quinta-feira, agosto 20, 2009

MERVAL PEREIRA

O PT sangra


O Globo - 20/08/2009


No mesmo dia em que a senadora Marina Silva anunciou sua saída do PT, depois de 30 anos de militância, por “falta de condições políticas” para avançar na sua luta “de fazer a questão ambiental alojar-se no coração do governo e do conjunto das políticas públicas”, a bancada do PT votou em peso a favor do presidente do Senado, José Sarney, depois de passar pelo vexame de levar um carão público do presidente do PT, Ricardo Berzoini, que fez ler no plenário da Comissão de Ética um documento que desautorizava a orientação do líder Aloizio Mercadante de votar a favor da abertura de um processo sobre os atos secretos

São dois assuntos que se cruzam nesse inferno astral em que vive o Partido dos Trabalhadores, que abandonou seu compromisso com a ética na política há muito tempo e, a cada dia, se torna um simples fantoche nas mão do presidente Lula.

O PT sangra em público, a ponto de um de seus mais destacados senadores, Flávio Arns, ter se confessado ontem “envergonhado” de fazer parte do partido, do qual pretende sair.

O papelão foi completo ontem na Comissão de Ética, a começar pelo líder Mercadante, que foi desautorizado pelo presidente do seu partido e pelos três senadores que votaram a favor de Sarney, e mesmo assim decidiu continuar na liderança, que já não exerce.

Os senadores Delcídio Amaral e Ideli Salvatti, que alegavam não querer votar a favor de Sarney para não se exporem ao veto dos eleitores em 2010, o fizeram envergonhadamente, em voz sussurrada, quase escondidos nas últimas filas do plenário.

O que importa ao presidente Lula não é mais a preservação do partido que ajudou a fundar, mas um projeto político pessoal, no qual o PMDB é mais importante do que o PT.

Eleger a ministra Dilma Rousseff como sua sucessora virou obsessão, e nada o fará entrar em atrito com o PMDB, atrás dos minutos da propaganda eleitoral. O PT, como partido, não tem alternativa, e todos os seus candidatos em 2010 julgam que a presença de Lula em seus palanques fará desaparecer eventuais decepções dos eleitores petistas.

É aí que a candidatura da senadora Marina Silva pode desestabilizar a estratégia lulista, que pretende fazer da eleição de 2010 um plebiscito entre seu governo e a proposta da oposição. Dilma Rousseff entraria nessa equação como simples figuração.

O problema é que Marina aparece como uma alternativa para eleitores insatisfeitos, para uma classe média envolvida na luta ambiental, e a disputa entre ela e a superministra Dilma Rousseff é a luta entre os ambientalistas e a tocadora de obras que, assim como o presidente Lula, se irrita com a preocupação com a preservação dos bagres, que atrasa a construção de hidrelétricas.

Quando anunciou a líder ambientalista Marina Silva como ministra do Meio Ambiente, em 2003, o presidente Lula tratou a escolha como uma mensagem ao mundo de que, a partir dali, a Amazônia passaria a ser tratada de maneira diferente.

Lula saíra de uma campanha presidencial vitoriosa, na qual defendia que o Brasil deveria se preocupar primeiro em matar a fome dos mais pobres, para só então exportar “as sobras”. Era o tempo em que ainda prevalecia no governo a tese de que a agricultura familiar deveria ter primazia sobre o agronegócio.

O Fome Zero desapareceu para dar lugar ao Bolsa Família; as exportações agrícolas são a base principal de nossa balança comercial, e Lula acabou sendo acusado até por “companheiros” como Chávez e Fidel Castro de estar priorizando os biocombustíveis em detrimento da produção de alimentos, o que provocaria a alta do preço internacional da comida.

O substituto de Marina, o verde Carlos Minc, foi escolhido porque, além de se dar bem com a superministra Dilma Rousseff — foi seu companheiro no tempo da luta armada —, o governador Sérgio Cabral elogiou para o presidente Lula a maneira “moderna” com que ele lidava com a questão ambiental no Rio.

A saída de Marina, por discordar do modelo de desenvolvimento, foi vista no mundo como um sinal de que o governo Lula virava as costas para a maior defensora da Amazônia, com o dizia na ocasião o jornal espanhol “El País”, talvez o mais importante da Europa atualmente.

A última derrota de Marina foi consequência da decisão do presidente Lula de entregar ao então ministro de Planejamento Estratégico, Mangabeira Unger, o Plano da Amazônia Sustentável (PAS), o que a fez deixar o Ministério do Meio Ambiente.

A MP 458, apelidada pelos ambientalistas de “a MP da Grilagem”, que caiu como uma bomba entre os ambientalistas do mundo inteiro, é a operacionalização das ideias contidas no PAS.

A Climate Action Network (CAN), uma reunião internacional de organizações não governamentais que promove ações para reduzir a níveis “ecologicamente sustentáveis” as ações humanas que provocam a mudança climática, soltou um documento criticando o governo brasileiro.

A lei permite a legalização de 67,4 milhões de hectares de terras públicas da União na Amazônia, até o limite de 1.500 hectares. Empresas que ocuparam terras públicas até 2004 também teriam direito às propriedades. Pressões fizeram com que o governo vetasse, na totalidade, o artigo 7º da medida e o inciso II do artigo 8º que tratavam da transferência de terras da União para as pessoas jurídicas e para quem não vive na Região Amazônica.

Mas outros vetos, como à possibilidade de venda dos terrenos no período de dez anos após a regularização, ou ao artigo que prevê apenas uma declaração do ocupante da terra como requisito suficiente para a regularização fundiária, não foram feitos por Lula.

A ida de Marina Silva para o PV deve ter como consequência a saída do partido da base aliada do governo.

PANORAMA POLÍTICO

Pragmatismo

Ilimar Franco
O Globo - 20/08/2009


O PV vai incluir em seu estatuto uma “cláusula de consciência”, permitindo aos filiados adotarem posições conflitantes com o programa partidário por razões de convicção religiosa. Fará isso para se ajustar à sua pré-candidata a presidente da República, senadora Marina Silva (AC). Ela é evangélica e contra a legalização do aborto. O PV também vai ampliar a Executiva. Marina vai indicar dez nomes. A filiação será na convenção nacional do dia 30.

