segunda-feira, junho 20, 2011

J. R. GUZZO - E a malandragem?


E a malandragem?
J. R. GUZZO
REVISTA VEJA

O Brasil vem se tornando, nos últimos anos, uma espécie de paraíso mundial da tapeação. O grande responsável por mais essa realização nacional é o governo, ou quem manda no governo, com o desenvolvimento de técnicas cada vez mais avançadas e eficientes para convencer a opinião pública de que coisas que todo mundo está vendo não existem - ou que existem coisas que ninguém consegue ver. Isso ajuda, e muito, todas as vezes que aparece uma história feia, que o governo quer esconder, ou quando ele decide fabricar uma história bonita, para mostrar méritos que não tem. Quase sempre a plateia acredita na mágica, bate palmas e diz, nas pesquisas de popularidade, que o governo é ótimo - ou, então, não mostra maior interesse no assunto, nem nas fábulas que a propaganda oficial está lhe contando. Não acredita nem desacredita; apenas não liga. O resultado é que o Brasil, hoje em dia, se transformou num dos países onde é mais fácil para o governo passar qualquer tipo de conto do vigário no público em geral.

E a célebre "malandragem brasileira", onde foi parar? O brasileiro, segundo rezam as nossas lendas, mitos e folclore, gosta de se imaginar no papel do sujeito esperto. (O locutor esportivo Galvão Bueno, homem de reconhecida competência em identificar com exatidão o que o público gosta de ouvir, diz que todo jogador da Seleção Brasileira de Futebol, do goleiro ao ponta-esquerda, é "malandro", sobretudo quando o Brasil está ganhando; é um dos seus maiores elogios.) Mas, se o brasileiro é tão esperto assim, por que está sempre no papel do otário em todo relacionamento que tem com o governo? Por que o ex-presidente da República, por exemplo, tem certeza de que vão acreditar nele quando diz que o mensalão, um dos casos de corrupção mais bem comprovados da história brasileira, simplesmente não existiu? Deveria acontecer o contrário, justamente: o povão, com todo o seu jogo de cintura, não se deixaria enganar por uma conversa dessas. A explicação para o fenômeno pode ter sido sugerida da trinta anos atrás, talvez, pelo samba Homenagem ao Malandro, de Chico Buarque de Holanda. O compositor nos conta, ali, que quis fazer uma homenagem "à nata da malandragem"; foi então à Lapa, mas perdeu a viagem, porque descobriu que "aquela tal malandragem não existe mais". A triste verdade, diz a canção, é que o malandro, agora, é um pobre coitado que "trabalha, mora lá longe e chacoalha num trem da Central". Em compensação, esclarece o compositor, "já não é normal o que dá de malandro regular, profissional, malandro com aparato de malandro oficial". Este aí, sim, conclui o samba: "Nunca se dá mal". Os malandros trocaram de lugar, então? Deve ser isso.

O fato é que vão se multiplicando em ritmo cada vez mais rápido, e com audácia cada vez maior, as histórias milagrosas para explicar todo tipo de coisa que não tem explicação. O clima, no fim, acaba ficando cômico. Uma das demonstrações mais recentes disso foi dada pelo ex-presidente Lula - um dos catedráticos na matéria, sem dúvida. Na sua atual carreira de palestrante para grandes empresas, que a cada negócio fechado o faz subir mais um degrau no mundo dos milionários brasileiros, Lula fez uma conferência para a Tetra Pak, multinacional do ramo de embalagens; recebeu, pelas informações disponíveis, 200000 reais. Não se trata, Deus nos livre, de "consultoria" do tipo que acaba de levar o ex-ministro Antonio Palocci à sua segunda ruína; é só palestra, certo? Mas acabou surgindo, nesse caso da Tetra Pak, uma questão enjoada: a empresa pediu ao ex-presidente que conseguisse uma redução de impostos para as embalagens de leite, e ele se comprometeu a tratar do assunto "com o companheiro Mantega". Estaria certa uma coisa dessas - um ex-presidente receber dinheiro de uma empresa e advogar para que ela pague menos imposto? Perguntado, Lula disse que estava batalhando para "levar leite de qualidade para a casa das pessoas". Ou seja, ele pede a todos que acreditem no seguinte: seu real interesse não foi receber os 200000 da Tetra Pak, nem atender ao pedido da empresa; o que realmente queria era ajudar o povo a comprar leite. Qual é o problema? Alguém aí vai duvidar?

Palocci, como se sabe, caiu pelo conjunto da obra, mas um dos seus piores momentos foi meter-se numa história de devolução de impostos para uma construtora. Deve haver alguma diferença com o caso da Tetra Pak, claro. Qualquer hora dessas talvez nos digam qual é.

LYA LUFT - Este nosso Brasil




Este nosso Brasil
LYA LUFT
REVISTA VEJA

Não gosto do meu ceticismo e assombro diante de muitas coisas, no que diz respeito ao Brasil, mas eles existem. Cada vez mais me espanto, e cada vez menos acredito. Não funciona, comigo, aquela conhecida frase dos mais velhos "a mim, nada mais me espanta". Pois a mim tudo ainda me choca, ou intriga, faz rir ou chorar ou me indignar como sempre, pois, vivendo mais, conheço mais as dores humanas, nossa responsabilidade, nossa miséria, nosso dever de solidariedade e trabalho, a necessidade de competência e honradez, de exemplo e seriedade. Seja como for, coisas bizarras acontecem neste Brasil nosso tão amado e tão negligenciado. Ao qual faltam, quem sabe, atenção, consciência, indignação, exigências junto dos que nos lideram ou governam, ou representam, educam ou deveriam educar, amparam ou deveriam amparar.

Outro dia escrevi sobre o tal livro com erros de português, metade aplaude, metade diz que a gente não entendeu nada, ou que é isso mesmo. Autoridades fazem as mais estapafúrdias afirmações. Logo apareceram outros livros escolares com erros crassos. Não são novidade livros didáticos com erros, e ninguém dava bola. Ninguém percebia, quem percebia ficou na moita, para que se incomodar? O mundo é assim, a vida é assim, o Brasil é assim. Aí eu protesto. O Brasil é bem melhor que isso, mas tem gente que gosta que ele pareça assim, alegrinho, divertido, hospitaleiro e alienado. Afasta preocupações e cobranças, e atrai turistas.

No governo, no Senado, na Câmara, pessoas altamente suspeitas, condenadas ou não, sendo processadas ou não, continuam em altos cargos ou voltam a eles, e são aplaudidas de pé enquanto nós, os que tentamos ser honestos e pagamos pelo circo todo trabalhando às vezes até o anoitecer da vida e das forças, se não cuidarmos levamos multa cuspida, advertência, punição, ainda que esta venha através de impostos cruéis.

Às vezes parece que nem sabemos direito quem nos governa, quem são os lideres, os grandes cuidadores do país. Saber causaria angústia, então fechamos os olhos. Desconhecidos, ou sabidamente ruins, alguns meras promessas, estão em altíssimos postos, parte de nosso destino depende deles.

Nas pesquisas, nas quais nunca acreditei muito, a opinião pública consagra tudo isso na maior naturalidade. E eu me pergunto se realmente observamos, refletimos, concluímos algumas coisas, disso que acontece e tanto nos diz respeito, como o pão, o café, o salário, a vida. Temos uma opinião formada e firme? Lutamos pela honra, pela melhor administração, pela segurança, pela decência, pela confiança que precisamos depositar nos líderes, nos governantes, nos nossos representantes ... ou nos entregamos ao fluxo das ondas, interessados muito mais no novo celular, no iPod, no iPad, no tablet, na fofoca da vizinhança, na troca da geladeira, na TV plana, no carrinho dos sonhos, pago em oitenta prestações impossíveis?

Acho que andamos otimistas demais, omissos demais, alienados demais. Devemos ser pacíficos e ordeiros, mas atentos. Aplaudir o erro é insensatez, valorizar o nebuloso é burrice, achar que tudo está ótimo é tiro no pé.

Logo não teremos mais pé para receber a bala, e vamos atirar na cabeça, não do erro, do desmando, da improvisação ou da incompetência, mas na nossa própria cabeça pouco pensante e, eu acho, nestes dias, otimista demais. Sofremos e torcemos pelo nosso país ou, ao primeiro trio elétrico que passa, ao primeiro show espetacular, esquecemos tudo (ser sério é tão chato ... ) e saímos nos requebrando, e aplaudindo, aprovando sempre, não importa o quê?

Começo a ter medo. Não o medo que temos diante de um cano de revólver, ou do barulho de um assaltante na casa, não o medo de que algum mal aconteça às pessoas amadas, mas um receio difuso, sombrio, de que estejamos bailando feito alucinados ou crianças inconscientes à beira de um abismo disfarçado por nuvenzinhas coloridas chamadas alienação, para dentro do qual vão escorregando, ou despencando, os nossos conceitos de patriotismo, decência, firmeza, lucidez, liderança, e uma esperança sem ufanismo tolo.

FLEX

"DO FUNDO DA ALMA"


"Tudo aquilo que algum filho da puta diz que é URGENTE, sempre é algo que algum imbecil deixou de fazer em tempo hábil e quer que você se foda para fazer em tempo recorde." 
(Thamo Dissa Kusheyo - Monge Tibetano)
 COLABORAÇÃO ENVIADA PELO MONGE APOLO

ANCELMO GÓIS - Comércio eletrônico

Comércio eletrônico
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 20/06/11

A Rocinha aderiu à moda de sites coletivos. Entrou no ar o site de compras exclusivo da comunidade. É o www.clubecomunidade.com.br, que promete descontos de até 90% no comércio dentro da favela carioca.

Ferrari do mar

Chegou ontem ao Rio a supersonda Deep Ocean Clarion, com capacidade para perfurar em águas ultraprofundas de até 3.600m. A sonda, que iria operar no Golfo do México, foi desviada pela BP para o Brasil, onde a britânica pretende produzir 100 mil barris/dia até o fim da década.

Aliás...
A BP sofreu mais que sovaco de aleijado nas mãos da ANP. A agência demorou 14 meses para aprovar a transferência para a empresa dos dez blocos que pertenciam à Devon Energy. É que a ANP redobrou o cuidado depois que a BP derramou cerca de 700 milhões de litros de petróleo no mar nos EUA.

Vale tudo
Beatriz Segall, a grande atriz que brilha na reexibição de “Vale tudo”, no canal Viva, e no Teatro Nelson Rodrigues, no Rio, vai depor hoje na CPI das Carteiras Falsas de Estudantes da Alerj. Segundo ela, a proliferação de meias-entradas torna os ingressos no Rio 40% mais caros que no resto do país.

Petrocultura
A Petrobras e o Ministério da Cultura lançam dia 5, no Rio, a Ação Petrobras/MinC 2011. É investimento de R$ 14,5 milhões em 10 grandes projetos.

