domingo, novembro 07, 2010

DANUZA LEÃO

Cenas de Ipanema
DANUZA LEÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10

Levou o guarda-chuva.Um homem que faz issoé um homem medroso.Não covarde, medroso


FOI CURIOSO ver Lula anunciar a grande novidade: que o governo vai ter a cara de Dilma; preferia ter ouvido isso da própria.
Não entendi por que ele vai levar a presidente eleita para viajar; para apresentá-la ao mundo, como uma filha inexperiente? Para tirar uma casquinha de sua popularidade?
Para aproveitar e no avião fazer a cabeça dela na escolha de sua equipe? Espero que Dilma dê boas razões para que eu lhe faça grandes elogios, mas está claro que, se a CPMF voltar, não será culpa dela, mas dos governadores. Para já, a eleição acabou, a vida voltou ao normal, vamos mudar de assunto.
Outro dia entrei numa farmácia na Visconde de Pirajá -são umas cinco em cada quarteirão- e dei de cara com uma freira. Levei um susto; era freira de verdade, vestida como tal, coisa que não via há anos.
Prestei atenção a seu hábito -é como se chama a roupa que elas usam. Uma roupa comprida, de algodão marrom; na cabeça, uma espécie de véu preto, e, cobrindo a testa, um tecido branco. Na cintura, uma corda, e nos pés uma sandália de couro cru, que não ficava nada a dever às mais lindas sandálias italianas dos anos 60.
No meio de mulheres de pernas e barrigas de fora, jeans apertadíssimos, tomara que caia, tudo numa profusão de estampas coloridas, me deu uma certa paz, ver aquela mulher tão chique -a combinação de marrom, preto e branco fazia toda a diferença. E lembrei de ouvir, quando criança, falar de meninas que tinham a "vocação", isto é, que pretendiam se tornar freiras.
Será que isso ainda existe? Será que passa pela cabeça de alguma adolescente ser noiva de Cristo? Lembrei de Madre Teresa de Calcutá, que usava um hábito branco, debruado de azul, e pensei que nesse momento tão difícil pelo qual passa a moda, se algum costureiro ousasse fazer uma coleção com a sobriedade e o bom gosto das roupas das religiosas, poderia ser um caminho, nesse universo tão perdido.
Voltando: o dia estava nublado, mas quente, e quando saí da farmácia, vi que se anunciava uma chuva. Parei na porta de uma loja e fiquei olhando as pessoas; foi quando vi um senhor carregando um guarda-chuva desses dobráveis. Andava devagar, olhando cuidadosamente para o chão, imagino que para não pisar num buraco ou tropeçar.
Sou de uma geração que achava os homens diferentes das mulheres. Mais fortes, mais corajosos -"homem não chora". Mas não aquele com o guarda-chuva. Antes de sair ele deve ter olhado o tempo pela janela, achou que podia chover, e levou o guarda-chuva. Um homem que faz isso é um homem medroso. Não covarde, medroso. Ele tem medo de se molhar, de talvez pegar uma gripe que pode se transformar em pneumonia.
Os jovens não usam guarda-chuva. Eles enfrentam as tempestades achando graça, e quando se trata de dois apaixonados, costumam às vezes se abrigar debaixo de uma marquise para se beijar. E -imagino- quando chegam, enquanto ele troca de camisa, ela enxuga os cabelos com uma toalha e vai para a cozinha fazer um chá, para esquentar os corpos. E os dois riem, falando da chuva, comentando que era uma chuva molhada -nem todas são-, felizes por já estar em casa.
Já aquele homem, não. Ele parecia ser só, a chuva não lhe trazia nenhuma alegria, nem mesmo um alívio porque o tempo ia refrescar, e quando chegasse em casa, não teria ninguém que lhe fizesse uma bebida quente, ou com quem pudesse -ou quisesse- falar.
A fragilidade masculina é sempre comovente, e, no caso, triste. Porque o medo daquele homem não era só da chuva, mas, também, da vida.

JOÃO UBALDO RIBEIRO

Por que não reescrevem tudo?

JOÃO UBALDO RIBEIRO
O GLOBO - 07/11/10

De uns tempos para cá, não sei se me engano, começaram a proliferar normas destinadas a controlar nossa conduta individual.
Falei em algumas aqui e cheguei a aventar a hipótese de que uma agência governamental, ou qualquer outra das muitas autoridades a que vivemos subordinados sem saber, venha a estabelecer normas para o uso do papel higiênico e garantir sua observação através da instalação de câmeras nos banheiros de uso público. Nos banheiros domésticos, imagino que seriam suficientes umas visitas incertas de inspetores com gazuas, para tentar flagrar os que se asseassem ilegalmente.
Não se trata somente de passatempo para burocratas entediados e sem mais o que fazer. Trata-se da convicção, que parece grassar truculentamente em toda parte, de que existe algo "certo", cientificamente certo e, portanto, todos devem comportar-se dentro do certo.
Se nas ciências físicas esse negócio de "certo" já é olhado com um pé atrás, nas ciências humanas, que nunca puderam aspirar ao nível de objetividade daquelas, a existência do "certo" é muito discutível, envolve necessariamente valores, valores que permeiam toda ação do homem e não são território da ciência e da objetividade.
Agora leio aqui nos jornais que a compulsão pelo certo acaba de atingir novo limite. Desta vez, por um parecer do Conselho Nacional de Educação, que opinou que o livro "Caçadas de Pedrinho", de Monteiro Lobato, deve ser proibido nas escolas públicas, por se tratar de obra racista. Sei que, entre vocês, há leitores de Monteiro Lobato que acharam que não entenderam o que acabaram de ler. Mas é isso mesmo: não pode "Caçadas de Pedrinho", porque é racista. Ou, por outra, pode, mas somente "quando o professor tiver a compreensão dos processos históricos que geram o racismo no Brasil".
Eu não vou nem falar nos milhões de brasileiros de todas as idades e todas as gerações que viveram no mundo mágico criado por um dos maiores escritores universais, um gênio naquilo que fez melhor, motivo de orgulho para todos nós, Monteiro Lobato. Nem vou dedicar tempo a entender como é que foi que todos esses milhões, lendo, despreparados, livros racistas, não vieram mais tarde a abrigar preconceitos e ideias nocivas, instilados solertemente na consciência indefesa de crianças.
Monteiro Lobato, com toda a certeza, tem tantos defensores quanto leitores, não precisa de mais uma defesa.
E que diabo é "compreensão dos processos históricos que geram o racismo no Brasil". A compreensão "certa"? Qual é a compreensão certa de um fenômeno que gera até brigas ferozes entre seus estudiosos e participantes? Estará correta a visão que vê no racismo um fenômeno causado exatamente pela diferença de raças? Terá mais razão o que vê na escravidão um fenômeno basicamente econômico e só secundariamente racial? Quem resolveu isso? Qual a posição oficial do governo? O professor que orientar a leitura de "Caçadas de Pedrinho" terá que saber.
Deus ajude as pobres crianças, torturadas com o que era antigamente somente um livro que as transportava para a fantasia, a aventura e o encantamento inocentes.
Agora, ao que parece, o correto é a leitura tutelada, orientada.
Antigamente, a literatura infantil era liberdade, escape, território autônomo em que a imaginação do jovem, ainda não embotada pela experiência, o levava a uma felicidade mais tarde irreproduzível. Agora talvez se diga "você gostou disso, por aquilo; e não gostou disso, porque não é para gostar, está errado". A boa literatura dá lições como consequência, não como objetivo. Deve-se ensinar a ler por prazer, de maneira desarmada e aberta - e não há como desconfiar dos clássicos como Lobato, os clássicos são clássicos porque são clássicos.
A literatura, como a vida, não é certinha.
A ficção até que arruma os acontecimentos, lhes empresta enredos e sentidos que na vida real não têm.
Mas, como a vida, a ficção mostra contradições, reflete dilemas, exibe defeitos, ilumina a existência humana.
Quem entra num romance deve entrar sozinho, a viagem é individual e intransmissível.
E até mesmo essa conversa de necessidade de contextualizar o livro é bem discutível. No meu tempo de menino, ninguém precisou contextualizar os livros de Tarzan para aceitar a África dele, assim como não se contextualizava Robin Hood, D'Artagnan, Jorge Amado, Érico Veríssimo ou quem lá fosse que aparecesse num romance, a contextualização era automática, vinha do bom texto.
Finalmente, em que medida os defeitos não são subjetivos, ou seja, não estão apenas na mente e na percepção de quem os aponta? Existirá um racismômetro? E, mais ainda, não haverá outras áreas sensíveis? Acho que a adoção de mais controles é decorrência lógica e questão de justiça. Temos por exemplo a antropologia ultrapassada de Euclides da Cunha, o tal que falou no "mestiço neurastênico do litoral".
É tão presente nele essa visão antropológica superada (além de ofensiva a grupos raciais; eu mesmo sou mestiço neurastênico do litoral e as mulheres sempre me discriminaram) que o melhor seria mandar um antropólogo correto e moderno reescrever "Os Sertões', para quê o velho? Esperemos também alegações de violência contra mulheres (Barba-Azul), machismo (Bolinha), ódio a uma espécie em extinção (o lobo de Chapeuzinho Vermelho), exploração de deficientes verticais (os anões de Branca de Neve), apologia da bruxaria (a Bela Adormecida) e assim por diante. Olhando para trás, chego a ter um arrepio, em ver como escapamos por pouco de termos as personalidades deformadas pela leitura irresponsável dos clássicos, esses repositórios de traições, assassinatos, incestos, preconceitos, guerras, adultérios e tudo mais que o planejamento científico logo eliminará. Melhor por enquanto ficar longe deles e aguardar instruções das autoridades
JOÃO UBALDO RIBEIRO é escritor.

