sexta-feira, setembro 09, 2011

ANCELMO GOIS - Brasil na TV


Brasil na TV 
ANCELMO GOIS
O Globo - 09/09/2011

Dilma deverá sancionar hoje ou segunda-feira a nova lei da TV a cabo. Pelas contas de Manoel Rangel, diretor da Ancine, a lei pode gerar uma encomenda adicional de quatro mil horas/ano de programas junto a produtores nacionais, dos quais a metade é de independentes.

Eu apoio 
Como se sabe, a lei estabelece uma cota mínima de meia hora de conteúdo nacional por dia na programação das TVs por assinatura.

Como de hábito 
Embora Nova York seja farta em bons hotéis, Dilma seguirá, na viagem para abertura da Assembleia-Geral da ONU, os passos de Sarney, FH e Lula. Ficará hospedada no elegante Waldorf Astoria Hotel.

A marcha do ágio 
Com a proximidade do Rock in Rio, o preço dos ingressos entre cambistas supera o dobro do valor oficial. No Facebook, tem uma turma reclamando que um kit de quatro dias para o evento chega a custar R$ 3.200. Já um ingresso para os shows menos badalados sai por mais de R$ 400.

Nelson e Villa-Lobos 
Nelson Freire, que dia 15 será feito doutor honoris causa pela UFRJ, tem novo CD no forno: “Villa-Lobos e seus amigos”.

Meneses também 
O violoncelista Antônio Meneses será doutor honoris causa pela mesma universidade. Eles merecem.

Ronaldinho na Bienal 
O padre Marcelo Rossi, que lotou a Bienal quarta-feira, pode ter um rival à altura, hoje. Ronaldinho Gaúcho, o craque do Flamengo, é esperado no Riocentro para uma sessão de autógrafos da revista em quadrinhos na qual é personagem.

Nossa Filmes 
Vai se chamar “Nossa” a nova distribuidora de filmes, sociedade que reúne três diretores de sucesso do cinema brasileiro. São eles: José Padilha, Fernando Meirelles e Daniel Filho.

Fernanda é brasileira 
Por falar em Daniel Filho, a série “As brasileiras”, que ele dirige para a TV Globo, terá um dos seus 16 episódios interpretado por Fernanda Montenegro, atriz número 1 do Brasil.

A produtora 
Paula Barreto, a produtora filha de Barretão, recebe em Londres, amanhã, o WFTV Award “Women in Film”, prêmio conferido anualmente a mulheres (produtoras, diretoras, roteiristas etc.) que se destacam pela excelência de seus trabalhos.

Hotel à venda 
O Copacabana Sol Hotel, no Rio, está à venda. Coisa de uns R$ 36 milhões.

Oi é campeã 
Mais uma vez, a Oi foi a empresa mais acionada em um mês nos Juizados Especiais Cíveis do Rio. Em agosto, foram 3.510 novas ações. O Santander ficou na vice-liderança em desserviço, com 2.259 feitos e o Itaú em 3o- lugar, com 1.816.

Doutor no samba 
No mundo do samba já há “Delegado”, “Sargento” e “Presidente”. Agora, chegou o “Desembargador”. É Henrique Carlos de Andrade Figueira, da 17a- Câmara Cível do TJ-RJ. Está na disputa de sambaenredo da São Clemente.

O outro lado 
A Abril, em nota, diz que irá apurar a denúncia da aluna do Colégio Guilherme Briggs, Niterói, que alega ter sido vítima de racismo ao tentar uma senha para pegar autógrafo de Rodrigo Faro, num estande da editora na Bienal do Livro. A Abril sustenta que seus estandes não receberam a visita do ator e que em nenhum deles houve distribuição de senhas.

Cena carioca
Na Rua Uruguaiana, no Centro do Rio, um ambulante faz o seguinte discurso: - Compro ouro! Mas não é qualquer ouro, não. Só compro aquelas peças que você não quer mais, a aliança do casamento que não deu certo, o brinco de presente daquela amiga da onça.

ILIMAR FRANCO - Todos são iguais


Todos são iguais 
ILIMAR FRANCO
O Globo - 09/09/2011

As redes sociais estão convocando novos atos contra a corrupção, em várias capitais do país, no dia 20 de setembro. O objetivo é transformar essa luta numa campanha de massas, como a das Diretas Já. Todas essas manifestações têm em comum: bandeiras só se forem do Brasil e políticos não são bem-vindos. Uma das organizadoras do ato na Cinelândia, no Rio, Cristine Maza explica a restrição: "Políticos e partidos estão todos envolvidos com a corrupção. Esta é uma luta da sociedade."

Secretário tucano quer divisão do bolo
O PSDB é contra a recriação de um imposto para financiar gastos com a Saúde, como a CPMF. Mas, como a oposição não tem votos para impedir que isso ocorra, se o governo Dilma fechar a base aliada, alguns tucanos também estudam propostas para descentralizar a aplicação dos recursos e de melhoria da gestão. O secretário de Saúde da cidade de São Paulo, o tucano Januário Montone, sobre a nova CPMF, diz: "Temos que evitar que seja mais uma receita da União a ser disputada de joelhos por estados e municípios". Ele defende que a arrecadação seja compartilhada por União (50%), estados (25%) e municípios (25%).

Essa gurizada das redes sociais vai tomar conta das ruas do país" - Pedro Simon, senador (PMDB-RS), sobre as manifestações contra a corrupção

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa
Sobre eventuais discrepâncias entre governadores do partido, como Teotônio Vilela (AL), que já defendeu a criação de um imposto para financiar a Saúde, e a posição oficial do PSDB, o líder na Câmara, Duarte Nogueira (SP), explica: "Uma coisa é o empenho institucional de quem está no Poder Executivo, outra é a ação do partido no Congresso. Nenhum deputado ou senador tucano defende ou votará a favor de um novo imposto."

Ciumeira
Mal-estar no governo com a ação no Congresso, de última hora, do Ministério da Defesa em favor do projeto da Comissão da Verdade. Os petistas dizem que a Secretaria de Direitos Humanos já tinha aparado todas as arestas.

Solidariedade
A Fundação Cultural Palmares está organizando show musical, no mês que vem, para obter alimentos e ajudar a combater a fome na Somália. O presidente da entidade, Eloi de Araujo, já obteve a adesão de Carlinhos Brown.

Dor de cabeça
O Planalto tentou minimizar o impacto do relatório da CGU sobre corrupção no Ministério dos Transportes. Mas os ministros políticos estão preocupados. Vislumbram que terão mais problemas, sobretudo com os seis senadores do PR.

Uma agenda de combate à corrupção
Senadores de vários partidos vão apresentar uma lista de propostas destinadas a combater a corrupção. Um dos projetos pretende atacar a impunidade e reduzir o número de recursos nos tribunais. Outro vai propor o fim das emendas individuais de parlamentares aos Orçamentos da União, dos estados e dos municípios. Os senadores também querem reduzir o número de funções gratificadas, pelas quais o Poder Executivo contrata funcionários que não são de carreira e concursados.

Mel
No encontro que teve com a bancada do PSDB, a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) disse que o governo Dilma pretende executar também as emendas ao Orçamento apresentadas pelos parlamentares de oposição.

O PRESIDENTE do PSDB, deputado Sérgio Guerra (PE), tem conversado muito com o governador Eduardo Campos (PSB-PE). O PSDB quer participar da chapa do PSB nas eleições para a prefeitura de Recife.

INTRIGA. Os aliados da candidatura da deputada Ana Arraes (PSB-PE) ao TCU estão lançando o nome de um dos adversários, o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), a candidato a presidente da Câmara.

O LÍDER do PDT na Câmara, deputado Paulo Pereira da Silva (SP), fala sobre a disputa no partido: "Reafirmo meu apoio ao ministro Carlos Lupi."

MONICA B. DE BOLLE - Abandono


Abandono
MONICA B. DE BOLLE
O Estado de S. Paulo - 09/09/2011

Às vezes essa palavra designa um ato - o abandono das regras, das amarras que cerceiam, mas que também norteiam. Outras vezes é utilizada para caracterizar um estado de espírito - a sensação de liberdade que acompanha a percepção de não se ater a nada, de poder agir sem restrições. Mas a palavra ainda tem conotações mais sombrias. Dependendo das circunstâncias, significa desleixo, negligência, renúncia, desistência. Os bancos centrais no mundo, hoje, se caracterizam pelo abandono. Seja por não poderem mais se amarrar às regras predeterminadas de outrora, em razão do ineditismo dos problemas que enfrentam; seja por quererem se libertar das restrições impostas por certos regimes monetários em meio à exacerbação da incerteza. Ou, ainda, por terem resolvido renunciar ao passado, desistindo dos modelos que geraram grandes benefícios, mas que também trouxeram custos. Como tudo na vida.

A crise global mudou radicalmente a "cara" da política monetária. Se antes os regimes adotados por grande parte dos países haviam encontrado um equilíbrio entre a orientação proporcionada pelas regras e a flexibilidade garantida pela discricionariedade, isso já não existe mais. Os regimes de metas de inflação explícitos, como o implantado no Brasil, ou implícitos, como o seguido pelo Fed e pelo Banco Central Europeu (BCE), foram abandonados por diversas razões. Nos EUA, porque, diante da necessidade premente de combater os efeitos nefastos da quebradeira bancária, cujas sequelas crônicas são muito graves, foi preciso mudar radicalmente a execução da política monetária. Não se sabe muito bem em que ela consiste hoje - ora é usada para compensar o mau funcionamento do mercado de crédito, ora para influenciar a estrutura a termo das taxas de juros, sempre torcendo para que surta algum efeito sobre o nível de atividade. Torcer é o verbo adequado. O abandono dos instrumentos tradicionais de política monetária imposto pela crise forçou o Fed a tatear no escuro, lançando mão de manobras convolutas, conhecidas pelo nome rebuscado de "afrouxamento quantitativo". Já passamos pelo primeiro e pelo segundo. Agora, aguardamos o terceiro.

