O pintassilgo do Planalto só desafina
Celso Amorim nunca desperdiça uma chance de errar, confirmam as primeiras semanas do outono. Já aproveitou três. Primeiro, conseguiu levar um chapéu desmoralizante do iraniano Mahmoud Ahmadinejab, que cancelou sem maiores explicações a visita ao Brasil quando o ministro das Relações Exteriores já aprendera a dizer em persa “pois não”, “sim senhor” e “disponha deste seu criado”. Em seguida, conseguiu trazer o paraguaio Fernando Lugo, que acumula o cargo de presidente da República com o título de Pai do Ano, conquistado pelo que andou fazendo o bispo. Momentaneamente liberado da maratona de exames de DNA, o visitante fez questão de dizer “não” pessoalmente a todas as propostas apresentadas por Lula sobre a hidrelétrica de Itaipu. Na quarta-feira, os brasileiros souberam da última do Amorim: em audiência no Congresso, ele confirmou que o Itamaraty não quer o brasileiro Márcio Barbosa na direção-geral da UNESCO, sigla que identifica a Organização das Nações Unidas para a Educação e a Cultura. Prefere um egípcio.
E que egípcio: depois de passar a noite sonhando com o afogamento de Israel inteiro no Mar Morto, Farouk Hosni acorda com alguma idéia cretina na cabeça. Uma das melhores foi a queima em praça pública todos os livros escritos em hebraico. Aos olhos de quem enxerga apenas os superiores interesses da pátria, coisas assim são miudezas. “Fizemos uma opção geopolítica”, explicou o chanceler. “O Brasil tem uma política de aproximação com os países árabes e africanos, que apoiam a candidatura egípcia”. O governo Lula não é de abandonar nações amigas no meio do caminho. E tem especial predileção por integrantes da grande aliança dos primitivos.
Isso já bastaria, mas há mais: também está em jogo, informou o depoente, o esforço feito pela cartolagem olímpica para que o Rio de Janeiro tenha a honra de hospedar a Olimpíada de 2016. “Cada candidatura que você lança tem um custo para outras”, ensinou o ministro. “Pode ser gerado um desgaste em termos de apoio. Nós, no momento, temos duas candidaturas: a da ministra Ellen Gracie para a Organização Mundial do Comércio e a do Rio para sede dos Jogos Olímpicos”. Não há vaga para o brasileiro Marcos Barbosa.
Vice-diretor da organização mundialmente respeitada, Barbosa já tem votos suficientes para tornar-se o número 1. Só não será vitorioso se o Brasil fizer um bom trabalho como cabo eleitoral do adversário. E é exatamente isso que o Itamaraty planeja, desafinou de novo Amorim, com a candura de quem ergue um brinde à paz entre os povos. Nada a dizer sobre as declarações delirantes de Hosni? ”Foram pouco felizes”, concedeu. “Nas tenho certeza de que ele pautará sua gestão à frente da Unesco por um diálogo de civilizações”.
Por algum motivo, Ruy Barbosa é lembrado como a Águia de Haia. Por todos os motivos, Celso Amorim será esquecido como um pintassilgo do Planalto.