FERREIRA GULLAR

O imprevisível na arte
FERREIRA GULLAR
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10

Quando as regras foram abandonadas, o imprevisível tornou-se um fator essencial da criação


TALVEZ A nossa visão da expressão artística se enriqueça se tentarmos mudar a maneira usual de entendê-la. Não há dúvida de que uma compreensão cabal desse fenômeno é quase impossível.
Digo isso porque tendo a achar que não há respostas definitivas para os problemas e, particularmente, quando se trata de matéria tão complexa e ambígua quanto a arte.
Estou convencido de que a obra de arte é resultado de um processo, que tem como fator consubstancial a imprevisibilidade. Isso se tornou mais evidente na época moderna, quando a expressão artística se libertou das normas que surgiram, séculos antes, nas academias de arte.
Uma série de fatores levara ao estabelecimento de regras e princípios a que os artistas deveriam obedecer; regras essas que nasceram da convicção de que a função das artes plásticas era representar a figura humana.
Uma coisa condicionou a outra: se a arte alcançaria sua mais alta expressão representando o corpo humano, era, então, obrigatório estudá-lo objetivamente e buscar, com rigor científico, copiar cada detalhe que o constitui.
E assim surgiu um verdadeiro código capaz de orientar o artista na captação fiel das particularidades do corpo humano. Normas e proporções preestabelecidas possibilitaram conceber a figura humana ideal, representada conforme relações e harmonia que não se encontram em nenhum corpo humano real. Por essa razão, a realização artística tornou-se previsível, ou seja, um procedimento regido de antemão por regras conhecidas.
Se é verdade que o grande artista nunca se submeteu integralmente a tais regras, não resta dúvida de que, quando elas foram abandonadas, o trabalho artístico sofreu uma mudança fundamental: o imprevisível tornou-se um fator essencial da criação artística.
O início se dá no cubismo analítico, quando a representação figurativa é substituída pela construção arbitrária da forma dos objetos. Agrava-se com o abandono dos processos propriamente pictóricos, substituídos pelo uso de papel colado à tela, arame, areia, barbante. Se o artista não tem qualquer compromisso com a imitação das figuras, que fatores passam a reger a realização da obra?
Do meu ponto de vista, com o cubismo, a pintura, que antes nascia das formas naturais, passou a nascer, na tela, da imaginação do pintor. "Cézanne, de uma garrafa fazia um cilindro; eu, de um cilindro, faço uma garrafa", afirmava o cubista Juan Gris (1887-1927). Essa autonomia da linguagem levou a uma exacerbação que ultrapassou os limites: tudo o que se punha na tela virava expressão estética, fosse papel, barbante ou areia.
Em contrapartida a esse tipo de construção arbitrária, surgiu a arte geométrico-construtiva, inicialmente com o neoplasticismo de Piet Mondrian (1872-1944). Regida por linhas verticais e horizontais, limitava a composição a quadrados e retângulos em cores primárias, que se repetem de um quadro para o outro.
O grau de imprevisibilidade foi reduzido, mas não eliminado, mesmo porque não era esse o propósito do artista, uma vez que a composição, como um todo, sem o comprometimento com a representação figurativa, era "arbitrária", ou seja, o resultado possível a partir dos elementos postos em jogo. Na verdade, a arte construtiva buscou tornar necessário o que era casual.
No polo oposto a essa arte, situou-se a arte informal ou tachismo, cuja manifestação mais radical terá sido a "pintura cega", como a do italiano Vêdova, por exemplo.
No entanto, pela despreocupação total com a construção da obra, esse procedimento tentou eliminar a relação dialética entre ordem e desordem, previsibilidade e imprevisibilidade, perdendo-se assim a noção de obra, em que sempre intervém a opção do autor: o acaso criaria a obra, mas é a intervenção do artista que faz dela expressão humana, mesmo porque o puro acaso, assim como a natureza, que produz galáxias, não produz arte.
Esta, por maior que seja o grau de acaso que a constitua, é sempre resultado da intervenção do artista. Mesmo Pollock -que, dançando sobre a tela posta no chão, deixava cair sobre ela respingos de tinta que constituiriam a obra- intervinha, depois, para corrigir o que o acaso criara errado.

JUMENTO

JOSÉ SIMÃO

Interlagos! Galvão estrebucha!
JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10

E quem mais gosta de Salão do Automóvel é motoboy: pra ver os modelos de retrovisor. Que vão quebrar!


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
GP Brasil! Interlagos! Hoje é dia de zoada de pernilongo zzzzzummm zzzzuummm. E o Galvão matando pernilongo no grito. É o Galvão que vai transmitir? Transmitir é modo de dizer, ele vai GRITAR! Rarará!
E tem gente que prefere o Galvão Bueno transmitindo avalanche na Sibéria! Rarará! E a definição do Galvão: "Corrida de carro é corrida de carro". Ah bom! Eu pensei que corrida de carro fosse corrida de charrete! Rarará! E o Rubinho vai correr? Correr não, o Rubinho vai PARTICIPAR! Rarará!
E vida de piloto é uma delícia: trabalha deitado, dá volta até ficar tonto e, quando perde, bota a culpa no carro! E os gringos? Os pilotos estrangeiros adoram churrascaria. "O que você quer conhecer no Brasil?" "Churrascaria." De duas coisas eles gostam: churrasco e quenga. Ou seja, vêm pra comer! E eu sou do tempo em que carro tinha porta!
E o Salão do Automóvel? Serve pra duas coisas: sentir cheiro de couro novo e lembrar como a mulher da gente é feia! Rarará! E um amigo vai pro Salão pra ver duas coisas: "o carro que comprarei e a mulher que comerei. Daqui a 20 anos!"
E quem mais gosta de Salão do Automóvel é motoboy: pra ver os modelos novos de retrovisor. Que eles vão quebrar! "Ô, mano, aquele prateado, irado!" Rarará! E aquela maria gasolina ao lado duma Ferrari com o cartaz: "Vou dar o fiofó pro dono deste carro". Rarará!
Ministério da Dilma Rouchefe! A Primeira Presidentuça do Brasil! Agricultura: Serra. Como espantalho. Educação: Tiririca. Saúde: Cleo Pires. Em página dupla. Aquilo é que é saúde! Transportes: Rubinho. Pra acelerar a indústria das multas. Passou de 50 km, multa. Ultrapassagem, multa. E ultrapassar gringo? Perde a carteira. Rarará!
E o Eramos6 revela como vai ser a montagem do ministério: o Lula dá as cartas, o Temer dá o morto e a Dilma BATE! Rarará!
E o PMDB mandou avisar que quer 15 ministérios, com frigobar, caixa de Moët & Chandon, massagista, cesta de frutas tropicais e 200 toalhas brancas. Nóis sofre, mas nóis goza. Que vou pingar o meu colírio alucinógeno!

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA

Como está não dá
RENATA LO PRETE

FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10 

Tamanho é o pacote de bondades que o Congresso tenta introduzir no Orçamento que o governo já discute internamente a possibilidade de deixar a votação para fevereiro de 2011, já sob a nova legislatura. 
Além das questões do salário mínimo, que os parlamentares tentam aproximar dos R$ 580 reivindicados pelas centrais sindicais, e do reajuste do Judiciário, há agora a encrenca das emendas individuais, cujo teto seria elevado dos atuais R$ 12,5 milhões para R$ 15 milhões ou mesmo R$ 17 milhões - em 2003, o limite eram R$ 2 milhões. O Planalto está decidido a não aceitar nenhum aumento nesse quesito. 