Viva Gullar!
A exposição sobre Ferreira Gullar “8 & 80” vai ser itinerante pelo Brasil no segundo semestre. Começará por São Paulo. No Rio, a exposição, com curadoria de Carlos Dimuro, reuniu 50 mil pessoas no MNBA.

Xica da Silva
A escritora Ana Miranda vai escrever para o selo LeYa um livro sobre Xica da Silva.

Aliança desfeita 
A notícia de uma possível fusão de duas empresas do grupo Aliança da Bahia tem levado acionistas minoritários a acionarem a Justiça.
Temem que isto evite a distribuição de dividendos estimados em R$ 400 milhões. A conferir.

Morar bem
Estudo da Binswanger Brasil mostra que o valor médio do metro quadrado para locação de imóveis corporativos de alto padrão no Rio é de R$ 124. O valor é mais alto do que em São Paulo (R$ 104) ou em Brasília (R$ 105).

Madeira-Mamoré
Com o apoio da Petrobras, o Clube de Engenharia irá digitalizar livros raros da história da engenharia brasileira como “Estudos da estrada de ferro Madeira-Mamoré”, de 1887.

Rock in Rio na UPP
Os moradores da Cidade de Deus e do Batan, duas comunidades com UPPs, vão poder assistir ao Rock in Rio, ao vivo, em telões.
Não é novela Aguinaldo Silva, o escritor, é o novo dono da Locanda della Mimosa, em Itaipava. Seu braço direito será Lilian Seldin, ex-mulher de Danio Braga.

Fora dos trilhos
Carlos Roberto Osório foi convidado para dirigir o Metrô carioca. Mas, a pedido do prefeito Paes, continuará como secretário municipal de Conservação.

Calma, gente

As investigações sobre o caso do espancamento, em Ipanema, de dois meninos de 14 anos, um deles filho do ex-presidente do Flamengo Márcio Braga, apontam para um grupo de alunos do Colégio Santo Agostinho. A acusação surgiu nos depoimentos colhidos pela polícia. O filho de Márcio, aluno da Escola Americana do Rio, será transferido para um colégio na Inglaterra (e não na Suíça como saiu).

União estável
O desembargador Siro Darlan vai presidir quarta agora a cerimônia de união estável de cinquenta casais homoafetivos, organizada
pelo governo do Rio.

Grande Hotel
O projeto de transformar a sede do Morro da Viúva num hotel de Eike sempre ele Batista precisa ainda de aprovação do Conselho do Flamengo. 

PAULO GUEDES - O resgate da Federação


O resgate da Federação
PAULO GUEDES
O GLOBO - 20/06/11

"A raiz dos grandes problemas brasileiros é acrescente e absurda concentração de recursos tributários nas mãos da União”, alertava em 2009 o então governador mineiro Aécio Neves. E reafirma em 2011 o agora senador, a propósito da crise que derrubou Antonio Palocci da
Casa Civil: “Grande parte do que estamos vivendo deve-se exatamente à concentração do poder financeiro e político no governo federal. Nós precisamos resgatar a Federação.” Pois bem, o senador Aécio Neves tem agora a chance de praticar o que prega. E pode reforçar sua eventual candidatura à Presidência da República com a belíssima tesede que a descentralização de recursos públicos e de atribuições para estados e municípios é uma exigência de nossa democracia emergente. A oportunidade de apoio à Federação está no projeto que o senador Francisco Dornelles acaba de encaminhar,que descentraliza da União para estados e municípios a distribuição de recursos com a exploração de petróleo, assegurando os pagamentos de royalties aos estados produtores previstos na Constituição.

O governador Sérgio Cabral e a bancada parlamentar do Rio de Janeiro têm dado ao Congresso um exemplo de atuação política construtiva na discussão sobre os recursos do pré-sal. Uma lição de como os representantes regionais podem contribuir para a transparência, a legitimidade ea boa qualidade das decisões em assuntos de interesse nacional. Eles defendem uma ação social descentralizada do Estado para transformar os recursos do petróleo em mais saúde,melhor educação e maior produtividade no presente, de forma que haja uma melhor distribuição de renda
e riqueza no futuro. Os estados e municípios são, afinal, os novos eixos para a modernização administrativa e a descentralização operacional do Estado brasileiro. Esta descentralização de atribuições é absolutamente necessária auma execução eficaz da ação social do Estado.

Se o dinheiro tem de ir aonde o povo está, são as pressões pela ação social descentralizada do Estado que legitimam também a necessária reforma administrativa do governo federal. Em vez de governar de forma gerencialmente caótica (os atuais 34 ministérios) e politicamente desarticulada (sem sintonia com estados emunicípios), Dilma Roussefftem aopção de transformar com uma reforma fiscal governadores em executivos de uma agenda comum estabelecida no Congresso. Seria o resgate da Federação.

Só Jesus Cristo salva a Copa do Mundo no Brasil - ENTREVISTA COM ROMÁRIO

Só Jesus Cristo salva a Copa do Mundo no Brasil
ENTREVISTA COM ROMÁRIO
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11 

DEPUTADO FEDERAL AFIRMA QUE NÃO FOI A BRASÍLIA PARA FAZER GRAÇA E SUGERE QUE RICARDO TEIXEIRA DEIXE A DIREÇÃO DO COMITÊ ORGANIZADOR DO PRÓXIMO MUNDIAL E DÊ EXPLICAÇÕES NA CÂMARA


FILIPE COUTINHO
DE BRASÍLIA


Só há uma chance de a Copa-2014 acontecer sem obras atrasadas, orçamentos extrapolados e outros problemas: se Jesus Cristo descer no Brasil nos próximos três anos. A conclusão é do ex-jogador e agora deputado Romário (PSB-RJ), autor do convite para que Ricardo Teixeira, presidente da CBF e do COL (Comitê Organizador Local) vá à Câmara dos Deputados explicar as denúncias de cobrança de propina e o aumento do custo dos estádios.
Muitos acreditavam que Romário, por ser ex-jogador da seleção, seria mais um a atuar nos bastidores a favor da CBF na chamada "bancada da bola", que contou com o apoio do governo para frear a CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar Teixeira e a próxima Copa.
Mas Romário avisa: "Não é nada pessoal, mas, se ele [Teixeira] não responder às denúncias, vou manter minha assinatura para abrir uma CPI e trabalhar para que outros deputados assinem".
Para o deputado, surge a cada dia uma nova denúncia sobre a Copa no Brasil, como a reportagem da Folha que mostrou, há uma semana, integrantes da Fifa e do COL fazendo lobby em favor de patrocinadores do Mundial.
"Quando a Copa foi anunciada, eu disse duas coisas: o Brasil tinha não só condições de sediar o Mundial como ia fazer a maior Copa de todos os tempos. Continuo com a primeira ideia. A segunda eu retiro", declarou Romário.
Para ele, "seria uma boa ideia" que Teixeira deixasse a organização da Copa. O presidente da CBF não quis dar entrevista à Folha.
Cotado para ser o candidato do PSB à Prefeitura do Rio em 2012, Romário afirma que vota a favor do governo inclusive em situações em que não votaria. Foi a favor da flexibilização das licitações para as obras da Copa-2014, projeto que abre brecha para aumentos de preço sem limite e orçamentos sigilosos.

Folha - Como o senhor avalia a organização da Copa?
Romário - Lá atrás, quando foi anunciada a Copa no Brasil, a gente comemorou bastante. Eu disse duas coisas: o Brasil tinha não só condições de sediar a Copa do Mundo como ia fazer a maior de todos os tempos. Continuo com a primeira ideia. A segunda eu retiro.

Por quê?
Porque, pelo que estou vendo, as coisas não vão acontecer. Vai ter a Copa, mas infelizmente teremos problemas e não vai ser a melhor de todos os tempos. Vou te falar uma verdade: os evangélicos acreditam que Jesus vai voltar. Só ele para fazer com que o Brasil faça a melhor Copa. Se ele descer nos próximos três anos, aí será possível.

Por comandar o COL e a CBF, Ricardo Teixeira acumula poderes?
Existem pessoas no Brasil bastante competentes para fazer esse papel de comandar o COL, mas ele se acha nesse direito. Mas, até mesmo por conta da idade dele [64], não é bom para ele. Eu colocaria outra pessoa, como é o caso do Henrique Meirelles [ex- -presidente do Banco Central] para a Olimpíada [do Rio, em 2016]. Seria um desgaste muito menor.

Mas ainda dá tempo de uma "solução Henrique Meirelles" para a Copa?
No meu modo de ver, como estamos a três anos da Copa, o senhor Ricardo Teixeira e seus assessores, se chegarem à conclusão de que ainda cabe outra pessoa para que ele saia de foco, seria uma boa ideia. Mas, às vezes, as pessoas têm vaidades que atrapalham. Não sei se é o caso dele, mas pode ser.

Por que convidar Ricardo Teixeira para prestar depoimento na Câmara?
Nós estivemos em cinco sedes da Copa-2014 e vamos às outras. Existia um orçamento no começo da preparação que, no mínimo, dobrou. Segundo o que ouvimos das cidades-sedes, eles fizeram um planejamento que não conseguem cumprir. A Fifa passa para o COL uma recomendação, e o COL faz virar uma obrigação. O Ricardo Teixeira é presidente do COL, presidente da CBF e é da cúpula da Fifa. Não tem ninguém no Brasil e no mundo que possa responder sobre o que realmente está acontecendo como ele. Do jeito que a coisa está, os estádios vão chegar a R$ 15 bilhões, e isso é um absurdo.

E em relação às denúncias de cobrança de propina?
Se ele vier e explicar, serei o primeiro a tirar a assinatura para uma CPI e pedir o mesmo para outros deputados. Mas, desde que houve o pedido de CPI, a cada dia aparece uma nova denúncia, e a coisa vai ficando mais estranha. Definitivamente não sei se vai dar tempo para a Casa levantar tudo. Eu, no lugar do presidente Ricardo Teixeira, viria e responderia. Mesmo que não seja o responsável por uma ilegalidade ou lentidão em alguma obra, ele é o cara do Brasil na Copa e tem que dar as caras.

E se Teixeira não esclarecer?
Se ele não responder a contento, não só vou manter minha assinatura para abrir uma CPI como vou trabalhar para que os outros deputados assinem também. Não é nada pessoal.

Quem é contra a CPI afirma que pode atrapalhar a organização da Copa...
Ser grato ao Ricardo Teixeira por conta da Copa não significa que ele seja a Copa. Entendo que existam fatores políticos que podem prejudicar a Copa, mexendo com uma pessoa do poder dele. Sou do PSB e tenho votado sempre a favor do governo, inclusive em situações que não votaria. Mas eu também ando na rua e sei o que as pessoas cobram de mim.

