segunda-feira, dezembro 26, 2011

O autor da foto - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 26/12/11

Está desfeito o mistério da autoria desta foto de Dilma, aos 22 anos, em depoimento à 1a- Auditoria Militar, no Rio, em 1970. É de Adir Mera, velho coleguinha da “Última Hora” naqueles dias difíceis da ditadura, falecido em 1990. A identificação foi feita por seus excompanheiros de redação Pinheiro Júnior e Adalberto Diniz, que decifraram os rabiscos no verso da cópia da foto.

Nome dele é trabalho

Carlos Lupi, o incansável exministro do Trabalho demitido, entre outros rolos, por causa da descoberta de seus múltiplos cargos públicos, ainda mantém o bico de conselheiro do BNDES, pago com o seu, o meu, o nosso dinheirinho.

Stepan 2012

O PPS deve lançar o deputado Stepan Nercessian candidato à prefeitura do Rio em 2012.

As brasileiras

A série “As brasileiras”, do craque Daniel Filho, teria 16 episódios, já prontos, mas a TV Globo pediu mais seis. O mestre já selecionou cinco musas para os novos capítulos — Glória Pires, Cléo Pires, Mariana Ximenes, Bruna Linzmeyer e Dira Paes. Só falta uma.

Stephen King
A Objetiva comprou os direitos de lançamento no Brasil de “Sob a redoma”, novo romance de Stephen King, o mestre americano do terror. É a história de uma pequena cidade fictícia separada do mundo por uma redoma invisível.

Amigos de Havelange
Os amigos de João Havelange, 95 anos, organizam um almoço de adesão em desagravo ao ex-presidente da Fifa, dia 5, no Country Club do Rio, em Ipanema. A lotação é limitada a 200 pessoas, a R$ 60 por cabeça.

Em tempo...

Havelange teve de renunciar ao COI, do qual era membro há 48 anos, acusado de receber dinheiro de uma empresa de marketing ligada à Fifa.

Blatter no Brasil

Joseph Blatter, presidente da Fifa, programa uma visita ao Brasil antes do carnaval. Vem tratar da Copa de 14.

Júnior sem Sandy

Depois de Sandy, agora é seu irmão Júnior que reaparece com sua carreira solo. O cantor, ex-sertanejo, de 27 anos, hoje adepto da música eletrônica, é atração confirmada para o Rio Music Conference, a partir de 14 de fevereiro, na Marina da Glória.

Ai, se eu te pego
Sexta, por volta de 22h, Eduardo Paes, de gaiatice com amigos, dançava “Ai, se eu te pego”, sucesso de Michel Teló, em frente ao Jobi, no Leblon.

Fator Infraero

De 9h até pelo menos meiodia de ontem, nenhum avião pode decolar ou pousar no Aeroporto de Jacarepaguá, no Rio, porque o caminhão de água operado pelos bombeiros, pertencente à Infraero, não... pegava. O pesadão velho de guerra tem 30 anos de uso. Muitos vips não puderam pousar com seus jatinhos na volta do feriadão.

Perigo na areia

No fim de semana, uma carioca brincava com a filha de 1 ano no Baixo Bebê, na Praia do Leblon, quando espetou o pé, acredite, numa... seringa de injeção! Assustada, foi ao Hospital Miguel Couto com a agulha, ver se estava infectada (o exame não ficou pronto). Ali, soube que este tipo de acidente na praia tem sido comum. Meu Deus...

Beth 2012

Beth Carvalho, que vai abrir o réveillon de Copacabana, tem superstições para a virada: — Vou comer três uvas verdes e fazer um pedido para cada — conta ela, que vestirá dourado, para “atrair riqueza”.

A boemia sorri

Eduardo Paes, depois de ler a notícia aqui no sábado, véspera de Natal, mandou reabrir na mesma manhã o Armazém Cardosão, bom e velho botequim de Laranjeiras, que um fiscal havia interditado há uma semana por causa de problemas no alvará.

A 'democradura' argentina - EDITORIAL O ESTADÃO



O Estado de S. Paulo - 26/12/11


As eleições de outubro passado na Argentina não apenas deram um segundo mandato à presidente Cristina Kirchner, como lhe permitiram recuperar a maioria na Câmara dos Deputados, perdida em 2009, e, com isso, assegurar a subordinação do Congresso Nacional aos ditames da Casa Rosada. Reempossada no começo do mês, Cristina não perdeu tempo em usar a supremacia política do governo para impor a sua agenda legislativa, em que se destacam propostas claramente destinadas a tolher a liberdade de expressão no país. Do ponto de vista do kirchnerismo, faz todo o sentido: com a oposição fragmentada por disputas paroquiais e desacreditada pela sua impotência em face do rolo compressor do oficialismo em todas as frentes, incluindo o Judiciário, sobrou um único obstáculo à transformação do país numa versão austral da "democradura" chavista: os setores da mídia que não se acoelharam diante dos atos de intimidação e de sua formidável prontidão para corromper.

Para se ter ideia, no ano passado os gastos do governo com publicidade somaram o equivalente a US$ 288,2 milhões, três vezes mais do que em 2008, o primeiro ano de Cristina no poder. O Executivo federal é o maior anunciante do país. E a distribuição das verbas de propaganda obedece - como quase tudo o mais nas relações do Estado argentino com a sociedade - à lei do cão. O jornal Pagina 12, outrora independente e mordaz, foi contemplado com US$ 5,6 milhões como prêmio por ter passado a fazer parte do sistema de controle social adotado pela Casa Rosada. Já o outrora aliado Clarín, o principal diário do país e um dos maiores do mundo em espanhol, recebeu a quirera de US$ 400 mil, apenas para constar, desde que começou a criticar o kirchnerismo, há três anos. O estrangulamento do matutino e, mais ainda, do bem-sucedido conglomerado de mídia que o edita se tornou uma obsessão da presidente.

Esse intento está na raiz da Lei de Serviços Audiovisuais (também chamada Lei de Meios) aprovada parcialmente em fins de 2009 e atualmente sub judice. O texto estabelece limites à participação privada nos setores de rádio e TV, o que obrigará o Grupo Clarín - se o governo impuser por inteiro a sua vontade - a abrir mão do controle acionário de um número talvez significativo de emissoras. O cerco à imprensa é uma operação concatenada. O novo chefe de gabinete de Cristina, com efeito, é o ex-secretário de Comunicação Juan Manuel Abal Medida, um dos autores da lei de mídia. Na Argentina, a chefia do gabinete presidencial equivale, em tese, ao Ministério de Relações Institucionais no Brasil: o seu titular é o interlocutor natural do governo com o Congresso e condutor da sua articulação política. Cristina deve estar muito satisfeita com o seu trabalho. A toque de caixa, o Parlamento aprovou dois sinistros projetos kirchneristas.

O primeiro, que declara de "interesse público" a produção, venda e distribuição de papel-jornal, passou na Câmara por 134 votos a favor ante 93 contra, na última semana. Na quinta-feira a dose se repetiu no Senado (41 a 26). O objetivo escancarado do governo é se apropriar da única empresa do setor no país, a Papel Prensa, cujos sócios privados, o Grupo Clarín e o que edita o jornal La Nación, detêm ao todo 71% do seu capital. O Estado argentino, 27%. Com a nova lei, a sua participação poderá se ampliar enormemente - isso se a companhia não for sumariamente expropriada, ficando a imprensa à mercê da Casa Rosada para ter acesso ao insumo e não precisar recorrer a fornecedores estrangeiros. O segundo ataque liberticida, via Congresso, foi mais engenhoso. Também na quinta-feira o Senado completou a aprovação de uma lei antiterrorista, feita para aterrorizar, isto sim, o jornalismo.

O governo poderá enquadrar na lei o noticiário da imprensa que possa provocar especulação financeira, cambial ou uma corrida aos bancos - ou ainda "ameaçar a governabilidade". Evidentemente, isso permitirá à Casa Rosada considerar terrorista qualquer notícia ou comentário que o seu ocupante não gostaria de ver divulgados - desde uma denúncia de corrupção nos negócios oficiais à exposição de graves desequilíbrios nas contas internas. Uma ditadura não faria melhor.

Programas em série - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 26/12/11


Dilma Rousseff tem dito aos ministros que é hora de se concentrar na realização dos projetos que anunciaram e arrumar recursos para aqueles recebidos de Lula - afinal, o governo é de continuidade. Em 2012, o Planalto não será mais o "Cabo Canaveral", uma base de lançamentos


Brasil Maior, Brasil sem Miséria, programa de combate ao crack, de atenção à pessoa com deficiência e por aí vai. Ao longo de 2011, o Palácio do Planalto mereceu o apelido de “Cabo Canaveral”, recebido ainda no governo Fernando Henrique Cardoso. Foi uma verdadeira base de lançamentos. Para 2012, a previsão é de menos novidades desse porte. A ordem da presidente Dilma Rousseff é que todos se dediquem a realizar o que foi apresentado à população. E, francamente, se isso for seguido à risca, sem dúvida teremos um 2012 mais ao gosto do contribuinte.

