FOLHA DE SP - 30/12
Naquela noite especial, se colocariam em círculo ao redor do fogo para ouvir os sons do pai de todos
Um monte de corpos que se mexiam e dançavam. Outros, mortos. O cheiro já adocicado da carne subia aos céus. Crianças brincavam se cobrindo de sangue enquanto velhas tentavam controlá-las. Mulheres, atarefadas, cuidavam de uma delas que, de pernas abertas, tentava pôr para fora um bebê.
Entre as pernas, líquidos escorriam e o cheiro de mulher tomava conta do bando. Alguns homens sentiam um prazer especial com isso, e queriam se aproximar dela para lamber suas pernas. O sangue de mulher tinha um gosto poderoso.
Em meio aos gritos da infeliz, outros homens se aproximavam carregando mais corpos. Estes eram vistos pelas mulheres como homens mais desejáveis, e não aqueles que tentavam a todo custo devorar a infeliz no meio das outras. Alguns olhavam para a infeliz e riam de sua agonia. Outros, menos ruidosos, faziam sinais para que os mais barulhentos se calassem e ouvissem o choro da mulher em silêncio. Havia algo de reverência neste silêncio.
Por alguns instantes, paravam diante da cena, e tudo parecia suspenso no tempo. Derrubavam os corpos no chão e quase choravam junto com ela.
Na rotina do dia a dia, aquela era uma noite especial. A vida era uma somatória de dias e noites que se repetiam. Mas aquela noite era especial. Logo, se colocariam em círculo ao redor do fogo para ouvir os sons do pai de todos. Este som desceria dos céus e encheria o espaço a volta de todos, chegando mesmo a entrar em suas cabeças. Sabiam que era a noite em que o pai de todos viria à Terra para jogar sobre ela a sua força. E eles comeriam corpos e dançariam.
Os corpos seriam despedaçados segundo a regra do pedaço mais fácil de arrancar ao mais difícil. Crianças e mulheres despedaçavam os mais fáceis, os homens, os mais difíceis. Passo a passo, aprendiam a ser inteligentes. Tal técnica, acreditavam, vinha do mesmo lugar de onde desciam o fogo e chuva. De onde descia o pai invisível do mundo.
Duas mulheres jogavam sobre o rosto da infeliz um líquido de cor ocre. Espalhavam sobre os olhos e os lábios, enquanto um som escapava de suas bocas, já quase sem dentes. As mulheres mais jovens não podiam se aproximar da infeliz. Depois de espalhar o líquido de cor ocre, lambiam os olhos e os lábios daquela que, de pernas abertas, próxima ao lugar onde seria aceso o fogo mais tarde, esperava pela noite mais importante da vida deles.
Quando o mundo começava a ficar escuro, e a cabeça da criança começava a surgir entre as pernas, fezes e urina, os gritos da infeliz subia aos céus. No alto da pedra, ali colocada pelo pai invisível, o homem maior se punha de pé. Os outros jogavam os corpos sobre os irmãos e irmãs de sangue, e os pedaços eram arrancados ao som cada vez mais alto de todos que repetiam monotonamente o mesmo grito. Em meio a eles, o grito frágil da infeliz, a mãe mais jovem entre todas se perdia.
O mesmo líquido ocre, misturado com sangue, escorria pelos lábios, enquanto o homem maior se contorcia sobre si mesmo, agora de joelhos. Por suas pernas, escorria sua bênção. Embaixo, e ao redor da infeliz, todos repetiam os gestos do homem maior, que carregava em si o espírito invisível do pai de todos.
Muitos corriam querendo lamber a bênção que escorria pela pedra. Depois de alguns instantes, ele repetia a dança, os gestos, se punha de joelhos, e a bênção escorria de novo pela pedra.
Quando o bebê, já fora do corpo da mãe mais jovem de todas, ligado a ela apenas por um cordão de carne, era carregado por uma das mulheres, o corpo da infeliz mãe mais jovem de todas era carregado pelo restante das velhas. Ambos eram arremessados para dentro do grande fogo, enquanto o restante dos irmãos e irmãs de sangue giravam sobre si mesmos.
De repente, do giro, passaram à perseguição das mulheres a sua volta (as irmãs de sangue). Estas, num misto de desejo e horror, tentavam escapar dos irmãos de sangue. Jogadas contra o chão e as pedras que enchiam o lugar, eram lançadas a condição de possíveis mães jovens dos próximos dias. Gritavam e gemiam, à medida em que eram abençoadas por seu irmãos.
segunda-feira, dezembro 30, 2013
Nada por mim - LULI RADFAHRER
FOLHA DE SP - 30/12
Usados com moderação, os apps de 'behaviorismo digital' podem ser uma bela ferramenta de autogestão
O crescimento das mídias sociais ajudou a reconfigurar as paranoias de comportamento e facilitar as resoluções de ano novo. Com a ajuda de aplicativos quase gratuitos e de um punhado de amigos nas redes é possível comer melhor, dormir mais e viver uma vida mais ecológica, saudável, produtiva e segura.
Seus usuários, fáceis demais, parecem incapazes de cuidar do corpo que possuem. Não vai demorar para que os programinhas que hoje registram calorias e horas de sono passem a computar fatores genéticos, pessoais e ambientais para recomendar a eles o que fazer, o que vestir, com quem andar e aonde ir.
Técnicas de mudança de comportamento partem do princípio de que é mais fácil realizar pequenas tarefas, administráveis, do que lutar contra a tentação munido apenas de força de vontade. Comuns em programas de combate a situações crônicas, como os Vigilantes do Peso e os Alcoólicos Anônimos, elas estão cada vez mais comuns no ambiente digital, em que usam neologismos marqueteiros como "quantified self" e "gamificação".
O primeiro a sugerir esse tipo de prática foi o controverso psicólogo americano B. F. Skinner, criador do behaviorismo radical. Ele acreditava que as pessoas poderiam ser programadas a tomar determinadas atitudes, desde que vissem bons resultados derivados delas --os chamados "reforços".
Skinner viu que muitos animais reagiam positivamente, repetindo-os até que se tornassem hábitos. E propôs que o ser humano reagiria da mesma forma, questionando a ideia do livre-arbítrio.
Depois de quase meio século de rejeição, as ideias de Skinner voltam a ativa nos aplicativos comportamentais. Eles estabelecem objetivos modestos para encorajar o progresso constante e reforços posteriores, medem rigorosamente os resultados para descobrir quais variáveis comprometem ou estimulam as conquistas, usam as mídias sociais para buscar apoio do grupo e criam novas tarefas para que o hábito se forme. Com o apoio dessas técnicas, o indivíduo quantificado e gamificado se transforma naquele indivíduo programável.
O problema das técnicas behavioristas é que a mudança de comportamento demanda o apego a determinadas rotinas, abrindo mão do livre-arbítrio. O usuário que se dedica a um desses programas reconhece não ser capaz de dar conta de si próprio, terceirizando o controle para o sistema.
É fácil ver aonde isso vai parar. Tecnologias de "big data", computação em nuvem e internet das coisas tendem a criar bolhas de isolamento cada vez maior, capazes de reconhecer mudanças de comportamento e se antecipar a novos desejos. Nas palavras do filósofo de tecnologia Albert Borgmann, "deixaremos de cuidar da casa para sermos cuidados por ela".
Por mais que seja eficiente para resolver problemas e hábitos que comprometem a saúde de seus usuários e dos que convivem com eles, a mecanização pode ser um perigoso instrumento de manipulação.
Usado com moderação, o behaviorismo digital pode ser uma bela ferramenta de autogestão. Em excesso, pode mecanizar seus usuários, comprometendo sua força de vontade. Na dúvida, o melhor é buscar independência para evitar que a máquina pense que você é dela.
Usados com moderação, os apps de 'behaviorismo digital' podem ser uma bela ferramenta de autogestão
O crescimento das mídias sociais ajudou a reconfigurar as paranoias de comportamento e facilitar as resoluções de ano novo. Com a ajuda de aplicativos quase gratuitos e de um punhado de amigos nas redes é possível comer melhor, dormir mais e viver uma vida mais ecológica, saudável, produtiva e segura.
Seus usuários, fáceis demais, parecem incapazes de cuidar do corpo que possuem. Não vai demorar para que os programinhas que hoje registram calorias e horas de sono passem a computar fatores genéticos, pessoais e ambientais para recomendar a eles o que fazer, o que vestir, com quem andar e aonde ir.
Técnicas de mudança de comportamento partem do princípio de que é mais fácil realizar pequenas tarefas, administráveis, do que lutar contra a tentação munido apenas de força de vontade. Comuns em programas de combate a situações crônicas, como os Vigilantes do Peso e os Alcoólicos Anônimos, elas estão cada vez mais comuns no ambiente digital, em que usam neologismos marqueteiros como "quantified self" e "gamificação".
O primeiro a sugerir esse tipo de prática foi o controverso psicólogo americano B. F. Skinner, criador do behaviorismo radical. Ele acreditava que as pessoas poderiam ser programadas a tomar determinadas atitudes, desde que vissem bons resultados derivados delas --os chamados "reforços".
Skinner viu que muitos animais reagiam positivamente, repetindo-os até que se tornassem hábitos. E propôs que o ser humano reagiria da mesma forma, questionando a ideia do livre-arbítrio.
Depois de quase meio século de rejeição, as ideias de Skinner voltam a ativa nos aplicativos comportamentais. Eles estabelecem objetivos modestos para encorajar o progresso constante e reforços posteriores, medem rigorosamente os resultados para descobrir quais variáveis comprometem ou estimulam as conquistas, usam as mídias sociais para buscar apoio do grupo e criam novas tarefas para que o hábito se forme. Com o apoio dessas técnicas, o indivíduo quantificado e gamificado se transforma naquele indivíduo programável.
O problema das técnicas behavioristas é que a mudança de comportamento demanda o apego a determinadas rotinas, abrindo mão do livre-arbítrio. O usuário que se dedica a um desses programas reconhece não ser capaz de dar conta de si próprio, terceirizando o controle para o sistema.
É fácil ver aonde isso vai parar. Tecnologias de "big data", computação em nuvem e internet das coisas tendem a criar bolhas de isolamento cada vez maior, capazes de reconhecer mudanças de comportamento e se antecipar a novos desejos. Nas palavras do filósofo de tecnologia Albert Borgmann, "deixaremos de cuidar da casa para sermos cuidados por ela".
Por mais que seja eficiente para resolver problemas e hábitos que comprometem a saúde de seus usuários e dos que convivem com eles, a mecanização pode ser um perigoso instrumento de manipulação.
Usado com moderação, o behaviorismo digital pode ser uma bela ferramenta de autogestão. Em excesso, pode mecanizar seus usuários, comprometendo sua força de vontade. Na dúvida, o melhor é buscar independência para evitar que a máquina pense que você é dela.
Glossário de 2014 - LÚCIA GUIMARÃES
O Estado de S.Paulo - 30/12
Podemos dar um basta em 2013? Podemos acalmar os ânimos entre as facções pró Papa Francisco e pró Edward Snowden como homem do ano?
Vez por outra, esta coluna presta um serviço semântico, espécie de check-up na linguagem corrente para que o caro leitor não dê vexame igual ao do primeiro ministro britânico David Cameron, que escreveu L.O.L em SMS's para uma amiga, certo de que era "lots of love" (muito amor) e não "laughing out loud" (rindo alto).
Aqui uma lista de palavras, expressões e nomes, parte da bagagem verbal com que embarcamos em 2014.
Branding - Que saudades do original Viking - marcar o gado - na idade média. Depois de entrar para o jargão da publicidade, o branding está se tornando uma necessidade pessoal, como colocar aparelho nos dentes. O branding é um esforço de auto empacotamento para se distinguir do resto do rebanho. Típico de uma economia que cada vez menos remunera o trabalho.
Reforma da Imigração - Espere aí, não era para acontecer em 2010? A promessa de Obama foi quebrada tantas vezes que já há dois milhões de imigrantes sem documentos a menos no país, despachados pelo presidente que mais deportou latinos e mais se beneficiou de seus votos. Ser contra a reforma de imigração nos Estados Unidos é como ser a favor da desnutrição infantil. Mas isto não serve de consolo para centenas de milhares de brasileiros que lavam banheiros, passeiam com cachorros, cortam grama e desempenham tarefas que os americanos evitam. A lei da imigração será debatida, diluída e, se passar este ano, vai testar a definição da palavra "reforma".
Tea Party - Há esperança de que a expressão volte a ser associada à tradição inglesa do chá das cinco servido com bolinhos. O movimento americano do Tea Party, assim batizado em homenagem à revolta contra os impostos da coroa britânica, em 1773, serviu tanta insânia ao discurso político em 2013 que até o emasculado líder republicano John Boehner começou a tratá-los como lunáticos.
Facebook - Se os seus filhos adolescentes não queriam ser vistos na sua companhia física, espere que eles cada vez mais evitem sua companhia virtual. O Facebook está "morto e enterrado" para a turma de 16 a 18 anos, segundo um novo estudo sobre o impacto da mídia social. Se antes os pais temiam que seus filhos passassem muito tempo no Facebook, agora estão pedindo que fiquem lá para saber o que estão fazendo, disse o pesquisador Daniel Miller. Mas a garotada prefere aplicativos como Snapchat e WhatsApp.
Desigualdade - Era déclassé comentar num jantar sobre a insustentável disparidade de renda, especialmente nesta cidade que se tornou parque temático para bilionários. Com a posse do novo prefeito, Bill de Blasio, na quarta-feira, pega mal convidar bilionários para jantar.
Elizabeth Warren - Você vai ouvir falar dela. A nova senadora e ex-professora de Direito de Harvard é considerada tão pró consumidor que Obama nomeou outra pessoa para ocupar o cargo que ela inventou, numa nova agência de proteção contra desmandos da indústria financeira. Warren, dizem alguns analistas, pode roubar de Hillary Clinton sua última chance de se candidatar a presidente, em 2016.
Opção nuclear - Nada de ameaças da Coreia do Norte. É uma manobra no Senado americano para fazer valer a votação de maioria simples, contra a obstrução da minoria, leiam-se republicanos, que fez de 2013 um modelo de inércia legislativa. Afinal, os democratas acordaram de seu estupor invertebrado e devem dar a Obama algum espaço para tomar iniciativas que os eleitores esperam desde 2009.
Edward Snowden - Vai continuar a ser chamado de herói e traidor. Os que o chamam de traidor vão continuar defendendo mais transparência e menos espionagem. Snowden vai continuar sonhando com o Brasil. E a presidente Dilma vai continuar se dando o direito de torturar a nossa língua se dando completamente o direito de não se manifestar sobre o que não lhe foi encaminhado.
Copa do Mundo - Evento que transformou o Brasil de gigante emergente em anão incompetente aos olhos do mundo. O evento que seria nosso baile de debutante planetário atraiu um foco negativo como nunca antes na história deste país. Morte de operários, goteiras e desabamento em estádios, corrupção, injustiça social, nossa continental roupa suja está sendo lavada em múltiplas línguas.
Podemos dar um basta em 2013? Podemos acalmar os ânimos entre as facções pró Papa Francisco e pró Edward Snowden como homem do ano?
Vez por outra, esta coluna presta um serviço semântico, espécie de check-up na linguagem corrente para que o caro leitor não dê vexame igual ao do primeiro ministro britânico David Cameron, que escreveu L.O.L em SMS's para uma amiga, certo de que era "lots of love" (muito amor) e não "laughing out loud" (rindo alto).
Aqui uma lista de palavras, expressões e nomes, parte da bagagem verbal com que embarcamos em 2014.
Branding - Que saudades do original Viking - marcar o gado - na idade média. Depois de entrar para o jargão da publicidade, o branding está se tornando uma necessidade pessoal, como colocar aparelho nos dentes. O branding é um esforço de auto empacotamento para se distinguir do resto do rebanho. Típico de uma economia que cada vez menos remunera o trabalho.
Reforma da Imigração - Espere aí, não era para acontecer em 2010? A promessa de Obama foi quebrada tantas vezes que já há dois milhões de imigrantes sem documentos a menos no país, despachados pelo presidente que mais deportou latinos e mais se beneficiou de seus votos. Ser contra a reforma de imigração nos Estados Unidos é como ser a favor da desnutrição infantil. Mas isto não serve de consolo para centenas de milhares de brasileiros que lavam banheiros, passeiam com cachorros, cortam grama e desempenham tarefas que os americanos evitam. A lei da imigração será debatida, diluída e, se passar este ano, vai testar a definição da palavra "reforma".
Tea Party - Há esperança de que a expressão volte a ser associada à tradição inglesa do chá das cinco servido com bolinhos. O movimento americano do Tea Party, assim batizado em homenagem à revolta contra os impostos da coroa britânica, em 1773, serviu tanta insânia ao discurso político em 2013 que até o emasculado líder republicano John Boehner começou a tratá-los como lunáticos.
Facebook - Se os seus filhos adolescentes não queriam ser vistos na sua companhia física, espere que eles cada vez mais evitem sua companhia virtual. O Facebook está "morto e enterrado" para a turma de 16 a 18 anos, segundo um novo estudo sobre o impacto da mídia social. Se antes os pais temiam que seus filhos passassem muito tempo no Facebook, agora estão pedindo que fiquem lá para saber o que estão fazendo, disse o pesquisador Daniel Miller. Mas a garotada prefere aplicativos como Snapchat e WhatsApp.
Desigualdade - Era déclassé comentar num jantar sobre a insustentável disparidade de renda, especialmente nesta cidade que se tornou parque temático para bilionários. Com a posse do novo prefeito, Bill de Blasio, na quarta-feira, pega mal convidar bilionários para jantar.
