Quem segue quem
JOSÉ ROBERTO DE TOLEDO
O Estado de S. Paulo - 20/06/2011
Pesquisadores do comportamento há muito identificaram a tendência humana de pinçar evidências que sustentam seus pontos de vista e ignorar o resto. O chamado "viés de confirmação" permite às pessoas manter suas crenças caninamente mesmo diante de sólidas provas em contrário.
Vai além do comportamento individual. Mais do que "defeito" ou "qualidade", é uma arma evolutiva, refinada por gerações e gerações. Associado a outras obras da seleção natural, como o raciocínio e o poder de argumentação, o "viés de confirmação" torna-se poderoso sistema de convencimento de uma pessoa ou de um grupo sobre os demais. Esse é o reino da política partidária.
No processo de sobrepujar o partido adversário, o grupo no poder (ou em busca dele) realimenta suas convicções ouvindo-se a si mesmo e alienando as opiniões oposicionistas. É a fermentação do dissenso. Quem já gastou horas ouvindo discursos no plenário da Câmara e do Senado sabe que a teoria se aplica à prática política no Brasil. Mas como medir isso?
Com ajuda do jornalista Daniel Lima, do estadão.com.br, identificamos quem os ministros do governo federal seguem em suas contas no Twitter. Trata-se de uma rede social digital em que cada usuário é seguido por qualquer um entre milhões de participantes, mas escolhe quem vai seguir. O tuiteiro não filtra quem lê suas mensagens, mas seleciona as de quem ele lê.
O objetivo é usar o Twitter para revelar conexões políticas e buscar um padrão de comportamento coletivo. O primeiro passo foi somar os pontos em comum: quais são as contas do Twitter que mais ministros tuiteiros acompanham. O segundo, constatar quem eles não seguem.
Para filtrar as 4.589 ligações, selecionamos as contas seguidas por pelo menos cinco ministros tuiteiros. Sobraram apenas 29. Elas exemplificam um padrão que se repete para as demais: 62% são contas de outros membros do governo ou de petistas. Os 38% restantes são jornalistas. Perfis da oposição são exceções que confirmam a regra.
Dos 16 ministros estudados, 13 seguem @DilmaBR, a representação de sua chefe. Não é de espantar que seja o ponto mais em comum entre eles. Surpresa é que os outros três - Guido Mantega (Fazenda, do PT), José Leônidas (Portos, do PSB) e Mario Negromonte (Cidades, do PP) - não acompanhem a conta criada para Dilma Rousseff durante a campanha presidencial. Talvez porque tenha caído em desuso desde a posse.
Em segundo lugar, com 9 seguidores cada um entre os ministros tuiteiros, estão dois petistas, @Mercadante (ministro Aloizio Mercadante, da Ciência e Tecnologia) e @zedutra13 (José Eduardo Dutra, ex-presidente do PT e da Petrobrás), e dois jornalistas, @BlogdoNoblat (Ricado Noblat) e @luisnassif (Luis Nassif).
Com 8 seguidores aparecem @blogdilmabr e @padilhando, o perfil do ministro da Saúde, Alexandre Padilha (PT). Cinco perfis somam 7 ministros seguidores: @blogdapetrobras, @helenachagas (ministra da Comunicação Social), @MarceloBranco (responsável pela campanha de Dilma Rousseff nas redes sociais em 2010), @Paulo_Bernardo (ministro das Comunicações) e @ptnacional.
Excluídos os perfis de jornalistas (veja a lista completa no blog voxpublica.com.br), surgem com 6 seguidores: @ptbrasil, @ricardoberzoini (deputado federal, PT-SP) e @vaccarezza (Cândido Vaccarezza, líder do governo na Câmara, PT-SP).
E com 5 os petistas @DrRosinha (deputado federal), @LindberghFarias (senador), @tarsogenro (governador gaúcho) e @pauloteixeira13 (líder do PT na Câmara dos Deputados), além de @dilmanarede.
Com 727 mil seguidores no Twitter, @joseserra_ é acompanhado por apenas dois ministros: o peemedebista Edison Lobão e Helena Chagas, que era jornalista antes de virar ministra e, como tal, adquiriu o hábito de seguir políticos de vários partidos.
Se o Twitter for uma amostra do comportamento dos políticos, a tendência é ouvirem muita gente que tem a mesma opinião que eles, e captarem uma parcela do ponto de vista dos adversários através do filtro da imprensa.
Nesse cenário de mais do mesmo, é surpreendente o elogio público de Dilma a Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Menos por reconhecer a importância histórica do antecessor, e mais por esboçar um diálogo que implica não ignorar argumentos que contrariem suas convicções. Se non è vero è ben trovato.
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