Afinal, o Brasil não carece de programas. Em cada ministério, há uma infinidade deles, nas mais diversas áreas. Só no catálogo de programas do governo federal destinado aos municípios são 180. E isso não inclui muitas ações do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), ou seja, há mais projeto por aí. Talvez nem a presidente Dilma Rousseff saiba dizer com segurança, se perguntada de sopetão, quantos programas existem em cada ministério de seu governo ou se há muitas ações sobrepostas a serem enxugadas.

Muitos desses programas vêm de governos anteriores. Alguns, dos tempos de Fernando Henrique Cardoso, ou mesmo de antes disso. O Bolsa Família, talvez o mais emblemático da era Lula, foi concebido juntando o Bolsa-Escola do Ministério da Educação com o Bolsa-Nutrição, do Ministério da Saúde; e o Vale-gás, do Ministério de Minas e Energia. Todos do período de Fernando Henrique. E muitos desses se basearam no tíquete do leite, lá dos anos 80, ainda no governo Sarney.

Até o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), deste século, não pode ser visto como uma invenção genial do último governo. Apresentado ao país em 2007, no início do segundo mandato do presidente Lula, o PAC é quase que mais do mesmo, se comparado ao que houve em alguns governos. Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, comandou algo parecido, o “Brasil em Ação”, no qual cada setor tinha um gerente encarregado do acompanhamento dos projetos. O país foi dividido em eixos de desenvolvimento, com obras estratégicas em vários setores. Assim como o PAC, o “Brasil em Ação” também passou por uma solenidade palaciana — ou várias. E, assim, a cada dia, solenidades e mais solenidades ocorrem nos salões do Planalto. Em temporada de presidente candidato à reeleição, o movimento por ali é frenético.

É natural que cada presidente se considere melhor do que seus antecessores para conceber programas e projetos governamentais. Faz parte do script. Também é até compreensível — embora não seja algo digno de aplausos — que um presidente queira mudar os projetos de nome para não deixar os louros ao antecessor. No mundo da política, onde os partidos se engalfinham por um naco de poder, essa atitude é corriqueira. Mas é chegada a hora de dar um basta nisso, nessa prática de lançar programas todos os anos, como se determinada área estivesse começando do zero.

Alguns técnicos contam muito reservadamente que, todas as vezes em que um ministério ganha um programa novo, os antigos são meio que deixados de lado. Ocorre com os projetos governamentais, guardadas as devidas proporções, o mesmo que acontece com algumas crianças, quando recebem um brinquedo novo. O antigo, já surrado de tanto levar trancos para lá e para cá, fica esquecido no fundo do baú, sem a menor atenção — o que, no caso dos projetos, se traduz em falta de recursos, de fiscalização e de controle.

Desativar o “Cabo Canaveral”, ou parar de dar “brinquedo novo” à burocracia governamental, talvez seja a única forma de fazer acontecer os projetos lançados até agora. Não por acaso a presidente Dilma Rousseff tem dito a seus ministros que é hora de todos eles se concentrarem na realização dos programas que o governo lançou neste ano e na reserva de recursos para levar adiante tudo o que ela recebeu do presidente Lula — afinal, o governo é de continuidade. E, se lançar mais algum programa novo, Dilma pode, sem querer, passar a impressão de que os do antecessor não serviam. E isso será mais uma intriga para a oposição usar no sentido de desconstruir o governo Lula. Já chega os ministros herdados, que mudaram quase todos. Mas essa é outra história.

GOSTOSA


Devolvendo - SONIA RACY

O ESTADÃO - 26/12/11


A APCA resolveu cancelar o prêmio dado, e ste ano, ao projeto “Panorama da Música Brasileira – Unicamp”, na categoria Música Erudita. A decisão foi tomada depois que a coluna publicou, semana passada, que o compositor Eduardo Escalante, um dos três jurados, havia participado do trabalho premiado.

Aguinaldo Cunha, daAssociação, informa ser “vedada a premiação de um crítico da própriaentidade. Isso não acontece, não pode acontecer”.

Não haverá punições ao júri.

Reforço
Mudanças na Unica, associação dos usineiros brasileiros. Está para ser anunciado que Pedro Parente assumirá a presidência do conselho da instituição, ficando Marcos Jank na presidência executiva.

Resoluções
Luan Santana abandonou a malhação com sua personal trainer em setembro.

Mas promete que voltará aos treinos em janeiro.

Uma década
O restaurante Maritaca, de Trancoso, completa 10 anos nesta quarta. Preparando-se para receber os fiéis clientes da temporada de verão.

À chinesa
A JAC Motors, de Sergio Habib, vendeu, em um ano, 35 mil veículos – perto de 20% do mercado de importados em 2011. Imagine o espaço que ocupará quando o produto for Made in Brazil.

Na tela
Frans Krajcberg vai ganhar mais um documentário. Desta vez, por Regina Jehá.

Responsabilidade social
• Neste Natal, a Motorola Solutions doou cinco toneladas de alimentos para a Secretaria de Assistência Social de Barueri, SP. Os produtos serão encaminhados a famílias carentes da região.

• O Amigo de Valor do Santander, programa de incentivo de doação de parte do Imposto de Renda às iniciativas em prol da criança e do adolescente, fechou as contas. Arrecadou entre seus funcionários e clientes este ano R$ 4,4 milhões, recorde histórico do projeto.

• A Fundação Lemann está trazendo para o Brasil o conteúdo do portal educacional Khan Academy. Os vídeos, com aulas de aritmética, física, química e biologia, estão sendo traduzidos para o português e alguns deles já estão disponíveis no canal da Fundação Lemann no YouTube. No ano que vem, a Fundação leva a ferramenta para seis escolas públicas de São Paulo.

• Regina Casé disse sim. É a nova embaixadora brasileira da Hear the World, iniciativa mundial para a prevenção dos problemas de audição.

• Fernanda Lancelloti e Marcelle Comin, sócias da Dreams Arquitetura de Ideias, trocaram a confraternização de fim de ano por ação social. Orientado por profissionais, os funcionários da agência repaginaram a Creche Lar da Bênção Divina.

• A Faculdade Cantareira avisa: apoia a campanha Papai Noel dos Correios.

• João Carlos Martins participou da solenidade de formação de 350 jovens da Orquestra Nova Harmonia, projeto 
de educação musical da Alelo com sede em Barueri.

A força da esperança - CARLOS ALBERTO DI FRANCO


O ESTADÃO - 26/12/11

Recentemente, reli a encíclica Spe Salvi (Salvos pela Esperança), a segunda do pontificado de Bento XVI. Um primor. O papa é um grande intelectual e um comunicador de primeira. Aborda temas difíceis com uma simplicidade admirável. Num mundo algemado pelos grilhões do ceticismo e pelo impacto corrosivo do cinismo, sobretudo no mundo político, Spe Salvi é uma forte estocada e uma provocação. De Santo Agostinho a Lutero, Kant, Bacon e Engels, homens da Igreja, santos e filósofos, ortodoxos e heterodoxos, desfilam na encíclica como protagonistas da nostalgia do ser humano com a esperança.

Bento XVI desnuda a inconsistência das esperanças materialistas e faz uma crítica serena, mas profunda, à utopia marxista. Segundo o papa, Marx mostrou com exatidão como realizar a derrubada das estruturas. "Mas não nos disse como as coisas deveriam proceder depois. Ele supunha simplesmente que, com a expropriação da classe dominante, a queda do poder político e a socialização dos meios de produção, ter-se-ia realizado a Nova Jerusalém." Marx "esqueceu que o homem permanece sempre homem. Esqueceu o homem e sua liberdade. Esqueceu que a liberdade permanece sempre liberdade, inclusive para o mal. (...) O seu verdadeiro erro é o materialismo: de fato, o homem não é só o produto de condições econômicas nem se pode curá-lo apenas do exterior. (...) Não é a ciência que redime o homem. O homem é redimido pelo amor".

O cerne da encíclica, um vibrante apelo à genuína esperança cristã, é a antítese do surrado discurso dos teólogos da libertação que, com teimosa monotonia, apostam no advento da utópica Jerusalém terrena. As injustiças, frequentemente escandalosas e brutais, devem ser enfrentadas e superadas, mas não há o paraíso neste mundo. E o papel da Igreja, não obstante seu compromisso preferencial com os pobres e desvalidos, é essencialmente espiritual. Bento XVI não contorna os temas difíceis ou politicamente corretos. Na contramão de certo ativismo eclesiástico, aponta a oração como "primeiro e essencial lugar" da esperança. "Quando já ninguém me escuta, Deus ainda me ouve." Sugestivamente, o papa evoca o falecido cardeal vietnamita Nguyen Van Thuan, que, após 13 anos na prisão comunista, 9 dos quais numa solitária, escreveu Orações na Esperança. "Numa situação de desespero aparentemente total, a escuta de Deus, o poder falar-Lhe, tornou-se para ele uma força crescente de esperança, que, depois da sua libertação, lhe permitiu ser para os homens em todo o mundo uma testemunha daquela grande esperança que não declina, mesmo nas noites de solidão."

A mensagem de Bento XVI, direta e sem concessões, tem repercutido com força surpreendente. Seu desempenho, sobretudo no meio jovem, é uma charada que desafia o pretenso feeling de certos estudiosos do comportamento. Afinal, o estereótipo do papa conservador, obstinadamente apegado aos valores que estariam em rota de colisão com a modernidade, vai sendo contestado pela força dos fatos e pela eloquência dos números.

