto a princesa Sofia, da Suécia, atendia pacientes de covid-19 num hospital em Estocolmo.

Apavorada, a Nação pergunta até quando falsos pais da Pátria, que deviam defender o Estado de Direito com fatos, vão se abrigar em notas oficiais inócuas, enquanto ele inspira canalhas que chutam ataúdes e desonram a Bandeira Nacional hasteada a meio mastro em luto pelas vítimas de um genocida ignorante, perverso e insensível.

JORNALISTA, POETA E ESCRITOR

As cartas do Centrão - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 13/05

Bolsonaro negocia com partidos que, sem nenhum compromisso com o interesse público, fazem da política balcão de negócios


Não bastasse a pandemia do novo coronavírus, o presidente Jair Bolsonaro criou mais um elemento a gerar preocupação sobre o futuro do governo e do País. Na tentativa de se proteger de eventual abertura de processo de impeachment, bem como de barrar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar suas irresponsabilidades, o presidente da República passou a negociar pessoalmente com o chamado Centrão – o bloco de partidos que, sem nenhum compromisso com o interesse público, faz da política um balcão de negócios.

Conforme revelou reportagem do Estado, o objetivo do Centrão é a liberação de recursos públicos, com o abandono por parte do governo federal de seu compromisso com o equilíbrio das contas públicas. Sinônimo de fisiologismo e habituado a não ter especiais pudores em suas negociações, o bloco de legendas tem claro o que deseja do presidente Jair Bolsonaro.

Ciente de que o Palácio do Planalto tem o controle das artilharias virtuais contra seus adversários políticos, o Centrão exige, em primeiro lugar, um cessar-fogo das redes bolsonaristas. Ainda que sua trajetória parlamentar seja umbilicalmente unida aos partidos do Centrão, desde a campanha presidencial de 2018, Jair Bolsonaro valeu-se da rejeição popular à compra e venda de apoio parlamentar, e prometeu instaurar uma forma de fazer política. Agora, o Centrão está cansado do tratamento abusivo que recebeu nos últimos dois anos e prescreve, se o presidente de fato almeja apoio no Congresso, a interrupção dos ataques, numa política de mais moderação e diálogo. O Centrão é especialista neste diálogo que, acima de tudo, é um intenso e profícuo comércio.

O Centrão pode ser criticado por inúmeros defeitos, mas não o da ingenuidade. Sabe que, para a concretização dessa troca de apoio e favores, é preciso que as partes honrem a palavra – e, nestes 17 meses de governo, o presidente da República não foi pródigo em exemplos nesse sentido. Na realidade, Jair Bolsonaro fez-se insistentemente refém de quem grita mais alto, mesmo que a voz altiva fosse apenas a de seus devaneios. O Centrão não é afeito a esse tipo de inconstância. Para entregar o tão desejado apoio político no Congresso, quer ver antes o presidente Bolsonaro cumprindo sua palavra.

Mas tudo isso são meras condições prévias diante do real objeto de desejo do Centrão. Em sua aproximação de Bolsonaro, o bloco vislumbrou um jeito de assegurar sua sobrevivência eleitoral. A solução não tem nada de inovadora, mas simples cópia do que, anos antes, o presidente Lula fez de forma tão sistemática. O Centrão quer que o governo federal abra as torneiras do Tesouro, irrigando com fartos recursos públicos o cenário eleitoral, especialmente no Nordeste.

Parlamentares do bloco já falam abertamente, por exemplo, em tornar permanente o auxílio emergencial de R$ 600 a informais e de ampliar o valor do benefício pago a empregados com carteira assinada afetados por redução de jornada e salário ou pela suspensão do contrato de trabalho. A jogada é clara: que o “corona voucher” possa ser o que foi o Bolsa Família, em termos eleitorais, durante os anos em que o PT esteve no governo federal.