O que explica tanto tempo de Ricardo Teixeira no poder do futebol brasileiro?
Esta foi uma das melhores perguntas que ouvi nos últimos tempos. Mas vou fazer diferente: responda você. Eu infelizmente não posso te dizer isso. Mesmo que as denúncias sejam verdadeiras, a gente não pode tirar o mérito dele de trazer a Copa para o Brasil. Mas, infelizmente, de lá para cá, não consigo responder por que tanto poder, por tanto tempo e por que aparece tanta coisa. Eu juro que gostaria de responder, mas não sei.

O senhor rachou com o Ricardo Teixeira?
Nunca fui amigo dele, sempre tivemos uma relação cordial. Não tenho nada pessoal contra ele e estou torcendo para que ele consiga se defender das denúncias. Quero que a parte do Brasil que o vê como uma pessoa "do mal" possa reconhecê-lo pela Copa. Agora, se alguma das denúncias for verdadeira, não posso tirar meu nome da CPI. Por eu jogar futebol, isso não significa que eu seja a favor do que é errado. Não vim para Brasília para fazer graça. Engordei 11 kg em dois meses, quase perco minha mulher, deixei de fazer coisas que amo, como jogar pelada, sair na noite para ouvir funk, tomar meu refrigerante e às vezes um champanhe. Foi um sacrifício que fiz. Desculpe a expressão, mas não devo porra nenhuma a ninguém e tenho o direito de falar e colocar as coisas claras para quem votou em mim.

Como classifica a gestão do futebol brasileiro hoje?
Quando as pessoas falam hoje de máfia e futebol, não sei se felizmente ou infelizmente, o nome de Ricardo Teixeira é sempre ouvido. Mas da minha boca não vão ouvir, pois não tenho provas. Mas, definitivamente, existe uma quadrilha no futebol.

Frase

"Eu jogar futebol não significa que eu seja a favor do que é errado. Não vim para Brasília para fazer graça. Engordei 11 kg em dois meses, quase perco minha mulher, deixei de fazer coisas que amo como jogar pelada, sair na noite para ouvir funk, foi um sacrifício que fiz"
ROMÁRIO

MARCO ANTONIO ROCHA - Por que Dilma Rousseff não mostra a sua cara?


Por que Dilma Rousseff não mostra a sua cara?
MARCO ANTONIO ROCHA
O Estado de S. Paulo - 20/06/2011

Na semana que vem é fim do mês e fim do 1.º semestre de Dilma Rousseff. Tipo de efeméride que a imprensa gosta. Serão providenciados vários balanços e diversas pesquisas procurando dar conta dos erros e acertos da presidente no período.

E, a exemplo do que acontece com qualquer governo, a imprensa também cometerá vários erros e acertos nas suas avaliações dos seis meses. A vantagem da imprensa é que ela pode desdizer amanhã o que disse hoje, e isso não cria muito problema a não ser para sua própria credibilidade. Já um governo tem de dizer e fazer coisas, muitas vezes a toque de caixa, que podem ter pesada repercussão para a população e para o futuro do País. Qualquer brasileiro com pelo menos 50 anos de idade pode citar meia dúzia de decisões governamentais que prejudicam o País e os jovens até hoje - e não estamos falando só da área do ensino, que é rica de exemplos.

O que nos parece indiscutível a essa altura é que o governo Dilma até agora não tem cara. Não a mostrou, pelo menos. Talvez seja cedo para dizer, mas ela parece não ter certeza de que uma política de protagonismo afirmativo pessoal seja um bom caminho: poderia talvez melindrar o seu patrono? Sem dúvida, dadas as vastas proporções do ego do antecessor, de quem recebeu as chaves do reino.

Mas o fato é que ela precisa mostrar sua cara não para inflar sua vaidade, ou para distanciar-se do mestre, mas em benefício do País e da sua governança. O Brasil está em fase de muita bonança no cenário internacional - tanto porque sua economia tem ido bem como porque as economias dos outros países não estão indo nada bem. Fosse quem fosse, nessa hora, nosso chefe de governo - homem ou mulher, político ou técnico - teria de exibir bom discernimento, muita lucidez e firmeza de comando na administração e perante o público, para poder complementar, com essas qualidades, entre os investidores privados, nacionais e internacionais, os bons auspícios que eles já alimentam a respeito dos rumos da nossa economia. Assim o País tiraria muito maior proveito da fase propícia que atravessa. É evidente que, pela primeira vez na sua história moderna, o Brasil está sendo olhado pela comunidade dos que decidem os negócios mundiais como player promissor, e não apenas como coadjuvante.

Portanto, a pergunta é se nestes seis meses a nossa presidente já se compenetrou com clareza da importância deste momento histórico, no qual foi inserida por Lula e pelos eleitores, e se se dispõe a atuar na exata medida dessas demandas; ou se ainda não percebeu que todo o seu sonhado projeto de eliminação da miséria no País muito depende, exatamente, da sua afirmação como protagonista de um processo benigno, do seu papel de para-raio da boa vontade internacional e nacional - muito mais do que das pessoas que estejam gerenciando os programas por ela incentivados. O gerenciamento é tarefa de pessoas competentes apenas. Já a credibilidade depende de quem tenha carisma e liderança.

Lula assumiu jogando na retranca. Seu passado o condenava aos olhos do mundo capitalista. O risco Brasil, em setembro de 2002, pouco antes da eleição que o consagraria, estava na casa dos 2.487 pontos básicos (acima do risco norte-americano), em boa parte por causa da jactância (dele e do seu partido) de "mudar tudo isso que está aí". Lula tinha de mudar a cara que exibira até então. E mudou. Entrou em cena una nuova persona como se diria na Commedia Dell"Arte, onde nasceu o teatro moderno e onde os personagens usavam máscaras (donde a palavra per-sonare, soar através de, que deu em "personagem"). Mas não vem ao caso, o que vem ao caso é que, usando a máscara de "Lulinha paz e amor...", ele per-sonou com facilidade, dada sua natureza camaleônica.

Dilma não teve nem tem de jogar na retranca. O risco Brasil está em torno de 160, menor que o dos EUA, como cantou o ministro Mantega. Ricos homens querem colocar tanto dinheiro aqui que o Banco Central teve de dar meia trava com o IOF, e nem assim consegue desanimá-los. Portanto, Dilma não tem de mudar de cara. Apenas tem de ser a animadora e estimuladora de um processo em marcha - a líder da fanfarra. Tem de conquistar confiança. Mesmo que isso melindre companheiros.

O episódio Palocci mostrou indefinição e titubeio: 14/15 dias para demitir um tolo gaguejante que não conseguia explicar como ganhou tanto dinheiro em tão pouco tempo? Injustificável!

Pior é que já exibira essa tibieza de comando: por que não exigir, logo de início, desse fazedor de média que é o seu ministro da Fazenda medidas duras que revertessem as expectativas de inflação? Por que deixar que o mercado começasse a apostar nela, agravando o problema? Por que não se livrar desse outro trapalhão, da Educação, que já mostrou que entende tanto disso quando de fritar bolinhos?

A cara que Dilma precisa ter é a seguinte: a responsabilidade é minha, o governo é meu e vai ter de funcionar do jeito que eu mandar. Poderá até errar, mas ganhará o respeito que ainda não ganhou.

JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO - Quem segue quem


Quem segue quem
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S. Paulo - 20/06/2011

Pesquisadores do comportamento há muito identificaram a tendência humana de pinçar evidências que sustentam seus pontos de vista e ignorar o resto. O chamado "viés de confirmação" permite às pessoas manter suas crenças caninamente mesmo diante de sólidas provas em contrário.

Vai além do comportamento individual. Mais do que "defeito" ou "qualidade", é uma arma evolutiva, refinada por gerações e gerações. Associado a outras obras da seleção natural, como o raciocínio e o poder de argumentação, o "viés de confirmação" torna-se poderoso sistema de convencimento de uma pessoa ou de um grupo sobre os demais. Esse é o reino da política partidária.

No processo de sobrepujar o partido adversário, o grupo no poder (ou em busca dele) realimenta suas convicções ouvindo-se a si mesmo e alienando as opiniões oposicionistas. É a fermentação do dissenso. Quem já gastou horas ouvindo discursos no plenário da Câmara e do Senado sabe que a teoria se aplica à prática política no Brasil. Mas como medir isso?

Com ajuda do jornalista Daniel Lima, do estadão.com.br, identificamos quem os ministros do governo federal seguem em suas contas no Twitter. Trata-se de uma rede social digital em que cada usuário é seguido por qualquer um entre milhões de participantes, mas escolhe quem vai seguir. O tuiteiro não filtra quem lê suas mensagens, mas seleciona as de quem ele lê.

O objetivo é usar o Twitter para revelar conexões políticas e buscar um padrão de comportamento coletivo. O primeiro passo foi somar os pontos em comum: quais são as contas do Twitter que mais ministros tuiteiros acompanham. O segundo, constatar quem eles não seguem.

Para filtrar as 4.589 ligações, selecionamos as contas seguidas por pelo menos cinco ministros tuiteiros. Sobraram apenas 29. Elas exemplificam um padrão que se repete para as demais: 62% são contas de outros membros do governo ou de petistas. Os 38% restantes são jornalistas. Perfis da oposição são exceções que confirmam a regra.

Dos 16 ministros estudados, 13 seguem @DilmaBR, a representação de sua chefe. Não é de espantar que seja o ponto mais em comum entre eles. Surpresa é que os outros três - Guido Mantega (Fazenda, do PT), José Leônidas (Portos, do PSB) e Mario Negromonte (Cidades, do PP) - não acompanhem a conta criada para Dilma Rousseff durante a campanha presidencial. Talvez porque tenha caído em desuso desde a posse.

Em segundo lugar, com 9 seguidores cada um entre os ministros tuiteiros, estão dois petistas, @Mercadante (ministro Aloizio Mercadante, da Ciência e Tecnologia) e @zedutra13 (José Eduardo Dutra, ex-presidente do PT e da Petrobrás), e dois jornalistas, @BlogdoNoblat (Ricado Noblat) e @luisnassif (Luis Nassif).

Com 8 seguidores aparecem @blogdilmabr e @padilhando, o perfil do ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT). Cinco perfis somam 7 ministros seguidores: @blogdapetrobras, @helenachagas (ministra da Comunicação Social), @MarceloBranco (responsável pela campanha de Dilma Rousseff nas redes sociais em 2010), @Paulo_Bernardo (ministro das Comunicações) e @ptnacional.

Excluídos os perfis de jornalistas (veja a lista completa no blog voxpublica.com.br), surgem com 6 seguidores: @ptbrasil, @ricardoberzoini (deputado federal, PT-SP) e @vaccarezza (Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, PT-SP).