Quer mais? - De um integrante do primeiro escalão, ao ver num programa de TV um analista repetir o bordão de que a ida de Antonio Palocci para a Casa Civil daria credibilidade ao governo de Dilma Rousseff: ‘A mulher teve 56 milhões de votos! Precisa de mais credibilidade?’. 

Kkkkk - Dizem os mais próximos que nada diverte tanto Dilma, atualmente, quanto espiar o noticiário e ver quanta gente já está ‘nomeada’ para seu ministério. 

Cabeça feita - Reeleito ao Senado, Edison Lobão (PMDB-MA) diz a quem quiser ouvir que não aventa a hipótese de presidir a Casa. Quer, isso sim, voltar a ser ministro de Minas e Energia. 

O de sempre - Mesmo porque José Sarney (PMDB-AP), depois de mais uma vez espalhar que estaria muito cansado e sem disposição para um novo mandato na presidência do Senado, começa a deixar claro que pretende continuar onde está. 

Calendário - No dia 14, termina o prazo dado pela Justiça para que a PF conclua as investigações sobre tráfico de influência na gestão de Erenice Guerra na Casa Civil. Como haverá pedido de prorrogação por mais um mês, se este novo prazo for cumprido as conclusões serão divulgadas em 14 de dezembro, dia do aniversário de Dilma. 

Pode esperar - Senadores tucanos identificam no horizonte sinais de que José Serra tentará postular a presidência do PSDB. E apostam que isso vai dar encrenca. 

Pré-sal 1 - Cumprida sua função na campanha eleitoral, o assunto Paulo Preto será devolvido às profundezas pelo PT, nada interessado em prospectar um terreno que faz fronteira com a Castelo de Areia, operação da Polícia Federal com potencial de dano tanto para tucanos quanto para petistas. 

Pré-sal 2 - O caso Paulo Preto só será trazido à tona bem mais adiante e num único cenário: o da candidatura a prefeito do senador eleito Aloysio Nunes (PSDB-SP), de longe o tucano mais próximo do ex-diretor da Dersa. 

Excel - Geraldo Alckmin encaminhou às secretarias esta­duais questionário sobre temas específicos de cada pasta, incluin­do a listagem completa de nomes de titulares, adjuntos, che­fes de gabinete e coordenadores. Pediu respostas até terça-feira. 

Nem tão verde - A definição do espaço do PV no futuro governo Alckmin ainda é objeto de conversas entre os dirigentes do partido e o eleito. Em privado, os ‘verdes’ desejam uma secretaria de orçamento mais robusto do que a do Meio Ambiente. 

Mãos de tesoura - Na reestruturação administrativa prometida por Alckmin, pelo menos uma pasta já é candidata a perder status de secretaria: Ensino Superior. 

Espertolândia - Um veterano da área filosofa: ‘Em política, só tem bobo a partir da sétima suplência’.

Tiroteio

O primeiro ato do governo Tião Viana deveria ser aprender a lição de Obama sobre como perder eleição sem reclamar. 
DO DEPUTADO ACM NETO (DEM-BA), usando o discurso em que o presidente americano assumiu a responsabilidade pela recente derrota de seu partido nas urnas para criticar o petista, segundo quem o povo do Acre cometeu ‘injustiça’ com Lula ao optar majoritariamente por Serra, e não por Dilma. 

Contraponto

Vamos ao que interessa 

Na última cerimônia de formandos do instituto Rio Branco realizada no governo Lula, Celso Amorim rememorou, ao discursar, o dia de 2002 em que Lula o chamou para ser ministro das Relações Exteriores. 
- Com muito jeito, disse duas coisas a ele. Primeiro: ‘olha, presidente, eu tenho uma ligação histórica com o PMDB’. Ele disse: ‘isso não tem importância’. 
A segunda ressalva dizia respeito a futebol: 
- Eu disse: ‘sou Santos’. E ele: ‘isso é mais grave’. 
Naquele ano, Santos e Corinthians fizeram a final do Campeonato Brasileiro - e o time de Lula perdeu.

MERVAL PEREIRA

Pragmatismo

MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 07/11/10
Estamos tendo um exemplo em tempo real do estilo lulista pragmático de governar. Nos últimos dois anos, para eleger sua candidata à presidência da República, o governo aumentou os gastos públicos e foi generoso com aposentados, pensionistas e funcionários públicos. Aumentou o alcance e o valor de programas sociais como o Bolsa-Família.
Reduziu o superávit primário, e fez malabarismos fiscais para parecer que continuava cuidando do equilíbrio das contas públicas.
Atingido o objetivo, a austeridade toma conta novamente do governo, que anuncia através do Ministro do Planejamento Paulo Bernardo, cotado para permanecer no governo Dilma em posição estratégica, que não há mais espaços para novas “bondades”.
Até mesmo a idéia de alterar a legislação que define o reajuste do salário mínimo, lançada pelas centrais sindicais e recebida com simpatia pela presidente eleita, foi rechaçada pelo Ministro, certamente assumindo o papel de “homem mau” do governo para livrar Dilma Rousseff do problema.
Sua argumentação é irrepreensível: se há uma legislação que define o reajuste do salário-mínimo pela média do crescimento do PIB dos dois últimos anos, não é possível mudá-la apenas por que, circunstancialmente, seu resultado não permite um aumento real devido ao crescimento negativo do PIB em 2009.
Também os governadores eleitos do PSB assumem a idéia de relançar a CPMF, incentivada pelo próprio presidente Lula, para tirar do futuro governo o peso de ter que quebrar a promessa de não aumentar a já alta carga tributária brasileira.
A desculpa de que a volta da nefasta contribuição é necessária por que a demanda da saúde é “infinita”, na explicação do governador eleito do PSDB Antonio Anastasia, de Minas, serve só para encobrir a real necessidade de mais dinheiro para sustentar os gastos que já foram contratados para o futuro.
O fato inquestionável é que os gastos com a saúde pública permaneceram inalterados depois da extinção da CPMF, e a arrecadação do governo acrescentou aos cofres públicos o equivalente a duas CPMFs, aumentando em cerca de 3% do PIB nos oito anos.
Esse movimento pela recriação da CPMF está colocando em movimento novamente as mesmas forças que levaram à sua extinção, em 2007.
E um dos mais destacados líderes empresariais, naquela ocasião e agora, é Paulo Skaf, da Fiesp, que se candidatou ao governo de São Paulo pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), numa dessas paradoxais bobagens que a política brasileira permite.
Lula, ao saber que as associações empresariais de Santa Catarina estão protestando contra a possibilidade de volta da CPMF e também da desindustrialização do estado devido à guerra fiscal, destilou todo seu ressentimento com a vitória da oposição no Estado: “E eles votaram em quem”, perguntou na reunião ministerial.
Ainda mais que o líder do movimento Xô CPMF foi o deputado federal Paulo Bornhausen, do DEM, que já está novamente em campo contra o ressurgimento da contribuição.
O mesmo pragmatismo Lula adotou na sua fala ao povo brasileiro para saudar a eleição realizada. Pediu que oposição e governo se respeitassem pelo bem da democracia, como se esse tivesse sido seu comportamento como líder político em todos os momentos em que foi derrotado.
Não foram poucos, e sempre Lula recusou-se a aceitar o governo eleito contra ele como legítimo, e nem mesmo quando houve a crise institucional provocada pelo impedimento de Collor ele aceitou participar do governo de união nacional de Itamar Franco.
A oposição brasileira, que saiu da urna fortalecida em relação às eleições anteriores, mas enfraquecida no Congresso, debate publicamente qual deve ser sua atitude daqui para frente.
Como bem ressalta o cientista político Cesar Romero Jacob, da PUC do Rio, o poder político deslocou-se de São Paulo para Minas na atual situação.
A presidente eleita Dilma Rousseff é mineira de nascimento e soube usar esse trunfo na eleição. Certamente essa origem recuperada pela política ajudou-a a manter a diferença a seu favor nos dois turnos, aliado ao fato de que há um sentimento em Minas de frustração em relação aos paulistas, mais imediatamente devido à disputa no PSDB para a indicação do presidente que relegou Aécio Neves, como destacou o ex-presidente Itamar Franco, senador eleito por Minas.
Mas também em termos históricos, como ressalta Romero Jacob, atingindo o próprio Itamar: os mineiros ajudaram a tirar os paulistas do poder em 1930 e os recolocaram de volta em 1994.
Romero Jacob ressalta que São Paulo, o principal estado brasileiro, ficou fora do comando da federação por 64 anos: de 1930 a 1994, tirando os nove meses de Jânio Quadros e o período dos militares, “isso porque mineiros e gaúchos se uniram contra os paulistas”.
O candidato do ex-presidente Itamar Franco à sua sucessão era o deputado federal Antonio Britto, político gaúcho, revivendo a velha aliança de Minas com o Rio Grande do Sul.
E, como Britto não quis, ele apoiou Fernando Henrique, esperando voltar à política do “café com leite”, e se sentiu traído pela reeleição. “Fernando Henrique fez com Itamar o mesmo que Washington Luiz fizera em 1929, quando não apoiou Antonio Carlos, presidente de Minas”, relembra.
O líder natural da oposição, depois da derrota de Serra, é o mineiro Aécio Neves que, com apoio de partidos da base governista, já ensaia articulações políticas que, se dificilmente o levarão agora à presidência do Senado, certamente plantarão sementes para futuras ações políticas mais conseqüentes. 

