domingo, abril 17, 2016

Veja os 'sete pecados na capital' que levaram Dilma ao inferno político - IGOR GIELOW

Folha de SP - 17/04
Dilma Rousseff (PT) chegou às portas de um inferno político que o Brasil acreditava terem sido cerradas com o impeachment de Fernando Collor de Mello em 1992.

A presidente, que segundo as contas do mundo político poderá ter a abertura do pedido de impedimento aceita neste domingo (17) pela Câmara, costuma colecionar culpados pela debacle de seu governo.

Ora ela culpa a imprensa, ora a oposição. Mais recentemente, seu alvo é o vice-presidente, Michel Temer (PMDB-SP), a quem acusa abertamente de ser golpista, já que vem articulando a formação de um eventual governo caso Dilma seja impedida.

Se adversários se aproveitaram de suas falhas, isso é da dinâmica da política, mas Dilma e o PT de Lula construíram aos poucos os erros que levaram à ruína política sobre a qual se debatem agora.

A tradição católica estabeleceu, quando o papa Gregório 1º organizou em 590 uma lista do monge grego Evágrio do Ponto (345-399), sete pecados capitais que levam a humanidade à danação. Santo Tomás de Aquino e o escritor Dante Alighieri popularizaram o conceito.

A Folha elencou sete aspectos que levaram o governo petista à lona, correlacionados com os pecados mortais dos quais mais se aproximam (veja abaixo a lista).

Acima de todos eles está a soberba, que permeia os demais. O temperamento difícil e a falta de urbanidade política de Dilma cobraram um preço alto ao fim.

Enquanto ela era a "faxineira" da corrupção e a "gerentona" no seu primeiro mandato, imagem que bem ou mal durou até a eleição de 2014, ela colecionou desafetos. Sua inapetência para a política congressual é notória. O troco veio agora.

O fator estrutural mais importante, contudo, é a ruína econômica. Dificilmente estaria sendo discutido o impeachment se o país estivesse bem das pernas. Não está muito por causa do pecado da preguiça do governo em não aceitar a realidade.

Em vez de ouvir alertas, o Planalto acelerou uma política iniciada por Lula em 2010 de populismo econômico.

Erros se sucederam. A "Nova Matriz Econômica" com suas desonerações, juros artificiais e irresponsabilidade fiscal, as pedaladas que geraram o fato frio do impeachment, a política de preços do setor elétrico e a gestão ruinosa da Petrobras –mais que a corrupção, foram ordens erradas que ajudaram a quase quebrar a petroleira e sua enorme cadeia econômi
O ano de 2015 foi perdido com a tentativa malfadada de ajuste fiscal capitaneada por Joaquim Levy. Acabou com o pagamento do "papagaio" das pedaladas, quase uma admissão de culpa. O aumento do desemprego coroou a queda final junto aos poderosos da economia.

Outros pecados são identificáveis: a gula da corrupção identificada pela Operação Lava Jato, a avareza ao se apegar a conceitos antigos em vez de tentar entender o recado das ruas nos protestos de 2013, a luxuriante propaganda eleitoral de 2014.

Por fim, o ex-aliado PMDB está em dois erros mortais. Primeiro, estabelecer uma relação de ira com Eduardo Cunha, o colérico e enrolado presidente da Câmara.

Segundo, a inveja final de ver Michel Temer emergir da condição de "vice decorativo" para a de potencial herdeiro do reino petista.

SOBERBA

A Presidente

A falta de tato político e o temperamento irascível de Dilma fazem parte do folclore de Brasília. Mas o que era quase anedótico virou centro de quase todas as reclamações de aliados, agora tornado inimigos. Além disso, práticas de governo acabaram contaminadas pelo mau humor da chefe, com subordinados agindo de forma burocrática por medo de broncas. A soberba nas relações com aqueles que deviam apoiá-la levou Dilma a um isolamento fatal, tendo de ser socorrida no último momento e sem eficácia certa por Lula

PREGUIÇA
Economia

A falta de vontade de ler a realidade levou o governo a cometer erros fatais na condução da economia. Populismo, gestão falha na Petrobras e outros fatores levaram o país à maior recessão de sua história e a um cenário no qual inflação alta para os padrões pós-real e queda da atividade conviveram. Tudo encabeçado pelo desemprego em alta, enterrando o último ponto de venda do governo junto à população, em especial os estratos menos favorecidos. Com tudo isso, o apoio entre os poderosos do PIB esfarelou-se

LUXÚRIA

Estelionato

A volúpia com a qual o Planalto se lançou à mentira pura e simples na campanha eleitoral de 2014 cobrou o preço. Como no caso da corrupção, não se trata de algo inédito na forma, mas sim na intensidade e sofisticação. Ao demonizar adversários ao extremo, a campanha de Dilma ajudou a lançar as bases para o radicalismo que se vê em manifestações contra o governo. O exemplo mais simples é o da economia: enquanto acusava tucanos de planejar um arrocho, o Planalto teve de adotá-lo
–ainda que só nominalmente

AVAREZA

Cegueira em 2013

Os protestos de junho de 2013 nunca foram lidos corretamente pelo poder estabelecido. A avareza, não só mas principalmente pela União, de se apegar às respostas tradicionais, como o lançamento de pacotes e a sugestão de reforma política nunca plenamente abraçada pelo governo, falhou em compreender o recado das ruas. Se o movimento refluiu depois que elementos radicais como os adeptos do black bloc provocaram distúrbios, a ojeriza da antipolítica estabeleceu-se como parte central das manifestações após 2014