Além de não ser ingênuo, o Centrão sabe que não há recursos públicos suficientes para a empreitada. Mas ele não se melindra com a origem do dinheiro e tem uma sugestão para contornar essa dificuldade – a emissão de moeda. Eis o cenário ideal para as aspirações do Centrão: um presidente da República que faz de tudo para se enfraquecer diariamente e ainda se mostra disposto a imprimir dinheiro. É modalidade de saque sem limite.

A concretização do acordo de Jair Bolsonaro com o Centrão representa o abandono da política prometida na campanha, escanteando a um só tempo o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Tal como Lula e Dilma fizeram, o tal pacto levaria o País à garra por meio da irresponsabilidade fiscal, tudo em troca de apoio político-eleitoral. De forma trágica e dolorosa, o País vê como bolsonarismo e lulopetismo são semelhantes, se não nos meios empregados, certamente quanto aos fins que almejam.

É constrangedor o desrespeito com que Jair Bolsonaro trata os brasileiros – e tudo isso, no meio de uma pandemia.

Os palavrões no Conselho de Governo - ELIO GASPARI

O GLOBO/FOLHA DE SP - 13/05

Bolsonaro presidiu uma conversa de botequim em reunião do conselho do governo

O bolsonarês humilha aqueles que votaram no capitão em nome dos bons costumes


Quando Sergio Moro pôs na roda a questão do vídeo da reunião do conselho de governo de 22 de abril, sabia que havia ali uma bala de prata capaz de provar que Jair Bolsonaro queria trocar o diretor da Polícia Federal para blindar os interesses políticos de sua família. Ele sabia também que a bala continha outro material.

Ao chegar ao Planalto, com pompa monarquista, o capitão chamou de conselho de governo aquilo que se conhecia como reunião do ministério. Reunindo-o, ele presidiu uma conversa de botequim, e Moro mostraria isso.

A divulgação desse áudio será também um espetáculo de falta de compostura e de asneiras. Outro dia a secretária da Cultura, Regina Duarte, disse que parou de ler os livros de Olavo de Carvalho porque ele usa muitos palavrões. No governo que ela louva, o vocabulário do doutor Olavo é o de um sacristão.

Alguns presidentes respeitavam seus interlocutores. Michel Temer, Fernando Henrique Cardoso e José Sarney falam como frades. Não se pode dizer o mesmo de Dilma Rousseff e Lula, mas nenhum deles disse palavrão em reunião ministerial.

Conhecem-se os áudios das reuniões do Conselho de Segurança Nacional que decidiram baixar o Ato Institucional número 5 (Costa e Silva) e o Pacote de Abril (Ernesto Geisel). Neles não há palavrões.

O primitivismo de Bolsonaro vai além do uso de expressões chulas, transborda para a própria maneira como preside uma reunião de ministros e como lida com sua equipe de renomados “técnicos”.

Em certa ocasião ele manifestou tamanha curiosidade por detalhes de casos de violência que um dos titulares achou melhor mudar de assunto. O clima de feijoada permite que o chanceler Ernesto Araújo exponha (em bom português) suas teorias lunáticas em relação à China ou que alguém resolva qualificar a genealogia de ministros do Supremo Tribunal Federal.

É a bagunça bolsonariana. Nela o presidente libera o funcionamento de academias de ginástica e salões de beleza sem ouvir seu ministro da Saúde. Afinal, ambos sabem com quem lidam.

O vídeo da reunião de 22 de abril é um exemplo da capacidade de autocombustão do governo. Já com Moro fora, Bolsonaro disse que divulgaria seu conteúdo: “Mandei legendar e vou divulgar”.

Falou o que lhe veio à cabeça, mas dias depois a Advocacia-Geral da União pediu ao ministro Celso de Mello que reconsiderasse a decisão de pedir a gravação porque na reunião foram tratados “assuntos potencialmente sensíveis e reservados de Estado”. Parolagem, pois podia ter pedido para embargar esses trechos. Essa é a prática de governos sérios, mas quem embarga trechos assina embaixo e se responsabiliza pelo ato.

