segunda-feira, dezembro 26, 2011
O mar numa piscina - RUY CASTRO
FOLHA DE SP - 26/12/11
RIO DE JANEIRO - João Gilberto tem saído com frequência nas folhas nesse fim de ano, pelos shows que acertou com empresários e não cumpriu, alegando questões de saúde. Questões que, devido ao seu histórico, foram recebidas com chacota, embora, no caso atual, o fiasco possa ter sido causado pela inexperiência de pessoas à sua volta.
Com isso, a grande notícia envolvendo o artista passou despercebida na semana passada: sua vitória no longo processo contra a gravadora EMI, por esta ter remasterizado e embalado indevidamente seus três primeiros LPs ("Chega de Saudade", 1959, "O Amor, o Sorriso e a Flor", 1960, e "João Gilberto", 1961, além de um 45 rpm, "Orfeu do Carnaval", 1959), espremendo 38 faixas num LP duplo ("O Mito") e num CD simples ("The Legendary João Gilberto"), em 1990.
Para realizar a proeza de despejar o mar numa piscina, a EMI alterou a ordem das faixas, fundiu umas e encurtou outras. Além disso, ao remasterizá-las, teria interferido na sonoridade dos instrumentos e alterado as frequências das gravações originais. Tais modificações podem ser imperceptíveis ao ouvido humano, mas o ouvido de João Gilberto não é humano. É sobre-humano. E o parecer do músico Paulo Jobim, filho do cocriador dos discos -Tom Jobim-, a favor de João Gilberto, encerrou o assunto.
João Gilberto tem direito a um xis sobre os exemplares vendidos naqueles formatos espúrios. E quanto não teria sobre os discos que deixaram de ser vendidos nesses 20 anos em que, por causa do processo que se viu obrigado a mover, eles não puderam ser legalmente prensados?
Mais importante: significa que, agora, os discos voltarão gloriosamente às lojas, como eram ao nascer e com as sonoridades certas? E quem vai ressarcir a cultura brasileira pelos 20 anos que ela teve de passar sem eles?
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