Também capazes de acordos pragmáticos, partidos de oposição com os da base governista como PSB e PP organizam uma aliança que se contraponha à força do PT e PMDB, que querem dividir entre eles, que detém as maiores bancadas, o poder nas duas Casas do Congresso.
São movimentos incipientes, mas que já demonstram que o alto grau de fragmentação da base governista, e a inexperiência da presidente eleita nesses jogos parlamentares, podem permitir que a oposição tenha mais campo de manobra do que inicialmente previsto.
Desde, é claro, que consigam se entender entre eles.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Lunetas novas?
Fernando Henrique Cardoso 
O Estado de S.Paulo - 07/11/10


A abertura da economia no início dos anos 1990, depois das crises do petróleo e ainda em meio ao longo processo inflacionário que se seguiu, não desencalhou o barco de nossa economia. Os mares do mundo batiam no casco, mas ele continuava adernado. Só depois de controlarmos a inflação, quando eu ainda era ministro da Fazenda do governo Itamar Franco, e depois que saneamos os ralos que corroíam as finanças públicas e levantamos as âncoras que nos mantinham estagnados - com a atração de capital privado para setores antes monopolizados pelo Estado - é que o navio começou a andar. No começo timidamente, usufruindo as benesses de uma base agrícola poderosa e de uma indústria criada no passado.

Com a volta dos capitais e dos investimentos, começamos a navegar com maior desenvoltura. Por exemplo: em 1995, havia montadoras de veículos somente em São Paulo e Minas; em 2002, não só estas tinham aumentado a produção, como também outras se haviam espalhado pelo País, no Rio Grande do Sul, no Paraná, no Rio de Janeiro, em Goiás e na Bahia. Outro exemplo: em 1995, a Petrobrás não chegava a produzir 700 mil barris/dia; em 2002, ultrapassou 1,5 milhão de barris. E assim por diante, sem esquecer a expansão das telecomunicações, da indústria aeronáutica ou mesmo da indústria naval, que começou a tomar ímpeto em 1999 com a encomenda pela Petrobrás de 22 navios.

Daí em diante nossa economia não parou de crescer, apesar das crises financeiras, que só deixaram de nos golpear em 1996 e em 2000. No período presidencial seguinte, o crescimento se acelerou. Não apenas porque o barco se tornou mais potente, uma vez mantido o rumo anteriormente traçado, mas também porque as águas do mar se encheram, pela bonança internacional entre 2003 e 2008. Junto com o crescimento deu-se a redução da pobreza. O efeito estabilizador do Plano Real reduziu a proporção de pobres de 40% para cerca de 30% da população total. No período presidencial seguinte, nova redução, para aproximadamente 20%. A redução da pobreza não foi resultado automático do crescimento. Políticas também foram adotadas com esse fim. Exemplo: o aumento real do salário mínimo, de 48% entre 1995 e 2002 e de 60% nos oito anos posteriores.

Em mares de almirante, com vento a favor, todos os barcos passaram a andar com velocidades maiores. Medido pelo aumento da renda per capita, andamos relativamente para trás: ocupávamos a 68.ª posição no mundo, na década anterior, e nesta retrocedemos à 72.ª.

Mas o atual comandante do barco, embriagado pelos êxitos, confundiu-se: atribuiu a si o aumento do nível das águas. Pior, conseguiu convencer os marinheiros de que fazia milagre e se tornou "mito". Agora, mais grisalho e quase aposentado, deixa o leme para uma companheira fiel. E será ela quem precisará usar lunetas para ver mais longe. Haverá tempestades ou bonança? Em qualquer caso, como anda o casco do navio? Que fazer para repará-lo? Ou para melhorar o desempenho do navio? Poderá continuar avançando sozinha ou dará a mão aos demais marinheiros? E as máquinas, seguirão a todo vapor sem algum ajuste ou será melhor evitar que a pressão as faça estourar? Acirrará ânimos e seguirá em frente até bater nalgum rochedo ou será previdente e ouvirá outras vozes que não sejam as das estrelas? São questões cujas respostas estão em aberto.

E há outras perguntas, de ordem estratégica, que precisarão ser respondidas. Para começar, como será o mundo dos próximos 20 anos? Tudo indica que nele as economias emergentes, e especialmente as dos Brics, ocuparão maior espaço. Mas qual desses países crescerá mais depressa? China e Índia são, neste caso, nossos competidores mais diretos, embora haja também complementaridades entre nossas economias. Estaremos condenados a, pouco a pouco, voltar à condição de provedores de alimentos e de matérias-primas para os países-monstros, que têm territórios com pouca possibilidade de expansão agrícola? Não necessariamente. Mas para evitar esse destino teremos de definir políticas que aumentem a nossa capacidade de inovar e competir. Não só na área fiscal, não só na tributária e na trabalhista, mas também na de educação, ciência e tecnologia. Sem isso será difícil ter uma indústria globalmente competitiva.

Em 2030 deveremos ter uma população em idade ativa da ordem de 150 milhões de pessoas. Sem uma indústria com musculatura e cérebro para enfrentar a competição global será impossível gerar empregos na qualidade e quantidade que necessitamos. Sem os empregos e a renda necessários o País corre o risco de se tornar "velho" antes de ficar rico. Precisamos aproveitar a nossa janela de "oportunidade demográfica", que se fechará a partir de 2030, para dar um salto em nossa capacidade de produção de riquezas. E para melhor distribuí-las também. E isso depende mais de uma verdadeira revolução educacional que da expansão do Bolsa-Família e outros programas assistenciais.

Como compatibilizar as necessárias taxas de crescimento da economia com os indispensáveis requisitos de respeito ao meio ambiente, de combate ao aquecimento global, e assim por diante? Estaremos dispostos a pensar com maior profundidade sobre como conservar uma matriz energética que utiliza fontes renováveis? Neste contexto, e atentos às questões de custos para o País, introduziremos maior racionalidade na discussão do pré-sal ou continuaremos a fingir que se trata de um Fla-Flu entre "patriotas" e "entreguistas"?

Por fim, nunca é demais lembrar: que papel o Brasil desempenhará no mundo, continuaremos indiferentes diante de vários autoritarismos e desrespeitos aos direitos humanos ou nos comprometeremos crescentemente com formas democráticas de convívio? Quem viver verá. No entretempo, é melhor manter um otimismo cauteloso e, sem embarcar em ufanismos enganosos, acreditar que a vitalidade dos brasileiros (vista uma vez mais na reafirmação democrática do pluralismo eleitoral recente) nos levará a melhores rumos.

SOCIÓLOGO, FOI PRESIDENTE DA REPÚBLICA

ELIO GASPARI

Dilma ampara um lance de estelionato
ELIO GASPARI
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10
 
D urou exatamente três dias a lorota da redução da carga tributária propagada pelo governo e pela oposição durante a campanha eleitoral. Dilma Rousseff foi eleita no domingo e, na quarta-feira, docemente constrangida, disse que "tenho visto uma mobilização dos governadores" para recriar o imposto do cheque, a falecida CPMF, derrubada pelo Congresso em 2007. Se ela acreditava no que dizia quando pedia votos, anunciaria sua disposição de barrar a criação de um novo imposto. No entanto, disse assim: "Não pretendo enviar ao Congresso a recomposição da CPMF, mas não posso afirmar... Esse país vai ser objeto de um processo de negociação com os governadores." Quando um repórter insistiu, ela se aborreceu: "Considero que essa pergunta já está respondida". Quem entendeu a resposta ganha uma viagem a Cuba.

A "mobilização" vem de pelo menos 13 dos 27 governadores, inclusive o tucano Antonio Anastasia. Nenhum deles, nem ela, teve a honestidade de defender a posição durante a campanha. Tentar empurrar a recriação da CPMF como coisa dos governadores é uma ofensa à inteligência do eleitorado que deu 55 milhões à doutora Rousseff. Se ela começa o governo com tamanha passividade, vem coisa pior por aí. É preferível supor que a doutora soubesse da iniciativa, concordando com ela, desde que as cartas rolassem por baixo da mesa.