Elizabeth Warren - Você vai ouvir falar dela. A nova senadora e ex-professora de Direito de Harvard é considerada tão pró consumidor que Obama nomeou outra pessoa para ocupar o cargo que ela inventou, numa nova agência de proteção contra desmandos da indústria financeira. Warren, dizem alguns analistas, pode roubar de Hillary Clinton sua última chance de se candidatar a presidente, em 2016.
Opção nuclear - Nada de ameaças da Coreia do Norte. É uma manobra no Senado americano para fazer valer a votação de maioria simples, contra a obstrução da minoria, leiam-se republicanos, que fez de 2013 um modelo de inércia legislativa. Afinal, os democratas acordaram de seu estupor invertebrado e devem dar a Obama algum espaço para tomar iniciativas que os eleitores esperam desde 2009.
Edward Snowden - Vai continuar a ser chamado de herói e traidor. Os que o chamam de traidor vão continuar defendendo mais transparência e menos espionagem. Snowden vai continuar sonhando com o Brasil. E a presidente Dilma vai continuar se dando o direito de torturar a nossa língua se dando completamente o direito de não se manifestar sobre o que não lhe foi encaminhado.
Copa do Mundo - Evento que transformou o Brasil de gigante emergente em anão incompetente aos olhos do mundo. O evento que seria nosso baile de debutante planetário atraiu um foco negativo como nunca antes na história deste país. Morte de operários, goteiras e desabamento em estádios, corrupção, injustiça social, nossa continental roupa suja está sendo lavada em múltiplas línguas.
PORTA GIRATÓRIA - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 30/12
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidirá, no primeiro semestre de 2014, se um condenado ao regime semiaberto deve cumprir a pena em casa quando o sistema penitenciário não oferecer a ele a vaga de trabalho adequada, em colônias agrícolas e industriais. Ou se, quando isso não ocorrer, a Justiça pode manter o preso em regime fechado.
NÃO HÁ VAGAS
O julgamento vai ocorrer no momento em que condenados do mensalão --como, por exemplo, José Dirceu--estão recolhidos ao regime fechado porque não há vagas no semiaberto para eles.
FALHA NOSSA
No caso em pauta do STF, o Ministério Público do Rio Grande do Sul recorre contra decisão da Justiça estadual. Os desembargadores gaúchos decidiram que um condenado ao semiaberto deve ficar em casa "enquanto não existir estabelecimento destinado ao regime" em que deveria cumprir a pena.
MULTIDÃO
O relator do caso é o ministro Gilmar Mendes, que convocou audiência pública com magistrados, promotores e defensores. Nas discussões surgiram informações como a de que, em SP, 6.000 pessoas já deveriam estar no semiaberto. Mas permanecem no fechado por falta de vaga. Só em 2012, a Defensoria Pública paulista impetrou igual número de habeas corpus no STJ (Superior Tribunal de Justiça), corte em que já tramitavam 200 mil.
CONTROLE PRÓPRIO
Na audiência, Mendes definiu os fatos como "estarrecedores". "Em razão da absoluta escassez de estabelecimentos prisionais para os regimes aberto e semiaberto, o que temos são penas em regime fechado, domiciliar ou uso do regime semiaberto para retroalimentação do crime organizado", afirmou. Constatou-se ainda que presídios são controlados "por facções criminosas que ditam quem tem e quem não tem direito aos benefícios", completou o ministro.
PLANO B
Ainda está em estudo na Prefeitura de SP um programa de parcelamento de dívidas (PPI) de IPTU e ISS. A iniciativa poderia engordar o caixa da administração de Fernando Haddad. Outra sugestão dada ao prefeito é a securitização de parte da dívida da cidade.
CHAMPAGNE
O Réveillon brasileiro em Miami terá dois endereços badalados: o clube de praia La Piaggia e uma mansão na Star Island, onde residem estrelas como Shaquille O'Neal e Gloria Estefan. O primeiro vai abrigar festa só para convidados, organizada pelos empresários Marco e Cristiana Machado. "Estou convidando 50 amigos para o La Piaggia", diz Paulo Bacchi, dono da Artefacto, que mora em Miami.
CHAMPAGNE 2
Outro grupo está organizando festança em uma ilha privada, com o nome de Five Star New Years Eve. Luiz Fleury, Beto Biscaia e Wictor Arraes vendem convites para um Réveillon verde e amarelo em uma mansão para 800 convidados. O passaporte para cinco pessoas (pacote mínimo) sai por R$ 23.390.
NA BOCA DO POVO
Ronaldo, 37, diz que "a Copa entrou num contexto que não faz sentido" nas manifestações de rua que tomaram o país. "O brasileiro se revoltou com o descaso que sofre. É justo querer padrão Fifa na saúde e na educação, mas a coisa não funciona assim", afirma.
Membro do Comitê Organizador Local do Mundial, ele defende a competição, na revista da Gol. "A Copa está trazendo muitos benefícios, investimentos em infraestrutura."
O ex-atleta, que vive em Londres desde abril, conta também que seu corpo "cansou de futebol" e que "não entende que os 80 kg viraram 100" quando ele joga bola. "O esforço é muito maior... Se não me preparo, depois fico três dias na cama."
CAUSA BRASILEIRA
Leona Forman e Patriccia Lobaccaro, fundadora e presidente, respectivamente, da ONG Brazil Foundation, lançaram livro sobre os dez anos da instituição, na Livraria da Vila do shopping Cidade Jardim. Sérgio Britto, dos Titãs, levou os filhos, José e Julia, ao evento, que também teve a presença da estilista Cris Barros, da designer de joias Fabiana Pastore e da editora Donata Meirelles, que foi com o filho, Zeca Bordon.
CURTO-CIRCUITO
O DJ e produtor francês Martin Solveig é atração hoje na Posh Club, em Jurerê Internacional (SC).
O filme "Flores Raras" será exibido gratuitamente entre quinta e segunda-feira, às 17h e às 19h30, no CCBB-SP. 14 anos.
Marco Nanini encena "A Arte e a Maneira de Abordar seu Chefe para Pedir um Aumento" no Auditório Ibirapuera, em 31 de janeiro e 1º de fevereiro. 12 anos.
Zezé di Camargo e Luciano fazem show no Citibank Hall nos próximos dias 17 e 18. 14 anos.
Sem puxadinho - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 30/12
Dilma Rousseff tentou, mas não lançará a terceira etapa do Minha Casa, Minha Vida. Uma das vitrines de sua administração, o programa terá peso na campanha pela reeleição. A presidente chegou a fazer consultas à Caixa Econômica Federal para avaliar a concessão de mais subsídios. Mas à negativa do banco, que avançou mais do que o esperado com recursos às construções, somou-se a preocupação de Dilma em dar um passo adiante sem ter concluído a fase dois do programa.
Recorde Mesmo sem lançar a terceira etapa do Minha Casa, Minha Vida, Dilma deve terminar seu mandato com 2,4 milhões de casas entregues e 600 mil em andamento, totalizando 3 milhões, número que supera em 1 milhão o total de moradias prometidas e que será explorado pelo marketing na campanha.
Mais peso Em três anos de gestão, o programa consumiu R$ 50 bilhões, uma média de R$ 16,7 bilhões por ano. Esse investimento representa 15% do total destinado pela União para habitação.
Abaixo os... O ministro Guilherme Afif (Pequena e Micro Empresa) comemorou o decreto da Receita Federal, na véspera do Natal, que dispensa o reconhecimento de firma em documentos apresentados ao órgão.
... carimbos Afif lembra que, quando sua pasta (que tem a atribuição de reduzir a burocracia) foi criada, exigiram reconhecimento da firma dele para fornecer o CNPJ. "Me queixei com a presidente e ela ficou muito brava", diz.
Low profile Indicado pelo líder peemedebista Eduardo Cunha (RJ) para o lugar de Geddel Vieira Lima na vice-presidência de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal, Roberto Derziê é um funcionário de carreira que está há mais de 20 anos no banco.
Melhor assim Sua escolha foi costurada com o aval do presidente da CEF, o petista Jorge Hereda, que preferiu ter um técnico de carreira a ver o PMDB indicar outro político para a vaga que também já foi de Moreira Franco.
Até o fim 1 Eduardo Campos (PSB) deve esticar até o prazo legal, em abril, sua desincompatibilização do governo de Pernambuco.
Até o fim 2 O presidenciável tem várias obras para entregar nos primeiros meses do ano, entre elas escolas em tempo integral e a interligação ao aeroporto por trem, vitrines que pretende usar ao máximo para se contrapor aos projetos que Dilma Rousseff deve lançar.
Hora do... Campos avisou aos principais articuladores de sua candidatura que fará reunião na semana de 6 de janeiro para definir um cronograma de campanha.
... jogo O PSB quer anunciar que o pernambucano será o candidato já em fevereiro, para acabar com a especulação de que Marina Silva poderia ser cabeça de chapa.
Desce do muro Tucanos esperam que, já no início de 2014, o prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), faça uma declaração incisiva de apoio à candidatura presidencial de Aécio Neves (MG).
Longo prazo O raciocínio dos tucanos é que, caso mantenha a atual política de boa vizinhança com Dilma, Neto fortalecerá a candidatura do petista Rui Costa à sucessão de Jaques Wagner e, consequentemente, reduzirá sua própria chance de formar aliança sólida para ser o candidato ao governo em 2018.
Agora vai? As mais recentes previsões de peemedebistas do Rio dão conta de que o governador Sérgio Cabral deixará o cargo até março para disputar o Senado.
Em casa Se sair, Cabral facilita que o vice e candidato a sua sucessão Luiz Fernando Pezão seja conhecido. Também abre caminho para que seu filho Marco Antônio seja candidato a deputado federal, o que seria vedado se ele ficasse no cargo até o fim.
tiroteio
Interpelado judicialmente, José Eduardo Cardozo demorou um mês para responder. Com ele, a Justiça tarda e também falha.
DE MILTON FLÁVIO, presidente do PSDB-SP, sobre o ministro da Justiça ter decidido processar o tucano José Anibal depois de ter sido interpelado por ele.
Contraponto
Melhor que a encomenda
Convidado pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS) para um seminário em Corumbá sobre integração sul-americana, o ex-presidente Lula manifestou dúvida sobre se daria certo reunir o senador boliviano Isaac Avalos Cuchallo, de esquerda, e o paraguaio Luiz Alberto Castiglioni, de perfil mais liberal. Delcídio manteve a escalação.
Na sua fala, Cuchallo agradeceu o apoio dado por Lula ao presidente Evo Morales e enalteceu sua liderança.
O senador paraguaio foi ainda mais elogioso:
- Lula é hoje um cidadão do mundo. Para ele, o importante é o ser humano. Ele humanizou a política.
No fim, Lula elogiou Delcídio pelo sucesso do evento.n
Dilma Rousseff tentou, mas não lançará a terceira etapa do Minha Casa, Minha Vida. Uma das vitrines de sua administração, o programa terá peso na campanha pela reeleição. A presidente chegou a fazer consultas à Caixa Econômica Federal para avaliar a concessão de mais subsídios. Mas à negativa do banco, que avançou mais do que o esperado com recursos às construções, somou-se a preocupação de Dilma em dar um passo adiante sem ter concluído a fase dois do programa.
Recorde Mesmo sem lançar a terceira etapa do Minha Casa, Minha Vida, Dilma deve terminar seu mandato com 2,4 milhões de casas entregues e 600 mil em andamento, totalizando 3 milhões, número que supera em 1 milhão o total de moradias prometidas e que será explorado pelo marketing na campanha.
Mais peso Em três anos de gestão, o programa consumiu R$ 50 bilhões, uma média de R$ 16,7 bilhões por ano. Esse investimento representa 15% do total destinado pela União para habitação.
Abaixo os... O ministro Guilherme Afif (Pequena e Micro Empresa) comemorou o decreto da Receita Federal, na véspera do Natal, que dispensa o reconhecimento de firma em documentos apresentados ao órgão.
... carimbos Afif lembra que, quando sua pasta (que tem a atribuição de reduzir a burocracia) foi criada, exigiram reconhecimento da firma dele para fornecer o CNPJ. "Me queixei com a presidente e ela ficou muito brava", diz.
Low profile Indicado pelo líder peemedebista Eduardo Cunha (RJ) para o lugar de Geddel Vieira Lima na vice-presidência de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal, Roberto Derziê é um funcionário de carreira que está há mais de 20 anos no banco.
Melhor assim Sua escolha foi costurada com o aval do presidente da CEF, o petista Jorge Hereda, que preferiu ter um técnico de carreira a ver o PMDB indicar outro político para a vaga que também já foi de Moreira Franco.
Até o fim 1 Eduardo Campos (PSB) deve esticar até o prazo legal, em abril, sua desincompatibilização do governo de Pernambuco.
Até o fim 2 O presidenciável tem várias obras para entregar nos primeiros meses do ano, entre elas escolas em tempo integral e a interligação ao aeroporto por trem, vitrines que pretende usar ao máximo para se contrapor aos projetos que Dilma Rousseff deve lançar.
Hora do... Campos avisou aos principais articuladores de sua candidatura que fará reunião na semana de 6 de janeiro para definir um cronograma de campanha.
... jogo O PSB quer anunciar que o pernambucano será o candidato já em fevereiro, para acabar com a especulação de que Marina Silva poderia ser cabeça de chapa.
Desce do muro Tucanos esperam que, já no início de 2014, o prefeito de Salvador, ACM Neto (DEM), faça uma declaração incisiva de apoio à candidatura presidencial de Aécio Neves (MG).
Longo prazo O raciocínio dos tucanos é que, caso mantenha a atual política de boa vizinhança com Dilma, Neto fortalecerá a candidatura do petista Rui Costa à sucessão de Jaques Wagner e, consequentemente, reduzirá sua própria chance de formar aliança sólida para ser o candidato ao governo em 2018.
Agora vai? As mais recentes previsões de peemedebistas do Rio dão conta de que o governador Sérgio Cabral deixará o cargo até março para disputar o Senado.
Em casa Se sair, Cabral facilita que o vice e candidato a sua sucessão Luiz Fernando Pezão seja conhecido. Também abre caminho para que seu filho Marco Antônio seja candidato a deputado federal, o que seria vedado se ele ficasse no cargo até o fim.
tiroteio
Interpelado judicialmente, José Eduardo Cardozo demorou um mês para responder. Com ele, a Justiça tarda e também falha.
DE MILTON FLÁVIO, presidente do PSDB-SP, sobre o ministro da Justiça ter decidido processar o tucano José Anibal depois de ter sido interpelado por ele.
Contraponto
Melhor que a encomenda
Convidado pelo senador Delcídio Amaral (PT-MS) para um seminário em Corumbá sobre integração sul-americana, o ex-presidente Lula manifestou dúvida sobre se daria certo reunir o senador boliviano Isaac Avalos Cuchallo, de esquerda, e o paraguaio Luiz Alberto Castiglioni, de perfil mais liberal. Delcídio manteve a escalação.
Na sua fala, Cuchallo agradeceu o apoio dado por Lula ao presidente Evo Morales e enalteceu sua liderança.
O senador paraguaio foi ainda mais elogioso:
- Lula é hoje um cidadão do mundo. Para ele, o importante é o ser humano. Ele humanizou a política.
No fim, Lula elogiou Delcídio pelo sucesso do evento.n
MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO
FOLHA DE SP - 30/12
Empresa de auditoria abrirá unidades no interior do país no próximo ano
A empresa de auditoria e consultoria PwC (PricewaterhouseCoopers) pretende abrir dois ou três escritórios no país em 2014.
As inaugurações fazem parte do projeto de interiorização da companhia. Neste ano, foram instaladas unidades em Maringá (PR) e Goiânia.
Cidades das regiões Centro-Oeste, Sul e Nordeste estão em análise, segundo Fernando Alves, presidente da PwC.
"O município tem de ter uma base [de negócios] forte, caso contrário, podemos atuar remotamente", diz.
A PwC no Brasil fechou 2013 com 18 escritórios e cerca de 5.500 funcionários --1.400 a mais que em 2012.
Em 2014, o quadro de colaboradores deve ter nova expansão com a incorporação de dez sócios da Booz & Company, empresa que se fundiu com a PwC neste ano.
"Com a união, vamos melhorar nossa estrutura e ampliar a atuação em planejamento estratégico", diz Alves, sem comentar alterações que poderão ocorrer. Hoje, a companhia é mais forte na área operacional.
O segmento de auditoria, por sua vez, é responsável por 40% do faturamento. Esse ramo poderá ter seu crescimento acelerado com a entrada de novas empresas na Bolsa.
"Há indicativos de que 2014 poderá ser melhor em IPOs [oferta inicial de ações, na sigla em inglês]", diz.
"O Brasil tem mais de 6 milhões de empresas, nem 500 estão na CVM [Comissão de Valores Mobiliários]. Há um grande caminho a percorrer."
ANTES DA TOPADA
Com o cenário de grande incerteza na economia, um ano de eleições pela frente e mudanças no cenário americano, a McKinsey viu crescer nas empresas no Brasil a busca por aumento de produtividade e redução de custos.
"Por precaução, como se diz no sul de Minas, o pessoal está enfaixando o pé antes da topada", diz Vicente Assis, diretor da firma no país.
"Continuamos com trabalhos de estratégia, de crescimento, mas há a preocupação de estar mais preparado."
Há três anos, afirma, uma minoria dos trabalhos da consultoria eram focados em aumento de eficiência.
"Hoje representam cerca de 30%, com perspectiva de crescer." Os sócios, porém, seguem otimistas para 2014, diz. Ainda mais depois de um ano "espetacular para firma" --embora não tão bom quanto o anterior, reconhece.
"Em 2011 e 2012, o escritório do país foi um dos melhores do mundo." Entre os setores de maior demanda, destaca os de infraestrutura e saúde, além dos governos, que contrataram consultorias.
