quarta-feira, agosto 03, 2016

Brasil golpista - GUILHERME FIUZA

REVISTA ÉPOCA

Duas pesquisas nacionais indicaram que a maioria dos brasileiros quer eleições presidenciais antecipadas. Isso significa o seguinte: a maioria dos brasileiros continua não fazendo a menor ideia do que é bom para sua saúde. Chega a ser injusto que essa distinta sociedade tenha recebido o impeachment de presente. Talvez merecesse continuar sendo alegremente roubada pelos companheiros, que ganharam na moleza mais de 13 anos de enriquecimento às custas dessa maioria tonta.

A ridícula narrativa do golpe de Estado jamais teria ido além da esquina do diretório petista se o país soubesse razoavelmente o que está acontecendo. Não sabe. O Brasil está chupando o dedo, para variar, e começa a emergir da lama achando que é papai do céu quem o está puxando. Vai ver o desemprego e a inflação caírem, o crescimento voltar - e vai até desistir dessa palhaçada de eleição antecipada -enquanto se prepara para vitaminar os novos gigolôs da bondade.

São eles: PSOL e seus menudos anti-impeachment, Marina e sua Rede de transfusão petista, Ciro Gomes (original ou genéricos, tanto faz) e aventureiros associados - incluindo um possível e providencial Joaquim Barbosa e até um Lula redivivo, se estiver solto. O que todas essas criaturas têm em comum? Todas torceram seus narizinhos para o impeachment, pensando no dia de amanhã: herdar o curral petista.

Pode escrever, caro leitor. Pode pesquisar, auditar cada passo, palavra ou gesto dessa turminha da democracia carnavalesca: estão todos de régua e compasso nas mãos, para calcular o caminho mais curto para o poder, para viver do proselitismo do oprimido, torrando o dinheiro do contribuinte na montagem e manutenção de sua corte de propaganda progressista. Em setembro estarão todos na artilharia da oposição, querendo sangue e sonhando com a sua DisneyLula própria.

Todos eles são candidatíssimos à tal eleição antecipada que a maioria dos brasileiros diz que deseja ou acha que deseja.

Naturalmente, eleição antecipada é golpe. Alguém aí está disposto a ler a lei? Onde está prevista, na lei, essa aberração? Ou a maioria dos brasileiros não sabe ler a lei ou não se importa com ela. Os primeiros não são melhores que os últimos. Todos representam a mesma massa de manobra que sustentou o estelionato petista e está pronta para sustentar a próxima malandragem "progressista".

Qual foi a primeira voz a espalhar com força a tese da antecipação de eleições presidenciais? Foi a dela, a da primeira e única mulher sapiens, a da inesquecível Dilma Rousseff. E todos os bagunceiros profissionais, disfarçados de bons samaritanos, foram atrás do disparate. E lá vai a maioria da população, distraída, macaquear a esperteza.

Para quem não liga mais o nome à pessoa, Dilma Rousseff é esta que tem agora nova acusação no Tribunal Superior Eleitoral, por causa de uma empresa de fachada que recebeu quase R$ 5 milhões às vésperas da eleição de 2014 por serviços de informática inexistentes. Apenas mais um dos diversos atestados do sequestro das maiores empresas do país pelo partido que defende os pobres - e fabrica ricos.

É o mundo dos sonhos de toda a vagabundagem pseudoesquerdista (vale lembrar FHC no auge do "neoliberalismo", vendo a sanha parasitária da oposição: "Esquerda sou eu").

O governo Temer - governo de brancos, velhos, homens, feios, chatos, bobos, recatados e do lar - está arrumando a casa. Não que Temer seja a Providência divina. É apenas um político com desconfiômetro, que notou ser sua única chance montar um governo com os melhores. Todos sabem quem são os melhores. Lula sabe. Tanto que começou assim, até que a querida maioria brasileira o santificou e ele descobriu que não precisava mais dar satisfações a ninguém. Itamar Franco também sabia, ou pelo menos ouviu falar. Assim nasceu o Plano Real.

Não dá para fazer um governo só de bons. Há concessões inevitáveis, há a montagem da base política. Mas os que estão tomando conta do dinheiro, após uma década de picaretagem, são bons. E, com a casa arrumada, as virtudes haverão de florescer - ou pelo menos sair da sombra dos michês da bondade.

Prezada maioria brasileira, não precisa ajudar. Se fizer a gentileza de não atrapalhar, já será uma revolução.


Um emprego divino - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 03/08

Se eu não tivesse lido no jornal e conferido com meus próprios olhos no site da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, juraria que é uma piada. Mas não é. A legislação estadual exige que todos os treinos e competições olímpicas sejam monitorados por um salva-vidas certificado pelo Corpo de Bombeiros. Como é algo remota a possibilidade de atletas como Michael Phelps se afogarem na piscina, esses profissionais dificilmente farão mais do que receber um salário para assistir aos jogos de camarote.

Tudo isso não passaria de um exotismo local a ser incorporado ao folclore olímpico, caso a regra não valesse para todas as piscinas de uso coletivo com mais de 6m x 6m fincadas em território fluminense, o que gera impactos não desprezíveis para pequenos condomínios com piscina e mesmo para academias de menor porte. Para fazer sentido e não tornar-se meras sinecuras, propostas legislativas como a do Rio precisam no mínimo considerar o fluxo de banhistas que o equipamento recebe.

Quando alguém decide construir uma piscina ou morar num prédio que tenha uma, opta por expor-se a riscos. Cabe à regulação estatal minorá-los, mas sempre segundo uma análise de custo e benefício e pautada pelo realismo. Obviamente, para fechar a conta é preciso atribuir um valor monetário à vida humana. Muitos consideram isso chocante, mas é inevitável fazê-lo se você vive num mundo cujos recursos são finitos e precisa tomar decisões, como a de reformar ou não a curva de uma estrada que mate x pessoas por ano.

Na verdade, muitas das agências estatais já operam com um preço de tabela para a vida humana, que é dado pelo maior valor que sacrificariam para prevenir uma morte. Raramente os revelam, mas em alguns casos eles são conhecidos. Para a EPA, a agência ambiental dos EUA, ele é de US$ 9,1 milhões (2010). Já para a FDA, a agência de medicamentos, um americano custa menos: US$ 7,9 milhões.


Alcateia - RODRIGO CONSTANTINO

REVISTA ISTO É

Qualquer crítica é vista como “islamofobia”, o que anula a possibilidade de um debate sério sobre o assunto



Dois irmãos explodem uma bomba numa maratona de Boston. Um sujeito decide abrir fogo numa boate gay em Orlando. Um maluco joga um caminhão em cima de uma multidão em Nice, matando mais de 80 pessoas. Um padre com 86 anos é morto a facadas numa igreja francesa. Qual o denominador comum aqui?

A imprensa fala em “lobos solitários”. Mesmo? Não seria o caso de tantos lobos muçulmanos a ponto de criarem uma verdadeira alcateia islâmica? O autoengano não vai ajudar no combate ao terrorismo. A covardia é o caminho certo da derrota. O Ocidente precisa encarar a dura realidade: estamos em guerra.

O primeiro passo é deixar os bodes expiatórios de lado. Não dá para culpar a venda de armas, quando tantos matam usando aquelas obtidas ilegalmente, ou facas, aviões, caminhões. O foco dos “progressistas”, como o presidente Obama, na questão do desarmamento é pura distração, e coloca em risco a população pela reação equivocada que produz.

Também não podemos falar em “discurso de ódio” nas redes sociais. Não é isso que tem atraído essas pessoas ao radicalismo islâmico. O multiculturalismo politicamente correto, ao contrário, tem impedido um debate sincero, pois não podemos “ofender” os muçulmanos. Qualquer crítica é vista como “islamofobia”, o que anula a possibilidade de um debate sério sobre o assunto.