Dilma aceitou a enganação e perfilhará a ressurreição de um imposto derrubado pelo Congresso. Pior: um imposto em cascata, pois uma transação que envolve cinco cheques será taxada cinco vezes com a alíquota de 0,1%.

O apoio de Anastasia e a bancada do silêncio confirmam que o PSDB é capaz de tudo, menos de fazer oposição. Afinal, a CPMF foi criada e desvirtuada pela ekipekonômica tucana. Em 2007, três governadores do PSDB trabalharam contra sua derrubada. O comissário José Eduardo Dutra assegura: "Todos, eu disse todos, os governadores são a favor da CPMF." Todos, inclusive Dutra, preferiram o lance de estelionato eleitoral.

Conselho de pai é bom, mas pode sair caro
Vem aí o filme "A Rede Social" que conta a aventura da criação do Facebook, em 2004, por Mark Zuckerberg, um garoto desinteressante da Universidade Harvard. A narrativa privilegia a versão de Eduardo Saverin, o sócio-fundador brasileiro, que foi escanteado um ano depois, com o equivalente a US$ 1,3 bilhão no bolso. Zuckerberg recusou-se a falar com o autor do livro "Milionários Acidentais", que serviu de base para o filme.

O fenômeno Facebook, que fez de Zuckerberg um dos homens mais ricos do mundo, tem um lição para os pais que se metem na vida dos filhos depois que eles estão na universidade.

Quando Zuckerberg encrencou-se em Harvard por montar um site que servia, entre outras coisas, para paqueras, tinha um vizinho de dormitório como parceiro. Chamava-se Joe Green. Diante da confusão, seu pai (professor de matemática na Universidade da Califórnia) exigiu que se afastasse daquele jovem trapalhão. Um dia Zuckerberg ofereceu-lhe sociedade no projeto do Facebook, em troca de um investimento de US$ 1 mil. Green seguiu o conselho do pai e ficou fora. Foi um dos palpites mais caros da história.

Outro garoto aceitou. Chamava-se Saverin. A turma de Zuckerberg acredita que foi seu pai quem o estimulou a desafiar o sócio. Felizmente, quando brigou, já era dono de um pedaço do negócio.
Saverin foi visto tocando negócios em Singapura, sempre evitando ser transformado no "Quinto Beatle". Essa urucubaca nasceu com Pete Best. Até 1962, ele era o baterista de um conjunto desconhecido, até que foi substituído por Ringo Starr.

Academia Rousseff 


Está aberto o Curso Rousseff de sabedoria universal. Ao condenar a guerra cambial, a presidente eleita ensinou: "Quando começam com uma política de desvalorização competitiva, deu no que deu: a Segunda Guerra Mundial".

Tudo bem. Se Adolf Hitler, bem como o expansionismo alemão foram apenas surtos neurastênicos da subjetividade humana e o conflito foi provocado por fatores econômicos, falta explicar porque a Terceira Guerra Mundial não começou em 1971, quando o presidente americano Richard Nixon abandonou o padrão-ouro do dólar e iniciou um processo de desvalorização que comeu 18% do valor da sua moeda.

Retrato da Corte 
Um deputado federal disputou a reeleição em seu Estado e registrou que recebeu, no máximo, uma dúzia de pedidos de empregos triviais de eleitores, para parentes necessitados.
O doutor reelegeu-se e na semana passada foi a Brasília. Passou 14 horas na Câmara e contou nove pedidos de nomeações, das boas. Decidiu fugir de volta para sua cidade.

Bush em forma 
George W. Bush deixou a Presidência pela porta do infortúnio, mas na terça-feira entrará no mercado editorial pela da frente.
Seu livro de memórias ("Decision Points") virá em duas edições. Uma no papel e outra eletrônica. Uma versão do e-book para tabuletas iPad trará não só o texto, como vídeos, áudios, 200 fotografias e reproduções de documentos. Tudo isso por US$ 9,99 (R$ 17,00).
(Pelo cheiro da brilhantina, o livro é pedestre, mas também não se pode querer tudo.)

A voz da Cúria 
A entrada do Papa Bento XVI na ofensiva de religiosidade desencadeada às vésperas da eleição mostrou o prestígio da ala conservadora da Igreja Católica brasileira junto à Cúria romana. Ela não teve o efeito que se esperava e, diante do resultado, ficou uma dúvida: será que houve um erro de cálculo em relação ao momento em que o Papa entrou em cena?
O atual expoente da corrente conservadora no episcopado é o cardeal Odilo Scherer, de São Paulo. Não só pela importância de sua arquidiocese, como também pelas boas relações na Cúria. D. Odilo é o quinto cardeal brasileiro saído do catolicismo dos imigrantes alemães que chegaram ao Brasil entre o final do século XIX e o início do XX. Antes dele, outro Scherer (Vicente) foi cardeal e arcebispo de Porto Alegre.

Há algum parafuso frouxo na maneira como Roma trata o clero brasileiro. Em outubro, o Papa nomeou cardeal o bispo de Aparecida, D. Geraldo Damasceno. Esqueceu-se de D. Orani Tempesta, arcebispo do Rio. Desde 1905, quando Pio X deu o barrete ao cardeal Arcoverde, o titular da Sé do Rio sempre foi nomeado cardeal pouco depois de receber o pálio.

Surgiu uma explicação pagã: Roma não queria dois brasileiros na lista.

E-mail 


De Obama.edu para Dilma.gov: Companheira, nós nos falamos na segunda e esqueci de mencionar que, ao ser eleito, tinha que escolher entre três nomes para cuidar da economia: Timothy Geithner, Lawrence Summers e Paul Volcker. Dei um jeito, botei um na Secretaria do Tesouro e acomodei os outros dois no governo. Na noite de terça recebi a conta, mandada pelos eleitores. Saudações do Barack. 

GOSTOSA

JANIO DE FREITAS

A história perdida
JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10



A história que o PSDB não defende é aquela que lhe deu vida para ser o partido da "social-democracia"

ENTRE AS MUITAS reordenações que os resultados eleitorais vão trazer ao quadro das forças políticas, a mais interessante promete ser a da face e destino que os senhores do PSDB, por deliberação ou por omissão, querem legar ao seu partido.
A batalha que Michel Temer considera iniciada, para tirar do PMDB a marca (e a obsessão) de partido do fisiologismo, também oferece interesse, temperado por ceticismo. Interesse não suscitado pelo PT, onde não há ilusões de que se imponha a Dilma Rousseff e vicejam apenas esperanças de bom convívio; nem pelo PSB, em momento de indigestão com seis governadores eleitos e, ainda, com sua bandeira social à espera de passar de certo fisiologismo da direção para a presença visível no jogo político. A situação do PSDB é, sem dúvida, a mais atraente de observação.
Fernando Henrique Cardoso e Aécio Neves, antes mesmo de completada uma semana das eleições, tornaram públicas suas cobranças de redefinições grandes no partido. O primeiro, entre sucessivas alfinetadas, menos ou mais explícitas, a José Serra e à atualidade peessedebista, deixa em uma frase o resumo conveniente: "Não estou disposto mais a dar endosso a um PSDB que não defenda a sua história". O outro, com visão impessoal, quer nada menos do que "a refundação" do partido.
A história a ser defendida, como Fernando Henrique deixou claro, é a do seu governo, que José Serra e a campanha do partido, pelo país afora, mais uma vez acharam necessário não relembrar ao eleitorado. A exceção se deu na campanha paulista do senador eleito Aloysio Nunes Ferreira, que juntou à sua uma foto de Fernando Henrique. A isso ficou atribuída a votação recordista do candidato, mas, para tanto, foi escondida a farta contribuição da transferência dos votos de Orestes Quércia, feita pelo próprio ao se retirar, para Nunes Ferreira.
Essa aliança de José Serra e do PSDB com Orestes Quércia é simbólica da reviravolta imposta pelos senhores do peessedebismo ao seu partido: o PSDB foi fundado como recusa de um grupo do PMDB de São Paulo a conviver, nem que apenas partidariamente no PMDB, com Orestes Quércia. A história que o PSDB não defende é, portanto, muito mais que a do governo Fernando Henrique. É aquela que lhe deu vida para ser o partido "da social-democracia".
Tal história se encerrou no momento em que Fernando Henrique, em sua primeira candidatura à Presidência, chama o PFL para uma aliança e até lhe dá a candidatura a vice. Desacordo histórico, partidário e ético agravado pela desnecessidade da aliança, porque o motor eleitoral do Plano Real se bastava e, também por isso, o PFL estava condenado a apoiar o candidato do PSDB, qualquer que fosse, contra Lula.
A aliança não se desfez mais. No governo Fernando Henrique, o PFL, por intermédio dos Magalhães da Bahia e outros, tornou-se muito mais influente na Presidência do que o PSDB. José Serra, crítico daquela aliança, copiou-a, inclusive fazendo entrega de candidaturas a vice ao PFL, com esta denominação e já como DEM.
A identidade do PSDB desmoronou antes de consolidar-se. E outra se formou, em escalada de degraus nítidos. Os primeiros, nos dois mandatos de PSDB-PFL; depois, na candidatura extremada de José Serra contra Lula em 2002; em seguida, na de Geraldo Alckmin e nas candidaturas e administrações de Serra em São Paulo.
A recente candidatura de José Serra consolidou a imagem que o PSDB difundiu, de si mesmo, nos últimos 15 anos: cada vez mais, o partido da centro-direita ou direita moderada. Ocupante também do espaço deixado pelo DEM por evaporação.
Nesse PSDB em que Serra pretende ter o papel de relevância, como indicou nas falas pós-eleitorais aqui e agora na França, a proposta de Aécio Neves é de difícil execução. E, seja ou não aceita pelos demais senhores do PSDB, tende a uma confrontação da qual saia alguma novidade interessante. Para o PSDB ou para Aécio Neves e uma corrente de insatisfeitos silenciosos.