INVEJA

Temer e PMDB

Enquanto tinha poder quase imperial, até junho de 2013, Dilma tratou o PMDB a pão e água. Seu vice acumulou rancores, explicitados na famosa carta de rompimento do fim de 2015, quando assumiu a alcunha de "decorativo". Líderes do partido foram maltratados, e depois da reeleição novos aliados foram adulados, como o PSD. Isso formou um caldo de vingança contra a presidente, de difícil deglutição neste momento. O resultado está aí, com Michel Temer articulando abertamente a sucessão da presidente

IRA

Eduardo Cunha

Dilma apostou tudo contra o peemedebista, com quem já vivia brigando. Lançou um candidato contra Cunha e perdeu a eleição na Câmara, estabelecendo as premissas para o período em que a Casa ditou o ritmo da aprovação de leis no Brasil pela primeira vez em décadas. Após ter sido alvejado pela Lava Jato, Cunha tornou-se ainda mais perigoso para o Planalto, já que comandou com obstinação movimentos para atrapalhar o governo e, agora, para guiar o processo de impeachment da presidente com a oposição a tiracolo

GULA
Corrupção

Se a corrupção é um fenômeno usual da história política brasileira, a magnitude relevada pela Operação Lava Jato a partir de 2014 supera qualquer registro até aqui. A gula foi insaciável. Isso manchou de vez a imagem já conspurcada do PT e do governo –ainda que aliados e até oposicionistas estejam na mira da ação, é o PT que tinha a chave do cofre durante os malfeitos desvendados. Para complicar a vida de Dilma, além de sua campanha estar sob investigação, a Lava Jato chegou também à figura de seu mentor, Lula

O dia ‘D’ - ELIANE CANTANHÊDE

ESTADÃO - 17/04

Vença ou não o impeachment – que chega a este domingo como tendência, apesar de tremeliques de última hora –, Dilma Rousseff, Lula e o PT são os grandes derrotados desse processo, que tem uma longa história, desde virar as costas a Tancredo, à Constituinte, a Itamar, ao Plano Real, com um ponto comum em todos esses momentos: o “nós” contra “eles”. Enfim, a realidade se impõe novamente: o “nós” é minoria, o “eles” é a maioria. A maioria da sociedade cansou da arrogância e da beligerância dessa minoria.

Apesar de o governo martelar dentro e fora do País a versão do “golpe”, não foi a oposição (muito menos o PSDB) que articulou o impeachment, redigiu e assinou o pedido de abertura, mobilizou milhões de brasileiros nas ruas, explodiu a base aliada. Em paralelo ao poderoso processo de inclusão social dos anos Lula, os responsáveis por tudo o que se está vendo e vivendo foram Dilma, Lula e o PT.

A presidente, pela incompetência, o destempero e a incrível capacidade de destruir a economia nacional. Lula, por se sentir Deus e dono do País, tomar de assalto a máquina, as estatais, os fundos de pensão e adotar a rotina da provocação à maioria que está em todas as classes de renda e em todas as regiões, estuda, trabalha, mora, produz, compra, vende. O PT, por jogar fora suas bandeiras e sua história pelo poder efêmero, esbaldando-se com adversários históricos e de passado duvidoso, incapaz de cobrar coerência e até decência do seu grande líder.

Na reta final do processo de impeachment, Dilma teve uma mãozinha de governadores camaradas, recebeu o diretor da OEA e reverteu um voto daqui, outro dali, mas os erros demonstram temor: a ida ao Supremo, a decisão e o recuo do pronunciamento pela TV, martelar que Michel Temer acabará com a Bolsa Família (repetição barata do bordão “o PSDB vai privatizar a Petrobrás”, de 2006). Por fim, a ida de Lula ao acampamento do MST. Para quem fala em “união nacional”...

Se conseguir os votos mínimos (1/3 da Câmara) para se segurar na cadeira, Dilma chega ao terceiro mandato como um fantasma, incapaz de incorporar uma presidente capaz de articular um pacto, arregimentar forças políticas, econômicos e sociais para reformas e para recuperar as contas públicas e a economia nacional. O mercado vai desandar. A crise vai explodir. Ela mantém o mandato, mas perde a Presidência para Lula – até onde a Lava Jato e a Zelotes permitirem.

Se der impeachment, Dilma vira mesmo “carta fora do baralho”. Nem PT, PC do B, PSOL e PDT vão bater à sua porta, acenar com uma volta por cima. Se não der, ela insistirá que lutará “até o último minuto”, mas faltarão ouvidos, tropas, armas. Hoje é o dia “D” do impeachment. Se não passar, acabou. Se passar, dificilmente o Senado desautorizará a Câmara, até porque a votação para acatar o pedido é por maioria simples e ninguém considera a hipótese de o plenário trazer Dilma de volta depois de 180 dias fora. Aí, Inês é morta, Dilma também. Quanto a seu legado, a história se encarregará de contar.

A história, porém, não acaba aí. Estará só começando, com as forças políticas se reaglutinando, o PT e seus movimentos discutindo um plano de ação, os agentes econômicos pedindo pressa, os trabalhadores apreensivos, o mundo olhando de esgueira para o Brasil. Tempos difíceis para o Brasil e para Temer.

Se ele assumir, terá de mostrar a que veio e até onde vai, com a obrigação de se livrar de Eduardo Cunha na primeira hora. É do jogo e o próprio Eduardo Cunha, um jogador, sabe que é assim. Como resume realisticamente o deputado Jarbas Vasconcelos, um governo do PMDB tem chance zero. Temer só terá chance com um governo de união. O grito de guerra de muitos que votam hoje no impeachment é “Fora Dilma, Fora Cunha”, para começar do zero. Mas falta o placar...