Tampouco se trata de um problema de desigualdade social, como insiste a esquerda. Há terroristas milionários, como era Bin Laden, e gente de classe média disposta a se explodir para levar a maior quantidade possível de vítimas. Reduzir algo dessa natureza a uma questão de conta bancária é simplesmente absurdo.

O que, então, explica o terrorismo moderno, quase todo ele ligado ao Islã? E como combatê-lo? O dr. Sabastian Gorka oferece boas explicações e sugestões em “Defeating Jihad”, livro em que traça um paralelo entre o islamismo de hoje e o comunismo do passado. O Ocidente está sob ataque de uma ideologia totalitária, que não aceita seu estilo de vida liberal.

Reconhecer esse fato já seria um bom começo. A origem do Islã, com um profeta que foi guerreiro militar, e sua mensagem eivada de passagens violentas e sem separar religião de estado, em nada ajudam. Isso não quer dizer que o inimigo seja todo o Islã. Há muçulmanos que querem reformá-lo, e esses “apóstatas” são os principais alvos dos fanáticos.

Mas é forçoso reconhecer que foi a tradição judaico-cristã ocidental que enfatizou pela primeira vez o indivíduo, valorizando cada vida humana como sagrada. É isso que está sendo atacado pelos terroristas. São seguidores de uma mentalidade niilista que despreza a vida humana, e querem impor um califado totalitário inspirado no Islã. É uma guerra intelectual e cultural, acima de tudo.

Não vivemos sob o império da lei - MURILLO DE ARAGÃO

REVISTA ISTO É

A Justiça, como um todo, precisa de um choque de gestão e de transparência. E devemos reduzir, dramaticamente, o número de leis


Um dos ideais de um regime democrático é que o império da lei seja efetivamente exercido perante todos os cidadãos. A lei valendo para todos de forma igual e uma justiça efetiva é o que devemos almejar para o País. Não é o que ocorre no Brasil.

Vivemos sob o peso de mais de 150 mil leis e normas, intermediadas por mais de ww800 mil advogados. Temos mais advogados que médicos em um sistema em que a lei vale mais, ou menos, de acordo com a capacidade de o cidadão enfrentar o sistema judiciário e se aproveitar de suas brechas e sua lentidão.

Para sustentar todo o aparato judiciário, gastamos 1,8% do PIB. Juízes e promotores são muito bem pagos, até mesmo comparando-se com padrões internacionais. Temos a Justiça mais cara do planeta, mas a prestação do serviço para a cidadania está longe de ser adequada.

O emaranhado legal sufoca o País. Paralisa os negócios. Não valoriza as vontades nem os contratos.

A produtividade do sistema baixa frente ao quadro de regras e leis vigentes. Outras vezes, o ativismo judicial faz a subjetividade ou a preferência do juiz valer mais que a lei.

Acordos de vontade entre partes e empregados que poderiam vitalizar o emprego são sabotados por uma visão arcaica do trabalho. Por outro lado, a morosidade na prestação do serviço jurisdicional nos leva, erroneamente, a saudar decisões que atropelam direitos e garantias.

Temos ainda excesso de casos indo para as cortes superiores. O Supremo Tribunal Federal recebe mais de 60 mil processos por ano.

Nos Estados Unidos, a Suprema Corte recebe pouco mais de oito mil anualmente. Existe algo de muito errado em nosso sistema. Lamentavelmente, o debate sobre o Poder Judiciário ainda é inconsistente e obstruído pelo corporativismo, por nossa imaturidade cívica e pela crise da política. A Justiça, como um todo, precisa de um choque de gestão e de transparência.

Devemos ainda buscar reduzir, dramaticamente, o número de leis por meio de um amplo programa de revogação e de desburocratização. Acordos entre as partes e a arbitragem devem ser estimulados. Infelizmente, falta um longo caminho para vivermos sob o devido império da lei.


Pulso - MONICA DE BOLLE

ESTADÃO - 03/08

Entre acertos e boa retórica, o pulso firme do governo enfraqueceu



Pulso, batimento, movimento do sangue no corpo. Pulso não é sinônimo de punho, a articulação da mão com o antebraço, vulgarmente chamado de pulso. Contudo, uma pessoa firme em suas decisões, que não cede às pressões, que não arreda o pé quando confrontada, tem pulso. Outra, mãos fechadas em expressão defensiva quando afrontada por perigo qualquer, tem punhos cerrados, mas não pulso. Punho ou pulso? O que, afinal, caracteriza o governo de Michel Temer até agora?

O governo começou com demonstrações de pulso firme. Mudou tudo na equipe econômica. Propôs medidas e reformas ambiciosas e essenciais. Encerrou o período de catatonia que marcara o fim da era Dilma Rousseff – a presidente afastada ainda não passou pelo julgamento final, mas é justo afirmar que sua era acabou. Michel Temer pôs no Ministério das Relações Exteriores político capaz de encerrar o nefasto isolacionismo brasileiro em nome de uma ideologia para lá de ultrapassada. Reduziu sumariamente os penduricalhos dos anos petistas, extinguindo milhares de cargos comissionados. Ao lado de seu ministro da Fazenda, prometeu consertar as contas públicas com a adoção de teto para os gastos, uma profunda reforma da Previdência, um programa de privatização. Privatização, palavra proibida nos tempos de Dilma. Tais atos e sinais, ideia de pulso firme, enraizaram nas cabeças dos investidores e do mercado financeiro. Os ativos recuperaram parte do valor perdido. A Bolsa subiu, o dólar caiu.

Contudo, entre acertos e boa retórica, o pulso firme enfraqueceu. Enfraqueceu ante a constatação de que a política é a mesma, os políticos, os mesmos – inclusive o próprio presidente interino. Michel Temer deu ar de novo ao que de novo nada tinha. Entre a necessidade de manter o pulso firme para arrebanhar a confiança e de cerrar os punhos para melhor se defender das inevitáveis pressões, a determinação e a ousadia cederam. Cederam rápido.

Temer interino assumiu a presidência da República em 12 de maio. Nesses três meses de governo, não aprovou nenhuma de suas propostas – sobretudo a emenda constitucional para a criação de um teto para os gastos, a PEC do Teto. Elaborou mas não discutiu com a sociedade brasileira suas propostas para a reforma da Previdência. Alguns detalhes, veiculados pelos jornais nos últimos dias, não são compreensíveis para a maioria da população brasileira, que, nesse momento, desvia sua atenção para os Jogos Olímpicos – e, claro, para a exposição das mazelas nacionais retratadas nas manchetes dos periódicos de grande circulação internacional. Como acreditar numa reforma ambiciosa da Previdência que não foi debatida e explicada àqueles que por ela serão afetados? A falta de debate sobre grandes temas, outra mazela brasileira duramente exposta nesses tempos bicudos. “Ah, mas o País estava paralisado em razão do impeachment”. “Ah, mas como fazer qualquer reforma enquanto prevalece a interinidade?”.

Reconheço a dificuldade. Mas não creio que após a remoção definitiva de Dilma um novo governo nascerá, um sistema político menos infame surgirá no País. As dificuldades hão de ser muito semelhantes. Quiçá serão as mesmas, com as eleições municipais no horizonte próximo, as discussões prematuras sobre candidaturas para 2018.