GAUDÊNCIO TORQUATO

O amanhã de Lula, Serra e Marina
Gaudêncio Torquato 
O Estado de S.Paulo - 07/11/10


A pergunta passa a frequentar a mesa política: o que farão, sem mandato, Luiz Inácio Lula da Silva, José Serra e Marina Silva? Os cenários desenhados pela resposta, por mais coloridos que sejam, deixam espaços em branco, porquanto entre os fatores que ajudam a tornar viáveis metas na arena política há aqueles que passam ao largo da vontade das pessoas. São os fatores imponderáveis que decorrem de circunstâncias temporais. O ciclo de vida de um ator político decorre, em primeiro lugar, dos vetores de força que o sustentam, entre os quais a motivação, a história, o domínio sobre a situação e o controle exercido sobre outros atores. Quanto à motivação, Lula, Serra e Marina dão mostras de que não pretendem abandonar tão cedo a competição. Dispõe cada qual de capital acumulado para gastar em futuros empreendimentos. O presidente da República sai da liça como responsável direto pela vitória de sua candidata; o ex-governador paulista brande o argumento de que, apesar da derrota, sua candidatura propiciou a eleição de oito governadores tucanos e dois do DEM, cuja administração abrigará 52% da população e mais de 50% do produto interno bruto (PIB) nacional. Já Marina, com quase 20% dos votos válidos, levanta o troféu da força moral, sendo este, por si, patrimônio suficiente para abrir frestas nas portas do amanhã.

O presidente que dá adeus reúne condição excepcional para alargar os horizontes. Governante dos mais admirados da História brasileira, com prestígio comparável ao de Getúlio Vargas e agora arquiteto da vitória de Dilma, esse último exemplar carismático estabeleceu simbiose tão intensa com o poder que não se imagina longe dele por muito tempo. Com 84% de aprovação, Lula dispõe de densa camada de gordura para queimar no caldeirão político. Intuitivo e perspicaz, afasta-se da pupila, num primeiro momento, para que ela desenvolva sua própria identidade. Um dos maiores desafios de um governante é fixar a marca pessoal, a maneira própria de comando, diferencial indispensável para angariar credibilidade. O "paizão" se esmerará na cautela, seja para não ofuscar os espaços da nova governante - e ser queimado pelo flash midiático -, seja para ela se sentir à vontade no exercício da autoridade. Mas prezará ser solicitado para emprestar seus saberes nos campos da política, da administração e da malícia, dando conselhos, sugerindo, orientando ajustes. E não se espere o desfecho, por alguns apregoado, da "criatura voltando-se contra o criador", no figurino Fleury contra Quércia ou Pitta contra Maluf. E a razão é a morfologia partidária: o PT, mais que uma sigla, é uma religião. Impõe dogmas. Voltar-se contra o Senhor dos Senhores seria a maior traição ao partido. Um suicídio.

Diferentemente de Fernando Henrique Cardoso, que encerrou o ciclo da representação popular por achar concluída a sua missão, Lula não se vê fora da política. E mais, da política militante, que exerce com desenvoltura desde os tempos do sindicalismo. Seu hábitat é o palanque, sua voz é a corneta de mobilização e seu prazer é o convívio com a massa, de onde extrai a vitamina que oxigena seu espírito. Não conseguirá viver longe de plateias. Correrá o mundo, a partir do continente africano, e, como caixeiro-viajante, vai "vender" os programas sociais que implantou. Sua fama abrirá portões. Se quiser, poderá comandar ações internacionais nas frentes sociais e de solidariedade. Mas seu foco continuarão a ser os fundões do País, onde criou profundas raízes desde os tempos das Caravanas da Cidadania. Por isso não se descartam novas viagens de Lula pelo território nacional, agora sob o argumento de avaliar a seara plantada. E apurar a temperatura social. Nisso é um craque. Entre viagens, aqui e alhures, palestras e encontros, Luiz Inácio disporá de tempo para reorientar rumos do PT e harmonizar as alas, que vivem em dissensão. O terceiro olho - o do meio da testa - contemplará horizontes mais largos. Céu de brigadeiro ou nuvens cinzentas, nas margens de 2014, ajudarão a balizar a decisão de voltar ou não à trilha de Brasília, que tão bem conhece.

José Serra, por sua vez, dispõe de um capital que tende a se esvair ao longo do tempo. No curto prazo, os recursos acumulados têm alto poder de compra. Basta anotar que a população se dividiu quase meio a meio, com parcela ponderável adquirindo suas ações. O ex-governador, porém, amarga duas derrotas para a Presidência e, diferentemente de Lula (que também as experimentou), não tem o carisma deste. Nem a proteção do cobertor social costurado pelo lulismo. Teria à disposição daqui a dois anos o amplo espaço da Prefeitura de São Paulo. Seria certamente forte candidato, ancorado no recall da candidatura presidencial. Tal opção, porém, soaria como um passo atrás. O "até logo" com que agradeceu aos eleitores pode ser entendido como "voltarei assim que for possível". Acontece que sua visibilidade de árvore mais alta na floresta tucana faz sombra ao florescimento de novos exemplares. Seu desafio é o de se encaixar no projeto de renovação do PSDB. O partido está a exigir uma reaprendizagem na forma de fazer oposição, tentando chegar às massas, das quais nunca se aproximou.

De Marina Silva, que se saiu bem na radiografia eleitoral, espera-se papel de indutora de novos ideários, a partir do engajamento de conjuntos médios formadores de opinião e da mobilização de segmentos jovens. Dispõe ela de boa reserva de carisma, acentuado por sua estética que evoca Gandhi. Sua ação poderá ser amplificada por núcleos da intelligentzia e setores engajados na causa ambiental. Identifica-se, ainda, com a bandeira ética, que se apresenta como símbolo da louvação nacional. A acriana terá sempre boa acolhida nos palcos das grandes metrópoles e, caso mantenha a visibilidade, poderá credenciar-se como contraponto aos valores da velha política.

Lula, Serra e Marina, todos de origem modesta, terão um novo encontro marcado com o poder. Se faltarem ao compromisso, será por circunstâncias maiores que a sua vontade.

JORNALISTA, É PROFESSOR TITULAR DA USP E CONSULTOR POLÍTICO E DE COMUNICAÇÃO

REGINA ALVAREZ

Tripé de Dilma
REGINA ALVAREZ
O GLOBO - 07/11/10


A presidente eleita Dilma Rousseff já declarou muitas vezes que não pretende alterar os fundamentos da política econômica, baseada no tripé de metas de inflação, câmbio flutuante e superávit primário, mas quem conhece a visão de seus conselheiros mais próximos nessa área deduz que a execução da política vai ganhar um toque de ousadia.

Dilma precisa manter a inflação sob controle e o país crescendo firme e forte, pois foram essas conquistas - a primeira herdada do governo anterior - que viabilizaram a sua vitória.

Sem o céu de brigadeiro na economia, só o carisma de Lula provavelmente não seria suficiente para eleger sua sucessora.

Mas existem entraves à manutenção sustentada e duradoura do crescimento, que não são triviais.

O economista Antonio Corrêa de Lacerda, da PUCSP, aponta o câmbio e os juros como os principais nós que precisam ser desatados pelo novo governo. E mais ousadia é o que sugere para desatar esses nós.

