sábado, janeiro 10, 2009

ROBERTO POMPEU DE TOLEDO

REVISTA VEJA

Roberto Pompeu de Toledo
Dois desejos

"A derrota da emenda que revoga a re-eleição 
e a vitória do "choque de ordem" no Rio de Janeiro 
têm algo em comum: significam, uma e outra, 
um avanço civilizacional"

Sejamos modestos, fiquemos em dois, só dois escassos desejos de início do ano, para não estufar com exageradas expectativas o que este 2009 possa trazer de bom à pátria. Primeiro: que seja derrotada no Congresso a emenda constitucional que prevê o fim da re-eleição. Segundo: que dê certo o "choque de ordem" desencadeado no Rio de Janeiro pelo prefeito Eduardo Paes. Ora, direis: e ainda achas pouco? São só dois, mas que desejos! Mais que isso, só pedindo o fim das secas no Nordeste e das enchentes em Santa Catarina. Eu vos direi no entanto que desejos são desejos, machucar não machucam, e que, se no passado não foi proibido sonhar com a queda do Muro de Berlim ou com a eleição de um negro para presidente dos EUA, então, por que não?

A ideia de acabar com a re-eleição do presidente, dos governadores e dos prefeitos é a mais recente prova de que De Gaulle realmente deveria ter dito a frase que dizem que ele disse, mas que na verdade não disse – segundo a qual o Brasil não é um país sério. A emenda foi aprovada no mês passado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. A duração dos mandatos passaria a cinco anos, e não apenas para presidente, governadores e prefeitos, mas também para deputados, vereadores e senadores. A promessa é de uma considerável bagunça institucional. Eis um país – esta a mensagem ao mundo – que não é capaz de construir as estáveis e previsíveis regras sem as quais a democracia, por sua vez, se priva do estável e previsível eixo sem o qual se condena a rodar em falso.

Faz só dez anos que a re-eleição vigora no Brasil. O argumento, no entanto, é que "não deu certo". A levá-lo a sério, muito menos certo deu o mandato de cinco anos sem re-eleição vigente sob a Constituição de 1946. No período, um presidente se suicidou (Getúlio), um renunciou (Jânio), três foram depostos (Jango, Café Filho e Carlos Luz) e apenas dois terminaram o mandato (Dutra e JK). Mas é de fachada o "não deu certo". O que vale são os interesses, por uma vez convergentes, dos dois disputadores de eleições presidenciais no país, o PSDB e o PT – o primeiro porque tem dois candidatos, e sem re-eleição fica mais fácil organizar a fila entre eles, e o segundo para encurtar a espera do atual presidente caso lhe convenha tentar uma volta, uma vez cumprido o interregno imposto pela proibição de três mandatos consecutivos. Como não disse o general, não é sério.

A operação "choque de ordem", a quem a ela ainda não foi apresentado, consiste numa grandiosa ofensiva de fiscais e guardas municipais contra tudo o que é irregular na cidade do Rio de Janeiro – camelôs, construções ilegais, infrações das regras de trânsito, transporte clandestino, outdoors fora de lugar, mendigos a bloquear espaços públicos. Eduardo Paes inventou um "secretário da ordem urbana", e, sob seu comando, lá foi a tropa para as ruas. "Não é admissível que existam áreas da cidade em que o poder público não seja soberano", disse o prefeito. Palmas para ele. Nos três primeiros dias de operação, toneladas de mercadorias piratas foram apreendidas, mais de 1 000 veículos foram multados ou rebocados, táxis e vans irregulares foram lacrados, mendigos foram recolhidos a abrigos.

Se der certo, o Rio de Janeiro, o mais eloquente exemplo de desordem urbana entre as cidades brasileiras, sairá transformado. A cidade, que é um paraíso para o comércio pirata e os táxis bandalhos, em que se constrói a casa onde bem se entende e em que se estaciona o carro na calçada, ganhará em beleza e urbanidade e, de quebra, terá aplainado o terreno para um combate mais eficaz ao crime e à violência. Ocorre que uma operação dessas não se faz em apenas algumas semanas, ao embalo da chegada de um novo prefeito. É obra para todo um mandato, com o mesmo gás, e se há algo em que nós, brasileiros, somos ruins é na persistência. Veja-se o exemplo recente da fiscalização contra os motoristas alcoolizados. Começou com fúria para, aos poucos, ceder à inércia característica da nacionalidade.

Os dois desejos são difíceis de concretizar por motivos inversos. A emenda contra a Constituição tem a impulsioná-la o excesso de ação que move os quadros dirigentes quando se trata de defender interesses próprios. O choque de ordem urbana tem contra si a escassez de ação quando o que está em jogo é o interesse público. É pena. Tanto uma medida como a outra embutem um avanço civilizacional para a Bruzundanga.

