domingo, janeiro 17, 2010

DANUZA LEÃO

Delicias do passado

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


QUE COISA boa é um telefone, e melhor ainda quando ele toca. Quando isso acontece, sempre penso que vai ser uma notícia maravilhosa, um convite com o qual nunca sonhei, de tão bom, alguém que eu pensava que nunca mais, e de repente ouvir aquela voz querida e dar risada, de tanta felicidade. Mesmo com o celular -não o meu, que está sempre com a bateria descarregada-, o Blackberry, o e-mail e todas as novidades que surgem a cada semana, nada melhor do que um bom telefone, de preferência preto, pesado, com fio, sem bina, sem secretária eletrônica, de discar, e não de teclar, tocando bem alto: nesses a gente confia. E pode ser levada a sério uma mensagem que só pode ter 140 toques?
Fico pensando no tempo em que o telefone ainda não existia. Segundo os livros da época, havia então os "moleques de recado", garotos cuja função era cruzar a cidade várias vezes por dia, levando um bilhete ou um simples recado. Quando vieram os primeiros telefones, era sinal de status ter um em casa. Lembro que em Vitória, onde eu morava, eles tinham apenas três números; o nosso era 674 -como é que eu fui lembrar disso?- e o aparelho (nada de extensão) ficava na sala, preso na parede.
Quando se tirava o fone do gancho, atendia uma telefonista, a quem se dizia com que número se queria falar. Ela fazia a ligação ou, se fosse o caso, dizia que o telefone estava ocupado, para ligar mais tarde. Dá para acreditar que era assim? E os interurbanos então?
Com esses, era assim: de manhã você pedia uma ligação para um determinado número em São Paulo, por exemplo, e marcava para as 8h da noite, geralmente de pessoa para pessoa; isso significava que a telefonista faria a ligação e diria que havia uma chamada de tal cidade, de tal pessoa, querendo falar com a pessoa tal. Se ela não estivesse, a ligação não seria completada, e só para explicar: ligações interurbanas, só pedindo com antecedência, geralmente de umas 12 horas. Imagine o que era um telefonema internacional.
Se os interurbanos já eram um luxo a que só alguns tinham acesso, os internacionais, então, nem se fala. Para começar, uma hora antes da hora marcada (de véspera), a telefonista ligava e confirmava que a ligação seria completada na hora programada -ou não. A partir daí, ninguém podia ocupar o telefone, e quando chegava o tão esperado momento, não havia lugar para nenhuma emoção, pois o som era tão ruim, ouvia-se tão mal, que só se queria uma coisa: ouvir melhor. Um "estou com saudades" não tinha nada a ver, pois precisaria ser repetido três, dez vezes, aos gritos, até que o de lá entendesse. Quando acontecia um telefonema internacional, todas as pessoas da casa ficavam em volta, para presenciar o milagre.
Como não se podia contar muito com o telefone, havia os telegramas, que eram assim: para mandar, você ia ao correio e procurava fazer o texto mais curto que pudesse, pois pagava-se por palavra. Quando o estafeta -minha memória hoje está tinindo- batia na porta, era um momento sério em qualquer casa. Telegramas eram para desejar feliz aniversário, anunciar um nascimento ou uma morte. Alguém assinava o recibo e todos se reuniam gravemente para ouvir a leitura, sabendo que boa coisa não devia ser.
Agora, quando eu falo pelo Skipe com Paris e ainda vejo o rosto do meu interlocutor, acho a coisa mais natural do mundo. Mas quando tento comprar um telefone e só encontro aqueles que se você puxar o fio o aparelho vai junto, morro de saudades daqueles bem pesadões. E de muitas outras coisas.

AI QUI

JOAQUÍN MORALES SOLÁ

Argentina: mandar todos embora, outra vez?

O GLOBO - 17/01/10


O ex-presidente argentino Eduardo Duhalde (janeiro de 2002 a maio de 2003) costuma dizer que a sociedade argentina parece caminhar para uma etapa na qual reclamará outra vez que se vayan todos. Dramatismo? Uma simples especulação para que os argentinos voltem a olhar para ele? A intenção de Duhalde pode ser uma dessas ou qualquer outra. O dilema crítico da política é, no entanto, que uma recente sondagem nacional sobre o estado da opinião pública dá razão ao ex-presidente.

A pesquisa foi feita por uma das mais prestigiosas empresas de análises de opinião pública, reconhecida por seus recentes acertos nos prognósticos eleitorais.

Segundo essa medição, concluída há poucos dias, os conflitos da política são, para a maioria social, o terceiro problema do país, depois da insegurança pública e do desemprego (que voltou a se alojar em um dos principais lugares da preocupação social).

A essa crítica da sociedade à política deve-se acrescentar outro resultado alarmante: uma enorme maioria (cerca de 70%) acredita que o país estará igual ou pior no futuro imediato. Se os conflitos da política são um problema e se o que vem é pior que o que está aí, onde haveria um mínimo capital político em condições de reconstruir a ilusão social? Encontrar as partículas desse capital intangível é o maior desafio atual da política.

A democracia necessita existencialmente da política, mas é a política que deve sedimentar-se como uma solução e não como um problema para os argentinos, cansados de crispações e enfrentamentos, segundo se deduz da pesquisa.

A crise da política se nota, inclusive, na valoração dos principais líderes. O mais popular de todos é o vice-presidente da República, Julio Cobos, mas ele só detém 44% de imagem positiva. A presidenta Cristina Kirchner chegou a ter mais de 60% quando foi candidata e quando já acumulava quatro anos de gestão de seu esposo (Néstor Kirchner, ex-presidente). Outros líderes políticos (os deputados nacionais Francisco de Narváez, Gabriela Michetti e Ricardo Alfonsín) seguem Cobos muito de perto, com 42% de imagem positiva.

Quando se olha para as intenções de votos para presidente, De Narváez, sim, tem um lugar entre os primeiros presidenciáveis.

Mas ele deve tem um problema com a Constituição: não nasceu na Argentina e o presidente deve ser argentino nato.

O conflito entre a lei e sua ambição só poderia ser resolvido por uma releitura da Constituição por parte da Corte Suprema de Justiça, mas isso ainda não aconteceu e o caso nem está no tribunal.

O primeiro peronista de fato e de direito que aparece no topo é Carlos Reutemann.

Não obstante, o senador da Província de Santa Fé tem insinuado que é provável que nunca se meta na selva implacável da luta presidencial.

Reutemann não tem corpo e nem alma para suportar o rigor de uma campanha presidencial carregada de ambições e candidatos. Outros peronistas (Duhalde, o deputado nacional Felipe Solá ou Néstor Kirchner) estão mais abaixo do que acima das preferências sociais.

Dos governantes que vinham com ambições presidenciais, Daniel Scioli (governador da Província de Buenos Aires) e Mauricio Macri (chefe de governo da Cidade de Buenos Aires), tombaram nas medições de opinião pública.

Scioli caiu muito mais que Macri.

A novidade pode ser também uma contradição com o resto da pesquisa: o principal problema de Scioli e de Macri é que seus erros são produto de uma escassa experiência política.

A reação social às transações da elite política é perceptível, também, quando se olha a lista dos mais impopulares.

Guillermo Moreno (secretário de Comércio) é o personagem público mais impopular do país, seguido de perto por LuisD´ Elía (dirigente da Central de Trabalhadores Argentinos), Hugo Moyano (líder da Central Geral de Trabalhadores) e pelo próprio ex-presidente Kirchner. O poder que atualmente governa está nesse quarteto.

O despótico Moreno é mais importante que o ministro da Economia Amado Boudou na hora de definir rumos da economia. Moyano tem tanto poder como Kirchner, e D‘Elía é a expressão pública e prepotente dos que mandam. É possível ignorar impunemente durante tanto tempo a majoritária opinião social? Surgem também dirigentes com alta popularidade, mas com um enorme desconhecimento público. É o caso do senador Ernesto Sanz, presidente do Partido Radical, que é muito bem avaliado pelos dirigentes políticos e pelos argentinos que o connhecem, mas seis de cada dez consultados dizem não saber nada sobre ele ou sabem muito pouco.