PMDB ameaça obstruir votações

O PMDB da Câmara ameaça não votar mais nada até o governo liberar as emendas parlamentares ao Orçamento.

Foram liberados apenas R$ 1 bi de R$ 5 bi previstos. O líder Henrique Alves (RN) bateu duro ontem na reunião da bancada.

O ministro José Múcio tratou do assunto com o presidente Lula. Para a bancada, Henrique criticou projeto de lei de crédito extraordinário de R$ 77 milhões para o Ministério das Relações Exteriores. “Destinam recursos para a nobre função social de aquisição de imóvel para a Embaixada do Brasil em Londres e não há dinheiro para pagar as emendas”, disse. Os projetos do pré-sal vêm aí.

"Vossa Excelência é passado na casca do alho” — Heráclito Fortes, senador (DEM-PI), elogiando o presidente do Conselho de Ética, senador Paulo Duque (PMDB-RJ)

PROTESTO. Com o arquivamento da representação contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o líder do DEM, Agripino Maia (RN), decidiu: "Vou propor à bancada que o partido se retire do Conselho de Ética". A proposta foi defendida pelo presidente do DEM, Rodrigo Maia (RJ), quando o deputado Edmar Moreira foi absolvido na Câmara. Lá, o líder Ronaldo Caiado (GO) resiste, teme que o gesto seja visto como omissão.

O nome

Recomendação do presidente Lula sobre a nova estatal do petróleo. A empresa não se chamará Petrosal.

Seu comentário: “Petrosal lembra dinossauro. O Roberto Campos toda vez que criticava a Petrobras a chamava de Petrossauro”.

Nova CPMF

O ministro José Temporão (Saúde) acertou ontem com seu partido, o PMDB, a conclusão da votação da Emenda 29. Falta votar na Câmara destaque que cria a Contribuição Social para a Saúde, exclusiva para o setor, com alíquota de 0,10%.

É a volta do cipó de aroeira...

Com essa, a oposição não contava. Seus integrantes anunciaram intenção de recorrer ao plenário do Senado contra o arquivamento da representação para investigar o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Ocorre que, na gestão Garibaldi Alves (PMDB-RN), a oposição aprovou resolução vedando recurso ao plenário das decisões do Conselho de Ética. Fizeram isso porque o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL), duas vezes recorreu ao plenário contra decisões do Conselho.

Tarso cobra aplicação de recursos

Preocupado com a execução do Pronasci, o ministro Tarso Genro (Justiça) enviou carta para 58 prefeitos e oito governadores, pedindo informações sobre o andamento dos convênios.

Em todos os casos há pendências: não usaram a verba repassada ou não responderam ao monitoramento da FGV. O valor pendente é de R$ 456,4 milhões.

Na carta, Tarso adverte prefeitos e governadores: “Tais pendências implicam a não designação de novos recursos”.

QUAL O PRÓXIMO PASSO? Fala o presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE): “Matar a (candidatura) Dilma (Rousseff)”

QUAL A AVALIAÇÃO? Diz o líder do PMDB, Renan Calheiros (AL): “Deu tudo errado para eles (oposição). O Lula e a Dilma (Rousseff) defenderam o (José) Sarney. A popularidade do Lula não caiu, a Dilma ficou como estava, e o (José) Serra caiu”.

O QUE FAZER? Reage o senador Flávio Arns (PT-PR): “Este não é o PT no qual eu me filiei. Vou sair do PT”.

ILIMAR FRANCO com Fernanda Krakovics, sucursais e correspondentes

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COISAS DA POLÍTICA

O mestiço e o americano

Mauro Santayana
Jornal do Brasil - 20/08/2009

Ao considerar justa a guerra contra o Afeganistão, o presidente dos Estados Unidos reafirma a velha política imperialista de seu país, iniciada com a agressão ao México, em 1846. Muito pode ter mudado com um presidente mestiço, mas nada mudou com o presidente americano em relação ao mundo. Quando um povo é diretamente agredido – como fomos, em 1942, com o ataque a navios mercantes brasileiros por submarinos alemães na costa de Sergipe – mais do que seu direito é seu imperioso dever responder ao ataque, qualquer que seja a correlação de forças. Churchill observou que é melhor defender-se com as armas do que curvar-se a ultimatos ou aceitar acordos humilhantes, como os impôs Hitler a seu antecessor Chamberlain, em Munique, contra a Tcheco-Eslováquia: os que resistem são mais respeitados pelos vencedores, mesmo que percam a guerra. Não têm sido assim os Estados Unidos, como vimos no Vietnã e no Iraque e estamos vendo no Afeganistão.

Ao avançarem rumo ao Oeste, fazendeiros norte-americanos ocuparam, pouco a pouco, o Texas, que pertencia ao México, e declararam a independência do território. Para garanti-la, os americanos moveram guerra ao México, em 1846, e se apoderaram de 1,3 milhão quilômetros quadrados de seu território. Dispondo de tecnologia militar avançada, não lhes foi difícil expandir o domínio sobre os territórios vizinhos, e compraram com dinheiro o que não podiam conquistar com as armas, como o Vale do Mississipi, adquirido dos franceses, e o Alasca, comprado do Império Russo.

Reconheça-se nos anglo-americanos – que só se desentenderam quando da independência dos Estados Unidos e, de forma episódica, na little war de 1812 – visão estratégica de longo alcance. Logo que se descobriu no petróleo a fonte promissora de energia, a Inglaterra e os Estados Unidos se mobilizaram a fim de controlar os mananciais do Oriente Médio. No início do século passado, com a produção em série de automóveis, a cobiça pelo óleo que encharcava as areias da Península Arábica e do Golfo Pérsico se intensificou. Por detrás da disputa entre a Áustria e a Sérvia, os alemães pretendiam seu quinhão de petróleo naquela área, e buscavam fortalecer os seus laços com os otomanos, que a controlavam politicamente. Para combatê-los, Londres enviou à região o coronel Thomas Lawrence, o famoso guerrilheiro Lawrence da Arábia.

