domingo, maio 17, 2009

MERVAL PEREIRA

(Des) vantagens comparativas

O GLOBO - 17/05/09

Quais seriam as vantagens comparativas do Brasil dentro dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e China), grupo de países apontados pela Goldman Sachs como futuros líderes internacionais? O jornalista Paulo Sotero, diretor do Brazil Institute, do Woodrow Wilson International Center for Scholars, de Washington, diz que a principal vantagem talvez seja que, em contraste com a China, a Índia e a Rússia, a ascensão internacional do Brasil não representa ameaça a ninguém.

"Nesse sentido, a ampliação do espaço internacional do Brasil não tem sido um alimentador de tensão. Pelo contrário, as ações internacionais brasileiras, mesmo com derrapagens, têm tido o efeito oposto e afirmado o papel estabilizador do país na América do Sul e no Caribe, como atesta a experiência recente no Haiti".

Mantidas as tendências atuais, Paulo Sotero acha que aumentarão as assimetrias entre o Brasil e seus vizinhos "e isso poderá se tornar fontes de problemas futuros". Ao mesmo tempo, ressalva, deve-se ter em conta que "um Brasil democrático, estável e próspero é benéfico à região e à comunidade internacional".

O sociólogo e cientista político Amaury de Souza, da MCM Consultores, acha que talvez fosse melhor indicar primeiro "nossas desvantagens relativas face aos demais países emergentes, destacando-se a ínfima participação no comércio mundial e taxas medíocres de crescimento econômico".

Onde corremos parelhos com os outros Brics, na sua análise, "é na posse de grandes territórios e populações, o que nos assegura amplos mercados domésticos".

Conta a favor do Brasil, também, o fato de sermos, na opinião de Souza, "o país mais ocidental e mais moderno social e culturalmente dentre os emergentes. E o bom relacionamento com os vizinhos, no que o Brasil contrasta vivamente com os demais Brics, cercados de ameaças em suas respectivas regiões".

O sociólogo e cientista político Candido Mendes ressalta a característica dos Brics de não terem nascido de uma política comum, "mas sim de escaparem às lógicas da globalização tal como entrevista ainda antes da crise com o modelo econômico capitalista".

Candido Mendes vê todos "países relativamente independentes da dimensão externa de suas economias. São todas extensões continentais constitutivamente orientadas para seus mercados internos, ainda que dentro de políticas distintas de acesso social: as áreas da saúde, educação e habitação".

Para Candido Mendes, "a consciência deste novo protagonismo internacional nos dissocia, de vez, da América Latina. Tal como, inclusive, vem de reconhecer o governo americano".

Para ele, nossa principal vantagem comparativa com os demais emergentes "vem da absoluta comparação democrática do nosso desenvolvimento, tal como hoje o governo Lula desfruta de uma admiração universal. Soma-se o jogo de contrapesos entre os três Poderes ao respeito aos direitos humanos e, sobretudo, ao estado de direito e obediência às suas regras do jogo fora das tentações intervencionistas, por exemplo, da maior parte da América Latina".

Neste aspecto, e entre os Brics, ressalta Candido Mendes, "o destaque democrático só repartimos informalmente com a Índia. Mas há que atentar ao quanto esta última, por sobre o formalismo democrático, mantém objetivamente o sistema dos párias e o multissecular regime de falta de reconhecimento coletivo".

Mesmo que os Brics não constituam um grupo entre si, Candido Mendes acha que eles podem, em conjunto, se contrapor a uma globalização hegemônica. Sobretudo, ressalta, "em termos do controle total desse processo de que a China não se demite e o Brasil apresenta a pauta mais rica de autointuição da mudança".

O sociólogo Simon Schwartzman, do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets) tem uma visão crítica do governo Lula, que "com declarações desastradas como a dos "brancos de olhos azuis" e a insistência em ensinar aos governos americano e europeus o que fazer, se torna cada vez mais uma figura folclórica".

Por isso, Schwartzman acha que a importância que o Brasil possa ter no cenário internacional "tem menos a ver com as articulações políticas e as viagens do presidente, do que com os fatos do tamanho da economia brasileira e a sua estabilidade, bastante distinta, no agregado, do voluntarismo e aventureirismo de muitos dos governos de nossos países vizinhos".