Na Europa, o ato de "entrega" tem sido mais difícil. O BCE resistiu aos impulsos discricionários, agarrando-se, até excessivamente, às amarras do controle rigoroso sobre a inflação. Mas os países de espírito mais libertário - ou libertino - estão forçando a sua mão. Já não é mais aquele BCE esculpido à imagem retilínea do Bundesbank. É algo mais sinuoso, encurvado às necessidades de salvaguardar o euro, de impedir que as travessuras de alguns países conhecidos por seu apetite dionisíaco implodam o projeto político de unificação.

Os bancos centrais e seus dirigentes fazem parte de um clã, no sentido antropológico do termo. Aquele que abandona os rituais predominantes e as normas de comportamento prevalecentes se torna um pária, um excluído - um abandonado. E o comportamento que hoje predomina no mundo rarefeito da política monetária incita a romper com as regras, a cortar as amarras, a permitir-se a total liberdade de atuação. Por esse prisma, é compreensível que o BC brasileiro tenha resolvido renunciar - temporariamente? - ao regime de metas de inflação. A decisão de reduzir os juros em meio à elevada taxa de inflação brasileira, aos modestos sinais de desaceleração da atividade doméstica e a uma recessão mundial que ainda não se materializou, e que talvez nem sequer se materialize, foi um ato de abandono.

Há circunstâncias em que a ousadia do abandono é admirável. Quando é presciente, quando sabe explicar por meio de uma lógica impecável as razões que motivaram as suas ações "fora de padrão". Mas há outras em que o ato é simplesmente negligente e descuidado, perseguindo falsos deuses - o crescimento de improviso, sem um plano para a infraestrutura e para a educação, sem uma visão congruente de longo prazo sobre o que se quer para o desenvolvimento do País -, em vez de combater problemas reais: a inflação. Neste caso, o abandono tem outro significado. Quer dizer retrocesso.

GOSTOSA


SONIA RACY - DIRETO DA FONTE


Lente de aumento
SONIA RACY
O ESTADÃO - 09/09/11

O Planalto consulta agências nacionais e internacionais para monitorar, por satélite, as áreas plantadas com cana-de-açúcar no País. Pretende confrontar os estoques de álcool com o potencial de produção. Para o governo, nada justifica o litro do etanol atingir os R$ 2.

Direto de Tel-Aviv

A El Al pretende interromper sua linha direta São Paulo-Tel-Aviv a partir de novembro. Alega que o movimento de passageiros não está compensando financeiramente.

De olho na intensificação do comércio bilateral, a Câmara Brasil-Israel tenta convencer a empresa aérea a manter a rota.

Direto da fonte

Depois de Blairo Maggi, o rei da soja, entra agora o rei da carne. José Batista Junior, da JBS-Friboi, costura candidatura ao governo do Estado de Goiás em 2014.

Torpedo

É aguardado com expectativa o discurso de Antonio Patriota, amanhã, em Genebra, no International Institute for Strategic Studies. Será a primeira vez que o chanceler falará, em foro externo, sobre posições militares do governo Dilma.

Na mira

Expirou o prazo dado pela Justiça para o fechamento da Igreja Mundial do Poder de Deus no Brás. O templo deveria ter sido cerrado esta semana para reformas.

Procurada por vizinhos, a subprefeitura da Mooca prometeu vistoria e, se necessário, multa por dia de desobediência.

De matar

Na ação em que foi condenado por atropelamento e agressão a um motoboy, Maurício Mattar teve despesas advocatícias pagas... pela Defensoria Pública de São Paulo.

Como o ator não foi encontrado pela Justiça à época do ocorrido, o órgão (que geralmente atende pessoas sem recursos) teve de nomear um representante para defender o réu.

Avatar tupi

Suzana Villas Boas vai coproduzir docudrama em 3D. Amazônia Planeta Verde está orçado em 12 milhões e começa a ser rodado neste mês.

Quem vem

Tokyo Police Club tocará em SP dia 28. A banda indie canadense será a atração principal da festa de aniversário de Mr. Jack, da Jack Daniel"s.

Quando eu estou aqui

Enquanto Roberto Carlos se preparava para cantar, dançar e lançar rosas ao público em Jerusalém, quarta-feira, convidados e familiares do Rei ocupavam as duas primeiras fileiras do anfiteatro Sultan"s Pool, à beira da muralha da Cidade Velha. Dudu, Rafael e Luciana, filhos de Roberto Carlos, padre Antonio Maria e Tom Cavalcanti, primeiro-camarada do Rei, se acomodaram na segunda fila, atrás de Bia Aydar, José Victor e Tatiana Oliva, Alex Lerner, Regina Casé e Estevão Ciavatta. Cercada por fãs, a humorista carioca ficou impaciente com os pedidos de fotos e autógrafos, mas explicou, com brilho nos olhos, o que a trouxe à Terra Santa: "Tive formação muito católica, estava me preparando para vir. Quando soube do show do Roberto Carlos, pensei: "É a hora certa"".

Já Nir Barkat, prefeito de Jerusalém, que gravara homenagem ao cantor (para ser exibida no telão), tentou falar com ele minutos antes do espetáculo. Mas logo descobriu a velha regra: "Roberto não recebe ninguém antes do show". Ganhou, como alento, o lugar de Dody Sirena na primeira fila.

Sultan"s Pool lotado, os sinos ecoam aos ventos do deserto e o Rei surge cantando "quando eu estou aqui, eu vivo esse momento lindo". As fiéis gritam.

No momento em que Roberto ataca com Jerusalém de Ouro, em hebraico, acompanhado por um coro de 30 vozes, israelenses choram. José Victor Oliva tuíta. O Rei solta a voz, então, no refrão "eu quero ter um milhão de amigos, e bem mais forte poder cantar". A turma de João Dória balança de um lado para o outro com as mãos erguidas. Todos vestindo roupa azul, como a produção do show queria.

Duas horas de espetáculo a céu aberto. Jayme Monjardim, diretor do especial da Globo, pede para repetir duas músicas. O Rei não entende, pensa que tinham ficado boas, demora um pouco, mas volta para o repeteco.

Show encerrado, convidados seguem para coquetel em uma casa milenar nas proximidades do anfiteatro. Dona Gery Simões, mãe de Maria Rita, mulher de Roberto Carlos morta em 1999, levanta-se rumo à portinha que dá acesso ao camarote para abraçar o eterno genro. No caminho, lembra-se de que a filha sonhava trazer o Rei para cantar em Jerusalém.

Gloria Maria chega ao coquetel em estado de graça. Não só foi mestre de cerimônias, escolhida pelo cantor, como ganhou rosa e dançou coladinha com ele. "Roberto falou que só poderia ter feito isso comigo e com mais ninguém". Numa roda de executivos, Dody Sirena comenta o sucesso do show, do retorno positivo que teve de quem comprou os pacotes. E afirma que só faltou a música árabe, cortada por causa de um imbróglio diplomático. Israel e Palestina vivem seu drama político, que terá mais um capítulo este mês, com a votação do reconhecimento do Estado palestino na ONU. Jerusalém Oriental é reivindicada como capital pelos palestinos, algo inconcebível para os israelenses. O Rei preferiu passar olímpico pela discussão.

A presença de Roberto Carlos, aliás, estava programada no coquetel, mas ele não apareceu. Motivo? Teria ficado muito cansado depois de tantos abraços distribuídos no camarote. Foi isso... ou fez justiça a uma das poucas frases que proferiu durante o show: "Gostaria de falar muitas outras coisas neste momento, mas acho melhor dizer cantando, que é o que sei fazer".

Na frente

Fernandinho Beat Box está em estúdio gravando o primeiro álbum. Seu Jorge e Tita Lima são convidados especiais. O disco, Caminho Estreito, sai até o fim do ano.

Nando Reis faz show em homenagem a Caetano Veloso. Hoje, na Hebraica.

Emannuelle Junqueira está na Índia. Motivo? Participa da Signature Premier Fashion Tour. Na volta, comanda lançamento de uma coleção de lingerie para núpcias.

Acontece hoje, no Teatro Alfa, a estreia de Tatyana, com a Companhia de Dança Deborah Colker.

Carlos Augusto Calil inaugura, amanhã, a exposição ArteFatos Indígenas. No Pavilhão das Culturas Brasileiras, no Parque Ibirapuera.

Mayana Zatz pilota noite de autógrafos de seu livro Gen Ética. Terça-feira na Livraria Cultura do Shopping Villa Lobos.

EDITORIAL O ESTADÃO - Uma ata ruim para o Copom


Uma ata ruim para o Copom
EDITORIAL
O Estado de S. Paulo - 09/09/2011

O Banco Central (BC) continua devendo uma boa explicação para o corte de juros anunciado na semana passada. Os motivos para classificar essa decisão como um lance de alto risco são ainda tão fortes quanto na semana passada, quando o Comitê de Política Monetária (Copom) baixou de 12,5% para 12% a Selic, a taxa referencial da economia brasileira. Divulgada ontem, a ata daquela reunião é decepcionante. A justificativa poderia não convencer, mas esperava-se pelo menos uma argumentação bem elaborada, talvez surpreendente. O longo arrazoado ficou longe disso e reforçou duas suspeitas: o BC passou a agir sob pressão política e o regime de metas de inflação está ameaçado. Se a política monetária continuar nesse rumo, o sistema de metas poderá ser nominalmente mantido, mas sem relevância prática.

A decisão do Copom foi baseada em três apostas: 1) a crise internacional, mais persistente e menos aguda que a de 2008-2009, causará uma desinflação e esse efeito será transmitido ao Brasil; 2) a demanda interna perderá vigor e deixará de alimentar a alta de preços; e 3) o governo vai cumprir as promessas de austeridade e as contas públicas serão um fator de ajuste da economia nacional.

Nenhum argumento de peso foi apresentado a favor dessas expectativas. Ao contrário: o texto contém um bom número de razões para se manter o aperto monetário ainda por algum tempo. Não haveria grande perda para a economia se os juros fossem mantidos até se delinear mais claramente o quadro internacional. Mas uma redução precipitada pode ter um custo elevado, se as pressões inflacionárias forem mais persistentes do que esperam os defensores do corte imediato da Selic.