INJEÇÃO REFORÇADA
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, liberou na sexta-feira passada R$ 86,2 milhões para a aquisição de equipamentos para 142 novas UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento).
Os recursos serão distribuídas em 137 municípios de 24 Estados. As unidades beneficiadas estão em fase final de construção, segundo a pasta.
Cada uma delas deverá receber entre R$ 600 mil e R$ 1 milhão, conforme a capacidade de atendimento.
As maiores unidades conseguem atender até 9.000 pessoas em um mês, conforme estimativa do ministério.
O número de UPAs em funcionamento no país aumentou 140% entre 2010 e 2013, ao completar 296 unidades.
Nesse período, o investimento federal alocado na construção e na ampliação de UPAs ultrapassou R$ 1 bilhão.
Para 2014, está prevista a construção de 20 UPAs apenas na cidade de São Paulo. Os recursos para a saúde destinados à capital do Estado subirão de cerca de R$ 21 milhões, previstos para 2013, para R$ 685 milhões.
O QUE EU ESTOU LENDO
Christian Hallot, embaixador da H.Stern
"A História do Mundo em 100 Objetos", de Neil MacGregor (ed. Intrínseca), é o livro que o porta-voz da joalheria H.Stern, Christian Hallot, tem à sua mesa. O embaixador da grife acabou de ler as cinco peças de "Ensaio sobre o Genius, por uma obra nem tão completa", de Rodrigo Moura (edição do autor). "O leitor escolhe o final", diz. "Pode ser diferente do imaginado pelo vizinho e já se sai com algo para falar com ele", ri.
NATAL EM BAIXA
A intenção de consumo entre os paulistanos ficou estável em dezembro, na comparação com o mês anterior, aponta a FecomercioSP.
O indicador permaneceu em 125,3 pontos pelo terceiro mês consecutivo --valores acima de cem significam que a população está satisfeita.
Na comparação com dezembro de 2012, o índice retraiu 11,4%.
Todos os itens analisados apresentaram baixa em relação ao mesmo mês do ano anterior. O acesso ao crédito (-18,4%) e a perspectiva profissional (-10,1%) estão entre as maiores quedas.
Empresa de auditoria abrirá unidades no interior do país no próximo ano
A empresa de auditoria e consultoria PwC (PricewaterhouseCoopers) pretende abrir dois ou três escritórios no país em 2014.
As inaugurações fazem parte do projeto de interiorização da companhia. Neste ano, foram instaladas unidades em Maringá (PR) e Goiânia.
Cidades das regiões Centro-Oeste, Sul e Nordeste estão em análise, segundo Fernando Alves, presidente da PwC.
"O município tem de ter uma base [de negócios] forte, caso contrário, podemos atuar remotamente", diz.
A PwC no Brasil fechou 2013 com 18 escritórios e cerca de 5.500 funcionários --1.400 a mais que em 2012.
Em 2014, o quadro de colaboradores deve ter nova expansão com a incorporação de dez sócios da Booz & Company, empresa que se fundiu com a PwC neste ano.
"Com a união, vamos melhorar nossa estrutura e ampliar a atuação em planejamento estratégico", diz Alves, sem comentar alterações que poderão ocorrer. Hoje, a companhia é mais forte na área operacional.
O segmento de auditoria, por sua vez, é responsável por 40% do faturamento. Esse ramo poderá ter seu crescimento acelerado com a entrada de novas empresas na Bolsa.
"Há indicativos de que 2014 poderá ser melhor em IPOs [oferta inicial de ações, na sigla em inglês]", diz.
"O Brasil tem mais de 6 milhões de empresas, nem 500 estão na CVM [Comissão de Valores Mobiliários]. Há um grande caminho a percorrer."
ANTES DA TOPADA
Com o cenário de grande incerteza na economia, um ano de eleições pela frente e mudanças no cenário americano, a McKinsey viu crescer nas empresas no Brasil a busca por aumento de produtividade e redução de custos.
"Por precaução, como se diz no sul de Minas, o pessoal está enfaixando o pé antes da topada", diz Vicente Assis, diretor da firma no país.
"Continuamos com trabalhos de estratégia, de crescimento, mas há a preocupação de estar mais preparado."
Há três anos, afirma, uma minoria dos trabalhos da consultoria eram focados em aumento de eficiência.
"Hoje representam cerca de 30%, com perspectiva de crescer." Os sócios, porém, seguem otimistas para 2014, diz. Ainda mais depois de um ano "espetacular para firma" --embora não tão bom quanto o anterior, reconhece.
"Em 2011 e 2012, o escritório do país foi um dos melhores do mundo." Entre os setores de maior demanda, destaca os de infraestrutura e saúde, além dos governos, que contrataram consultorias.
INJEÇÃO REFORÇADA
O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, liberou na sexta-feira passada R$ 86,2 milhões para a aquisição de equipamentos para 142 novas UPAs (Unidades de Pronto-Atendimento).
Os recursos serão distribuídas em 137 municípios de 24 Estados. As unidades beneficiadas estão em fase final de construção, segundo a pasta.
Cada uma delas deverá receber entre R$ 600 mil e R$ 1 milhão, conforme a capacidade de atendimento.
As maiores unidades conseguem atender até 9.000 pessoas em um mês, conforme estimativa do ministério.
O número de UPAs em funcionamento no país aumentou 140% entre 2010 e 2013, ao completar 296 unidades.
Nesse período, o investimento federal alocado na construção e na ampliação de UPAs ultrapassou R$ 1 bilhão.
Para 2014, está prevista a construção de 20 UPAs apenas na cidade de São Paulo. Os recursos para a saúde destinados à capital do Estado subirão de cerca de R$ 21 milhões, previstos para 2013, para R$ 685 milhões.
O QUE EU ESTOU LENDO
Christian Hallot, embaixador da H.Stern
"A História do Mundo em 100 Objetos", de Neil MacGregor (ed. Intrínseca), é o livro que o porta-voz da joalheria H.Stern, Christian Hallot, tem à sua mesa. O embaixador da grife acabou de ler as cinco peças de "Ensaio sobre o Genius, por uma obra nem tão completa", de Rodrigo Moura (edição do autor). "O leitor escolhe o final", diz. "Pode ser diferente do imaginado pelo vizinho e já se sai com algo para falar com ele", ri.
NATAL EM BAIXA
A intenção de consumo entre os paulistanos ficou estável em dezembro, na comparação com o mês anterior, aponta a FecomercioSP.
O indicador permaneceu em 125,3 pontos pelo terceiro mês consecutivo --valores acima de cem significam que a população está satisfeita.
Na comparação com dezembro de 2012, o índice retraiu 11,4%.
Todos os itens analisados apresentaram baixa em relação ao mesmo mês do ano anterior. O acesso ao crédito (-18,4%) e a perspectiva profissional (-10,1%) estão entre as maiores quedas.
Feliz 2014! - PAULO GUEDES
O GLOBO - 30/12
A espécie humana insiste na extraordinária ousadia de rejeitar suas despretensiosas origens. O homem criou narrativas de fuga de sua modesta natureza. Demos fôlego a nossas precárias existências elaborando as primeiras crenças e religiões. Era preciso dar sentido a vidas biologicamente acidentais, fragilíssimas e sobretudo curtas. O encantamento do mundo foi uma exigência de mentes primitivas assombradas pela grandiosidade de um incompreensível universo. Filósofos e teólogos deram significado a vidas efêmeras construindo pontes para mundos transcendentes, habitados por almas eternas. Sopros de esperança e magia alimentando nossa vontade de viver.
"O homem, um curioso acidente ocorrido num canto do universo, é inteligível: sua mistura de virtudes e vícios é aquela que se pode esperar do resultado de uma origem fortuita.
Se me fosse concedida a onipotência e milhões de anos para experimentá-la, não me gabaria de ser o homem o resultado de todos os meus esforços", observa o resoluto ateísta Bertrand Russell. "É curiosa a ideia de que uma proposta cósmica superior esteja especialmente voltada ao nosso pequeno planeta, pois seremos destruídos quando o Sol explodir e se tornar uma estrela anã fria e branca daqui a 1 bilhão de anos", prossegue Russell em suas dúvidas quanto às boas intenções do universo em relação aos humanos. O matemático e filósofo inglês tinha especial afeição por Baruch Spinoza, o farol holandês do iluminismo radical, cuja negação dos milagres e do sobrenatural, anúncio da morte do diabo e denúncia da credulidade das massas deram início ao desencantamento do mundo.
Compreender é um milagre ainda maior que existir. A consciência da transitoriedade de nossas vidas e de sua improvável transcendência torna imperativo realizar nossas possibilidades com ainda maior intensidade. Criamos significados para nossas vidas aperfeiçoando nossos talentos e cooperando com os demais em busca de sonhos comuns. Para Rousseau, a diferença entre o homem e o animal está na faculdade de aperfeiçoamento, de fuga de seus instintos naturais. "A vontade ainda fala quando já se calou a natureza." Que possamos dar mais significados a nossas vidas, aperfeiçoando-nos a cada dia de 2014.
Afinal, temos ainda 1 bilhão de anos pela frente.
"O homem, um curioso acidente ocorrido num canto do universo, é inteligível: sua mistura de virtudes e vícios é aquela que se pode esperar do resultado de uma origem fortuita.
Se me fosse concedida a onipotência e milhões de anos para experimentá-la, não me gabaria de ser o homem o resultado de todos os meus esforços", observa o resoluto ateísta Bertrand Russell. "É curiosa a ideia de que uma proposta cósmica superior esteja especialmente voltada ao nosso pequeno planeta, pois seremos destruídos quando o Sol explodir e se tornar uma estrela anã fria e branca daqui a 1 bilhão de anos", prossegue Russell em suas dúvidas quanto às boas intenções do universo em relação aos humanos. O matemático e filósofo inglês tinha especial afeição por Baruch Spinoza, o farol holandês do iluminismo radical, cuja negação dos milagres e do sobrenatural, anúncio da morte do diabo e denúncia da credulidade das massas deram início ao desencantamento do mundo.
Compreender é um milagre ainda maior que existir. A consciência da transitoriedade de nossas vidas e de sua improvável transcendência torna imperativo realizar nossas possibilidades com ainda maior intensidade. Criamos significados para nossas vidas aperfeiçoando nossos talentos e cooperando com os demais em busca de sonhos comuns. Para Rousseau, a diferença entre o homem e o animal está na faculdade de aperfeiçoamento, de fuga de seus instintos naturais. "A vontade ainda fala quando já se calou a natureza." Que possamos dar mais significados a nossas vidas, aperfeiçoando-nos a cada dia de 2014.
Afinal, temos ainda 1 bilhão de anos pela frente.
Rumo a 2015 - LUÍS EDUARDO ASSIS
O Estado de S.Paulo - 30/12
Com a possível exceção do risco de ouvir a cantora Simone anunciando que então é Natal, uma das coisas mais difíceis no fim de ano é conviver com as previsões que os economistas fazem para o ano que se inicia.
No fim de 2012, os analistas poderiam ter se contentado em prever que o ano acabará amanhã, no que, possivelmente, estarão certos. Não se contiveram e foram além. Em dezembro de 2012, a pesquisa Focus, do Banco Central, projetava um superávit comercial de US$ 15,2 bilhões em 2013. Fecharemos o ano com pouco mais de US$ 1 bilhão de saldo, o mais baixo em 12 anos. A taxa de câmbio era estimada em R$ 2,09, bem menos do que sinaliza o mercado nos últimos dias. A previsão da taxa Selic para o final de 2013 há um ano era de 7,25%. Muito diferente dos 10% que temos hoje. Tomando a previsão do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) que se fez com um ano de antecedência, a variação acumulada desde 2010 deveria estar hoje em 11,5%, quase o dobro dos 6,1% que conseguimos de fato crescer. Num país onde o passado é imprevisível, fazer estimativas é sempre muito perigoso.
Ainda assim, desafiando o bom senso, aqui vai uma previsão: nada de importante acontecerá na economia brasileira em 2014.
O próximo ano será mais do mesmo que aconteceu em 2013. No front externo, o banco central americano já deu sinais de que a alteração da política monetária será prudente e cuidadosa. O pior da crise vai ficando para trás. A região do euro também não promete grandes emoções. O crescimento será pífio, mas o suficiente para afastar rupturas. A China, por sua vez, decidiu mudar seu modelo econômico de forma substancial, mas não abandonará o pragmatismo que evita guinadas e surpresas.
Por aqui, no Brasil, seria de esperar que o governo estivesse disposto a fazer loucuras para assegurar a reeleição no final do ano. Nem isso conseguirá. O fracasso da "nova matriz econômica" foi tão acachapante que o próprio espaço para cometer equívocos ficou reduzido. Uma forte expansão dos gastos públicos em 2014 - sempre uma tentação em ano eleitoral - poderia precipitar um rebaixamento na avaliação de risco das agências internacionais, o que pressionaria o dólar e a inflação, corroendo o poder aquisitivo dos salários e tornando os eleitores menos favoráveis a um segundo mandato. O governo encalacrou-se numa armadilha que combina baixo potencial de crescimento, inflação alta e deterioração das finanças públicas. Não será em 2014 que isso mudará.
Por que chegamos a esse ponto? Três critérios podem ser escolhidos para uma possível taxonomia dos equívocos da política econômica recente. As piores medidas foram aquelas que: 1) refletiram uma concepção inexata daquilo que já se conhece hoje sobre teoria econômica; 2) contrariaram a própria visão que o governo tem sobre o funcionamento dos mercados; e 3) geraram distorções que se acumulam ao longo do tempo.
Neste contexto, os piores deslizes foram a ideia de que a desoneração fiscal induziria um aumento nos investimentos (uma descabida versão tropical do liberalismo do governo Reagan), o descaso com os investimentos de infraestrutura (que poderia ser esperado apenas de um governo que acreditasse que o mercado resolve tudo) e o represamento dos preços dos combustíveis (que sucateou a mais emblemática das empresas estatais, justo ao contrário do ideário do governo).
São erros dentro do erro, desnecessários e onerosos. Sair dessa situação não será simples e nada de complicado poderá ser feito na economia em 2014. Não há condições sequer para discutir as reformas que conduziriam o País a um ritmo mais acelerado de crescimento, já que temas como desindexação, modernização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou reforma da previdência são tabus eleitorais.
Em boa medida, a falta de clareza na definição de prioridades da política econômica reflete a própria insipiência do debate existente na sociedade, que prefere acreditar, enganosamente, que tudo se resolve apenas com o combate à corrupção e a utilização judiciosa do dinheiro público. É muito mais do que isso. Somos pobres ainda e assumimos compromissos de solidariedade social que, embora louváveis, exigem transferências vultosas de recursos e uma carga tributária asfixiante. Nosso caminho é, desta forma, mais sinuoso.
A presidente Dilma Rousseff se confortaria se lesse o último livro do economista John Kay (Obliquity, 2010), articulista do Financial Times. Para ele, as soluções dos problemas podem ser mais facilmente atingidas de forma indireta, da mesma forma que o traçado do Canal do Panamá não privilegiou a rota mais curta entre o Atlântico e o Pacífico ou a arquitetura modernista de Le Corbusier, nas suas palavras, foi incapaz de apreender a complexidade das interações sociais. Pode ser um consolo, mas não é uma solução. No nosso caso, nem sequer temos soluções tortuosas. Não andamos em zigue-zague; andamos em círculos. Nossa opção por alternativas "oblíquas" é muito custosa. Se crescermos, nos próximos 25 anos, à taxa do governo Lula (4% ao ano), chegaremos a 2038 com uma renda per capita, ajustada pelo padrão de preços, acima do nível que têm atualmente Portugal ou Grécia. Se, no entanto, mantivermos neste período o crescimento do governo Dilma (2% ao ano apenas), teremos no final uma renda per capita menor que o patamar atual (!) do México ou da Malásia. Faz toda diferença.
Acelerar as taxas de crescimento é fundamental. O mundo mudou. Se não quisermos ficar para trás, é preciso mudar também. Procrastinar decisões difíceis pode garantir a reeleição em 2014, mas 2015 está à espreita e dele não escaparemos.
No fim do próximo ano, será ainda mais fácil errar as previsões econômicas.
Com a possível exceção do risco de ouvir a cantora Simone anunciando que então é Natal, uma das coisas mais difíceis no fim de ano é conviver com as previsões que os economistas fazem para o ano que se inicia.
No fim de 2012, os analistas poderiam ter se contentado em prever que o ano acabará amanhã, no que, possivelmente, estarão certos. Não se contiveram e foram além. Em dezembro de 2012, a pesquisa Focus, do Banco Central, projetava um superávit comercial de US$ 15,2 bilhões em 2013. Fecharemos o ano com pouco mais de US$ 1 bilhão de saldo, o mais baixo em 12 anos. A taxa de câmbio era estimada em R$ 2,09, bem menos do que sinaliza o mercado nos últimos dias. A previsão da taxa Selic para o final de 2013 há um ano era de 7,25%. Muito diferente dos 10% que temos hoje. Tomando a previsão do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) que se fez com um ano de antecedência, a variação acumulada desde 2010 deveria estar hoje em 11,5%, quase o dobro dos 6,1% que conseguimos de fato crescer. Num país onde o passado é imprevisível, fazer estimativas é sempre muito perigoso.
Ainda assim, desafiando o bom senso, aqui vai uma previsão: nada de importante acontecerá na economia brasileira em 2014.
O próximo ano será mais do mesmo que aconteceu em 2013. No front externo, o banco central americano já deu sinais de que a alteração da política monetária será prudente e cuidadosa. O pior da crise vai ficando para trás. A região do euro também não promete grandes emoções. O crescimento será pífio, mas o suficiente para afastar rupturas. A China, por sua vez, decidiu mudar seu modelo econômico de forma substancial, mas não abandonará o pragmatismo que evita guinadas e surpresas.