Para ele, além da importância econômica, o Brasil pode fazer muito "participando de forma séria e responsável em diferentes instituições e iniciativas internacionais, e fortalecendo os programas e atividades de intercâmbio e cooperação com outros países".

Ele vê bons exemplos, "entre os quais a atuação dos militares no Haiti", mas considera que "o Brasil tem muito ainda a melhorar para que sua presença e prestígio internacional possam corresponder às dimensões de sua economia".

O economista Paulo Vieira da Cunha, ex-diretor do Banco Central, acha que um dos problemas do Brasil é que a América Latina ainda é vista como "o quintal dos Estados Unidos".

Na sua análise, "a China é uma potência em sua área; a Índia continua sua guerra disfarçada com o Paquistão, e a região é tão problemática que sua presença estratégica é reconhecidamente fundamental para todos; a Rússia ainda joga seu jogo de "potência atômica", mas, dos Brics, é claramente, o mais decadente".

O Brasil é estrategicamente importante por suas relações com Venezuela, Bolívia, Equador e agora Paraguai, o que sem dúvida, é importante para o Departamento de Estado dos Estados Unidos, mas não vai muito além disso, analisa Paulo Vieira da Cunha, para quem "o Mercosul faliu".

BRASÍLIA - DF

O FATOR PAIM

CORREIO BRAZILIENSE - 17/05/09

Dos males, o menor. Para não ver derrubado o veto que travou a vinculação das aposentadorias ao salário mínimo, o governo vai ceder ainda mais na negociação de uma versão mais branda do projeto do senador Paulo Paim (PT-RS), que acaba com o fator previdenciário. A ideia é dar mais uma redução na base de cálculo desse fator e, assim, permitir um alivio no bolso dos aposentados. Assim, o governo espera dar um discurso para a sua base não comprometer tanto o caixa da Previdência. Afinal, dizem os técnicos, dar uma aliviada no fator previdenciário sai mais barato do que o impacto imediato de R$ 15 bilhões nos cofres, caso o Congresso derrube o veto. Também não está descartada uma conversa franca com o senador Paulo Paim para que ele dê uma força ao Poder Executivo. Afinal, é ele quem tem mobilizado os aposentados nas duas frentes, seja pelo fim do fator previdenciário, seja pela vinculação das aposentadorias ao salário mínimo.

Prevenir, que nada

Depois de liberar, há três semanas, R$ 300 milhões remediar o flagelo das vítimas de enchentes e da estiagem, o Executivo cancelou R$ 136 milhões destinados a obras preventivas de desastres, no orçamento da Secretaria Nacional de Defesa Civil. O corte foi feito por um decreto de 11 de maio, que remanejou parte dos recursos para o custeio da máquina do Ministério da Integração Nacional.

E o dinheiro encolheu

Vem confusão na Comissão Mista de Orçamento. Por causa da crise econômica, o relator do Orçamento de 2010, deputado Geraldo Magela (PT-DF), pretende reduzir de R$ 10 milhões para R$ 8 milhões o limite que cada deputado pode usar para suas emendas individuais à proposta orçamentária do ano eleitoral. Ele é o entrevistado de hoje do programa Brasília-DF no site www.correiobraziliense.com.br. 

Chapéu

Diante dos minguados repasses do Fundo de Participação dos Estados (FPE), governos estaduais acentuaram a cobrança ao Ministério da Fazenda pelo pagamento de R$ 1,3 bilhão em compensações daLei Kandir referentes a 2007. O governo havia se comprometido a honrar a dívida caso registrasse superávit no ano passado. "O superávit foi de R$ 29 bilhões e até agora não se pagou um centavo", protesta o deputado Nárcio Rodrigues (PSDB-MG), um dos porta-vozes do pleito. 

Maldade na roda

A retirada das assinaturas da CPI da Petrobras pedida em 2007 deixou alguns políticos com a pulga atrás da orelha: há quem considere que foi mais fácil acabar com a CPI porque a investigação mexeria na Transpetro, ocupada pelo ex-senador Sérgio Machado, do PMDB. Quanto à outra CPI da Petrobras, que espeta o PT e a Agência Nacional do Petróleo (ANP), dirigida pelo PCdoB, as assinaturas caíam a conta-gotas.

Cabem mais dois?