Dois dos cenários mencionados na ata - o de referência, construído pelo pessoal do BC, e o de mercado - indicam para 2011 inflação maior que a estimada em julho e, portanto, mais distante do centro da meta, de 4,5%. Nos dois casos, a inflação ficará "em torno" da meta em 2012 e assim continuará no primeiro semestre de 2013. Em outras palavras, inflação no centro da meta, no fim do próximo ano ou no começo do seguinte, ainda seria uma previsão muito otimista. Detalhe: no quadro de referência a taxa Selic é mantida em 12,5% e o dólar vale R$ 1,60. Só num terceiro cenário, chamado de alternativo, a crise internacional derruba os preços, impõe um freio à economia brasileira e permite conter a inflação interna mesmo com juros menores.

Não há como desprezar essa possibilidade, mas também não há como justificar a decisão de cortar os juros por conta de uma desinflação externa ainda hipotética. Além disso, o impacto da crise internacional no Brasil será equivalente a um quarto do observado em 2008-2009, segundo o tal cenário alternativo.

A ata menciona várias vezes a forte demanda interna e o descompasso entre o seu crescimento e o da oferta. Menciona também o reduzido desemprego, a pequena folga no mercado de trabalho e a expansão da massa de salários como fatores de sustentação de uma forte demanda. Aquele descompasso, segundo o texto, envolve "riscos relevantes", mas em seguida, sem nenhum argumento convincente, esses perigos são descritos como "decrescentes". O texto contém apenas arremedos de argumentos. O nível do uso da capacidade instalada tem diminuído. Mas não convence usar essa referência, quando a utilização permanece acima de 80% e a variação é marginal. Outro motivo de otimismo é "o processo de consolidação fiscal". Esse ponto é mencionado várias vezes, como se os autores da ata ignorassem dois conjuntos de fatos evidentes: 1) a folga fiscal deste ano resulta de um enorme aumento real da arrecadação e só isso explica o aumento de R$ 10 bilhões no superávit primário programado; e 2) a proposta de Orçamento para 2012 é expansionista, o governo admite recorrer mais uma vez a um desconto contábil para cumprir a meta fiscal, há pressões por novos aumentos salariais e a gastança tende a crescer por causa das eleições municipais.

Apesar de todos esses fatos, o Copom decidiu reduzir os juros agora, como se a mudança na gestão das contas públicas fosse um fato. Pagou adiantado numa demonstração notável de confiança ou foi pressionado a agir dessa forma? A ata não deslinda nenhuma das dúvidas vexatórias.

BARBARA GANCIA - Abaixo o bigode do Sarney!

Abaixo o bigode do Sarney!
BARBARA GANCIA 
FOLHA DE SP - 09/09/11

A corrupção deveria ser igualada ao homicídio e ter leis compatíveis ao estrago que produz


CUSTEI A levantar do sofá para atender o telefone.
"Não acredito que você não foi ao protesto contra a corrupção." Era o meu compadre. Ele mora há tantos anos em Londres que parece ter esquecido de que a política, da forma como nós a praticamos, é bidimensional, rasa e oca.
"Eu iria", disse-lhe. "Mas fiquei na dúvida se o desfile de cães do João Dória Jr. seria antes ou depois do ato e acabei perdendo a hora".
É um problema. Nunca se sabe quem está promovendo a passeata. E depois dizem que no Brasil as redes sociais não conseguem aglutinar para fazer protesto organizado, como se o problema fosse falta de poder de mobilização das redes. Sobre a qualidade da mobilização, ninguém diz nada.
Se não for para comprar pãozinho na padaria -sabe como a gente gosta de arrastar o pé dentro da Havaiana da geladeira para o sofá e de volta-, eu prefiro ficar em casa.
Abaixo os impostos! Abaixo as filas nos hospitais públicos! Abaixo a matança de gatos para fazer cuíca no Carnaval! Qualquer que seja a reivindicação, ela precisa conversar com a alma.
Desconfio de que o problema não tenha sido a falta de apelo do Twitter e do Facebook. As vozes que ouvimos esparsas nos protestos do feriado da Independência tem mais o design de choraminga de uma oposição cuja única agenda é querer de volta o poder que lhe escorreu pelas mãos.
Vi várias imagens das manifestações do basta à corrupção e em muitas delas apareciam bandeiras do PT chamuscadas ou ardendo. Isso faz sentido em um país que está maduro politicamente? Tem razão de ser em uma sociedade que conhece o grau de podridão que contaminou as esferas política, legislativa, administrativa e social? A corrupção é privilégio do PT em um país em que pobre rouba pobre, médico esfola paciente e padre passa a mão na carteira do defunto?
Pretendem transformar Dilma na santa Virgem Maria. A Dilma da Berenice, veja só. Na mesmíssima manobra, empurram José Dirceu para o papel de Mefistófeles. Só falta agora inventar uma cavalaria ou os boinas verdes para virem nos livrar do bigode do Sarney.
Em vez de queimar bandeira do PT em praça pública, os indignados do feriado deveriam estar empenhados em pressionar o Congresso a votar para endurecer as leis contra a corrupção. É bem simples.
A gente concentra toda a nossa capacidade neste momento em botar essa turma que só sabe legislar em causa própria para sacudir.
Veja: crime hediondo é pleonasmo, já que não existem crimes adoráveis. Mas corrupção traz consequências nefastas para a sociedade e, como tal, precisa ser tratada como crime gravíssimo e ter leis compatíveis. Nós exigimos que ela seja igualada em gravidade ao homicídio e ponto.
Isso nada tem a ver com mesquinharia partidária nem tampouco com picuinhas de classe. É uma reivindicação justa e autêntica neste momento histórico que precisa ser respeitada e plenamente atendida pelo Congresso Nacional. Estamos resolvidos? Ficamos marcados então para o dia 2 de novembro, no vão do Masp.

CADÊ OS PELEGOS

CADÊ OS PELEGOS

CARLOS HEITOR CONY - Tanta coisa e nada

Tanta coisa e nada
CARLOS HEITOR CONY 
FOLHA DE SP - 09/09/11

Guardo a imagem de um operário com o maçarico, soldando os trilhos do bonde que por ali iria passar



O dia nublado me deu preguiça de ir à praia. Como já estava no carro, peguei o túnel e fui à zona norte rever o cenário de minha infância.
Faço isso esporadicamente, de seis em seis ou de sete em sete anos. Intencionava tirar uma foto da casa onde nasci, levei a máquina fotográfica -a filmadora estava sem bateria.
Encontrei-a com facilidade. Tem hoje o número 306. Quando ali nasci, era o 214, segundo o cartão em que comunicaram o nascimento do filho Carlos Heitor -lá está o endereço da época.
Da vez anterior em que lá estive, há seis ou sete anos, a casa estava em escombros, toda quebrada, mas continuava em pé. Toquei a campainha, um homem veio atender. Disse-lhe o que pretendia, havia nascido ali, pensava até em comprar a casa.
Mas o homem era desconfiado, não permitiu que eu entrasse, acho que alegou ser a casa de outro, sem a licença do dono não podia permitir a visita. Tudo muito estranho, mas o que fazer? Bati em retirada.
Hoje, tive uma surpresa desagradável: a casa continua de pé, mas guardada por um muro de três metros de altura, pintado de verde, com uma porta de ferro maciça, como a das penitenciárias, e apenas um olho mágico quebrando a superfície da porta que parece guardar a caixa forte de um banco clandestino.
Da casa mesmo, só se vê o telhado. O muro protege a casa inteira, mas pela lateral pude ver a parte superior da fachada, que foi reformada. Um aparelho de ar refrigerado em cima e grades fortíssimas protegendo as janelas. Só agora, quando faço este registro, me passa pela cabeça a suspeita: tanto na visita anterior, quando o cara não me deixou entrar, como agora, a casa virou uma fortaleza. Cheguei a pensar em esconderijo de algum bando de traficantes ou de bicheiros, de gente ligada ao crime. Impossível que um morador comum, num bairro tranquilo, de gente pacata, fizesse uma casamata, um bunker.
Bem, tomei nota do novo endereço, quando tiver tempo verei se tem telefone ali. Falarei com o dono ou morador e insistirei em fazer nova visita, embora desconfie de que, da casa em que nasci, só tenham restado as paredes de sustentação. Lembro bem dela, uns quartos pintados de azul, quintal cheio de apetrechos de cozinha, acho que por ocasião de um surto de alguma febre e todos precisavam imunizar cozinhas e banheiros.
Lembro o pai, no jardim da frente, apanhando um balão que ali caiu, na tarde de um domingo. Ele estava dormindo, nós o acordamos, ele veio de pijama, calmo, coçando as costas, apanhou o balão que não era lá essas coisas. Essa lembrança eu aproveitei em "Quase Memória", mas de forma quase épica.
Lembro também da grade da frente, da barraquinha de fogos, com a lanterna vermelha, avisando que ali vendiam fogos. Era do meu irmão e até hoje é uma das minhas frustrações não ter tido uma barraquinha daquelas. Muitos garotos tinham, praticamente em cada rua havia uma lanterna vermelha acesa à noite, avisando que ali se vendiam busca-pés, rodinhas, estrelinhas, bengalas, coisas miúdas.
O irmão botava uma pelerine por causa do sereno e passava parte da noite ali, esperando os fregueses. Lembro que tia Doneta ficava com ele até a hora em que se retirava para dormir, levando a barraquinha para o quarto dele. Eu nem podia me aproximar daquele tesouro que tinha um cheiro que não esqueci, cheiro de pólvora, de cola, de papelão, de papel seda colorido.
Lembro também dos operários que calçavam a rua, eu teria dois ou três anos. Guardo a imagem de um operário com o maçarico, soldando os trilhos do bonde que por ali iria passar. As fagulhas azuladas -eu tinha medo delas? Não sei. Tinha medo, isso sim, da máquina que era um ancestral do rolo compressor, passava em cima dos paralelepípedos, com o peso do imenso rolo de aço fixava as pedras no leito da rua.
Acho que a tal máquina apitava, dela saía uma fumaça, eu tinha pavor quando ela passava pela nossa casa. Parecia um bicho, uma espécie de mula sem cabeça, um animal desgovernado que me ameaçava. Minha reação era chorar, chorar muito. Creio que essa máquina me fez medroso pelo resto da vida.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS - Diário de uma semana em Londres