Ocorre o mesmo com o governador de Chubut, Mario Das Neves: cinco de cada dez argentinos não o conhecem.

Os Kirchner estão na linha descendente de que padecem desde a crise com o setor rural, no ano passado. A curva de queda do casal presidencial começou claramente quando hostilizou os produtores do campo. Os Kirchner agora perfuraram o piso de 20% de aceitação, mas sua rejeição supera os 60% da opinião pública. Não há precedente de presidentes que tenham logrado se recompor depois de haver tocado tais índices de impopularidade.

Nem sequer a posibilidade de um 2010 melhor na economia deveria despertarlhes esperanças. Como recordou um analista de opinião pública, o presidente Carlos Menem também teve bons anos econômicos em 1997 e 1998, mas seu contrato com a sociedade já estava definitivamente rompido.

O período de Cristina Kirchner será lembrado por duas circunstâncias: o poder nas mãos de seu marido e a regressão econômica. Caso se concretize o decreto de uso de mais de US$ 6,5 bilhões das reservas cambiais para pagar dívida pública durante 2010, o Banco Central terá perdido uns 20% de suas reservas durante os dois anos de Cristina Kirchner. A presidenta recebeu o governo com US$ 50 bilhões, que se reduziriam a US$ 40 bilhões.

O poder que se fecha nas sombras luta por conservar seu direito à arbitrariedade.

A oposição não é um só partido; tem a dificuldade constante de restaurar seus fragmentos dispersos.

Nada mudaria sem a vocação dos políticos para renovar os estilos, os programas e também as pessoas. Esse é o maior clamor social captado pela recente pesquisa.

Não existem, é certo, todas as condições para outro alarido social buscando que se vayan todos. Mas o risco é demasiado alto. Começar o ano entre tais lamentos, não significa nada. A política não se define pelo invariável trânsito de calendário. Como escreveu Borges, la mañana sólo finge un comienzo (a manhã só finge um começo).

JOAQUÍN MORALES SOLÁ é jornalista do “La Nación”/GDA.

NOTA DA REDAÇÃO: João Ubaldo Ribeiro volta a escrever neste espaço no próximo mês.

MÍRIAM LEITÃO

Amargo começo

O GLOBO - 17/01/10


Foram apenas duas semanas, e o ano já parece velho. Enchentes, deslizamentos e mortes no Rio, em Angra, em São Luiz do Paraitinga alertaram para os riscos que a população urbana corre. Crise institucional na Argentina. Crise econômica e racionamento na Venezuela. Catástrofe no Haiti, país mais pobre das Américas, em dimensões não vistas em 200 anos.

O ano de 2010, que começou cercado de esperanças na área econômica, pesou de repente. A primeira semana foi dolorosamente ocupada pela morte e destruição das tempestades em várias áreas do Brasil. A segunda semana excedeu tudo o que se pudesse imaginar na pior ficção de terror.

O mundo ainda não sabe como sair da tragédia do Haiti, que espanta a todos.

“Desolação e impotência”, diz um jornalista dominicano que tem enviado informações por twitter de lá desde o primeiro momento, com fotos e palavras. Os relatos dos primeiros jornalistas brasileiros que conseguiram chegar lá são aterradores.

Nada parece pior, e mesmo assim se teme pelo pior: uma revolta desesperada pode eclodir a qualquer momento no país que não tem como enterrar seus mortos, resgatar os soterrados, alimentar e dar água aos feridos. Um país que não tem estrutura sequer para receber ajuda.

Um sinal dos tempos extremos foi dado aqui neste jornal. A manchete de quintafeira era “Desespero”. A de sexta-feira era: “Horror, fome e revolta.” A situação é tão limite que o mundo não tem alternativa a não ser superar todos os falsos obstáculos que sempre foram criados entre os países pela lógica mesquinha do cotidiano.

Estados Unidos recebendo permissão do governo de Cuba para usar seu território é o que não se vê há 50 anos. A mobilização pública e privada começa a se formar em dimensão robusta.

Mesmo assim, a luz no fim do túnel tardará para o Haiti. “Hoje, somos todos haitianos”, escreveu em seu twitter a jornalista Kristie lu Stout, da CNN de Hong Kong, e imediatamente o texto foi retuitado no Brasil.

O sofrimento dos haitianos terá que unir os países, eliminar distâncias, superar inimizades e mobilizar organizações e pessoas, porque seu abandono seria o fim da esperança. Se o Haiti não nos comover, nada mais comoverá o mundo.

Além disso, há uma lição prática a se tirar tanto dos desastres do Brasil do começo do ano como da tragédia do Haiti. O que o mundo tem visto com muita frequência é que não está preparado para qualquer evento extremo. Até o país mais rico do mundo pareceu extraordinariamente despreparado para o Katrina, quando o furacão vitimou Nova Orleans.

O que os cientistas estão dizendo é que eventos extremos — inundações, secas, furacões, tempestades violentas, deslizamentos — vão acontecer no mundo com mais frequência e mais rigor.

Terremotos não são fenômenos da mesma natureza, como se sabe. São movimentos de placas tectônicas, para os quais, em alguns países mais ricos, como o Japão, e até a uma certa intensidade, conseguese preparar o país. Impossível é se preparar para algo da magnitude do que houve no Haiti. Ele foi assim tão letal pela pobreza do país.

No Haiti, o que aconteceu foi o encontro de duas tragédias: um violento terremoto num país de privação absoluta. O que fica claro para a maioria das pessoas, só agora, é que o país tinha sido desamparado demais, por tempo demais.

Só recentemente as Forças de Paz da ONU chegaram. O Brasil pode dizer que tem feito seu trabalho de comando das tropas internacionais com extrema diligência, tentando levar o mínimo a um país sem nada. E tinha feito tão bom trabalho que virou uma liderança no país sem nenhuma baixa em combate. As poucas perdas de vida antes do terremoto haviam sido atingidas por acidentes. Agora, o Brasil enlutado vê a volta de militares em caixões e, consternado, chora a morte de Zilda Arns, ícone da solidariedade e da vitória sobre a mortalidade infantil. O fato de que ela estava lá mostra que o Brasil sempre se importou com a tragédia haitiana.

O mundo certamente subestimou o tamanho do desamparo do Haiti.

Mas o alerta dos cientistas não tem sido ouvido.

Fenômenos naturais, mas agravados pelas mudanças climáticas, atingirão mais e mais populações. É preciso ter tecnologia, logística, treinamento para saber como evacuar áreas, como abrigar desabrigados, como receber expatriados. É preciso ter forças de paz cada vez mais treinadas, num mundo que perde ainda tanto tempo, recursos e vidas com os esforços de guerra.

O ano será de boas notícias econômicas que vão apagar um pouco a impressão desse chocante começo. A economia está retomando o nível de atividade no Brasil, e as notícias de aumento de investimento, recorde de vendas, crescimento da arrecadação vão ocupar cada vez mais as páginas da economia.

Há preocupações com sinais de desequilíbrios em alguns países e em certos setores que podem trazer riscos de bolhas e sustos. O debate político-eleitoral vai criar suas polarizações e simplificações, principalmente a partir do segundo trimestre.

Depois, virá a Copa do Mundo com sua torcida. Será um ano cheio de emoções.

Que desse impacto inicial do ano fique o melhor: a capacidade de multiplicar a solidariedade como nos ensinou Zilda Arns, a sabedoria de começar a preparar espaços urbanos para os eventos naturais mais rigorosos que certamente virão, um debate político que não se amesquinhe e procure soluções para os problemas do Brasil. O ano mal começou mas já nos indicou, com seus fatos extremos, o que é essencial na vida.

Saio de férias e vocês ficarão com Regina Alvarez, que já ocupou este espaço.

GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO

DAVID OLIVEIRA DE SOUZA

Que potência queremos ser?