E com 5 os petistas @DrRosinha (deputado federal), @LindberghFarias (senador), @tarsogenro (governador gaúcho) e @pauloteixeira13 (líder do PT na Câmara dos Deputados), além de @dilmanarede.

Com 727 mil seguidores no Twitter, @joseserra_ é acompanhado por apenas dois ministros: o peemedebista Edison Lobão e Helena Chagas, que era jornalista antes de virar ministra e, como tal, adquiriu o hábito de seguir políticos de vários partidos.

Se o Twitter for uma amostra do comportamento dos políticos, a tendência é ouvirem muita gente que tem a mesma opinião que eles, e captarem uma parcela do ponto de vista dos adversários através do filtro da imprensa.

Nesse cenário de mais do mesmo, é surpreendente o elogio público de Dilma a Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Menos por reconhecer a importância histórica do antecessor, e mais por esboçar um diálogo que implica não ignorar argumentos que contrariem suas convicções. Se non è vero è ben trovato.

CARLOS ALBERTO SARDENBERG - ''É nóis!''


''É nóis!''
CARLOS ALBERTO SARDENBERGO 
Estado de S. Paulo - 20/06/2011 


O ministro Guido Mantega chamou a imprensa na semana passada para alardear: o risco americano, ou seja, o risco de se aplicar em títulos do governo americano, é maior que o risco Brasil. E isso, acrescentou, se explicava pela fraqueza da economia americana e pela fortaleza da nossa; pelo fracasso da política econômica lá deles e pelo sucesso da dele, Mantega.

O ministro se baseava numa situação de fato insólita. Há um papel no mercado internacional chamado CDS (Credit Default Swap), uma espécie de seguro que o investidor compra para se proteger de eventual calote em títulos de governo. Assim: o sujeito compra um papel do Tesouro brasileiro e, para se proteger, um CDS vinculado. Quanto maior o risco de não pagamento da dívida, maior o preço do seguro (do CDS).

Pois na semana passada o CDS americano de um ano custava mais que o papel brasileiro equivalente. Viram só?

Qual é o outro lado da história?

Não foi o risco Brasil que diminuiu, foi o americano que subiu. E por razões políticas. Nos EUA, republicanos, que têm a maioria no Congresso, se recusam a aprovar uma lei proposta por Barack Obama que aumenta o teto da dívida americana, já no limite. Nessa circunstância, o governo americano não pode emitir títulos novos para pagar os que estão vencendo e mais os juros. O que vai acontecer? O governo vai pagar em dólares (monetizar a dívida, encher o mercado mundial de mais moeda desvalorizada)? Teria recursos para isso? Ou vai atrasar os pagamentos?

É mais provável que os republicanos estejam apenas esticando a corda, de modo a arrancar outras coisas do presidente Obama. Mas, enquanto isso, o CDS deles subiu, piorou no curtíssimo prazo. E vai cair quando se resolver o embrulho político.

E foi tudo. Não decorre daí que o Brasil está melhor. Se estivesse, a taxa básica de juros aqui - os 12,25% do Banco Central - não seria a maior do mundo, disparada. A taxa real de juros não seria de 5,5% ao ano, enquanto está em torno de zero em boa parte do mundo e é negativa em muitos países, inclusive nos EUA. Para colocar os títulos da dívida de dez anos, os EUA pagam 2,9% ao ano e o governo brasileiro paga 4,7%, em dólares. Para se financiar em reais, o governo brasileiro paga 12,3% ao ano, e o Tesouro americano paga 0,5% em moeda local.

Juros elevados num mundo de juros baixos exibem o sintoma da doença brasileira. Por que não caem? Essa é a pergunta que o ministro Mantega deveria responder. É nisso que deveria estar trabalhando.

O Brasil melhorou muito, mas chegou a um ponto em que exige mudanças importantes para continuar avançando. Eis algumas histórias de que tomei conhecimento nos últimos dias:

o advogado Eduardo Fleury, de São Paulo, estava numa conference call com clientes de uma empresa americana, preparando novos investimentos no Brasil. Estavam quebrando a cabeça para descobrir como superar as variadas barreiras burocráticas. Após algumas horas de conversa, o CFO americano comenta: "Mas será que vale a pena isso tudo?";

o diretor de uma empresa industrial alemã conversa com possíveis parceiros numa fábrica em São Paulo: "Mas por essas contas, o custo de produção no Brasil é 30% maior que na Alemanha. É isso mesmo?";

de um executivo francês que trabalha no Brasil e tem família em Santos: "Pelo telefone fixo, é mais caro falar de Santos para São Paulo do que de Paris para São Paulo. Como pode?";

de outro: "O Brasil tem tudo para produzir energia - rios, quedas d"água, ventos, petróleo, biocombustíveis e até minério de urânio. E tem também a energia mais cara do mundo. Como pode?";

um operador do JP Morgan, nos EUA, comentando com brasileiros: "O Brasil tem prazo de validade, vai até a Copa. Depois, todo mundo vai rever investimentos".

E, por falar nisso, também ficamos sabendo que funcionários do governo brasileiro procuraram recentemente colegas alemães para buscar informações sobre a preparação da Copa. "Agora!?" - foi a resposta (e o espanto) dos alemães.

A Copa tem sido uma das preocupações centrais do governo Dilma - e precisa mesmo ser assim. Há atrasos em todos os projetos e na organização geral. O Congresso ainda está votando a lei que regulamenta (e simplifica) as licitações de obras ligadas ao campeonato. O BNDES já tem os recursos para financiar estádios, mas a falta de alguma coisa (projeto, licitação, licença, contratos, etc.) tem bloqueado os empréstimos para obras cruciais.

Na reforma do Maracanã, por exemplo, o governo do Rio está utilizando recursos próprios para não deixar as obras paradas enquanto espera o dinheiro do BNDES. Gasta, assim, verbas orçamentárias que deveriam ser destinadas a escolas, hospitais, segurança (os bombeiros!) e unidades de pacificação.

Em São Paulo, a Odebrecht iniciou a terraplenagem do estádio do Corinthians por sua conta e risco. Simplesmente não há contrato assinado para as obras e a Câmara de Vereadores da cidade ainda está votando a lei que concede as reduções de impostos sem as quais o estádio não é viável. A Fifa vai anunciar a cidade da abertura da Copa agora em julho.

E assim segue a ciranda. Foram impressionantes a inação e a incapacidade do governo Lula de colocar o evento num ritmo forte e seguro. O caso dos aeroportos é o mais visível. O que o atual governo percebeu - que o setor público não tem nem os recursos nem a capacidade para tocar as obras e os serviços necessários - estava amplamente demonstrado por analistas independentes desde que o Brasil ganhou o direito de sediar a Copa.

Mas, além desse caso, por toda parte se encontra uma falha de governo - do federal, dos estaduais e dos municipais. Estamos de novo num ambiente do quebra-galho. A Copa vai sair assim, no puxadinho. Mas não se faz um país assim. Os problemas da Copa também são um sintoma.

DENIS LERRER ROSENFIELD - Resgate da memória


Resgate da memória
DENIS LERRER ROSENFIELD
O ESTADÃO - 20/06/11

A polêmica envolvendo a divulgação de documentos considerados ultrassecretos do Estado brasileiro envolve questões fundamentais que dizem respeito ao resgate da memória do país. O sigilo envolvendo esses documentos não poderia nem deveria ser objeto de barganhas partidárias ou outras, porque compromete a compreensão que tenhamos de nossa própria história. A história do país deveria se situar para além de qualquer disputa política.

O projeto de lei tramitando no Senado, depois de ter sido aprovado na Câmara dos Deputados, estipula em 25 anos, com uma única renovação possível, o período máximo do sigilo, o que já é, inclusive, um tempo abusivo, pois significa meio século de desconhecimento de um período relevante do país. Agora, a proposta de que mesmo esse período seria curto, exigindo uma espécie de segredo eterno, foge de qualquer regra de razoabilidade. O país tem direito de conhecer a sua própria história, qualquer que seja, mesmo que escape aos cânones atuais do politicamente correto. Arquivos históricos não deveriam estar submetidos às intempéries da política.

A história das nações não é a história do politicamente correto. Nações não são anjos, nem os homens estão voltados necessariamente para o bem, tendo, igualmente, uma propensão ao mal. Hegel já dizia que a história não é o lugar da felicidade. Pretender impor retroativamente critérios atuais do certo e do errado significa desconhecer a própria natureza humana.

Argumentos têm sido veiculados de que a divulgação desses documentos comprometeria nossas relações com Estados vizinhos, em particular com o Paraguai, em virtude da guerra travada com esse país no século XIX , e com a Bolívia, a propósito das ações do Barão de Rio Branco na demarcação do estado do Acre. Ora, o traçado de fronteiras, em toda a história da humanidade, envolveu guerras e os mais diferentes tipos de contratos e tratados. São fatos que deveriam ser reconhecidos enquanto tais. Pensar diferentemente é como se somente o Brasil devesse "se envergonhar" de seu passado.

Mais importante ainda, deixamos de conhecer uma parte importante de nossa história, que só a abertura desses arquivos poderia propiciar. Países aprendem com seus erros e seus acertos, assim como as pessoas. Quem esconde algo é porque não quer nada aprender. A ignorância não é uma lição de aprendizagem.

Aliás, o que poderia bem acontecer nas relações atuais com o Paraguai e a Bolívia, se eles tivessem acesso a esses documentos, se é que já não os possuem? Reivindicariam territórios e ameaçariam militarmente o Brasil? Invadiriam o país em nome de sua "causa"? Tal hipótese não tem o menor cabimento. Nada aconteceria. As fronteiras brasileiras permaneceriam como estão, não havendo nenhuma modificação.

Os EUA travaram uma longa guerra com o México que modificou as fronteiras desses países, tendo esse último perdido vários territórios. Os documentos do que aconteceu são públicos, e as fronteiras atuais desses respectivos países não foram, no entanto, alteradas. Os EUA, ademais, compraram o Alasca do Tsar da Rússia no século XIX, tendo esse território se tornado um estado americano. A história é conhecida e, no entanto, não haverá nenhuma modificação de fronteiras. Alguns podem mesmo considerar o preço pago barato demais!

A Europa, em um passado recente, posterior à Segunda Guerra Mundial, foi objeto de um redesenho de suas fronteiras entre os vencedores e os vencidos. Um mapa do século XXI é, em muito, diferente de um mapa do início do século XX. Alguns Estados podem estar descontentes, porém nada disto alterará o atual traçado. A Lorena e a Alsácia, por sua vez, sempre foram objeto de litígio entre a Alemanha e a França. No entanto, as atuais fronteiras não são objeto de contestação, mesmo que tenham sido fruto de um fato de guerra.