Diário de uma semana em Londres
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS 
FOLHA DE SP - 09/09/11

Se os líderes das nações europeias errarem, o mundo pode mergulhar em nova recessão econômica


ISOLADO DO dia a dia dos mercados por um retiro voluntário na velha Londres, trago ao leitor da Folha algumas reflexões sobre o que tenho lido sobre a crise da Europa unida. Longe da internet e da sala de operações da Quest em São Paulo, o mundo parece outro.
Leio os principais jornais europeus sabendo que estou 24 horas atrás do fuso horário do mercado financeiro. Mas essa sensação de estar atrás dos acontecimentos me faz voltar a um mundo mais reflexivo de uma década atrás e no qual os acontecimentos estão sempre ligados pelo tempo mais lento da história. E ler nos jornais de papel as reflexões de analistas mais sóbrios do que os que frequentam os sites do mundo eletrônico me fez entender as causas mais profundas dos problemas que os líderes políticos da Europa terão de enfrentar nos próximos meses.
Para muitos desses analistas, os problemas de hoje derivam de uma leitura romântica e demasiadamente racional das sociedades que formam a comunidade europeia de hoje, reunidas pela utopia de um só espaço político e econômico.
A ideia dessa união surgiu quando as cinzas da destruição criada pela Segunda Guerra ainda estavam presentes e o desejo de não mais viver essas experiências dominavam os povos da Europa.
Foram os políticos marcados por essas duas guerras devastadoras que lideraram os primeiros movimentos na direção da integração econômica e que seria seguida mais adiante pela política.
Mas as primeiras décadas do sonho europeu de uma só sociedade foram marcadas, de forma pragmática, por movimentos contínuos, mas cuidadosos em relação à integração da economia.
A questão política ficou restrita, por muito tempo, apenas na criação de um governo europeu -Executivo e Legislativo- sem poder real e restrito à pequena Bruxelas.
Todos sabiam que as decisões mais importantes continuavam nas mãos de líderes nacionais, eleitos em seus respectivos países por franceses, alemães, italianos e outros.
Nos 40 anos que separaram a criação da chamada comunidade do aço da Europa -primeiro passo na integração econômica- da queda do Muro de Berlim, muitos políticos sentiram que a ideia de uma só Europa perdia força.
As guerras vividas no século anterior eram, cada vez mais, coisas dos velhos e do passado, com o dia a dia de cada país marcado pelo espírito nacional de cada nação e, principalmente, pelas dificuldades que os jovens encontravam para acessar o mercado de trabalho.
Como o mito da Europa unida pela economia prometia tempos melhores, a busca continuou a ser vista como desejável, e os passos nessa direção continuaram a ser tomados.
Marca viva dos anos de guerra, a força simbólica da unificação da Alemanha, com a queda do Muro de Berlim, levou ao passo definitivo da criação do euro e, segundo muitos analistas, ao início do fim do sonho de uma Europa única.
Na euforia da vitória sobre o comunismo, François Miterrand e Helmut Kohl, líderes políticos que conduziam de fato o processo de integração, deixaram de lado questões técnicas para aproveitar o momento de opinião pública favorável e forçaram a criação do euro.
Os problemas enfrentados hoje mostram de forma clara que a criação de uma moeda única naquele momento foi um erro. A questão da dívida pública em um grande número de países mostrou o vazio existente nas regras de integração fiscal de economias tão diferentes como a alemã e a grega.
Mas, o que fazer agora? Voltar atrás ou caminhar adiante na direção de uma verdadeira comunidade de países? Essa dúvida é que está por trás das especulações e do vaivém das cotações do euro, do dólar e das ações nos mercados financeiros do mundo todo.
Se os líderes das nações envolvidas nesse imbróglio escolherem o caminho errado, podem criar uma crise bancária ainda mais grave do que a que estamos vivendo. E, se isso ocorrer, dada a fragilidade da economia americana, que ainda digere os excessos financeiros dos anos Bush, o mundo pode mergulhar em nova recessão econômica.

VINICIUS TORRES FREIRE - Obama, o fraco

Obama, o fraco
VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 09/09/11 

Tardio, talvez insuficiente, plano Obama parece ter sido feito por um governo que teme republicanos

MAIS DO que de costume, a economia e a política econômica do país dependem dos sacolejos do trem mundial. Como se sabe, o Banco Central acredita que vamos pegar gripe, dado o risco de pneumonia nos EUA e de tuberculose europeia.
A ação nos EUA agora depende de Barack Obama. Bom de discurso, é um democrata conservador, assustadiço e sem imaginação.
Ontem, o presidente do Banco Central dos EUA, o Fed, meio que jogou a toalha ou pediu que Obama tomasse alguma providência. Ben Bernanke falava horas antes de Obama contar de seus planos de estímulo à economia. Por ora, o Fed tem pouco mais mesmo o que fazer.
Bernanke foi algo mais incisivo quanto à necessidade de o governo dar um choque no corpo desanimado da economia. O estímulo fiscal (gastos ou corte de imposto) federal está no fim; sem receita, Estados e municípios demitem e cortam gasto. Com a palavra, Ben Bernanke:
"...Sem significativas mudanças de política, que lidem com o crescente peso fiscal associado ao envelhecimento da população e o contínuo aumento dos custos com a saúde, as finanças do governo federal vão fugir do controle nas próximas décadas, com ameaça de grave dano financeiro e econômico".
Embora seja bom começar a lidar com isso, quem cuida das contas do governo não deve "desprezar a fragilidade da recuperação econômica. Felizmente, os dois objetivos não são incompatíveis [isto é, o início de um projeto fiscal responsável, de longo prazo e recorrer à política fiscal para reanimar o PIB, agora]".
Paul Krugman, o economista Nobel e jornalista do "New York Times", diz a mesma coisa faz anos; o repetiu no "NYT" de domingo:
"Não quero desprezar preocupações com o Orçamento dos EUA no longo prazo. Se você olha as projeções fiscais para, digamos, 20 anos, elas são de fato muito preocupantes, principalmente por causa dos crescentes custos da saúde. Mas a experiência dos últimos dois anos confirmou de modo acachapante o que alguns de nós tentamos dizer desde o começo [da crise]: os deficit de agora não são ameaça, são deficit que deveríamos ter, pois o gasto extra ajuda a dar apoio a uma economia deprimida".
Ao contrário do Brasil, de consumo excessivo, desemprego baixo e juro alto, falta demanda nos EUA, sobra dinheiro parado e há desemprego em massa. O pontapé inicial do gasto poderia vir de dívida extra.
O governo dos EUA pode tomar empréstimos de dez anos a juro zero. Para prazo menor, a taxa é negativa. Isto posto, o que faz Obama, depois de já ter entregue a alma e as calças ao baixo clero chantagista da direita dos republicanos?
Aparece com um plano de cortar uns impostos (estímulo mais fraco que o aumento direto de gasto) -reduz imposto sobre folha de salários e a contribuição social dos trabalhadores. Um plano de baixar imposto para quem contratar mais, atitude em baixa porque a economia não anda, pois falta criar empregos, coisa na qual Obama não quer se meter diretamente. Além disso, há um plano menor de investimento em infraestrutura (estradas, escolas).
O plano seria pago com imposto sobre ricos e o fim de brechas tributárias usadas por empresas. Melhor que nada? Mas pouco. A recessão espreita na esquina, se já não dobrou o cabo da falta de esperança.

JAPA GOSTOSA


RUY CASTRO - Pelos olhos do cidadão

 Pelos olhos do cidadão
RUY CASTRO 
FOLHA DE SP - 09/09/11

RIO DE JANEIRO - Numa entrevista a Vanessa Correa (Entrevista da 2ª, 29/8) durante o 1º Congresso Internacional de Habitação e Urbanismo, realizado em São Paulo, o arquiteto Alexandros Washburn, diretor de desenho urbano da Prefeitura de Nova York, falou da importância de ser, ora, veja, pedestre na metrópole por excelência.
"Caminhar é a atividade mais importante na cidade", ele disse. "Tanto pelo lado cultural como pela sustentabilidade. (...) É por isso que Nova York é uma cidade vibrante. (...) O espaço público é importante para construir confiança entre as pessoas de todas as classes e etnias. (...) Quando toma a decisão de colocar o pedestre em primeiro lugar, você adota um ponto de vista. Você vê os problemas através dos olhos de um cidadão caminhando pela rua."
E, então, Washburn disparou um conceito que, para muitos, pode parecer chocante: "O muro da rua tem que ser feito do tecido dos prédios, com lojas [no térreo], janelas nos primeiros andares. [É preciso] sentir que as extremidades da rua estão abertas para você. E que as pessoas estão olhando para você".
No Brasil, há anos temos feito o contrário. Asfixiamos nossas cidades com prédios em que não só o comércio, mas até os moradores foram banidos dos três ou quatro primeiros andares, agora reservados a garagens. Somando a isso o térreo afastado da rua e de pé-direito muito alto, é como se, nesses prédios, a vida só começasse a 20 metros de altura. É como estabelecer que a rua nos é hostil, que devemos manter distância e nunca nos arriscarmos por ela a pé.
Pusemos nossas cidades a serviço dos carros, e deu no que deu -elas ficaram efetivamente hostis. Daí ser fascinante ouvir do homem responsável pelo planejamento urbano, não de Brejo Seco, mas de Nova York: "Carros e pessoas podem andar juntos, mas a questão é perguntar primeiro ao pedestre".