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


Por todos os cantos sopram ventos de um Brasil potência, o que aumenta nossa responsabilidade diante dos gritos da Terra


TERCEIRA semana de 2010. Em algum lugar da África acaba de amanhecer. Sentada no chão de terra de uma enfermaria humanitária, uma mulher segura um bebê enrolado em panos. Eu e você nos aproximamos e afastamos o tecido com cuidado. Para nossa surpresa, não se trata exatamente de um bebê, mas da menina Therése, de sete anos, tão pequena e magra que não tem forças sequer para engolir. Por sua narina passa um cateter que conduz o alimento diretamente ao estômago.
De quem é a culpa por ela ter chegado a esse estado de desnutrição? De Deus, que não usou suas mãos onipotentes para protegê-la? Da natureza, que não trouxe as chuvas no tempo certo? Do mercado, que permitiu o aumento do preço dos alimentos?
Dos países ricos, que negligenciaram a ajuda internacional? Do governo, que não deu apoio à agricultura familiar? Certamente, não de Therése. A tarde começa e o calor nos incomoda. O suor escorre rosto abaixo. Estamos agora num povoado do semiárido brasileiro. Na sala escura de uma casa de taipa, vemos Maria preparando o almoço com o que há disponível: água e um punhado de açúcar. As crianças tomam na garapinha algumas calorias e quase nenhum nutriente. Entretidas na bebida açucarada, não chegam a perceber as lágrimas que deslizam pelo rosto de "mainha". Ela chora porque possui um córtex cerebral humano.
A imagem dos filhos com fome imprime-se em suas retinas, viaja pelo nervo ótico, converte-se em sinal elétrico e espalha-se por milhões de neurônios até chegar ao lobo occipital. Uma cadeia de reações químicas e neuronais chamada emoção é então iniciada. Maria tenta achar uma solução para seus meninos, mas solução não há. Nem comida. Só a sensação de impotência, cada vez mais dolorosa.
Precisamos nos apressar. Ainda temos que chegar a uma megalópole do Sudeste asiático. Chove tanto que eu e você quase escorregamos no lamaçal dos caminhos da favela. A água já invadiu várias casas. Enfim encontramos o barraco onde vivem a menina Abhaiá, seu irmão Gadin e os jovens pais. Com a chegada da noite, apagam-se as distrações que enganaram o estômago das crianças durante o dia. Abhaiá e Gadin pedem comida.
O pai tem matado a fome e a humilhação com as calorias vazias do álcool. Para a mãe, o momento é de solidão e assombro. Ela tenta acalmar os filhos com pedacinhos inventados de esperança, jogos de cena. "Meus amores, vou botar a panela no fogo, já já nossa janta fica pronta." E vai soltando pedras e gravetos dentro do tacho de água fervente enquanto sussurra uma prece: "Tende piedade, senhor.
Fazei com que minhas crianças adormeçam enquanto esperam". As pessoas que acabamos de visitar são reais e, em 2009, pela primeira vez na história seu número superou a marca de 1 bilhão de seres humanos.
A segurança alimentar existe quando toda pessoa, em qualquer tempo e lugar, tem condições de acesso a uma alimentação saudável e em quantidade suficiente para cobrir suas necessidades diárias. A alimentação é um direito humano básico que possui uma característica peculiar: quanto mais privado dele se está, menor é a capacidade de um indivíduo conseguir lutar para fazê-lo cumprir-se. Cada punho que se ergue, cada grito de clamor, cada passo que avança em busca de justiça depende da existência de calorias, nutrientes e células humanas em bom funcionamento nos corpos de seus executores.
Não é à toa que dentre os sinais da desnutrição estão a imobilidade, a expressão apática, a ausência de brilho no olhar e a incapacidade de reagir a estímulos. A fome tende a ser uma dor silenciosa e, por isso, escondida em muitos lugares do planeta.
Durante a última cúpula mundial sobre segurança alimentar, em Roma, os Estados adotaram uma declaração propondo estratégias e ações para erradicar a fome no mundo. Infelizmente, o texto carece de objetivos quantificáveis e prazos precisos, o que faz dele um compromisso inconsistente. Ademais, quase nenhum dos líderes do G8, em tese os principais financiadores das ações propostas na declaração, compareceu ao encontro.
Por todos os cantos do planeta, sopram ventos de um Brasil potência. Tanto otimismo não deve sufocar a necessidade de reflexão que esse momento de crescimento impõe. Como potência, aumenta nossa responsabilidade diante dos gritos da Terra e do sofrimento de pessoas como Maria, Therése, Abhaiá e Gadin.
Como potência, somos chamados a pensar paradigmas cada vez mais comprometidos de ajuda humanitária e desenvolvimento internacional e a procurar por eles inclusive nos programas de governo dos candidatos à Presidência da República.
Como potência, quanta falta nos fará a doutora Zilda Arns! Roma decepcionou com a segurança alimentar, Copenhague fracassou com o clima. Fica valendo para o Brasil a velha pergunta feita a tantos pequeninos: O que você vai fazer quando crescer?

DAVID OLIVEIRA DE SOUZA, 34, médico especialista em medicina de família e comunidade pela Uerj e em clínica médica pela UFRJ, mestre em relações internacionais pelo Instituto de Estudos Políticos de Paris (França), é professor de saúde coletiva da Universidade Federal de Sergipe. Trabalhou com organizações humanitárias em diversos países.

ELIANE CANTANHÊDE

Tarde demais?

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


BRASÍLIA - O colapso do Haiti, que já era o país mais miserável da região, é considerado pelas diplomacias dos EUA e do Brasil como o evento da década nas Américas. À primeira impressão, o Haiti acabou.
Mas, como não pode simplesmente acabar, virou fator de confluência internacional. A união não é mais em torno de guerras, mas da solidariedade. Para os EUA, uma chance única de aproximar sua imagem à de Obama, amenizando o ranço de potência que invade, domina e mata e assumindo a ação que agrega e salva. Para o Brasil, mais um degrau na busca de uma liderança regional.
Os EUA comandam o Haiti e foi por delegação deles que o Brasil assumiu a chefia da Minustah, a missão de paz da ONU. Com o caos, os dois tentam acertar níveis de convivência e de comando, o que não é fácil num momento assim. Há de ciumeira a cotovelada até para definir o controle do aeroporto.
Mas é dessa estreia no Haiti que depende uma parceria estratégia EUA-Brasil para a América Latina e para além dela -na África, por exemplo, onde já têm programas comuns contra a Aids, um dos principais flagelos no continente.
Mais fundamental do que definir o horizonte diplomático, porém, é agir. Milhares de pessoas morreram, 70% dos prédios desabaram, os corpos estão jogados ao tempo. E não há perspectiva. Nem governo, projeto, infraestrutura, hospitais, médicos. Aliás, nem remédios, comida e água. Saques e epidemias são inevitáveis.
Os EUA doam US$ 100 milhões, o Brasil, US$ 15 milhões, nossa Gisele Bundchen, US$ 1,5 milhão. Somados governos, empresas e astros, isso vai à casa dos bilhões. Mas para quem gerir? E para o quê? Enterrar os mortos, salvar os vivos e construir o país? Como? Foi preciso a desgraça total para o mundo olhar e acordar para o Haiti.
A dúvida é se não foi tarde demais, e o desafio dos EUA e do Brasil é mostrar que não. Se puderem.

JAPA GOSTOSA

BRASÍLIA -DF

Pacto de conveniência

Luiz Carlos Azedo
CORREIO BRAZILIENSE - 17/01/10

A cúpula do PMDB fará um encontro na próxima semana, em Brasília, para acertar os ponteiros em relação à eleição do novo diretório nacional da legenda. Escaldados, o presidente do Senado, José Sarney (AP), e o líder da bancada de senadores, Renan Calheiros (AL), não querem marola com a bancada da Câmara, controlada pelo presidente da Casa, Michel Temer (SP), e o líder Henrique Eduardo Alves (RN), com apoio dos deputados Eduardo Cunha (RJ) e Eunício de Oliveira (CE). Uma divisão entre eles pode abrir espaço para que a ala oposicionista encabeçada pelo ex-governador Orestes Quércia (SP) e os senadores Jarbas Vasconcelos (PE) e Pedro Simon (RS) ganhe força na legenda e acabe inviabilizando a coligação com o PT em torno da candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff.