O mesmo vale para a discussão envolvendo a divulgação dos documentos relativos ao regime militar no país. Todos os documentos deveriam estar à disposição pública, em particular dos historiadores, que poderiam trabalhar com fontes de primeira mão. O problema não diz respeito a torturadores nem aos que pegaram em armas para instalar um regime comunista no país. Embora de um ponto de vista ideológico a questão seja frequentemente colocada desta maneira, o problema é muito mais abrangente, porque diz respeito ao conhecimento das gerações atuais em relação à própria história nacional.

Se o país tem direito de conhecer a tortura que ocorreu em um determinado período, ele tem igualmente direito de saber sobre os assassinatos e justiçamentos cometidos pelos que pretendiam impor ao país um regime totalitário. Se se fala da Comissão da Verdade, ela não pode omitir fato nenhum sob pena de se tornar uma Comissão da Mentira.

Ressalte-se que se trata da história, da memória e do conhecimento. Não está aqui em questão uma suposta revisão da Lei da Anistia, assunto já pacificado do ponto de vista do Supremo Tribunal Federal, e novamente confirmado pela Advocacia-Geral da União. O país pode se relançar sobre nossas bases, que perduram até hoje, tendo propiciado o mais longo período de democracia nacional. Um país só pode recomeçar se fizer uso do perdão, algo central, aliás, da doutrina cristã. Um país que não sabe repactuar consigo é um país imerso em revanches e vinganças de ambos os lados que, por isto mesmo, tornam-se intermináveis.

Eis por que o Brasil tem direito de conhecer integralmente a sua própria história, algo que não diz respeito a pseudodenominações de "esquerda" e "direita", nem a questões de política externa baseadas no segredo e na ignorância nacional. Somente pelo resgate de sua própria memória um país pode trilhar um outro caminho, diferente em muitos aspectos a outros de seu passado. O futuro só se esboça verdadeiramente diferente graças ao pleno conhecimento do passado.

MELCHIADES FILHO - Quem te viu

Quem te viu
MELCHIADES FILHO
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11
BRASÍLIA - Dilma Rousseff não faz jus à fama de firme e doutrinária nem confirma a expectativa de que realizaria um governo inflexível. Aos poucos, ela vai se dobrando à realpolitik. Resistiu por um tempo à fisiologia pura, mas não tardou a abandonar antigas convicções.
Os recuos mais gritantes dizem respeito a um tema caro à presidente "enquanto pessoa física": a radiografia do passado, sobretudo do período de repressão militar.
Como ministra da Casa Civil, a ex-presa política Dilma reclamou a abertura total dos arquivos oficiais e a revisão da Lei da Anistia, para levar à Justiça os crimes comuns (sequestros, estupros) cometidos em nome do Estado na ditadura.
Agora, defende o sigilo dos documentos que o governo considerar sensíveis e joga fora a chance de ajustar a Lei da Anistia -o advogado-geral da União usou argumentação frontalmente contrária à que Dilma esgrimiu, três anos atrás, para pedir a correção histórica.
Erra quem sustenta que são concessões isoladas para reforçar os alicerces do governo, abalados pela inesperada demissão de Antonio Palocci. Outros recuos precederam a queda do "primeiro-ministro".
Enquanto braço-direito de Lula, Dilma atuou para esvaziar a pauta ambientalista, fritar a colega Marina Silva e explorar o potencial agrícola e energético da Amazônia. Hoje, preocupada com a imagem no exterior, manifesta contrariedade com o Código Florestal em análise no Congresso -cujos artigos, um a um, retratam o que ela sempre defendeu. Mais: Marina é convidada ao Planalto como aliada.
O chamego com FHC, atacado impiedosamente na eleição. A decisão de privatizar os aeroportos, em vez de cumprir os planos de fortalecer a estatal Infraero. A manobra para ocultar os orçamentos da Copa, meses após ter prometido que toda planilha seria divulgada.
Para os dilmistas, há um só alento. Quem muda tanto de princípios um dia pode retomar os originais.

FERNANDO DE BARROS E SILVA - Dilma e seu paradoxo

Dilma e seu paradoxo
FERNANDO DE BARROS E SILVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11

SÃO PAULO - "Estou de saco cheio de ver companheiro acusado, humilhado, e depois não se provar nada." Era Lula, anteontem, num encontro do PT paulista. No contexto da frase, defendia Antonio Palocci, o maior consultor do Brasil. Mas poderia estar falando dos mensaleiros, dos aloprados, do caso Santo André, da família Erenice ou do próprio Palocci, aquele envolvido na violação do sigilo do caseiro -para lembrar só os "greatest hits" do petismo na vida como ela é. Humilhação? De quem contra quem?
Lula, no entanto, não estava preocupado com Palocci, e sim com as brigas internas na bancada do PT na Câmara. Lembrou que o mensalão só veio à tona porque o partido "estava desunido" -como se se tratasse de um problema de falta de coesão, e não de princípios -e passou a seguir um pito coletivo:
"Tem deputado me ligando, querendo conversar. Vocês têm que resolver entre vocês. Todo mundo aqui é maduro, é cientista político. Temos que dar tranquilidade à companheira Dilma".
Ao se colocar como mediador e fingir não fazê-lo, Lula, na prática, cuida da articulação política entre Dilma e seu partido. Como já havia feito entre o PMDB e a presidente.
Sua atuação não traz de volta apenas o estilo palanqueiro, de inflamação retórica e ameaças, que Dilma estava decidida a aposentar. Traz de volta, além disso, a percepção de quem sem ele, Lula, a base aliada será incapaz de conter sua tendência à autofagia. Mais do que interlocutor, Lula age (e também vem sendo solicitado) como o grande fiador da governabilidade -seja porque os aliados não reconhecem a autoridade política da presidente, seja porque os apetites do consórcio no poder são maiores que o prato que o governo pode entregar.
A presença de Lula enfraquece Dilma; sua ausência a desestabiliza. Passada a lua de mel (e a quarentena), o governo parece pendular entre uma coisa e outra, refém de um paradoxo que é péssimo para Dilma e ótimo para seu padrinho.

LUIZ FELIPE PONDÉ - Marianne

Marianne
LUIZ FELIPE PONDÉ
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11


Seguindo o rastro da filosofia escandinava da angústia, deixando a Dinamarca e indo em direção à Suécia, encontro a atmosfera do grande cineasta Ingmar Bergman (1918-2007) em sua ilha de Faro.

Paisagem desolada e fria, cenário de alguns dos seus grandes filmes, Faro é o mundo ideal para a geografia bergmaniana da alma, geografia esta que fala das experiências do abandono, do amor traído, da tortura causada por um Deus silencioso, e do pavor do nada que nos habita dissolvendo nossas esperanças.


Entre os seus filmes rodados em Faro, um -para o qual ele "apenas" fez o roteiro e Liv Ullmann, uma de suas esposas e maiores atrizes, dirigiu- é excepcionalmente contundente. "Infiel", feito em 2000, é uma pérola da tradição dos filmes sobre o amor que devasta a vida com a força de uma tempestade vulcânica.

A estética bergmaniana da devastação da alma pelo afeto se realiza no filme não só pela presença de sua repetida insistência em expor nossos maiores demônios mas também pela delicadeza no tratamento de um desses demônios, a paixão imprevista, que assola nossa vida e a destrói, esmagando-a sob o peso da irresistível beleza do amor romântico.

Marianne é uma bela atriz, casada com o bem-sucedido maestro Markus. O casamento deles é muito feliz, com amor, uma filha linda e doce, e sexo em abundância, dados importantes para excluirmos o senso comum que crê que a infidelidade por paixão só assola casamentos já arruinados.

Se assim fosse, casais que se amam estariam a salvo, e a infidelidade por paixão romântica não seria uma tragédia, mas sim uma ciência matemática e, portanto, previsível.

O terceiro elemento é David (o amante), diretor de teatro, amigo íntimo do casal, que carrega elementos autobiográficos do próprio Bergman (sua crueldade com as mulheres, seu caráter furioso, sua insegurança afetiva, sua tendência autodestrutiva).

O triângulo repete a "receita" medieval clássica de destruição da vida pela paixão amorosa: a mulher que se apaixona perdidamente pelo melhor amigo do marido.

Tudo começa por acaso. Marianne e David se viam como irmãos. Uma noite, dormindo na mesma cama, já que se viam como irmãos (não vou entrar em detalhes de por que dormem nessa ocasião na mesma cama), Marianne desperta no meio da noite e "o vê pela primeira vez", enquanto ele dorme.

Na sequência, eles se encontram numa galeria de arte, e num beijo impulsivo, a vida deles, do amigo e marido dela, Markus, e da pequena filha, Isabella, mergulha no abismo. A cegueira é de fato a melhor metáfora sensorial para o amor que os enlaçará num destino impiedoso, mas belo.

Como diz o maravilhoso escritor francês Bernanos, "o acaso é feito à nossa semelhança". O sentido dado pelos medievais à paixão romântica é exatamente este: uma doença que nos acomete ao acaso e nos deixa obcecado pela beleza do ser amado, levando-nos à destruição.

A paixão se impõe por sua própria natureza deliciosa e por isso mesmo impiedosa, e não porque ela signifique algo além de si mesma. Quem busca na doença do amor algo além dele mesmo vaga por uma casa vazia. O roteiro de Bergman e a direção de Liv Ullmann capturam exatamente essa falta de sentido da paixão romântica, a não ser a própria escravidão maravilhosa a ela.

Marianne, contra si mesma, perde o controle da própria vida e arrasta consigo "um mundo inteiro".

Sua vida, antes bela e bem disposta entre os elementos que ordenam o cotidiano (amor, sexo, trabalho feliz e bem-sucedido, bens materiais abundantes, mas não excessivos, desenhando o equilíbrio entre desejos e necessidades visíveis), é destroçada contra sua crescente dependência da presença física de David em seu cotidiano, dissolvendo a ordem bela que dispunha sua vida para a felicidade e harmonia entre seus desejos e necessidades invisíveis.

Quanto maior o amor, maior a indiferença para com suas vítimas. Num momento de grande agonia, descrevendo o que sente, Marianne diz que "David cresce dentro dela e de sua vida como um tumor que tudo invade".

Que Deus nos proteja do amor.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

''Somos apontados como vilões''
SONIA RACY
O GLOBO - 20/06/11

Para Jun Sakamoto, que se prepara para assumir a Associação Nacional de Restaurantes, o governo trata empresários do setor como mercenários em busca de lucro fácil

A meticulosidade de Jun Sakamoto no balcão do restaurante que leva seu nome rende a ele, frequentemente, o título de melhor sushiman de São Paulo. E também a fama de "chato, mal-humorado e briguento", como ele mesmo descreve. Mas, consciente de que optou por uma profissão na qual para ter sucesso não necessariamente precisa beijar criancinhas para conseguir votos, o arquiteto formado na USP aceitou convite para disputar a presidência da Associação Nacional de Restaurantes (ANR), amanhã, em chapa única. E liderar 185 associados. A seguir, trechos da entrevista.

