segunda-feira, março 21, 2016

Ponham barbas e batons de molho - LUIZ FELIPE PONDÉ

FOLHA DE SP - 21/03

Hoje quero pensar, com você, em duas questões relacionadas ao tema da corrupção da política no Brasil. Uma primeira, fruto de uma pergunta que ouço muitas vezes das pessoas, e uma outra, sobre a aposta do PT que Lulinha resolverá o problema do governo salvando todo o sistema político corrupto brasileiro, aniquilando a Lava Jato com a discreta aceitação de grande parte dos setores da oposição e do alto clero jurídico do país. Vamos por partes.

Vamos à primeira questão. Muitos se perguntam a razão da maioria esmagadora dos intelectuais, artistas e estudantes de humanas ser tão caninamente a favor do PT. Na semana passada, nesta coluna, me referi à seita da jararaca (o PT) como uma religião. Hoje, vamos olhar de outra forma esse fenômeno que é espantoso para muita gente, mas que, na realidade, pode até ser visto de forma filosófica.

Caros, prestem atenção: verdade seja dita, muita gente da academia é caninamente fiel ao PT, mesmo sendo evidente que ele participa profundamente do esquema de corrupção da política brasileira.

É claro que praticamente todos os partidos também o fazem, e isso é fundamental pra você entender a segunda questão que tratarei abaixo. Muitos jovens aderem de forma impensada e estimulada por professores que construíram e constroem suas vidas intelectuais e institucionais em cima da seita marxista e associadas.

Essa adesão significa poder nos departamentos, órgãos colegiados e instituições que financiam pesquisas. Entendeu? Grana e poder localizado dentro do espaço institucional acadêmico. O mesmo serve para os editais de cultura dos artistas que vivem do governo.

Muitos alunos são tragados, em seu impulso de querer mudar o mundo (muitas vezes, em detrimento de arrumar o próprio quarto), por essa máquina de corrupção interna ao mundo intelectual institucional. De um ponto de vista da carreira, essa adesão pode, inclusive, garantir concursos e parcerias interessantes.

Mas existe uma causa mais metafísica ou mais sofisticada para gente inteligente apoiar caninamente e violentamente o PT e associados, em sua saga pela corrupção ideologicamente justificada.

Eis a causa: para a moçada inteligente, o horror à corrupção é coisa do humanismo burguês (coxinha, numa linguagem mais atual).

Para esses inteligentes, se a corrupção, o crime, a mentira, a violência, forem em nome da causa, tá valendo. É isso que grande parte das pessoas não entende quando se choca com o fato que a universidade, a arte e a cultura, em grande parte, apoia caninamente corruptos com metafísica, como a tropa de choque do PT e associados.

Marx (1818-1883), Bakunin (1814-1876) e Nechayev (1847-1882), para ficar apenas em três grandes estrelas desse mundo, pensavam exatamente assim. Portanto, caros, para os inteligentes, a corrupção tem metafísica: essa metafísica é a justificativa de que ela é parte das ferramentas necessárias para a luta. Você, burguês, coxinha, na sua ingenuidade, pensa que, sendo eles cultos, pensariam de forma simplista como você?

Agora vamos à segunda questão de hoje. Por que Lula foi indicado para o ministério? Não, não estou me referindo à forte indicação de que isso foi um truque para tirá-lo das mãos do algoz Moro. Refiro-me à sua missão superior de salvar o sistema corrupto inteiro que a Lava Jato pode vir a engolfar em seu processo pós-PT. E aí, caros irmãos, a coisa pega.

O PT, caso confirme seu superministro, aposta no medo do alto clero jurídico e da oposição como apoio ao aniquilamento institucional e burocrático da Lava Jato.

É um papinho aqui, uma leizinha ali, um parecerzinho acolá, e pronto: a Lava Jato vira pizza, como as Mãos Limpas viraram na Itália graças a Berlusconi (e Moro sabe muito bem dessa história). Nosso Berlusconi é o Lula. Não é o Moro que é o Berlusconi (como muitos desavisados pensam), é o Lula. O Moro tá mais pra Batman do que pra Berlusconi.

Portanto, ponham suas barbas e batons de molho. Lulinha paz e amor da manifestação da última sexta veio pra salvar a corrupção de todos.


A guerra final - VALDO CRUZ

Folha de SP - 21/03
Tucanos recolhem as armas para 2018, Lula arrependido por aceitar a Casa Civil, Marina a postos e Dilma abatida pelo tempo que perdeu em chamar seu criador para seu time e iniciar uma reação.