É um pacto de conveniência. Porém, robusto o suficiente para impor condições ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A primeira delas é a indicação do vice, posição que a bancada na Câmara insiste em pleitear para o presidente licenciado da legenda, Michel Temer, apesar de Lula já ter mandado recado de que prefere outro nome, no caso o ministro das Comunicações, Hélio Costa (PMDB). Na cúpula da legenda, a indicação do ministro peemedebista não passaria de uma manobra para desobstruir o caminho do ex-prefeito de Belo Horizonte Fernando Pimentel ou do ministro do Desenvolvimento Social, Patrus Ananias, ambos petistas, ao governo de Minas.

Trauma// As tropas brasileiras no Haiti, cujo rodízio deveria ter sido iniciado na quarta-feira, voltarão ao país a partir da próxima semana. Todos os soldados da força de paz serão substituídos por um novo contingente que já está mobilizado no Brasil. Se houver aumento das tropas, não será mantendo por lá os que sobreviveram ao terremoto.

Restituição

A Receita Federal do Brasil libera amanhã mais um lote residual do Imposto de Renda Pessoa Física 2006, ano-calendário 2005. Dos 19.558 contribuintes, terão direito à restituição 2.511, que receberão um montante total de R$ 5.612.892,50

Hamlet

Muito bem avaliado nas pesquisas, o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), está em dúvida se permanece no cargo até o fim do mandato ou concorre a uma cadeira no Senado. Seu problema é a disputa entre o vice-governador Ricardo Ferraço (PMDB), seu candidato, e o ex-prefeito Luiz Paulo Vellozo Lucas (PSDB), o amigo dissidente. O senador Renato Casagrande (PSB) somente será candidato com o apoio do PT, mas o prefeito de Vitória, João Coser (PT), já apoia Ferraço.

Dois estados

Minas e Bahia são os estados onde as relações do PMDB com o PT estão mais tensas. A bancada mineira é a segunda em delegados na convenção nacional e não está disposta a abrir mão da candidatura própria para apoiar um candidato petista ao governo de Minas. Na Bahia, o ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima (PMDB), e o governador petista Jaques Wagner continuam em rota de colisão. Hélio e Geddel têm a solidariedade dos caciques do PMDB que apoiam Dilma.

Candidato à reeleição, o governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), jogou para escanteio: o senador Marcelo Crivella, do PRB, está fora de sua chapa ao Senado. A preferência é para o presidente da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani (PMDB), e o prefeito de Nova Iguaçu, Lindberg Farias (PT). O petista, porém, precisa disputar a vaga com a ex-governadora Benedita da Silva.

A candidatura do ex-ministro da Integração Nacional Ciro Gomes a presidente da República está mesmo por um fio. A cúpula do PSB começa a dar sinais de que não vai sustentá-la até março, prazo que lhe foi dado para consolidá-la. A bancada federal na Câmara, principal sustentáculo de sua candidatura, começa a se dar conta de que Ciro foi isolado pelo Palácio do Planalto. O governador de Pernambuco, Eduardo Campos, presidente do PSB, também começa a ser pressionado pelo PT, que ameaça lançar o ex-prefeito do Recife João Paulo ao governo pernambucano. Campos é avalista da candidatura de Ciro.

Caçada/ O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), nomeou uma comissão de sindicância, formada por cinco agentes da Polícia Legislativa, para investigar o vazamento de informações sobre recursos humanos para os jornalistas que cobrem o Congresso.

Vanguarda/ O ministro da Defesa, Nelson Jobim, vai ao Congresso relatar a catástrofe do Haiti e pedir apoio às ações da força de paz que o Brasil mantém naquele país. A primeira reunião será na Comissão de Relações Exteriores do Senado. Dirá que a presença dos militares brasileiros e a mobilização do governo para prestar solidariedade às vítimas do terremoto não têm precedentes desde a Segunda Guerra Mundial graças ao protagonismo do presidente Lula.

Discórdia/ O deputado Eduardo Gomes (PSDB-GO) articula a formação de uma comissão geral da Câmara para discutir o polêmico terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos lançado pelo presidente Lula. Os tucanos estão gostando do debate com o PT sobre os temas abordados no programa.

CLÓVIS ROSSI

Rottweiler sem dentes

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


SÃO PAULO - O Brasil mudou de complexo. Antes, abrigava n'alma o de vira-lata, segundo Nelson Rodrigues, o notável escafandrista da alma brasileira. Agora, na crise haitiana, mostra complexo de rottweiler.
Pena que não tenha dentes. Refiro-me à ciumeira de autoridades brasileiras em relação a rápida e decidida ação do governo norte-americano. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, reage com pura masturbação diplomática, ao dizer que se trata de "assistencialismo unilateral".
Qualquer pessoa que não tenha perdido o senso comum sabe que os haitianos não estão preocupados com a cor do assistencialismo, se unilateral, bilateral, multilateral. Querem que funcione.
No aeroporto da capital, está funcionando, conforme relato desta Folha: "Depois que os americanos assumiram o aeroporto, os voos aumentaram e também o envio de medicamentos e alimentos".
É claro que precisa haver coordenação, como cobra o chanceler Celso Amorim, mas é bobagem resmungar sobre os Estados Unidos assumirem um papel mais relevante que o das forças da ONU. É brigar com os fatos da vida. Os EUA podem mais que qualquer outro país, o que é escandalosamente óbvio.
Ajuda-memória aos resmungões, extraída do texto de Sérgio Dávila: os EUA enviaram vários navios da Guarda Costeira com helicópteros, o porta-aviões Carl Vinson, com 19 helicópteros, 51 leitos hospitalares, três centros cirúrgicos e capacidade de tornar potáveis centenas de milhares de litros de água por dia.
Nos próximos dias, chegam mais dois navios com helicópteros e uma força-anfíbia com 2.200 fuzileiros e um navio-hospital.
O Brasil tem condições de chegar a um décimo disso? Não. Então que pare de rosnar e reforce o seu pessoal no Haiti, que fez e está fazendo notável trabalho, dentro de seus limites bem mais modestos.

GOSTOSA

MERVAL PEREIRA

O papel de cada um

O GLOBO - 17/01/10


Desde outubro, o presidente Lula sabe que estava crescendo “chifre em cabeça de cavalo” devido ao Programa Nacional de Direitos Humanos e, na tentativa de chegar a uma posição que agradasse tanto aos militares quanto aos militantes de esquerda de seu governo, acabou fazendo com que o texto saísse da maneira que saiu, provocando a crise que teve depois de contornar. Aprofundando-se mais a apuração do que aconteceu nesses meses, aprende-se que é incorreto chamar a crise de “militar”, pois dois civis estiveram sempre à frente da oposição ao texto original da Secretaria de Direitos Humanos: o ministro da Defesa, Nelson Jobim, e o ministro da Comunicação Social, Franklin Martins.

Este último, antigo integrante do grupo guerrilheiro MR-8, tendo inclusive participado do sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, foi um auxílio inesperado e importante para o ministro Jobim, já que tinha, por sua própria história política, peso para discordar do caminho tomado na elaboração do Programa de Direitos Humanos original.

Além de pedir para que seu nome fosse retirado do decreto, Franklin Martins atuou nos bastidores para convencer Paulo Vannuchi de que não haveria ganho político em criar atritos com a área militar.

Ao contrário, a chefe do Gabinete Civil, ministra Dilma Rousseff, a quem estava afeita a aprovação final do decreto antes da assinatura do presidente, não quis interferir em favor do ministro da Defesa, provavelmente para se colocar bem com a ala esquerdista do governo, com o objetivo de tê-la a seu lado na campanha presidencial em que se candidatará à sucessão de Lula.

Os ministros Jobim e Vannuchi trocaram diversas mensagens no decorrer desses meses, negociando os termos da constituição da Comissão Nacional da Verdade e seus objetivos.