Caso seu nome seja mesmo referendado amanhã, que marca pretende imprimir?


O crescimento da entidade. As pessoas do setor já me conhecem e sei que é diferente porque quando toco a campainha não sou só "mais um". Outra marca é que a nossa entidade é do diálogo, diferentemente da Abrasel que opta pelo embate entrando com ações na Justiça. Fomos os primeiros a procurar a Coordenadoria de Vigilância Sanitária, por exemplo, para trocar figurinhas. As vezes são trazidas demandas impraticáveis. Agora vem uma que me afeta diretamente: querem que a gente congele todos os peixes antes do preparo para evitar uma possível transmissão de verminose. Isso acaba com a qualidade do produto. O governo nivela tudo por baixo. Eles pegam a ponta final da cadeia (os restaurantes) e falam: "Vocês dão um jeito de consertar". Mas não fiscalizam o pescador...

Qual é a maior luta da ANR?

Criar condições para o setor se formalizar. E a tributação é o principal empecilho. O governo tem a visão de que dono de restaurante é milionário: "Esse ganha dinheiro, então o desgraçado tá roubando da população e de nós". É impressionante porque nossa margem é estreitíssima e só consegue tirar algum lucro quem é realmente competente ou quem faz tudo errado: compra carne de origem duvidosa, paga funcionário por fora. E vai fiscal lá no meio de Itaquera? Não, ninguém tá nem aí. E se vai, já chamam ali para o canto, "quanto é?", bate um carimbo, assina aqui e tá tudo certo. Já ouvi muitos casos assim. Ah, agora se pegam um Alex Atala... meu, o cara recebe até promoção. São situações em que nós, donos de restaurantes, somos apontados como vilões. No setor tem vilão que faz tudo errado? Tem, e a gente lamenta e luta contra. Só que o governo não acredita que o povo brasileiro possa ter boa índole. Pensa: "Se baixarmos os impostos aí é que os desgraçados vão nadar à vontade".

Qual é o posicionamento da instituição em relação à "lei da gorjeta", que já está no Senado?

Somos contra o governo querer transformar os 10% do garçom em salário só para tributar. Somos extremamente a favor de que essa gorjeta vá todinha para o funcionário, mas que não incida imposto sobre isso.

Mas muito dono de restaurante não repassa o valor ao garçom...


Por isso lutamos pela formalização desse procedimento. Donos de restaurantes também atendem pessoas do governo. Estamos mobilizando uma rede de contatos, falando com sindicatos representantes dos garçons, dos patrões, tudo para tentar chegar a um acordo e levar para Brasília, juntos, outro projeto de lei.

Você tem a fama de ser um chef que gosta de tudo do seu jeito, inclusive com os clientes. Você se acha democrático para ser representante desta entidade?

Eu sou sempre democrático. A democracia está em chegar a um acordo em que ambas as partes concordem. No restaurante eu só tenho oito lugares no balcão, onde faço um tipo de arte gastronômica. Então já é explicado na reserva como funciona. Se a pessoa estiver de acordo, ótimo, será bem-vinda. No começo, até conseguir passar essa informação, deu muito arranhão. O cliente chega no balcão e pede um sushi califórnia. Eu digo que não, não faço califórnia nem nada além da minha degustação. Tem gente que não entende isso, mas estamos falando de pessoas intransigentes, mimadas, arrogantes, que têm um ego gigante porque fizeram fortuna há pouco tempo. Ou porque herdaram o dinheiro, mas não cultura. Daí eu falo: "Desculpa, eu não obriguei você a vir aqui, você tem 600 restaurantes para ir e exigir o que quiser". Daí peguei a fama de chato, mal-humorado, briguento.

Seu estilo no balcão é diferente de quando está na mesa de reuniões?

Sim, fica bem distante, porque não tem emoção, só análise. A diretoria aqui é bem ativa e as decisões são tomadas em conjunto. Se mudarmos a plaquinha de presidente de lugar, não fará a menor diferença.

Como lidam com a questão dos arrastões nos restaurantes?


Discutimos o assunto em todas as reuniões. Pedimos um plano de ação à Secretaria de Segurança Pública. Conseguimos, no máximo, mais viaturas circulando nas áreas com mais restaurantes. Nas assembleias plenárias, alertamos os associados porque, por incrível que pareça, muita gente nem abre o jornal, nem sabe o que está acontecendo. Recomendamos, aos que tiverem condições, colocar mais equipamentos de segurança. E rezamos, né?

A lei antifumo comprometeu o movimento?

Na ANR, todos fomos extremamente a favor da lei porque faz bem à saúde. E quando a coisa acontece para todo mundo, não tem queda de movimento. Porque daí o cara não vai mais em restaurante para ficar em casa fumando? Não existe isso.

E a "lei seca"? Afetou?

Também é importante, mas não pegou por falta de fiscalização. No Rio pegou, porque lá você faz blitz em três corredores e pronto, fechou o Rio de Janeiro. É o poder público nivelando por baixo, tratando todo mundo como um bando de bebum.

Há um projeto de lei na Assembleia Legislativa que propõe regulamentar a cobrança do couvert porque, muitas vezes, o cliente não sabe se o produto será cobrado ou não. Qual é sua opinião?


É mais uma vez o governo defendendo o burro que não sabe de nada. Por que não dá educação em vez de tratar a gente como bandido que quer se aproveitar? Nada é de graça nesse mundo. Mas procuramos tentar dialogar. E entender como nasce um projeto de lei desses... Mas já vi, sim, restaurante oferecer uma taça de champanhe e depois vir na conta R$ 150. Acho erradas essas armadilhazinhas. Orientamos o empresário a ser honesto com o cliente.

No manual do bom cliente, é feio perguntar: "Vou ter que pagar por isso?"


Também não precisa perguntar assim, né? Pergunte: "É um presentinho? É cortesia da casa?".

Na cozinha, prefere criatividade ou qualidade?

Qualidade. Não crio nada, mas aprendo muito. Recebi um professor de história da culinária japonesa e mudei muita coisa naquela noite. Ele me disse que o peixe no Brasil cheira mais do que no Japão. E me ensinou que a alga tira esse excesso de odor. Hoje, o shoyu que preparo para o sushi é diferente: coloco shoyu, caldo de peixe que eu mesmo faço e algas marinhas. Bato tudo no liquidificador, depois peneiro.

A degustação no Jun custa R$ 250. É caro?


Não. Se eu te vender um (avião) Gulfstream G650 por R$ 1 milhão é de graça. Ou um grão de café por R$ 1 é caro. Se não houvesse fila de espera, diria que estou caro. E se o lucro fosse grande, eu não teria hamburguerias. Aliás, só consegui ter mais qualidade de vida da metade do ano passado para cá. Neste ano termino de mobiliar o apartamento. Juro por Deus, há três anos, eu morava em um de 42 m² com minha mulher e meus dois filhos. Financiei e hoje comprei um de 160 m². Há três anos morando lá, o colchão ainda está no chão. Não tenho mesa nem sofá.

É difícil achar profissionais no mercado?

Meu Deus do céu, cada vez pior. E não só em restaurante. Um colega da construção civil me contou que estava em uma obra e pegaram o pipoqueiro que estava ali com o carrinho e o chamaram para ser operador de betoneira.

Paulistano sabe comer bem?

Comparado a quem? A carioca (risos)? Eles têm praia, nem precisam disso com aquela vida maravilhosa. Mas paulistano come bem pela diversidade. Você pode ir a Goiânia e ter uma comida típica maravilhosa, mas talvez lá não tenha um bom restaurante japonês.

DÉBORA BERGAMASCO

MÔNICA BERGAMO - AGENDA MÉDICA

AGENDA MÉDICA
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11

A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) baixa hoje uma norma obrigando os planos de saúde a cumprir prazos mínimos de atendimento para seus usuários. Consultas básicas com pediatras, ginecologistas, obstetras e clínicos terão que ser marcadas em no máximo sete dias; com os demais especialistas, como cardiologistas, em até 14 dias. A operadora terá ainda até dez dias para agendar com outros profissionais de saúde, como nutricionista, fonoaudiólogo, psicólogo, terapeuta ocupacional e fisioterapeuta.

AGENDA 2

A norma da ANS determina também que exames para diagnóstico por laboratório de análises clínicas (como os de sangue e urina) sejam agendados em até três dias. Os procedimentos de maior complexidade, como tomografia e ressonância magnética, terão que ser marcados em até 21 dias.

AGENDA 3
A resolução da agência, que será publicada hoje no "Diário Oficial", entra em vigor em 90 dias.

TESTE

O PC do B encomendou pesquisa para o Ipespe sobre a sucessão em SP. A ideia era testar o nome do vereador Netinho (PC do B-SP) na corrida eleitoral. Num cenário com Aloizio Mercadante (PT-SP) e José Serra (PSDB-SP) como candidatos, ele ficou com 17%, contra 26% do petista e 22% do tucano.

POP
Quando só nomes "novos" na política entram na lista da pesquisa, Netinho se sai melhor. Aparece com 23%. Paulo Skaf (PMDB-SP) tem 10%, Gabriel Chalita (PMDB-SP), 2% e Fernando Haddad (PT-SP), 1%. O fato de Netinho ser um cantor popular e de tanto ele quanto Skaf já terem disputado campanhas majoritárias, para o Senado e o governo de SP, explica o resultado.

MARINA LÁ
Em plena crise do PV (Partido Verde), Marina Silva ficará entre outubro e dezembro no MIT (Massachusetts Institute of Technology), nos EUA, participando de um grupo multidisciplinar de pesquisa sobre sustentabilidade. Ela foi a única brasileira convidada.

VIDA DE CÃO

A Polícia Civil de SP instaurou inquérito para apurar supostos maus-tratos a animais no Centro de Controle de Zoonoses da prefeitura. Laudo de uma bióloga diz que pitbulls e rotweillers vivem numa ala "escura, úmida e mal ventilada". As baias, pequenas e dispostas umas em frente às outras, limitam seus movimentos e obrigam o contato visual com outros animais, provocando estresse e "agressão mental".

CÃOMINHADAS

O centro diz que os canis contam há um mês com solários. Neles, os bichos andam até 50 minutos por dia, em horários alternados, para reduzir os danos do contato visual. O problema é que o espaço não foi projetado para alojar os cães por longos períodos -eles ficam hospedados até serem adotados. E a construção é da época em que os animais eram sacrificados, prática hoje proibida.