Nesses três meses de governo, Temer concedeu reajustes salariais ao funcionalismo público em dissonância com seu discurso de austeridade. Renegociou as dívidas estaduais impondo contrapartidas que acabam de ser relaxadas ante a pressão dos governadores e de membros de seu próprio governo. Prometeu que as condições para os cortes de juros serão construídas, mas a verdade é que a nova diretoria do Banco Central ainda pouco acredita que isso seja possível. Tanto que evitou reduzir os juros. Tanto que preferiu apoiar o aperto das condições monetárias ao nada fazer em sua primeira reunião. Aperto sim, uma vez que, com a queda das expectativas de inflação, a taxa de juros real – a que desconta a inflação e reflete o custo do investimento – subiu. Subiu em meio à recessão que ainda é avassaladora, aos 11,6 milhões de desempregados.

Em meio a tudo isso, o pulso ainda pulsa. Porém, pulsa de modo pulsilânime num País onde o corpo ainda é pouco.

*Economista, pesquisadora do Peterson Institute for Economics e professora da Sais/Johns Hopkins University

Fardo do setor público garantirá crescimento medíocre por muitos anos - ALEXANDRE SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 03/08

Não consigo (nem tento) disfarçar meu pessimismo sobre o futuro do país, em que pese a perspectiva de alguma recuperação à frente.

Não me interprete mal. Acredito que estamos melhores agora do que há alguns meses e muito mais do que estaríamos caso o governo anterior não tivesse sido afastado.

Ao menos temos uma equipe econômica que entende a natureza dos problemas enfrentados pelo país, não só a questão do gasto público mas também a necessidade de reformas que acelerem o crescimento da produtividade. E, embora tenha cá muitas dúvidas sobre a posição de Michel Temer quanto à questão fiscal, caso alguém queira defender que ele compartilha da mesma visão de seu time, eu nem discutiria muito.

Isto dito, até agora, a cada encruzilhada que encontrou, o governo sempre tomou o caminho errado.

O reajuste do funcionalismo pode até ter sido (como foi) negociado pela administração anterior, mas defendê-lo, argumentando que "está abaixo da inflação esperada para o mesmo período" e, portanto, de acordo com o ajuste fiscal, soa como uma tentativa canhestra de tapar o sol com a peneira.

Da mesma forma, não é possível vender como vitória da equipe econômica a meta de deficit de R$ 139 bilhões para o ano que vem, apesar de tentativas em contrário. Para que esse valor se materialize, será necessário obter R$ 55 bilhões de receitas ainda não especificadas que certamente não se repetirão em outros anos, ou seja, o valor recorrente do deficit, que balizará a meta para 2018, será de R$ 194 bilhões.

Acrescentando à lista, agora o governo federal cedeu mais uma vez aos Estados, ao permitir que não contabilizem certos gastos no limite de sua folha de pagamento.

Seria muito fácil descrever isso como resultado de um governo fraco, ainda tentando se consolidar, mas acredito que se trata de um problema bem mais profundo.

Não chegamos aqui por acaso. Como escrevi na semana passada, muito da piora fiscal se deve ao governo anterior, em particular à presidente, que, desde que era ministra, sempre se opôs a medidas que colocassem as contas públicas numa trajetória sustentável. Ela, porém, não esteve sozinha na empreitada de demolir o Orçamento e, ainda mais importante, o próprio arcabouço institucional que havia sido criado para dar um mínimo de previsibilidade nesta área.

Quem acompanha o tema há de ter notado a situação dos Estados brasileiros, esmagados pelo peso de seus gastos com pessoal. Oficialmente, 17 deles estouram o limite prudencial, mas uma especialista como Ana Carla Abrão Costa, secretária da Fazenda de Goiás, estima que gastos com o funcionalismo podem ter ultrapassado 80% da receita líquida, comprometendo qualquer possibilidade de gestão.

Não há como escapar à conclusão: o setor público brasileiro se tornou, há muito, refém de interesses especiais.

Nesse contexto, a chance de se concretizar um ajuste fiscal da magnitude do requerido para estabilizar a dívida relativamente ao PIB é mínima, para colocar de forma delicada.

Assim, muito embora possamos imaginar que a economia comece a se recobrar já na segunda metade deste ano, não há como sonhar com uma recuperação vigorosa como na saída de outras recessões, pelo contrário: o fardo do setor público há de garantir crescimento medíocre ainda por muitos anos.


O que eles dizem- MÍRIAM LEITÃO

O Globo - 03/08

Pode ser que os impostos aumentem. É o que o ministro Henrique Meirelles tem avisado. A explicação, segundo Meirelles, é a seguinte: a arrecadação federal tem caído muito, mais do que a queda da economia, numa indicação de que as empresas estão deixando de pagar impostos por causa da crise. Com a melhora da economia, elas voltarão a pagar e só então se saberá se novos tributos são necessários.

Numa entrevista que fiz com ele na segundafeira à noite no palco da festa da “Época Negócios”, Meirelles negou que fosse ser recriada a CPMF, mas não foi igualmente taxativo quando perguntei sobre a Cide, cuja elevação da alíquota não tem que passar pelo Congresso. Meirelles disse que as empresas estão pagando fornecedores, trabalhadores, mas algumas estão postergando o pagamento de impostos para quando a situação melhorar. Ele acredita que isso pode acontecer em breve e lembrou que o governo está prevendo 1,2% de crescimento para 2017, mas “algumas casas estão prevendo mais”.

— Se houver maior crescimento, haverá também maior arrecadação.

Tanto ele quanto os ministros da Casa Civil, Eliseu Padilha, e das Relações Exteriores, José Serra, falando na cerimônia de premiação das empresas do ranking da revista, mostraram os avanços recentes da economia captados pelos indicadores de confiança. Ao mesmo tempo, apontaram mudanças para alavancar a economia. Serra disse que todos afirmam ser contra impostos na exportação, mas tirá-los sempre encontra resistência. Eliseu Padilha foi firme ao falar da reforma da previdência:

— No ano passado, o déficit (do INSS) foi de R$ 80 bilhões, este ano está sendo de R$ 145 bilhões e no ano que vem está previsto R$ 200 bilhões. Não há hipótese de não fazermos a reforma da previdência porque ela interessa a todos. Do contrário, em breves anos não poderemos pagar a aposentadoria — afirmou Padilha.

Meirelles disse que o déficit primário deste ano será cumprido. Perguntei sobre isso porque está havendo queda de receita além do previsto, e alguns imprevistos nas despesas, como os R$ 2,9 bilhões para o Rio.

— O déficit será cumprido. Eu sei que ele é enorme, enorme. Mas é realista. Se houver risco de ele ser ultrapassado, haverá contingenciamento — disse Meirelles.

O do ano que vem será R$ 139 bilhões. E o déficit de R$ 2018, segundo Henrique Meirelles, deve ficar em R$ 60 bilhões:

— Se a economia se recuperar mais fortemente, poderemos até ter equilíbrio em 2018, mas a previsão por enquanto é de equilíbrio, ou um pequeno superávit, em 2019.

Tanto ele quanto Padilha ressaltaram a tendência declinante do déficit como parte do compromisso de se inverter a curva de crescimento da dívida pública.

— Mas este, é bom lembrar, é um governo de pouco mais de dois meses — disse Padilha.

Meirelles defendeu os aumentos de salários aos funcionários como cumprimento do que havia sido negociado anteriormente. Perguntei se não era contraditório aumentar gastos com salários de servidores ao mesmo tempo em que o governo propõe um teto para as despesas obrigatórias. Ele disse que havia previsão orçamentária para esses reajustes e que o teto de gastos quando for aprovado vai garantir a queda das despesas.