Sem Dilma, o que vem por aí? - SUELY CALDAS

ESTADÃO - 17/04

O que pode acontecer com a economia se o impeachment passar e o vice, Michel Temer, assumir a Presidência? Provavelmente, nem ele sabe. Ele até pode ter um plano de emergência (como teve Itamar Franco em seu mandato-tampão), um choque econômico para tentar tirar o País do buraco, mas ele não ignora que vai enfrentar um inimigo imponderável que não consegue controlar: o descrédito, a falta de confiança da população em seu partido, o PMDB, que nos últimos 13 anos dividiu com o PT responsabilidades de governo, as benesses da corrupção espalhada pela gestão pública e as decisões erradas que arruinaram a economia do País.

A seu favor Temer conta com uma fatalidade: a alternativa Dilma seria pior, o que pode lhe dar um voto de confiança na partida, mas certamente com prazo de validade – dos empresários, mais longo; da população, mais curto. Portanto ele tem pouco tempo para agir, e agora sem direito de errar. Suas chances crescem se ele priorizar temas centrais das manifestações de rua. As reformas política e administrativa, por exemplo. Diferente da previdenciária (necessária, mas mal compreendida), essas reformas têm apoio popular entusiasmado e dariam um bom início para Temer conquistar confiança. Elas têm o mérito de produzir duplo impacto: efeito positivo na economia, ao reduzir o gasto público e o aparato burocrata de governos balofos, e a população ficaria mais protegida de pilantras e enganadores da política, sobretudo em época eleitoral.

O Brasil é campeão mundial em ministérios (32) e partidos políticos (também 32). Eles custam bilhões de reais ao contribuinte brasileiro e a maioria serve para abrigar políticos aparelhados no governo, para receber dinheiro público do Fundo Partidário, vender espaço na TV em época de eleições e espalhar corrupção pela gestão pública. O toma lá dá cá, que Lula institucionalizou e exagerou e Dilma escancara, agora, em troca de votos contra o impeachment, explica a profusão de partidos e ministérios e reclama urgência nas reformas política e administrativa.

Em Brasília poucos acreditam que chegará o dia em que essa realidade vai mudar, que deputados e senadores aceitarão abrir mão de poder e aprovar reformas e regras que eliminem ou contenham seus privilégios. Muito menos que isso se dará pelas mãos de um peemedebista. Porém, se aprovado o impeachment de Dilma, é a chance de Temer e do PMDB sobreviverem nestes dois anos e oito meses de mandato. Propor ao Congresso reformas estruturais sérias (também da previdência, tributária e trabalhista) é o primeiro e imprescindível passo para o novo governo ganhar credibilidade e dar sustentação a um programa econômico que convença o investidor a investir e a população a apoiar e acreditar em que o crescimento econômico pode demorar, mas o País marcha na sua direção.

Nesse choque de credibilidade é fundamental garantir continuidade à Operação Lava Jato. O desmantelamento de esquemas de corrupção no governo, em empresas estatais e fundos de pensão não pode ser desativado ou mascarado para proteger lideranças políticas influentes, como o presidente do Senado, Renan Calheiros.

Temer vai encontrar um país despedaçado: as contas públicas em frangalhos; receita tributária desabando; investimento público zerado e o privado, assustado; desemprego disparando; população perdendo quase 10% de sua renda em apenas dois anos de recessão; a dívida pública passando de 70% do PIB, podendo chegar a 90% em 2020; a corrupção presente por onde circula dinheiro público; programas sociais retrocedendo; pobreza em expansão; Estados falidos e funcionários sem salários. E por aí vai.

São muitas as frentes de ação do novo governo. Um programa de emergência é bem-vindo para perseguir resultados rápidos, mas é indispensável abandonar o ritmo desarvorado de apagar incêndios, que predominou sob Dilma e tanto mal fez ao País. É fundamental pensar o Brasil no longo prazo, arrancar do Congresso a aprovação das reformas, tantas vezes adiadas, planejar ações, construir e perseguir metas.

Hora da decisão - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 17/04

Se a tendência detectada nas pesquisas feitas de diversas maneiras - consulta direta aos interessados ou projeções baseadas em sofisticados cálculos matemáticos - for confirmada, começa hoje uma transição que poderia ter sido iniciada na eleição presidencial de 2014.

Sabe-se hoje que essa alternância, que não se realizou por uma diferença de 3% dos votos, foi evitada por motivos que vão além das razões políticas: dinheiro transferido diretamente de esquemas corruptos irrigaram a campanha petista, permitindo uma atuação muito mais efetiva do grupo vencedor, traduzindo-se num abuso de poder econômico que a legislação pune até mesmo com a cassação da chapa. Poder econômico que está sendo largamente utilizado mais uma vez neste momento para, à margem da lei, evitar a aprovação do impeachment na Câmara.

A esse abuso de poder econômico somou-se o abuso do poder político, transgredindo a legislação em vigor no país e quebrando o equilíbrio fiscal, com trágicas consequências. Afirmar que uma presidente honesta está sendo condenada por políticos corruptos é apenas uma simplificação benevolente da situação, ou a visão distorcida de quem procura uma narrativa que justifique sua derrocada.

De nada adiantará, no entanto, essa tentativa de reescrever a História, pois as investigações em andamento no Supremo Tribunal Federal e na Justiça de Curitiba acabarão demonstrando cabalmente que a presidente não esteve alheia a todos os passos do esquema corrupto montado pelos petistas nesses 14 anos de poder.

