Não consigo (nem tento) disfarçar meu pessimismo sobre o futuro do país, em que pese a perspectiva de alguma recuperação à frente.
Não me interprete mal. Acredito que estamos melhores agora do que há alguns meses e muito mais do que estaríamos caso o governo anterior não tivesse sido afastado.
Ao menos temos uma equipe econômica que entende a natureza dos problemas enfrentados pelo país, não só a questão do gasto público mas também a necessidade de reformas que acelerem o crescimento da produtividade. E, embora tenha cá muitas dúvidas sobre a posição de Michel Temer quanto à questão fiscal, caso alguém queira defender que ele compartilha da mesma visão de seu time, eu nem discutiria muito.
Isto dito, até agora, a cada encruzilhada que encontrou, o governo sempre tomou o caminho errado.
O reajuste do funcionalismo pode até ter sido (como foi) negociado pela administração anterior, mas defendê-lo, argumentando que "está abaixo da inflação esperada para o mesmo período" e, portanto, de acordo com o ajuste fiscal, soa como uma tentativa canhestra de tapar o sol com a peneira.
Da mesma forma, não é possível vender como vitória da equipe econômica a meta de deficit de R$ 139 bilhões para o ano que vem, apesar de tentativas em contrário. Para que esse valor se materialize, será necessário obter R$ 55 bilhões de receitas ainda não especificadas que certamente não se repetirão em outros anos, ou seja, o valor recorrente do deficit, que balizará a meta para 2018, será de R$ 194 bilhões.
Acrescentando à lista, agora o governo federal cedeu mais uma vez aos Estados, ao permitir que não contabilizem certos gastos no limite de sua folha de pagamento.
Seria muito fácil descrever isso como resultado de um governo fraco, ainda tentando se consolidar, mas acredito que se trata de um problema bem mais profundo.
Não chegamos aqui por acaso. Como escrevi na semana passada, muito da piora fiscal se deve ao governo anterior, em particular à presidente, que, desde que era ministra, sempre se opôs a medidas que colocassem as contas públicas numa trajetória sustentável. Ela, porém, não esteve sozinha na empreitada de demolir o Orçamento e, ainda mais importante, o próprio arcabouço institucional que havia sido criado para dar um mínimo de previsibilidade nesta área.
Quem acompanha o tema há de ter notado a situação dos Estados brasileiros, esmagados pelo peso de seus gastos com pessoal. Oficialmente, 17 deles estouram o limite prudencial, mas uma especialista como Ana Carla Abrão Costa, secretária da Fazenda de Goiás, estima que gastos com o funcionalismo podem ter ultrapassado 80% da receita líquida, comprometendo qualquer possibilidade de gestão.
Não há como escapar à conclusão: o setor público brasileiro se tornou, há muito, refém de interesses especiais.
Nesse contexto, a chance de se concretizar um ajuste fiscal da magnitude do requerido para estabilizar a dívida relativamente ao PIB é mínima, para colocar de forma delicada.
Assim, muito embora possamos imaginar que a economia comece a se recobrar já na segunda metade deste ano, não há como sonhar com uma recuperação vigorosa como na saída de outras recessões, pelo contrário: o fardo do setor público há de garantir crescimento medíocre ainda por muitos anos.
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