Por aqui, no Brasil, seria de esperar que o governo estivesse disposto a fazer loucuras para assegurar a reeleição no final do ano. Nem isso conseguirá. O fracasso da "nova matriz econômica" foi tão acachapante que o próprio espaço para cometer equívocos ficou reduzido. Uma forte expansão dos gastos públicos em 2014 - sempre uma tentação em ano eleitoral - poderia precipitar um rebaixamento na avaliação de risco das agências internacionais, o que pressionaria o dólar e a inflação, corroendo o poder aquisitivo dos salários e tornando os eleitores menos favoráveis a um segundo mandato. O governo encalacrou-se numa armadilha que combina baixo potencial de crescimento, inflação alta e deterioração das finanças públicas. Não será em 2014 que isso mudará.
Por que chegamos a esse ponto? Três critérios podem ser escolhidos para uma possível taxonomia dos equívocos da política econômica recente. As piores medidas foram aquelas que: 1) refletiram uma concepção inexata daquilo que já se conhece hoje sobre teoria econômica; 2) contrariaram a própria visão que o governo tem sobre o funcionamento dos mercados; e 3) geraram distorções que se acumulam ao longo do tempo.
Neste contexto, os piores deslizes foram a ideia de que a desoneração fiscal induziria um aumento nos investimentos (uma descabida versão tropical do liberalismo do governo Reagan), o descaso com os investimentos de infraestrutura (que poderia ser esperado apenas de um governo que acreditasse que o mercado resolve tudo) e o represamento dos preços dos combustíveis (que sucateou a mais emblemática das empresas estatais, justo ao contrário do ideário do governo).
São erros dentro do erro, desnecessários e onerosos. Sair dessa situação não será simples e nada de complicado poderá ser feito na economia em 2014. Não há condições sequer para discutir as reformas que conduziriam o País a um ritmo mais acelerado de crescimento, já que temas como desindexação, modernização da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) ou reforma da previdência são tabus eleitorais.
Em boa medida, a falta de clareza na definição de prioridades da política econômica reflete a própria insipiência do debate existente na sociedade, que prefere acreditar, enganosamente, que tudo se resolve apenas com o combate à corrupção e a utilização judiciosa do dinheiro público. É muito mais do que isso. Somos pobres ainda e assumimos compromissos de solidariedade social que, embora louváveis, exigem transferências vultosas de recursos e uma carga tributária asfixiante. Nosso caminho é, desta forma, mais sinuoso.
A presidente Dilma Rousseff se confortaria se lesse o último livro do economista John Kay (Obliquity, 2010), articulista do Financial Times. Para ele, as soluções dos problemas podem ser mais facilmente atingidas de forma indireta, da mesma forma que o traçado do Canal do Panamá não privilegiou a rota mais curta entre o Atlântico e o Pacífico ou a arquitetura modernista de Le Corbusier, nas suas palavras, foi incapaz de apreender a complexidade das interações sociais. Pode ser um consolo, mas não é uma solução. No nosso caso, nem sequer temos soluções tortuosas. Não andamos em zigue-zague; andamos em círculos. Nossa opção por alternativas "oblíquas" é muito custosa. Se crescermos, nos próximos 25 anos, à taxa do governo Lula (4% ao ano), chegaremos a 2038 com uma renda per capita, ajustada pelo padrão de preços, acima do nível que têm atualmente Portugal ou Grécia. Se, no entanto, mantivermos neste período o crescimento do governo Dilma (2% ao ano apenas), teremos no final uma renda per capita menor que o patamar atual (!) do México ou da Malásia. Faz toda diferença.
Acelerar as taxas de crescimento é fundamental. O mundo mudou. Se não quisermos ficar para trás, é preciso mudar também. Procrastinar decisões difíceis pode garantir a reeleição em 2014, mas 2015 está à espreita e dele não escaparemos.
No fim do próximo ano, será ainda mais fácil errar as previsões econômicas.
"Use com moderação" - ALMIR PAZZIANOTTO PINTO
CORREIO BRAZILIENSE - 30/12
A realidade da América do Sul, desde que os países se tornaram independentes de Espanha e Portugal, consiste em ininterruptos projetos de reforma. A estranha obsessão por mudanças tenta ocultar o fracasso de projetos que permanecem no papel, para logo serem esquecidos e abandonados.
Veja-se a declaração da socialista Michelle Bachelet, ao ser reconduzida à Presidência do Chile, no primeiro comício após a vitória: "Finalmente é o momento de fazer mudanças". Finalmente, por quê? Não poderia tê-las levado avante no primeiro mandato? Reencontrou o país estraçalhado? Certamente, não. Afinal, segundo a opinião de viajantes, seria o Chile uma espécie de oásis, dentro de desolador cenário político sul-americano.
A proclamação peca pela ausência de originalidade. Não há candidato, na tumultuada história do continente, que economize promessas de estabilidade econômica, geração de emprego e renda, saúde, educação, transporte, segurança, sem abrir mão das garantias democráticas. Com raras exceções, assumem compromissos irreais de combate à corrupção e juram estar dispostos a lutar pela moralização dos costumes. Poucos, entretanto, têm a coragem de dizer que desenvolvimento é fruto de trabalho pesado e persistente, austeridade nos gastos, equilíbrio das contas públicas, que não haverá progresso se não houver um mínimo de entendimento entre governo, oposição e povo.
Caso singular é o do Uruguai. A única reforma que até agora promoveu o presidente José Mujica consiste na liberação do plantio e da comercialização da maconha. Fazendo fronteira com o Brasil, no Rio Grande do Sul, já antevemos os reflexos que a medida insana trará ao nosso país, que hoje enfrenta o dramático problema da expansão do baseado entre jovens de todas as classes sociais, o crescente consumo de crack, cocaína, heroína e outros produtos proibidos. Vozes já se ouvem entre nós em defesa de idêntica bandeira. Talvez venhamos a ter, em maços de cigarro de maconha, e embalagens de cocaína, a inócua frase "use com moderação", encontrada em latas e garrafas de bebidas alcoólicas.
Voltando as atenções para Argentina, Bolívia, Equador, Venezuela e Colômbia, em décadas de luta contra o narcotráfico, percebemos o perigo que nos circunda, e a necessidade de proteção ao Estado Democrático de Direito, em particular do Poder Judiciário, cuja majestade o PT procura desacreditar após a prisão dos mensaleiros.
É útil o paralelo entre América do Sul e Europa. Enquanto, por aqui, a urgência de medidas corajosas e inovadoras se resolve com promessas, no Velho Continente, crises são combatidas sem o temor da adoção de medidas de austeridade. Experiências acumuladas com guerras, fome, desemprego fizeram com que eleitores e políticos se convencessem da inexistência de medidas simples e rápidas para derrotar desafios que demandam firmeza, integridade e severas punições para transgressores. Acreditamos, como Fernando Pessoa, que "Deus quer e, o homem sonha, a obra nasce".
Com o fim do regime militar, foi devolvida à nação a responsabilidade de sustentar a democracia e resolver problemas de governabilidade e desenvolvimento. Após malogrados esforços para conter os preços, durante os governos de José Sarney e Fernando Collor, havíamos conseguido, com Fernando Henrique Cardoso, aquilo que era tido como impossível: estabilizar a moeda, deter a inflação, preparar a retomada do crescimento. Numerosos obstáculos tiveram que ser superados pela equipe econômica, liderada por Pedro Malan, ministro da Fazenda, para combater o pessimismo e neutralizar opositores e especuladores, beneficiados pelo ambiente anárquico dominante na economia.
Doze anos depois, o país está em marcha a ré. O ministro Mantega fala em crescimento com pernas mancas, para justificar o pífio Produto Interno Bruto (PIB). Esquece-se de que foi o governo quem comprometeu o tripé estabilizador: câmbio flutuante, responsabilidade fiscal e meta de inflação.
Poucas são as esperanças da oposição em 2014. Sob a dupla PT-CUT, teremos reformas, ou o Brasil se perderá na inconsistência populista dos discursos? Iludir a realidade com promessas demagógicas, acreditar na eficácia mágica das palavras, é típico dos subdesenvolvidos.
Nostri nosmet paenitet. Nós somos o nosso próprio tormento, ensinava o filósofo Terêncio. As provas, nesse sentido, são robustas.
O embuste ideológico - DENIS LERRER ROSENFIELD
O GLOBO - 30/12
O assassinato político tornou-se uma forma ‘corriqueira’ de a esquerda resolver os seus conflitos intestinos
O assassinato político de Jang Song-Thaek, tio e mentor político de Kim Jong-un, Líder Máximo da Coreia do Norte, apesar de grotesco, não deixa de ser algo, digamos, “normal”, dada a característica stalinista deste regime político. Nada muito diferente do que a esquerda totalitária fez na extinta União Soviética, nos hoje amplamente conhecidos Processos de Moscou, que eliminaram a velha guarda bolchevique.
Em outro célebre episódio, Trotsky primeiro foi apagado de uma foto junto a Lênin em uma comemoração revolucionária para, depois, ser “apagado” com uma machadinha na cabeça, no México. Quem perpetrou tal assassinato foi um agente de Stálin, Ramón Mercader, que acabou placidamente os seus dias, em Cuba, com todos os privilégios da nomenclatura castrista.
Nada tampouco distinto do que Mao fez na China. Os camaradas, amigos de ontem, tornavam-se os inimigos de hoje, taxados de contrarrevolucionários a serviço do capitalismo.
No Brasil, ainda atualmente, há os que admiram Marighella e a guerrilha do Araguaia, que compartilhavam das mesmas concepções marxistas. Há, em todos esses casos, uma patológica perversão das ideias.
O assassinato político tornou-se uma forma “corriqueira” de a esquerda resolver os seus conflitos intestinos. Processos jurídicos de fachada, tortura, acusações infundadas e mortes eram características próprias da esquerda no Poder. Não há sequer uma experiência histórica de compatibilização entre socialismo/comunismo e democracia. Lá onde o socialismo vingou, a democracia jamais germinou. Cuba e Coreia do Norte são rebentos deste período.
Se tomarmos a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, teremos uma oportunidade rara de comparação entre socialismo e capitalismo. O capitalismo sul-coreano produziu uma sociedade próspera, com alto grau de desenvolvimento industrial, científico e tecnológico. Empresas e universidades lá se retroalimentam. Sua educação tornou-se referência mundial. A democracia é o seu regime político.
A Coreia do Norte, por sua vez, é um regime tirânico, liberticida, que reduz a sua população a uma vida miserável. A fome grassa e os servos deste país sucumbem à falta de alimentos. Nada funciona, a não ser o Exército dotado de armamento nuclear, usado como ameaça constante à Coreia do Sul. Os seus processos políticos são uma caricatura, tendo sido neste país instaurada uma monarquia comunista, com direito de hereditariedade!
O século XX também apresentou outra experiência altamente significativa. Só os tolos hesitam em extrair dela o seu ensinamento. Havia duas Alemanhas, a Ocidental, capitalista, e a Oriental, socialista.
A primeira se caracterizava pela pujança, pelo respeito às liberdades, por uma vida sindical forte, por um crescimento econômico notável e por condições sociais invejáveis. Sua indústria tornou-se um exemplo mundial. Veio a ser uma das maiores economias do Planeta.
A segunda tinha como característica central a dominação violenta de sua população, com uso do partido e de sua polícia política. As suas condições sociais eram precárias e a liberdade era sistematicamente pisoteada. Tais eram seus problemas que o socialismo sucumbiu às suas próprias contradições. Nem os prussianos resistiram ao socialismo. A queda do Muro de Berlim foi um símbolo da derrocada socialista/comunista. A ideia socialista esborrachou-se no chão.
A esquerda tupiniquim, porém, teima em nada aprender. Parafraseando Talleyrand, discorrendo sobre a aristocracia emigrada, que se obstinava em não reconhecer os eventos revolucionários: “Eles nada aprenderam e nada esqueceram.”
Para essa esquerda, o socialismo continua plenamente vigente, sendo superior ao capitalismo, compreendido como fonte de todos os males. Trata-se de uma visão religiosa: o capitalismo é o pecado, o mal sobre a Terra, a origem do egoísmo e do lucro, enquanto o socialismo seria a redenção da humanidade, a solidariedade enfim conquistada entre os homens.
O embuste consiste no seguinte. O capitalismo não é comparado ao socialismo. Se isto fosse feito, a comparação, por exemplo, deveria ser entre a Alemanha capitalista e a socialista, ou ainda, entre a Coreia capitalista e a socialista. Os termos da comparação teriam parâmetros que serviriam de critério para qualquer avaliação.
A “comparação” é de outro tipo. Compara-se o capitalismo real, existente, com a ideia do socialismo, forjada por aqueles que lhe atribuem todas as perfeições. Ou seja, atribui-se ao socialismo todas as perfeições e, de posse destes atributos, passa-se a verificar se eles “existem” no capitalismo.
Isto é equivalente a comparar uma sociedade perfeita a uma imperfeita, ou ainda, a comparar o homem a Deus. É claro que o homem, com suas imperfeições, sairá sempre perdendo quando comparado a Deus. O mesmo destino teria a comparação entre uma sociedade perfeita (ideal) e uma imperfeita (real).
Mais curiosa ainda é a afirmação de alguns segundo os quais haveria plena compatibilidade entre socialismo e democracia, quando isto não se verificou historicamente em nenhum lugar. O socialismo no Poder se caracterizou pela tirania totalitária. O “pensamento” esquerdista, se é que se pode utilizar essa palavra, é totalmente capturado pelo dogma, esse repouso dos que se recusam a pensar. É o mundo das ideias descontroladas, que não podem ser verificadas empiricamente. Ora, só onde o capitalismo prosperou é que a democracia representativa foi consolidada e os cidadãos puderam usufruir da liberdade.
Há uma mentalidade religiosa, teológico-política, que guia a esquerda tupiniquim. Vive de “preconceitos” contra a economia de mercado e o direito de propriedade, postulando, como se fosse uma coisa teoricamente séria, a “utopia” ou o “socialismo” enquanto ideias “superiores” ao capitalismo. Na ausência de conceitos, contenta-se com diatribes contra o “neoliberalismo” e outras patranhas do mesmo tipo, como se fazer política residisse somente em enganar o próximo, em abusar da inteligência alheia.
O assassinato político tornou-se uma forma ‘corriqueira’ de a esquerda resolver os seus conflitos intestinos
O assassinato político de Jang Song-Thaek, tio e mentor político de Kim Jong-un, Líder Máximo da Coreia do Norte, apesar de grotesco, não deixa de ser algo, digamos, “normal”, dada a característica stalinista deste regime político. Nada muito diferente do que a esquerda totalitária fez na extinta União Soviética, nos hoje amplamente conhecidos Processos de Moscou, que eliminaram a velha guarda bolchevique.
Em outro célebre episódio, Trotsky primeiro foi apagado de uma foto junto a Lênin em uma comemoração revolucionária para, depois, ser “apagado” com uma machadinha na cabeça, no México. Quem perpetrou tal assassinato foi um agente de Stálin, Ramón Mercader, que acabou placidamente os seus dias, em Cuba, com todos os privilégios da nomenclatura castrista.
Nada tampouco distinto do que Mao fez na China. Os camaradas, amigos de ontem, tornavam-se os inimigos de hoje, taxados de contrarrevolucionários a serviço do capitalismo.
No Brasil, ainda atualmente, há os que admiram Marighella e a guerrilha do Araguaia, que compartilhavam das mesmas concepções marxistas. Há, em todos esses casos, uma patológica perversão das ideias.
O assassinato político tornou-se uma forma “corriqueira” de a esquerda resolver os seus conflitos intestinos. Processos jurídicos de fachada, tortura, acusações infundadas e mortes eram características próprias da esquerda no Poder. Não há sequer uma experiência histórica de compatibilização entre socialismo/comunismo e democracia. Lá onde o socialismo vingou, a democracia jamais germinou. Cuba e Coreia do Norte são rebentos deste período.
Se tomarmos a Coreia do Norte e a Coreia do Sul, teremos uma oportunidade rara de comparação entre socialismo e capitalismo. O capitalismo sul-coreano produziu uma sociedade próspera, com alto grau de desenvolvimento industrial, científico e tecnológico. Empresas e universidades lá se retroalimentam. Sua educação tornou-se referência mundial. A democracia é o seu regime político.
A Coreia do Norte, por sua vez, é um regime tirânico, liberticida, que reduz a sua população a uma vida miserável. A fome grassa e os servos deste país sucumbem à falta de alimentos. Nada funciona, a não ser o Exército dotado de armamento nuclear, usado como ameaça constante à Coreia do Sul. Os seus processos políticos são uma caricatura, tendo sido neste país instaurada uma monarquia comunista, com direito de hereditariedade!
O século XX também apresentou outra experiência altamente significativa. Só os tolos hesitam em extrair dela o seu ensinamento. Havia duas Alemanhas, a Ocidental, capitalista, e a Oriental, socialista.
A primeira se caracterizava pela pujança, pelo respeito às liberdades, por uma vida sindical forte, por um crescimento econômico notável e por condições sociais invejáveis. Sua indústria tornou-se um exemplo mundial. Veio a ser uma das maiores economias do Planeta.
A segunda tinha como característica central a dominação violenta de sua população, com uso do partido e de sua polícia política. As suas condições sociais eram precárias e a liberdade era sistematicamente pisoteada. Tais eram seus problemas que o socialismo sucumbiu às suas próprias contradições. Nem os prussianos resistiram ao socialismo. A queda do Muro de Berlim foi um símbolo da derrocada socialista/comunista. A ideia socialista esborrachou-se no chão.