RUBENS BUENO - O PT e o controle da informação


O PT e o controle da informação 
 RUBENS BUENO
FOLHA DE SP - 09/09/11

A democratização da mídia está em deixá-la livre, e não em circundá-la; o Congresso deve atentar para projetos de regulamentação da imprensa


O historiador britânico Robert Conquest nos conta que, no período do Grande Terror (1936-1938), no qual Stálin mandava políticos e intelectuais para a Sibéria nos expurgos criados para eliminar adversários, o controle da informação era tão rígido que a única forma segura de transmitir alguma coisa era por debaixo de cobertores.
Entre 1966 e 1976, outro ditador, Mao Tsé-tung, instituiu a Revolução Cultural na China, um processo sistemático de julgamentos públicos de professores e opositores com o objetivo indisfarçável, mais uma vez, de controlar a informação circulante entre o povo chinês.
Em Cuba, deu-se o mesmo. Durante décadas, para se criticar Fidel Castro, foi preciso sair do país, como fez o escritor Guillermo Cabrera Infante. Mais uma vez, controlar a informação era e tem sido essencial para a manutenção do status quo refratário a manifestações críticas.
Há casos em que o desejo dos governantes de encurralar a informação se dá por meio da manipulação das massas. Há pouco, Hugo Chávez liderou odiosa campanha contra a imprensa livre. Partidários dele atacaram a TV Globovisión, e é notória a perseguição a jornalistas e empresários, como Guillermo Zuloaga, dono da rede agredida, e Alejandro Peña Esclusa, opositor recentemente libertado, depois de ter sido preso sob a falsa acusação de tramar a deposição de Chávez.
Na mesma toada, a presidente da Argentina, Cristina Kirchner, move incansável campanha contra o jornal "Clarín", respeitado por fazer um jornalismo crítico e independente. Situação semelhante tem ocorrido na Bolívia e no Equador.
O que se vê com tudo isso é que o autoritarismo sempre encontra meios de limitar a manifestação independente de opinião. Seja à la Stálin, à la Mao, à la Fidel ou à la Chávez, algum mecanismo é encontrado para cumprir a tarefa de frear a livre circulação da notícia.
No Brasil, desde Lula, temos visto o ensaio do controle da mídia por meio de propostas como a criação de conselhos que garantiriam, segundo os que as concebem, a democratização da mídia. A história mostra que ações nessa direção servem mais para balizar fontes noticiosas do que para universalizar a produção da notícia.
Afinal, quem fará parte desses conselhos se não os afinados ideologicamente ou por conveniência ao governo federal? O próprio conceito de conselhos está vinculado à ação de restringir, regular e fiscalizar, ou seja, seu escopo não é o da liberdade, e sim o de controle de algo que se quer regulamentado.
A democratização da mídia está, portanto, em deixá-la livre, e não em circundá-la, como quer o PT. O Congresso Nacional precisa estar atento a projetos que tenham por objetivo a regulamentação da imprensa. Será preciso rechaçá-los como se rechaça toda ideia cujo fim intrínseco seja ferir a democracia.
Vamos dizer não a isso.

O CORRUPTO LULA TIRANDO O CORPO FORA


O CORRUPTO LULA TIRANDO O CORPO FORA

MARIA CRISTINA FERNANDES - O Senador que apostou na queda dos juros


O Senador que apostou na queda dos juros
MARIA CRISTINA FERNANDES
VALOR ECONÔMICO - 09/09/11

O Senador Lindbergh Farias (PT-RJ) subiu à tribuna duas vezes em menos de uma semana para apostar na queda da taxa Selic. A última delas foi na noite da terça-feira, 30, véspera da decisão do Copom.
Depois de ter ascendido na política como o líder estudantil das manifestações que resultaram no impeachment de Fernando Collor, o Senador, que cursou Medicina e Direito, sem concluí-los, direcionou seu mandato para temas econômicos. No ponto futuro de sua carreira - a mais meteórica do PT fluminense - está o Palácio da Guanabara.
Titular da Comissão de Assuntos Econômicos, Lindbergh assumiu a condição de principal interlocutor petista da área econômica no Senado desde que a Senadora Gleisi Hoffmann assumiu a Casa Civil.
A afinidade se reflete no teor dos três projetos que apresentou em seu primeiro semestre de mandato: o que soma às competências do BC o estímulo à geração de empregos, e dois outros que promovem a desindexação de títulos e contratos públicos.
Casado há 17 anos com Maria Antônia Goulart, filha de uma companheira de guerrilha da presidente Dilma Rousseff, Linda Goulart, hoje assessora do ministro da Educação, Fernando Haddad, Lindbergh foi convidado pelo menos duas vezes a integrar a comitiva de viagens da presidente.
Mas o Senador não atribui sua aposta na queda da Selic à proximidade adquirida com os ministros da área econômica nem à relação familiar com a presidente. "Os sinais foram públicos e sucessivos. O mercado não pode alegar que foi pego de surpresa", diz.
Lourdes Sola, por exemplo, professora aposentada da USP e organizadora de "Banco Central, Autoridade Política e Democratização" (FGV, 2002), sintetiza as preocupações surgidas desde a decisão do Copom: "Desde meados dos anos 1990 o BC tornou-se um coordenador das expectativas de mercado. Foi assim que suas decisões adquiriram mais transparência. A decisão da semana passada rompeu com a ritualística e quis pegar o mercado de surpresa como no passado. Por isso, foi autoritária". A professora contesta um mandato para o BC perseguir tanto a estabilidade monetária quanto a geração de emprego: "O Fed age assim porque é independente e presta contas ao Congresso. O Brasil tem um sistema hiperpresidencialista que tende a manipular a política monetária de olho nas eleições".
Lindbergh não apenas saúda como benéfica a convergência entre governo e BC como cita uma entrevista da presidente e outra do presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, como dois sinais eloquentes da queda da Selic ignorados pelo mercado. Na entrevista da presidente (Carta Capital 16/08/2011), respondendo à pergunta do que faria para baixar os juros, respondeu: "Não vou dizer qual é a nossa receita, porque, se fizer essa antecipação, cometerei um equívoco político e econômico. Vamos olhar a partir de agora de uma forma diferente essa situação que vem pela frente, porque é algo distinto. Não estamos mais na mesma situação de antes, nem sabemos direito o que vem, mas estamos com abertura suficiente para perceber que pode ser exigido de nós um grande esforço para conter isso".
O presidente do Banco Central também não tergiversou em sua entrevista ("O Estado de S. Paulo", 18/6/2011): "A presidente dá o comando. E o comando dela tem sido muito claro para que as políticas do governo sejam adotadas visando assegurar a estabilidade monetária e a inflação na meta. É isso o que temos feito. O BC é uma autarquia. Sou ministro de Estado. Além de presidente do BC, faço parte do conjunto do ministério. Há um diálogo sobre avaliação econômica".
A essas duas entrevistas Lindbergh somou as declarações convergentes dos ministros Guido Mantega e Fernando Pimentel no Senado, nas proximidades do Copom, de que o aumento do superávit abriria espaço para o corte de juros e concluiu que o jogo ia virar.
É com a mesma convicção que o Senador agora atesta força redobrada de Dilma junto à sua base aliada no Congresso para cumprir o ajuste fiscal que a ata do Copom de ontem elege como condição à continuidade da política de redução dos juros.
Um sinal do fortalecimento político da presidente teria sido a resolução do PT em seu 4º Congresso. O partido dava sinais de que seu documento oficial teria um tom de calculada independência em relação a Dilma. Quando veio o Copom, o partido afinou, citou 35 vezes a presidente e fez uma resolução saudando a redução da Selic.
Na mesma resolução, no entanto, o partido reafirma como compromissos inadiáveis a emenda 29 para a saúde pública e o Plano Nacional da Educação. Se aprovados, representarão despesas adicionais na casa das dezenas de bilhões do Tesouro.
Some-se à resistência petista a crítica da maior central sindical do país, a CUT, à elevação do superávit primário em R$ 10 bilhões. É a essa central que está filiada a grande maioria dos funcionários públicos que, pela proposta orçamentária enviada ao Congresso, terá que se ver com uma redução, em termos reais, dos gastos da União com pessoal.
No tripé das pressões contrárias ao equilíbrio fiscal reclamado pelo Copom está a cúpula do Judiciário com sua demanda por reajuste que, replicado em cascata Brasil afora, resultaria em mais um passivo bilionário a ser coberto pela União.
Confrontado com essa equação política à época em que o déficit nominal zero lhe foi proposto em 2005, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva recuou com o apoio da então ministra da Casa Civil que viria a sucedê-lo.
Por que Dilma Rousseff, que também tem uma reeleição pela frente, agora estaria disposta a enfrentar o risco político embutido nessa equação menos juros/ menos gastos?
Lindbergh diz que a atual situação econômica do país exigirá um sacrifício menor dos brasileiros do que teria exigido naquele momento: "A presidente nunca admitirá que esses 40 milhões que ascenderam à classe média retroajam".
E avalia que a força política adquirida por Dilma favorece uma solução que desindexe a poupança da Selic. Reconhece que a solução politicamente mais viável pode vir a ser uma desindexação restrita a depósitos futuros, mas diz que se o governo quer aprofundar as mudanças necessárias à redução continuada dos juros o momento é este.

PAULO SANT’ANA - O carneiro montanhês


O carneiro montanhês
 PAULO SANT’ANA 
ZERO HORA - 09/09/11

Ontem, escrevi sobre as pessoas que parecem uma coisa e são outra bem diferente.

Vejam o caso de meu amigo Fernando Soler, da casa de tango Señor Tango, onde me chama para o palco para cantar, todas as vezes que vou a Buenos Aires.

É um homem encantador, poético, jovem, bonito, grande cantor. Então, o que há por trás dele?

Pois ele próprio me contou. Viaja duas vezes por ano ao Canadá, até Vancouver. Depois, fica três dias escondido em uma barraca, à beira de uma montanha.

E se arma de uma carabina com luneta, sobre a montanha. Lá, num lugar qualquer, fica à espreita de carneiros montanheses, um animal estupendo, do tamanho de um novilho.

E o momento de maior felicidade do meu amigo Fernando Soler é quando, de 150 metros a 200 metros de distância, deitado na mira, puxa o gatilho de sua espingarda e vê lá adiante, no seu alvo, o carneiro montanhês tombar morto.

E o meu amigo Soler me mostra a fotografia colorida dele ao lado de seu troféu. O carneiro parece vivo, tem os olhos grandes bem abertos, os chifres lindos e simétricos fazem uma volta esteticamente perfeita. Ali está, diante dos meus olhos, aquela cena horrenda: o meigo carneiro e seu assassino, o meu amigo Fernando Soler, que a mim parecia, antes de me contar esta faceta, ser um homem ideal, perfeito, chefe de família e grande cantor – tudo isto ele sempre vai ser.