Este é o retrato que a pesquisa Datafolha revela sobre como está o campo da batalha final que definirá o destino da presidente petista.

Mais do que nunca o PSDB opta pelo impeachment como a melhor solução para a crise atual, colocando o vice Temer no lugar de Dilma.

Não apenas pelo Datafolha, que mostra Aécio, Alckmin e Serra em queda na corrida presidencial. Mas também porque dizem por aí que vem chumbo grosso contra tucanos nas delações da Operação Lava Jato.

Melhor, então, fechar com o vice-presidente Michel Temer, ele assumir, arrumar a casa e o PSDB tentar recuperar o poder apenas em 2018.

Já Lula, que não escondia seu constrangimento na posse como ministro da Casa Civil, perdeu o papel de vítima da Lava Jato. A maioria dos eleitores acredita que ele aceitou o convite de Dilma para fugir de ser preso pelo juiz Sergio Moro.

O ex-presidente entra na guerra final alquebrado e fragilizado, sem saber inclusive se poderá assumir o posto, mas com o trunfo de ser o único capaz de reanimar a tropa petista como se viu na sexta-feira (18) nos protestos pró-Dilma e pró-Lula.

A presidente, do seu lado, dormiu no ponto. Teve uma janela de sossego no início do ano e não soube aproveitá-la. Chega na batalha final com impopularidade em alta e ameaça de debandada de aliados.

Marina Silva surge, até aqui, como a maior beneficiária da crise que arrasta a tudo e a todos para a vala comum da corrupção. Mas também não empolga, afinal está onde sempre esteve. Os outros é que caíram.

Enfim, a oposição e o PMDB dão o jogo como jogado e já pensam no dia seguinte. O governo teme cada vez mais este destino. Mas esta crise tem sido tão eletrizante que esta novela pode ganhar novos capítulos.

O fugitivo, a rainha e os cidadãos - DENIS LERRER ROSENFIELD

O Estado de S. Paulo - 21/03

O fundador de uma dinastia partidária subira na vida política graças a seu carisma pessoal, que o levara ao trono. Em época nem tão remota, contou com a ajuda de um partido que ajudou a criar, da Igreja Católica, que o apoiava, e de um conjunto de intelectuais desgarrados com a queda das monarquias comunistas, ditas populares. Conseguiu ardilosamente vender a ideia – falsa, aliás – de que estaria mudando tudo o que estava aí, apesar de, num acesso de bom senso inicial, ter mantido todas as importantes reformas do antecessor. A ilusão vingou e foi compartilhada pela maioria dos súditos daquele reino.

Mas a farsa não resistiu por muito tempo. Imbuído da ideia messiânica de que estaria resgatando o país e, em particular, os pobres, terminou por criar uma corte – militantes e aproveitadores dos mais diferentes tipos, alguns riquíssimos. Não faltaram os “bobos da corte”, na verdade, um bando de espertos que passaram a contar com benefícios próprios, oriundos do exercício arbitrário do poder.

Passado um tempo, o rei e seu grupo partiram para a etapa seguinte, a apropriação privada dos bens públicos, com seus membros aparelhando o Estado, numa espécie de assalto ao Tesouro. É bem verdade que continuavam vendendo a ideia, e muitos acreditaram, de que estavam pondo o país na rota do “progresso social”, quando, de fato, estavam destruindo o Estado, suas empresas e as leis.

A rota que seguiam era a do dinheiro. Ávidos em busca dele, até esqueceram as leis do reino, que disciplinavam, entre outras coisas, a relação entre o público e o privado. Achavam que isso era coisa de “burguês”, termo usado para qualificar qualquer inimigo deles. Na visão deles, não havia mais adversários, mas tão somente inimigos a serem aniquilados. O ódio foi instalado.

O rei tornou-se milionário, embora quisesse ocultar para a massa dos seus súditos essa realidade. Fazia parte da ficção do seu poder. Sua fortuna, graças a diligentes funcionários públicos, juízes, promotores e policiais, que não compactuavam com o arbítrio, foi estimada em dezenas de milhões de reais. O império das leis tornou-se o império de dom Lula da Silva, o Onipotente.

Curioso que o rei se apresentava como metalúrgico, embora o tenha sido por curtíssimo período, pois logo se tornou sindicalista e líder partidário, sua verdadeira “profissão”. Manteve aquela imagem, porque lhe era útil para o exercício do poder. Veio a ser o mais ilustre membro da elite dominante.

Entretanto, o reino guardava um traço democrático, a realização de eleições periódicas para a renovação dos quadros dirigentes. Tratava-se de uma espécie de monarquia eleitoral. Ante tal situação e na impossibilidade, naquele momento, de alterar essa regra, embora tenha cogitado, optou por um esperto estratagema: uma sucessora que seria sua criatura.