Jobim já havia alertado o presidente Lula de que ele, como jurista e ministro da Defesa, não poderia aceitar que o texto do decreto desse margem a que a Lei de Anistia pudesse ser revista.

Desde o início, a expressão “repressão política” estivera na berlinda, pois ela indicava que a tal comissão só analisaria um dos aspectos do período militar.

Jobim explicou para o presidente que os chefes militares já haviam acatado sua determinação de apoiar a constituição da Comissão da Verdade, para que todos os fatos ainda não esclarecidos com relação aos desaparecidos políticos venham a público — inclusive a localização dos corpos, para que as famílias possam enterrar seus mortos, como salientou o próprio presidente Lula, no fim da semana.

Foi Lula mesmo, aliás, quem estabeleceu, em conversas ainda em outubro, os limites que deveriam ser seguidos na elaboração do decreto dos direitos humanos, já alertado por Jobim de que o texto continha afirmações inaceitáveis.

A ideia de que o ministro civil da Defesa esteve emparedado pelos chefes militares no episódio é a que parece mais verossímil, mas o fato é que, por ser um político experiente e de temperamento forte, o comportamento de Nelson Jobim no episódio só fez reforçar o papel do Ministério da Defesa de ser um poder civil comandando os militares.

Ao sentir cheiro de queimado no texto original do decreto, Jobim assumiu a dianteira das negociações e chamou os chefes militares para uma conversa, em que ele deu a direção.

Declarou-se contrário à revisão da Lei de Anistia, como político e como jurista, mas defendeu a necessidade de que a Comissão Nacional da Verdade pudesse investigar e revelar fatos ocorridos durante os “anos de chumbo”.

Retirado o eventual caráter revanchista das investigações, a criação da comissão não enfrentaria resistências dos militares. Já nesta ocasião estava em discussão a troca da expressão “repressão política” por “conflitos políticos”.

Como Paulo Vannuchi insistia no uso de “repressão política”, alegando ao presidente Lula que era preciso usar uma expressão forte, houve um momento em que se pensou em pôr os dois termos no texto, para deixar claro que as apurações da Comissão da Verdade se dariam nos dois lados em confronto na ocasião.

Antes de viajar para Copenhague, para a reunião sobre o clima, Lula ainda foi alertado por Jobim de que o texto final do decreto que ele assinara não havia sido alterado, e ficou acertado que o chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, seria acionado para fazer a alteração, o que acabou não acontecendo.

Carvalho alegou que, quando o presidente falara com ele, o texto já estava sendo impresso na gráfica do Diário Oficial. O acerto que foi determinado após o regresso das férias de Lula, portanto, deveria ter sido feito antes da publicação do decreto criando o III Programa Nacional de Direitos Humanos.

Tudo indica que houve, pelo menos por parte do secretário nacional de Direitos Humanos, a tentativa de esticar a corda até o último momento, acreditando que, diante do fato consumado, os militares não reagiriam.

Os relatos de diversas fontes não permitem determinar exatamente qual foi o papel do presidente Lula no episódio.

Alguns consideram que Lula não estava realmente interessado em abrir uma discussão com os militares, e foi enganado por Vannuchi e Dilma Rousseff, que jogaram com o fato consumado.

Outros acham que o próprio presidente levou a negociação até o limite, interessado em dar mais espaço para sua ala esquerda, também acreditando que os militares não concretizariam a ameaça de pedir demissão.

A solução final, de criar um grupo de trabalho para elaborar o anteprojeto de lei que cria a Comissão da Verdade para “examinar violações de direitos humanos, ocorridas no regime militar” foi acertada entre o ministro Nelson Jobim e o secretário Paulo Vannuchi, antes da reunião dos dois com o presidente Lula.

ELIO GASPARI

No Haiti, o coronel de "Avatar" prevaleceu

FOLHA DE SÃO PAULO 17/01/10


Uma ilha, dois países, duas maneiras de lidar com a natureza e o preço da predação


POR TRÁS DA TRAGÉDIA haitiana há um secular desastre ambiental, preço que a natureza cobra aos predadores. Algo como se um coronel-fazendeiro Quatrich tivesse derrotado os Na'vi da terra de Pandora do filme "Avatar". A ilha, que se chamava Hispaniola, era partilhada a oeste pelo Haiti, com poucas terras férteis, e a leste pela República Dominicana e seu vales. Até o início do século 19, a França tirava da agricultura haitiana 25% da sua riqueza.
A riqueza vinha da escravidão, do café, da cana e do desmatamento. Do outro lado da ilha, a banda fértil foi menosprezada pelos espanhóis. Em 1804, derrotados por uma rebelião negra, os franceses foram embora do Haiti, as terras foram divididas e a pequena propriedade derrubou a produtividade da agricultura. Na Dominicana, a partir da segunda metade do 19 estimulou-se a imigração europeia. Mesmo assim, enquanto os haitianos mataram 20 dos 21 presidentes entre 1843 e 1915, os dominicanos tiveram 50 presidentes e 30 revoluções entre 1844 e 1930.
No século passado, os dois países tiveram ditadores larápios e assassinos. O haitiano François Duvalier era um médico pós-graduado nos Estados Unidos que pouco ligava para a modernização de sua terra. O dominicano Rafael Trujillo tinha pouca educação, mas foi na direção oposta.
A República Dominicana começou a preservar suas florestas em 1930. Trujillo e seu sucessor tomaram para si o monopólio do desmatamento, reprimiram a concorrência e expulsaram centenas de milhares de lavradores de suas roças. Hoje, 32% do território do país é ocupado por 74 reservas ambientais. No Haiti os parques são quatro e estão encolhendo. A renda per capita de um dominicano está em US$ 7.400, e a do haitiano vale US$ 1.300. (A do brasileiro é de US$ 9.400.)
(As informações deste texto saíram do esplêndido livro "Colapso", do geógrafo Jared Diamond.)

TRIÂNGULO
A diplomacia companheira de Nosso Guia cultiva uma "parceria estratégica" com a França e uma aproximação com o Irã. A negociação com os franceses envolve compras de armamentos que podem chegar a US$ 20 bilhões, ervanário equivalente ao orçamento do MEC. São cinco submarinos convencionais, o casco de outro, de propulsão nuclear, mais 36 caças Rafale. Na discussão dessas despesas apontam-se sobrepreços e carestias de pelo menos US$ 5 bilhões.
A aproximação com o Irã levou Nosso Guia a defender o programa nuclear do presidente Ahmadinejad ao mesmo tempo em que negou "autoridade moral" aos Estados Unidos e à Rússia para condenarem as bombas alheias.
Até 1979 a França foi parceira do programa nuclear do xá do Irã num projeto multinacional de enriquecimento de urânio. A França também construiu um reator para o ditador iraquiano Saddam Hussein, destruído em 1981 pela aviação israelense. (Nessa época a ditadura brasileira tinha um programa nuclear secreto com o Iraque.) Atualmente Nicolas Sarkozy é um adversário declarado da bomba iraniana. Sua oposição é mais firme que a de Nosso Guia. Em novembro passado, o presidente Ahmadinejad mostrou-se interessado em compartilhar tecnologia nuclear com o Brasil. Quem conhece os antecedentes das negociações nucleares secretas acha que há algo mais na parceria Brasil-França do que a compra de submarinos e aviões. Na melhor das hipóteses, um atalho para afastar o Irã do caminho da bomba. Na pior das hipóteses, a pior das hipóteses.
China, Índia e Paquistão juravam que seus programas nucleares eram pacíficos, até a hora em que cada um deles explodiu sua bomba.

BOICOTE A CHINA
Sugestão para quem torce pelo Google na sua briga com a censura chinesa: evite comprar produtos com a inscrição "Made in China" na carcaça.
Quem quiser ir mais longe pode mandar uma mensagem para a Apple pedindo-lhe que pare de fabricar seus iPods na China. Steve Jobs pretende dirigir uma empresa que, como o Google, é "do bem".
Enquanto o Yahoo entregou e-mails de dissidentes ao governo chinês, o Google quase rompeu com a censura de Pequim em 2006. Um de seus fundadores, Sergey Brin, foi ultrapassado pelo sócio Larry Page e pelo gerentão Eric Schmidt.