O câmbio flutuante não impede, na sua opinião, que a equipe econômica adote medidas mais ousadas para conter o derretimento do dólar frente ao real. Medidas, que, inclusive, nem podem esperar pela posse da nova presidente.

O governo poderia aumentar a intervenção no mercado, a tributação, fixar prazos mínimos de permanência dos investimentos externos no país e usar o Fundo Soberano como uma linha auxiliar nessa batalha, evitando que parte dos dólares que o país atrai seja internalizada, sugere.

Em relação aos juros, Lacerda é categórico: - Não tem justificativa para essa taxa de juros absurda - afirma.

Na sua visão, é necessário introduzir no sistema de metas de inflação um componente novo, que considere a conjuntura internacional.

- Se o mundo mudou , as convicções têm que mudar, como diria Keynes - observa.

A conta de juros chegou a R$ 185 bilhões até julho em 12 meses, lembra o economista.

Portanto, qualquer economia nessa despesa teria impacto positivo na dívida e no déficit público.

Lacerda diz que a política atual é manca, pois busca segurar o câmbio, de um lado; e oferece aos mercados juros elevadíssimos,de outro. É como apagar incêndio usando gasolina.

A questão fiscal, na sua visão, poderia ser equacionada com uma trava nos gastos correntes para os próximos quatro anos, de modo que cresçam abaixo da variação do PIB.

Só o fato dessa questão cambial entrar nas discussão da cúpula já é muito importante. Construir consensos é mais difícil (em relação ao G-7) e não há nada de errado nisso. É um grupo muito maior com países muito diferentes" - embaixador Marcos Galvão, sobre a reunião do G-20

Simbolismo

A informação mais esperada pelo mercado é o cargo e atribuições que o deputado Antonio Palocci terá no governo de Dilma Rousseff. Na campanha, Palocci atuou como uma espécie de fiador da política econômica da candidata, engrossando a lista de admiradores entre empresários e banqueiros, especialmente os paulistas. Sua escolha para coordenador técnico da transição confirma o prestígio junto à presidente eleita, mas o papel no futuro governo ainda é um ponto de interrogação.

"Qual será a efetiva política fiscal do governo Dilma é uma das maiores preocupações dos agentes econômicos.

Como a presidente enfrentará politicamente a necessidade de ajuste fiscal e qual seu efetivo empenho nesta direção é uma incógnita", destaca análise de conjuntura da MB Associados, que também reflete a ansiedade do mercado em relação ao destino de Palocci, concluindo que o deputado e ex-ministro "será essencial na intermediação política e na definição da política econômica."

Bate e volta

Vejam no gráfico como não é fácil a vida do presidente do BC americano, Ben Bernanke. Ele já despejou cerca de US$ 1,6 trilhão no mercado, mas a maior parte desse dinheiro voltou para o próprio Fed. É que os bancos não estão repassando todo o crédito a empresas e consumidores, mas depositando os recursos como reservas, o que provoca um empoçamento de liquidez. "Com isso, a oferta de crédito não cresce a contento e a demanda potencial por esse capital fica restrita", diz Luis Otávio Leal, do banco ABC Brasil.

COM ALVARO GRIBEL

DILMA CABEÇA OCA

ELIANE CANTANHÊDE

Por quê? Porque Lula quer
ELIANE CANTANHÊDE
FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10



BRASÍLIA - A candidata Dilma ainda está quente, e a presidente eleita Dilma já sinaliza a possibilidade de ressuscitar a CPMF -algo sobre o qual não abrira a boca durante toda a longuíssima campanha.
Isso causa, evidentemente, o maior rebuliço na opinião pública, nos partidos aliados, nos governistas, nos mercados. Há um desequilíbrio entre ônus e bônus.
O bônus econômico é questionável. Primeiro, porque a receita da Saúde se manteve praticamente estável antes, durante e depois da CPMF. Segundo, porque a arrecadação vai muito bem, obrigada. A receita cresceu duas vezes mais que a CPMF nos dois mandatos de Lula. Dilma precisa de mais imposto?
O mercado acha que não. Apesar de ter jogado todas as fichas e simpatias na candidatura de Dilma, de "esquerda", já está reagindo. Nem se sabe ainda se a CPMF voltará, mas os juros disparam na Bolsa de Mercadorias e Futuros.
E o ônus político pode ser pesado. Trazer a CPMF de volta à pauta é mexer com o bolso e com a emoção de quem paga a conta e dar de presente uma boia para a oposição se agarrar, particularmente o DEM. É também excitar o ambiente entre os dez partidos aliados, a dois meses da troca de governo, com todos eles se estapeando por cargos.
Principalmente, cria mais um teste de fogo para Dilma, que já tem mil problemas para se preocupar e cujo forte não é exatamente o jogo de cintura e a negociação política.
Se é uma temeridade política sem contrapartida econômica, resta uma conclusão: a CPMF é mais um voluntarismo de Lula. Com tantas vitórias, ele não suporta a ideia de conviver com essa doída derrota no Congresso e quer rebobinar o filme. Depois de "caçar" adversários e conclamar o "extermínio" da oposição, agora quer vingança.
Simultaneamente, Lula faz pronunciamento na TV propondo que oposição e governo respeitem-se mutuamente e divirjam de "forma madura e civilizada". Parece piada.

ALDO REBELO

Monteiro Lobato no tribunal literário

ALDO REBELO



FOLHA DE SÃO PAULO - 07/11/10


Se o disparate prosperar, nenhuma grande obra será lida por nossos estudantes, a não ser que aguilhoada pela restrição da "nota explicativa"



O parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE) de que o livro "Caçadas de Pedrinho" deve ser proibido nas escolas públicas, ou ao menos estigmatizado com o ferrão do racismo, instala no Brasil um tribunal literário.
A obra de Monteiro Lobato, publicada em 1933, virou ré por denúncia -é esta a palavra do processo legal-de um cidadão de Brasília, e a Câmara de Educação Básica do Conselho opinou por sua exclusão do Programa Nacional Biblioteca na Escola.
Na melhor das hipóteses, a editora deverá incluir uma "nota explicativa" nas passagens incriminadas de "preconceitos, estereótipos ou doutrinações". O Conselho recomenda que entrem no índex "todas as obras literárias que se encontrem em situação semelhante".
Se o disparate prosperar, nenhuma grande obra será lida por nossos estudantes, a não ser que aguilhoada pela restrição da "nota explicativa" -a começar da Bíblia, com suas numerosas passagens acerca da "submissão da mulher", e dos livros de José de Alencar, Machado de Assis e Graciliano Ramos; dos de Nelson Rodrigues, nem se fale. Em todos cintilam trechos politicamente incorretos.
Incapaz de perceber a camada imaginária que se interpõe entre autor e personagem, o Conselho vê em "Caçadas de Pedrinho" preconceito de cor na passagem em que Tia Nastácia, construída por Lobato como topo da bondade humana e da sabedoria popular, é supostamente discriminada pela desbocada boneca Emília, "torneirinha de asneiras", nas palavras do próprio autor: "É guerra, e guerra das boas.
Não vai escapar ninguém -nem Tia Nastácia, que tem carne negra". Escapou aos censores que, ao final do livro, exatamente no fecho de ouro, Tia Nastácia se adianta e impede Dona Benta de se alojar no carrinho puxado pelo rinoceronte: "Tenha paciência -dizia a boa criatura. Agora chegou minha vez. Negro também é gente, sinhá...".
Não seria difícil a um intérprete minimamente atento observar que a personagem projeta a igualdade do ser humano a partir da consciência de sua cor. A maior extravagância literária de Monteiro Lobato foi o Jeca Tatu, pincelado no livro "Urupês", de 1918, como infamante retrato do brasileiro. Mereceria uma "nota explicativa"?
Disso encarregou-se, já em 1919, o jurista Rui Barbosa, na plataforma eleitoral "A Questão Social e Política no Brasil", ao interpretar o Jeca de Lobato, "símbolo de preguiça e fatalismo", como a visão que a oligarquia tinha do povo, "a síntese da concepção que têm, da nossa nacionalidade, os homens que a exploram".
Ou seja, é assim que se faz uma "nota explicativa": iluminando o texto com estudo, reflexão, debate, confronto de ideias, não com censuras de rodapé.
O caráter pernicioso dessas iniciativas não se esgota no campo literário. Decorre do erro do multiculturalismo, que reivindica a intervenção do Estado para autonomizar culturas, como se fossem minorias oprimidas em pé de guerra com a sociedade nacional.
Não tem sequer a graça da originalidade, pois é imitação servil dos Estados Unidos, país por séculos institucionalmente racista que hoje procura maquiar sua bipolaridade étnica com ações ditas afirmativas.
A distorção vem de lá, onde a obra de Mark Twain, abolicionista e anti-imperialista, é vítima dessas revisões ditas politicamente corretas. País mestiço por excelência, o Brasil dispensa a patacoada a que recorrem os que renunciam às lutas transformadoras da sociedade para tomar atalhos retóricos.
Com conselheiros desse nível, não admira que a educação esteja em situação tão difícil. Ressalvado o heroísmo dos professores, a escola pública se degrada e corre o risco de se tornar uma fonte de obscurantismo sob a orientação desses "guardiões" da cultura.