As Jornadas Mundiais da Juventude têm sido um bom exemplo do descompasso entre as profecias de certos vaticanólogos e a verdade factual. Crescentes multidões multicoloridas, usando tênis e mochilas, transformam este avô da cristandade num indiscutível fenômeno de massas. Como explicar o fascínio exercido pelo papa? Como digerir a força de um fato?

Vem-me à lembrança, enquanto escrevo este artigo nesta São Paulo fascinante, cosmopolita e multicultural, a cobertura que fiz para o jornal O Estado de S. Paulo, em outubro de 2003, do 25.º aniversário do pontificado de João Paulo II. Lembro-me, entre outros, de um depoimento sugestivo. Bruno Mastroianni era um jovem filósofo romano. Sobrinho de Marcello Mastroianni, o falecido ator de La Dolce Vita, do magnífico Fellini, nasceu depois da eleição de João Paulo II. Encontrei-o enturmado na Praça de São Pedro. "Nestes meus 24 anos", dizia-me então, "o papa sempre esteve presente. Lembro-me quando era criança daquele homem vestido de branco, com aspecto de estrangeiro, mas, ao mesmo tempo, tão familiar. Mais tarde, durante os anos da adolescência, fiquei rebelde. O papa, no entanto, estava sempre lá, um pouco mais velho, mas sempre forte. Dizia-nos, então, que o amor de Deus era a única resposta, o único caminho para um futuro melhor. Agora, formado e iniciando minha vida profissional, aquele homem vestido de branco, longe de parecer um velhinho frágil e doente, continua lá. É uma rocha firme e segura. Acredito que para todos os jovens como eu não exista um melhor mestre do amor que um papa tão enamorado de seu serviço ao mundo."

A incrível sintonia entre os papas e a juventude oculta inúmeros recados. Num mundo dominado pela cultura do ter, pelo expurgo do sofrimento e pela fuga da dor, Bento XVI caminha aparentemente no contrafluxo.

"Não é o evitar o sofrimento, a fuga diante da dor, que cura o homem, mas a capacidade de aceitar a tribulação e nela amadurecer, de encontrar o seu sentido através da união com Cristo, que sofreu com infinito amor", sublinha o papa na Spe Salvi.

"A grandeza da humanidade determina-se essencialmente na relação com o sofrimento e com quem sofre. Isto vale tanto para o indivíduo como para a sociedade. Uma sociedade que não consegue aceitar os que sofrem e não é capaz de contribuir, mediante a compaixão, para fazer com que o sofrimento seja compartilhado e assumido é uma sociedade cruel e desumana", conclui Bento XVI.

Os jovens, rebeldes, mas idealistas, decodificam com mais facilidade o recado de esperança do papa.

A todos, feliz 2012!

O mar numa piscina - RUY CASTRO


FOLHA DE SP - 26/12/11
RIO DE JANEIRO - João Gilberto tem saído com frequência nas folhas nesse fim de ano, pelos shows que acertou com empresários e não cumpriu, alegando questões de saúde. Questões que, devido ao seu histórico, foram recebidas com chacota, embora, no caso atual, o fiasco possa ter sido causado pela inexperiência de pessoas à sua volta.

Com isso, a grande notícia envolvendo o artista passou despercebida na semana passada: sua vitória no longo processo contra a gravadora EMI, por esta ter remasterizado e embalado indevidamente seus três primeiros LPs ("Chega de Saudade", 1959, "O Amor, o Sorriso e a Flor", 1960, e "João Gilberto", 1961, além de um 45 rpm, "Orfeu do Carnaval", 1959), espremendo 38 faixas num LP duplo ("O Mito") e num CD simples ("The Legendary João Gilberto"), em 1990.

Para realizar a proeza de despejar o mar numa piscina, a EMI alterou a ordem das faixas, fundiu umas e encurtou outras. Além disso, ao remasterizá-las, teria interferido na sonoridade dos instrumentos e alterado as frequências das gravações originais. Tais modificações podem ser imperceptíveis ao ouvido humano, mas o ouvido de João Gilberto não é humano. É sobre-humano. E o parecer do músico Paulo Jobim, filho do cocriador dos discos -Tom Jobim-, a favor de João Gilberto, encerrou o assunto.

João Gilberto tem direito a um xis sobre os exemplares vendidos naqueles formatos espúrios. E quanto não teria sobre os discos que deixaram de ser vendidos nesses 20 anos em que, por causa do processo que se viu obrigado a mover, eles não puderam ser legalmente prensados?

Mais importante: significa que, agora, os discos voltarão gloriosamente às lojas, como eram ao nascer e com as sonoridades certas? E quem vai ressarcir a cultura brasileira pelos 20 anos que ela teve de passar sem eles?

OTIMISMO - AÉCIO NEVES


FOLHA DE SP - 26/12/11

O final do ano nos humaniza. Traz consigo o calor da família e dos amigos, momento para encontros e reencontros, propício para reparar eventuais omissões, lapsos, encurtar distâncias e também desarmar o estopim da intolerância.

É quando pisamos com outra leveza e a necessária sabedoria o terreno das oportunidades vividas ou perdidas e dos sonhos ainda acalentados.

É quando não podemos deixar de somar ausências, lidar com cadeiras vazias na ceia de Natal e nos darmos conta do que parecemos esquecer no dia a dia: que a marcha do tempo é irremediável. É nessa época que costumamos fazer balanços e nos reencontrar com nós mesmos, com as convicções e esperanças que constroem a identidade de cada um.

No meu caso, nesta perspectiva extensa, vejo que busco manter-me fiel à postura que sempre me impus desde que, há 25 anos, iniciei a minha vida pública -não cair na tentação fácil de tratar adversário como inimigo, de confundir país com governo.

No plano da esperança, apesar das decepções de tarefas inconclusas e das incompreensões da vida pública, constato novas possibilidades sendo vagarosamente gestadas, não pelo mundo do poder, mas pelo amadurecimento de uma nova consciência coletiva acerca dos direitos dos cidadãos e dos deveres de todos nós para com o país.

E é ela, sempre ela, a esperança, que termina por nos conduzir à frente.

Se no Brasil o ano foi engolfado por denúncias no campo ético e marcado por um crônico imobilismo da agenda de transformações, em plano mais ampliado, a história, aqui e fora daqui, registrará 2011 como o momento em que, após longo torpor, a juventude começou a retomar a iniciativa da ação política.

Sou otimista por natureza e é com este sentimento que saúdo a forma com que, graças à tecnologia, mais e mais pessoas se apropriam da política como ela merece ser exercida, como instrumento pessoal e coletivo de transformação da sociedade, longe dos ritos solenes.

Através da internet e das redes sociais, os espaços públicos aqui e no mundo voltaram a ser arejados e rejuvenescidos por contingentes de cidadãos de todas as idades, ávidos em reiterar o valor universal da justiça e da democracia. Como consequência, a política tradicional está sendo obrigada a ecoar cada vez mais esse generoso clamor das ruas. E se o final do ano, repito, nos humaniza, que isso não seja privilégio apenas desses dias.

Que 2012 nos permita encontrar o caminho para novas convivências. Na vida familiar e na atividade profissional. E que essa convivência seja, no primeiro caso, regada apelo afeto. E, no segundo, pelo respeito. Assim, poderemos percorrer 2012 honrando mais e melhor a nós mesmos e a nossa história. Feliz ano novo!

Integração ou embromação? - MAURO LAVIOLA


O GLOBO - 26/12/11 


Há quem ache que os setores privados preferem ver os países latinos do continente viver de forma periférica e dependentes do mundo desenvolvido porque atados aos modelos orientados pelos organismos financeiros internacionais que lhes impedem de conceber categorias próprias à região. É o caso de Carlos (Chacho) Alvarez, argentino e atual secretário-geral da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi), que publicou no GLOBO (16/12) um artigo onde isso fica subentendido. Ele, provavelmente, não tomou conhecimento das novas diretrizes que a recém-reeleita presidente da Argentina divulgou durante sua posse. Trata-se de verdadeiro programa libertário das "amarras" político-institucionais que, supostamente, são impostas à Argentina por OMC, FMI, Aladi, banca internacional e pelo próprio Mercosul.

Resumidamente, o programa argentino para o próximo quadriênio abrange:

- Controle geral de todas as exportações e importações como medida básica de priorizar o abastecimento do mercado interno;

- Total coordenação das secretarias de Comércio Exterior e do Interior na aplicação desses controles, sob a tutela do Ministério da Economia;

- Esvaziamento do Ministério das Relações Exteriores das funções relativas às negociações internacionais que passarão a ser conduzidas pela Secretaria de Comércio Exterior do Ministério da Indústria, encarregado de orientar a política de defesa do mercado interno (leia-se protecionismo);

- Proposta no Mercosul para elevação da TEC de produtos "sensíveis";

- A nova secretaria será responsável pela administração de todos os mecanismos de defesa comercial (permitidos ou não), tais como: licenças não automáticas (LNA); medidas antidumping e antissubsídios; impostos de exportação; aplicação de "valores critério" (equivalente aos preços de referência) nas importações; rígido controle cambial na venda de divisas e nas transferências ao exterior; posicionamento defensivo nas negociações internacionais em geral, particularmente com relação aos entendimentos para a formalização do acordo Mercosul-União Europeia.

