quarta-feira, agosto 03, 2016

Um emprego divino - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 03/08

Se eu não tivesse lido no jornal e conferido com meus próprios olhos no site da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, juraria que é uma piada. Mas não é. A legislação estadual exige que todos os treinos e competições olímpicas sejam monitorados por um salva-vidas certificado pelo Corpo de Bombeiros. Como é algo remota a possibilidade de atletas como Michael Phelps se afogarem na piscina, esses profissionais dificilmente farão mais do que receber um salário para assistir aos jogos de camarote.

Tudo isso não passaria de um exotismo local a ser incorporado ao folclore olímpico, caso a regra não valesse para todas as piscinas de uso coletivo com mais de 6m x 6m fincadas em território fluminense, o que gera impactos não desprezíveis para pequenos condomínios com piscina e mesmo para academias de menor porte. Para fazer sentido e não tornar-se meras sinecuras, propostas legislativas como a do Rio precisam no mínimo considerar o fluxo de banhistas que o equipamento recebe.

Quando alguém decide construir uma piscina ou morar num prédio que tenha uma, opta por expor-se a riscos. Cabe à regulação estatal minorá-los, mas sempre segundo uma análise de custo e benefício e pautada pelo realismo. Obviamente, para fechar a conta é preciso atribuir um valor monetário à vida humana. Muitos consideram isso chocante, mas é inevitável fazê-lo se você vive num mundo cujos recursos são finitos e precisa tomar decisões, como a de reformar ou não a curva de uma estrada que mate x pessoas por ano.

Na verdade, muitas das agências estatais já operam com um preço de tabela para a vida humana, que é dado pelo maior valor que sacrificariam para prevenir uma morte. Raramente os revelam, mas em alguns casos eles são conhecidos. Para a EPA, a agência ambiental dos EUA, ele é de US$ 9,1 milhões (2010). Já para a FDA, a agência de medicamentos, um americano custa menos: US$ 7,9 milhões.


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