PSDB e PPS pediram ao DEM para embarcar na chamada Caravana da Transparência. Ambos gostaram da repercussão das três vistorias em obras do PAC promovidas pelos democratas nas últimas semanas. Avaliaram que serviu para colocar uma interrogação sobre a alardeada eficiência da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff.

No cafezinho 

E Gabrielli se lixou

No início deste mês, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, faltou à maior feira de petróleo do mundo, a Offshore Technology Conference, em Houston, no Texas, onde a empresa receberia um prêmio da Chevron. Os diretores alegaram medo da gripe suína. Agora, com a CPI da Petrobras no seu encalço, Gabrielli, para usar o termo da moda, se lixou para a gripe. Passa uns dias em Pequim e segue para Nova York, onde é homenageado num jantar a US$ 800,00 por cabeça. Tempo suficiente para pensar no que fazer, enquanto a turma da política age na linha de frente anti-CPI. 

Relações

O PMDB fez o seguinte balanço de seu casamento com o PT e o governo: a convivência com o presidente Lula é maravilhosa. Com a ministra Dilma Rousseff, idem. Mas, com o PT, vai aos trancos e barrancos. Moral da história: ou o PT cede nos estados ou vai perder o apoio dos peemedebistas. A vida é feita de escolhas.

Adeus, Anexo 5

Concebida para abrigar um memorial à história da Câmara, a construção do Anexo 5 está entre os investimentos sacrificados no pacote de economias a ser anunciado pela Mesa Diretora da Casa. O projeto de ampliação do Anexo 4, porém, será tocado com 5% do orçamento previsto para que possa sair do papel em 2010. O edifício, conhecido pelas venezianas amarelas, abriga hoje a maioria dos gabinetes.

Pop star. Para alguns

Dedicado ao lobby em favor do futebol essa semana em Brasília, o presidente do Flamengo, Márcio Braga, não teve sossego na Câmara. Os parlamentares flamenguistas faziam rodinhas em torno dele para tirar fotos. Sérgio Barradas Carneiro, que, apesar de baiano torce para o time carioca, colocou para tocar o hino rubro-negro na maior altura. Os botafoguenses passaram pelos dois com uma cara de "urgh". 

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CLÓVIS ROSSI

Nem G20 nem G8. É G1

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09

SÃO PAULO - O governo Barack Obama anunciou seu plano para a regulação dos derivativos, um mecanismo de apostas em diferentes tipos de ativo (da cotação de moedas às commodities). Os derivativos foram (ou são) um dos vilões da crise econômica em curso.
Seu valor, segundo o Council on Foreign Relations, é inacreditável: US$ 680 trilhões, muitíssimo mais que toda a economia mundial. Como é possível? É um desses mistérios da riqueza puramente virtual, que não se materializa.
Ao contrário dos ativos tóxicos, não é um produto desconhecido no Brasil. Seu estoque, em meados de 2008, era de US$ 2,5 bilhões, pouco em relação ao conjunto de investimentos externos (US$ 1 trilhão), mas de crescimento explosivo: multiplicou-se por 11,5 desde 2005, enquanto o total geral só duplicou.
O eixo do plano é a introdução de uma espécie de câmara de compensações, como a que existe para os cheques. Centralizaria o risco, em vez de disseminá-lo, o que é coerente com a discussão havida no G20 de março/abril: o sistema financeiro deveria ser amortecedor e não propagador de riscos.
Regular todos os produtos financeiros foi a principal decisão do G20 no que se refere à elaboração de uma nova arquitetura financeira global. O fato de os Estados Unidos saírem na frente é institucional e politicamente significativo.
Primeiro, a ideia de que todos atuariam coordenadamente foi atropelada. Segundo, a fanfarra em torno do papel relevante dos emergentes emudece algo. Claro que a China tem um peso novo no mundo (os outros emergentes ainda precisam comer muito arroz-e-feijão para chegar perto dos chineses), mas em matéria de liderança e capacidade de iniciativa não há nem G20 nem mesmo o G8, o velho e ultrapassado clubão dos ricos. É G1 mesmo. Mas pode chamar de Estados Unidos da América.