Toda a política internacional do século 20 teve como eixo o problema da energia, o primeiro e mais importante fator de produção, o mais importante insumo da vida. Como nos ensinam os compêndios elementares de física, a matéria é apenas um comportamento da energia. Essa é a razão da declaração de Obama, de que permanecerá no Afeganistão até derrotar os “terroristas”. Para assegurar apoio popular a essa decisão, o presidente usa o mesmo argumento de seu antecessor Bush: a necessidade de proteger a sociedade norte-americana contra os que foram capazes de atingir o símbolo de seu poder, ao destruir as torres de Manhattan. Mas, ainda que Bin Laden fosse o atacante, com isso nada teria o povo afegão.

É também o petróleo (mais do que as drogas) que explica os acordos militares com a Colômbia. Um dos mais argutos conhecedores e analistas da política internacional, o professor Moniz Bandeira, tratou do assunto em artigo recente. Washington se preocupa com o governo de Caracas e, ao assegurar e aumentar a produção colombiana, exercem pressão diplomática e militar contra Chávez, a fim de continuarem importando o óleo dos ricos poços venezuelanos.

Sempre estivemos advertidos do risco que corremos com a descoberta dos imensos depósitos de petróleo no profundo subsolo marinho abaixo da camada de sal. O petróleo não é apenas um negócio. É o mais grave problema estratégico do mundo, e deve estar sob o rígido controle do Estado. Já que o governo anterior comprometeu a Petrobras, com sua política antinacional, é necessário preservar o novo e mais profundo lençol petrolífero, com a criação de nova empresa, sob o controle total do povo brasileiro, mediante o Estado Nacional. A CPI da Petrobras procura impedir que a nova empresa se forme. Repete-se o mesmo cerco ao interesse nacional nos anos 50, quando pretendiam frustrar o desenvolvimento da grande empresa, hoje a maior do país. A prudência recomenda o fortalecimento das Forças Armadas, a fim de que não sejamos compelidos a aceitar ultimatos, nem acordos que reduzam a nossa soberania, como os está aceitando o governo de Bogotá.

ARI CUNHA

Situação difícil


Correio Braziliense - 20/08/2009


Não foi simples como parecia. A visita da ex-secretária da Receita Federal à ministra-chefe da Casa Civil não foi tão simples como parecia. Chegando ao Senado às 8h30, Lina Vieira, com paciência, respondeu até a tarde. Questionada pela tropa de choque do governo, manteve-se calma e respondia a todos. A tropa não deu certo. Trabalhava para tumultuar. Não surgiu de parte do governo quem pensasse em entendimento. Lina rejeitou as provocações, e plácida se esquivou do que poderia ser crime perante a lei. Pelo visto, o assunto piorou. Apareceram outras coisas que terão consequências. Para quem pensava que o assunto terminava aí, a decepção. A coisa toma rumo que pode chegar às eleições.

A frase que não foi pronunciada


“Enquanto isso, vou cantando e andando.”
»Gilberto Gil, pensando em aceitar ser vice de Marina Silva


Cuidado dos DA

  • Grupo de funcionários especializados está acompanhando o que se passa no jornal para prevenir contra a gripe A H1N1. Nos departamentos, é distribuído gel para assepsia. Atendimento a toda hora. Até os móveis recebem cuidados. A ideia provém de uma mãe de família, que começou a ser posta em prática na residência em Belo Horizonte. Façamos justiça a dona Nazaré Teixeira da Costa.

    Defesa da TIM
  • A concessionária TIM não tem nada a ver com notícia aqui publicada incriminando empresas sobre contrato de call center. Comunica não ter interesse em prejudicar concorrentes. Informa, porém, que não participa desse conglomerado.

    CBN
  • Trabalho jornalístico profissional foi realizado pelos repórteres da CBN. Antes da reunião do Senado falaram com senadores indagando opinião sobre caso de Dilma Rousseff e Lina Vieira. Está no site a gravação com opinião de todos. Acessando a internet, ouvintes conhecerão o pensamento de antes da reunião.

    Novidade
  • Seguiu para a Câmara dos Deputados projeto da senadora Lucia Vânia com mudanças na forma de classificação de propriedades agrícolas destinadas à reforma agrária. Entre outras ideias, a senadora dá ao Congresso Nacional competência para classificar e aprovar os indicadores que apontem o rendimento da atividade agrícola. Outra novidade é que o parlamento será responsável por classificar as terras como improdutivas ou não.

    Errata
  • Notícia publicada nesta coluna sobre o BRB não procede. O Banco do Brasil fez, isto sim, convênio com o Banco Votorantim. O maior banco do Brasil tem ativo de R$ 600 bilhões e a maior base de clientes — 53,8 milhões.

    Melhores
  • Nada como a crise americana no que tange à saúde pública para que o brasileiro se dê conta de que o Sistema Único de Saúde é um ganho do cidadão. Mesmo com as reclamações de filas imensas ou falta de médicos, a verdade é que também há socorro e atendimento. O SUS completou 20 anos. É hora de reconhecer para não lamentar depois: “Eu era feliz e não sabia.”

    Tecnologia
  • Rápido e eficaz. Desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Pernambuco, já há um método que identifica o vírus H1N1 em apenas cinco minutos. A pesquisa foi conduzida pelo professor Celso Melo, que aguarda aprovação da Anvisa. A equipe já estudava um diagnóstico mais rápido para a dengue e HPV.

    Prevenção
  • Grandes empresas de laticínios serão obrigadas a divulgar eletronicamente o resultado de análises laboratoriais. O que o senador Perillo quer em seu projeto é que o consumidor não seja surpreendido com alta taxa de amônia no leite UHT. O texto vai passar pela comissão de Agricultura e Assuntos Sociais.