Crédulos, os súditos aceitaram sua escolha e a ungiram. Nomearam-na dona Dilma, a Desconexa. A trama política consistia no retorno dele no futuro próximo. Acontece que sua criatura pôs os pés pelas mãos como se diz no popular. Gastou o que o reino não tinha, maquiou as contas públicas, pôs o país na recessão, destruiu empregos e empresas e produziu perigosa inflação. Um desastre total.

Nesse meio tempo a máscara começou a cair. Os cidadãos crédulos tornaram-se incrédulos no culto dominante. As manifestações se iniciaram. Aquele grupo de funcionários públicos dedicados passou a investigar e vasculhar as contas públicas.

Estarrecidos, descobriam que as contas públicas se haviam tornado privadas, apropriadas pelo rei, por sua corte partidária e por um grupo de empresários inescrupulosos. Juntos, todos participavam do festim dos bens públicos. Para os súditos, as migalhas!

Começaram, então, um impecável trabalho de resgate do império da lei. Sociedades livres não podem viver sob o arbítrio de poucos, de uma oligarquia vestida com as roupagens de “esquerda” com o intuito de esconder os seus crimes. O esforço produziu resultados.

O ex-rei, embora vendesse aos crédulos – cada vez menos numerosos – a sua santidade, começou a fugir da Justiça. Foi um alvoroço no palácio e na corte. Todos corriam para todos os lados, chocavam-se sem cessar, até que um “iluminado” – de poucas luzes – lançou uma ideia genial, própria de gênios desmiolados: por que não fazer do ex-rei o vizir, uma espécie de primeiro-ministro da rainha?

Esta teria inicialmente hesitado em aceitar tal proposta, uma vez que poderia tornar-se mera figurante de seu criador. De fato, seria o destino real da criatura. Logo, teve de fazer a “escolha” entre ser figurante e coisa nenhuma, porque se arriscava a perder todo o seu poder.

Acontece que a impunidade tinha acabado no reino. Ninguém estava mais fora do alcance da lei. Dom Lula da Silva, o Onipotente, não mais tinha a potência de antanho. Ficou desacorçoado. Em conversas privadas, primava por insultos e palavras de baixo calão. Coisa de bêbado em botequim. Tomou a decisão de fugir.

A questão era: para onde? Poderia ter escolhido países “amigos”, com os quais sempre desfrutou de uma relação privilegiada. No continente havia a monarquia comunista cubana ou o projeto terminal da oligarquia bolivariana venezuelana. Seria, porém, patético!

Optou, então, por fugir para dentro do palácio, como se esse fosse um lugar onde as leis não valeriam. A rainha concedeu-lhe uma espécie de salvo-conduto, o título de ministro, como se assim pudesse escapar dos juízes, promotores e policiais que estavam no seu encalço. Manobra pueril.

Os ministros da Corte Máxima, insultados por dom Lula, o Onipotente, reagiram com dignidade e proclamaram que o inaceitável havia sido atingido. As ruas se inflamaram. Os cidadãos disseram em alto e bom som: basta!

Sem medo, proclamaram: abaixo a monarquia esquerdista, viva a democracia!

*DENIS LERRER ROSENFIELD É PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS

Mãos sujas - PAULO GUEDES

O GLOBO - 21/03

Desconcertantes conversas de Lula foram mais reveladores das intenções de obstrução de Justiça do que denúncias de Delcídio


O poder corrompe, o poder absoluto corrompe absolutamente. Muitas biografias desceram pelos ralos da História quando lideranças se perderam por excessos permitidos ao poder sem limites. As instituições de uma sociedade livre estabelecem limites ao exercício do poder exatamente para evitar tais excessos. As investigações da operação Lava-Jato são o registro dessa marcha histórica de aperfeiçoamento institucional da República. Contra o abuso de poder, as práticas políticas degeneradas e a corrupção sistêmica.