Mas vejam como as aparências enganam. Ele mora em Buenos Aires e atravessa a América para caçar indefesos carneiros montanheses no Canadá.

Mesmo assim, continuo seu amigo, mas, sempre que me encontrar com ele, vou vê-lo também como abatedor de carneiros.

Vai aparecer para sempre esta sombra na nossa amizade.

Pois foi preciso ir a Buenos Aires para conhecer esta história que vou agora contar. Quem me passou foi o próprio Fernando Soler.

Num dia qualquer do século passado, numa aldeia chilena, estava uma mulher que mais tarde seria a grande poeta chilena Gabriela Mistral, como professora de uma escola primária.

E ela perguntou ao aluno que estava na fila da frente da aula o que ele queria ser quando fosse grande. E o aluno, com oito anos de idade, que mais tarde se chamaria Pablo Neruda, o maior de todos os poetas americanos, disse que queria ser poeta quando fosse grande.

Anos mais tarde, aconteceu uma incrível coincidência: tanto Gabriela Mistral, não mais professora, quanto Pablo Neruda, não mais aluno, receberiam, em datas diferentes, o Prêmio Nobel de Literatura.

Foram os dois únicos chilenos premiados com o Nobel de Literatura em todos os tempos. A professorinha e o aluno que se encontraram 60 anos antes naquela escola de aldeia.

Recebo um apelo desesperado: “Por favor, me ajude. Estou com problema grave de família, meu avô está com câncer. Ele não tem plano de saúde e tivemos de levá-lo até o Hospital Conceição. Fizeram exames nele, mas o hospital não possui leitos, todos os pacientes, inclusive meu avô, estão sentados em uma cadeira de rodas na área verde do Conceição. Peço socorro urgente. Me chamo Carla de Souza Medeiros e meu telefone é 51-9318-7151”.

E meu coração se fez em pedaços quando li. Porque eu também tenho câncer, mas pude fazer tratamento.

GOSTOSA


MIRIAM LEITÃO - Pontos soltos


Pontos soltos
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 09/09/11

A ata do Copom diz que o cenário para a inflação futura "acumulou sinais favoráveis", quando ele piorou; diz que "eventualmente" a política monetária terá uma reversão, depois que ela já reverteu; aposta que o aumento do gás de bujão será zero, num ano em que o produto já subiu. Em suma, acabou-se a esperança de que a ata do Banco Central fosse eliminar as dúvidas sobre a queda dos juros.

Não é apenas uma questão de redação. Quando a comunicação do Banco Central não fica muito clara as previsões de inflação podem subir, e o País entra naquela armadilha da profecia que se autorrealiza: agentes econômicos estabelecem preços de seus produtos considerando que a inflação vai subir e, em consequência, ela sobe mesmo.

Uma comunicação clara e previsível faz parte do regime de metas de inflação, e por isso os economistas se acostumaram a esquadrinhar as atas e relatórios do Banco Central tentando entender cada palavra.

Isso fez o professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, estranhar uma palavra no parágrafo 30 da ata. O texto diz que os diretores acham que aumentou muito a incerteza na economia desde a última reunião e que isso justifica uma reavaliação "e eventualmente uma reversão do recente processo de elevação da taxa básica." Ora, a ata era para explicar por que reverteu e não dizer que "eventualmente" poderá reverter.

O texto assegura que já está encerrado o período de elevação da inflação em 12 meses, mas isso não está garantido. Haverá queda no acumulado em 12 meses até dezembro porque dificilmente o país repetirá este ano a mesma elevação do último trimestre do ano passado.

Mas essa queda do acumulado - que já está em 7,23% - pode ser interrompida no começo de 2012 por pressão dos preços dos serviços, que certamente vão subir com o aumento de 14% do salário mínimo. A própria ata alerta que a inflação de serviços continua e vai continuar alta.

A explicação mais consistente da ata é que a situação internacional está em contínua deterioração. Piorou mesmo e ficou mais incerta. A questão é saber se a crise reduzirá a inflação no Brasil. Até agora, a queda das previsões para o PIB de uma série de países não está derrubando as cotações das commodities agrícolas. Os alimentos continuam em alta por outros fatores que não o crescimento mundial. E isso a própria ata reconhece.

O Banco Central acha que a crise agora é diferente: mais persistente, menos aguda, e com um impacto menor na economia brasileira. Calcula que será de um quarto do que foi o impacto em 2008/2009. O BC diz no parágrafo 11 que os "riscos para a estabilidade financeira global se ampliaram, entre outros, pela possível exposição de bancos internacionais a dívidas soberanas, principalmente da Zona do Euro."

E acha que essa crise pode, num cenário alternativo, diminuir a pressão inflacionária, mesmo se o dólar subir e os juros continuarem caindo. Em comparação com o resto do mundo, as taxas de juros brasileiras são tão altas que o desejável era reduzi-las mesmo. Mas a queda acontecendo no meio de ruídos e suspeitas pode fomentar a ideia de que o Banco Central se enfraqueceu. Hoje, as previsões são de juros em baixa, inflação em alta, desaceleração do PIB; um conjunto contraditório.

O Banco Central voltou a dizer que o mercado de trabalho está aquecido e que há "um risco importante" de "aumentos de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade e suas repercussões negativas sobre a dinâmica de inflação."

De novo, este trecho não conversa com o resto. Se o cenário é de recessão global então por que temer aumentos incompatíveis de salário? Por outro lado, se há esse risco, não é precipitado baixar as taxas de juros?

Segundo o BC, o crescimento da renda e a expansão do crédito mantêm a demanda doméstica "robusta", mas acha que isso será compensado porque "iniciativas recentes reforçam o cenário de contenção das despesas públicas." Que iniciativas? A decisão do governo de avisar que não gastará R$ 10 bilhões de uma receita extraordinária, que recebeu este ano, não reforça sinal algum de contenção de despesa. Se o setor público está no meio de uma campanha para criar um novo imposto é porque terá novas despesas. Além disso, o Orçamento de 2012 foi enviado com uma previsão de aumento de gastos maior do que o crescimento da receita. Os sinais mais consistentes são de ampliação de gastos.

Por enquanto, o que mais incomoda o governo é o que mais ajuda no controle da inflação: o câmbio valorizado. A guerra cambial, como foi definida pelo ministro Guido Mantega, está ajudando, mesmo que ninguém a queira. Contra seus efeitos o governo pensa numa série de medidas de fechamento do mercado brasileiro, mas o dólar baixo derrubou a inflação de bens duráveis nos últimos doze meses. Esses preços tiveram deflação de 0,95%. Mas isso produz efeitos colaterais indesejáveis.

O cenário de referência, ou seja, o que tem maior probabilidade de acontecer, é de um dólar de R$ 1,60. Esta semana, bateu em R$ 1,66 e zerou a queda no ano. Assim, uma parte do governo torce para que o dólar suba, mas se ele subir pode haver impacto na inflação. Enfim, a ata deixou uma série de pontos soltos.

NELSON MOTTA - O guerreiro do povo


O guerreiro do povo
NELSON MOTTA
O Estado de S.Paulo - 09/09/11

O grito de guerra dos militantes ainda ecoa no Planalto Central. "Dirceu guerreiro! Do povo brasileiro!", o refrão estremece o salão, como um canto de torcida organizada no estádio ou o coro de um funk carioca num bailão.

Mas Dirceu é guerreiro modesto e discreto, nunca falou sobre as suas ações revolucionárias, seus confrontos com as forças da repressão, suas batalhas de arma na mão pelo povo brasileiro. Talvez para não humilhar companheiros que não tiveram tanta bravura como ele na luta contra a ditadura, ou cometeram erros estratégicos que levaram à prisão e à morte de companheiros. Ou talvez porque nunca tenham acontecido. Quando lhe perguntam se matou alguém em combate, dá um sorrisinho maroto e faz cara de mistério.

O guerreiro chama a presidente Dilma de "companheira de armas", mas embora ela tenha pago na própria carne pela sua coragem revolucionária, não há qualquer notícia, documento ou testemunha da presença de Dirceu, ou de "Daniel", seu nome de guerra, em nenhuma ação armada durante a ditadura. Talvez a Comissão da Verdade faça justiça à sua combatividade, ou desmascare o guerreiro que foi sem nunca ter sido. Talvez algum dia reapareçam os disquetes com a sua biografia escrita por Fernando Morais, em que ele dizia ter contado tudo sobre a sua vida guerreira, mas foram misteriosamente roubados da sua trincheira.

Na Câmara, ele foi um incansável guerreiro, se recusando a assinar a Constituição democrática de 88, batalhando pela rejeição da Lei de Responsabilidade Fiscal e denunciando o Plano Real como uma farsa eleitoreira da direita. Perdeu essas batalhas, mas não a sua guerra.

Notável estrategista, ele começou como um dos líderes estudantis que, em 1968, convocaram um congresso "secreto" da UNE em uma fazenda em Ibiúna, onde os 500 congressistas foram facilmente cercados pela polícia e pelo Exército e presos, aniquilando o movimento estudantil. Em entrevista recente, Dirceu disse que, mesmo cercado por centenas de policiais e soldados armados, "queria resistir", mas foi voto vencido.

Com um guerreiro desses, o povo brasileiro não precisa de inimigos.

LAVANDO O GOVERNO DA VAGABUNDA

LAVANDO O GOVERNO DA VAGABUNDA


MÔNICA BERGAMO - ITAQUERÃO DA JANELA


ITAQUERÃO DA JANELA
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 09/09/11

Além de construir o Itaquerão, estádio do Corinthians, a Odebrecht deve participar de um empreendimento imobiliário nos arredores da arena em conjunto com a Prefeitura de SP. Na PPP (Parceria Público-Privada) que está em estudo, a administração pública entra com um terreno vizinho ao campo -e a empreiteira constrói um condomínio de 600 casas populares.

DA JANELA 2
O projeto da Odebrecht com a prefeitura deve ter ainda financiamento do Minha Casa, Minha Vida, programa do governo federal para moradia popular.

