Com a preferência pelos ardis e conchavos, governistas terminam o dia com o risco de mais um ônus político e ético
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FOI UM MOMENTO raro a que os espectadores da TV Senado e os presentes no Conselho de Ética assistiram quando o senador Flávio Arns tomou a palavra, para dirigir-se ao colega Arthur Virgílio, pouco antes absolvido por unanimidade de uma representação do PMDB. Calmo como sempre, escandindo as palavras como sempre, rosto neutro e sério como sempre, o petista Flávio Arns disse nada menos do que coisas assim: "sinto vergonha" do PT; "aquelas coisas ditas ao povo", sobre luta contra corrupção e outros velhos compromissos, "eram mentiras"; "os senadores do PT que hoje votaram aqui", pela recusa de recurso contra o senador-presidente José Sarney, "antes assinaram uma carta comprometendo-se a apoiar investigações do presidente do Senado", e "fizeram o oposto, rasgaram a carta que assinaram: como se pode confiar em pessoas assim?" Estão aí poucos exemplos de um momento de grandeza pessoal estarrecedor, daqueles que nem se imaginaria mais na vida pública brasileira. O senador Flávio Arns coroou um dia esmagador para o PT e para o governismo. Mesmo a isenção total do senador Sarney, comandada com rebenque pelo próprio Lula contra o líder de bancada Aloizio Mercadante, apenas deu tudo como resolvido para continuar como estava até anteontem. PSDB e PSOL prometeram, com presteza, recursos ao plenário, o que basta para um lado e outro não perder o pique. E a condução do resultado só ser estimulante para o incipiente movimento de ruas. Menos escandaloso e mais criativo, um ardil criado pelo senador Romero Jucá revela quanto a situação de Dilma Rousseff tornou-se inquietante para Lula e o governismo. O gesto repentino e surpreendente de Jucá por uma acareação da ministra e da ex-secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, era um truque que o senador Demóstenes Torres desmontou. Depois de tratar com normalidade o requerimento, Demóstenes despiu-se da condição de muito capaz presidente da Comissão de Constituição e Justiça e, vestindo a de oposicionista, fez o encerramento súbito da sessão, sem submetê-lo a votação, para fúria dos governistas. Em fácil maioria, e sob a aparência de uma iniciativa enfim esclarecedora, eles votariam contra a convocação e, com isso, eliminariam o risco de Dilma Rousseff ser chamada a interrogatório ali, como se deu com sua oponente. Mais do que se desfez, a manobra do governo reverteu. É só perguntar-se por que os governistas chegariam a tanto, depois do insucesso de sua bancada, na véspera, diante da tranquilidade e da segurança de Lina Vieira? Só há uma resposta, evidente. E que, mesmo se neutralizada por fatos futuros, juntou-se ao forte desgaste de Dilma Rousseff por tantos dias de falta de ação do governo para comprovar (?) sua contestação Lina Vieira. A apelação é sempre um sinal. A atitude digna do senador Arthur Virgílio seria, a propósito, bom motivo de reflexão para a Presidência e o governismo acossados por tantos questionamentos éticos. Virgílio assumiu sua responsabilidade pelas condutas impróprias de que foi acusado, no uso excessivo dos serviços à sua disposição; expôs-se em pessoa ao Conselho de Ética, fez sua defesa -e foi inocentado mas não por graça de cambalacho. A unanimidade que lhe foi dada deveu-se, no dizer do mesmo petista Flávio Arns sobre o peessedebista, que a presença de Arthur Virgílio "é essencial no Senado". Com a preferência pelos conchavos e ardis, o PT e os demais governistas chegaram ao fim do dia com o risco de mais um ônus político e ético. Em vista da carga da Presidência contra a posição assumida dias antes pela bancada, Aloizio Mercadante convocou uma reunião dos petistas, e dela se presumia que saísse sua renúncia à liderança. Escrevo antes de uma informação segura a respeito, mas já contava com outra renúncia para completar a escalada desastrosa do PT: a renúncia de Marina Silva a seus 30 anos de PT. Tema para muitos dias nossos e muitas noites de Lula e seus governistas.
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