Soa quase afrontoso o argumento de que Dilma nada roubou para si que se tenha provado, e por isso não merece ser punida, numa tentativa de opor sua situação à de Collor, como se o impeachment político ocorresse apenas quando comprovada a corrupção pessoal, desculpada a corrupção "pela causa" 


Também Collor usou essa desculpa esfarrapada, baseado no fato de que o STF não encontrou provas que pudessem incriminá-lo. As evidências de corrupção, nos dois casos, no entanto, estão fartamente documentadas, e Dilma não terá a vantagem de Collor, que foi julgado em um momento em que a sociedade brasileira não estava aparelhada para uma investigação ajudada por tecnologia hoje à disposição da Justiça e apoiada por acordos internacionais que localizem dinheiro desviado no exterior.

Sem falar na delação premiada, instrumento fundamental para desvendar esquemas criminosos do tipo. Embolsar o dinheiro da corrupção, ou se beneficiar dele para fins políticos, tem a mesma gravidade para a democracia.

Os dois processos de impeachment que acontecem na nossa História com uma diferença de 24 anos mostram que nosso sistema político-partidário não se regenerou a ponto de evitar que aventureiros como Collor e Dilma chegassem à presidência da República.

Foram dois presidentes eleitos por fenômenos semelhantes, consequências de um populismo demagógico que permitiu que um salvador da pátria fosse criado por campanha de marketing, e que uma burocrata inepta fosse apresentada à população por outro salvador da pátria como sua sucessora.

A "mulher do Lula" como Dilma era conhecida nos grotões, passou a ser a "mãe dos pobres" numa farsa política tupiniquim que já havia sido encenada duas vezes na Argentina, sem final feliz.

Saídos do meio de uma coligação partidária montada pelo PT desde o governo Lula, os políticos, hoje considerados traidores e corruptos, já foram ministros, secretários e aliados importantes dos governos Lula e Dilma. E quem escolheu Michel Temer para candidato a vice foi a própria presidente Dilma, ou seu tutor Lula, o mesmo que governou com boa parte dos 300 picaretas que havia identificado depois de sua curta experiência no Congresso.

Descobrir agora que esses mesmos políticos não servem ao país é patético, e mais ainda é a tentativa de mantê-los presos a compromissos através da compra de votos, criando uma situação paradoxal de querer se mostrar uma defensora da democracia usando os mesmos métodos que nos levaram a essa situação caótica.

Um voto em Brasília está valendo ouro, disse outro dia um político. Pena que não seja simples metáfora.

A soma das tempestades - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 17/04

A soma das tempestades que atingiram Dilma. O que nos trouxe até aqui foi a economia. A luta contra a corrupção não explica o que se passa no país, já que dos dois lados que se enfrentam no plenário da Câmara há envolvidos na Operação Lava-Jato. Não há na lei do impeachment nada que puna a má gestão econômica, mas nenhum governo resiste ao trio inflação alta, recessão profunda e colapso fiscal.

Collor não caiu porque mentiu na campanha, nem pelo plano que aprisionou as finanças das empresas e famílias, mas sim porque essa violência extrema não entregou inflação baixa e produziu recessão severa. As denúncias naquela época de desvio de dinheiro, inclusive para proveito pessoal do presidente, deram o motivo final para o impeachment.

Este domingo, em que a presidente Dilma estará sob ataque político de adversários e antigos aliados, começou no primeiro trimestre do segundo mandato. O tarifaço de energia fez a inflação dar um salto e a popularidade despencar. Ao final de março de 2015, o percentual de ruim e péssimo pelo CNI/Ibope havia atingido 64% e se igualava ao pior momento do governo Sarney. Em dezembro, já havia batido o recorde de rejeição entre todos os presidentes da era democrática, com 70%. Em março deste ano, mantinha o patamar porque o PIB continuou afundando, impedindo a recuperação.

As pedaladas aconteceram principalmente no primeiro mandato. Elas foram um atentado à Lei de Responsabilidade Fiscal e explicam a desordem econômica em que o país está. Dilma desrespeitou, com seu ministro da Fazenda e secretário do Tesouro do primeiro mandato, inúmeras regras contábeis. A crônica econômica está repleta de decisões que atentaram contra o ordenamento monetário e fiscal do país. É justo que ela tenha que responder pelos abusos e absurdos que cometeu. Foram tantos que transbordaram para o segundo mandato. Foram tantos que ameaçaram a estabilidade.

A crise econômica produzida pela gestão de Dilma levou ao enfraquecimento político da presidente. Ela foi inábil ao gerir a crise, mas no primeiro mandato já havia demonstrado a mesma inabilidade de administrar a coalizão. O que a atingiu agora foi a soma de tudo: a crise econômica corroeu o apoio popular ao governo, os políticos começaram a se afastar, ela não teve sabedoria para agir. O fator externo que acelerou a dinâmica da crise foi a Lava-Jato. Nas investigações, não há indícios de proveito pessoal da presidente Dilma — apesar de haver contra vários do seu grupo, inclusive o ex-presidente Lula — mas sobram indícios de que houve dinheiro dos contratos da Petrobras no financiamento da campanha presidencial, que, é bom lembrar, elegeu Dilma Rousseff e Michel Temer. O fator Eduardo Cunha foi o gatilho. Atingido diretamente pelas denúncias de corrupção, ele preferiu atirar. Se Cunha sobreviver a tudo isso, o país estará encrencado.

O Brasil vive neste domingo um dia dramático sobre o qual será preciso continuar pensando. Estamos no tempo da traição, o que nunca é um espetáculo bonito de se ver, mas é fácil de explicar. Quando os políticos começam a fugir de um líder impopular, há um momento em que o movimento se acelera. Foi o que se viu nos últimos dias. Na época de Collor, até seu amigo de primeira hora, Renan Calheiros, o traiu. Todos tentam escapar do navio que afunda e mandam mensagens para as suas bases. Ainda mais em ano de eleição municipal, quando se formam as alianças e apoios para a renovação dos mandatos federais.