Por outro lado, o senador Delcídio do Amaral denuncia a articulação de uma operação Mãos Sujas, comandada pelo ex-presidente Lula, para interferir nos trabalhos da Polícia Federal, do Ministério Público e do Supremo Tribunal Federal. Com a indicação de Lula para ministro-chefe da Casa Civil, a operação Mãos Sujas sai da clandestinidade para virar programa de governo. Essa perturbadora agenda foi confirmada pelas desconcertantes conversas de Lula, ainda mais reveladoras do que os depoimentos do ex-líder do governo no Senado. “Tô assustado com a República de Curitiba... esses meninos da Polícia Federal e do Ministério Público têm que ter medo... delegado não pode desrespeitar político... tem que trucar o Janot e triturar... que porra é essa que a Receita Federal tá fazendo junto com a Polícia Federal? Fala com a Dilma o negócio da Rosa Weber... temos uma Suprema Corte totalmente acovardada... presidentes da Câmara e do Senado fodidos... o Aragão deveria cumprir um papel de homem.” O novo ministro da Justiça, pautado por Lula, anuncia estudar medidas judiciais contra Sérgio Moro e punir policiais federais por suspeita de vazamento de informações. “Cheirou vazamento de investigação por um agente nosso, a equipe será trocada, toda. Não preciso ter prova”, ameaça Eugênio Aragão.

Lula é um bom brasileiro e não quer incendiar o país. Exige com razão que a operação Lava-Jato não atinja apenas a ele e ao PT. Mas erra se exige cumplicidade em malfeitos e elabora uma agenda de obstrução da Justiça. É importante que ouça a voz do povo nas ruas antes de investir contra a Justiça. Foram muito mais de três milhões de manifestantes em verde e amarelo a favor de Sérgio Moro, e algo menos de 300 mil em vermelho a seu favor.

Não é a Lava Jato que está fora da lei - EDITORIAL O ESTADÃO

O Estado de S. Paulo - 21/03

Em várias ocasiões – e muito especialmente no julgamento do mensalão –, o Partido dos Trabalhadores (PT) tentou vender a ideia de que as atividades ilícitas de seus membros não eram assim tão ilícitas. Seriam “apenas” caixa 2. Seriam “apenas” a manutenção de práticas já existentes desde os tempos do Brasil colônia. De vez em quando, os petistas tentavam ir um pouco mais longe, dizendo que as ações da tigrada seriam na verdade meritórias. Desse delírio partidário nasceu o ridículo ímpeto de proclamar como heróis do povo brasileiro alguns réus condenados na Ação Penal 470 pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Agora, o PT mostra que é capaz de ir ainda mais longe em sua perversa retórica. Diante dos avanços da Operação Lava Jato, o partido não tem se contentado em dizer que o que fez não foi ilegal ou que seu líder e seu séquito não são criminosos. Apregoam abertamente a ideia de que os criminosos estão do outro lado do balcão. Nessa tresloucada visão, os contrários à lei seriam a Polícia Federal, o Ministério Público e o Poder Judiciário – muito especialmente o juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba, Sergio Fernando Moro.

É uma completa inversão de valores – como se os petistas estivessem do lado da lei e fossem as instituições as descumpridoras da lei. Haja descaramento. Sem conseguir apresentar uma explicação convincente para as inúmeras denúncias e escândalos em que estão implicados, os líderes petistas partem para o ataque.

Parece maluquice, mas é apenas a exacerbação da sem-vergonhice: o PT anda querendo criminalizar a Operação Lava Jato. Tal tentativa só pode ser a reação desesperada de quem não tem fatos nem argumentos a apresentar em sua defesa. Afinal, responde pelo saque do Brasil. Manifesta completo desespero, pois o movimento de criminalizar o Poder Judiciário, a Polícia Federal e o Ministério Público não tem qualquer respaldo jurídico, nem muito menos apoio popular.

É evidente que a sociedade está do lado de quem cumpre a lei. As manifestações do dia 13 de março foram suficientemente elucidativas quanto a isso. A população respeita e admira a Operação Lava Jato, vislumbrando no trabalho realizado em Curitiba um Brasil sério, que trabalha, que funciona, que não se detém diante de poderosos políticos ou de influentes empresários. Pôr-se contra esse esforço anticorrupção, como vem fazendo o PT, é nada mais nada menos que um suicídio político.

No aspecto jurídico, é um absoluto despautério a tentativa do PT de criminalizar a Operação Lava Jato e, em concreto, a atuação do juiz Sergio Moro. Vige no País a garantia do duplo grau de jurisdição – tem-se sempre a possibilidade da revisão de uma decisão de um juiz monocrático por um órgão colegiado. Na verdade, o problema do PT não é tanto com o juiz de primeira instância, mas com os tribunais, que têm reconhecido sobejamente a correção das decisões de Moro.

Nos últimos dias, a campanha contra o juiz da 13.ª Vara Federal de Curitiba recrudesceu sensivelmente, após a retirada do sigilo do processo envolvendo o ex-presidente Lula e a consequente divulgação de áudios gravados. Como o que foi revelado não agradou nem a Lula nem a Dilma – afinal, a cafajestagem explícita nas conversas faz corar frades de pedra –, o PT e o Palácio do Planalto tentaram tratar como criminosa a decisão de Moro.