    Autoestima
  • Destaque para o Cras (Centro de Referência de Assistência Social). O projeto do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome é a resposta do ministro Patrus Ananias aos críticos do Bolsa Família. Pouco divulgado, o Cras dá à população a oportunidade de trabalho e conhecimento. Não é o peixe, é a vara.
  • História de Brasília


    O prefeito nomeado mandou fazer um levantamento do funcionalismo da prefeitura de Taguatinga. Encontrou 220 funcionários, sendo que apenas 30 trazem em dia o serviço daquela cidade-satélite.(Publicado em 5/2/1961)

    PT NEWS


    MÍRIAM LEITÃO

    O primeiro passo


    O Globo - 20/08/2009


    Marina deu o primeiro passo. Faltam muitos, é uma longa caminhada. A senadora conhece longas caminhadas. O quadro eleitoral já mudou. A eleição deixou de ser plebiscitária, tende a ser uma eleição mais fragmentada, e a senadora obrigará os outros candidatos a terem ideias e propostas para uma questão central que é a conciliação entre meio ambiente e desenvolvimento econômico.

    Por enquanto, a eleição de 2010 sofre de várias esquisitices.

    A primeira delas é que o candidato que está na frente em todas as pesquisas de intenção de voto, o governador de São Paulo, José Serra, ainda não disse se é candidato, e seu partido tem dois virtuais concorrentes: ele e o governador de Minas, Aécio Neves.

    No cenário — apurado pelo DataFolha — em que Serra aparece, o partido fica com 36% dos votos; no cenário no qual concorre Aécio, o partido tem 15%. Mas eles não decidem, não debatem, não fazem primárias. Continuam misteriosos, com conversas de cardeais, articulações intramuros, no estilo tucano. Quando Serra não é candidato, sobem Dilma, Ciro e Heloísa, e até o percentual de indecisos sai de 18% para 24%.

    A segunda esquisitice eu disse aqui ontem: a maneira como a ministra Dilma Rousseff foi escolhida candidata lembra o “dedaço” da época em que o PRI era partido único no México. O presidente em exercício é que dizia quem era o candidato a concorrer para o período seguinte. O PT até hoje teve apenas um candidato, essa seria uma oportunidade de renovação se a escolha fosse aberta e democrática.

    Quem sabe assim, o partido conseguiria olhar de frente para toda aquela sujeira que varreu para debaixo do tapete nestes tempos de governo, especialmente após o mensalão.

    O candidato Ciro Gomes tentava ser uma terceira via entre governismo e oposição, mas ao longo dos últimos anos esteve tempo demais do lado do governo, como ministro. E antes de Marina aparecer na cena, até ele achava que a eleição não seria plebiscitária. A candidata Heloísa Helena, mesmo estando longe do cenário nacional, permanece oscilando entre 12% e 17% das intenções de voto, dependendo de quem é o candidato tucano.

    Marina apareceu com 3% em qualquer cenário, mas isso após ela apenas aventar a possibilidade de concorrer.

    Ontem, ela saiu do PT e tem pela frente mais dois eventos nos quais estará no palco: o momento de se filiar ao PV; o momento de assumir a candidatura.

    Ela definiu ontem posições importantes: ter a sustentabilidade como centro de um projeto de desenvolvimento; acolher as melhores práticas e experiências das empresas, academia e organizações; não deixar o Brasil atrasado em relação ao debate que ocorre no mundo; aproveitar as chances de o Brasil ser uma potência ambiental.

    Posto assim, Marina não se coloca como uma candidata temática, mas sim faz com que o tema das mudanças climáticas — que cresceu tanto nos últimos anos e continuará crescendo, digam os céticos o que disserem — seja o novo paradigma no qual se organize um programa para disputar as eleições.

    Marina tem um enorme caminho a seguir para sair dos 3%, ser uma candidata viável e evitar o perigo de ficar à margem do processo.

    Para ser competitiva, precisa de ferramentas que o PV não tem: tempo de televisão, partido com estrutura e capilaridade no país. Ela sabe disso. Por isso, comparou o ato de ontem com aquele momento, quando aos 16 para 17 anos saiu de casa para ir, analfabeta e doente, se tratar e estudar. Ela tinha ficado um ano muito mal. Já tinha tido malária, mas contraíra hepatite. Mal diagnosticada, sua hepatite foi tratada com remédio de malária e ela quase morreu. Ao emergir disso, decidiu sair de casa e ir para uma cidade maior para estudar, trabalhar, se tratar. Objetivamente, que chance tinha aquela menina do seringal Bagaço? Marina está preparando propostas que vão além da luta de classes que moldou o PT original. Acha que a defesa do meio ambiente não comporta recorte de classes. Está convencida de que algumas empresas já se deram conta da profundidade do tema e querem uma proposta que não é de ruptura com a velha ordem, mas de transição para uma nova ordem. Acredita que as empresas que não entenderam ainda entenderão quando o carbono for taxado no mundo. Não acha que a questão ambiental seja uma bandeira monotemática.

    Para ela, o que vai propor é um novo paradigma, uma nova forma de tratar cada uma das questões que compõem um programa partidário.

    Ideias ela tem e erra quem subestimar sua capacidade de organizá-las em um discurso contemporâneo e sedutor.

    Ao entrar no jogo, obrigará os outros candidatos a terem programa também. Me lembro que na última campanha eleitoral eu perguntei ao candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, numa entrevista neste jornal, qual era o programa dele. Ele me respondeu que o documento estava quase pronto e sairia na semana seguinte, em fascículos.

    Faltava uma semana para a eleição. Esse tipo de improviso não será mais possível, a partir da entrada da senadora Marina em campo.

    Os outros candidatos terão que se esforçar mais, pensar mais, aprofundar-se, rever estratégias.

    Tudo isso torna a disputa mais interessante, com mais conteúdo e bem mais indefinida. Tudo isso é bom para a democracia.

    GOSTOSA


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    DEMÉTRIO MAGNOLI

    Um conto de duas subversivas


    O Globo - 20/08/2009

    Dilma Rousseff e Lina Vieira são subversivas, mas em tempos diferentes. Dilma rebelouse contra a ordem no passado, usando a mentira factual para combater a verdade de um poder ilegítimo.


    Lina insurge-se contra a ordem no presente, usando a verdade factual para desmascarar a mentira de um poder legítimo, mas abusado.