Antes da entrevista, eu havia conversado com Meirelles sobre a concessão feita na negociação com os estados e municípios, que deixou fora do cálculo das despesas de pessoal os benefícios como auxílio-moradia ou gastos com indenização e terceirização. Ele negou que estivesse cedendo. Explicou que pela lei de responsabilidade fiscal esses gastos não entram quando se quer verificar o limite das despesas versus receita líquida. Se entrassem agora, os estados ficariam desenquadrados. Esses itens serão contabilizados separadamente, mas serão submetidos também ao mesmo teto, ou seja, não poderão subir mais do que a inflação do ano anterior.

Agosto é um mês decisivo, em que se saberá quanto tempo terá o governo para realizar esse projeto fiscal. Os ministros Meirelles e Serra falaram dos projetos para os próximos anos, mas Padilha, que é ministro político, lembrou que antes será preciso votar no Senado o impeachment da presidente Dilma.

Na frente dos bois - DORA KRAMER

ESTADÃO - 03/08

Essencial para o bom andamento dos trabalhos é que a carroça seja levada pelos bois. Do contrário, nem carroça nem bois vão a lugar algum. Mal comparando é o que acontece com a aludida candidatura de Michel Temer para presidente em 2018.



Há três hipóteses para que o assunto seja ventilado como foi pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia, em entrevista aoEstado e por ministros que falaram sob a condição de anonimato para a Folha de S.Paulo: desejo de bajular o chefe colocando-o numa dimensão maior que a real, falta de assunto melhor a tratar nesse período de interregno de poder ou produto do que se convencionou chamar de fogo amigo, mas é lança-chamas na mão do inimigo dissimulado.

Tudo o que Michel Temer não precisa é de ser posto na roda da próxima disputa presidencial. Antes disso precisa de muitas outras coisas. Passar pelo período de interinidade é a primeira delas. Não o fará com a tranquilidade pretendida se der sinais de que, uma vez efetivado, usará o cargo para se promover sem respeitar a ordem de entrada em cena de Henrique Meirelles, José Serra, Aécio Neves e Geraldo Alckmin, só para citar os mais óbvios.

Temer precisará também de dar conta do País em 2017 com um mínimo de sucesso. Para isso, precisará das reformas estruturais, para cuja tramitação no Congresso necessita de base parlamentar sólida com maioria de mais de dois terços da Câmara e do Senado. Nesse campo, precisará estar preparado para contrariar interesses políticos e corporativos, o que provavelmente não lhe renderá a condição de líder popular.

A conturbar o cenário há as incertezas da Lava Jato que não permitem vislumbrar com clareza quais políticos estarão política e eleitoralmente “vivos” em 2018. Aliás, nem sabemos se Michel Temer chegará lá na posse plena de seus direitos políticos. Hoje, o presidente em exercício está inelegível por uma decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, relativa a doações de campanha acima do limite permitido, à qual cabe recurso à instância superior (TSE).

Logo, há uma boiada a ser amaciada antes de se pôr a carroça na estrada.

Força do hábito. Em 2005, quando Duda Mendonça admitiu à CPI dos Correios que havia recebido dinheiro “por fora” pelos serviços prestados à campanha de Luiz Inácio da Silva em 2002, o PT chorou de arrependimento em praça pública, o então presidente cogitou não concorrer à reeleição no ano seguinte e próceres da oposição acionaram a tecla “deixa-disso” a fim de não provocar ações contra Lula que, na concepção tucana, morreria politicamente de inanição. Quem viveu viu o tamanho do forrobodó.

Agora, João Santana diz o mesmo e mais um pouco e não causa o menor espanto. A antiga oposição, hoje governo, faz de conta que o tema não lhe diz respeito. A reação na seara petista é apenas um leve desconforto por Dilma Rousseff, a candidata que teve a campanha financiada do modo relatado por Santana, jogar a culpa no partido a fim de manter a pose da “mulher honesta”. De onde, nesses onze anos decorridos entre os dois episódios o PT além da reputação perdeu a capacidade de se envergonhar.

Duplo sentido
. A operação “Resta Um”, da 33.ª fase da Lava Jato, tanto serve como referência ao fato de a empreiteira Queiroz Galvão ter sido a última das grandes construtoras a ser alcançada pelas investigações, quanto pode ser vista como uma alusão ao grande chefe sem o qual, já apontou o procurador-geral Rodrigo Janot, a organização criminosa não teria como operar um esquema tão amplo de corrupção na máquina do Estado.

Lado a lado - BERNARDO MELLO FRANCO

FOLHA DE SP - 03/08

A 33ª fase da Lava Jato levantou novas suspeitas de pagamento de propina a PT e PSDB. Os partidos rivais aparecem lado a lado nos papéis da Operação Resta Um. Ambos são acusados de receber dinheiro sujo da Queiroz Galvão, envolvida no escândalo da Petrobras.

O procurador Carlos Fernando dos Santos disse que a empreiteira abasteceu ilegalmente a campanha de reeleição do ex-presidente Lula em 2006. Ele citou dois delatores que relataram a entrega de R$ 2,4 milhões em espécie ao comitê petista.

Mais cauteloso, o juiz Sergio Moro reproduziu os depoimentos, mas anotou que "até o momento" não há provas que confirmem o repasse. O PT sustenta que todas as suas doações foram declaradas à Justiça. A prisão de executivos da construtora poderá ajudar a esclarecer o caso.

A suspeita sobre o PSDB envolve valores mais altos. O ex-senador Sérgio Guerra, que morreu em 2014, teria cobrado R$ 10 milhões para travar uma CPI sobre a Petrobras. Ele não era um tucano qualquer. Presidiu o partido e coordenou a última campanha de José Serra ao Planalto.

O PSDB afirma apoiar a Lava Jato e evita discutir o caso concreto, com o argumento de que Guerra não pode mais se defender. É verdade, mas falta esclarecer se a propina ficava com ele ou era distribuída entre outros políticos do partido. As delações de Paulo Roberto Costa e Fernando Baiano apontam para a segunda hipótese. Mais uma vez, Moro diz que ainda não há "prova de fato".

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Leitores perguntam se Michel Temer pode mesmo disputar a Presidência pelo voto direto em 2018.

O TRE de São Paulo afirma que ele está no cadastro de políticos inelegíveisdesde maio, quando foi condenado em segunda instância por fazer doações acima do limite legal.

O tribunal informa que a situação será reavaliada se o interino recorrer à Justiça Eleitoral. Hoje, no entanto, ele aparece na lista dos fichas-sujas.

Causa e efeito - MERVAL PEREIRA

O Globo - 03/08

Não sobrou pedra sobre pedra: o senador Antonio Anastasia, relator do processo de impeachment na comissão especial do Senado, não se limitou a reafirmar as acusações formais que o baseiam, foi além e fez uma análise política das consequências econômicas das transgressões à Constituição pela presidente afastada, Dilma Rousseff.

‘Aexpansão insustentável do gasto público está associada à profunda crise econômica que o Brasil vive hoje”, afirmou o senador tucano, alegando que “os artifícios e manobras fiscais utilizados para a expansão do gasto implicaram perda de confiança dos agentes econômicos, dos investidores, das pessoas físicas, nos números da economia e no futuro da economia, e, hoje, perda do grau de investimento do Brasil pelas principais agências de classificação de risco”.

O senador Anastasia disse em seu parecer que a consequência dos atos de burla da Lei da Responsabilidade Fiscal (LRF) “é a percepção, para a comunidade internacional, de que o Brasil não é um país comprometido com metas fixadas em lei, e que os compromissos de ordem financeira não são levados a sério no País”.

Segundo o relator, a instrução preliminar na comissão especial evidenciou “um sistemático e abrangente descumprimento de princípios fundamentais e basilares que regem não apenas a Administração Pública, mas o Estado de Direito”.