FAÇA-SE A LUZ
O acordo firmado entre os cineastas Helena Ignez e Ícaro Martins naJustiça não alterará a ordem de seus nomes nos letreiros finais do filme "Luz nas Trevas" -ele já era creditado como diretor junto com ela e apresentado primeiro. Entre as mudanças, Helena deixará de aparecer como "diretora-geral", mas permanece como "idealizadora" do longa. Embora Martins tivesse conseguido liminar para proibir a exibição do filme, o longa acabou liberado por outra decisão.

ALÉM DO HORIZONTE

Roberto Carlos abriu para venda o prédio Horizonte, do qual é sócio. O estilista Carlos Miele foi ao evento de inauguração imobiliária, na avenida Juscelino Kubitschek. Chitãozinho e sua mulher, Márcia Alves, assistiram à curta apresentação que o Rei fez para convidados.

COMIDA É ARTE DE COMER
O Prêmio Melhores do Ano Prazeres da Mesa Bohemia elegeu Isabela Raposeiras a melhor barista do Brasil. Carole Crema ganhou na categoria chef "pâtisser". Entre os chefs que foram ao Grand Hyatt estava Emmanuel Bassoleil.

CURTO-CIRCUITO


Lulu Santos se apresenta no Citibank Hall nos dias 8 e 9 de julho às 22h. 12 anos.

A atriz italiana Margareth Madé será a madrinha do navio Costa Favolosa, que será batizado no dia 2 de julho, em Trieste, na Itália.

A ONG Liberta organiza happy hour beneficente, com show da banda Duo-Dheno, amanhã no Mercearia do Jockey, às 19h.

Nando Reis fará show amanhã na festa do hotel Pullman para convidados.

A Reteté Big Band se apresenta hoje às 21h no Teatro da Vila. Classificação: livre.

com DIÓGENES CAMPANHA, LÍGIA MESQUITA, THAIS BILENKY e CHICO FELITTI

RENATA LO PRETE - PAINEL

Gregos e troianos
RENATA LO PRETE
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11

Ao declarar que a decisão do Supremo Tribunal Federal de não extraditar Cesare Battisti foi "mal compreendida" pela opinião pública, Carlos Ayres Britto conseguiu produzir desconforto nas duas alas em que a Corte se dividiu no julgamento de 8 de junho.
Entre os seis ministros cujo voto resultou na libertação do ex-terrorista italiano, há quem considere que Britto, diante das reações negativas, "traiu" a maioria que ajudou a formar. Na minoria (foram três votos favoráveis à extradição), a queixa é que o ministro teria subestimado as implicações da decisão e agora tenta "reescrever" seu voto para evitar desgaste.

Em dupla 
Deputados e senadores governistas notaram: quando o assunto é distribuição de cargos, as reuniões no Planalto têm a presença não apenas de Ideli Salvatti (Relações Institucionais), mas também de Gleisi Hoffmann (Casa Civil).

Intensivão 
Gleisi, que no Senado já vinha se dedicando a entender melhor o novo Código Florestal, mergulhou de vez no assunto ao assumir a Casa Civil, por meio de leituras e conversas com gente do ramo.

Prontuário 1
Além de ter votado contra o Planalto no código, Mendes Ribeiro (PMDB-RS), que Dilma Rousseff desistiu na última hora de indicar para a liderança do governo no Congresso, relatou, na Câmara, a Lei de Acesso à Informação.

Prontuário 2 

Foi Ribeiro quem alterou o texto original do governo de modo a eliminar a possibilidade de sigilo eterno de documentos oficiais. Antes favorável à medida, a presidente agora se declara contrária.

Festival vermelho 

O MST prepara sua primeira grande manifestação no governo Dilma. No final de agosto, montará um mega-acampamento em Brasília. O objetivo é receber cerca de 5.000 sem-terra na capital ao longo de uma semana.

Não... 
Antes mesmo de Lula pregar, em encontro partidário anteontem, a união da fraturada bancada do PT na Câmara, deputados de diferentes facções já se preocupavam com os efeitos da crise interna sobre o relacionamento com o Planalto.

...na frente 

Reunidos na semana passada em jantar na casa de André Vargas (PR), cerca de 40 deputados petistas, quase todos pertencentes à corrente majoritária, concluíram que o litígio tem servido para que outras vozes do partido "façam a cabeça" de Dilma Rousseff e ganhem espaço no governo em prejuízo da bancada.

...das crianças 

Ninguém acredita propriamente em pacificação, mas foi decretada no evento uma ordem geral para mergulhar e evitar lavagem pública de roupa suja -em "on" e, se possível, também em "off".

Sinuca 1 

Desde sempre inclinado a apoiar a reeleição de Luciano Ducci (PSB) em Curitiba, em detrimento das pretensões de seu correligionário Gustavo Fruet, o governador Beto Richa avalia no momento as possíveis consequências de sua opção.

Sinuca 2 
Há sinais de que Fruet não ficará isolado se abandonar o PSDB e disputar a prefeitura por outra sigla. Até no PT existe quem defenda apoiar o ex-deputado na capital paranaense.

Pai e filho 
Depois de flertarem com a ideia de engrossar as fileiras do PSD de Gilberto Kassab no Paraná, os deputados Reinhold Stephanes, federal, e Reinhold Stephanes Júnior, estadual, resolveram ficar no PMDB.
com LETÍCIA SANDER e FABIO ZAMBELI

tiroteio

"Lula é aquele que "não sabia" do mensalão. Agora, falou como o chefe que foi e ainda é".
DO TUCANO EDUARDO GRAEFF, secretário-geral da Presidência no governo FHC, sobre o fato de o petista haver declarado que o escândalo de 2005 teria passado sem maiores consequências se o partido estivesse unido.

contraponto

Longa vida

Na reunião do Conselho de Ética que decidiu pela cassação de Jaqueline Roriz (PMN-DF), Vladimir Costa (PMDB-PA), da tropa de choque da deputada, atacou:
-Vou mandar erguer uma estátua lá no meu Estado em sua homenagem, Chico Alencar. Você é o arauto da moralidade pública- ironizou, numa referência ao fato de a representação ali analisada ser do PSOL.
-Estátua só deve ser erigida depois da morte. Espero que o colega não deseje rapidez na minha!
-Longe de mim sequer pensar nisso, nobre líder!

AMIR KHAIR - Questionar dogmas

Questionar dogmas

AMIR KHAIR
O ESTADÃO - 20/06/11
O dogma pode ser caracterizado como sendo uma crença estabelecida sobre a qual não cabe discussão. É muitas vezes usado para se referir a qualquer crença que é mantida insistentemente.

Muitas vezes repetida, determinada ideia acaba por se assemelhar a um dogma. Na economia têm sido usadas pelas análises tradicionais duas afirmações que se assemelham ao conceito de dogma: 1) a economia não pode crescer acima de determinado nível, pois ocorrerá necessariamente inflação; 2) a Selic só poderá cair depois que caírem as despesas do governo federal.

1º Dogma. Crescimento x Inflação: o conceito de produto potencial é normalmente usado como sendo o máximo crescimento que é possível alcançar sem causar elevação da inflação. É uma simplificação de uma realidade complexa de vários fatores que atuam sobre o crescimento e a inflação de origem interna e externa ao país. A globalização comercial e financeira invadiu a "tranquilidade" que reinava nas economias nacionais e passou a ter importância crescente na determinação do crescimento e na inflação de cada país, e de forma mais intensa quanto mais exposto ao comércio e sistema financeiro fora de suas fronteiras.

Quando ocorre um processo inflacionário em escala internacional, como uma crise na oferta de petróleo, crescem os custos dos seus derivados, dos produtos petroquímicos, da energia e dos fretes que dependem do óleo diesel. O mesmo vale para choques de oferta de alimentos e metais.

Como o último movimento da elevação da inflação começou a acorrer em escala global a partir de meados de 2010, com a subida dos preços dos alimentos e commodities (incluindo petróleo, alguns alimentos e metais), os países passaram a combatê-la com os instrumentos fiscais e monetários ao seu alcance.

Os países desenvolvidos, com economias estagnadas, sentiram menos seus efeitos, pois o consumo e o investimento se encontram, desde a crise de 2008, em níveis baixos e, as taxas de desemprego, ao redor de 10%, com a população envolvida em dívidas geradas pelo excesso de financiamentos, especialmente o imobiliário.

O mesmo não está ocorrendo nos países emergentes, que apresentam crescimentos ao nível do que vinha ocorrendo antes da crise de 2008. Assim, o consumo e o investimento continuam permitindo o desenvolvimento natural que vinha ocorrendo e, estão sofrendo um pouco mais de pressão de demanda, que criou uma elevação de preços mais acentuada do que nos países desenvolvidos. Diante desse quadro, há que tomar decisões que possam otimizar os benefícios da continuidade do crescimento, com razoável controle do processo inflacionário. Medidas de abrandamento da liquidez e elevação dos juros foram acionadas pelos emergentes, mas dentro de níveis compatíveis a não sacrificar o crescimento.

Por outro lado, foram ativados os investimentos para elevar a capacidade de atendimento de bens e serviços em expansão. Assim, o controle inflacionário é atacado pelas suas duas frentes: elevação da oferta e regulação da demanda por adequação do nível e condições do crédito de forma a não artificializar o consumo, criando riscos de elevação da inadimplência dos consumidores. No âmbito dessa política de manter o crescimento econômico com controle inflacionário, chama mais a atenção a questão das taxas de juros reais das diversas economias dentro desse processo. Era de se esperar que, para conter a inflação, as taxas reais de juros dos emergentes subissem para ficar no campo positivo. Não foi o que ocorreu. Nos países desenvolvidos, mais preocupados em retomar o crescimento, as taxas reais de juros foram para o campo negativo.

Logo após a elevação da Selic pelo Copom para 12,25% ao ano, no último dia 9, a Corretora Cruzeiro do Sul apresentou o ranking das taxas básicas de juros reais de uma amostra representativa das 40 principais economias. O Brasil liderou essa relação com 6,8%, mais de quatro vezes superior ao Chile, o segundo, com 1,5%. Os emergentes, exclusive o Brasil, apresentaram taxa negativa de 0,8% e, os desenvolvidos, taxa negativa de 1,4%. A média do conjunto dos 40 países foi de 0,9% negativa.

Chama a atenção o fato de ser tão discrepante a situação dos juros no Brasil e, isso merece prioridade de preocupação não apenas do governo federal, mas de toda a sociedade. O que poderia justificar tamanha discrepância? Segundo as análises tradicionais lideradas pelo mercado financeiro, essa taxa de juros é a necessária para evitar que a inflação dispare, pois existe um excesso de demanda que deve ser combatido com uma taxa de juros que desestimule o consumo e, embora não declarado, o investimento, pois ele é parte integrante da demanda.