    Ano passado, o senador Agripino Maia sugeriu que as mentiras contadas pela jovem Dilma nos porões indicariam uma propensão da ministra a mentir ao Senado sobre o dossiê elaborado na Casa Civil contra Ruth Cardoso.

    A resposta da ministra cortou o ar como a espada de um samurai: “Diante da tortura, quem tem dignidade fala mentira. Aguentar tortura é dificílimo.

    Me orgulho de ter mentido porque salvei companheiros da mesma tortura e da morte.” Agripino Maia iniciou sua carreira política na Arena, o partido situacionista na ditadura militar. A sua pergunta infeliz à ministra evidenciou a persistência de um desvio de princípio.

    Nas democracias, diante das autoridades policiais e judiciárias, um acusado tem o direito de calar para não se incriminar.

    Desse direito decorre o direito sagrado à mentira diante dos torturadores.

    Ele devia saber disso.

    A resposta da ministra não foi submetida ao crivo da crítica, em virtude de sua carga emotiva. Mas ela estava errada ao justificar a mentira por meio da sua finalidade útil. A jovem Dilma pertenceu à VAR-Palmares, uma organização que se enxergava como vanguarda do proletariado e ferramenta de uma história em rota rumo ao porto do socialismo. A mentira nos porões servia não só para salvar companheiros, mas sobretudo para preservar a organização revolucionária. Mas essa justificativa política e moral da mentira só funciona no universo lógico do militante que pensa possuir a chave mágica de um futuro redentor.

    A lógica da militante está presente na resposta da ministra. Ela podia ter dito que mentiu porque os que a interrogavam não tinham nenhum direito de fazê-lo. Mas preferiu dizer o que disse — e sua escolha tem significado.

    Justificar a mentira pela sua utilidade política é abrir uma senda perigosa, que desconhece a fronteira entre a ditadura e a democracia. Sob a lógica utilitária, Lula poderá um dia dizer que alegou nada saber a respeito do mensalão a fim de preservar um governo devotado a salvar o povo da “elite que manda no Brasil há 500 anos”. No mesmo diapasão, Antonio Palocci pode confessar, no futuro, que determinou a quebra do sigilo bancário de uma testemunha com a finalidade de conservar a racionalidade de uma política econômica contestada no núcleo do PT. E, como cada um elege valores segundo critérios de consciência individual, José Sarney fica moralmente autorizado a esclarecer, amanhã, que mentiu sem parar sobre os atos secretos do Senado para proteger os interesses de seus filhos, primos, sobrinhos, afilhados e netos...

    Lina converteu-se em perigosa subversiva ao assumir o cargo de secretária da Receita Federal. O seu gesto de insurgência consistiu em cumprir a lei — ou seja, conferir tratamento igual a todos os contribuintes. A adesão à lei representa uma corajosa ruptura com a norma, num tempo em que o princípio da impessoalidade na administração pública experimenta uma baixa sem precedentes.

    No Brasil de Lula, elaboram-se teorias sobre as virtudes da distinção. As universidades, em nome da justiça social, selecionam candidatos segundo a cor da pele (na prática, muitas vezes segundo o alinhamento ideológico a ONGs do movimento negro). O governo, em nome da projeção externa de uma empresa nacional, muda a lei de telecomunicações de modo a favorecer os empresários que financiaram a fundo perdido os negócios do filho do presidente. O próprio Lula declara que o ex-presidente no comando do Senado, hoje seu aliado político, não deve ser escrutinado como uma pessoa comum. Sobre essa tela de fundo, o gesto de Lina equivale a uma conclamação revolucionária.

    Conheço uma professora universitária que se esqueceu de lançar no imposto de renda uma receita simbólica, de umas centenas de reais, pela participação eventual numa banca de doutorado. Anos depois, a falha valeulhe uma cobrança da Receita que, acrescida de multa e juros, importava em milhares de reais. Quando Lina resolveu que grandes empresas privadas (leia-se: generosos financiadores de campanhas eleitorais) mereciam abordagem similar, chegaram à imprensa rumores de que a secretária havia se cercado de “sindicalistas”, aparelhando o órgão.

    No passo seguinte, Lina impugnou uma manobra contábil da Petrobras que “economiza” o pagamento de bilhões em impostos. A ousadia de mexer com a estatal intocável, um ícone da pátria no panteão do nacionalismo de araque, selou-lhe a sorte. A máquina de difamação disseminou um diagnóstico de incompetência da secretária, que seria a responsável pela inevitável queda na arrecadação no curso do ciclo recessivo. Por ordem do Planalto, a subversiva foi demitida.

    A imprensa apurou que, na trajetória da insurreição, os caminhos de Dilma e de Lina se cruzaram. A ministra teria solicitado uma reunião sigilosa com a secretária, na qual pediu o célere encerramento de uma investigação fiscal da família Sarney. Lina confirmou a história, oferecendo sua palavra como garantia. Dilma negou a existência da própria reunião.

    Mais uma vez, tudo gira em torno da verdade factual. A ministra podia ter dito que sim, se reuniu a sós com Lina, porém não pediu que tratasse Sarney como um homem incomum.

    Mas escolheu um caminho que faz da existência da reunião uma comprovação lógica de que existiu também o pedido. Agora, surgiu uma testemunha ocular do agendamento da reunião: chama-se Iraneth Weiler e (ainda) ocupa a chefia de gabinete do secretário da Receita. É uma prova de crime e caberia a Dilma refutá-la factualmente.

    A não ser que ela pense mesmo que o valor da verdade se mede pela sua utilidade.

    BRASÍLIA - DF

    Fechando a porta


    Correio Braziliense - 20/08/2009




    Os governistas resolveram enterrar a chamada “janela da infidelidade”, que abria um prazo de 30 dias para o troca-troca partidário um ano antes das eleições. A proposta de emenda constitucional com esse objetivo, de autoria do deputado Sílvio Costa (PMN-PE) — que está deixando a legenda para embarcar no PTB —, caiu no buraco negro dos projetos sem previsão de votação. Outra emenda, de autoria do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que pretendia reduzir o prazo de filiação para seis meses antes da eleição, nem sequer foi apresentada.