Algum tempo atrás, a Argentina pretendeu aplicar cláusula de salvaguarda no Mercosul, que, felizmente, não contou com o apoio dos demais sócios por infringir as regras do Tratado de Assunção.

Este é, apenas, um bom exemplo de como é difícil desenvolver, na prática, um modelo integracionista na região, porque os países, de um modo geral, são fundamentalmente autárquicos na forma de resolver seus problemas internos e continuam mais autônomos do que nunca em matéria de políticas econômicas e fiscais.

As políticas comerciais liberalizantes e disseminadas para alcançar objetivos mais amplos, praticadas há algum tempo por Chile, México, Peru e Colômbia negociando acordos de livre comércio com diversas nações do Leste asiático e com americanos, canadenses e europeus, são exemplos marcantes que expressam um evidente cansaço daqueles países com o excesso de discursos evasivos que caracterizam as reuniões de cúpula dos organismos mais responsáveis pela integração regional.

Tais ações, praticadas justamente por países latino-americanos desvinculados de compromissos compulsórios de aglutinação, ao contrário do que ocorre com os integrantes do Mercosul, por um lado podem significar o rompimento com o tão idolatrado preceito da "latinidade". Por outro, contudo, certamente revela a disposição de romper com determinados dogmas e pregações políticas inconsequentes que muitos dos citados organismos repetem a cada encontro inútil porque jamais se coadunam com a realidade e nada contribuem para o avanço dos respectivos processos de desenvolvimento econômico e político.

Esses movimentos isolados parecem invalidar a alcunha que certo ministro inglês ousou empregar para a região classificando-a como um "subcontinente desperdiçado".

Apenas o primeiro passo - JOSÉ MARIANO BELTRAME

O GLOBO - 26/12/11

“O senhor não acha que quatro presos e nenhum tiro disparado foi um resultado fraco para a retomada da Rocinha?”

A pergunta me foi feita por um repórter, poucas horas após a Operação Choque de Paz, que resultou na retomada da Rocinha, do Vidigal e da Chácara do Céu, três comunidades que durante décadas foram subjugadas pelo domínio dos fuzis dos traficantes. Na verdade, a operação compreendeu várias outras incursões em comunidades aliadas da facção que dominava a Rocinha, iniciadas no começo de novembro e que continuaram sendo realizadas depois da retomada das três comunidades.

Resultou, até agora, na prisão de 70 bandidos — incluindo o Nem e outros chefes de quadrilhas — e na apreensão de 263 armas de fogo, 122 granadas, 93 bombas artesanais e mais de 60 mil balas de diversos calibres, um verdadeiro arsenal de um pequeno exército. E representou, acima de tudo, a liberdade de ir e vir para cerca de 70 mil pessoas.

Por trás da frustração do repórter, talvez provocada pela falta de cenas “espetaculares” como as que foram transmitidas pela TV para o mundo inteiro na retomada do Complexo do Alemão, vejo uma falta de percepção, por parte da opinião pública, do verdadeiro papel das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs).

A função das UPPs — que estão longe de representar a solução definitiva para os problemas de segurança do Rio — me remete a outro momento não muito distante da história do Brasil, quando um grupo de professores de economia da PUC do Rio criou um mecanismo que viabilizou a passagem de um momento crítico, sem solução à vista, para um período longo de estabilidade econômica, que persiste até os dias de hoje. Essa história está muito bem contada no livro “Saga brasileira: a longa luta de um povo por sua moeda”, da jornalista Miriam Leitão.

Naquela época, início dos anos 90, o Brasil chegou a ter 80% de inflação em um único mês — um enorme contraste com a realidade atual, de um índice inflacionário de 7% ao ano. Vários planos econômicos haviam sido tentados e todos fracassaram. A população estava cada vez mais descrente da capacidade do governo de mudar alguma coisa. Os mais velhos lembram-se bem de como era viver com reajustes dos preços que deram ao Brasil o indesejável título de “campeão mundial da inflação”. Entre julho de 1964 e julho de 1994 (ano do Plano Real) acumulamos uma inflação medida pelo IGP-DI de fantásticos 1,3 quatrilhão%. Quando contamos isso para os mais jovens, ouvimos a pergunta: “Como isso era possível?”

Em seu livro, Miriam Leitão relata a “mágica” do Plano Real: a Unidade Real de Valor (URV), que abriu o caminho para a estabilidade. “A URV tinha apenas uma das funções da moeda, era unidade de conta, mas não existia fisicamente. Não era uma nova moeda. Era uma véspera de moeda.” Foi uma solução de resultado rápido? Não, mas acabou sendo o caminho seguro para extinguir, a médio e longo prazos, a indexação de preços e salários, principal combustível da hiperinflação. Mesmo com a genialidade financeira da equipe de economistas criadores da URV, o país ainda precisou de uma geração inteira para domar o mal inflacionário.

A saga do combate ao “dragão da inflação” guarda uma importante similaridade com a luta do povo do Rio pela paz. Tal como a estabilização da economia brasileira, a pacificação é um processo que demandará anos para ser consolidado. Sempre que me perguntam se as UPPs vão livrar o Rio das drogas e da violência, respondo que não podemos brincar com esperança das pessoas ou agirmos como mercadores de ilusões. É preciso ter responsabilidade. As UPPs, por si, não são a solução definitiva. Mas abrem caminho para construirmos uma nova realidade duradoura.

Assim como a URV, as UPPs devem ser compreendidas como um mecanismo de transição do velho para o novo modelo de segurança pública e, em consequência, de uma nova realidade de desenvolvimento econômico e social da cidade do Rio de Janeiro.

No antigo modelo, o Estado não se fazia presente em áreas carentes e a polícia era violenta. Os traficantes, na luta por mais poder e lucros, introduziram as armas automáticas e criaram ilhas de violência, separadas da sociedade. Esse processo foi sintetizado pelo jornalista Zuenir Ventura em seu livro “Cidade partida”.

O novo modelo é simples: a retomada dessas áreas pelo Estado e sua reintegração à cidade. As UPPs são apenas a primeira fase desse processo, o direito de milhões de pessoas a dormir em paz. A pacificação não se resume às UPPs, mas começa com elas. Assim como na estabilização econômica a URV preparou o caminho para a chegada do Real, as UPPs são o instrumento de transição do jugo da violência para o regime de cidadania, onde o Estado está de volta com serviços essenciais como saúde, educação, água, saneamento, coleta de lixo e iluminação pública.

Com a chegada da Polícia Pacificadora, com homens e mulheres treinados não apenas para enfrentar a violência — mas também, e principalmente, para conversar e negociar com a comunidade —, o poder público agora encontra as portas dessas comunidades abertas para receber serviços que demandam há décadas.

Sonho com o dia em que meu neto, incrédulo, perguntará: “Vovô, como era possível que os morros do Rio fossem dominados por bandidos, que não deixavam a polícia entrar?” Esse dia há de chegar!