É tempo de complexidades. Nada é simples. Qualquer que seja o resultado da votação de hoje, o preço que o país pagará será alto. Se a presidente vencer, ela terá perdido a capacidade de governar; se o processo for adiante, serão meses de sofrimento em que a família brasileira permanecerá dolorosamente fraturada.


Política faliu mais que economia - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 17/04

É mais fácil estimar o que será da economia daqui até a eleição de 2018 do que pensar o futuro próximo da política e do "sistema partidário", essa barafunda gelatinosa mutante e despedaçada que há no Congresso.

PSDB e PT lideraram os anos politicamente mais estáveis da República, 1994-2012. Representavam projetos claros de mudança. Tinham âncoras sociais consideráveis.

Estabilidade não há desde 2013. PT e PSDB estão quase aos pedaços, literalmente. Perderam articulações sociais, entre outros desgastes graves. O resto dos partidos é ainda pior ou nanico.

O PSDB se reduziu a um triunvirato de candidatos hiperindividualistas a presidente com um departamento de bons economistas liberais. O ex-clube de elites econômicas mais esclarecidas racha em três partes carcomidas, uma delas um grupo de direita retrógrada.

Há rumores de que o PT pode rachar com uma debandada de parlamentares. Movimentos sociais ligados ao petismo, históricos ou novos, devaneiam com outras paragens políticas. A grande cola do PT é Lula.

Os dois partidos perderam peso no Congresso, dada a fragmentação crescente desde 1998. Aliás, a fragmentação cresceu tanto de 2010 para 2014 quanto de 1998 a 2010.

Além de Dilma Rousseff, algo mais grave aconteceu ou se revelou entre 2010 e 2014. Houve o Junho de 2013. Renasceu a polarização "ideológica" odienta, que amainava desde meados dos 1990.

Apodreceu o sistema de relações entre governo e Congresso. Regras eleitorais, entre outras, reforçaram incentivos para a fragmentação partidária, nome bonito para a formação de grupos que vão de tropas de barganha a bandos de extorsão.

Sim, a coisa vinha de longe. FHC formou a maioria mais sólida do período, mas adquiria apoio com ministérios (preservando os essenciais) e com emendas parlamentares; houve a compra de votos da emenda da reeleição.

Lula, mais minoritário e de início avesso ao PMDB, pagou mais caro. Inflou o número de ministérios (em 60%) para acomodar a barganha e facções petistas irritadas com a "virada à direita" de 2002. Teve mensalão e petrolão.

Nos anos da estabilidade, 1994-2012, politólogos dedicaram-se a um debate de tamanho bíblico sobre a governabilidade. Parecia prevalecer a ideia de que um sistema presidencialista com "n" partidos, o brasileiro, era "governável". Isto é, os poderes do presidente e de uma cúpula centralizada no Congresso eram capazes de organizar maiorias estáveis de partidos que votavam de modo relativamente previsível, "fiel", produzindo a legislação de interesse, em vez de impasses e tumultos.

Pois então. Algo deu errado (já dava, mas não cabe aqui).

Não se prestou atenção nas relações dos partidos com a sociedade nem a contextos sociais e econômicos que produziram essa governabilidade.

Não se atentou para a qualidade desse processo. À corrupção progressiva (escassa prestação de contas). À substância dos partidos (propõem o quê? para quem?). Ao caos do troca-troca partidário. Ao resultado da "governabilidade", às políticas aprovadas: Dilma Rousseff produziu desastre com anuência ou conivência parlamentar e social.

É uma descrição parcial do problema. Mas talvez a política esteja mais quebrada do que a economia.

Jogo de profissional - DORA KRAMER

ESTADÃO - 17/04

A história é professora. Há 30 anos, quando Tancredo Neves vislumbrou a possibilidade concreta de se eleger pelo Colégio Eleitoral e com isso dar fim ao regime militar pela via da legalidade, o então candidato da oposição declarou: “O jogo agora é para profissionais.”.

Paulo Maluf, em tese um bamba na matéria, imbatível na arte de cooptar adeptos a título de quaisquer métodos _ notadamente aqueles materialmente objetivos _ perdeu de lavada a eleição no colégio eleitoral de 1985. Não propriamente por falha na metodologia, mas por ausência da percepção do momento.

Tancredo não era um esquerdista, um radical, muito menos um revolucionário. Ministro de Getúlio Vargas, primeiro ministro da tentativa parlamentarista de João Goulart, deputado eleito de 1958 a 1956, primeiro-ministro no breve período do parlamentarismo brasileiro entre setembro de 1961 e julho de 1962.

Escolhido governador de Minas Gerais na primeira eleição direta pós-ditadura, em 1982, renunciou dois anos depois para se jogar naquela que parecia uma aventura de recuperar a esperança nacional na volta da democracia, golpeada pela queda da emenda Dante de Oliveira que, não por falta de votos, mas por ausência de quorum no Congresso em 25 de abril de 1984. Isso a despeito das pesquisas indicarem apoio de 84% da população às Diretas-Já.

Ato contínuo, a oposição, na voz do então governador de São Paulo Franco Montoro deu a palavra de ordem: “Não vamos nos dispersar”. Um chamamento à continuidade da luta. No caso, em prol da retomada da democracia. Sem invocação à violência nem convocação às ruas.

Apenas o reconhecimento da responsabilidade das forças políticas na reconstrução do que havia sido destruído pelo esforço do poder autoritário. Pela via do arbítrio ou por intermédio da propaganda enganosa. Cumpre lembrar que a maioria da população brasileira já havia saudado o governo dos militares por ocasião de período bem sucedido na economia. De onde se vê que, pelo bolso, é fácil tergiversar e iludir.