PAINEL

Crise na relação

RENATA LO PRETE

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09

O litígio entre PSDB e DEM em torno da criação da CPI da Petrobras é apenas o mais recente de uma série iniciada com a eleição de José Sarney (PMDB) para a presidência do Senado -apoiada apenas pelos "demos"- e que complica a costura da aliança para as eleições do ano que vem. O próximo embate deverá ser sobre a alteração nas regras da poupança: o DEM quer bater sem dó; o PSDB tem lá suas dúvidas.
O estranhamento é agravado por disputas em Estados importantes e pela percepção, por parte do DEM, de que os articuladores da candidatura de José Serra jogam muitas fichas na aproximação com o PMDB. "Ou sentamos para aparar as arestas ou vamos entrar em 2010 desarticulados", diz um dirigente do DEM.



Tratos à bola. Na quinta-feira, enquanto os tucanos esperneavam no plenário pela CPI da Petrobras, o líder do DEM, José Agripino (RN), estava no Rio com o presidente da CBF, Ricardo Teixeira. Tratava de assegurar um jogo da seleção em Natal, que considera fundamental para as suas chances de reeleição. 

Em comum. Governistas que flertam com a ideia de colocar Lula na cédula em 2010 acreditam ter um aliado oculto nas hostes da oposição: Aécio Neves. O terceiro mandato tiraria José Serra definitivamente de seu caminho. 

Etéreo 1. O presidente Michel Temer (PMDB-SP) tem sido vago ao comentar o retorno do assunto terceiro mandato. Em conversa recente, disse que "não seria bom" se o tema entrasse na pauta da Câmara. Mas nada de condenação peremptória à tese. 

Etéreo 2. Quando questionado sobre a necessidade de tempo para que emenda constitucional abrindo a possibilidade de nova candidatura de Lula fosse votada, Temer opinou que os prazos são facilmente negociáveis, desde que haja convencimento político. 

Estica... O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, reafirmou no final da semana a disposição de ir até o fim na defesa da manobra contábil que permitiu à empresa pagar menos impostos. O primeiro embate será no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais. Se perder, a Petrobras promete ir à Justiça. 

...e puxa. Já os Estados, que viram os repasses da Cide despencarem 90% devido ao truque da Petrobras, apostam que a Receita acabará concluindo pelo erro da empresa. Do contrário, restará ao Tesouro ressarcir os Estados.

Bem lembrado. Um dos argumentos colocados à mesa para abortar a CPI da Petrobras é que a investigação acabaria batendo em nomes da Operação Castelo de Areia por meio da Refinaria Abreu e Lima (PE). A obra é tocada pela Camargo Corrêa, uma das maiores doadoras eleitorais. 

Melhor não. Petistas partiram para negociações com Ciro Gomes (PSB), como possível candidato ao governo paulista, depois de concluir que Doutor Hélio (PDT), a outra opção do chamado "bloquinho", não resistiria ao escrutínio de uma campanha estadual. Argumentam que o prefeito de Campinas só passou ileso até hoje porque protegido por um arco de alianças no qual cabe até o DEM. 

Apostas 1. Enquanto no governo se dá como certo que o próximo indicado para o STF será o advogado-geral da União, José Antonio Toffoli, dois outros nomes têm sido mencionados no próprio Supremo: Sylvia Steiner, juíza federal de São Paulo atualmente no Tribunal Penal Internacional, e o gaúcho Ari Pargendler, membro do STJ. 

Apostas 2. Já entre advogados de São Paulo a torcida é pelo criminalista Arnaldo Malheiros Filho, mas não para a vaga a ser aberta com a saída de Ellen Gracie, e sim para a seguinte, fruto da aposentadoria de Eros Grau. Será a última preenchida por Lula. 

Na mira. Mauro Faria de Lima, da Promotoria Militar do DF e responsável por propor a ação penal que resultou na demissão da cúpula da PM, relatou a conhecidos ter sido alvo de escutas. Disse também que foi seguido pela P2, polícia secreta da corporação.

com VERA MAGALHÃES e SILVIO NAVARRO

Tiroteio

"Enquanto todos os países agem para salvar suas empresas, aqui a oposição quer colocar a maior delas no banco dos réus. Se a tática for a do "quanto pior, melhor", o caminho é este." 


De ALOIZIO MERCADANTE, líder da bancada do PT no Senado, sobre os esforços do PSDB para criar a CPI da Petrobras.