GOSTOSA


Saudades de Deus - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 26/12/11

Ateísmo como conquista da razão é uma ideia risível


Tem coisa mais monótona do que discutir sobre a existência ou não de Deus? Ninguém crê em Deus "por razões lógicas". Isso é papo furado.
Ninguém "decide" ter fé.
Tentar provar que Deus existe porque ele seria "uma necessidade da razão" me parece um engodo.
Primeiro porque a razão é risível em suas necessidades, como diria o cético Michel de Montaigne (século 16). A pergunta pela origem de tudo que existe (como numa espécie de aristotelismo aguado) não prova nada. Temos inúmeras necessidades que não são autoevidentes -por exemplo, que o bem deva vencer ao final das coisas.
Muitas vezes o mal vence e pronto. Quase sempre. Por outro lado, é interessante se pensar de onde veio a matéria que explodiu um dia e o lugar onde ela explodiu.
Mas isso nada prova acerca do Deus ocidental. O princípio pode ser uma mecânica estúpida.
Aliás, o chamado "argument from evil" (argumento a partir do mal) do ateísmo é famoso. Autores grandes como Dostoiévski e Kafka, entre outros, já o frequentaram de forma brilhante.
O argumento basicamente é o seguinte: se Deus é bom, por que o mundo é mau? Alguns já chegaram a supor que Deus seria mesmo mau, como o próprio Kafka.
Duas questões são importantes apontar nesse debate, uma com relação aos crentes, outra aos ateus.
Primeiro os crentes. Uma falácia comum por parte dos crentes é supor que seria impossível você ser uma pessoa razoavelmente moral sem alguma forma de religião. A história prova que ateus e crentes dividem o mesmo lote de miséria moral. Pouco importa ser ou não crente.
Pessoalmente, acho que o acaso decide: o temperamento (o acaso de você ter nascido "assim ou assado") é quase sempre o juiz do comportamento humano e não "valores" religiosos ou éticos seculares (não religiosos).
Portanto, a tentativa de afirmar que, se você é ateu você necessariamente não é "bom", é pura falácia. Tampouco penso que uma religião faça falta para todas as pessoas. Muita gente vive sem crise sem acreditar em coisa nenhuma "do outro mundo". Isso não significa que ela seja sempre feliz (tampouco os religiosos o são), a (in)felicidade depende de inúmeros fatores.
E mais: "crer ou não crer" não é algo que você escolhe, "acontece". Grandes teólogos como Santo Agostinho, Lutero e Calvino diziam que a "fé é uma graça" (simplificando a coisa), alguns receberam o dom e outros não (portanto, ela "acontece", como eu dizia acima, não é você quem escolhe ter ou não). Acho essa ideia bem mais elegante do que esse papo furado acerca das necessidades racionais, sociais, morais ou psíquicas da crença.
Quanto aos ateus, acho risível a ideia de que o ateísmo seja uma "conquista" da razão ou de alguma forma de rigor moral ou "coragem cosmológica".
Nada disso, como já disse antes, e repito, até golfinhos conseguem ser ateus em sua maravilhosa vida aquática. Fiquei ateu quando tinha oito anos.
O ateísmo me parece, entre todas as hipóteses sobre o universo, a mais fácil, simples, rápida e quase "fast food theory" (teoria fast food).
Não precisamos nos esforçar muito para perceber que podemos talvez um dia descobrir a causa
"natural" do universo, ou acabarmos como espécie antes de descobrir qualquer coisa. E "who cares" se sumirmos um dia?
E mais: é quase evidente que somos uma raça abandonada na face da Terra e a indiferença dos elementos naturais para conosco (sejam eles externos ou internos ao nosso corpo) salta aos olhos.
E mais: a possibilidade de estarmos sozinhos é sempre mais fácil do que acompanhados por um ser maravilhoso, dono do universo e que sabe cada fio do cabelo que você tem na cabeça.
Não há nenhuma evidencia definitiva de que Deus ou que qualquer outra entidade divina exista. O ônus da prova é de quem crê. Além do fato de que os japoneses, caras bem inteligentes, não creem em Jesus na maioria das vezes.
Acho Deus uma hipótese acerca da origem das coisas mais elegante do que a dos golfinhos. Mas, por outro lado, a ideia de que um dia o pó tomou consciência de si mesmo e constatou sua dolorosa solidão cósmica é bela como uma ópera.

EXECUÇÃO A CÉU ABERTO - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 26/12/11
O Estado de SP vai indenizar os pais de Dileone Aquino, morto por policiais militares em um cemitério de Ferraz de Vasconcelos. Sua execução foi relatada por telefone, no momento em que acontecia, por testemunha que estava no local e ligou para o 190. A pessoa chegou a ser intimidada pelos policiais enquanto fazia a denúncia.

VIVA VOZ
O caso virou escândalo porque a conversa da testemunha com o 190 foi gravada e divulgada pela imprensa.

Ela chegou a receber proteção oficial.

AÇÃO MILITAR
Os pais de Dileone receberão R$ 100 mil, pensão mensal de um terço de um salário mínimo e o que gastaram no funeral do jovem, que tinha 27 anos. O pedido de reparação foi feito pela Defensoria Pública. O relatório da Procuradoria-Geral do Estado, que concedeu a indenização, diz que "está claro" que o óbito "foi causado pela ação dos policiais militares".

ESTOQUE DE ENERGIA
Lula se internará no hospital Sírio-Libanês nas primeiras semanas de janeiro para o início da radioterapia.

Ele descansa nas festas de fim de ano e se prepara para a fase mais dura do tratamento contra o câncer.

CARA OU COROA
Paschoal Rodriguez

A top Marcelia Freesz, que estrela recente campanha da Givenchy, posou nua e com um terninho para o novo calendário da agência Way Model. A folhinha também traz fotos produzidas de outras modelos brasileiras como Alessandra Ambrósio e Carol Trentini.

É TUDO NO MEU NOME
A empresária Yara Rossi (ex-Baumgart) processou o Google para que a empresa lhe transferisse todas as contas do Gmail registradas com o mesmo nome que o dela. Dizendo-se "renomada" e "figura pública", alegou que elas poderiam ser usadas para "atos ilícitos" e exigiu acesso aos dados desses internautas. A Justiça negou o pedido e condenou-a a pagar custas e os honorários do advogado do Google, Eduardo Luiz Brock.

CALÇADA DA FAMA
Na sentença de primeira instância, o juiz Rodrigo Cesar Marinho declarou que Yara não apresentou provas de que utilize o nome como marca nem indícios de que suas xarás criaram os e-mails para atos ilícitos. Também não comprovou ser "figura pública nacionalmente conhecida". Rony Vainzof, advogado de Yara, diz que, a pedido dela, não pode comentar o caso.

ÓPERA SEM TELA
As transmissões ao vivo das óperas do Metropolitan de Nova York em cinemas brasileiros serão suspensas pelo menos até outubro de 2012. Só 18% das salas do país possuem os equipamentos necessários para a projeção digital dos espectáculos e, de agora até meados de março, elas deverão priorizar filmes em 3D e potenciais concorrentes do Oscar.

SÓ GRAVADO
Uma das óperas que deixará de ser exibida ao vivo nas telas é "Crepúsculo dos Deuses", de Richard Wagner, em fevereiro.

A Mobz, responsável pela transmissão, pretende reunir a apresentação gravada a outras três obras do compositor e fazer um festival no mês de maio.

ALMOÇO EXECUTIVO
Marcos Amaro, presidente do Instituto Brasis de Estudos e Ações, fez um almoço de final de ano para mantenedores como Marcelo Pastore e Lucas Aly, na sede do instituto, no centro de São Paulo.

BONS DRINKS

A festa Big Bang Party, de Rodrigo Pitta, aconteceu no fim da semana, no bar Dry. A atriz Paula Guimarães, o produtor Rodrigo Coelho e a diretora de arte Roberta Vaz circularam nos Jardins.

CURTO-CIRCUITO

A sambista Dona Duda se apresenta no dia 5 de janeiro no Diquinta, na Vila Leopoldina. Classificação etária: 18 anos.

A banda Mother Funkers faz show no dia 3 de janeiro no Rey Castro, na Vila Olímpia. Classificação etária: 18 anos.

A chef Bella Masano, do restaurante Amadeus, criou menu degustação com cinco etapas para o almoço do dia 1º de janeiro.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

Ciclos defasados - RUBENS RICUPERO


FOLHA DE SP - 26/12/11

Raras vezes o mundo conheceu fases tão dessincronizadas da política e da economia


O ciclo político de terrorismo e guerras, desencadeado pelos ataques de 2001, toca o fim ao mesmo tempo em que o da crise econômica, iniciado em 2007, dissipa as ilusões de um próximo retorno à prosperidade. Raras vezes o mundo conheceu fases tão dessincronizadas da política e da economia, sem que uma contagiasse a outra.

Contágio significa aqui coisa diversa de influência. Os gastos militares americanos aprofundaram sem dúvida o deficit e enfraqueceram a economia dos Estados Unidos. Do mesmo modo, a crise financeira pesou na decisão de reverter a tendência à constante militarização da diplomacia americana.

O que não se observou até agora foi coincidência ou relação de causa e efeito, como nos anos 1930, de depressão econômica com alastramento de regimes e partidos totalitários do tipo do nazifascismo e do stalinismo. Talvez não tenha havido tempo para que a deterioração das condições de vida envenene a atmosfera política. Ou, quem sabe, o desemprego e o empobrecimento tenham sido desta vez atenuados pela legislação de bem-estar.

O fato é que o mundo parece um pouco melhor neste fim de ano. Salvo na África, o terrorismo recua em toda a parte. Há muito tempo a Al Qaeda não consegue repetir atentados espetaculares, seu chefe foi morto, os dirigentes são dizimados por aviões não pilotados. O basco ETA, último reduto terrorista no Ocidente, foi obrigado a reconhecer a derrota. Até o Hamas na faixa de Gaza anunciou que mudará a tática de resistência armada para popular.

Ante o desmantelamento da ameaça do terror, nem a sectária paralisação da política americana foi capaz de impedir que o presidente retirasse as tropas do Iraque e se preparasse para fazer outro tanto no Afeganistão. Aos poucos os EUA recuperam a capacidade de iniciativa.

Desponta o ano com o Oriente Médio livre de ditadores no Egito, na Tunísia, no Iêmen, na Líbia, talvez em breve na Síria, e reformas mais ou menos sinceras em quase todos os demais. Ações populares em favor de mais democracia principiam a aparecer na Rússia e na China. Cada vez sobra menos espaço para autocracias e violações de direitos humanos encobertas por anistias ou recusa de entrega dos culpados aos tribunais da ONU.

O Oscar de diplomacia mais inteligente na América Latina vai para o presidente da Colômbia, que se reconciliou com a Venezuela e o Equador, dissipando o mais sério foco de tensão regional. No mundo, o prêmio de diplomacia inovadora cabe à Turquia, que aceitou o risco de apostar na Primavera Árabe, em contraste com os Brics tucanamente pousados no muro da indecisão.

Até na mais improvável das causas, a ambiental, registrou-se algum progresso na Conferência de Durban. Apesar da crise econômica, megapoluidores como a China e o Brasil concederam afinal que terão de dar alguma contribuição para salvarem a si próprios, juntamente com o planeta.