Diante da blindagem absurda, a AGU recuou e disse que se contentava em entregar uma versão com trechos embargados. Não deu certo. Sergio Moro e seus advogados não aceitaram o atalho, argumentando que não compete ao governo selecionar provas. Caberá ao ministro Celso de Mello decidir se torna público todo o vídeo ou partes dele.

Se Moro quisesse apenas provar que Bolsonaro pressionou-o para trocar o diretor da Polícia Federal, o embargo seria neutro e justificável. Ele também queria mostrar como funciona a muvuca em que se meteu.

Elio Gaspari
Jornalista, autor de cinco volumes sobre a história do regime militar, entre eles "A Ditadura Encurralada".

A noção do essencial - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 13/05

Com decreto descabido para a abertura de salões, Bolsonaro aposta no desgoverno


Poucas cenas ilustram tão bem o desgoverno da administração Jair Bolsonaro na crise do coronavírus quanto a reação do ministro da Saúde, Nelson Teich, ao ser informado de que seu chefe acabara de anunciar a inclusão de academias esportivas, barbearias e salões de beleza no rol de serviços essenciais a serem mantidos na pandemia.

Surpreendido pela notícia enquanto concedia uma entrevista coletiva de imprensa na segunda-feira (11), um balbuciante Teich ainda tentou explicar de forma constrangedora aquilo que seria inconcebível em outros tempos —a decisão amalucada fora tomada sem consulta a sua pasta.

Mais que impor uma humilhação ao subordinado, o decreto presidencial deixa claro que se mantém firme a infame estratégia bolsonarista de tentar sabotar esforços estaduais e municipais para controlar a disseminação do Sars-CoV-2.

Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que prefeitos e governadores gozam de autonomia para determinar tanto medidas de quarentena como fixar os serviços aptos a seguirem funcionando.

Em outras palavras, o presidente sabe que não possui o poder para impor sua vontade nessa questão, e age apenas como o provocador cínico e incendiário que sempre foi. Fomenta a confusão, estimula a desobediência e excita as hostes que bradam em carreatas pela reabertura do comércio.

Depois de diversos estados anunciarem que irão ignorar o decreto, Bolsonaro voltou à carga. Sugeriu que a reação dos governadores afronta o Estado democrático de Direito e “aflora o indesejável autoritarismo no Brasil” —tratando com a costumeira leviandade de valores, esses sim, essenciais.

Medidas e declarações desencontradas —e, sobretudo, o descaso— do Executivo federal se enquadram naquilo que o diretor-executivo da Organização Mundial da Saúde classificou de “séria cegueira” de certos governos, não nominados, diante da Covid-19.

Não parece ser coincidência que, entre as dez nações com maior número de mortes, apenas o Brasil de Jair Bolsonaro e os EUA de Donald Trump não tenham adotado políticas de alcance nacional.

Impossível, assim, dissociar a omissão governamental do curso preocupante que a epidemia vem tomando no país. Como constatou reportagem desta Folha, na semana passada o aumento diário do número de mortes aqui se dava em taxa superior à de países europeus em estágio similar da crise.

Nada, no entanto, que faça mudar as prioridades do presidente.

O risco da democracia - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 13/05

Toffoli e ministros militares são lenientes com Bolsonaro


A versão mais recente do Palácio do Planalto sobre o vídeo da reunião ministerial em que o presidente Bolsonaro ameaçou demitir o então ministro Sergio Moro dá conta de que o presidente se queixava da segurança pessoal dele e de sua família. Sem saber o contexto em que se deu a discussão, pois o vídeo ainda não foi liberado, pode-se afirmar, no entanto, que Moro seria o interlocutor errado, pois a segurança do presidente e família é feita pelo Exército e pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin), e o responsável é o General Augusto Heleno, que estava na reunião e não foi admoestado pelo presidente.