Contraponto

Tudo muito estranho Na sessão de quinta no Senado, o PSDB pressionava pela instalação da CPI da Petrobras. O primeiro-secretário, Heráclito Fortes (DEM-PI), presidia os trabalhos e se recusava a fazer a leitura do requerimento, pois havia sido feito um acordo para adiar a criação da comissão.
Em Florianópolis, onde participava de evento ao lado de Lula, a senadora Ideli Salvatti (PT-SC) ia monitorando a situação pelo telefone:
-As coisas hoje estão diferentes no Senado, presidente...
Lula quis saber o motivo, e Ideli arrematou:
-Neste exato momento, quem nos defende é o Heráclito!

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DANUSA LEÃO

A vida não pode ser fácil

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09


Quem é difícil não suporta a companhia de gente leve, e encontra sempre um tão difícil quanto ele para conviver



POR QUE será que para alguns a vida é tão fácil, tão leve, e para outros tudo é problema, complicação? Existem pessoas que estão gripadas, cheias de febre, e se levantam da cama, mesmo se sentindo péssimas, para ir ao dentista.
Qual seria o problema de desmarcar? Nenhum. Mas elas são exigentes com elas mesmas e, se deram a palavra -mesmo sendo uma simples ida ao dentista-, não podem falhar. Essas pessoas, se são duras com elas mesmas, são também duras com os outros. Ai de você telefonar às 19 horas para desmarcar aquele jantar combinado na véspera. Jantar que não era nada, apenas um encontro de dois bons amigos que se falam quase todo dia no telefone; por mais que tenha havido um bom motivo, um complicado acha que isso não se faz.
Ele cria expectativas -para o bem e para o mal- que não podem ser frustradas, sob pena de cair em profundo sofrimento. Se um desses complicados programar uma viagem maravilhosa para as ilhas gregas, quando voltar ele vai falar apenas de como é difícil viajar nos dias de hoje, dos aeroportos cheios, da bagagem que demorou a chegar na esteira, e vai se esquecer de contar as coisas maravilhosas que viu, até porque talvez ele não tenha visto nada, apenas olhado, o que não tem nada a ver.
Mesmo boas notícias que não estavam programadas contrariam os viciados em sofrer. O imprevisto, mesmo -e sobretudo- em se tratando de coisas boas, transtorna certas pessoas; a vida para elas é difícil, dura. Não se pode ser feliz porque o castigo vem depois. Elas adiam qualquer prazer por nada, ou talvez para não terem prazer. Quando veem alguém com pouco ou nenhum futuro pela frente, um empreguinho de nada, sem perspectivas, tomando uma cerveja e dando não uma, mas várias gargalhadas, elas se sentem quase ofendidas.
E sempre encontram uma outra pessoa para dizer o quanto aquele cara é irresponsável, que depois não se queixe e, sobretudo, que não venha pedir nada, já que vive pensando que a vida é fácil. O lema deles é esse: "A vida não é fácil". A visão de uma pessoa que acha que a vida pode ser fácil e leve faz mal aos difíceis. Só que a vida ser fácil ou difícil depende, e muito, de como se é. Quem é difícil não suporta a companhia de gente leve, e encontra sempre um tão difícil quanto ele para conviver.
E o que é uma pessoa fácil? É aquela que, se você passar na casa dela na hora do almoço e não tiver nada na geladeira, diz, alegremente, que não tem problema, que em cinco minutos resolve tudo, e pergunta o que você quer: se um pão fresquinho, com um presunto cortado na hora e um guaraná, ou se prefere uns ovos mexidos e uma cerveja. Mas isso nunca vai acontecer: uma pessoa difícil nunca chega à casa do outro sem avisar, para que o outro nunca, jamais, faça isso com ele, que só de pensar nessa possibilidade já fica estressado; difícil lidar com pessoas difíceis.
Não há quem não tenha uma amigo difícil; eu tenho alguns, e você também deve ter, claro. E o mais inexplicável é que continuo gostando deles, me dando com eles, telefonando para eles, como provavelmente acontece com você. Por que será?