    O presidente da Câmara, Michel Temer (PMDB-SP), e os líderes dos partidos governistas avaliam que não há tempo para uma mudança constitucional dessa natureza, que precisa ser aprovada um ano antes das eleições. No fundo, porém, a preocupação é outra. A “janela” foi arquitetada para desidratar os partidos de oposição na sucessão de 2010, mas armou-se um cenário nebuloso no campo governista. Com três prováveis candidaturas presidenciais — Dilma Rousseff (PT), Ciro Gomes (PSB) e Marina Silva (sem partido) —, ninguém sabe como será o realinhamento de forças na base de apoio de Lula. A mudança seria um eventual passe livre para dissidentes e mal-acomodados em todas as legendas da base.

    Troco// Rebelados contra o governo, os líderes da base fecharam acordo, ontem, para rejeitar uma mensagem do Executivo que pedia a retirada de pauta de dois projetos que tratam da regulamentação da prestação de serviços terceirizados. Sem nenhum efeito prático, o gesto foi um recado para o Palácio do Planalto.

    Carola

    Uma ala do PT comemora a saída de Marina Silva da legenda. Ela era considerada um estorvo ao desenvolvimento da Amazônia pelo presidente Lula e pela ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, por causa das suas posições sobre a questão ambiental, um dos obstáculos às grandes obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) na região. Além disso, Marina é evangélica. Defende teses criacionistas contra o aborto, as pesquisas com células-tronco e o casamento gay.

    Inferno

    A vida de Aloizio Mercadante (SP) no PT está cada vez mais difícil. Ontem, por causa de Delcídio Amaral (MS), aliado do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o petista colocou o cargo de líder à disposição da bancada, mas sete dos 10 senadores petistas decidiram mantê-lo na função. Para completar o inferno astral, a cúpula da legenda começa a questionar o fato de não se candidatar a governador de São Paulo, abrindo a vaga ao Senado para a ex-prefeita de São Paulo Marta Suplicy (PT).

    Mídia

    Depois de passar duas tesouradas nos recursos destinados à Conferência Nacional de Comunicação, o Executivo recompôs a dotação inicial do encontro, proposta do próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A organização do evento contará com R$ 8,3 milhões

    Bode


    Sobraram para o ministro do Esporte, Orlando Silva (foto), as reclamações de deputados da base sobre o cancelamento das emendas parlamentares. Aliados aprovaram, ontem, a convocação de Orlando à Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara para dar explicações sobre “a baixa execução orçamentária” em sua pasta.



    As batatas

    “Ao vencedor, as batatas”, como diria Machado de Assis. Foi com uma delas na mão que o senador Flávio Arns (foto), do PT paranaense, anunciou à apresentadora do Pânico na TV!, Sabrina Sato, da RedeTV!, que está deixando a legenda do presidente Lula. Acusa o PT de rasgar a página da ética de seu estatuto.

    X-tudo

    Recheado de enxertos, o parecer do deputado Sandro Mabel (PR-GO) para a MP 462 — que libera recursos para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM) — recebeu o apelido de “relatório Babel”, em referência à alegoria bíblica da torre que leva o nome. A matéria recebeu penduricalhos que nada têm a ver com seu objeto principal, a ajuda federal de R$ 1 bilhão para os municípios.

    Taxa Temporão

    A bancada do PMDB na Câmara dos Deputados selou acordo ontem para apoiar a votação da proposta que recria a Contribuição Social da Saúde (CSS) no início de setembro. A emenda à Constituição prevê uma injeção de R$ 15 bilhões extras ao orçamento da pasta do ministro José Gomes Temporão, que aproveitou o clima criado pela gripe suína para tentar ressuscitar o antigo imposto do cheque.

    Arbitragem/ A OAB-SP promove amanhã o I Seminário Internacional de Mediação e Arbitragem. A cerimônia de abertura contará com a presença do senador Marco Maciel, que será homenageado por ser o autor da Lei nº 9.307/96, graças à qual disputas comerciais e ações trabalhistas são resolvidas por acordo entre as partes.

    Posse/ Novo presidente da BR Distribuidora, o engenheiro químico José Lima de Andrade Neto toma posse hoje. Indicado pelos caciques do PMDB, substituirá o ex-senador sergipano Eduardo Dutra, candidato a presidente do PT.
    Transparência/ A Fundação Universitária de Brasília (Fubra/FGI) prepara projeto para difundir e aprimorar ações de controle na gestão de recursos públicos pelas fundações de apoio das universidades, em conjunto com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (UNODC). A Fubra/FGI já implantou um Sistema Integrado de Gestão e Governança (SIGG) que permite total transparência na gestão dos recursos aportados perante à fundação.

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    AUGUSTO NUNES

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    Eles fugiram da escola, escaparam da cadeia e agora mandam no Senado


    Parece que foi há muitos séculos, e no entanto faz menos de 20 anos. No começo de 1990, já não era numericamente desprezível o bloco dos senadores que merecem longas temporada na cadeia, em regime de estudos forçados. Mas havia vida inteligente e homens de bem no Senado. Os melhores e mais brilhantes conseguiam, simultaneamente, enquadrar os imbecis sem remédio, manter os delinquentes sob estreita vigilância, conduzir a instituição e garantir-lhe a independência. Sobretudo, cuidavam de erradicar de imediato tumores que ameaçassem valores morais irrevogáveis. Nada a ver com a Casa do Espanto que Lula criou em parceria com o clube dos cafajestes.

    É improvável que o presidente tentasse fazer em 1990 o que anda fazendo há meses com um Senado em estado de decomposição. Mesmo que tivesse atingido os 103% de popularidade prometidos pelos institutos de pesquisa, logo saberia com quem estava falando. O mais loquaz dos governantes perderia a fala no segundo minuto de conversa com Afonso Arinos ou Roberto Campos. O capitão-do-mato não iria além da primeira ordem se o aliado fosse Darcy Ribeiro. O palanqueiro debochado não se atreveria a insultar oposicionistas como Mário Covas ou Franco Montoro.