Além do mais, quem foi demitido foi o diretor-geral da Polícia Federal, e por tabela o ministro Sergio Moro. Outro ponto interessante é que o delegado Alexandre Ramagem, que foi indicado por Bolsonaro para chefiar a Policia Federal, era o chefe da Abin. Portanto, se a queixa de referia à segurança pessoal, cuja responsabilidade era de Ramagem, por que indicá-lo para a PF? .

A exibição integral da reunião ministerial servirá para confirmar a acusação de Moro ao deixar o ministério da Justiça, como também para se constatar de que maneira o presidente Bolsonaro conduz os destinos do país. Pelos relatos, um autoritarismo sem controles, e um ambiente de desrespeito a seus ministros que, para agradar o presidente, não apenas aceitam os maus tratos como tentam imitá-lo, usando palavras chulas e atacando sem distinção países e instituições.

O presidente Bolsonaro quer constranger as forças democráticas que impõem limites a qualquer presidente da República, porque quer fazer um governo mais liberado dessas limitações, um perigo, porque é exatamente o que Hugo Chavez fez na Venezuela, constranger até controlar os Poderes, e usar a democracia direta para impor as suas vontades.

O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, e os ministros militares estão sendo lenientes com Bolsonaro e, nessa toada, começaremos a abrir mão dos freios que a democracia representativa impõe ao presidente.

O presidente da Câmara Rodrigo Maia claramente não quer aparecer como o grande inimigo de Bolsonaro, o homem que vai autorizar o impeachment, e o STF, embora tenha tomado decisões ultimamente seguras e restringido abusos, através de seu presidente está condescendente com as atitudes de Bolsonaro. Muito preocupante nesse sentido a entrevista que deu ao programa Roda Viva, onde tentou explicar a ida de Bolsonaro ao STF.

Disse que não se sentiu constrangido, e que entende perfeitamente que Bolsonaro governa para os seus, para os radicais que o elegeram, que tenta trazer radicais para o centro, e que nunca fez nada de concreto contra a democracia. Disse também que as pessoas querem uma democracia mais direta, o que chamou de “uberização da política”, e o que está em jogo é a democracia representativa. É aí que mora o perigo, é exatamente o que o Chavez fez na Venezuela.

Na democracia direta, é possível manipular plebiscitos, consultas, referendos, e o presidente começa a ser autorizado a fazer coisas que o STF e o Congresso não autorizariam. O ministro Luis Fux vai assumir a presidência do STF em setembro, e espero que tenha visão de Estado maior do que a que Toffoli está demonstrando.

Pesquisa de ontem da Confederação Nacional dos Transportes (CNT) e MDA diz que aumentou o nível de pessoas que consideram o governo ruim ou péssimo, mas Bolsonaro mantém os 30 por cento favoráveis. Ontem, por exemplo, fez manifestação contra a ideologia de gênero nas escolas. No meio dessa pandemia que cresce brutalmente, no dia em que chegamos ao nível de 800 mortes diárias, e a mais de 12 mil mortos durante a pandemia. Faz isso apenas para alimentar os seus radicais, o núcleo duro de seus eleitores, e se manter competitivo em 2022.

Se o Congresso estivesse reunido presencialmente, acho que o ambiente político estaria muito mais conturbado, porque ele registra a pulsão da sociedade. Mas do jeito que está, funcionando virtualmente, e o isolamento social fazendo com que só maluco vá para a rua se manifestar, a maioria do povo brasileiro, que condena o governo Bolsonaro, está sem poder se manifestar, o que é um perigo para a democracia representativa.