Pura encenação. Sabe-se bem que as escutas foram feitas de acordo com a lei e, portanto, podem ser usadas em juízo como prova contra Lula. A tentativa de criminalizar a decisão de Moro de levantar o sigilo das gravações é coisa de aloprados. Entre os pilares da isenção do Poder Judiciário está o princípio do livre convencimento do juiz. Pretender que uma decisão judicial fundamentada – com amplos e sólidos argumentos, diga-se de passagem – seja tratada como se fosse um crime, pela simples razão de haver produzido efeitos políticos contrários aos interesses dos inquilinos do Palácio do Planalto, equivale a querer que o País volte aos tempos do absolutismo. Um Estado Democrático de Direito tem muitas garantias, mas entre elas não está a imunidade para o ilícito.


Não vai ter golpe! - RICARDO NOBLAT

O GLOBO - 21/03

Simples o que aconteceu na última quarta-feira em Brasília quando Dilma telefonou para Lula avisando-o de que um emissário lhe entregaria no hotel o termo de posse. No melhor "estilo Dilma" de falar, ela disse, na tentativa desesperada de se fazer entender: "Seguinte, eu tô mandando o Messias junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!"

SUBCHEFE DE ASSUNTOS jurídicos da Casa Civil, Jorge Messias deu a Lula uma cópia assinada por Dilma do termo de posse dele como ministro-chefe da Casa Civil da Presidência da República. E pegou a assinatura de Lula em outra cópia do mesmo documento que ainda carecia da assinatura de Dilma. Mas como este parágrafo acabará na próxima linha, espere só um pouco para conhecer o resto da história. Adiante.

DILMA E LULA HAVIAM sido informados de que o juiz Sérgio Moro estava pronto para decretar a prisão preventiva de Lula pedida pelo Ministério Público de São Paulo. Se isso acontecesse, Lula correria o risco de ser preso antes da posse, indo assim a pique a operação montada para fazê-lo ministro de Estado. Uma vez ministro, ele ficaria a salvo da "República de Curitiba" e aos cuidados do Supremo Tribunal Federal.

DO HOTEL EM BRASÍLIA, Lula retornou a São Paulo. Se agentes federais batessem à sua porta, ele assinaria a cópia do termo de posse já assinado por Dilma, uma espécie de habeas corpus administrativo. Em Brasília, por sua vez, Dilma assinaria a cópia do termo de posse já assinado por Lula, mandando-o para publicação no Diário Oficial. E o ministro-chefe da Casa Civil assim "lavado" escaparia à prisão.

UM PLANO PERFEITO? Está para ser inventado um. Bancado pela dupla Dilma-Lula para obstruir a Justiça, o plano começou a dar errado tão logo Moro, acostumado a bisbilhotar os outros, soube que estava sendo bisbilhotado. Suspendeu a redação dos motivos que justificariam a prisão de Lula e divulgou de uma vez mais de 40 conversas dele ao telefone, grampeadas com a sua autorização.

PARA O PAÍS, foram horas eletrizantes, aquelas, transcorridas entre o anúncio de que Lula aceitara o convite de Dilma para ser ministro (pouco antes do meio-dia) e o momento em que se ouviu na Globo News (pouco antes das 19h) a voz de Dilma informando a Lula sobre o papel que só deveria ser usado "em caso de necessidade" Em cerca de sete horas, o governo foi da esperança e da euforia à frustração e ao medo.

É COM PAVOR A UMA queda rápida que o governo se prepara para enfrentar no Congresso o pedido de impeachment. Desfalcado de Lula, que teve sua nomeação para ministro suspensa pela Justiça, e ameaçado por novos fatos a serem produzidos pela Lava-Jato, o governo parece dispor de uma única arma: os erros dos seus adversários. Atuará em cima dos erros. E, no mais, seja o que Deus quiser.

DEUS, NÃO SEI, mas os brasileiros dão fortes sinais de que desejam ver Dilma, Lula e o PT pelas costas. Não estão divididos, como se diz. Podem não saber o que querem, mas sabem o que não querem. Não querem ser enganados como foram por Dilma, reeleita com base em mentiras. Não querem devolver o que ganharam. E não querem corrupção - daí o esmagador apoio ao impeachment e à rejeição crescente a Lula.

JAMAIS A DEMOCRACIA por aqui deu tantas provas de solidez e de vitalidade. Suportou a queda de um presidente eleito. Se for o caso, suportará outra. Tranquilo: não vai ter golpe.