VOO EXTRA
O general brasileiro Floriano Peixoto Vieira Neto, comandante das tropas da ONU no Haiti, estava em Nova York na terça-feira, quando Porto Príncipe foi arrasada por um terremoto. A caminho do posto, ele voou de Miami à base de Guantánamo num jatinho da Guarda Costeira dos Estados Unidos.

BOA NOTÍCIA
Começou a descarrilar o lobby de empreiteiras, fornecedores de equipamentos e bancos interessados em arrancar do governo benefícios que garantissem a demanda pelo serviço do trem-bala. O BNDES ofereceu apenas a possibilidade de renegociação do contrato se, passado um tempo, viesse a faltar freguesia para o trem. Os maganos queriam mais. Seria um absurdo se os passageiros do trem-bala recebessem um subsídio para viajar a 300 quilômetros por hora, no ar refrigerado, enquanto a patuleia do Rio viaja a 30 quilômetros em ônibus-estufas e o prefeito Eduardo Paes (que prometeu a implantação do bilhete único) se recusa a subsidiar transporte público.

A TORRE DA ELETROBRÁS AJUDA A LAPA
O ex-prefeito Cesar Maia resolveu condenar a construção de uma torre de 40 andares no coração do Rio de Janeiro. Ele denunciou: "Prédio da Eletrobrás estupra a Lapa e o Corredor Cultural".
Logo Cesar Maia, que foi impedido de estuprar o aterro do Flamengo espetando um centro de convenções ao lado da marina da Glória. A construção da lâmina da Eletrobrás, bem como as torres projetadas para a Petrobras (a quatro quarteirões de distância), são algumas das melhores coisas que estão acontecendo no Rio de Janeiro.
A Eletrobrás levará cerca de 2.000 pessoas para os novos prédios, revitalizando um comércio estagnado. Um dos edifícios, mais baixo, ficará a 300 metros dos Arcos. O mais alto, a 400. Com 50 anos de atraso, ajudarão a resgatar a região, onde se deu o desastre urbanístico da avenida Chile, um lugar aonde se vai, mas por onde não se passa. (Isso para não se falar no monstruoso coador de macarrão da catedral).
A ideia de que não se deve construir edifícios altos na paisagem dos Arcos é um exagero. O aqueduto está parcialmente encapsulado numa enorme praça, que lhe dá o devido relevo.
Se São Sebastião ajudar, a Eletrobrás não entregará o projeto arquitetônico da torre a um escritório amigo ou subsidiário de empreiteira. Por agir dessa forma, a Infraero transformou inúmeros aeroportos brasileiros em sarcófagos, onde a única coisa que funcionou direito foi o tráfego de comissões.
Concursos públicos de arquitetura sempre fizeram bem ao Rio. A eles se devem marcos como o aeroporto do centro da cidade, o prédio da Petrobras e a futura sede do Museu da Imagem e do Som. Sem concurso, a torre da Eletrobrás ficará com o jeitão do choque de desordem que já impregnou o projeto da zona portuária. Nesse caso, é melhor deixar os Arcos em paz.

AZAR

JANIO DE FREITAS

Precisamos, em vão

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


É preciso discutir o regime sob o qual vivemos, e que pouco tem a ver com a Constituição que a maioria saudou e apoia
O QUARTO DE SÉCULO, completado anteontem no esquecimento, da eleição do primeiro presidente civil passados 21 anos de ditadura -Tancredo Neves, na última eleição indireta- não corresponde ao que era ambicionado como volta ao Estado de Direito.
É preciso, embora improvável, discutir as características do regime sob o qual estamos vivendo, e que pouco ou nada tem a ver com a Constituição que a maioria saudou e defende. Sob surtos de perplexidade, nem sabemos onde estamos nem, portanto, podemos enveredar pela acomodação ou pela ação em busca da democracia mais real e promissora. Postos sob o autoritarismo remanescente e um transformismo degenerado, os valores da cidadania se esvaem antes de chegarem a ter dimensão de fato democrática.
É preciso discutir o que significa, para o regime e para a cidadania, o poder autoatribuído pelos comandos militares e reconhecido pelo presidente da República de impedir, sobrepondo-se à ordem institucional proclamada, medidas autorizadas ou determinadas pela Constituição. Os militares não se tornaram democratas, como têm atestado tantas demonstrações do seu apego à memória da ditadura. Mas, daí a interferir na função e na autoridade de um poder constituído, vai a distância entre regime constitucional democrático e a falência desse regime, da Constituição e da cidadania.
É preciso discutir o que é feito do Congresso pela venalidade como método de compor a "base aliada" e, agora, as bases partidárias para a candidatura patrocinada pela Presidência da República. Se a plenitude do Congresso é essencial ao regime democrático, e à validade da Constituição e da cidadania, então não é esse o regime em vigência. E tanto não é, que o governo se exerce por medidas provisórias, como a ditadura o exercia pelo decreto-lei, e a função legislativa do Congresso reduz-se à de cartório. Aliada à produção de escândalos.
É preciso discutir a aceleração da imoralidade administrativa. Não se trata, aqui, da corrupção nas malas e meias, mas do que está implícito em atos de governo que possibilitam negócios proibidos por lei (telefônicas), prorrogação anistiante de multas bilionárias a grandes produtores rurais, e compras de equipamento militar eivadas de suspeições, por exemplo. É apenas natural que a crescente sem-cerimônia desse regime do "quem decide sou eu" chegue, agora, à negação de todo escrúpulo, com a proposta de Lula de que não se fiscalizem as obras da Copa, "para não atrasar as obras". As do Pan, com "fiscalização" federal, estadual e municipal, ficaram 800% acima da previsão. Nem essa fiscalização Lula deseja a seus amigos empreiteiros, como os da Odebrecht e da Andrade Gutierres.
É preciso, mas improvável, discutir o descaminho em que entramos, mais empurrados ainda por uma campanha eleitoral deformada a partir da própria Presidência da República e da máquina de governo.

No código
Pode ficar só no ridículo a infantilidade que leva Nelson Jobim, por ser ministro da Defesa, a fantasiar-se de militar para ir à Amazônia ou ao Haiti. Ele ainda não se deu conta de que haver civil como ministro de militares é tido, ao menos para as aparências, como uma conquista civilizatória.
Mas apor na roupa, ou na boina, emblema do Exército, está previsto no código penal: é falsidade ideológica.

ARI CUNHA

Ainda somos amigos


CORREIO BRAZILIENSE - 17/01/10



Hugo Chávez não perde a vez. Quando pode, aperta o cinto do Brasil. Há momentos em que chegamos a ter cintura de pilão. Coisa que não falta ao presidente Lula é ouvir. Nunca deu um tiro na opinião de ninguém. Com calma, coloca a cabeça no travesseiro e dorme. Agitado, porque sempre vive os aperreios do país. Hugo Chávez tem apoio do Brasil para integrar o Mercosul. Acredita-se seja bom para o Brasil. Falta a comprovação. Em chegando ao Mercosul como está, se não usar democracia no comando, a organização vai amargar depois. Como a esperança é sempre a última que morre, vale a pena esperar.

“Os fetos torturados em sessão de aborto querem uma lei de anistia.”
Dona Zilda Arns, de onde estiver, com mais um argumento em favor da vida


IBGE
» Ano passado, o IBGE divulgou pesquisa mostrando que metade dos brasileiros tem telefone celular. Os aparelhos foram a salvação durante as enchentes de São Luiz de Paraitinga. Uma das formas que a turma do rafting pediu de socorro foi acrescentar crédito nos celulares.

Preço alto
» Brasília está de cabelos levantados. Os jovens amargam tempos difíceis com os imóveis a preços fora da realidade. Estamos como durante a guerra da Europa. Uma só casa reunia vários casais. Na capital, pessoas com apartamentos maiores alugam quartos para moradores desconhecidos.