LULA É DO BEM
Depois da pesquisa Datafolha que mostrou Marta Suplicy com 29% dos votos, ela foi aconselhada a segurar seus impulsos de criticar o ex-presidente Lula. "É preciso muita calma nesta hora", diz um de seus apoiadores.

BATE, CORAÇÃO
Marta, segundo o mesmo conselheiro, estava amargurada, triste, chateada e se sentindo humilhada por Lula. A pesquisa teria feito voltar ao partido um clima de "racionalidade", já que Fernando Haddad, o candidato que o ex-presidente quer lançar à prefeitura, aparece só com 2% das intenções de votos na pesquisa.

SANGUE EM FAMÍLIA
O PSD, novo partido de Gilberto Kassab, vem recebendo apelidos jocosos de integrantes do DEM, antiga legenda do prefeito.

Um deles: Partido Só da Dilma, pela proximidade com o governo federal. Outro: Pode Ser Defunto, por causa das denúncias de que eleitores que já faleceram constam das listas de apoio à nova agremiação.

MEU GAROTO
Entrevistado pela revista "Poder", o presidente de honra da Fifa, João Havelange, comentou a recente veiculação, pela TV Globo, de denúncias contra seu ex-genro e presidente da CBF, Ricardo Teixeira: "Por que isso? Porque mudou horário de jogo [transmitido por canais da Globo]. O Ricardo só não serve na hora que não faz as vontades. Enquanto interessou à Globo, era um gênio. No dia em que ele quis tomar uma medida que poderia ferir a emissora, ela se volta contra ele".

OUTRO LADO
A Central Globo de Comunicação disse à coluna que "o jornalismo da TV Globo é absolutamente independente e não existe quem possa influenciar a sua linha editorial, baseada sempre em critérios de correção e isenção". Segue a emissora, comentando a reportagem: "Objetivamente, nunca deixamos de noticiar qualquer fato relevante envolvendo a CBF ou qualquer outra entidade. Quem acompanha nosso noticiário, incluindo o mais recente, sabe que isso não procede".

FESTA NO CLUBE
O designer Raphael Falci e o empresário José Tibiriçá comemoraram aniversários no clube Lions. Bia Anthony, mulher do ex-jogador de futebol Ronaldo, e Cleo Dobberthin, entre outros convidados, foram à festa.

DOIS A ZERO
O Conar, órgão que regula a publicidade, confirmou o arquivamento da denúncia do Instituto Alana contra um comercial que o McDonald's exibia antes das sessões do filme "Rio". O caso havia sido reaberto pelo próprio conselho depois que o relator chamava a ONG de "bruxa que odeia criancinhas". O Alana rompeu com o Conar.

FIM DE JOGO
O arquivamento foi confirmado por unanimidade, com o argumento de que o anúncio, por ter sido exibido antes do filme, não misturava seu conteúdo com o do longa. Ekaterine Karageorgiadis, advogada do Alana, discorda: "Se a criança sai do cinema e vê o McDonald's, o que ela vai pedir? É uma pena que o Conar tenha arquivado, perdendo a oportunidade de questionar".

BONS DE PAPO
Escritores como Frei Betto, Ruy Castro, Leonardo Boff e Luis Fernando Verissimo participaram do debate em comemoração dos 25 anos do projeto literário Sempre um Papo, em Minas. Zuenir Ventura foi com a mulher, Mary, ao evento organizado por Afonso Borges no Grande Teatro do Palácio das Artes.

CURTO-CIRCUITO

Cristovão Tezza faz palestra, hoje, às 20h, no Itaú Cultural, e autografa o livro "O Fotógrafo".

A mostra "Rubens Gerchman - Os Últimos Anos" será inaugurada amanhã, às 11h, na Caixa Cultural.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO - Literatura vai de menos 1 a 40 graus


Literatura vai de menos 1 a 40 graus
IGNÁCIO DE LOYOLA BRANDÃO
O Estado de S.Paulo - 09/09/11

Bem interessante. Enquanto a Flip foi dominada pelo escritor português walter hugo mãe, conquistando homens e mulheres, a Jornada Nacional de Literatura de Passo Fundo, que continua sendo o maior evento do Brasil e da América Latina, girou em torno do talento e do carisma de outro português, Gonçalo Tavares. Tranquilo, simples, ele foi "comendo" todo mundo pelas beiradas, como se diz por aqui.

Na mesa sobre identidade, literatura e cultura na globalização, foi o único a fazer um depoimento atual, consciente, lúcido, ao contrário do celebrado (e decepcionante) Luiz Costa Lima, que se julga em altíssima conta e desprezou a Jornada e os participantes dormindo no palco, diante de 6 mil pessoas, e dando um depoimento pífio. Ao acordar, atrapalhou-se com suas anotações, disse que as tinha esquecido no hotel. Não tinha nada a dizer. Ensaísta à antiga que fala em linguagem hermética, vazia. Plateia monumental, professoras e estudantes, 18 mil crianças na Jornadinha, ouvindo e conversando com autores infantis. Ninguém bate Passo Fundo. Mauricio de Sousa dominou a cena, crianças de todo o Brasil o conhecem, adoram.

Neste momento há pelo Brasil dezenas de feiras (acaba uma, começa outra) e bienais e encontros. Saí de São Joaquim da Barra, interior de São Paulo, onde a prefeita Maria Helena Borges Vannuchi, obstinada e interessada em cultura, insiste em manter uma feira de livros com gente de primeira linha, e parti para Passo Fundo (-1°C na abertura da festa e vento minuano varrendo), norte do Rio Grande do Sul. Segui para o Piauí, para o terceiro Salipa, Salão Literário de Parnaíba (40°C à sombra), na boca do maravilhoso delta que separa aquele Estado do Maranhão. Hoje estou na 2.ª Filmar, Feira Literária de Marechal Deodoro, ao lado de Maceió. O sol come. Livros e literatura por toda a parte. Segunda-feira desço ao interior do Paraná para falar nos Sescs de Cascavel, Pato Branco, Fernando Beltrão e Foz do Iguaçu.

Em São Joaquim da Barra, a pamonha deliciosa e delicada, vendida num duas portas em frente da Feira, me provoca água na boca. Duas equivalem a um jantar. No Piauí, doce Estado, há o arroz Maria Isabel, o Capote, o queijo de coalho, a caranguejada. Em Passo Fundo, há a gastronomia dos Biazis, Alcir e Lisete, secundados pelo Serafim Lutz, com saladas inventivas, pernis, massas, filés e picanhas, costelas, matambres, num estilo sulino afetuoso. Alimentar com qualidade mil pessoas é tarefa de competentes. Sentar-se à mesa servida pelo garçom Otavio é privilégio. Com seus cabelos brancos e sabendo tudo, faz você parecer o mais VIP dos clientes, seja VIP ou não. E o que é VIP, afinal? As refeições no Clube Comercial eram no fim de noite, com conversas, papos cabeça, fofocas, informações, vinhos, todos juntos. Esse é o diferencial da Jornada, aglutina pessoas, momentos em que todos se juntam. Os irmãos Caruso, Chico e Paulo, cartunistas e músicos, estão na mesa com Gonçalo Tavares e Affonso Romano de Sant"Anna. Edney Silvestre, um dos mais procurados pelos leitores, juntava-se a Tatiana Salem Levy e à professora Maria Esther Maciel. Marcia Tiburi, filósofa, conversava com Peter Hunt, enquanto Eliane Brum juntava-se a Rinaldo Gama, que foi o único que se preparou convenientemente com uma bela fala para a mesa da comunicação do impresso ao digital. O comer é o momento em que todos se juntam, em lugar de se espalharem em busca de restaurantes espalhados pela noite afora.

A mesa final de Passo Fundo, formação do leitor contemporâneo, provocou incêndio. Alberto Manguel irritou-se com a inglesa Kate Wilson, amável mulher, que levou um projeto de livros em computador, em tablets, ainda em fase de implantação e discussão. Manguel se acha o dono da verdade do livro em forma de livro. Tablets, e-books, iPads são dignos da excomunhão. Arrogante, destratou aos gritos o americano Nick Montfort: "Não tenho e-mail, não uso computador". Para ele significam a deformação do leitor, não uma das formas para se conseguir sua formação. Crente de que é uma grande pessoa, guardião do livro em papel, Manguel partiu com patadas para cima da inglesa que, todavia, sabe espanhol, e respondeu à altura. Manguel, que vem escrevendo e reescrevendo os mesmos livros, tem de encontrar, urgentemente, as portas do século 21, desembarcar neste milênio, e ser mais gentil, admitir que a informática veio para ficar. Uma anedota circulou pela Jornada. Dizem que Manguel foi leitor de Borges. Ao fim de cada leitura, Borges acentuava: "Leu, pode ir embora, não me dê nenhuma opinião". Ao menos, a argentina Beatriz Sarlo, figura exponencial, estava na mesa, deu o tom de grandeza, ao lado de Affonso Romano.

O que importa é que literatura, misturada a música, informática e teatro, está sendo discutida em todo o País. Nunca, como hoje, houve tantas feiras e eventos em torno do livro, leitura, formação de leitores. Discussões, debates e buscas de caminhos. A Jornada de Passo Fundo chegou aos 30 anos, milhares de professores passaram por ela, milhares de crianças. A Jornada é a única que não se esgota assim que termina. Aí é que ela começa, com a multiplicação de ideias, conversas, aprendizados, vindos das oficinas, seminários, cursos, aulas paralelas, infinitas, atualizadoras. Recomeça quando acaba. Para culminar, premiou-se João Almino, grande autor com o seu Cidade Livre. O Bourbon Zaffari é o maior prêmio literário privado da América latina. Diplomata de carreira, autor por paixão, Almino levou um susto com o tamanho da Jornada e voltou à Espanha apaixonado.