A esquerda tupiniquim, porém, teima em nada aprender. Parafraseando Talleyrand, discorrendo sobre a aristocracia emigrada, que se obstinava em não reconhecer os eventos revolucionários: “Eles nada aprenderam e nada esqueceram.”
Para essa esquerda, o socialismo continua plenamente vigente, sendo superior ao capitalismo, compreendido como fonte de todos os males. Trata-se de uma visão religiosa: o capitalismo é o pecado, o mal sobre a Terra, a origem do egoísmo e do lucro, enquanto o socialismo seria a redenção da humanidade, a solidariedade enfim conquistada entre os homens.
O embuste consiste no seguinte. O capitalismo não é comparado ao socialismo. Se isto fosse feito, a comparação, por exemplo, deveria ser entre a Alemanha capitalista e a socialista, ou ainda, entre a Coreia capitalista e a socialista. Os termos da comparação teriam parâmetros que serviriam de critério para qualquer avaliação.
A “comparação” é de outro tipo. Compara-se o capitalismo real, existente, com a ideia do socialismo, forjada por aqueles que lhe atribuem todas as perfeições. Ou seja, atribui-se ao socialismo todas as perfeições e, de posse destes atributos, passa-se a verificar se eles “existem” no capitalismo.
Isto é equivalente a comparar uma sociedade perfeita a uma imperfeita, ou ainda, a comparar o homem a Deus. É claro que o homem, com suas imperfeições, sairá sempre perdendo quando comparado a Deus. O mesmo destino teria a comparação entre uma sociedade perfeita (ideal) e uma imperfeita (real).
Mais curiosa ainda é a afirmação de alguns segundo os quais haveria plena compatibilidade entre socialismo e democracia, quando isto não se verificou historicamente em nenhum lugar. O socialismo no Poder se caracterizou pela tirania totalitária. O “pensamento” esquerdista, se é que se pode utilizar essa palavra, é totalmente capturado pelo dogma, esse repouso dos que se recusam a pensar. É o mundo das ideias descontroladas, que não podem ser verificadas empiricamente. Ora, só onde o capitalismo prosperou é que a democracia representativa foi consolidada e os cidadãos puderam usufruir da liberdade.
Há uma mentalidade religiosa, teológico-política, que guia a esquerda tupiniquim. Vive de “preconceitos” contra a economia de mercado e o direito de propriedade, postulando, como se fosse uma coisa teoricamente séria, a “utopia” ou o “socialismo” enquanto ideias “superiores” ao capitalismo. Na ausência de conceitos, contenta-se com diatribes contra o “neoliberalismo” e outras patranhas do mesmo tipo, como se fazer política residisse somente em enganar o próximo, em abusar da inteligência alheia.
A perna manca de 2014 - VALDO CRUZ
FOLHA DE SP - 30/12
BRASÍLIA - O ano das estripulias econômicas do governo Dilma chega ao fim com algumas boas notícias. A inflação voltou a ser tratada como um mal a ser combatido. Ajustes foram feitos e as concessões decolaram. Falta, contudo, uma perna ainda manca, a da política fiscal.
Apesar das promessas, ainda não há uma clareza sobre a real disposição do governo de conter seus gastos. Por um simples motivo: é minoria na equipe presidencial o grupo que defende um aperto fiscal.
Em vez de admitir a realidade, Dilma e sua equipe preferem acusar o mercado de má vontade com o governo atual, só porque ele é do PT. Bem, vamos, então, aos números, que não costumam mentir.
No início de 2013, o governo prometeu economizar 3,1% do PIB para pagamento da dívida pública, a meta de superavit primário. Dela, 2,1% seriam de sua responsabilidade. Depois, reduziu a meta para 2,3%. Sua parte despencou para 1,5%.
E tudo indica que nem isso será cumprido. Ou seja, o governo gastou, sim, muito, jogando lenha na fogueira da inflação. Para 2014, os primeiros dados indicam um apetite ainda maior por mais gastos.
Ao elaborar o Orçamento do ano que vem, o governo fixou uma meta de superavit de 2,1% do PIB, menor do que a de 2,3% revisada deste ano. Não para aí. Da meta de 2,1%, a parte do governo federal seria de apenas 1,1%. Bem mais baixa do que a de 2013, que ficou em 1,5%.
Sinal ainda mais forte do desejo de gastança da equipe dilmista no ano da campanha da reeleição da chefe. Em sua defesa, o governo diz que tem elevado os gastos sociais. Só que não dá para aumentar despesas sem receitas para bancá-las. É insustentável no médio prazo.
Agora, diante do risco de a inflação voltar a subir no ano da reeleição, o governo promete elevar sua meta de superavit em 2014. A decisão ficou para janeiro. Saberemos, então, se o Brasil seguirá mancando ou, enfim, acertará o passo.
BRASÍLIA - O ano das estripulias econômicas do governo Dilma chega ao fim com algumas boas notícias. A inflação voltou a ser tratada como um mal a ser combatido. Ajustes foram feitos e as concessões decolaram. Falta, contudo, uma perna ainda manca, a da política fiscal.
Apesar das promessas, ainda não há uma clareza sobre a real disposição do governo de conter seus gastos. Por um simples motivo: é minoria na equipe presidencial o grupo que defende um aperto fiscal.
Em vez de admitir a realidade, Dilma e sua equipe preferem acusar o mercado de má vontade com o governo atual, só porque ele é do PT. Bem, vamos, então, aos números, que não costumam mentir.
No início de 2013, o governo prometeu economizar 3,1% do PIB para pagamento da dívida pública, a meta de superavit primário. Dela, 2,1% seriam de sua responsabilidade. Depois, reduziu a meta para 2,3%. Sua parte despencou para 1,5%.
E tudo indica que nem isso será cumprido. Ou seja, o governo gastou, sim, muito, jogando lenha na fogueira da inflação. Para 2014, os primeiros dados indicam um apetite ainda maior por mais gastos.
Ao elaborar o Orçamento do ano que vem, o governo fixou uma meta de superavit de 2,1% do PIB, menor do que a de 2,3% revisada deste ano. Não para aí. Da meta de 2,1%, a parte do governo federal seria de apenas 1,1%. Bem mais baixa do que a de 2013, que ficou em 1,5%.
Sinal ainda mais forte do desejo de gastança da equipe dilmista no ano da campanha da reeleição da chefe. Em sua defesa, o governo diz que tem elevado os gastos sociais. Só que não dá para aumentar despesas sem receitas para bancá-las. É insustentável no médio prazo.
Agora, diante do risco de a inflação voltar a subir no ano da reeleição, o governo promete elevar sua meta de superavit em 2014. A decisão ficou para janeiro. Saberemos, então, se o Brasil seguirá mancando ou, enfim, acertará o passo.
Careca de saber - RICARDO NOBLAT
O GLOBO - 30/12
"Renan estava careca de saber que não pode usar avião da FAB para viagem particular"
Chico Alencar, PSOL-RJ
O Senado deve ao distinto público a abertura de um processo para cassar por quebra de decoro o mandato do seu presidente, Renan Calheiros. Ou não é falta de decoro ignorar a lei? Ou não foi o que fez Renan ao voar em jatinho da FAB para se submeter no Recife a um implante de dez mil fios de cabelo? Com um agravante: depois de flagrado voando às nossas custas, tentou encenar uma farsa. Consultou a FAB sobre se de fato desrespeitara a lei.
A FAB NÃO respondeu à consulta. Deu-se ao respeito. Renan estava careca de saber que o decreto que regulamenta o uso por autoridades de jatinhos da FAB não prevê deslocamentos por razões particulares. É lícita a requisição de jatinho para viagens a serviço ou de volta ao seu estado, por exemplo. Ou em caso de emergência médica. Um implante capilar é tudo - até um luxo. Emergência, não é.
IMAGINE SE FOSSE possível escapar dos rigores da lei sob a desculpa de que desconhecia sua existência. "Sinto muito, mas nunca fora apresentado a essa lei". Não teríamos um Estado, não como o que conhecemos hoje. Mas um Estado de anarquia. Renan é político desde 1978. Foi duas vezes deputado federal por Alagoas, três vezes senador, líder do governo Collor e ministro da Justiça de Fernando Henrique.
UMA DE SUAS atividades é ajudar a fazer leis. Há várias de sua autoria. Fora centenas que ajudou a fazer.
Para isso, como deputado ou senador, sempre contou com a assessoria de dezenas de funcionários do quadro fixo da Câmara dos Deputados ou do Senado. Como presidente do Senado - o terceiro na linha direta da sucessão do presidente da República -, todas as suas dúvidas lhe são tiradas. Na hora.
COMO SUGERIR que possa ter sido traído pela memória? Ou que seus assessores possam ter-se enganado na interpretação da lei? Ou que caberia à FAB dizer se ele acertara ou não ao requisitar jato para uma viagem particular? E uma viagem que ele se empenhou para que não chamasse a atenção de ninguém? Como de costume, foi a imprensa que descobriu o malfeito de Renan.
NA NOITE DO último dia 18, uma quarta-feira, Renan voou a Recife a "serviço", conforme consta dos registros da FAB. A agenda dele no site do Senado omitiu a viagem. Uma vez lá, internou-se em uma clínica onde, no dia seguinte, teve dez mil fios de cabelo implantados na cabeça pelo cirurgião plástico Fernando Basto. A cirurgia durou oito horas. Seus resultados começarão a se tornar visíveis daqui a quatro meses.
DE RECIFE, Renan foi a Maceió. Um outro jatinho o levaria a Brasília quando quisesse. No que deu errado... Renan apelou para plano B - "A FAB tem a última palavra". Esqueceu de combinar com a FAB. Mandou um ofício ao comandante da FAB perguntando se cometera alguma "impropriedade" ao voar a Recife de jatinho. Não recebeu resposta. Decidiu então pagar à FAB os custos da viagem.
FINAL FELIZ? Quem, fora Renan, pode pensar assim? Ok, a imprensa esquecerá mais rapidamente o assunto por causa da decisão de Renan de reembolsar a FAB. E, se ela esquece, todo mundo muda de assunto. Mas Renan, além de tudo, é reincidente. Em junho passado, foi a Trancoso, na Bahia, para o casamento da filha do colega Eduardo Braga (PMDB-AM). Usou um jato da FAB. Flagrado, devolveu à FAB R$ 32 mil.
RENAN É TUDO - menos um inocente coitadinho. Ignorou a lei em junho, voltou a ignorá-la seis meses depois, só reembolsou a União quando os dois episódios se tornaram públicos. Do contrário... Razoável supor que teria embolsado nosso dinheiro em silêncio.
A FAB NÃO respondeu à consulta. Deu-se ao respeito. Renan estava careca de saber que o decreto que regulamenta o uso por autoridades de jatinhos da FAB não prevê deslocamentos por razões particulares. É lícita a requisição de jatinho para viagens a serviço ou de volta ao seu estado, por exemplo. Ou em caso de emergência médica. Um implante capilar é tudo - até um luxo. Emergência, não é.
IMAGINE SE FOSSE possível escapar dos rigores da lei sob a desculpa de que desconhecia sua existência. "Sinto muito, mas nunca fora apresentado a essa lei". Não teríamos um Estado, não como o que conhecemos hoje. Mas um Estado de anarquia. Renan é político desde 1978. Foi duas vezes deputado federal por Alagoas, três vezes senador, líder do governo Collor e ministro da Justiça de Fernando Henrique.
UMA DE SUAS atividades é ajudar a fazer leis. Há várias de sua autoria. Fora centenas que ajudou a fazer.
Para isso, como deputado ou senador, sempre contou com a assessoria de dezenas de funcionários do quadro fixo da Câmara dos Deputados ou do Senado. Como presidente do Senado - o terceiro na linha direta da sucessão do presidente da República -, todas as suas dúvidas lhe são tiradas. Na hora.
COMO SUGERIR que possa ter sido traído pela memória? Ou que seus assessores possam ter-se enganado na interpretação da lei? Ou que caberia à FAB dizer se ele acertara ou não ao requisitar jato para uma viagem particular? E uma viagem que ele se empenhou para que não chamasse a atenção de ninguém? Como de costume, foi a imprensa que descobriu o malfeito de Renan.
NA NOITE DO último dia 18, uma quarta-feira, Renan voou a Recife a "serviço", conforme consta dos registros da FAB. A agenda dele no site do Senado omitiu a viagem. Uma vez lá, internou-se em uma clínica onde, no dia seguinte, teve dez mil fios de cabelo implantados na cabeça pelo cirurgião plástico Fernando Basto. A cirurgia durou oito horas. Seus resultados começarão a se tornar visíveis daqui a quatro meses.
DE RECIFE, Renan foi a Maceió. Um outro jatinho o levaria a Brasília quando quisesse. No que deu errado... Renan apelou para plano B - "A FAB tem a última palavra". Esqueceu de combinar com a FAB. Mandou um ofício ao comandante da FAB perguntando se cometera alguma "impropriedade" ao voar a Recife de jatinho. Não recebeu resposta. Decidiu então pagar à FAB os custos da viagem.
FINAL FELIZ? Quem, fora Renan, pode pensar assim? Ok, a imprensa esquecerá mais rapidamente o assunto por causa da decisão de Renan de reembolsar a FAB. E, se ela esquece, todo mundo muda de assunto. Mas Renan, além de tudo, é reincidente. Em junho passado, foi a Trancoso, na Bahia, para o casamento da filha do colega Eduardo Braga (PMDB-AM). Usou um jato da FAB. Flagrado, devolveu à FAB R$ 32 mil.
RENAN É TUDO - menos um inocente coitadinho. Ignorou a lei em junho, voltou a ignorá-la seis meses depois, só reembolsou a União quando os dois episódios se tornaram públicos. Do contrário... Razoável supor que teria embolsado nosso dinheiro em silêncio.
Muito além da urna - JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S.Paulo - 30/12
Em ano de eleição presidencial, o Brasil discute problemas aparentemente essenciais: privatizar o privado, estatizar o público, bolsas e embolsos. Mas, para espanto dos políticos, a vida dos brasileiros depende pouco dos eleitos. As principais tendências da população mudam à revelia de Brasília.
E muita coisa está mudando. Mais instruída e integrada ao mercado de trabalho, a brasileira casa e tem filhos cada vez mais tarde. A idade média das mães cresceu 12 meses em uma década. Está em 26 anos e aumentando. Uma brasileira de 20 e 24 anos tem 62% de probabilidade de não ser mãe. Se a jovem for branca, a chance de não ter dado à luz chega a 70%.
Mais drástico ainda foi o amadurecimento das noivas. Em 2003, a idade típica da mulher solteira ao casar era 21 anos. Em 2012, já beirava os 25 anos. Essa média oculta um fenômeno dentro das estatísticas do registro civil: em 10 anos, duplicou o número de mulheres de 30 anos ou mais que se casam no papel.
Em parte, é fruto do envelhecimento da população, pois há também mais homens dessa idade se casando. Mas o fenômeno é 30% mais intenso entre as mulheres. As maduras estão mais casadoiras - ironicamente - devido ao novo padrão de mortalidade masculina.
Nasce um brasileiro a cada 10 segundos. Há 5% mais chances de o recém-nascido ser homem. A prevalência do sexo masculino nos nascimentos costumava ser rapidamente compensada pela maior sobrevivência das mulheres. Mas a drástica diminuição da mortalidade na infância faz com que o excedente masculino perdure cada vez mais.
Só quando os nascidos em 2012 completarem 37 anos haverá mais brasileiras do que brasileiros dessa mesma idade. Nas gerações seguintes, essa inversão vai levar mais e mais tempo. O excedente masculino provoca novos comportamentos e uma profunda transformação das relações entre os sexos - inclusive de poder.
Hoje, o mercado matrimonial favorece as mulheres até a faixa dos 30 anos. Além dos homens da mesma idade, mais numerosos, elas atraem também maridos mais velhos. Daí em diante, porém, a oferta de parceiras é maior do que a de parceiros da mesma geração - e muitos desses homens maduros casam com mulheres mais jovens.
É o que a demografia batizou de "pirâmide da solidão": à medida que a idade avançava, as brasileiras, principalmente separadas ou viúvas, tinham ao alcance um contingente cada vez menor de potenciais parceiros, enquanto para os homens a oferta de companheiras aumentava. Com o tempo, cresciam as solitárias e diminuíam os solitários. Mas a pirâmide começa a ruir.
Em 2012, para cada 100 divorciadas que voltaram a se casar, houve 136 divorciados que formalizaram nova união. Felizmente para as mulheres, a desproporção está diminuindo rapidamente. A diferença, que era de 45% só quatro anos antes, caiu para 36% e diminui ano a ano. Tende a desaparecer em pouco tempo. Mas como?
Morre um bebê a cada 15 minutos no Brasil, e a chance de a vítima ser menino é 25% maior. A fragilidade do dito sexo forte se mantém até os 80 anos, quando as mortes femininas pela primeira vez suplantam as masculinas em volume. Por isso, toda redução da mortalidade, principalmente nos primeiros anos de vida, aumenta a proporção de homens na população.
As próprias mulheres têm contribuído para isso: 61% das mães já fazem 7 ou mais consultas pré-natal. Agem em benefício próprio. Menor mortalidade implica maior número de homens, o que aumenta as oportunidades matrimoniais por um período mais longo. Elas ficam em posição de força para postergar a escolha do parceiro enquanto se afirmam profissional e politicamente. É uma revolução, e isso tem pouco ou quase nada a ver com a eleição.
Em ano de eleição presidencial, o Brasil discute problemas aparentemente essenciais: privatizar o privado, estatizar o público, bolsas e embolsos. Mas, para espanto dos políticos, a vida dos brasileiros depende pouco dos eleitos. As principais tendências da população mudam à revelia de Brasília.