Assim, seria necessário forte contenção do crescimento para ficar abaixo do famoso produto potencial, que é uma medida teórica que varia conforme o interesse maior ou menor de apertar o deslanche da economia.

Por essa corrente de pensamento, é preciso abortar o crescimento para um ritmo inferior a 4% ao ano, ou seja, estamos condenados a crescer bem menos que os emergentes, de 6,5%, segundo o FMI, embora se tenha potencial de crescimento acima de 5%.

O que importa é continuar crescendo, mas procurando manter o controle sobre os fatores ao alcance do País para minimizar o impacto inflacionário. É falsa a afirmativa de que o combate à inflação deva se dar encolhendo a economia via elevação da Selic. O tiro pode sair pela culatra pois, ao elevar a Selic, reduz a possibilidade de as empresas investirem, o que prejudica a ampliação necessária da oferta de bens e serviços.

2º Dogma. A Selic só poderá cair depois que caírem as despesas do governo federal: é comum avaliar a questão fiscal apenas pelo lado das despesas de custeio. A fragilidade dessas análises é: 1) só considerar as despesas do governo federal, ignorando que Estados e municípios respondem por metade da despesa do setor público; 2) não considerar como despesa os investimentos e os juros; 3) não considerar os reflexos que determinados tipos de despesas de custeio (transferências de renda) geram crescimento e arrecadação superior às despesas que foram usadas.

A Selic pode cair sim, e já deveria ter caído há muito tempo. Aliviaria parte substancial da despesa do setor público, reduziria a demanda pelo efeito riqueza, reduziria rapidamente a relação dívida/PIB, reduziria a bomba de sucção da especulação internacional propiciada pela Selic, reduziria o custo das reservas internacionais e não artificializaria o câmbio.

Embora fundamental nas despesas públicas a gestão eficiente, eficaz e efetiva, toda economia em despesas (custeio, investimento e juros) deve ser usada não para reduzir a despesa pública, mas rentabilizá-la para permitir a redução do elevado déficit social e de infraestrutura do País. Para isso, o aliado mais importante é o crescimento econômico via incorporação de amplas camadas da população ao mercado formal de trabalho, que é a meta perseguida pelo governo. É melhor deixar os dogmas no campo da fé religiosa.

ROBERTO ZENTGRAF - Sem a menor cerimônia


Sem a menor cerimônia
ROBERTO ZENTGRAF
O GLOBO - 20/06/11
E então, meu querido amigo-leitor, aconteceu com você também? Fui todo animado consultar o site da Receita Federal se minha restituição do IR tinha sido restituída (!) e dei de cara com a mensagem lacônica "Sua declaração está na base de dados da RFB". Fazer o quê, né? Já me acostumei, pois mesmo tendo sempre enviado as minhas declarações antes do prazo final e sem erros ou trapaças fiscais, nunca peguei o dinheiro que paguei a mais de imposto antes do quinto lote, que este ano será pago em 17 de outubro (o cronograma da Receita está disponível na internet, no endereço http://bit.ly/2oJMj7). Mas pensemos pelo lado positivo: tendo me acostumado à demora, passei a me planejar sem incluí-la em meu orçamento! Entretanto, sei que muitos - infelizmente! - não têm a mesma opção e, assim, pensei em abordar no artigo de hoje algumas opções para você usar a sua restituição. Vamos a elas!

1. Como investimento: Enquanto a restituição não chega, a receita aplica a Taxa Selic sobre o saldo. Caso você não esteja pendurado em dívidas e aceite a poupança forçada imposta pelo governo, isso vira uma excelente alternativa de investimento, pois não paga taxa de administração e é isenta de impostos. Posto de outra forma: funciona como uma caderneta de poupança com a rentabilidade bruta do CDI. Que tal? Como ilustração: quem está com a restituição de 2010 pendente irá receber 12,14% de correção caso ela saia em 16 de junho, e quem já foi incluído neste primeiro lote conta com correção de 1,99%. Nada mau, não é mesmo?

2, Para liquidar dívidas: Para aqueles que já a receberam e estão pendurados em dívidas com cartões de crédito ou cheques especiais, o momento é este: usar o total da restituição para diminuir ou, quem sabe, eliminar os saldos devedores que mensalmente sangram orçamentos pessoais a uma velocidade abusiva de mais de 10% ao mês. A dica vale para as demais dívidas caras também, mesmo que isso signifique renunciar ao consumo imediato: adiar a compra do objeto do desejo até a chegada do décimo terceiro pode servir de consolo, não?

3. Como garantia de empréstimos: Em uma rápida pesquisa on-line, observei que os maiores bancos oferecem a antecipação da restituição (nome pomposo para o velho e conhecido empréstimo!). As taxas são até baixas quando comparadas às demais praticadas no mercado - oscilam entre 2,35% e 3,38% - mas, como o seguro morreu de velho, eu adicionalmente recomendaria a você: (a) verificar junto ao banco qual o valor que ele utilizará para liquidar a dívida: o constante na declaração ou o valor corrigido pela Selic, o que aumentará a taxa paga no empréstimo; (b) planejar como liquidará o empréstimo bancário caso sua restituição demore mais do que o planejado, pois, a 3,38%, sua dívida dobrará em menos de dois anos; (c) refletir porque está optando em pagar juros (os bancários) em vez de recebê-los (a Selic do governo). Vale se for para liquidar as dívidas citadas no item (2) e, mesmo assim, só no caso em que a taxa cobrada pela antecipação do IR for menor do que a taxa da sua atual dívida. Do contrário, peça ao seu gerente um minutinho e caia fora da operação. !

Um grande abraço e até a próxima semana!

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


Líder, zona sul de SP perde fatia de imóveis residenciais
MARIA CRISTINA FRIAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 20/06/11

A zona sul deve perder nos próximos anos a liderança em lançamentos de imóveis residenciais na cidade de São Paulo, de acordo com especialistas do setor.
Nos quatro primeiros meses de 2011, 34,3% das unidades entregues na cidade estavam nessa região. No mesmo período de 2010, o índice era de 41,1%, segundo o Secovi-SP (sindicato da habitação).
"Há poucos terrenos disponíveis na região sul. A tendência é diminuir o número de lançamentos, mas com aumento de participação da zona leste", diz o presidente da entidade, João Crestana.
A zona leste foi a única região da cidade com aumento no número de apartamentos entregues no primeiro quadrimestre deste ano ante o mesmo período de 2010 (de 1.354 para 2.340 unidades).
Os lançamentos da zona leste passaram a representar 32,7% do total, ante 15,8% no mesmo período de 2010.
A disponibilidade de terrenos na zona oeste também pode levar a região à liderança de lançamentos residenciais, segundo Carlos Alberto Camargo, da Fiabci (federação ligada ao setor) .
"Do ponto de vista geográfico, é a única região para onde a cidade pode crescer."
Com a falta de terrenos, houve queda de 16,4% no número de lançamentos residenciais em São Paulo, na comparação entre os quatro primeiros meses de 2010 e de 2011. Entre março e abril deste ano, porém, houve crescimento de 39,2%.
"A cidade precisa de mudanças na Lei de Zoneamento para continuar a se desenvolver", diz Crestana.

FUNDOS DE IMÓVEIS
De olho no interesse de investidores por fundos imobiliários, a Rio Bravo decidiu incrementar a área. Um novo diretor, José Diniz, vai cuidar dos fundos que têm R$ 3 bilhões em carteira.
Ex-presidente da divisão responsável pelos negócios de incorporação (CCDI e HM) do grupo Camargo Corrêa, Diniz substitui o atual diretor e sócio da Rio Bravo, Luiz Eugênio Junqueira Figueiredo, que se concentrará na diretoria de operações.
A gestora de recursos planeja lançar outros fundos imobiliários ainda neste ano.
"Já temos dois no forno. A demanda é mais para imóvel comercial, que aluga lajes ou salas para escritórios. O fluxo de receitas é mais seguro que no imóvel residencial", afirma Diniz. Para ele, a demanda por fundos com "flats" deve voltar.

DISPUTA NA EDUCAÇÃO
A Unifacs (Universidade de Salvador) e a Educacional Extensa estão em litígio após a universidade ter sido comprada pelo grupo americano Laureate, em junho de 2010.
As duas instituições mantiveram parceria por mais de seis anos: a Unifacs disponibilizava professores e a Educacional Extensa comprava livros, computadores e alugava os imóveis utilizados.
A Educacional Extensa foi notificada do rompimento no fim de 2010 e discute os valores a serem pagos. "Nosso cliente deve ser ressarcido no valor do ativo imobilizado e dos investimentos", diz a advogada Beatriz Lopes.
A Unifacs "prefere não se pronunciar", pois o assunto "está na esfera judicial".

PELO AR
A ICSA do Brasil fechou R$ 100 milhões em contratos para fabricar conversores de energia para parques eólicos em Santa Catarina, Bahia e Ceará.
Os primeiros 15 conversores ficaram prontos em maio. Os outros serão entregues até julho de 2012.
Os equipamentos fabricados não precisarão de um sistema de engrenagem, como costuma ocorrer com os outros tipos do aparelho.
Para produzir os conversores, a ICSA fechou parceria (que envolve transferência de tecnologia) com a empresa alemã Vensys.
A forma de produção dos equipamentos, porém, foi "tropicalizada". "Usamos componentes adequados para as condições ambientais do país, de alta temperatura e umidade", diz Victor Rozo, diretor da empresa.
Os conversores produzidos na fábrica de Minas Gerais devem ser exportados para países como Venezuela e Argentina, segundo Rozo.

EMBATE
A convivência entre líderes de gerações diferentes ("baby boom", X e Y) é motivo de conflito dentro de empresas, segundo pesquisa da Amcham-Brasil (Câmara Americana de Comércio) realizada com 80 executivos.
Dos entrevistados, 75% afirmaram que sofrem esse tipo de problema. Apesar disso, 70% deles dizem que não tomaram ações para facilitar a interação entre gestores de épocas distintas.

Churrasco Apex e CNI fazem amanhã, em Bruxelas (Bélgica), seminário sobre agronegócio. Dentre os palestrantes, representantes do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento e de entidades de produtores de carne, laranja, açúcar e etanol.

Renovação A Alstom criou a divisão de energias renováveis (eólica, hidrelétrica e solar). No Brasil, a empresa assinou dois contratos de eólica, de 300 milhões, e inaugura fábrica neste ano.

FÉRIAS SEGURAS
O aumento das viagens dos brasileiros impulsiona o mercado de seguros.
As seguradoras faturaram R$ 13 milhões com a venda de seguro-viagem neste ano até abril, com alta de 32,4% sobre 2010, segundo a Susep.
A taxa média de sinistralidade, que aponta o peso das indenizações pagas sobre a receita apurada, caiu de 77% no primeiro quadrimestre de 2010 para apenas 30% em igual período deste ano.