RENATA LO PRETE - PAINEL DA FOLHA


Livre interpretação
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SP - 09/09/11

O evasivo relatório da CGU sobre as denúncias de corrupção no Ministério dos Transportes serviu para evidenciar as divisões no PR. A introdução elogiosa ao ªpleno apoioº do ex-ministro Alfredo Nascimento às apurações foi vista por uma ala do partido como senha para voltar à base aliada. ªJá que o texto não aponta nomes, cabe ao governo dizer que não há parlamentar envolvidoº, afirma o deputado Luciano Castro (RR).
Mas há quem veja o documento com mais reservas. ªA auditoria não é boa para o PR, pois constata irregularidades. Temos de avaliar se vale a pena indicar novos nomes à pastaº, diz o senador Clésio Andrade (MG).

Poemas Em entrevista gravada ontem na biblioteca do Alvorada, a ser exibida no próximo "Fantástico", Dilma disse a Patrícia Poeta que sua leitura mais recente foi "O romanceiro da Inconfidência", de Cecília Meireles.

Assim sim? Emissários do governo acenam com a possibilidade de especificar, no projeto de lei que cria a Comissão da Verdade, os critérios de indicação dos sete integrantes do grupo. Hoje, o texto diz apenas que eles serão escolhidos pela presidente "entre brasileiros de reconhecida idoneidade e conduta ética, identificados com a defesa da democracia e institucionalidade constitucional, bem como respeito aos direitos humanos."

Assim não O objetivo do gesto é amaciar a oposição, que continua a reivindicar para o Congresso a prerrogativa de indicar dois membros -do que o Planalto discorda. "O que a gente não quer é dar ao governo livre arbítrio para politizar a comissão", afirma o líder do DEM na Câmara, ACM Neto (BA).

No palco Shakira e a ministra Maria do Rosário (Direitos Humanos) marcaram encontro no final deste mês, quando a cantora se apresentará no Rock in Rio, para detalhar o apoio que ela dará à construção de escolas de educação infantil no Brasil.

Barreira 1 Aliados de Lula trabalham para vencer a resistência do grupo de Ricardo Berzoini, que, numa tentativa anterior, inviabilizou o anúncio de apoio da corrente majoritária do PT à candidatuta de Fernando Haddad a prefeito de São Paulo.

Barreira 2 Na avaliação do ex-presidente, o respaldo da corrente majoritária (CNB) ajudaria a atrair os vereadores, até agora refratários ao ministro da Educação, mas tampouco entusiasmados com Marta Suplicy.

Alto risco Se Marta não jogar a toalha, "haddadistas" temem pelas prévias de novembro. Num colégio de 30 mil votantes, o poder de fogo da ex-prefeita e dos pré-candidatos Carlos Zarattini e Jilmar Tatto, ambos secretários em sua gestão, tornaria o resultado imprevisível.

Onde pega O principal entrave para o embarque dos "marineiros" no PPS paulista é a percepção, difundida entre aliados da ex-senadora, de que os dirigentes estaduais e nacionais do partido possam atropelar a tese da candidatura própria à Prefeitura de São Paulo em favor de aliança com o PSDB.

Flashback Em defesa da aliança, o PPS evoca a memória de 2008, quando, a despeito das pressões demotucanas, o partido manteve Soninha no páreo até o fim.

Plano B Companheiros de Marina Silva consideram vital garantir um palanque vistoso no maior colégio eleitoral do país para turbinar o debate sobre as "cidades sustentáveis". Uma opção é o PHS, onde dizem ter assegurada a legenda.
com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI

tiroteio

"Prometeram o paraíso, mas esqueceram de informar que haveria o purgatório no meio do caminho. As UPPs, sozinhas, não resolvem o problema da violência no Rio."
DO DEPUTADO OTÁVIO LEITE (PSDB-RJ), sobre o recrudescimento das dificuldades enfrentadas pelo Exército no morro do Alemão, ação vista pelo governador Sérgio Cabral (PMDB) como "boicote de quem perdeu o poder".

contraponto

Sob nova direção


No congresso petista realizado há uma semana em Brasília, militantes da Central Única dos Trabalhadores apresentaram emenda à resolução final com o objetivo de condenar a concessão de aeroportos à iniciativa privada, na contramão da política adotada pelo governo de Dilma Rousseff. Mais que depressa, a turma do deixa-disso entrou em campo para engavetar a ideia. E Francisco Lemos, um dos defensores da emenda, protestou:
-O PT deveria mudar o significado de sua sigla, que passaria a ser 'Privatizamos Também'!

JOÃO MELLÃO NETO - Manual de picaretagem intelectual


Manual de picaretagem intelectual
JOÃO MELLÃO NETO
O Estado de S.Paulo - 09/09/11

Antes de ler este artigo, sugiro ao leitor do Estadão que responda ao seguinte questionário. Você precisa debater em público e não tem certeza da validade de seus argumentos? Você, com certeza, é o melhor executivo da empresa; mas por que as boas vagas sempre acabam sendo ocupadas por profissionais que você julga menos capacitados? Suas ideias, é claro, são sempre as melhores; por que ninguém se interessa por elas? Embora seja frequente, você ainda não se conformou em sempre passar por idiota? Você acredita, realmente, que ainda vai vencer na vida?

Então este artigo foi feito para você. Preste muita atenção!

Você não precisa se aprofundar na arte de argumentar. Muitos sábios, advogados e homens públicos já cuidaram disso por você. Desde a Grécia antiga, berço da civilização ocidental - começando com os filósofos sofistas e, depois, Sócrates, Platão e Aristóteles -, muitos dos grandes pensadores da humanidade se debruçaram sobre esse tema. Discutia-se a respeito dele na República e no Império Romano, em Bizâncio, na Europa medieval, na Renascença, no Novo Continente e até hoje se acumulam novos conhecimentos sobre o assunto. Pensadores da estatura do filósofo alemão Arthur Schopenhauer chegaram a elaborar tratados sobre o tema. Há uma obra dele que merece ser lida e devidamente estudada. Foi publicada depois de sua morte e recebeu dos editores o sugestivo título Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão. As conclusões são alarmantes e desoladoras. Os bons argumentos não precisam ser os melhores nem os mais verdadeiros. Bem apresentá-los é o que realmente importa.

O que cabe a você, aqui, é - de uma vez por todas - saber que os que sabem discursar melhor não são, necessariamente, os que sabem governar melhor. Os medíocres também têm vez. Não importa se seu produto é o melhor, o que importa é saber vendê-lo bem. Saiba, enfim que para vencer um debate o que menos você precisa é estar com a tese certa.

1.ª lição - Mesmo que esteja em dúvida, trate de ser convincente - se não der para convencer, confunda. Se mesmo assim não funcionar, encontre um ausente no qual pôr a culpa.

2.ª lição - Demonstre sempre certeza do que está falando, mesmo quando já tenha percebido que sua proposta está errada.

3.ª lição - Decorre da segunda: ninguém segue um líder que se mostre em dúvida.

4.ª lição - Não se preocupe em responder a um argumento correto, é muito melhor dizer que seu oponente não tem autoridade moral para afirmá-lo. Inversamente: uma boa ideia será sempre uma boa ideia, independentemente de quem a tenha tido.

5.ª lição - Apresente ideias que aparentem ser coerentes. As boas histórias só convencem a audiência se tiverem começo, meio e fim. Inversamente: não acredite em histórias perfeitas, geralmente elas são inventadas. Tenha sempre em mente que a realidade não produz enredos perfeitos.

6.ª lição - Para que ideias confusas sejam mais convincentes, você deve atribuí-las a alguém como Napoleão. Servem também Júlio César, Alexandre ou Abraham Lincoln. Ninguém se atreverá a desmenti-lo nem admitirá pouco saber sobre eles. Se a celebridade em questão já tiver falecido, nem mesmo ela poderá desmenti-lo.

7.ª lição - Os exemplos de que você se vale não precisam ser verdadeiros. Basta que eles sejam verossímeis.

As lições são inúmeras. Mas, por enquanto, são suficientes essas sete. Você ainda acredita nas palavras e nas elaborações intelectuais? Então, para terminar leia o que vem a seguir.

Recordo-me de, muitos anos atrás, ter lido um livro sobre retórica no qual havia um belo exemplo de como tudo isso funciona. O autor resumiu a questão apresentando duas biografias, retratos fiéis de grandes vultos da História.

O primeiro era um beberrão contumaz. E, não bastasse, tabagista inveterado, mulherengo e dado a excessos alimentares. Não tinha hora de dormir nem de acordar. Era indisciplinado por natureza. Não gostava de ler relatórios, era teimoso, ranzinza e não aceitava as ideias de ninguém. Por causa da teimosia, perdeu diversas batalhas, foi afastado do comando, caiu em desgraça perante a imprensa em geral e a opinião pública o desprezou por mais de duas décadas. Voltou ao poder em razão de uma grave comoção popular. Pode-se dizer que tinha grande desprezo por seus subordinados e era cético quanto à capacidade de discernimento da humanidade.

Já o segundo era praticamente o oposto. Não se conhece dele nenhum vício ou algum tipo de costume reprovável. Não fumava, não bebia e se preocupava sempre em estar dentro do peso. Extremamente metódico e disciplinado, tinha obsessão pela pontualidade. Quando não estava trabalhando, cuidava de ler e estudar. Desde pequeno sentia-se imbuído de uma grande missão. A ela dedicou toda a sua juventude. Para bem executá-la evitou até a prática sexual, só vindo a contrair matrimônio no fim da vida. Enquanto viveu, dedicou todo o seu tempo à sua causa. Morreu por causa dela. E sua mulher morreu logo a seguir. Todos os que o conheceram afirmam que nunca deixou de ser um idealista. Em suas aparições públicas demonstrava ser enérgico e intransigente, mas em casa seu comportamento era cordial. Seus funcionários mais íntimos foram unânimes em afirmar que era cavalheiro, polido e afável no trato. Às vezes perdia a paciência, mas só quando se sentia injustiçado.

Qual dos dois perfis é o que mais lhe agrada? Qual dos dois líderes você não vacilaria em acompanhar? Os dois líderes foram retratados com exatidão. Qual deles, a princípio, mais lhe desperta simpatia?

A maioria das pessoas, provavelmente, terá escolhido o segundo. Pois as aparências, como sempre, enganam. O primeiro perfil é de Winston Churchill. E o segundo, de Adolf Hitler.