E muita coisa está mudando. Mais instruída e integrada ao mercado de trabalho, a brasileira casa e tem filhos cada vez mais tarde. A idade média das mães cresceu 12 meses em uma década. Está em 26 anos e aumentando. Uma brasileira de 20 e 24 anos tem 62% de probabilidade de não ser mãe. Se a jovem for branca, a chance de não ter dado à luz chega a 70%.
Mais drástico ainda foi o amadurecimento das noivas. Em 2003, a idade típica da mulher solteira ao casar era 21 anos. Em 2012, já beirava os 25 anos. Essa média oculta um fenômeno dentro das estatísticas do registro civil: em 10 anos, duplicou o número de mulheres de 30 anos ou mais que se casam no papel.
Em parte, é fruto do envelhecimento da população, pois há também mais homens dessa idade se casando. Mas o fenômeno é 30% mais intenso entre as mulheres. As maduras estão mais casadoiras - ironicamente - devido ao novo padrão de mortalidade masculina.
Nasce um brasileiro a cada 10 segundos. Há 5% mais chances de o recém-nascido ser homem. A prevalência do sexo masculino nos nascimentos costumava ser rapidamente compensada pela maior sobrevivência das mulheres. Mas a drástica diminuição da mortalidade na infância faz com que o excedente masculino perdure cada vez mais.
Só quando os nascidos em 2012 completarem 37 anos haverá mais brasileiras do que brasileiros dessa mesma idade. Nas gerações seguintes, essa inversão vai levar mais e mais tempo. O excedente masculino provoca novos comportamentos e uma profunda transformação das relações entre os sexos - inclusive de poder.
Hoje, o mercado matrimonial favorece as mulheres até a faixa dos 30 anos. Além dos homens da mesma idade, mais numerosos, elas atraem também maridos mais velhos. Daí em diante, porém, a oferta de parceiras é maior do que a de parceiros da mesma geração - e muitos desses homens maduros casam com mulheres mais jovens.
É o que a demografia batizou de "pirâmide da solidão": à medida que a idade avançava, as brasileiras, principalmente separadas ou viúvas, tinham ao alcance um contingente cada vez menor de potenciais parceiros, enquanto para os homens a oferta de companheiras aumentava. Com o tempo, cresciam as solitárias e diminuíam os solitários. Mas a pirâmide começa a ruir.
Em 2012, para cada 100 divorciadas que voltaram a se casar, houve 136 divorciados que formalizaram nova união. Felizmente para as mulheres, a desproporção está diminuindo rapidamente. A diferença, que era de 45% só quatro anos antes, caiu para 36% e diminui ano a ano. Tende a desaparecer em pouco tempo. Mas como?
Morre um bebê a cada 15 minutos no Brasil, e a chance de a vítima ser menino é 25% maior. A fragilidade do dito sexo forte se mantém até os 80 anos, quando as mortes femininas pela primeira vez suplantam as masculinas em volume. Por isso, toda redução da mortalidade, principalmente nos primeiros anos de vida, aumenta a proporção de homens na população.
As próprias mulheres têm contribuído para isso: 61% das mães já fazem 7 ou mais consultas pré-natal. Agem em benefício próprio. Menor mortalidade implica maior número de homens, o que aumenta as oportunidades matrimoniais por um período mais longo. Elas ficam em posição de força para postergar a escolha do parceiro enquanto se afirmam profissional e politicamente. É uma revolução, e isso tem pouco ou quase nada a ver com a eleição.
O Julinho e o ensino - PAULO BROSSARD
ZERO HORA - 30/12
Um fato chocante e de inegável importância social foi divulgado por ZH dias antes do Natal ao retratar a alarmante deterioração de um dos mais conceituados colégios de Porto Alegre, o “Julinho”, como era familiarmente denominado o “Julio de Castilhos”. Ao tempo em que surgiam colégios de inspiração religiosa, logo consagrados pela excelência do ensino ministrados por notáveis educadores, o governo rio-grandense, de forte tintura comtiana, cuidou de formar seu colégio padrão, que viria a levar o nome do chefe republicano; cansei de ouvir referências respeitosas ao colégio laico destinado a cotejar com os católicos e evangélicos; o maior louvor suponho viesse daqueles que lhe houvessem frequentado. O trabalho da jornalista Letícia Duarte estendeu-se pelo ano escolar, 27 de fevereiro a 22 de novembro de 2013; registrando o colapso do que fora um colégio modelar; é impossível resumi-lo, o espaço seria insuficiente para um resumo do resumo, limito-me a dizer que, a todos os títulos, o quadro é deplorável.
É óbvio que sem professor não há escola nem ensino, no entanto, no Julinho, até sete professores por dia faltam às aulas, 89% dos alunos chegam ao final do Ensino Médio sem aprender o mínimo em matemática, 38% saem do Ensino Médio e chegam ao Superior e não sabem ler e escrever plenamente; ao fundo da sala alunos se divertem com equipamentos eletrônicos durante as aulas; essas singelas observações esclarecem porque a classificação do Brasil entre 65 nações ocupa posição desoladora. É de notar-se que isto acontece em um colégio que durante muitos anos foi dos melhores aqui existentes e em consequência no Brasil inteiro. Esta metamorfose não se operou de repente, o mal, por conseguinte não começou ontem. O colégio que foi o melhor não se transforma no pior da noite para o dia. E o mais grave é que a degradação se infiltra a setores relevantes do país, do governo inclusive a de instituições docentes. Dir-se-á que existem, Deus seja louvado, colégios da melhor e mais justificada reputação e eu sei disso e como brasileiro por isto me felicito, mas infelizmente isto não justifica a cota de colégios de inqualificável reputação. Segundo as repercussões até agora conhecidas verifica-se que há os que pensam que o fenômeno que deformou o Julinho tem caráter geral e há os que entendem que a falência do antigo e modelar ornamento do colégio oficial é uma exceção.
Não tenho elementos para opinar em favor de uma ou outra das interpretações, mas confesso a minha angústia cívica diante do espetáculo público do caso funesto e vexatório do Julinho uma vez que os efeitos dele se irradiam aos demais graus do ensino; é evidente que o ensino primário contamina o Ensino Médio e este compromete o Ensino Superior; a esse respeito, louvores seriam poucos, se as numerosas universidades emergentes realmente encarnassem o que a sua denominação anuncia. Confesso-me sem condições de opinar em assunto de tal relevância, pois não conheço o real teor do ensino oferecido e mais do que o ensino, da real formação de seus jovens frequentadores.
No entanto, há um dado idôneo que ajuda a esclarecer o problema em causa, não é segredo, foi amplamente divulgado que dos 65 países que participam do exame de avaliação internacional de alunos de 15 e 16 anos em várias áreas, ficou o Brasil na 55ª posição em leitura, 58ª em matemática e 59ª em ciências. Dispensável dizer que esses dados indicam as carências do ensino no Brasil. Os dados referidos são dolorosos para não dizer humilhantes. O caso do Julinho soa como uma espécie de S.O.S. partindo da educação.
Um fato chocante e de inegável importância social foi divulgado por ZH dias antes do Natal ao retratar a alarmante deterioração de um dos mais conceituados colégios de Porto Alegre, o “Julinho”, como era familiarmente denominado o “Julio de Castilhos”. Ao tempo em que surgiam colégios de inspiração religiosa, logo consagrados pela excelência do ensino ministrados por notáveis educadores, o governo rio-grandense, de forte tintura comtiana, cuidou de formar seu colégio padrão, que viria a levar o nome do chefe republicano; cansei de ouvir referências respeitosas ao colégio laico destinado a cotejar com os católicos e evangélicos; o maior louvor suponho viesse daqueles que lhe houvessem frequentado. O trabalho da jornalista Letícia Duarte estendeu-se pelo ano escolar, 27 de fevereiro a 22 de novembro de 2013; registrando o colapso do que fora um colégio modelar; é impossível resumi-lo, o espaço seria insuficiente para um resumo do resumo, limito-me a dizer que, a todos os títulos, o quadro é deplorável.
É óbvio que sem professor não há escola nem ensino, no entanto, no Julinho, até sete professores por dia faltam às aulas, 89% dos alunos chegam ao final do Ensino Médio sem aprender o mínimo em matemática, 38% saem do Ensino Médio e chegam ao Superior e não sabem ler e escrever plenamente; ao fundo da sala alunos se divertem com equipamentos eletrônicos durante as aulas; essas singelas observações esclarecem porque a classificação do Brasil entre 65 nações ocupa posição desoladora. É de notar-se que isto acontece em um colégio que durante muitos anos foi dos melhores aqui existentes e em consequência no Brasil inteiro. Esta metamorfose não se operou de repente, o mal, por conseguinte não começou ontem. O colégio que foi o melhor não se transforma no pior da noite para o dia. E o mais grave é que a degradação se infiltra a setores relevantes do país, do governo inclusive a de instituições docentes. Dir-se-á que existem, Deus seja louvado, colégios da melhor e mais justificada reputação e eu sei disso e como brasileiro por isto me felicito, mas infelizmente isto não justifica a cota de colégios de inqualificável reputação. Segundo as repercussões até agora conhecidas verifica-se que há os que pensam que o fenômeno que deformou o Julinho tem caráter geral e há os que entendem que a falência do antigo e modelar ornamento do colégio oficial é uma exceção.
Não tenho elementos para opinar em favor de uma ou outra das interpretações, mas confesso a minha angústia cívica diante do espetáculo público do caso funesto e vexatório do Julinho uma vez que os efeitos dele se irradiam aos demais graus do ensino; é evidente que o ensino primário contamina o Ensino Médio e este compromete o Ensino Superior; a esse respeito, louvores seriam poucos, se as numerosas universidades emergentes realmente encarnassem o que a sua denominação anuncia. Confesso-me sem condições de opinar em assunto de tal relevância, pois não conheço o real teor do ensino oferecido e mais do que o ensino, da real formação de seus jovens frequentadores.
No entanto, há um dado idôneo que ajuda a esclarecer o problema em causa, não é segredo, foi amplamente divulgado que dos 65 países que participam do exame de avaliação internacional de alunos de 15 e 16 anos em várias áreas, ficou o Brasil na 55ª posição em leitura, 58ª em matemática e 59ª em ciências. Dispensável dizer que esses dados indicam as carências do ensino no Brasil. Os dados referidos são dolorosos para não dizer humilhantes. O caso do Julinho soa como uma espécie de S.O.S. partindo da educação.
O mergulho - FÁBIO ZANINI
FOLHA DE SP - 30/12
SÃO PAULO - A cena é digna de Monty Python. Sem camisa, o governador Cid Gomes mergulha numa adutora para tentar consertá-la em Itapipoca, cidade afetada pela seca no Ceará. Fica longos segundos dentro d'água, apenas o cocuruto calvo à mostra.
Volta com o cabelo escorrido na cara, dá uma cusparada, pega ar e tenta de novo. Finalmente consegue fechar uma válvula com defeito. Um puxa-saco pede palmas ao Jacques Cousteau cearense (a cena está em folha.com/no1390844).
O ridículo da performance tornou-a saco de pancada nas impiedosas redes sociais, mas há que se admitir que o governador não está sozinho.
Sair do gabinete, pôr a mão na massa ou simplesmente aparecer de um jeito inusitado são hoje pré-requisitos do manual do governante em busca de popularidade.
Não apenas no Brasil. Talvez Cid tivesse em mente as histrionices do uruguaio José Mujica (esse sim um Deus para a turma do Facebook), que moldou a Presidência à sua imagem de velhinho excêntrico. A última foi aparecer de sandálias e unha de fora na posse de um ministro.
Exemplo ainda maior é o do papa Francisco, cuja façanha em 2013 foi chacoalhar a igreja menos com reais mudanças de doutrina que com gestos como pagar sua conta numa pousada ou carregar a maleta na subida do avião.
No Brasil pós-protestos, as antenas das autoridades estão ainda mais alertas. Certamente isso entrou no cálculo da presidente Dilma para interromper sua folga de Natal e sobrevoar áreas inundadas em Minas.
Para Cid Gomes, talvez o maior problema seja ter adotado tardiamente o estilo "gente que faz". Um único banho de adutora não deve ser suficiente para desfazer o estrago na imagem causado por farras como a contratação da cantora Ivete Sangalo a peso de ouro para inaugurar um hospital (inacabado) em Sobral, há um ano. Aguardemos, portanto, suas novas peripécias.
SÃO PAULO - A cena é digna de Monty Python. Sem camisa, o governador Cid Gomes mergulha numa adutora para tentar consertá-la em Itapipoca, cidade afetada pela seca no Ceará. Fica longos segundos dentro d'água, apenas o cocuruto calvo à mostra.
Volta com o cabelo escorrido na cara, dá uma cusparada, pega ar e tenta de novo. Finalmente consegue fechar uma válvula com defeito. Um puxa-saco pede palmas ao Jacques Cousteau cearense (a cena está em folha.com/no1390844).
O ridículo da performance tornou-a saco de pancada nas impiedosas redes sociais, mas há que se admitir que o governador não está sozinho.
Sair do gabinete, pôr a mão na massa ou simplesmente aparecer de um jeito inusitado são hoje pré-requisitos do manual do governante em busca de popularidade.
Não apenas no Brasil. Talvez Cid tivesse em mente as histrionices do uruguaio José Mujica (esse sim um Deus para a turma do Facebook), que moldou a Presidência à sua imagem de velhinho excêntrico. A última foi aparecer de sandálias e unha de fora na posse de um ministro.
Exemplo ainda maior é o do papa Francisco, cuja façanha em 2013 foi chacoalhar a igreja menos com reais mudanças de doutrina que com gestos como pagar sua conta numa pousada ou carregar a maleta na subida do avião.
No Brasil pós-protestos, as antenas das autoridades estão ainda mais alertas. Certamente isso entrou no cálculo da presidente Dilma para interromper sua folga de Natal e sobrevoar áreas inundadas em Minas.
Para Cid Gomes, talvez o maior problema seja ter adotado tardiamente o estilo "gente que faz". Um único banho de adutora não deve ser suficiente para desfazer o estrago na imagem causado por farras como a contratação da cantora Ivete Sangalo a peso de ouro para inaugurar um hospital (inacabado) em Sobral, há um ano. Aguardemos, portanto, suas novas peripécias.
Cabeça de Ruy Barbosa - RUBEM AZEVEDO LIMA
CORREIO BRAZILIENSE - 30/12
Bom Senso FC, movimento que acredita representar os jogadores de futebol no país, lamentou o fim do Campeonato Brasileiro "de forma melancólica", que, como disse o presidente da CBF, José Maria Marin, acabou "dentro do Tribunal". Este é aquele que guardou a medalha de ouro de um atleta. O repórter, tanto quanto Maria Marin, cumpre seu dever, mas acha que os atletas do Bom Senso nem conhecem os departamentos de seus clubes para saberem se eles estão quites com seus compromissos disciplinares. Tais diretorias costumam atender, em geral, mais os chamados craques, do que os indisciplinados.
Quem acompanhou a defesa dos advogados do Flamengo e da Portuguesa estranhou, pois eles pareciam estar mais preparados para atacar o clube adversário, valendo-se dos apupos do público flamenguista e lusitano ao advogado e ao clube adversário, interessados os dois. Mas a galhofa contra o Fluminense foi um trabalho malfeito e a maldade dos que prepararam os que tinham esse objetivo perdeu seu tempo.
Aliás, o Ministro Marco Aurélio, do STF, observou que "a celeuma no futebol que salvou o Fluminense tem um simbolismo: provou-se que as regras são para serem cumpridas e quem não cumpri-las será punido".
A psiquiatria de Freud diz que a inveja é um erro terrível à verdade sobre os erros morais. Camões diz, com Marco Aurélio: "A inverdade é o que nunca salvará a inveja. O bem de outrem merece o que o céu deseja".
No futebol, a bola com que se joga não chega ao céu. As jogadas tão altas normalmente não são dignas de craques. Pelo contrário; estes, em perigo, não hesitam em chutar.
O que periga é o Brasil. Mas não na política, face às eleições o Congresso está separado. Quanto à economia, idem, como a política, o governo mostra agir sem orientação.
O que pode nos salvar é a Justiça. Mas estamos às voltas com a corrupção. Vista nossa posição inferior na América do Sul, teremos de trabalhar muito para igualá-la e passá-la.
A descoberta do ministro do Supremo Marco Aurélio na IstoÉ é a celeuma do futebol brasileiro, no qual cada jogador joga para si mesmo. Basta educá-los para que os craques joguem unidos, não como se não jogassem todos por uns, na tragédia do Maracanã, de 70 mil brasileiros nas arquibancadas.
Quem acompanhou a defesa dos advogados do Flamengo e da Portuguesa estranhou, pois eles pareciam estar mais preparados para atacar o clube adversário, valendo-se dos apupos do público flamenguista e lusitano ao advogado e ao clube adversário, interessados os dois. Mas a galhofa contra o Fluminense foi um trabalho malfeito e a maldade dos que prepararam os que tinham esse objetivo perdeu seu tempo.
Aliás, o Ministro Marco Aurélio, do STF, observou que "a celeuma no futebol que salvou o Fluminense tem um simbolismo: provou-se que as regras são para serem cumpridas e quem não cumpri-las será punido".
A psiquiatria de Freud diz que a inveja é um erro terrível à verdade sobre os erros morais. Camões diz, com Marco Aurélio: "A inverdade é o que nunca salvará a inveja. O bem de outrem merece o que o céu deseja".
No futebol, a bola com que se joga não chega ao céu. As jogadas tão altas normalmente não são dignas de craques. Pelo contrário; estes, em perigo, não hesitam em chutar.
O que periga é o Brasil. Mas não na política, face às eleições o Congresso está separado. Quanto à economia, idem, como a política, o governo mostra agir sem orientação.