Vídeo de Bolsonaro parece uma confissão - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 13/05

Confirmados os fatos, inquérito precisa prosseguir para o bem das instituições republicanas


O vídeo da reunião ministerial de 22 de abril, em que, segundo o ex-ministro Sergio Moro, o presidente Bolsonaro confirmou que faria tudo para substituir Maurício Valeixo na diretoria-geral da Polícia Federal, inclusive demitir o ministro da Justiça e Segurança Pública, superior hierárquico de Valeixo, era a peça final de um quebra-cabeça já conhecido no seu conteúdo. O relato público que Moro fez no dia 24, dos motivos de sua saída, sem responder a perguntas da imprensa, já trazia o entendimento de que o presidente queria ter na Polícia Federal, na cúpula e/ou na superintendência do Rio de Janeiro, pessoas com as quais ele pudesse obter informações e relatórios de inteligência, o que não é função da PF, uma polícia que trabalha em inquéritos instaurados pela Justiça. Bolsonaro queria privatizar a PF.

A íntegra do vídeo, pedida pelo ministro do Supremo Celso de Mello, presidente do inquérito sobre as denúncias de Moro, conduzido pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, foi exibida ontem em Brasília para Moro e seus advogados, além de representantes da Advocacia-Geral da União (AGU), do lado do presidente, policiais e procuradores. A divulgação restrita — o vídeo continua sob sigilo — completou uma cena não surpreendente, mas o fez com um bônus. Segundo relatos, o presidente aparece, como afirmara Moro, dizendo que substituiria o então diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, a quem Moro resistia a afastar, e que poderia demitir o próprio ministro. O bônus veio na declaração de que ele queria defender sua família. Tudo ficou explícito, a se confirmar o conteúdo do vídeo.

A explicação também não é uma surpresa, mas tem grande impacto político e ético ao sair da boca de Bolsonaro. Soa como confissão. A preocupação do presidente com os filhos é conhecida. E motivos existem. Bolsonaro assumiu a Presidência quando Flávio, eleito senador pelo Rio, passara a ser investigado no escândalo da “rachadinha”, ocorrido na Alerj, em que Flávio e outros deputados foram apanhados num esquema de recolhimento de parte dos salários de assessores, segundo denúncia do Ministério Público. No caso do hoje senador, uma operação a cargo do desaparecido Fabrício Queiroz.

A PF não está neste caso. Mas atua em dois inquéritos que correm sob a presidência do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, que investigam esquemas de distribuição de fake news e de ameaças contra o Supremo e ministros da Corte; e ainda os esquemas de financiamento e organização das manifestações antidemocráticas, apoiadas pelo presidente e clã. Moraes se tornou um alvo ainda mais prioritário de milícias bolsonaristas por ser quem concedeu liminar pedida pelo PDT contra a posse do delegado Alexandre Ramagem no lugar de Valeixo, com o argumento de “desvio de finalidade”. Indiscutível, pois em nenhum momento Bolsonaro escondeu que teria no chefe de sua segurança durante a campanha alguém com quem pudesse “interagir”. Entenda-se, obter informações privilegiadas sobre adversários políticos, por exemplo. Esta é uma possibilidade a não ser descartada. A história de ditaduras latino-americanas ensina o que pode acontecer quando aparatos de segurança pública passam a servir a caudilhos, autoritários por definição.

Nesses dois inquéritos, os filhos “02”, o vereador Carlos, e “03”, o deputado Eduardo, poderiam estar citados. Além, é provável, de suas conexões com o “gabinete do ódio” que atuaria no Planalto, usina de articulação de ataques virtuais, e nem por isso menos criminosos. O presidente, já no final do dia de ontem, em um arremedo de entrevista dada do alto da rampa do Planalto, procurou afastar a família de qualquer investigação da PF.

Só o prosseguimento deste inquérito — se o procurador-geral, Augusto Aras, não arquivá-lo intempestivamente — poderá esclarecer. Independentemente da família presidencial, interessa averiguar esta tentativa de interferência política e pessoal em um aparato de segurança do Estado, para que as devidas punições impeçam que isso se repita e faça o Brasil retroceder no processo civilizatório.