ALDO REBELO, 54, jornalista, é deputado federal pelo PC do B de São Paulo.

GOSTOSA

VERISSIMO

Não riram
VERISSIMO

O GLOBO - 07/11/10

O filme italiano Vincere, do Marco Bellochio, é sobre uma das mulheres na vida do Mussolini. Inclui documentários da época da ascensão do fascismo e cenas reais do Mussolini no poder, discursando ou fazendo suas poses de Duce para multidões delirantes. Se não fosse a diferença na qualidade das imagens, apesar do ótimo trabalho de restauração feito no material de arquivo, você poderia jurar que o Mussolini dos documentários é que é o falso, um péssimo ator num desempenho caricato e inverossímil, e não o que o interpreta no filme. E no entanto este bufão mandou e desmandou durante vinte anos numa das grandes civilizações da Europa. Mais do que estranhar o fato da terra de Goethe e Bach ser também a terra da Gestapo e uma grande tradição renascentista e humanista não ter impedido o nascimento do fascismo, o que espanta, tanto na Alemanha do também caricato Hitler quanto na Itália de Mussolini, é a consagração do ridículo. O triunfo da histrionice fascista dependeu, antes de mais nada, de uma suspensão do senso de ridículo da plateia. Milhões morreram porque milhões não riram quando deveriam
O que nos traz ao Berlusconi. O atual primeiro-ministro italiano lembra Mussolini tão pouco quando a Frau Merkel lembra Hitler, mas sua chegada reincidente ao poder também dependeu de uma inexplicável pane no espírito crítico italiano. Se há um líder ocidental cujo caráter está exposto na cara é o Berlusconi, e no entanto, de novo, não riram, e o seguiram. Ou então, os tempos sendo outros, talvez o eleitor italiano tenha conscientemente escolhido o mais ridículo para se divertir e fazer uma profissão de desencanto. Depois de tantos anos de bagunça política, de tanta hipocrisia democrata-cristã e socialista, manter no poder um “mascalzone” explícito, representando nada mais do que os seus próprios bolsos, é uma forma de protesto. Apoiando um empreendedor sem escrúpulos bem-sucedido a maioria dos italianos teriam aderido ao cinismo da época, que também não deixa de ser um antídoto para a hipocrisia. No caso, estariam rindo com ele.
Vincere, por sinal, é um belo filme, na linha do cinema político que fazia na Itália, melhor do que ninguém, a geração do Bellochio. Ele deve estar 
com seus 70 anos. Continua em forma.

CLÁUDIO HUMBERTO

“...que governo e oposição respeitem-se mutuamente”
PRESIDENTE LULA EM PRONUNCIAMENTO NA TELEVISÃO, APÓS PREGAR A “EXTINÇÃO” DO DEM

CHÁVEZ ENROLA O BRASIL NA REFINARIA ABREU E LIMA 
O presidente falastrão da Venezuela, Hugo Chávez, continua enrolando sem desembolsar um centavo na construção da refinaria petrolífera de Abreu e Lima, em Pernambuco. Ele influenciou na escolha do local, para instalar a refinaria, cuja pedra fundamental foi lançada em 2005, e assumiu o compromisso de bancar 40% da obra. Mas até agora só a Petrobras tem investido no projeto estimado em US$ 13 bilhões. 

SUPERFATURAMENTO 
O Tribunal de Contas da União chegou a constatar superfaturamento, há um ano, de R$ 234 milhões nos custos de construção da refinaria.

MAIS SUSPEITAS 
Na CPI da Petrobras, de 2009, que deu em nada, quatro contratos, no total de R$ 2,7 bilhões eram também suspeitos de superfaturamento.

DECISÃO CONJUNTA 
O ex-jornalista e ministro Franklin Martins (Propaganda) queria ser conselheiro e presidente da Anatel, mas foi barrado por Lula e Dilma.

CURA AGRADÁVEL 
A prefeita de Natal, Micarla Sousa (PV), foi curar em Miami a ressaca eleitoral pela derrota do marido Miguel Weber para deputado estadual. 

PROCURADORES VÃO AO ‘SACRIFÍCIO’... EM BÚZIOS 
Entre os dias 18 a 21, procuradores da Fazenda Nacional vão ao sacrifício pela Pátria no balneário de Búzios (RJ), a pretexto de discutir Desenvolvimento Sustentável e Tributação. Fazem isso desde 2001, sempre em paraísos como Angra dos Reis (RJ), Costa do Sauípe (BA), Costão do Santinho (SC), Porto de Galinhas (PE), Maragogi (AL), com a presença de autoridades igualmente interessadas no tema.

PATRIOTAS 
Os ministros Nelson Jobim (Defesa), José Dias Toffoli (STF) e Luis Adams, advogado-geral da União, já foram ao “sacrifício” em paraísos.

GLICOSE 
É doce a vida dos senadores: consumiram R$ 23 mil em açúcar cristal, ano passado. Em comidinhas, biscoitinhos e afins foram R$ 143,7 mil. 

BOROCOXÔ 
Derrotado nas urnas, Mão Santa (PSC-PI) perdeu o entusiasmo. Já não ocupa a mesa principal no Senado. Fica distante dos holofotes.

EX É PARA SEMPRE 
Ex-marido de Dilma Rousseff, Carlos Araújo, em conversas com jornalistas, tem se revelado um leão na defesa da ex-mulher, e avisa aos navegantes: cairá o cavalo quem achar que pode mandar nela.

LOROTA DO DIA 
Humilhado nas urnas, Alfredo Nascimento não perde a pose e espalha no Amazonas que voltará ao Ministério dos Transportes. O governador Omar Aziz foi reeleito com 64% dos votos; Nascimento teve só 25%.

BANDEIRA AMARELA 
Na temporada de intrigas para a eleição da mesa diretora do Senado, a cúpula do PT só se refere ao senador Renan por “Rubinho Calheiros”, pelo seu segundo lugar para senador, em Alagoas. Quanta maldade...

SEM OPOSIÇÃO 
Ao dizer que o PSDB não fará a Dilma a oposição implacável que o PT fez ao governo FHC, o senador eleito Aécio Neves (MG) joga a toalha. Afinal, foi aquele PT “implacável” que destronou o PSDB do poder. 

PROFISSIONAIS 
Enquanto se especulava sobre o “apetite do PMDB” por ministérios, o vice-presidente eleito Michel Temer tentou garantir, junto ao presidente do PT, apenas a eleição do amigo Henrique Alves (RN) para presidir a Câmara por um biênio. Temer só discutirá ministérios com Dilma.

CAMPEÕES DE VOTOS 
Por sua atuação na CPI da Conta de Luz, o deputado Eduardo da Fonte (PP) obteve mais de 330 mil votos em Pernambuco. Ele só perdeu para a campeã, deputada Ana Arraes (PSB), com 387 mil votos.

LEI JADER
Jáder Barbalho (PMDB-PA) acha que a Lei da Ficha Limpa até poderia ser batizada com seu nome. Acha que foi feita para impedir sua eleição para o Senado. Seus 1,8 milhão de votos foram jogados no lixo. 

ESTRANHA ALIANÇA 
A frase do deputado ACM Neto (DEM-BA) explica o flerte, antes impensável, entre o “carlismo” e o governador baiano Jaques Wagner (PT): “É melhor ser cabeça de lagartixa do que rabo de crocodilo”. Mas a aliança é um autêntico casamento de jacaré com cobra d’água.

AVATAR 
Pelo andar da carruagem lulista na transição, teremos uma presidente de direito e um presidente de fato a partir de 1º de janeiro? 

PODER SEM PUDOR
PÓSTUMAS E PRÉVIAS 
Então vereador em Divinópolis, Dé Pasteleiro ganhou lugar no folclore político mineiro ao propor suas “mudanças”. Chegou a anunciar um projeto trocando o nome do Tiro de Guerra, guarnição do Exército brasileiro, para “Tiro da Paz”. Certa vez, aproveitando o minuto de silêncio proposto por um colega, em memória de um morto ilustre, Dé Pasteleiro não teve dúvida: estendeu a homenagem às pessoas que iriam morrer nos trinta dias seguintes.