O que pode nos salvar é a Justiça. Mas estamos às voltas com a corrupção. Vista nossa posição inferior na América do Sul, teremos de trabalhar muito para igualá-la e passá-la.
A descoberta do ministro do Supremo Marco Aurélio na IstoÉ é a celeuma do futebol brasileiro, no qual cada jogador joga para si mesmo. Basta educá-los para que os craques joguem unidos, não como se não jogassem todos por uns, na tragédia do Maracanã, de 70 mil brasileiros nas arquibancadas.
Duas ou três coisas sobre 2013 - LUIZ SÉRGIO HENRIQUES
O Estado de S.Paulo - 30/12
Nada difícil encontrar sinais contraditórios para onde quer que se olhe, no mundo e no Brasil, a confirmar que vivemos situação inédita em que não basta a navegação de cabotagem, quando acidentes geográficos familiares, ao alcance da vista, asseguram a tranquilidade do viajante. Agora, de cada um dos atores da cena pública o que se requer é a renovação ousada do repertório de conceitos e valores, de modo que, num cenário subitamente em movimento, encontros imprevistos entre tradições diferentes e até antagônicas podem descortinar modos novos de fazer política e cultura, à altura da situação que alguns definem como de "emergência antropológica", tamanhos os riscos (e as possibilidades) inerentes à atual estrutura do mundo.
Esta é toda uma época, como comumente se diz, de globalização neoliberal ou, se quisermos, de agressiva afirmação do "comunismo dos capitalistas", sob a égide dos caprichos voláteis e tempos velozes da grande finança. Uma época que pode ser lida sob a ótica da unificação contraditória do gênero humano, que deixa de ser categoria filosófico-especulativa para se tornar realidade imediatamente palpável para cada pessoa: já se observou, por exemplo, que até as doenças são globais, a exigir medidas que muitas vezes superam o poder de reação das autoridades de determinado país.
Nem tudo é perdição. Não vivemos, como diagnosticou certa esquerda de tons apocalípticos há um século diante do flagelo da guerra, a era da pecaminosidade absoluta. Indicadores confiáveis trazem a boa-nova segundo a qual, com tal processo de unificação do gênero, diminuiu consistentemente a pobreza em termos absolutos, embora as desigualdades sejam crescentes entre países e no interior dos diferentes países. Fenômeno agravado nestes últimos anos de impenitente crise, com seu cortejo dramático de desemprego estrutural, migrações massivas, tragédias econômicas que marcam o destino de milhões de pessoas.
Um bom diagnóstico, não pessimista, mas rigoroso em suas implicações, é o de que vivemos descompasso crescentemente insustentável entre a internacionalização das forças econômicas, que têm o mundo inteiro como seu teatro real, e a timidez da política - certamente, da política democrática, essa que mobiliza o interesse e a consciência de grandes massas -, cujo âmbito ainda são os Estados nacionais, relativamente impotentes para redefinir e regular correntes que superam amplamente sua capacidade de intervenção.
Esta, a realidade efetiva, para empregar expressão ao gosto de um clássico renascentista de 500 anos, completados no ano que ora finda. Inútil retornar, entre outras categorias, ao "finalismo" do comunismo do século 20, que imaginava a transição para um Estado ideal - o socialismo ou o comunismo, precisamente -, determinado pelo desenvolvimento das forças produtivas, que concretizaria, após o grande evento revolucionário, a hipótese do governo como mera administração das coisas. Uma realidade que comportaria, ainda, a supressão progressiva da mediação política, uma vez extirpadas as fontes básicas do conflito entre os homens. Para que, então, pensar o Estado, o Direito, a política - fantasmagorias destinadas a perecer paulatinamente, à medida que se aproximasse aquela imaginária e transparente realidade final da convivência humana?
Eis que descobrimos, ou redescobrimos, a ideia de que o movimento civilizatório é tudo, o fim é quase nada, ou, antes, será o que dele fizermos, em absoluta coerência com os meios de que lançarmos mão. Esquerda e direita ainda são palavras significativas na esfera pública, mas, além de palavras, devem se referir a coisas, situações, valores, classes, indivíduos. Apropriar-se, na medida do possível, dos mecanismos autonomizados que colonizam a vida dos indivíduos e lhes roubam autonomia e capacidade de escolha - essa deveria ser a tarefa fundamental das diferentes esquerdas.
Mas, assim como é um equívoco demonizar a direita - pois existem correntes moderadas e conservadoras que lutam legitimamente segundo as regras do jogo e, dentro da normal dialética democrática, não constituem retrocesso político ou social -, também não é suficiente, para a esquerda, a autocomplacência e a arrogância de se pretender, por definição, o "sal da terra". Apregoar pura e simplesmente "socialismo ou barbárie" significa cancelar, de modo míope, a tremenda realidade de que o século 20 conheceu formas bárbaras de socialismo, a seu tempo repudiadas pelas pessoas comuns às quais foram impostas.
Para onde quer que olhemos neste 2013, como dissemos, os sinais são às vezes iluminadores e às vezes, não. Por exemplo, perdemos Nelson Mandela, mas para reconstruir a esquerda a não violência é agora, e para sempre, valor estratégico. Como estratégico é compreender a política cada vez menos como coerção e cada vez mais como persuasão e convencimento mútuo. Sem abrir mão da intocável laicidade do Estado, patrimônio comum duramente conquistado, impossível ignorar, do ponto de vista da esquerda democrática, a bem-vinda presença de valores religiosos, revigorados por um pontífice que sob tantos aspectos traz à lembrança o afeto, a sabedoria e as luzes de João XXIII e seu Concílio Vaticano II - referência de diálogo entre as religiões, bem como entre religiosos e não religiosos.
Seria mesquinho reivindicar para um só lado do espectro político - qualquer que seja - o monopólio do terreno de encontro e diálogo. Ao contrário, a conquista maior consistiria em trazer para esse terreno a maior parte das forças políticas, sociais, intelectuais, sem apagar os bons motivos de diferença e divergência. Com isso aumentaríamos exponencialmente as chances de vencer os desafios da "emergência antropológica" à nossa frente. Mero desejo de um feliz 2014?
Nada difícil encontrar sinais contraditórios para onde quer que se olhe, no mundo e no Brasil, a confirmar que vivemos situação inédita em que não basta a navegação de cabotagem, quando acidentes geográficos familiares, ao alcance da vista, asseguram a tranquilidade do viajante. Agora, de cada um dos atores da cena pública o que se requer é a renovação ousada do repertório de conceitos e valores, de modo que, num cenário subitamente em movimento, encontros imprevistos entre tradições diferentes e até antagônicas podem descortinar modos novos de fazer política e cultura, à altura da situação que alguns definem como de "emergência antropológica", tamanhos os riscos (e as possibilidades) inerentes à atual estrutura do mundo.
Esta é toda uma época, como comumente se diz, de globalização neoliberal ou, se quisermos, de agressiva afirmação do "comunismo dos capitalistas", sob a égide dos caprichos voláteis e tempos velozes da grande finança. Uma época que pode ser lida sob a ótica da unificação contraditória do gênero humano, que deixa de ser categoria filosófico-especulativa para se tornar realidade imediatamente palpável para cada pessoa: já se observou, por exemplo, que até as doenças são globais, a exigir medidas que muitas vezes superam o poder de reação das autoridades de determinado país.
Nem tudo é perdição. Não vivemos, como diagnosticou certa esquerda de tons apocalípticos há um século diante do flagelo da guerra, a era da pecaminosidade absoluta. Indicadores confiáveis trazem a boa-nova segundo a qual, com tal processo de unificação do gênero, diminuiu consistentemente a pobreza em termos absolutos, embora as desigualdades sejam crescentes entre países e no interior dos diferentes países. Fenômeno agravado nestes últimos anos de impenitente crise, com seu cortejo dramático de desemprego estrutural, migrações massivas, tragédias econômicas que marcam o destino de milhões de pessoas.
Um bom diagnóstico, não pessimista, mas rigoroso em suas implicações, é o de que vivemos descompasso crescentemente insustentável entre a internacionalização das forças econômicas, que têm o mundo inteiro como seu teatro real, e a timidez da política - certamente, da política democrática, essa que mobiliza o interesse e a consciência de grandes massas -, cujo âmbito ainda são os Estados nacionais, relativamente impotentes para redefinir e regular correntes que superam amplamente sua capacidade de intervenção.
Esta, a realidade efetiva, para empregar expressão ao gosto de um clássico renascentista de 500 anos, completados no ano que ora finda. Inútil retornar, entre outras categorias, ao "finalismo" do comunismo do século 20, que imaginava a transição para um Estado ideal - o socialismo ou o comunismo, precisamente -, determinado pelo desenvolvimento das forças produtivas, que concretizaria, após o grande evento revolucionário, a hipótese do governo como mera administração das coisas. Uma realidade que comportaria, ainda, a supressão progressiva da mediação política, uma vez extirpadas as fontes básicas do conflito entre os homens. Para que, então, pensar o Estado, o Direito, a política - fantasmagorias destinadas a perecer paulatinamente, à medida que se aproximasse aquela imaginária e transparente realidade final da convivência humana?
Eis que descobrimos, ou redescobrimos, a ideia de que o movimento civilizatório é tudo, o fim é quase nada, ou, antes, será o que dele fizermos, em absoluta coerência com os meios de que lançarmos mão. Esquerda e direita ainda são palavras significativas na esfera pública, mas, além de palavras, devem se referir a coisas, situações, valores, classes, indivíduos. Apropriar-se, na medida do possível, dos mecanismos autonomizados que colonizam a vida dos indivíduos e lhes roubam autonomia e capacidade de escolha - essa deveria ser a tarefa fundamental das diferentes esquerdas.
Mas, assim como é um equívoco demonizar a direita - pois existem correntes moderadas e conservadoras que lutam legitimamente segundo as regras do jogo e, dentro da normal dialética democrática, não constituem retrocesso político ou social -, também não é suficiente, para a esquerda, a autocomplacência e a arrogância de se pretender, por definição, o "sal da terra". Apregoar pura e simplesmente "socialismo ou barbárie" significa cancelar, de modo míope, a tremenda realidade de que o século 20 conheceu formas bárbaras de socialismo, a seu tempo repudiadas pelas pessoas comuns às quais foram impostas.
Para onde quer que olhemos neste 2013, como dissemos, os sinais são às vezes iluminadores e às vezes, não. Por exemplo, perdemos Nelson Mandela, mas para reconstruir a esquerda a não violência é agora, e para sempre, valor estratégico. Como estratégico é compreender a política cada vez menos como coerção e cada vez mais como persuasão e convencimento mútuo. Sem abrir mão da intocável laicidade do Estado, patrimônio comum duramente conquistado, impossível ignorar, do ponto de vista da esquerda democrática, a bem-vinda presença de valores religiosos, revigorados por um pontífice que sob tantos aspectos traz à lembrança o afeto, a sabedoria e as luzes de João XXIII e seu Concílio Vaticano II - referência de diálogo entre as religiões, bem como entre religiosos e não religiosos.
Seria mesquinho reivindicar para um só lado do espectro político - qualquer que seja - o monopólio do terreno de encontro e diálogo. Ao contrário, a conquista maior consistiria em trazer para esse terreno a maior parte das forças políticas, sociais, intelectuais, sem apagar os bons motivos de diferença e divergência. Com isso aumentaríamos exponencialmente as chances de vencer os desafios da "emergência antropológica" à nossa frente. Mero desejo de um feliz 2014?
Feliz Brasil Novo - AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP - 30/12
A última imagem do ano para milhões de brasileiros solidários é a do sofrimento das famílias vítimas da violência das chuvas. O Brasil assiste a um novo capítulo da mesma tragédia muitas vezes anunciada.
Nenhum governo é responsável por desastres naturais, por chuvas ou enchentes que arrastam vidas e esperanças. Mas são responsáveis pelo que fazem e deixam de fazer.
A presidente Dilma fez bem em simbolicamente levar a solidariedade do país aos brasileiros das regiões atingidas. Mas errou ao tratar essas situações tão graves como se não tivesse responsabilidade sobre elas. As visitas e as declarações da presidente seriam adequadas a alguém que tivesse assumido o cargo na véspera, mas não cabem a quem representa um governo que há 11 anos conduz o país.
Infelizmente, mais uma vez, o governo enfrenta um problema objetivo, acirrado pela sua própria omissão, sem reconhecer a sua parcela de responsabilidade e se limitando a fazer novas promessas. Promessas que, provavelmente, não serão cumpridas, como não foram as feitas no passado.
Na visita a Minas, vendo o sofrimento da cidade de Virgolândia, a presidente surpreendeu a muitos ao comentar que a cidade teve sorte por não ter um rio caudaloso passando por perto. E, em mais um lance de marketing, anunciou a liberação de um cartão "ilimitado" para as prefeituras.
Nenhuma palavra sobre as ações --ou a ausência delas-- do governo federal nos últimos anos. Nenhuma palavra sobre o fato de que das 630 obras acompanhadas no PAC 2, lançado em 2010 (mas que inclui obras anunciadas desde 2007), nas ações voltadas para a Prevenção de Áreas de Risco, apenas 54 tenham sido entregues até setembro passado.
Nenhum comentário sobre a constatação de que, dos R$ 11 bilhões anunciados pelo PAC 2 com a costumeira pompa para a mesma finalidade, apenas 0,5% correspondam às obras efetivamente entregues até a mesma data. Meio por cento! Números como esses falam mais do que qualquer propaganda.
Mais um ano se aproxima do seu final. E registro o que, em meio a tantos desafios, acredito que devemos especialmente celebrar: a consolidação da nossa democracia, com destaque para o Judiciário independente e a liberdade de imprensa assegurada.
A presença de milhares de brasileiros nas ruas, um coro de vozes que ainda ecoa à espera de respostas, é o retrato emblemático e inesquecível do ano que se encerra.
Que no final de 2014 possamos comemorar bem mais do que a "sorte" de cidades não terem rios, e celebrar vidas e esperanças que não terão sucumbido às inevitáveis chuvas que virão. E que possamos celebrar especialmente o resgate da confiança no futuro do país. Feliz Brasil Novo!
A última imagem do ano para milhões de brasileiros solidários é a do sofrimento das famílias vítimas da violência das chuvas. O Brasil assiste a um novo capítulo da mesma tragédia muitas vezes anunciada.
Nenhum governo é responsável por desastres naturais, por chuvas ou enchentes que arrastam vidas e esperanças. Mas são responsáveis pelo que fazem e deixam de fazer.
A presidente Dilma fez bem em simbolicamente levar a solidariedade do país aos brasileiros das regiões atingidas. Mas errou ao tratar essas situações tão graves como se não tivesse responsabilidade sobre elas. As visitas e as declarações da presidente seriam adequadas a alguém que tivesse assumido o cargo na véspera, mas não cabem a quem representa um governo que há 11 anos conduz o país.
Infelizmente, mais uma vez, o governo enfrenta um problema objetivo, acirrado pela sua própria omissão, sem reconhecer a sua parcela de responsabilidade e se limitando a fazer novas promessas. Promessas que, provavelmente, não serão cumpridas, como não foram as feitas no passado.
Na visita a Minas, vendo o sofrimento da cidade de Virgolândia, a presidente surpreendeu a muitos ao comentar que a cidade teve sorte por não ter um rio caudaloso passando por perto. E, em mais um lance de marketing, anunciou a liberação de um cartão "ilimitado" para as prefeituras.
Nenhuma palavra sobre as ações --ou a ausência delas-- do governo federal nos últimos anos. Nenhuma palavra sobre o fato de que das 630 obras acompanhadas no PAC 2, lançado em 2010 (mas que inclui obras anunciadas desde 2007), nas ações voltadas para a Prevenção de Áreas de Risco, apenas 54 tenham sido entregues até setembro passado.
Nenhum comentário sobre a constatação de que, dos R$ 11 bilhões anunciados pelo PAC 2 com a costumeira pompa para a mesma finalidade, apenas 0,5% correspondam às obras efetivamente entregues até a mesma data. Meio por cento! Números como esses falam mais do que qualquer propaganda.
Mais um ano se aproxima do seu final. E registro o que, em meio a tantos desafios, acredito que devemos especialmente celebrar: a consolidação da nossa democracia, com destaque para o Judiciário independente e a liberdade de imprensa assegurada.
A presença de milhares de brasileiros nas ruas, um coro de vozes que ainda ecoa à espera de respostas, é o retrato emblemático e inesquecível do ano que se encerra.
Que no final de 2014 possamos comemorar bem mais do que a "sorte" de cidades não terem rios, e celebrar vidas e esperanças que não terão sucumbido às inevitáveis chuvas que virão. E que possamos celebrar especialmente o resgate da confiança no futuro do país. Feliz Brasil Novo!
A confiança dos industriais - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 30/12
A recuperação da indústria pode estar começando, depois de dois anos muito ruins, mas as perspectivas para 2014 ainda são de crescimento muito moderado. De toda forma, há sinais de otimismo entre os dirigentes do setor e hoje há mais sinais positivos do que em novembro, comentou a pesquisadora Tabi Thuler Santos, da Fundação Getúlio Vargas, ao apresentar a edição de dezembro da Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação. Mas a sua avaliação foi complementada por um toque de prudência: é bom esperar a confirmação da tendência nos próximos meses. Sempre sensata, essa ressalva é especialmente justificável neste momento, quando a maior parte das previsões aponta mais um ano de crescimento econômico medíocre, inflação alta e sérias dificuldades no setor externo.