Um “vale-tudo orçamentário e fiscal que trouxe sérias consequências negativas para o País” foi instalado no país, afirmou o relator, “uma política expansiva de gasto sem sustentabilidade fiscal e sem a devida transparência, com o uso de operações que passaram ao largo da legislação e das boas práticas de gestão fiscal e orçamentária, assim como a recusa em se interromper o curso danoso dos eventos pela autoridade máxima do País, que detinha o poder e as informações necessárias, em última instância, para ordenar e fazer cessar as irregularidades”.

Anteriormente, a bancada de apoio à presidente afastada tentou atrasar o processo requerendo que o procurador Ivan Marx fosse ouvido para explicar por que considerou que não houve crime nas chamadas “pedaladas fiscais”. Já não havia condições legais para novas audiências, inclusive porque o advogado de defesa José Eduardo Cardozo já incluíra em sua manifestação final os argumentos do procurador.

Coube à senadora Simone Tebet esclarecer o caso: o procurador disse que não houvera crime em relação à legislação penal, o que não é objeto de análise da comissão nem do Congresso, que analisam apenas os crimes de responsabilidade que a presidente afastada é acusada de ter cometido.

O relator Antonio Anastasia mostrou que a presidente tinha pleno controle das medidas tomadas pelo governo, e citou discursos seus defendendo os atos e um discurso do diretor do Banco do Brasil, o ex-senador Osmar Dias, afirmando que as reuniões para definição do Plano Safra foram coordenadas pela própria presidente Dilma.

Caía por terra, assim, a tese da defesa de que não havia nenhum ato da presidente e que todas as medidas eventualmente ilegais deveriam ser atribuídas aos ministros das áreas e à direção do Banco do Brasil.

O senador Antonio Anastasia fez questão de ser bastante didático em seu parecer, e disse que existem três lições fundamentais que devem ser consideradas pela sociedade brasileira ao acompanhar este processo de impeachment. “Em primeiro lugar, o descontrole fiscal compromete a sustentabilidade das políticas públicas de serviços fundamentais para a sociedade”.

Em segundo lugar, Anastasia destacou que o desequilíbrio das contas públicas “amplia o endividamento público e impacta vários indicadores econômicos (como inflação, PIB, desemprego e taxa de juros), que, por sua vez, representarão prejuízos à qualidade de vida da população”.

Por fim, o relator chamou a atenção para o fato de que o Poder Legislativo, “a caixa de ressonância da sociedade”, não pode ter suas funções constitucionais de fiscalização e controle do orçamento usurpadas pelo Poder Executivo. “A democracia também exige o controle da sociedade sobre a gestão do dinheiro público”, concluiu.

Foi um parecer bastante claro e conclusivo, que ligou causa e efeito, e certamente retira de eventuais senadores “indecisos” razões para não assumirem suas posições diante da sociedade, em voto aberto.

O mandato da presidente - LUIZ CARLOS AZEDO

CORREIO BRAZILIENSE - 03/08

O parecer do senador Anastasia a favor do impeachment será contestado pelo ex-ministro Cardozo, mas nada mudará na comissão especial do Senado. O jogo está jogado


Dilma Rousseff é um cadáver insepulto. A pá de cal foi lançada pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em entrevista coletiva, depois de um almoço com o presidente interino, Michel Temer. Acusado de manobrar para adiar o julgamento do impeachment, em razão da não nomeação de um apadrinhado para o Ministério do Turismo, Renan pôs um ponto final nessas especulações ao declarar que vai trabalhar para concluir o processo até o fim de agosto. A expectativa era de que o julgamento se arrastaria até meados de setembro.

Tudo indica que os caciques do PMDB chegaram a um acordo e a legenda votará maciçamente a favor do impeachment, com exceção da ex-ministra da Agricultura Katia Abreu, que nunca foi do grupo que controla o Senado. Renan pretende dar inicio ao julgamento nos dias 25 e 26, avançando pelo fim de semana - e não em 29 de agosto, como se chegou a prever. O presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, que presidirá o julgamento, está de acordo com o cronograma. Isso significa que aliados de primeira hora de Dilma Rousseff, como o ex-ministro de Minas e Energia Eduardo Braga (PMDB-AM) e o senador Jader Barbalho (PMDB-PA), também estão acertados com Michel Temer.

Ontem, como se esperava, o senador Antônio Anastasia apresentou o relatório à comissão especial do impeachment. Seu voto foi pela "pela procedência da acusação e prosseguimento do processo". O senador tucano apontou as irregularidades cometidas por Dilma que configurariam crime de responsabilidade: a abertura de créditos suplementares sem autorização do Congresso e a realização de operações de crédito com instituição financeira controlada pela União. A defesa pessoal de Dilma será feira pelo ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo.

Três decretos suplementares de Dilma Rousseff, sem a devida autorização do Congresso, foram considerados ilegais por Anastasia porque promoveram alterações na programação orçamentária incompatíveis com a obtenção de resultado primário vigente à época de sua edição, com impacto negativo sobre o resultado primário esperado. Anastasia também caracterizou como ilegais as "pedaladas fiscais", porque configura empréstimo da União com instituição financeira que controla, o que é vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. A omissão da presidente da República, segundo ele, permitiu o financiamento de despesas primárias pelo Banco do Brasil. Anastasia acusou Dilma de desestabilizar a economia: "Os artifícios e manobras fiscais utilizados para a expansão do gasto implicaram perda de confiança dos agentes econômicos, dos investidores, das pessoas físicas, nos números da economia e no futuro da economia, e, hoje, perda do grau de investimento do Brasil pelas principais agências de classificação de risco."

O parecer de Anastasia será contestado pelo ex-ministro Cardozo, mas nada mudará na comissão especial. O jogo está jogado. Dilma tem apenas cinco senadores do seu lado, que deverão apresentar votos em separado. É o fim da linha para a celeuma sobre a existência ou não de pedaladas e dos decretos ilegais. A tese do golpe parlamentar não tem sustentação, porque a lei do impeachment, de 1950, é muito vaga na tipificação de crime de responsabilidade e não sofreu alterações na Constituição de 1988. Além disso, o rito estabelecido pelo Supremo Tribunal Federal(STF), com base no impeachment de Fernando Collor de Mello, embora tenha protelado o julgamento, está sendo seguido à risca. Na verdade, o impeachment substituiu o voto de confiança na Constituição de 88, quando os constituintes desistiram do parlamentarismo e adotaram o presidencialismo.

Quem é o chefe?


Na medida em que avança o processo de impeachment, a Operação Lava-Jato também se projeta na direção do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que já se tornou réu por tentativa de obstrução da Justiça no caso da delação premiada do ex-diretor Internacional da Petrobras Nestor Cerveró. É meio inevitável que isso ocorra, na medida em que as delações premiadas vão chegando perto do círculo mais próximo de colaboradores, amigos e parentes do ex-presidente. O volume de recursos desviados da Petrobras e das obras federais é muito grande para que os investigadores aceitem os argumentos de que Lula não sabia de nada. O mesmo raciocínio vale para Dilma Rousseff, que presidiu o Conselho de Administração da Petrobras e comandou com mão de ferro o chamado Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Quando a Lava-Jato acabar, alguém será apontado como chefe do esquema. A delação premiada dos principais executivos das empreiteiras envolvidas exclui a possibilidade de que um deles assuma esse papel pelos demais.


O samba do partido doido - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 03/08

O festival de asneiras prossegue no trecho em que os petistas acusam a oposição de disseminar o ódio contra o partido



Há carradas de razões para que se consume o impeachment da presidente Dilma Rousseff, desde as arroladas no processo ora em curso no Senado até as que fizeram do quase finado governo da petista o mais irresponsável e corrupto da história nacional. Mas o voto em separado elaborado pelo PT para se contrapor, na Comissão Especial do Impeachment no Senado, ao parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG) é prova cabal de outro grave delito cometido recorrentemente pelos petistas: o de lesa-inteligência. Em poucas oportunidades, os borra-papéis do partido conseguiram juntar num mesmo texto tão estapafúrdias referências – que vão de Dante Alighieri a Hitler – para reafirmar a tese de que Dilma é vítima de golpe.