Findo esse período negro, estabelecido que o valor da liberdade e do exercício da política como fator essencial para o avanço da sociedade, o País aderiu à possibilidade de sair das trevas e retomar o caminho da luz, expresso na retomada total da democracia.

Pelo visto recuperamos o estado de direito, mas não soubemos dar a ele o uso mais eficaz. Em princípio, é verdade. Olhando melhor pode ser que não seja esse o problema, partindo da premissa de Tancredo Neves de que o jogo da democracia, sobretudo quanto complicado, dispensa os amadores e requer a atuação de profissionais.

Justamente o que ocorre com o atual governo que se debate em reações erráticas frente a um adversário frio e experiente como o PMDB. O partido esperou do PT “na esquina” e, na oportunidade certa, valeu-se de seus erros. Vários e, sobretudo, primários: não levar em conta a opinião do público, apostar todas as fichas na divisão dos pemedebistas e acreditar que o velho truque de distribuir cargos seria suficiente para capturar parte da base parlamentar e, com isso, conseguir virar o jogo.

Base esta de lealdade fluida, cujos desejos, circunstâncias e apelos o PMDB conhece muito melhor que o PT, um amador na matéria. Jogador de competência que só se expressa quando as condições são completamente favoráveis. Na adversidade, não conseguem atuar de modo estrategicamente eficaz e a fábula da celebrada habilidade política cai por terra.

Isso ocorre porque os petistas são profissionais da agitação propagandística, mas completamente amadores da arte de fazer política. Tarefa em que o PMBD em geral, Michel Temer em particular, cursou especialização, pós-graduação, mestrado e doutorado até a conquista do posto de catedráticos.


Os dois lados da história - ANA DUBEUX

CORREIO BRAZILIENSE - 17/04

Somos acostumados, desde a mais tenra idade, à ideia de divisão. Norte e Sul, certo e errado, pobre e rico, branco e preto, verdade e mentira. Na política, esquerda e direita; governo e oposição. Em algum momento, acabamos por nos enquadrar num canto ou noutro; nos identificar com um ou outro viés e nos acolchoar naquele grupo que nos mantém aquecido e confortável neste mundo cruel e conflitante. Nos últimos tempos, não há ninho que nos devolva o sentimento de total adequação. São muitas as contradições a vencer antes de escolher lados. E ainda que se escolha, as inquietações persistem.

Hoje, por exemplo, quando a Esplanada dos Ministérios for tomada aos milhares por espectadores da votação do processo de impeachment, na Câmara dos Deputados, da presidente Dilma, será preciso escolher um lado, ainda que as posições sejam fluidas, tendo vírgulas e senões por toda parte. Toda a subjetividade a que temos direito foi surrupiada pela intolerância, que não deixa alternativa a não ser separar em dois lados, por um alambrado gigante, os manifestantes brasileiros. De um lado, os contrários ao impeachment; de outro, os favoráveis. Simples assim.

Na verdade, nem tanto assim. O muro da discórdia virou por si só um símbolo. Ainda que provisório, é incômodo, menos ao patrimônio, que nos é tão caro; mais à verve democrática, que prega o respeito ao contraditório sempre - o que, convenhamos, não tem existido, nem mesmo entre famílias, tampouco no ambiente virtual. Dificilmente saberemos se a decisão de instalar as cercas foi ou não acertada. Afinal, elas já estão lá. Se a paz prevalecer, terá cumprindo a função, que foi garantir a segurança de todos. Se der confusão, também não saberemos como teria sido sem as grades, pior, talvez.

A decisão de impor o muro ao cartão-postal foi, no mínimo, corajosa, pois colocou o governador Rodrigo Rollemberg na desconfortável posição de ter erguido um monumento à intolerância - ainda que justificável como estratégia de segurança. Também levantou uma discussão sobre a violência dos protestos e levou a manifestações sobre o desejo de paz, com bem-humoradas fotos, charges e memes, que ressignificaram as cercas. Já ficou para a história. Um triste retrato da Esplanada. O muro, que roubou o centro das atenções por uns dias, é uma discussão simbólica, mas no fundo é secundária. Diante da magnitude e da complexidade do momento político brasileiro, diria que beira a desimportância. Independentemente de que lado estamos ou estaremos, será preciso escolher um caminho que todos possam trilhar juntos. A votação de hoje, qualquer que seja o resultado, está longe de encerrar um processo doloroso que nos arrasta há dois anos.

Tirando ou não a presidente, os problemas estão longe de acabar. Também espero que a Lava-Jato não esteja com os dias contados, como o juiz Sérgio Moro insinuou. Que ela dure o tempo necessário para que não sobre um único político corrupto fora da cadeia. Se tudo o que estamos vivendo, incluindo todo o processo para tirar do poder uma presidente eleita de forma legítima, não servir para mudar de uma vez por todas os rumos da política brasileira, toda a luta e o esforço pela democracia brasileira terão sido em vão.

Um dia decisivo - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 17/04

A Câmara dos Deputados reúne-se hoje para decidir sobre a admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. É oportuno reiterar, nesta oportunidade, os termos da nota publicada neste espaço na quinta-feira, 7 de abril, sob o título Impeachment é o melhor caminho: “Este governo, inviabilizado por uma presidente da República inábil e inepta, se deslegitimou de facto por decisão da maioria absoluta dos brasileiros e precisa ser afastado o mais rapidamente possível para permitir que se dê início à reconstrução nacional”. Esta é a dura realidade dos fatos e o País espera que seus representantes não a percam de vista no momento em que, diante dos olhos daqueles aos quais devem seus mandatos, se dirigirem ao microfone do plenário da Câmara para declarar “sim” ou “não” à admissibilidade do processo de impeachment.