Três sinais positivos foram apontados pela coordenadora da sondagem, mas todos acompanhados de alguma restrição. O Índice de Confiança da Indústria, com variação de 1,1%, aumentou pelo segundo mês consecutivo e atingiu 100,1 pontos, o maior nível desde junho, mas ainda inferior à média dos últimos 60 meses (104 pontos). O Índice de Expectativas avançou pelo terceiro mês consecutivo e passou de 98,1 para 100,3, mas continuou abaixo da média histórica, de 103,2. A previsão de emprego para os próximos três meses subiu 3,1%, chegou a 100,4 pontos e, como os dois itens anteriores, continuou abaixo da média de cinco anos (112,2 pontos). Além disso, aponta mais para a estabilidade - período sem demissões - do que para mais contratações, observou a pesquisadora. O Índice de Situação Atual ficou praticamente estável, com variação de 00,9 para 100 pontos (média de 104,9).
Nenhum desses números valeria um comentário otimista, se a indústria de transformação estivesse operando em condições mais próximas da normalidade. Mas o setor esteve muito mal nos últimos dois anos. Perdeu espaço no comércio exterior e tem tido muita dificuldade para enfrentar os estrangeiros até no mercado interno, apesar da proteção oferecida a alguns segmentos pela política federal. Entre 1996 e 2012 a parcela de importados no consumo de bens industriais intermediários e finais passou de 12,5% para 22%. No terceiro trimestre de 2013 essa participação chegou a 22,8%, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). O aumento de participação foi especialmente sensível nos últimos seis anos.
Segundo a CNI, a indústria de transformação deve ter crescido 2,3% neste ano e poderá crescer 2,5% no próximo. No ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) de toda a indústria (mineração, transformação, construção e utilidade pública) diminuiu 0,8%. Para este ano a CNI estima 1,4% de expansão. O quadro geral, portanto, ainda é de estagnação, quando se leva em conta o desempenho a partir de 2011. Nos três primeiros anos do governo da presidente Dilma Rousseff o setor industrial permaneceu atolado em dificuldades. Os estímulos fiscais e financeiros adotados nesse período serviram muito mais para a expansão do consumo do que para o aumento da produção manufatureira.
Os sinais de otimismo detectados na sondagem da FGV podem ser antecipações de uma retomada do investimento industrial. O total investido pelo governo e pelo setor privado em todos os setores da economia continua abaixo de 20% do Produto Interno Bruto. No ano passado, o investimento diminuiu e a proporção em relação ao PIB foi pouco superior a 18%, uma taxa baixíssima em relação às necessidades nacionais (de, no mínimo, 24%) quanto e também quando comparada com os padrões das economias emergentes.
Para 2014 a CNI estima elevação de 5% no valor investido em máquinas, equipamentos e instalações públicas e privadas. Pelas projeções conhecidas até agora, ainda será insuficiente para alcançar 20% do PIB. Investimento depende só em parte da disponibilidade de recursos. A confiança na economia - e, portanto, na política econômica - é determinante. No País, essa confiança tem sido mais escassa que o financiamento.
A recuperação da indústria pode estar começando, depois de dois anos muito ruins, mas as perspectivas para 2014 ainda são de crescimento muito moderado. De toda forma, há sinais de otimismo entre os dirigentes do setor e hoje há mais sinais positivos do que em novembro, comentou a pesquisadora Tabi Thuler Santos, da Fundação Getúlio Vargas, ao apresentar a edição de dezembro da Sondagem Conjuntural da Indústria de Transformação. Mas a sua avaliação foi complementada por um toque de prudência: é bom esperar a confirmação da tendência nos próximos meses. Sempre sensata, essa ressalva é especialmente justificável neste momento, quando a maior parte das previsões aponta mais um ano de crescimento econômico medíocre, inflação alta e sérias dificuldades no setor externo.
Três sinais positivos foram apontados pela coordenadora da sondagem, mas todos acompanhados de alguma restrição. O Índice de Confiança da Indústria, com variação de 1,1%, aumentou pelo segundo mês consecutivo e atingiu 100,1 pontos, o maior nível desde junho, mas ainda inferior à média dos últimos 60 meses (104 pontos). O Índice de Expectativas avançou pelo terceiro mês consecutivo e passou de 98,1 para 100,3, mas continuou abaixo da média histórica, de 103,2. A previsão de emprego para os próximos três meses subiu 3,1%, chegou a 100,4 pontos e, como os dois itens anteriores, continuou abaixo da média de cinco anos (112,2 pontos). Além disso, aponta mais para a estabilidade - período sem demissões - do que para mais contratações, observou a pesquisadora. O Índice de Situação Atual ficou praticamente estável, com variação de 00,9 para 100 pontos (média de 104,9).
Nenhum desses números valeria um comentário otimista, se a indústria de transformação estivesse operando em condições mais próximas da normalidade. Mas o setor esteve muito mal nos últimos dois anos. Perdeu espaço no comércio exterior e tem tido muita dificuldade para enfrentar os estrangeiros até no mercado interno, apesar da proteção oferecida a alguns segmentos pela política federal. Entre 1996 e 2012 a parcela de importados no consumo de bens industriais intermediários e finais passou de 12,5% para 22%. No terceiro trimestre de 2013 essa participação chegou a 22,8%, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex). O aumento de participação foi especialmente sensível nos últimos seis anos.
Segundo a CNI, a indústria de transformação deve ter crescido 2,3% neste ano e poderá crescer 2,5% no próximo. No ano passado, o Produto Interno Bruto (PIB) de toda a indústria (mineração, transformação, construção e utilidade pública) diminuiu 0,8%. Para este ano a CNI estima 1,4% de expansão. O quadro geral, portanto, ainda é de estagnação, quando se leva em conta o desempenho a partir de 2011. Nos três primeiros anos do governo da presidente Dilma Rousseff o setor industrial permaneceu atolado em dificuldades. Os estímulos fiscais e financeiros adotados nesse período serviram muito mais para a expansão do consumo do que para o aumento da produção manufatureira.
Os sinais de otimismo detectados na sondagem da FGV podem ser antecipações de uma retomada do investimento industrial. O total investido pelo governo e pelo setor privado em todos os setores da economia continua abaixo de 20% do Produto Interno Bruto. No ano passado, o investimento diminuiu e a proporção em relação ao PIB foi pouco superior a 18%, uma taxa baixíssima em relação às necessidades nacionais (de, no mínimo, 24%) quanto e também quando comparada com os padrões das economias emergentes.
Para 2014 a CNI estima elevação de 5% no valor investido em máquinas, equipamentos e instalações públicas e privadas. Pelas projeções conhecidas até agora, ainda será insuficiente para alcançar 20% do PIB. Investimento depende só em parte da disponibilidade de recursos. A confiança na economia - e, portanto, na política econômica - é determinante. No País, essa confiança tem sido mais escassa que o financiamento.
Tempo perdido - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 30/12
Os bons resultados das licitações realizadas este ano para concessões no setor de infraestrutura de transportes (rodovias e aeroportos) ou para exploração de petróleo não deixam dúvida que o governo cometeu um grave erro quando interrompeu esse processo, basicamente por preconceito ideológico.
A campanha sistemática que o PT promoveu contra a privatização antes de chegar ao poder deixou os governos Lula e Dilma em situação embaraçosa. Politicamente, não seria possível admitir que as concessões privadas eram a opção racional para se deslanchar investimentos em infraestrutura diante da incapacidade financeira e gerencial do setor público. Os governos Lula e Dilma perderam tempo precioso tentando reinventar a roda.
Aperfeiçoamentos e ajustes nesse processo seriam naturais e recomendáveis a partir da experiência acumulada, mas o governo Lula e o de Dilma, inicialmente, estavam tão preocupados em não caracterizar concessões como uma forma de privatização que exageraram na dose de intervencionismo nas licitações que decidiram realizar. O número de interessados foi diminuindo, e o resultados nem sempre se mostraram satisfatórios.
No meio do mandato da presidente Dilma, com a economia brasileira dando clara demonstração que a fórmula de estímulo ao consumo doméstico não seria capaz de sustentar o ritmo de crescimento que o governo vinha apregoando (em determinado momento chegando à fanfarronice de querer dar lições aos países desenvolvidos, em crise), houve uma reviravolta e os equívocos começaram a ser corrigidos. O mercado passou a receber bem essas mudanças, e quase todas as licitações realizadas nos últimos três meses foram bem-sucedidas.
Mesmo sendo um ano eleitoral, tudo leva a crer que as licitações que o governo decidiu realizar em 2014 para concessões na infraestrutura de transporte terão bom resultado. Falta testar o modelo em novas ferrovias, mas se as autoridades ouvirem, também nesse segmento, as partes interessadas, o risco de dar errado será mínimo.
O preconceito contra a privatização é politicamente jurássica. O Estado tem muitas atribuições e missões a cumprir ao meio de restrições orçamentárias incontornáveis. Está alicerçado em uma estrutura pesada e tem de se submeter a regras que o tornam gerencialmente incapacitado a realizar investimentos e a gerir satisfatoriamente grandes rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Tais segmentos podem ser financeiramente autossustentáveis nas mãos de concessionários, em razão dos benefícios que proporcionam a seus usuários.
A economia brasileira convive há décadas com taxas de investimento insatisfatórias, que reduzem a capacidade produtiva do país. Para resolver grande parte de seus problemas, o Brasil precisa de uma economia mais competitiva, e sem multiplicar investimentos não conseguirá atingir o grau de eficiência que tanto precisa. E se licitação é ou não “privatização”, trata-se de discussão semântica.
Os bons resultados das licitações realizadas este ano para concessões no setor de infraestrutura de transportes (rodovias e aeroportos) ou para exploração de petróleo não deixam dúvida que o governo cometeu um grave erro quando interrompeu esse processo, basicamente por preconceito ideológico.
A campanha sistemática que o PT promoveu contra a privatização antes de chegar ao poder deixou os governos Lula e Dilma em situação embaraçosa. Politicamente, não seria possível admitir que as concessões privadas eram a opção racional para se deslanchar investimentos em infraestrutura diante da incapacidade financeira e gerencial do setor público. Os governos Lula e Dilma perderam tempo precioso tentando reinventar a roda.
Aperfeiçoamentos e ajustes nesse processo seriam naturais e recomendáveis a partir da experiência acumulada, mas o governo Lula e o de Dilma, inicialmente, estavam tão preocupados em não caracterizar concessões como uma forma de privatização que exageraram na dose de intervencionismo nas licitações que decidiram realizar. O número de interessados foi diminuindo, e o resultados nem sempre se mostraram satisfatórios.
No meio do mandato da presidente Dilma, com a economia brasileira dando clara demonstração que a fórmula de estímulo ao consumo doméstico não seria capaz de sustentar o ritmo de crescimento que o governo vinha apregoando (em determinado momento chegando à fanfarronice de querer dar lições aos países desenvolvidos, em crise), houve uma reviravolta e os equívocos começaram a ser corrigidos. O mercado passou a receber bem essas mudanças, e quase todas as licitações realizadas nos últimos três meses foram bem-sucedidas.
Mesmo sendo um ano eleitoral, tudo leva a crer que as licitações que o governo decidiu realizar em 2014 para concessões na infraestrutura de transporte terão bom resultado. Falta testar o modelo em novas ferrovias, mas se as autoridades ouvirem, também nesse segmento, as partes interessadas, o risco de dar errado será mínimo.
O preconceito contra a privatização é politicamente jurássica. O Estado tem muitas atribuições e missões a cumprir ao meio de restrições orçamentárias incontornáveis. Está alicerçado em uma estrutura pesada e tem de se submeter a regras que o tornam gerencialmente incapacitado a realizar investimentos e a gerir satisfatoriamente grandes rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. Tais segmentos podem ser financeiramente autossustentáveis nas mãos de concessionários, em razão dos benefícios que proporcionam a seus usuários.
A economia brasileira convive há décadas com taxas de investimento insatisfatórias, que reduzem a capacidade produtiva do país. Para resolver grande parte de seus problemas, o Brasil precisa de uma economia mais competitiva, e sem multiplicar investimentos não conseguirá atingir o grau de eficiência que tanto precisa. E se licitação é ou não “privatização”, trata-se de discussão semântica.
Cenário sombrio - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE
CORREIO BRAZILIENSE - 30/12
A economia brasileira deverá ser marcada no último ano do mandato da presidente - e economista - Dilma Rousseff pela consolidação de expectativas que a própria equipe plantou desde a posse. Sem surpresas, 2014 fechará com crescimento em torno de 2% do Produto Interno Bruto (PIB) e com inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) mais próxima de 6% que do centro da meta fixada pelo Banco Central (BC), de 4,5%.
Até mesmo o monstro que estava na jaula e ameaçava turvar esses prognósticos rasos foi domado antes mesmo de o novo ano chegar. Representado pela iminente suspensão dos pesados estímulos financeiros à economia dos Estados Unidos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), o apocalipse financeiro não está mais à espreita.
Essa contenção de forte fator de alta sobre a cotação local do dólar e de limitação para outros indicadores de desempenho do país foi anunciada semana passada, sinalizando transição tranquila e gradual, a começar em janeiro. No último anúncio antes de deixar o cargo, Ben Bernanke, presidente do Fed, afirmou que as taxas de juros nos EUA poderão continuar baixas, próximas de zero, ainda por bom tempo, o mesmo necessário para o Brasil reduzir a fragilidade externa.
A agenda típica de ano eleitoral não vai dar chances a ajustes macroeconômicos impopulares, como os da Previdência e do mercado de trabalho. Nem os gastos públicos extras tão comuns nesse período vão impulsionar a atividade produtiva a ponto de acelerar o PIB, a exemplo do que foi o chamado pibão de 2010. O problema maior, contudo, está ao redor do cenário que está sendo desenhado para os próximos 12 meses.
Os fundamentos econômicos - como o da dívida externa, que engordou 37% desde 2011 - pioram, deixando conta salgada para 2015, o primeiro ano de um governo de oposição ao atual ou o começo da segunda gestão da presidente, com a qual se completariam 16 anos de PT no poder. A maior esperança de reversão do marasmo econômico que ronda a economia e deixa mais evidentes os problemas fiscais da União continua numa reação dos investimentos.
Sustentada até agora pelo consumo, com a liberação generosa de crédito e os cortes temporários de tributos, a economia está cada vez mais dependente da aplicação de recursos públicos e privados no aumento da capacidade de produção, da eficiência e, sobretudo, da infraestrutura. Por isso tudo, é fundamental continuar o avanço percebido no segundo semestre de 2013 das concessões de portos, ferrovias, aeroportos e rodovias.
Além de manter em alta as taxas de emprego e renda, os projetos para dotar o país de condições sustentáveis de crescimento são a única chance de estancar a perda de competitividade perante o mundo. Em paralelo, os ganhos reais de salários começaram a se estreitar, a oferta de crédito às pessoas físicas dá sinais de fadiga e as taxas de juros médias dos empréstimos seguem estrangulando o orçamento de um quarto das famílias brasileiras.
O esgotamento do modelo econômico em vigor desde a última década impôs uma agenda ao governo que ainda não se concluiu em razão da burocracia, da ineficiência estatal e das contingências políticas. O novo modelo, virtuoso e perene, poderá exigir rupturas, que só não virão se houver acomodação eleitoral diante da contínua mobilidade social dentro da classe média.
Até mesmo o monstro que estava na jaula e ameaçava turvar esses prognósticos rasos foi domado antes mesmo de o novo ano chegar. Representado pela iminente suspensão dos pesados estímulos financeiros à economia dos Estados Unidos pelo Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), o apocalipse financeiro não está mais à espreita.
Essa contenção de forte fator de alta sobre a cotação local do dólar e de limitação para outros indicadores de desempenho do país foi anunciada semana passada, sinalizando transição tranquila e gradual, a começar em janeiro. No último anúncio antes de deixar o cargo, Ben Bernanke, presidente do Fed, afirmou que as taxas de juros nos EUA poderão continuar baixas, próximas de zero, ainda por bom tempo, o mesmo necessário para o Brasil reduzir a fragilidade externa.
A agenda típica de ano eleitoral não vai dar chances a ajustes macroeconômicos impopulares, como os da Previdência e do mercado de trabalho. Nem os gastos públicos extras tão comuns nesse período vão impulsionar a atividade produtiva a ponto de acelerar o PIB, a exemplo do que foi o chamado pibão de 2010. O problema maior, contudo, está ao redor do cenário que está sendo desenhado para os próximos 12 meses.
Os fundamentos econômicos - como o da dívida externa, que engordou 37% desde 2011 - pioram, deixando conta salgada para 2015, o primeiro ano de um governo de oposição ao atual ou o começo da segunda gestão da presidente, com a qual se completariam 16 anos de PT no poder. A maior esperança de reversão do marasmo econômico que ronda a economia e deixa mais evidentes os problemas fiscais da União continua numa reação dos investimentos.
Sustentada até agora pelo consumo, com a liberação generosa de crédito e os cortes temporários de tributos, a economia está cada vez mais dependente da aplicação de recursos públicos e privados no aumento da capacidade de produção, da eficiência e, sobretudo, da infraestrutura. Por isso tudo, é fundamental continuar o avanço percebido no segundo semestre de 2013 das concessões de portos, ferrovias, aeroportos e rodovias.
Além de manter em alta as taxas de emprego e renda, os projetos para dotar o país de condições sustentáveis de crescimento são a única chance de estancar a perda de competitividade perante o mundo. Em paralelo, os ganhos reais de salários começaram a se estreitar, a oferta de crédito às pessoas físicas dá sinais de fadiga e as taxas de juros médias dos empréstimos seguem estrangulando o orçamento de um quarto das famílias brasileiras.
O esgotamento do modelo econômico em vigor desde a última década impôs uma agenda ao governo que ainda não se concluiu em razão da burocracia, da ineficiência estatal e das contingências políticas. O novo modelo, virtuoso e perene, poderá exigir rupturas, que só não virão se houver acomodação eleitoral diante da contínua mobilidade social dentro da classe média.
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