Se não se foi mais longe nesse e outros foros, culpe-se a falta de liderança. Não há mais hegemonia dos EUA, mas o vácuo não foi ocupado por um multipolarismo responsável.

Ah! Estava esquecendo neste balanço de Papai Noel: a Itália e o mundo se livraram de Silvio Berlusconi. Esperemos que para sempre!

PEQUENA GLOBAL - MARIA CRISTINA FRIAS


FOLHA DE SP - 26/12/11



A Estáter, uma butique de investimentos responsável por notórias fusões e aquisições de empresas, acaba de abrir um escritório em Londres e já pensa em ter outra unidade em Nova York, até o final de 2012.

"Desde a década de 90, pensamos em algo mais global. Pessoas são fundamentais e agora temos quem procurávamos para o comando na Europa", diz o sócio Pércio de Souza.

"Somos uma empresa pequena voltada para grandes negócios. Fechamos de quatro a seis operações por ano", segundo Souza, que, com três sócios, comanda uma equipe de 33 pessoas.

"Vamos atrás dos negócios, não eles vêm atrás de nós." Como nos casos da Ipiranga e do Pão de Açúcar, lembra. À rede de supermercados Souza deu também uma consultoria na tentativa de negócio com Carrefour.

"Estudamos características societárias, o momento da empresa e do setor no mundo", afirma. Até que o negócio seja fechado, a Estáter recebe "para ter o mandato só um fixo de R$ 200 mil, que é doado para nossos projetos sociais".

Grupo português investirá R$ 600 mi em cinco hotéis em SP, MG, RJ e PE

O grupo português Enotel investirá cerca de R$ 600 milhões no Brasil nos próximos quatro anos.

O projeto da empresa é ter quatro hotéis no país até 2015, além de ampliar o resort que possui há cinco anos em Porto de Galinhas (PE).

Cerca de 15% do aporte virá da empresa. O restante, de empréstimos bancários.

Apenas o resort receberá cerca de R$ 340 milhões, em duas etapas.

Na primeira etapa, que necessitará de aproximadamente R$ 200 milhões, serão construídos 406 apartamentos, centro de convenções e parque aquático. As obras devem ser concluídas até outubro de 2013.

Na segunda fase, serão mais 256 apartamentos. A previsão é que fiquem prontos em junho de 2014, para a Copa do Mundo.

Os outros hotéis da empresa devem ser instalados em São Paulo, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Em Recife, o grupo deve entrar com uma parceria para fazer a gestão do estabelecimento.

O Enotel tem outros quatro hotéis na Ilha da Madeira, em Portugal, onde o faturamento da empresa caiu cerca de 30% de 2008 para 2010.

No Brasil, deve haver incremento de 23% neste ano, na comparação com 2010.

"Estamos sempre focando os dois países. Não podemos abandonar o continente europeu, mas agora olhamos mais para o Brasil porque o mercado está muito melhor", afirma o presidente do grupo, Estevão Neves.

NAVEGAÇÃO

A Petrobras articula a criação de um centro de excelência em engenharia naval.

O objetivo da iniciativa é dar suporte tecnológico a estaleiros brasileiros e auxiliar a indústria nacional a se tornar mais competitiva.

O diretor de Serviços da Petrobras, Renato Duque, participou, na semana passada, de reunião sobre o assunto com a Coppe-UFRJ. Além da instituição carioca, a empresa quer fazer parcerias com a USP e o Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis para concretizar a ideia.

CESTAS
PRESENTE CORPORATIVO

Mais da metade das cestas de Natal costumam ser compradas por empresas, segundo lojas do setor.

No Empório Santa Maria, cerca de 60% das mais de 20 mil unidades foram vendidas para pessoas jurídicas.

"São, em boa parte, prestadores de serviço, como advogados e agências de publicidade, que enviam esse presente até como uma forma de manter o cliente nos anos seguintes", afirma André Scartozzoni, gerente da loja.

CLIMA INGLÊS

A confiança do consumidor inglês caiu dois pontos neste mês e atingiu um dos níveis mais baixos da história, segundo a empresa GfK.

O indicador (que varia de -100 a +100) marcou -33. Nos últimos 37 anos, apenas em outras duas ocasiões o índice foi mais baixo.

Segundo a GfK, o Natal não ajudou a elevar o ânimo do consumidor e não há motivos para que o índice melhore.

Foram ouvidas 2.001 pessoas. A margem de erro da pesquisa é de -/+2%.

Cortina de fumaça - EDITORIAL O GLOBO


O GLOBO - 26/12/11
Não há registro de regime democrático em que o financiamento de partidos, políticos e campanhas deixe de gerar crises. Não faltam denúncias de caixa dois, dinheiro de origem obscura. Dinheiro e política, misturados, costumam gerar problemas.

Há exemplos célebres. De Jacques Chirac, ex-presidente francês, denunciado por corrupção e condenado há poucos dias, ao chanceler alemão Helmut Kohl, obrigado a encerrar a carreira política por ter recebido recursos "não contabilizados", apesar de ostentar biografia de estadista por ser o responsável pela histórica reunificação alemã.

Na política americana, a lista é grande. Nela inclui-se Spiro Agnew, o único vice-presidente da história americana - de Nixon - obrigado a renunciar por receber dinheiro "por fora".

O Brasil não poderia escapar à regra. Tem-se a impressão que o caixa dois virou norma, enquanto o financiamento legal teria ficado em segundo plano. A grande maioria dos escândalos verificados logo no primeiro ano do governo Dilma, por exemplo, tem origem na manipulação de orçamentos de ministérios a fim de desviar recursos públicos para projetos político-partidários. Também não se pode descartar o desfrute pessoal da dinheirama que se esvaiu do Tesouro.

Foi assim no balcão de negociatas montado pelo PR de Valdemar Costa Neto (SP) e Alfredo Nascimento (AM) no Ministério dos Transportes; no Turismo de Pedro Novais (PMDB-MA); nas ONGs camaradas do PCdoB de Orlando Silva no Ministério do Esporte, bem como em esquema semelhante montado por Carlos Lupi (PDT-RJ) no Trabalho. O PMDB também está representado na lista de "malfeitos" por Wagner Rossi (SP), quando ele passou pelo Ministério da Agricultura. Ao se contabilizar os diversos desvios - para esquemas políticos subterrâneos ou não -, sob investigação pelos diversos órgãos públicos, a cifra chega aos bilhões.

Diante deste quadro desanimador, há quem proponha a falsa solução da estatização total dos gastos nas campanhas eleitorais. Num passe de mágica, todo o dinheiro aplicado nas eleições passaria a sair do "caixa um". Grande ilusão. A tecnologia de lavagem de dinheiro sujo na política brasileira chegou a tal estágio de aperfeiçoamento que não se pode garantir que o financiamento público de campanha desaparecerá com o caixa dois.

O contribuinte brasileiro já arca com um pedaço da conta dos gastos de partidos e políticos, em campanha ou não. Não esquecer que o fundo partidário sai do Tesouro, abastecido pelos impostos. O mesmo para o custo da "propaganda gratuita", que, apesar do nome, é paga por meio de abatimento de impostos recolhidos pelas emissoras. A propaganda é "gratuita" só no nome, e para os políticos.

Caso um dia seja aprovado o financiamento de gastos eleitorais pelo contribuinte, ele correrá 100% de risco de pagar três vezes: a primeira, nas despesas pelas quais já é responsável; a segunda, pelo "financiamento público"; e a terceira no sobrepreço embutido na venda de bens e serviços ao Estado pelos colaboradores do caixa dois, quase sempre fornecedores de governos que, dessa forma, recuperam a "colaboração" dada ao(s) político(s) preferido(s).

Estatizar todas as finanças da política apenas funcionará como cortina de fumaça para o dinheiro "não contabilizado", e para sobrecarregar ainda mais o contribuinte. O caminho correto é o de mais transparência nas doações, mais fiscalizações e maiores penas para os infratores.

Ruim com a OMC, muito pior sem ela - MARCELO DE PAIVA ABREU


O Estado de S. Paulo - 26/12/11


A última reunião ministerial da Organização Mundial do Comércio (OMC) em Genebra foi um bom retrato da maior crise institucional enfrentada pelo sistema multilateral de comércio no período pós 2.ª Guerra Mundial. As crises do Gatt, centradas em tratamento especial e diferenciado para os países em desenvolvimento, no unilateralismo dos EUA e na erosão do princípio da não discriminação, parecem menores, quando comparadas à crise atual.

A conferência marcou o funeral da Rodada Doha. As celebrações da admissão da Rússia depois de longas negociações e da ampliação do acordo plurilateral sobre compras públicas - do qual o Brasil não é signatário - não dissiparam a constatação de fracasso depois de uma década de negociações.

Os países desenvolvidos ventilaram proposta de congelamento dos atuais níveis de proteção por todos os membros da OMC. O impacto da adoção de tal medida seria assimétrico, atingindo desfavoravelmente os países em desenvolvimento. A Rodada Uruguai gerou listas de concessões tarifárias consolidadas em listas nacionais. As tarifas praticadas pelos países desenvolvidos são as tarifas consolidadas, enquanto as tarifas dos países em desenvolvimento são frequentemente muito inferiores aos níveis consolidados. Tratava-se de típica proposta de troca de algo por nada: os países desenvolvidos manteriam seus níveis tarifários e os países em desenvolvimento estariam impedidos de aumentar as suas tarifas até os níveis consolidados.