A deposição de uma chefe de Estado eleita pelo voto popular é certamente uma medida traumática que, se não fosse conduzida dentro dos limites estritamente constitucionais, constituiria grave ofensa – “golpe”, como preferem os petistas – aos fundamentos institucionais do País. Mas a democracia brasileira, embora jovem e carecendo de aprimoramentos, tem sabido reagir adequadamente às crises surgidas nos últimos trinta e tantos anos. O processo de impeachment de Dilma Rousseff não fugiu à regra.

Existem fundamentos jurídicos em abundância para respaldar o pedido de impeachment. A eles se soma a avassaladora razão de natureza política que se traduz, em resumo, pela traição aos reais interesses do País, patente a partir do momento em que o governo petista escancarou a opção por seu projeto de perpetuação no poder com a prática de um populismo irresponsável que mergulhou o Brasil na mais grave crise moral e econômica do último quarto de século.

Dilma deverá ter seu mandato cassado não apenas pelas “pedaladas” que efetivamente praticou, desrespeitando normas fiscais, ou por ter criminosamente autorizado despesas públicas à revelia do Parlamento. Dilma também será apeada do poder porque a esmagadora maioria dos brasileiros está revoltada com a corrupção endêmica na gestão da coisa pública, estimulada por um ex-presidente que se apresenta como defensor dos fracos e oprimidos enquanto confraterniza com empresários poderosos e corruptos; com as deslavadas mentiras eleitorais de 2014; com a arrogante e desastrada tentativa de impor, na marra, a hegemonia do lulopetismo ao Parlamento logo no início do segundo mandato; com a exacerbação do nefasto toma lá dá cá que transformou a Esplanada dos Ministérios num balcão de compra e venda de diplomas de representação popular.

Dilma deverá ser afastada da Presidência da República porque sua gerência arrogante e inepta resultou na inflação que corrói os rendimentos da população de baixa renda e na recessão que rouba os empregos, igualmente, de chefes de família e de jovens. A perversa combinação de inflação e recessão resultou na absoluta falta de confiança no governo central por parte dos agentes econômicos, sem cujo concurso é simplesmente impossível promover o crescimento econômico e a criação de riquezas que beneficiem o conjunto da sociedade.

A vitória do “sim” ao impeachment na votação de hoje na Câmara, sugerida pela debandada dos antigos apoiadores da presidente que se seguiu à aprovação do relatório da Comissão Especial, será apenas mais um passo no processo de afastamento definitivo de Dilma. A partir daí, a responsabilidade será do Senado Federal, onde já se prevê que a votação, por maioria simples, da admissibilidade do impeachment será realizada dentro de pouco mais de um mês. Começará, então, a contar o prazo de até 180 dias, durante o qual Dilma ficará afastada da Presidência, para a decisão final do Senado.

Todo esse rito deverá ser conduzido com serenidade de espírito e rigoroso respeito à Constituição e às leis do País. E o resultado deverá ser acatado por todos os brasileiros, independentemente de simpatias e ideologias. Pois, após passar pelas incertezas dos últimos meses, a Nação precisa se reagrupar para superar a crise. Esse é um dever patriótico ao qual nenhum cidadão poderá faltar.

Não vai mesmo ter golpe - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 17/04

Importante é que, seja ou não aprovada a admissibilidade do processo de impeachment da presidente Dilma, tudo transcorre sem quebra da ordem institucional

Depois de 24 anos, o país volta a se encontrar, pela segunda vez na História, com a situação limite do impeachment de um presidente da República. No caso de Fernando Collor, em 1992, estava em questão a honradez, o decoro do cargo manchado pela corrupção; com Dilma Rousseff, um crime tipificado de responsabilidade, devido ao notório desprezo da presidente pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) — registrado por analistas, denunciado pela imprensa profissional pelo menos desde 2013 —, reforçado pela realização de despesas sem a aprovação do Congresso, um ato monárquico. Não se trata de “questão contábil”, como procura minimizar o advogado-geral da União, ministro José Eduardo Cardozo, defensor de Dilma no Congresso e perante o Supremo Tribunal Federal.

Entre os dois casos, há uma importante diferença: Collor, um desconhecido do eleitorado, governador de Alagoas, favorecido por um desses momentos perigosos em que a degradação da imagem da política dá chances a oportunistas que se transvestem em “salvadores” do Brasil, não contava com o suporte de qualquer partido forte. Teve de se abrigar no nanico PRN, para registrar a candidatura.

Já Dilma, brizolista, depois filiada ao PT, criatura de Lula, tem o apoio do bloco de esquerda, minoritário entre os eleitores, porém organizado. Durante os 13 anos no Planalto, ainda soube cooptar movimentos ditos sociais e organizações em geral, entre as quais se destacam sindicatos, com benevolente distribuição de dinheiro do Tesouro.

Além disso, o PT foi beneficiado pela decisão do primeiro governo Lula de manter as bases de uma política econômica sensata, ajudada pela sorte de haver um ciclo importante de alta de cotações de commodities. O governo aproveitou e expandiu programas sociais herdados dos tucanos, e assim Lula turbinou a popularidade. Já Collor não tinha esse apoio, nem contou com a sorte de um ciclo mundial de crescimento.

Pesquisa mostra que 61% dos brasileiros querem o impeachment, mas os 33% do lado contrário, segundo o Datafolha, contam com máquinas — nos aparelhos encravados em segmentos da burocracia pública, em sindicatos e em movimentos ditos sociais cevados com dinheiro público. Não deverá ser uma tramitação tranquila a do impeachment, em todas as etapas. Se aprovado hoje.