Enquanto Anastasia procurou embasar seu parecer em fatos, dizendo que a gestão de Dilma instaurou “um vale-tudo orçamentário e fiscal que trouxe sérias consequências negativas para o País”, os petistas denunciaram que a presidente é vítima de uma conspiração das forças do mal. Para isso, apelaram à mais medíocre literatice, a começar pelo título: Crônica de um golpe anunciado.

Logo nos primeiros parágrafos, denuncia-se que, “na calada da noite, em meio aos odores desagradáveis emanados do fisiologismo político e da hipocrisia moral”, se urdiu, em seguida à reeleição de Dilma, “o golpe que ameaça submergir o Brasil numa longa noite de autoritarismo, conservadorismo, retrocesso social e desconstrução de direitos”.

O texto segue nessa toada embaraçosa, dizendo que, “enquanto os justos dormiam o sono do dever cívico cumprido, os derrotados, com ânimo inconformado e insone, iniciavam sua trama cínica e antidemocrática, apoiados em mentiras, distorções e, sobretudo, num secular desprezo pelo voto popular”. Os “justos”, claro, são Dilma e os petistas – aqueles cuja campanha eleitoral foi irrigada com dinheiro de origem mais do que duvidosa e que mentiram descaradamente nos palanques.

A trama, diz o texto, foi “de tal forma sinistra que poderia ter sido contada por Virgílio a Dante Alighieri e ter como introito a lúgubre frase Deixai toda esperança, vós que entrais! Com efeito, começava ali a nova descida da democracia brasileira aos históricos infernos do golpismo”. Era o caso de mencionar que o oitavo círculo do inferno de Dante é aquele onde os corruptos, hipócritas e falsários são punidos com banho em piche fervente, mas o texto omite essa passagem.

O festival de asneiras prossegue no trecho em que os petistas acusam a oposição de disseminar o ódio contra o partido. Eles não se limitam a citar Mandela: “O ódio é algo que se ensina”. Para a tigrada, a estratégia para incitar a violência contra o PT se assemelha à dos nazistas contra os judeus, “como ensinava Goebbels”. E a luta contra a corrupção é vista como “forma de legitimação de forças ou regimes autoritários”: “Hitler, por exemplo, legitimou em grande parte a sua ascensão no cenário político alemão com o recurso demagogo da ‘limpeza das ruas’ alemãs de judeus, ciganos, comunistas e corruptos”.

Na ladainha, assinada pelos senadores Lindbergh Farias (PT-RJ), Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Kátia Abreu (PMDB-TO), não faltaram nem mesmo acusações de que Dilma sofreu o tal “golpe” por ser mulher – e essa alegada misoginia desrespeitou até “o corpo da presidenta do Brasil”. Homessa!

Para coroar, esse verdadeiro samba do partido doido, que faz referências também a Hannah Arendt, Sófocles, Getúlio Vargas e Carlos Lacerda, termina com uma manjada citação de Marx, evocado para dizer que “é a história que se repete, desta vez como farsa”. A turma aposta que “o julgamento definitivo desse hediondo crime de irresponsabilidade caberá, em instância irrecorrível, à História”. Os “historiadores do futuro”, conclui o voto, vão se debruçar sobre esses episódios e concluir que o impeachment, se ocorrer, terá sido um golpe.

Quando se depararem com esse texto exótico, no entanto, os historiadores do futuro só poderão concluir que jamais um grupo político tão medíocre, arrogante e pretensioso esteve no poder no Brasil.

Saudades de Zé Dirceu - ROSÂNGELA BITTAR

VALOR ECONÔMICO - 03/08

Na reta final do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, as forças políticas, tanto as prováveis vencedoras, como as derrotadas certas, começam a dar espaço à inquietude difusa. Por isso, talvez, deixem aflorar sentimentos menores que, de uma maneira não surpreendente, porém constrangedora, se expressam nos dois lados da luta.

Destacaram-se os condutores do processo, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, e o presidente do Senado, Renan Calheiros. Acertaram uma data para o julgamento final que entra pelo mês de setembro e isso não tem outra explicação racional a não ser atrapalhar a viagem do presidente Michel Temer ao exterior, para estrear no G20. Ontem ensaiaram um recuo, e não se conhece ainda o calendário prevalente.

Além do referendo internacional que o novo presidente do Brasil poderia ganhar nesse encontro (aqui leia-se a obrigatória ressalva da confirmação das previsões na votação do impeachment) Renan e Lewandowski, com sua decisão, impediram também o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, de estrear a cadeira de presidente da República em exercício, em substituição a Temer que não tem vice.

As pressões e contrapressões no Congresso, para aproveitar os estertores do poder de barganha máximo que já tiveram com um governo, revelam desde o exibicionismo tonitroante de alguns relatores de projetos de interesse do governo à arrogância brega de velhos fregueses da fisiologia enraizada.

Mas o máximo da disfunção ainda deve está por vir, correndo ao seu encontro o ex-presidente Lula, a presidente Dilma e os petistas da linha de frente contra o impeachment no Congresso. Esses fazem jus à dramática situação do partido-perdido, o PT, cujo desgaste se torna superlativo nesse fim de jornada. Também estão à deriva, e quem não parou de falar, prefere a inconsequência.

Resolveram retomar as derrotadas teses de golpe na defesa final da presidente e nos votos em separado, além de abraçar a proposta de degola geral e irrestrita que Dilma pretende fazer em carta à Nação, na qual proporá um plebiscito convocando eleições gerais para que deputados, senadores, governadores, presidente interino e quem mais tiver mandato venham ao seu encontro no abismo.

Não se suportam mais sequer as piadas, O advogado da presidente foi levar as alegações finais ao protocolo e soube que, no registro sequencial, a última documentação tinha o número 170. Preferiu não esperar dois minutinhos para entrar alguém com um documento qualquer. Apôs à defesa de Dilma o 171.

Dilma tenta mostrar uma força que não tem, está esticando a corda ao máximo, e o país, suas instituições estáveis, todos, estão tendo uma paciência imensa com a presidente. Ela até parece querer, às vezes, uma reação mais truculenta, talvez para justificar a pirraça e os argumentos do golpismo. Ainda dá tempo?

Dilma resolveu, também, liquidar seu único defensor, o PT, e diante da delação da Andrade Gutierrez que revelou ter sido cobrada por tesoureiros de sua campanha em 2014, a presidente ateou o fogo ao amigo. Ela não sabia, pergunte ao PT.

Mas as empresas não temem quem está fora do poder, e delação é mesmo para dizer a verdade. Assim, nominaram dois de seus braços direitos, Edinho Silva e Giles Azevedo, como os pedintes, tirando-lhe o direito à negação.

No comportamento do ex-presidente Lula, a palavra mais adequada para definir este momento do salve-se se puder é choque. Foi estarrecedor, não só para juristas, acadêmicos, políticos, diplomatas mas, sobretudo para os ainda fiéis e esperançosos no resgate do PT, seu recurso à Organização das Nações Unidas, contra o Brasil.

Lula não está afastado da vida política, como pensam muitos. Foi durante um discurso político que se defendeu, semana passada, do processo por obstrução da justiça, aberto em Brasília. Ao saber do fato, pediu que provassem que o apartamento do Guarujá e o Sítio de Atibaia são dele. Desinformado até sobre o teor da acusação daquele momento, deixou seguir o baile.