Rechaçada esta proposta de standstill, os membros desenvolvidos da OMC persistiram com sondagens irrealistas. Na esteira da ampliação do acordo sobre compras públicas, esboçaram a retomada de interesse na generalização de acordos plurilaterais, em detrimento de acordos multilaterais. Nos acordos plurilaterais, concessões recíprocas estão limitadas aos signatários e não são estendidas automaticamente a todos os membros da organização. Trata-se de exceção frontal ao princípio da não discriminação.

Os países desenvolvidos também manifestaram interesse na "colheita precoce" de resultados selecionados. As negociações multilaterais mais recentes têm sido baseadas no princípio de compromisso único - single undertaking - envolvendo todos os elementos postos na mesa de negociações. Dada a disparidade do poder de barganha de diferentes lobbies e de diferentes países, a consequência da estratégia de colheita precoce é a acumulação de um backlog, uma lista de temas difíceis não resolvidos, tal como foi o caso da agricultura antes da Rodada Uruguai.

O que dizer do Brasil em Genebra? Até que tivemos a preocupação de enviar ministros, em contraste com muitos países que não se dignaram a tanto. O destaque da atuação ministerial brasileira foi negativo, com a melancólica participação do ministro Pimentel limitada a uma inócua reunião com a ministra sueca e seu retorno apressado, em meio a controvérsias sobre preço, qualidade e mesmo ocorrência de consultorias milionárias.

O Brasil foi criticado como caso extremo de país que tenta "empobrecer os seus parceiros", retomando medidas protecionistas que mostraram ser perniciosas no passado, em vez de contrabalançar a apreciação cambial com ajustes na política fiscal e com incentivos ao aumento de produtividade e redução de custos.

A ênfase no protecionismo como resposta à "ameaça das importações" enfrenta obstáculos institucionais. O primeiro é que são os setores caracterizados por lobbies mais ativos os que são beneficiados por níveis tarifários mais elevados. O setor automotivo é protegido no Brasil pela tarifa máxima de 35%, consolidada na OMC. Para elevar essa tarifa, seria necessário negociar compensações com todos os nossos parceiros comerciais. O caminho encontrado pelo governo - de legalidade mais do que duvidosa de acordo com as regras da OMC - foi a discriminação de tratamento tributário baseada em índices mínimos de nacionalização de componentes. Trata-se de lamentável reversão a políticas que já se mostraram inadequadas no passado. O outro obstáculo enfrentado pelos lobbies protecionistas é a Tarifa Externa Comum (TEC) do Mercosul, cujos níveis tarifários são em geral inferiores aos 35% consolidados na OMC. Mas essa limitação foi "flexibilizada" com o aumento da lista de exceções à TEC aprovado em recente cúpula do Mercosul.

Não se ouviu falar de discussão, em Genebra, da delirante proposta brasileira de que o impacto de flutuações cambiais sobre o comércio seja discutido na OMC. O vetusto artigo XV do Gatt, que trata de taxas cambiais, não dá margem à interpretação de que o assunto possa ser tratado independentemente do Fundo Monetário Internacional (FMI). É preciso fechar o laborioso Departamento de Ideias Estapafúrdias (DIE) aberto em Brasília. Será que o governo vai propor que, por simetria, a Rodada Doha seja discutida no âmbito do FMI?

A preservação da credibilidade da OMC como foro para tratar das pendências relativas ao sistema multilateral de comércio é de interesse especial de países com poder de barganha limitado, como é o caso do Brasil. Tendo construído sólida reputação em Genebra, é lamentável que esse cabedal esteja sendo erodido pela combinação de iniciativas irrealistas com regressão ao protecionismo.

Vespeiro penal - RENATA LO PRETE

FOLHA DE SP - 26/12/11
Presidida pelo ministro Gilson Dipp, do STJ, a comissão que apresentará ao Senado uma proposta de reforma do Código Penal vai sugerir, entre outras mudanças, abertura na legislação sobre o aborto, para ampliar o leque de situações em que a interrupção da gravidez é permitida. Deve propor, ainda, descriminalizar a ortoeutanásia, na qual o médico deixa de realizar procedimentos penosos em doentes sem chance de cura.

O grupo também quer regular questões para as quais não existe lei específica, como crimes cibernéticos, tráfico de pessoas e terrorismo. "Não teremos nenhum tabu. Vamos enfrentar todos os temas", afirma Dipp.

Tempo do onça 
A comissão planeja entregar o trabalho ao presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), até o final de maio. O atual Código Penal é de 1940.

Gaveta cheia 
Dilma Rousseff embarcou para descanso de fim de ano na Bahia deixando em seu gabinete mais de 30 listas tríplices de nomeações para a Justiça pendentes, segundo entidades da área. Entre os papagaios, o mais polêmico é a vaga de ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Supertrunfo 
Cabo eleitoral da cunhada, Suzana Camargo, para a vaga no STJ, o presidente da corte, Ari Pargendler, tem dito em Brasília que selou compromisso com Lula de que a desembargadora do TRF da 3ª Região seria a escolhida por Dilma.

Divergente 
Quando o plenário do Supremo Tribunal Federal julgar o mérito da ação que tenta rever atribuições do CNJ, o ministro Dias Toffoli vai defender a "competência concorrente" do órgão -e não apenas "subsidiária" à das corregedorias - para fazer investigações.

Professor Pardal 
Um dos programas que fizeram Dilma se encantar pela gestão de Aloizio Mercadante foi o Ciência sem Fronteiras, sempre citado de forma elogiosa pela presidente.

Em frente 
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), disse a aliados que não vai recuar na decisão de reajustar a verba de gabinete. Diz que os cargos de confiança estão sem aumento de salário há quatro anos, e que, restrito a esse universo, o impacto será pequeno.

Casas separadas 
Com ou sem aliança com o PSD, os tucanos da capital deixarão de ser vizinhos do partido de Gilberto Kassab. Hoje ocupando sala no edifício Joelma, onde funciona a sigla do prefeito, o PSDB paulistano está à procura de imóvel para a campanha de 2012.

Bunker virtual 
É no Joelma que está a Fundação Espaço Democrático, do PSD. A entidade, pilotada pelo vice-governador e pré-candidato à prefeitura, Guilherme Afif, monta um "núcleo de conectividade" sob a coordenadação de Alecsandr Mandic, pioneiro da internet no país.

Cursinho 
A deputada Manuela D'Ávila (PC do B), pré-candidata a prefeita de Porto Alegre (RS), tem tomado aulas semanais com técnicos de várias áreas sobre os problemas da cidade. O esforço foi apelidado entre assessores de "MBA da Manu".

Inanição 1 
O sonho de verão do DEM de selar alianças com o PMDB -e, se possível, com o PSDB- em várias capitais enfrenta problemas não só em São Paulo.

Inanição 2 
Em Salvador, o deputado ACM Neto dá sinais de que não pretende encarar uma campanha quixotesca contra a máquina do governo do Estado. Em Recife, Sérgio Guerra não cogita apoiar candidato do DEM.

com LETÍCIA SANDER e FÁBIO ZAMBELI

tiroteio

"Discutir 2014 agora é uma grande bobagem e um desrepeito com o eleitor. O que nossos pré-pré-candidatos deveriam fazer agora é apoiar as prévias e o vencedor delas."

DO TESOUREIRO DO PSDB MUNICIPAL, FÁBIO LEPIQUE, sobre os pré-candidatos a presidente pelo PSDB José Serra e Aécio Neves articularem alianças para a sucessão municipal de olho na disputa presidencial.

contraponto
Famoso quem?

Após as vaias que recebeu das claques de Bruno Covas e Marta Suplicy no Natal dos catadores, em São Paulo, na última semana, o pré-candidato a prefeito Fernando Haddad aproveitou o fim do evento para circular entre os militantes. Uma catadora se dirigiu a ele, interessada:

-O sr. é o Jorge, do Banco do Brasil?

Diante da negativa, ela saiu, sem puxar mais conversa.

Imediatamente depois, um outro militante o abordou:

-O sr. é o governador de São Paulo?

Haddad negou, e o interlocutor saiu, decepcionado.