    É por saber com quem está falando que Lula humilha antigos companheiros. Sabujice não inspira respeito. Ofende adversários por ter certeza de que o merecido revide não virá. É por conhecer os novos amigos de infância que abençoa toda a base alugada com salvo-condutos, absolvições, agrados retóricos e presentes em dinheiro. Não existem acordos políticos entre partidos distintos. Existe um acerto a ser cumprido pelas partes, um contrato verbal entre o chefe do Executivo e parlamentares que enxergam na aliança com o governo o caminho mais curto e seguro para o enriquecimento criminoso.

    Quem acompanhou na terça-feira o depoimento de Lina Vieira e, nesta quarta, a sessão do Conselho de Ética viu em ação um bando fora-da-lei, esbanjando truculência e cinismo no cumprimento de missões determinadas pelo chefe. Os vilões dio faroeste se apoderaram do lugarejo. O presidente honorário é José Sarney. Paulo Duque comanda o Conselho de Ética. Romero Jucá lidera a bancada do governo e é o relator da CPI da Petrobras presidida pelo suplente amazonense. Renan Calheiros chefia a base alugada. Fernando Colllor comanda uma comissão. Abjeções como Wellington Salgado e Almeida Lima aceitam qualquer encomenda. Tudo parece dominado.

    O PT foi reduzido por Lula a duas consoantes descartáveis. A líder do governo no Congresso é Ideli Salvatti, um berreiro à procura de uma idéia. O líder da bancada é Aloízio Mercadante, promovido a Herói da Rendição por sucessivas demonstrações de coragem em atos de covardia. Nesta semana, constatou-se que aprendeu com Eduardo Suplicy a fazer de conta que acha intragável o que não para de engolir.

    Simulando descontentamento com a absolvição sumária de Sarney, colocou o cargo à disposição da bancada. O cargo sempre está à disposição da bancada. Quem finge que não sabe disso está implorando para ficar. Quem quer sair se demite ─ e em caráter irrevogável. Por acharem que a cafajestagem passou dos limites, os senadores Flávio Arns e Marina Silva deixaram o partido. Todos os que permanecerem submissos à quadrilha serão responsabilizados pelo assassinato do Senado.

    A contemplação do Congresso ensina que, além dos cretinos fundamentais, só farsantes dividem o Brasil em esquerda e direita, povo e elite. O que se vê é um país decente ameaçado pela ofensiva do bando que junta socialistas de araque e conservadores gatunos, casos para psiquiatra e casos de polícia, todos convencidos de que só é imoral perder o poder.

    É hora de bloquear o caminho. O general parece invencível? A tropa parece crescer em tamanho e agressividade? A maioria parece satisfeita com a vida não vivida? Nada disso importa. Movimentos de resistência nunca tomam forma no ventre da multidão. Não é preciso nascer grande para ter força. Basta ter razão.

    JANIO DE FREITAS

    Um dia esmagador


    Folha de S. Paulo - 20/08/2009



    Com a preferência pelos ardis e conchavos, governistas terminam o dia com o risco de mais um ônus político e ético


    FOI UM MOMENTO raro a que os espectadores da TV Senado e os presentes no Conselho de Ética assistiram quando o senador Flávio Arns tomou a palavra, para dirigir-se ao colega Arthur Virgílio, pouco antes absolvido por unanimidade de uma representação do PMDB.
    Calmo como sempre, escandindo as palavras como sempre, rosto neutro e sério como sempre, o petista Flávio Arns disse nada menos do que coisas assim: "sinto vergonha" do PT; "aquelas coisas ditas ao povo", sobre luta contra corrupção e outros velhos compromissos, "eram mentiras"; "os senadores do PT que hoje votaram aqui", pela recusa de recurso contra o senador-presidente José Sarney, "antes assinaram uma carta comprometendo-se a apoiar investigações do presidente do Senado", e "fizeram o oposto, rasgaram a carta que assinaram: como se pode confiar em pessoas assim?" Estão aí poucos exemplos de um momento de grandeza pessoal estarrecedor, daqueles que nem se imaginaria mais na vida pública brasileira.
    O senador Flávio Arns coroou um dia esmagador para o PT e para o governismo. Mesmo a isenção total do senador Sarney, comandada com rebenque pelo próprio Lula contra o líder de bancada Aloizio Mercadante, apenas deu tudo como resolvido para continuar como estava até anteontem. PSDB e PSOL prometeram, com presteza, recursos ao plenário, o que basta para um lado e outro não perder o pique. E a condução do resultado só ser estimulante para o incipiente movimento de ruas.
    Menos escandaloso e mais criativo, um ardil criado pelo senador Romero Jucá revela quanto a situação de Dilma Rousseff tornou-se inquietante para Lula e o governismo. O gesto repentino e surpreendente de Jucá por uma acareação da ministra e da ex-secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, era um truque que o senador Demóstenes Torres desmontou. Depois de tratar com normalidade o requerimento, Demóstenes despiu-se da condição de muito capaz presidente da Comissão de Constituição e Justiça e, vestindo a de oposicionista, fez o encerramento súbito da sessão, sem submetê-lo a votação, para fúria dos governistas. Em fácil maioria, e sob a aparência de uma iniciativa enfim esclarecedora, eles votariam contra a convocação e, com isso, eliminariam o risco de Dilma Rousseff ser chamada a interrogatório ali, como se deu com sua oponente.
    Mais do que se desfez, a manobra do governo reverteu. É só perguntar-se por que os governistas chegariam a tanto, depois do insucesso de sua bancada, na véspera, diante da tranquilidade e da segurança de Lina Vieira? Só há uma resposta, evidente. E que, mesmo se neutralizada por fatos futuros, juntou-se ao forte desgaste de Dilma Rousseff por tantos dias de falta de ação do governo para comprovar (?) sua contestação Lina Vieira. A apelação é sempre um sinal.
    A atitude digna do senador Arthur Virgílio seria, a propósito, bom motivo de reflexão para a Presidência e o governismo acossados por tantos questionamentos éticos. Virgílio assumiu sua responsabilidade pelas condutas impróprias de que foi acusado, no uso excessivo dos serviços à sua disposição; expôs-se em pessoa ao Conselho de Ética, fez sua defesa -e foi inocentado mas não por graça de cambalacho. A unanimidade que lhe foi dada deveu-se, no dizer do mesmo petista Flávio Arns sobre o peessedebista, que a presença de Arthur Virgílio "é essencial no Senado".
    Com a preferência pelos conchavos e ardis, o PT e os demais governistas chegaram ao fim do dia com o risco de mais um ônus político e ético. Em vista da carga da Presidência contra a posição assumida dias antes pela bancada, Aloizio Mercadante convocou uma reunião dos petistas, e dela se presumia que saísse sua renúncia à liderança. Escrevo antes de uma informação segura a respeito, mas já contava com outra renúncia para completar a escalada desastrosa do PT: a renúncia de Marina Silva a seus 30 anos de PT. Tema para muitos dias nossos e muitas noites de Lula e seus governistas.