Ele pode até não ser candidato em 2018 - ontem assegurou que será - mas tem andado por aí falando ao PT e a quem mais quiser ouvi-lo. Se não for, apoiará algum outro que possa dar nova vida ao partido. Para Lula não tem outra solução, é a política. Ou alguém o imagina em casa, em tempo integral, ou voltando a ser metalúrgico? Continuará político.

Mas passava pela cabeça de um adversário ou mesmo de um aliado que o presidente da República do Brasil por oito anos, que fez a sucessora que governou plenamente por seis anos, portanto 14 longos anos com as rédeas institucionais, tivesse a inacreditável ideia de denunciar o Brasil à ONU por ser um Estado que não garante seus direitos?

Seria esdrúxulo se não fosse muito sério. O que salva a Nação do ridículo maior é que a linguagem da diplomacia filtra tudo. No máximo do máximo, se a ONU julgar procedente a representação de Lula e seus advogados e políticos amigos conselheiros, dirá o quê? "Brasil, envide esforços para...."

Os assessores de Lula e os assessores de Dilma acham que ainda podem enfrentar um cenário desses só no gogó. Quantos petistas têm repetido nas últimas semanas a frase inacreditável: "Ah, que saudades do Zé Dirceu". Está na cadeia, é verdade, mas tinha senso, inteligência, organização, estratégia política, eixo, responsabilidade partidária. Um reconhecimento tardio, no contraste da adversidade.

Michel Temer, o presidente interino, não passou incólume pela tormenta, mas foi quem mais escapou do ridículo. O auge de sua baixa performance, por enquanto, foi ter ido buscar o filho na escola. Francamente, para um garoto de 7 anos, recém-chegado a uma cidade estranha, numa escola bilíngue no meio do cerrado, no primeiro dia de aula, em onde não conhece ninguém e não tem um só amigo, o mínimo era ser buscado pelo pai e pela mãe. Sendo ele presidente interino, deputado distrital ou jovem professor de relações humanas.

Depois, a imprensa não foi convocada, ou obrigada a registrar a cena. Foi porque quis, os personagens não mandam na pauta da imprensa que os registras, é ela que escolhe reportar o que acha que é notícia.

Se Temer ficasse só nisso, então, viva!

Rosângela Bittar é chefe da Redação, em Brasília.

Temer candidato em 2018 - ELIO GASPARI

O GLOBO - 03/08

Se o doutor quer dar um desmentido de verdade, deve repetir a frase do general Sherman, que falava sério


Depois da Guerra Civil Americana, circularam em Washington notícias de que o general William Sherman seria candidato à Presidência dos Estados Unidos. Ele fora o grande comandante da devastação do Sul rebelde, era amado pela tropa e pelo homem da rua. Seria uma barbada. Para encerrar a conversa, Sherman informou: “Nunca fui e nunca serei candidato a presidente; se for indicado, recusarei a candidatura; e mesmo que venha a ser eleito por unanimidade, não assumirei o cargo”.

Depois que o deputado Rodrigo Maia levantou a possibilidade de uma candidatura de Michel Temer em 2018, ele disse que “não cogito disputar a reeleição”. O comentário de Temer e a declaração do general Sherman permitem que se meça a distância que separa quem quer e quem não quer ser candidato. Temer não sabe como chegará a 2018, mas se chegar na condição lembrada por Maia, com “50% de ótimo e bom”, cogitará e será candidato. Afinal, ele disse que não queria o lugar de Dilma Rousseff, bem como Lula e Fernando Henrique Cardoso diziam que não queriam a reeleição. Por enquanto, o Datafolha informa que seu governo tem uma avaliação medíocre. Na faixa do ótimo e bom há só 14% dos entrevistados. Dilma saiu do Planalto com 13%.

Entre os muitos problemas do país está a incerteza em relação aos candidatos que disputarão a Presidência em 2018. O barco da oligarquia política bateu num iceberg e não se sabe quem sobreviverá. Isso enquanto não se conhecem as revelações da OAS e da Odebrecht ao Ministério Público. Se em 2018 Temer tiver os tais 50%, será até bom que se candidate. Resta saber o que seu governo fará na busca dessa mítica aprovação.

Se ela ocorrer, o PMDB (partido de Temer) e o DEM (casa de Rodrigo Maia) terão chegado ao paraíso. Já o PSDB fica numa posição esquisita. Se Temer conseguir os 50%, os tucanos ficarão fora do trono. Caso aconteça um fracasso, o partido será condômino da ruína. Isso tudo e mais a autofagia histórica dos tucanos de carterinha ou de alma. São notáveis políticos, capazes de brigar até mesmo pelo assento de uma cadeira elétrica.

Temer chegou ao Planalto com duas bolas na marca do pênalti da popularidade: a Lava-Jato e Eduardo Cunha. Evitou as duas. Seu apoio à Lava-Jato é cerimonial, e ele se manteve numa imprudente proximidade com o ex-presidente da Câmara. Sua plataforma econômica é apenas uma esperança, com uma agenda que pode trazer qualquer coisa, menos popularidade. Promete austeridade e reformas, mas entrega o velho narcótico do aumento de impostos. O presidente decidiu acorrentar-se a projetos que o obrigam a cultivar uma maioria parlamentar capaz de promover uma série de reformas constitucionais. Cada uma delas requer três quintos dos votos da Câmara e do Senado: 308 deputados e 49 senadores.

A declaração de Rodrigo Maia roçou o óbvio e ainda assim causou um certo desconforto, como se Temer tivesse chegado ao Planalto abdicando de seus direitos políticos. Um cidadão só pode ser impedido de disputar uma eleição se estiver impedido pela Justiça. (O atual governo espera que isso aconteça a Lula.) Não se pode querer que Temer vá ao patíbulo, muito menos se ele tiver um desempenho que justifique seu desejo de permanecer na cadeira.

Elio Gaspari é jornalista

Urgência no parlamento - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 03/08

O Congresso retoma os trabalhos, depois do recesso de julho, com a responsabilidade maior de aprovar as urgentes medidas propostas pelo governo do presidente em exercício, Michel Temer, para a retomada do crescimento econômico. Inicialmente, a aprovação da meta fiscal para 2017 (deficit primário de R$ 139 bilhões para o governo federal) e do teto dos gastos públicos. Ato contínuo, os parlamentares têm pela frente as não menos urgentes discussões sobre as reformas previdenciária e trabalhista, que não podem esperar.

Os senadores e deputados federais muitas vezes se prendem a seus interesses paroquiais, em detrimento dos interesses maiores da República. O grau de instabilidade econômica, política e social é de tal monta que os responsáveis pela aprovação de medidas imprescindíveis para o país reencontrar o desenvolvimento não podem mais protelar a implantação das propostas. Têm de se sensibilizar com o sofrimento da população - mais de 11 milhões de desempregados, inflação descontrolada, queda no poder de compra dos salários, entre outros exemplos - e encaminhar as soluções que a nação tanto reclama.

Os parlamentares devem deixar de lado o jogo de pressão para tirar vantagens na sua relação com o Poder Executivo, demonstrar ter entendido a profundidade da grave crise econômica, e principalmente fiscal, e buscar medidas realistas - amargas também, mas necessárias - para enfrentá-la. Mostrar com o seu voto que não se aproveitam da interinidade do presidente em exercício para barganhar nos moldes da velha e desgastada política do toma lá dá cá. O país não aceita mais que os interesses pessoais de congressistas se sobreponham aos da nação.

A economia já dá os primeiros sinais de recuperação, apesar do histórico índice de desemprego, da alta do custo de vida e previsão do Produto Interno Bruto (PIB) negativo, mas com previsão de uma ligeira melhora. As exportações continuam responsáveis pelo superavit da balança comercial e o índice de confiança do empresariado também tem melhorado.