Democracia relativizada - EDITORIAL O ESTADO DE MINAS


O ESTADO DE MINAS - 26/12/11

 Imprensa argentina vive sob perigosa perseguição do governo

Menos de duas semanas depois de assumir um segundo mandato consecutivo na Casa Rosada, a presidente da Argentina revela-se mais do que disposta a condicionar a liberdade de imprensa no país. Depois de suceder ao marido, Néstor Kirchner, e ser reeleita com 54% dos votos, Cristina Fernández de Kirchner finalmente obteve do Congresso, onde fez maioria nas duas Casas, a aprovação de lei que garante ao governo o controle da produção e da comercialização de papel-jornal. Detentora de poder extraordinário, com o domínio do Executivo e do Legislativo, além de influência potencial sobre o Judiciário, é forte o risco de que ela agora leve às últimas consequências a perseguição implacável que faz aos órgãos de comunicação independentes que lhe negam apoio irrestrito.
O histórico do casal K recomenda alerta total aos democratas. Embora a postura firme no combate a resquícios da ditadura que perseguiu e assassinou cidadãos entre 1976 e 1983, com a responsabilização criminal dos responsáveis, é cada vez mais evidente, no país, a ameaça à liberdade de expressão. As tentativas do Estado de intervir no mercado de papel-jornal vêm desde 2009. Mas há mais de uma década — portanto, desde o governo Néstor Kirchner —, sobretudo o Grupo Clarín, principal conglomerado de comunicação do país, sofre perseguição implacável. Entre outras investidas, o órgão teve proibidas várias publicações dominicais, passou por rigoroso cerco da fiscalização fazendária e se tornou alvo do populismo, que se esmera em desacreditá-lo.
Sob o pretexto de investigar denúncia de uma concorrente (a operadora de tevê a cabo Supercanal), a Cablevisión, de propriedade do Grupo Clarín, foi invadida por 50 policiais armados na última terça-feira. A alegação era de que o veículo não alinhado à Casa Rosada havia violado a Lei de Defesa da Competição ao adquirir a Multicanal, em 2008. Numa ação que durou mais de três horas, a emissora teve documentos apreendidos e um interventor nomeado. Em abril, uma greve de gráficos impediu a distribuição do Clarín e o governo descumpriu ordem judicial para suspender o bloqueio. À época, a Sociedade Interamericana de Imprensa (SIP) já acusava a existência de "uma estratégia oficial de controle da informação".
Não resta dúvida quanto ao acerto da denúncia da entidade de defesa da liberdade de expressão e de imprensa no continente. Menos ainda depois dos acontecimentos da semana passada. Soma-se a eles a aprovação de outra lei com potencial para cercear a mídia independente: a antiterrorismo, convenientemente ampla para ser usada contra jornais, TVs e rádios, a depender da interpretação que se possa dar ao noticiário que produzam. Ora, o respeito à democracia é uma exigência aos países-membros do Mercosul. Sem plena liberdade de imprensa não há que se falar em democracia.

GOSTOSA


Amadorismo, não - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 26/12/11

Onde vige o regime presidencialista de governo, o presidente da República pode muito. Mas embora possa, nem mesmo o presidente dos Estados Unidos, por exemplo, pode tudo. Esbarra em um Congresso ciente de sua força e em uma sociedade um pouco mais amadurecida. Entre nós, não. O presidente só não pode desrespeitar as leis. O resto, ele pode.

Dilma dá por findo seu primeiro ano de governo sem parecer ter entendido que renunciar a impor a sua vontade é também um meio de exercer o poder. E, com frequência, um meio inteligente e admirável, capaz de evitar desgastes e de consolidar apoios.

Seis ministros
 pediram as contas em sete meses, chamuscados por suspeitas de toda ordem. Recentemente, Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, sugeriu a Dilma que o mais sensato a fazer seria ir embora. Não tem como justificar sua experiência como consultor de empresas.

Foram R$ 2 milhões
 embolsados em dois anos, via quatro contratos — três deles feitos de boca. O maior, assinado com a Federação das Indústrias de Minas, exigiu palestras em dez unidades regionais da Federação. Pois bem: O GLOBO bateu à porta das dez unidades.

Em nove delas,
 ninguém ouviu falar da passagem por ali de Pimentel na condição de palestrante. Provocado a respeito, o atual presidente da Federação suplicou: “Por favor, me deem um tempo para pensar. O assunto é muito delicado”. Pensa há mais de 15 dias. Delicado? Como assim?

Pimentel foi
 companheiro de Dilma na luta armada contra a ditadura militar de 1964. É o único ministro com autoridade para dizer, se quiser, que ama Dilma. E para supor que, por ela, é amado. Foi um dos coordenadores de sua campanha.

Por acaso, Dilma
 não se deu conta da encrenca em que Pimentel se meteu? Desconhece que doravante, por mais que cale ou fuja, ele será perseguido pela história do consultor bem pago e dispensado de dar consultoria?A imprensa não o deixará em paz. A oposição também não.

Por que Dilma
 mantém Pimentel no governo? Porque gosta dele? Não é suficiente. Porque não gosta quando a imprensa lhe cobra qualquer coisa? Também não é suficiente — e chega a ser tolo. Porque faz questão de mostrar que manda tanto a ponto de desafiar a lógica? Pois é. Pode ser.

Na verdade,
 Dilma está sendo vítima da doença infantil do amadorismo.

Faça sua escolha 
Quem você apontaria como o autor da declaração mais insólita de 2011? Carlos Lupi, ex-ministro do Trabalho, que para garantir o emprego, proclamou: “Dilma, eu te amo”? Dilma, que para defender o ministro Fernando Pimentel, enrascado com consultorias suspeitas, decretou: “É um problema pessoal dele”? Ou o senador cassado Luiz Estevão, que justificou assim o fato de dirigir, sem carteira de habilitação, uma Ferrari desprovida de placa e carente de documentos: “Eu vim fazer ginástica. Não tinha nem bolso. Então, nem trouxe carteira de motorista”?

Ex-companheiros
Em meio à eleição do ano passado, quando o sigilo fiscal de Verônica Serra foi quebrado por encomenda do jornalista Amaury Ribeiro, o problema a separar José Serra de Aécio Neves deixou de ser político e passou a ser pessoal. Serra concluiu que Amaury estava, de fato, a serviço de Aécio. Em seu livro “A privataria tucana”, Amaury confessa que espionou o esquema de espionagem de Serra a pedido de Aécio. Serra acalenta o sonho de ser de novo candidato a presidente. Se não der, tudo fará para que Aécio, uma vez candidato, não se eleja. O PT agradece.

Mudança demográfica e educação no Brasil - JORGE ARBACHE

FOLHA DE SP - 26/12/11

A educação deve ser prioridade para as políticas públicas, mas a alocação de recursos para a área deve ser compatível com a realidade demográfica do país



O Brasil encontra-se num momento especialmente favorável para promover um grande salto na qualidade da educação e aumentar a abrangência dos programas educacionais. Isso porque o crescimento econômico e o bônus demográfico permitem maior alocação de recursos para a educação.

A queda da população de crianças e jovens em razão da transformação demográfica facilitará ainda mais a tarefa de melhorar a educação. De fato, em 2010, havia 47,1 milhões de pessoas em idade escolar, mas, em 2020, haverá 41,5 milhões, uma redução de 5,6 milhões.

Apenas entre 2009 e 2011 houve uma queda de 1,8 milhão de matrículas na rede pública de ensino fundamental, o que decorreu, em parte, da mudança demográfica.

Se os mesmos 5,08% do PIB continuarem sendo destinados para a educação pública e se a economia continuar crescendo no mesmo ritmo dos últimos oito anos, será possível elevar os investimentos por aluno em 45% entre 2010 e 2020, já descontada a inflação.

Juntas, a economia e a demografia farão os investimentos públicos em educação por aluno saltarem de 20% para 25% do PIB per capita no mesmo período, taxa elevada para os padrões internacionais.

Embora os investimentos públicos em educação por aluno já estejam crescendo, o Brasil precisa aproveitar as condições econômicas e demográficas favoráveis para fortalecer ainda mais o orçamento da educação nos próximos anos, com vistas a diminuir o hiato que separa a educação pública daquela necessária para fomentar o crescimento econômico e alavancar a competitividade internacional da nossa economia.

Com o objetivo de superar esse hiato educacional, tem-se argumentado, no âmbito do Plano Nacional da Educação, ora em discussão no Congresso Nacional, em favor da destinação de 8% ou até de 10% do PIB para a educação.

A fixação de uma parcela do PIB para o financiamento da educação pode não ser o caminho mais adequado num contexto de rápida transformação demográfica e crescimento econômico, já que, de um lado, a população em idade escolar continuará caindo e, de outro lado, os investimentos por aluno continuarão crescendo.

Outro aspecto a se considerar é que a destinação de um percentual elevado do PIB para a educação tende a conflitar com as necessidades fiscais futuras decorrentes do contínuo aumento da população de idosos, que vai requerer crescente alocação de recursos para a saúde pública, aposentadorias e pensões - já em 2026, a população em idade escolar, na faixa etária de 4 a 17 anos, será ultrapassada pela população acima de 60 anos.

Uma alternativa a ser considerada é definir o orçamento público para a educação de acordo com os recursos necessários para atingir metas educacionais, política essa que teria que vir acompanhada do aperfeiçoamento da gestão do sistema educacional.

Num primeiro momento, será preciso elevar significativamente a parcela do PIB destinada para a educação, mas, numa fase seguinte, quando as metas forem sendo alcançadas, o orçamento da educação poderá se estabilizar e até diminuir, como ocorreu décadas atrás nos tigres asiáticos, quando promoveram grandes avanços na educação.

A educação deve ser prioridade de política pública, mas a alocação de recursos para a área deve ser compatível com a realidade demográfica do país. Do contrário, poder-se-á criar compromissos e pressões fiscais futuras com efeitos deletérios para o crescimento econômico sustentável.