    GOSTOSA DO TEMPO ANTIGO


    PAINEL DA FOLHA

    PT em cacos

    RENATA LO PRETE

    Folha de S. Paulo - 20/08/2009

    Foi a pedido de Delcídio Amaral e Ideli Salvatti que o presidente do PT, Ricardo Berzoini, emitiu a nota em defesa do sepultamento definitivo de investigações contra José Sarney. Obrigados a votar devido à recusa do líder Aloizio Mercadante em nomear novos titulares para o Conselho de Ética, os dois queriam algo que lhes permitisse dizer ao eleitor que livraram a cara de Sarney por determinação superior. Ao se recusar a ler a nota, Mercadante retirou-lhe o caráter institucional. O discurso de Flávio Arns ("me envergonha estar no PT") completou o desastre.

    Longe dali, um grão-petista minimizava a confusão e a saída de Marina Silva: "O PT tomou um rumo. Vamos trazer o PMDB para Dilma. Quem não estiver contente que procure outro caminho".




    Não falei! De Mercadante: "A carta está assinada. E nunca assumi o compromisso de defender essa posição".

    Falou sim! De Delcídio, no Twitter: "Coisa feia, Mercadante. Pela manhã assumiu que iria ler a carta do Berzoini, mas em coletiva negou".

    Disfarça... Foi de propósito que Delcídio proferiu longe do microfone seus votos pró-Sarney. O ex-presidente da CPI dos Correios providenciou livros e revistas para esconder o rosto e usou inusuais óculos de leitura.

    ...e vota. O tucano Flexa Ribeiro provocou: "Ideli, ninguém ouviu o seu voto". "Meu voto foi esse aí", respondeu a petista de cara amarrada.

    De saída. Flávio Arns negocia filiação ao PSC do deputado Ratinho Júnior. Sabe que o nome preferido do PT para o Senado pelo Paraná é o de Gleisi Hoffmann. O partido lhe sugeriu tentar a Câmara.

    Reality. O vice-presidente Marconi Perillo (PSDB-GO) suspendeu a sessão do plenário para que a TV Senado exibisse ao vivo o PT salvando Sarney no Conselho de Ética. "É por isso que o Lula me odeia", brincava ele, depois.

    Freezer. Franklin Paes Landim, o funcionário que introduziu boletins com atos secretos na intranet do Senado depois da abertura de investigação, foi removido do cargo de chefe de publicações e devolvido para a Gráfica.

    Internacional. O anúncio da saída de Marina Silva do PT foi acompanhado por pelo menos cinco veículos estrangeiros, entre agências de notícias, TVs, jornais e revistas.

    Ontem e hoje. Para Luiza Erundina, uma das primeiras a romper com o PT, Marina "fará a diferença no debate". "Ela tem perfil mais parecido com o Lula do que a Dilma", diz a ex-prefeita, hoje no PSB.

    Melhor não. Ao final do depoimento de Lina Vieira no Senado, Dilma Rousseff estava decidida a divulgar nota para marcar o encerramento do caso, uma vez que a ex-secretária da Receita não apresentou prova do encontro que afirma ter mantido com a ministra. Lula, porém, abortou a iniciativa, sob o argumento de que daria corda à oposição.

    Mentor. Ao ouvir Lina dizer que "os governos passam, e nós ficamos e servimos ao país", quem conhece os bastidores da Receita imediatamente se lembrou de Alberto Amadei Neto, auditor que ela elevou a assessor especial quando virou secretária. Egresso dos quadros do Unafisco, ele continua no gabinete do sucessor, Otacílio Cartaxo.

    Mulheres. Fátima Cartaxo, mulher de Otacílio e também auditora da Receita, é grande amiga de Lina, assim como Iraneth Weiler, chefe de gabinete que corroborou o relato sobre a ida da então secretária ao Planalto a pedido de Dilma.

    Fumaça. Assim como o PT-SP, que votou contra a lei antifumo, a Advocacia Geral da União, comandada por José Antonio Toffoli, deu parecer pela inconstitucionalidade da iniciativa de José Serra, dentro de ação em curso no STF.


    com VERA MAGALHÃES e SILVIO NAVARRO

    Tiroteio

    Estão serrando a história da Marina. Ela vai deixar de ser seringueira para ser laranjeira.


    Do deputado SILVIO COSTA (PMN-PE), da base governista, sugerindo que a provável candidatura da senadora ao Planalto será linha auxiliar do PSDB na disputa contra Dilma Rousseff.

    Contraponto

    Mãe Dinah Os governistas trabalhavam a toque de caixa ontem, no Conselho de Ética, para manter arquivados os 11 pedidos de investigação contra José Sarney. Vice-presidente do órgão, Gim Argello ia chamando os integrantes, um a um, e computando os votos contra e a favor da reabertura dos casos. A certa altura, o petebista exagerou na pressa:
    -Senador Wellington Salgado. Vota não!
    Sentado na terceira fileira, "Cabelo" não se conteve e brincou com o companheiro de tropa de choque:
    -Não sabia que Vossa Excelência lia mentes...
    Em seguida, confirmou o voto pró-Sarney.