O Brasil precisa avançar em seus projetos com o apoio do Poder Legislativo e não se tornar refém de interesses menores e inconfessáveis. Dentro dessa perspectiva, senadores e deputados federais devem se preocupar em reverter, o mais breve possível, o atual quadro econômico, político e social. E o início dessa recuperação se dará com a aprovação das medidas encaminhadas ao parlamento pelo governo federal.


Tese do ‘golpe’ e da perseguição a Lula é pulverizada - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 03/08

A conversão do ex-presidente em réu por um juiz de fora de Curitiba, e a partir de denúncia de promotor que não havia criminalizado Dilma, desmonta a farsa


Os tempos já foram mais risonhos para o ex-presidente Lula. Já sob investigação na Lava-Jato, na jurisdição do juiz Sérgio Moro, ele acaba de ser considerado réu por outro magistrado e em Brasília, distante de Curitiba.

Este processo em que Lula está arrolado trata da acusação de tentativa de obstrução da Justiça na manobra, denunciada pelo ex-senador Delcídio Amaral, em que o ex-presidente, diz Delcídio, comandou um esquema para literalmente comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró.

Dessa mesma história participam, entre outros, além do ex-senador, o pecuarista José Carlos Bumlai, amigo de Lula, e o banqueiro André Santos Esteves (BTG).

Lula foi convertido em réu, pela primeira vez, por decisão do juiz da 10ª Vara da Justiça Federal de Brasília, Ricardo Augusto Soares Leite. A má sorte de Lula é que a decisão do magistrado foi revelada quando o ex-presidente formalizava na Comissão de Direitos Humanos da ONU reclamação contra o juiz Moro e o procurador-geral da Justiça, Rodrigo Janot — um ato político.

Virou pó, então, a tese que Lula criou de que haveria uma perseguição dos dois contra ele. O revés na Justiça Federal de Brasília comprova a isenção de Moro e dá uma ideia da consistência das acusações ao ex-presidente.

Além disso, a denúncia contra Lula é encaminhada pelo procurador Ivan Cláudio Marx, o mesmo que não considerou que a presidente afastada, Dilma Rousseff, tenha cometido crime nas pedaladas fiscais (atrasos propositais, para maquiar déficits, no ressarcimento de instituições financeiras públicas que haviam feito pagamentos em nome do Tesouro).

Na visão lulopetista, o Poder Judiciário atuaria de forma tendenciosa, contra petistas, nos processos sobre casos de corrupção. Daí a reclamação na ONU e a tese delirante do “golpe”. Mas também o comportamento do procurador Marx, favorável a Dilma nas pedaladas e contrário a Lula neste caso da obstrução da Justiça, é demonstração cabal de isenção do Ministério Público.

A realidade insiste em desmentir versões cândidas que o lulopetismo propaga para proteger o ex-presidente. Mas como o tempo não para, a Lava-Jato continua a evoluir e a expectativa é que fique cada vez mais evidente que Lula manteve um relacionamento indevido com grandes empresários, com ocultação de patrimônio. A delação premiada de executivos da Odebrecht, com destaque para a de Marcelo Odebrecht, ainda preso em Curitiba, pode acrescentar mais informações ao processo e tornar ainda mais delicada a situação do ex-presidente.

O mesmo vale para Léo Pinheiro, ex-diretor da também empreiteira OAS, que atuou na reforma do sítio que Lula garante não possuir, bem como no tríplex sem dono de Guarujá.

Recado do Brasil a Maduro - EDITORIAL ESTADÃO

ESTADÃO - 03/08

O aventureirismo de Maduro, neste caso com as bênçãos do Uruguai, abriu no Mercosul uma crise que exige solução rápida



A decisão do governo brasileiro de rejeitar, em termos incisivos, a tentativa da Venezuela de assumir a presidência rotativa do Mercosul é um claro recado ao presidente Nicolás Maduro de que seus métodos truculentos são inaceitáveis no âmbito dessa organização. Há muito que se esperava do País esse tipo de atitude para pôr freio ao hábito do regime chavista – cortejado e encorajado pelos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff – de se impor, no grito, a seus vizinhos, em especial os parceiros do Mercosul.

Acostumado a mandar e desmandar em seu país, onde o “bolivarianismo” implantado por seu antecessor e mentor Hugo Chávez não passa de um disfarce caricatural de democracia, que produziu monumental crise em todos os terrenos, Maduro resolveu tratar seus parceiros como trata seu povo. Comunicou aos governos do Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai que, ao fim do mandato deste último – e infelizmente com o beneplácito dele –, a Venezuela assumia a vaga. Limitou-se a argumentar, simplificando grosseiramente as coisas a seu favor, que assim agia “com fundamento no artigo 12 do Tratado de Assunção (que criou o bloco) e em correspondência com o artigo 5 do Protocolo de Ouro Preto”, pelos quais a regra nesse caso é a da rotatividade por ordem alfabética.

Em carta enviada aos países-membros do bloco, o ministro das Relações Exteriores José Serra vai direto ao ponto que interessa, sem meias-palavras: “O governo brasileiro entende que se encontra vaga a Presidência Pro Tempore do Mercosul, uma vez que não houve decisão consensual a respeito do seu exercício no período semestral subsequente”. Posição que coincide com a de seu colega paraguaio, Eladio Loizaga, segundo o qual o Protocolo de Ouro Preto invocado por Maduro estipula que as decisões dos organismos do Mercosul devem ser tomadas por todos os Estados-membros.

Serra lembra também que a Venezuela não cumpriu – como seu próprio governo admite – “disposições essenciais” à sua adesão ao bloco, um cenário que deve ser avaliado detidamente à luz do direito internacional. Essa linha de conduta havia sido traçada, dias antes, pelo presidente em exercício Michel Temer, em entrevista a jornalistas estrangeiros, quando advertiu que o Brasil “não se opõe exatamente a que a Venezuela assuma a presidência, mas pondera que para ser parte integral do bloco há que se cumprir requisitos acordados há quatro anos, que ainda não foram cumpridos”. Em outras palavras: quem não cumpre obrigações assumidas livremente não pode exigir direitos que a elas estão ligados.

A decisão do Uruguai de deixar vago o posto que ocupava – tomada sem levar em conta o que pensavam Brasil, Argentina e Paraguai, que não queriam sua substituição pela Venezuela e pediam prazo para encaminhar uma solução – foi qualificada por Serra, com razão, como “sem precedentes” e um ato que “gera incerteza”.

O que torna ainda mais lamentável a posição adotada pelo presidente do Uruguai, Tabaré Vazquez, que abriu caminho para o oportunismo e a ousadia de Maduro, é que ela foi motivada por razões de política interna, que nada têm a ver com o Mercosul: o desejo de agradar a sua própria base de apoio, simpática ao regime venezuelano, para poder levar avante um indispensável, mas impopular programa de austeridade econômica.

O aventureirismo de Maduro, neste caso com as bênçãos do Uruguai, abriu no Mercosul uma crise que exige solução rápida. Para superá-la, Serra fala em “medidas pragmáticas” e cita como exemplo a proposta argentina de estabelecimento de um mecanismo transitório de coordenação coletiva.

O Mercosul está pagando o preço da infeliz decisão – de viés ideológico, sem levar em conta a realidade política e econômica – tomada em 2012 pelos então presidentes do Brasil, Dilma Rousseff, da Argentina, Cristina Kirchner, e do Uruguai, José Mujica, de aceitar a Venezuela no bloco. Mas pelo menos um passo foi dado para impedir que Maduro tomasse de assalto o Mercosul.