O ponto comum entre os processos de Collor e Dilma são as instituições republicanas. Ministério Público, Polícia Federal, Judiciário e Legislativo deram, no escândalo de Collor, o primeiro exemplo de atuação, desde a redemocratização, à margem de pressões de poderosos. E dariam demonstração mais forte ainda nestes 13 anos de PT e Lula em Brasília.

Primeiro, no mensalão, e, desde 2014, com a Lava-Jato, no petrolão. Houve incontestável assalto ao dinheiro público por meio do controle de estatais (Banco do Brasil, Petrobras, Eletrobras etc.). Chegando ao ápice no petrolão, escândalo de corrupção dos maiores do planeta.

O mesmo instrumento institucional mobilizado contra Collor, este visto como das “elites”, tem sido acionado pelo Estado, também sem qualquer deslize inconstitucional, desta vez contra Dilma e companheiros, Lula incluso, num governo “popular”. As instituições precisam ser impessoais, e têm sido.

Assim como não houve golpe contra Collor, não há também contra Dilma, seja a admissibilidade do pedido de julgamento do seu impeachment aprovada hoje ou não. Não importa o resultado da votação, a democracia representativa brasileira sairá mais forte.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

DILMA FORA, MINISTROS CAIRÃO NAS MÃOS DE MORO

Várias autoridades do governo Lula estão insones porque a destituição da presidente Dilma Rousseff ocasionará perda dos seus cargos e, principalmente, de prerrogativas preciosas. Sem foro privilegiado, Lula e os ministros Jaques Wagner, Aloizio Mercadante e Edinho Silva, citados em delações premiadas da Operação Lava Jato, ficarão sujeitos ao juiz federal Sergio Moro, implacável contra a corrupção.

LULA, O INIMPUTÁVEL
Dilma decidiu nomear Lula ministro, conforme denunciou a Procuradoria Geral da República, para livrá-lo do juiz Sergio Moro.

OLHO DA RUA
O que tira o sono desses ministros enrolados é a certeza de que serão demitidos, caso Michel Temer assuma o lugar de Dilma.

NO LIMBO
Sendo afastada do cargo, Dilma terá de coçar o bolso para pagar sua própria defesa. A Advocacia-Geral da União deve defender a União.

MEDO DE CADEIA
Apesar de receber metade do salário se for mesmo afastada, Dilma poderá usar uma residência oficial do Alvorada ou da Granja do Torto.

LULA FEZ VISITA A CRIMINALISTA ÀS 6H DA MANHÃ
O ex-presidente Lula manteve reunião secreta com José Gerardo Grossi, ex-ministro de Tribunal Superior Eleitoral e um dos mais requisitados criminalistas de Brasília. O caráter sigiloso e urgente do encontro pode ser avaliado pela hora que Lula chegou ao escritório do advogado, no Lago Sul, em Brasília: antes das 6h da manhã. Os escritórios de Lula e de Grossi não informaram o motivo da reunião.

FORA DA LISTA
José Gerardo Grossi não consta da lista de advogados oficialmente contratados para promover a defesa de Lula, na Lava Jato.

MÃO AMIGA
Grossi ajudou José Dirceu quando o ex-ministro de Lula precisava de carteira assinada para se habilitar ao regime semiaberto, na Papuda.

EX-PRESIDENTE INVESTIGADO
Lula é investigado por corrupção na Lava Jato, até foi conduzido para depor pela PF sob vara, e seu filho Luiz Claudio é alvo da Zelotes.

O BRASIL REAL QUEBROU
Enquanto Dilma paralisa seu governo há semanas, para tentar escapar do impeachment, comerciantes decidem fechar lojas aos domingos, inclusive nos shoppings, em razão da crise e dos custos insuportáveis.

QUEIMA DE ESTOQUE
A oposição está de olho na “queima de estoque” de cargos, em curso no governo, para tentar barrar o impeachment de Dilma. Há suspeitas de que, além de cargos, governistas têm oferecido malas de dinheiro.

AMEAÇA VELADA
Em conversas reservadas, Lula diz estar “preocupado” com a reação de sindicatos e movimentos sociais, que a rigor ele controla, no caso de impeachment de Dilma. Mas foi ele quem convocou seguranças para “bater em coxinhas”, na rua onde mora, em São Bernardo.

TUDO POR DINHEIRO
Deputados aliados do governo estão aproveitando o momento de fragilidade de Dilma para empenhar emendas parlamentares, mas se comprometem com a oposição a votar pelo impeachment.

MORTADELAS ILEGAIS
O governo Dilma e o PT ignoraram a Lei 6.815, que proíbe estrangeiros participando de protestos políticos em território nacional. Governos da Bolívia, Venezuela e outros, mandaram manifestantes “mortadelas”, para fazer número nas manifestações deste domingo, em Brasília.

DIAS MELHORES
Pré-candidato a presidente pelo Partido Verde, em 2018, o senador Alvaro Dias (PR) já tem slogan, aliás, muito pouco criativo: “Dias melhores virão”. Sua turma de criação precisa se esforçar mais.

CENOURA ALICIANTE
O deputado Eduardo da Fonte (PP-PE) protagonizou um vexame. Aceitou a cenoura que o governo acenou e indicou um aliado para ser ministro da Integração. Ficou menos de 24 horas no cargo.

#FORADILMA
Contra o discurso do governo de que impeachment é golpe, o deputado Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) garante que não trabalha para Temer ser presidente: “Estou trabalhando pelo impedimento de Dilma”, diz.

PENSANDO BEM…
…tudo começou com 20 centavos, quando o povo foi às ruas, em junho de 2013, sem ainda saber das “pedaladas” bilionárias de Dilma.