LIA LUFT

REVISTA VEJA

Lya Luft
As mortes poderiam
ser evitadas

"Estamos tão pressionados pela vida, a política, 
as circunstâncias, as dificuldades, os medos e 
sustos, que por qualquer coisa explodimos. 
Penso que somos uma geração doente da alma"

Ilustração Atômica Studio


Abrimos o ano novo com a habitual lista de tragédias que poderiam ser evitadas. Talvez a gente não perceba o valor da própria vida. Talvez a gente só consiga viver porque não tem consciência disso. Parece que só diante da morte nos damos conta de que, apesar dos altos e baixos, viver é maravilhoso, viver bem é possível. Na corrida do cotidiano, não paramos para pensar: "O que estou fazendo da minha vida? Como estou tratando as pessoas que amo? De que jeito estou cuidando delas, de mim, deste mundo em que vivemos?". Isso me ocorre especialmente lendo as primeiras notícias dos primeiros horrores: mortes nas estradas e cidades, fome e miséria para milhões de pessoas inocentes pelo mundo e, de novo, a guerra. Ou sempre as guerras, pois o homem gosta de brincar de bandido e mocinho, trocando as armas de brinquedo por tremendas armas de verdade. Nelas incluo carro, ônibus, barcos e outros.

Pelas estradas e ruas – para começar com o doméstico e cotidiano – não é preciso esperar muito para presenciar as maiores aberrações, desde pedestres praticamente se jogando diante de carros e caminhões até motoristas que parecem alucinados. Não sei se é possível, mas valeria a pena, quem sabe, tentar contar o número de mortes burras e evitáveis no trânsito, que ocorrem por imprudência, loucura, arrogância, despreparo, futilidade. Mortes fúteis, que mesmo sendo fúteis são tragédias. E não falo só dos assassinatos praticados pelos motoristas alcoolizados, falo também dos infantiloides e idiotas, que mesmo assim têm nas mãos as poderosas armas que são o carro, o ônibus, o caminhão.

Dirijo frequentemente em estradas, e diariamente em ruas. Boa parte dos motoristas não poderia ter carteira, não deveria dirigir. Não antes de conhecer as regras e aprender a respeitá-las, não antes de amadurecer, ter consciência e ser uma pessoa confiável. Com um veículo seguro. O que se vê nas ruas e estradas é um espetáculo incompreensível de imprudência e loucura. Ultrapassagens incríveis, muitas vezes feitas por um pai de família com o carro cheio de crianças. Impaciência doentia, uma raiva generalizada dando a impressão de que se quer matar, atropelar, fazer sofrer o primeiro que aparecer pela frente. O verniz de civilidade que nos cobre é cada vez mais tênue.

Talvez seja mais um sinal dos tempos: estamos tão pressionados pela vida, a política, as circunstâncias, as dificuldades, os medos e sustos, que por qualquer coisa explodimos. Penso que somos uma geração doente da alma. Ultrapreocupados, supermedicados, incapazes de relaxar e curtir a vida, de parar para pensar ("Parar pra pensar? Nem pensar! Se paro para pensar, eu desmorono!", a gente ouve com frequência). Estamos hipnotizados por questões de saúde, sentamos à mesa só pensando em triglicérides e calorias, deitamos pensando no Viagra, acordamos apressados porque é preciso correr, caminhar, ir à academia – tudo coisas ótimas, desde que não sejam obsessão. Porém, na conduta diária, em nossas particulares vidinhas, supertensionados, nos portamos como adolescentes insensatos.

E agora, mais uma vez, a guerra. Sempre há guerrinhas neste vasto mundo estranho. Não quero nem sei discutir razões e justificativas nem desta nem de outra guerra qualquer. Mas é nas guerras – como nos campos de refugiados na África e também por aqui, onde se morre de fome, sujeira e falta de condições mínimas – que nos damos conta do pouco valor da vida para uma humanidade que se bota fora a todo momento. No cotidiano em casa, na rua, na estrada, no campo de batalha, no corpo dos inocentes atônitos em casas arrasadas ou veículos destroçados, hospitais sem estrutura ou apenas com condições sub-humanas, a gente se porta como se a sobrevivência fosse garantida, e tivéssemos dos deuses o aval para cometer todas as imprudências assassinas e mortais futilidades que se possam inventar. Bom Ano Novo, para os que conseguirmos sobreviver.

O SEU FUTURO


SÁBADO NOS JORNAIS


Globo: Crise joga inflação para baixo e preço do gás cairá

Estadão: Israel e Hamas rejeitam cessar-fogo da ONU

JB: Massacre de crianças

Correio: IPVA mais barato

Valor: Lula quer governadores na campanha anticrise

Gazeta Mercantil: Auditorias de grande porte serão auditadas

Estado de Minas: Inflação cai e deve derrubar a taxa de juros

Jornal do Commercio: Inflação de 2008 foi a maior em quatro anos