Empregos
» Pelo menos 2 milhões de pessoas estão sem emprego na América Latina. A situação é de amargar para muita gente. No Brasil, a situação é bem melhor. O povo desfruta de vantagens que favorecem a vida. Recebem cartão que vale dinheiro e substitui a labuta diária.

Senai
» Casos registrados em obras chamam a atenção em Brasília. O número de acidentes de trabalho tem aumentado nos últimos anos. Só na construção civil, as estatísticas mostram aumento de 60% no país. O Senai tem sido grande aliado para melhorar esse quadro.

Presidente sem prudência
» Leonardo Prudente está com a cabeça à mostra. Dispensou a licença, mas não deve assumir a cadeira. Assumiu outro dia, em segredo, proibindo a entrada do povo, que é o juiz nas eleições. Não se entendeu o porquê do ato sigiloso. Érika Kokay não dobra o espinhaço a dúvidas.

Divergência
» Paulo Vannuchi entra em choque com a Presidência da República na apuração dos fatos da ditadura militar. Houve crimes dos dois lados. Bom seria o país tomar conhecimento de todos os fatos. Inclusive quanto às gordas gratificações dos bem situados. Não esqueçam que o sol nasce para todos.

Tradição
» Quem ouve a Jovem Pan sabe que ali resiste um coração com saudade de outros tempos. Não havia internet nem computador. A Rádio Panamericana de 1944 rejuvenesceu em 1965 quando Paulo Machado de Carvalho a rebatizou de Jovem Pan.

Golpe
» Uma das principais opções de importar pelos Correios é o baixo custo do frete e a agilidade no processo. Só que Brasília não faz parte desse critério. Desde outubro os importadores são informados de que a carga terá que ser liberada pela alfândega do Rio de Janeiro ou São Paulo. O pior da história é o silêncio dos Correios e da Receita Federal sobre o assunto.

Excesso
» Um litro de tinta para impressora colorida custa R$ 13.575. O equivalente a 300g de ouro, três TVs de plasma de ``42´´, um Uno Mille 2003, 45 impressoras que utilizam esse cartucho, quatro notebooks, seis micros Intel Core 2 quad com 4 GB e um HD de 500GB. A informação chegou por e-mail assinado por Elina Martins.

História de Brasília

É incrível, numa cidade de quatro anos, a gente ver o que todo o mundo viu ontem: uma miniatura do Iguaçu, em plena rua da Igrejinha, só porque choveu. Ora essa. Chover é pra chover em toda parte. Afinal de contas, não se construiu Brasília para o clima de Lima. (Publicado em 22/2/1961)

GOSTOSA

GAUDÊNCIO TORQUATO

Surtos e sustos

O ESTADO DE SÃO PAULO - 17/01/10


O Brasil vive de surtos. Não apenas na área das doenças do passado - leishmaniose, hanseníase, dengue, tuberculose, cólera e febre amarela urbana. Os surtos nacionais se dão também na área das atitudes e dos comportamentos do governo federal. Vez ou outra, o País é surpreendido por uma decisão - instrução, projeto, decreto - que contraria a linha do bom senso. Quando se imagina que a velha luta de classes passou a dormir no baú das antiguidades, eis que ela ameaça tomar assento na arena dos conflitos cotidianos, por conta de figuras que ainda vivem nos tempos da guerra fria. Quando se pensa que o revanchismo foi banido da agenda política, surgem indícios de que continuam vivos os rancores do passado. Quando se desenha o espectro da Nação nos horizontes da estabilidade institucional, veem-se traços de improvisação, a denotar falta de rigor técnico, tendência à exorbitância e gosto pelo inusitado. Nada parece ser definitivo. A luz do direito à informação, que tem iluminado a democracia desde a Revolução Francesa, recebe, frequentemente, ameaças de apagão. A pergunta traz a dissonância: como um governo com formidável lastro nos ideais democráticos - distribuição de renda, defesa de minorias, liberdade de expressão e promoção da cidadania - pode abrigar redutos autoritários e centros de propulsão do radicalismo?

Só há uma resposta: o presidente Luiz Inácio, do alto de extraordinário poder, consente e até alimenta as divisões internas. Ou, como se diz de gente maquiavélica, divide para somar. Temos, assim, a radiografia de corpo inteiro do governo: o presidente exerce funções do mando executivo usando a força da caneta para fazer e desfazer, seduzindo e cooptando, puxando a orelha de comandados, dando o tom geral da administração, De um lado, deixa a coisa correr solta. Incentiva um subgoverno. Quando fatos, atos e atores entram em dissenso e litígio, Sua Excelência emerge como Poder Moderador. Chama as partes, ordena unidade de sentido, emergindo ao final como Lula, o Providencial, capaz de tornar possível o que parecia impossível. Sai de episódios negativos intacto. Para evitar que sombras de dúvidas sujem a imagem pinça o discurso pronto: assinou documentos sem ler, não sabia o que estava acontecendo, vai resolver o imbróglio.

Sob essa tessitura governativa se desenrola o pacote de dissonâncias do governo Lula. O Programa Nacional de Direitos Humanos é o mais recente exemplo. A vastidão temática, que abriga receituário considerado mais denso do que a própria Constituição, denota que o documento, à semelhança de outros, é para ser lido, e não cumprido. Lula, o Moderador, no último minuto aparece para conter a carga revanchista. É isso que causa estranheza. A conta dos anos de chumbo, que continua a ser paga (os programas de amparo às vítimas continuam se multiplicando até hoje), pela vontade de grupos encastelados na administração, deveria ser cobrada com muita punição. Convenhamos. Ninguém de bom senso pode ser contrário ao exercício da cidadania, entendido como o esforço contra qualquer tipo de arbítrio e que tem lastro no bem-estar. Mas tal esforço pela promoção humana deixa de ser efetivo quando se desgarra da realidade concreta, passando a acolher desejos exclusivos de setores que operam no seio do governo. A planilha dos direitos humanos, para ser respeitada, deve acolher o acordado pacto nacional por paz e justiça. Claro, em consonância com o ideário da sociedade civil.

Não se trata de perdoar torturadores ou querer apagar partes obscuras da História. A busca da verdade, porém, que inspira o programa de defesa dos direitos dos cidadãos, deve ser um exercício plural, buscando abrigar todas as partes envolvidas na luta armada. Outro surto do governo Lula é na área da mídia. O alvo é o direito de informação. Pela insistência com que a administração quer ordenar os rumos midiáticos, desconfia-se que há um núcleo que não se conforma com a livre expressão. Tenta-se, desde 2003, formar um Conselho de Comunicação com função de controlar os meios de comunicação. Se há um documento onde o monstrengo poderá aparecer, a patrulha age. A tentativa de mordaça tem dado com os burros n"água. O documento dos direitos humanos procura resgatar o controle quando propõe um ranking de mídias confiáveis.

Outra área que provoca surtos e sustos é a das relações trabalhistas. A política do trabalho é retrógrada. Para piorar, é conduzida pela mão forte das centrais sindicais. Exemplo é a visão do governo sobre a terceirização de serviços, que emerge, em todos os quadrantes, como mecanismo de apoio aos setores produtivos. Os serviços terceirizados se expandem ao fluxo da especialização e das estratégias de flexibilidade, rapidez e mobilidade. O universo do trabalho, no mundo, vive uma de suas mais agudas depressões, fruto da crise no sistema financeiro internacional. No Brasil, a terceirização é acusada de precarização do trabalho, mesmo sabendo que trabalhadores integram entidades laborais legalizadas e empresários formam sindicatos patronais especializados, em que se promovem convenções coletivas e se fixam os deveres fiscais/tributários de cada setor. As centrais combatem tal possibilidade porque temem a dispersão dos trabalhadores. Quanto mais bases fixas nas empresas, maior será a arrecadação sindical.

Há quem entenda os surtos autoritários como demonstração do extraordinário prestígio de Lula. A montanha do apoio popular permite-lhe subir aos píncaros da glória e brandir o slogan de Luís XIV: "Eu sou o Estado." Se o Estado é ele, pode comprar os caças Rafale, que custam o dobro do preço dos aviões suecos (os Gripen). Dinheiro não é problema. E Lula, como se sabe, é um grande gastador. Defensor do Estado forte. Cada vez mais forte ante o Estado em crise no liberalismo. Essa é a face autoritária do governo. E o diálogo com a sociedade? Faz parte da liturgia do poder. Mas a palavra final cabe ao todo-poderoso. Nunca na História deste país se leu tanto na mídia que "a decisão cabe ao presidente Lula".

Gaudêncio Torquato, jornalista, é professor titular da USP e consultor político e de comunicação

JOSÉ SIMÃO

BBB 10! Boate gay é mais animado!

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


E São Paulo lança mais um parque aquático: o AQUASSAB! Beach park com água de enchente!


BUEMBA! BUEMBA! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País da Piada Pronta! Pesquisadora americana afirma que gordo vive melhor. Como é o nome da pesquisadora? LINDA BACON! Legislando em causa própria!
Notícias da praia. No Rio, já lançaram a Mulher Miojo. É só jogar na água e comer. E esse surto de diarreia no Guarujá? É o ACAGÃO!
E um amigo estava em Fortaleza e disse que teve uma vida sexual agitada: comeu quatro caranguejos. E recado de um leitor, direto de Ubatuba: "Não comi, mas também não dei! Empate fora de casa é vitória!".
E São Paulo lança mais um parque aquático: o AQUASSAB! Beach park com água de enchente. Beach park com leptospirose!
E essa: "Empresa americana lança robô sexual que conversa com o usuário". Tem versão muda? A gente passa anos pra mulher parar de falar e aí vem um robô sexual e quer conversar? E o robô fala o quê? "Você me ama ou só quer me comer?"
E o IPVA? O IPVA é impagável. E o meu carro é implacável. IPVA, IPTU, IPI, é tanto "ip" que já tô ficando IPERTENSO! IPERTENSÃO.
E com esse calor um amigo foi dormir pelado no terraço e perguntou pra mulher: "Querida, se eu sair pelado no terraço, o que os vizinhos vão pensar?". "Que eu casei por dinheiro." Rarará!
BBBIBA! Big Biba Brasil! Começou o BBB 10! Adoro uma acefalia televisiva! Adorei o casting: biba, drag, sapata. É casa ou boate gay? O BBB devia ser na The Week! Ia ser muito mais animado! E tem uma PM que gosta de apanhar. Ela é o lado errado do cassetete. PM gosta é de bater! E tem um modelo de Maringá que é da agência da irmã do Galvão Bueno! Adorei o pedigree!
E tem uma twitteira, a Twitess. Com seus dois neurônios de Twitter: o Twico e o Tweco! E um personal trainer, rinoceronte de sunga! Foi capa de revista gay chamada "Cabo Frio". Uhhhnn, isso é nome de revista gay, "Cabo FRIO"?!
E a bibinha emo dança tanto que parece invertebrada. Biba não tem osso! E a drag Dimmy Kieer. Vai no YouTube e digita "Bixa Linda, Mona Luxo": aparece ela toda montada!
E por que drag quando tá de homem é um dragão?! Dragão Queen! E as perguntas do Bial? "Qual o maior bem do mundo?" Minha amiga gritou: "A maquiagem!". E eu acho que é a geladeira! E aí, ele perguntou pro personal trainer: "Você acha que excesso de autoconfiança se confunde com agressividade?". E o personal: "AHHNN?! Agora você me pegou, Bial". Não é massa muscular, é massa moluscar!
Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje, só amanhã! Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

GOSTOSA

PAINEL DA FOLHA

Abre-alas

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/01/10


O PT preparou inserções de TV com um minuto de duração para levar ao ar no dia 11 de fevereiro, destinadas a abrir caminho para o Congresso do partido na semana seguinte, quando Dilma Rousseff será aclamada candidata à Presidência. O partido repetirá a fórmula da dobradinha Lula-Dilma, embalada por uma fala em tom emotivo. A comparação com a gestão tucana, explorada nos últimos programas, dará lugar a uma narrativa sobre os 30 anos da legenda, a luta pela redemocratização do país e as políticas de inclusão social implementadas nos últimos anos. Termina jogando luzes para a necessidade de surgirem novas ‘lideranças políticas’ pós-Lula.

Na tela - As demais inserções e a propaganda partidária foram agendadas para maio, que será o mês mais complicado para Dilma, segundo dirigentes da sigla. Obrigada pela legislação eleitoral, ela já terá deixado a Casa Civil, mas a campanha não estará oficialmente na rua.

Canudo - Lula afirmou a auxiliares que quer passar seis meses viajando quando deixar o governo para receber todos os ‘títulos de doutor’ a que tem direito. Dezenas de universidades e instituições internacionais concederam ao petista o título de doutor honoris causa. ‘Entrei na Presidência torneiro mecânico e é assim que quero sair’, disse.

Tour - O PSDB já dá como superada a discussão sobre a necessidade de antecipar o anúncio da candidatura do governador José Serra (SP) à Presidência. Mas há uma avaliação unânime: o tucano deveria circular mais pelo país para ajudar na montagem dos palanques estaduais.

Mapa - Com a articulação para fazer de Fernando Gabeira (PV) candidato ao governo do Rio avançada, os tucanos se dedicarão a resolver o tabuleiro em três Estados: Paraíba, Ceará e Amazonas.

Sobressalente - No Ceará, além da lista de deputados, o PSDB avalia nomes de empresários caso o senador Tasso Jereissati não tope disputar o governo. São eles Amarílio Macedo e Beto Studart.

Parceria 1 - De acordo com o Itamaraty, o Brasil tem cerca de 30 iniciativas de cooperação com o Haiti em fase de elaboração, envolvendo um montante de US$ 14 mi. São ações em áreas como agricultura, direitos humanos e obras de infraestrutura. Em virtude do terremoto que devastou o país, algumas serão adaptadas e as demais não têm data para sair do papel.

Parceria 2 - O programa de cooperação brasileiro com o Haiti previa a instalação de dois centros de formação profissional em Porto Príncipe, um do Senai e outro do Senac, a partir de fevereiro. Ainda não se sabe se os prédios cedidos pelo governo haitiano para a iniciativa estão em pé.

Do cara - De um integrante do governo sobre os planos de Lula para se contrapor às ações de socorro de Barack Obama no Haiti: ‘Assim que ele souber que a Hillary Clinton embarcou para lá, despacha metade da Esplanada para Porto Príncipe na hora’.

Memórias - Antes que estourasse a crise sobre o Programa Nacional de Direitos Humanos, o ministro Nelson Jobim (Defesa) havia relatado a integrantes do alto escalão que escreverá um livro sobre as inúmeras pressões que sofreu, quando ministro de FHC, ao negociar a aprovação da Lei 9.140 que reconheceu como mortos os desaparecidos no período de 1961 a 79.

Contraponto

Fico por aqui

Então governador de Pernambuco, Miguel Arraes (1916-2005) conversava com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quando o tucano lhe sugeriu que saísse candidato à Presidência em 1998. Arraes agradeceu a sugestão, mas declinou:

- Obrigado, mas é muita grandeza...

E, diante do olhar curioso de FHC, explicou:

- O meu tio saiu do interior e pegou um trem para conhecer Recife. No caminho, o trem parou em Caruaru, ele viu as luzes e mandou a mulher descer. Ela protestou dizendo que “não era Recife, e sim Caruaru’... Ele respondeu que “não era Recife, mas já era muita grandeza’.

Idas e vindas - Fruto da visita do iraniano Mahmoud Ahmadinejad ao Brasil, o Ministério de Ciência e Tecnologia enviou cinco funcionários para participarem de uma missão no Irã. O objetivo, diz a pasta, é expandir a cooperação para ‘fins pacíficos’.

Tiroteio


Esse programa de direitos humanos é espelho da política revanchista do PT, cada vez mais próxima da ditadura venezuelana.

Do deputado ACM NETO (DEM-BA), sobre a manutenção de pontos polêmicos no terceiro Programa Nacional de Direitos Humanos.