JANIO DE FREITAS

CPI ao gosto de todos

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09


É verdade que a Petrobras tem práticas reprováveis, mas foi transformada pelo PSDB em arena pré-2010


ENTRE SER a favor ou contra a CPI da Petrobras, fique à vontade, porque não há como errar. Os dois lados dispõem de bons argumentos, à parte os motivos que os levem a defendê-los e exagerá-los. Os itens utilizados com maior ênfase pelo governo não têm importância. Se a Petrobras é a maior empresa do Brasil, se é mesmo a segunda maior petroleira do mundo, se tem 700 mil acionistas, se esses fatos tornam inconveniente uma investida contra a Petrobras em meio aos problemas econômicos da crise, nem a soma disso isenta qualquer empresa do risco de ver-se sob questionamentos autorizados pela legislação, quando invocáveis por força de condutas administrativas duvidosas.
A ocasião da CPI é imprópria para a Petrobras por enfraquecer sua administração quando discute financiamentos internacionais, uma multidão de contratos com fornecedores estrangeiros, batalha contra pressões para entrega do pré-sal (descoberto com méritos e custos altíssimos da estatal) a concorrentes e a capitais privados. Não há dúvida de que, sob uma CPI, a administração da empresa precisará desviar muita atenção das negociações e planejamentos em curso, e fará sob piores condições a continuação parcial desse trabalho. E o pré-sal, causa de toda essa ação atual na empresa, é estratégico não só para a Petrobras, porém ainda mais para o país.
É verdade que a Petrobras tem deixado pelo caminho muitas práticas reprováveis. Muitas suspeitas. E muito pouco interesse pela imagem empresarial que não depende da dinheirama despejada, grande parte pelos piores motivos, na conquista de mera simpatia popular e adesões lobísticas como a do cinema, em detrimento de contribuições mais louváveis. O clima que favoreceu a aprovação da CPI decorreu também daquele pouco interesse: a Petrobras faltou com os esclarecimentos sobre suas alterações contábeis quando deveria fazê-los com prioridade, por praticar uma redução de tributos e royalties com perdas financeiras para a população, por intermédio de suas administrações locais. O desprezo da opinião que a publicidade não faz foi um pesado erro político da direção da Petrobras.
A oposição investiu na CPI e alguns fisiológicos da "base aliada do governo" a apoiaram pelo motivo mais reprovável: o interesse meramente político. Se o PSDB que agora clama pela CPI em defesa da "Petrobras que é um patrimônio do Brasil" tivesse, de fato, dedicação perceptível à coisa pública, seus congressistas não chegariam a condutas até sórdidas para impedir CPIs no governo Fernando Henrique. Nem as ostensivas prevaricações na privatização da telefonia os sensibilizaram. Ou -só por não resistir a citar ao menos mais uma entre tantas- a entrega do Sivam, o Sistema de Vigilância da Amazônia e seus segredos, a uma empresa estrangeira com ramificações militares e civis no governo dos EUA e em outros.
A Petrobras foi transformada pelo PSDB em arena das disputas preliminares da sucessão presidencial. Surrada pelo prestígio de Lula e incompetente por seu próprio demérito, a oposição conduzida pelo PSDB virou a velha barata tonta: pesquisas recentes indicam, em várias regiões, o crescimento eleitoral de Dilma Rousseff depois da notícia de sua doença. A oposição não é solidária nem no câncer.
Maus motivos levaram a um recurso parlamentar legítimo. Mas CPIs nascem, por exigência da norma, com um tema preciso e, depois, em geral o que menos prevalece é sua finalidade originária. Se isso ocorrer também agora, será mais do que possível uma virada da CPI contra a oposição. E, mais importante, será a oportunidade, nunca tardia, do exame das inúmeras barbaridades na Petrobras durante o governo Fernando Henrique.

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ELIANE CANTANHÊDE

Fechou o tempo

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09

BRASÍLIA - Saio de férias com a sensação de que tudo mudou nos ares da política. Aquele marasmo todo de Serra versus Dilma, aliança PSDB-DEM, PMDB comportado nos braços do governo, Lula paz e amor, tudo isso está sendo chacoalhado pelas ventanias, inclusive as ventanias do destino.
A notícia do linfoma de Dilma não só abriu incertezas como fez emergir insatisfações dissimuladas e ambições ocultas e coincidiu com o furacão causado no Congresso pela eleição de Sarney. Lula deve estar profundamente arrependido de ter precipitado o processo eleitoral. Com a doença de Dilma, ficou evidente o vácuo de nomes nacionais no PT e na base governista, como ficou explícita a guerra entre PT e PMDB.
Na Bahia, Geddel vive às turras com o PT de Jaques Wagner. No Pará, Jader pula do barco da petista Ana Júlia. No RS, a debacle tucana reacende a cobiça do PT de Tarso Genro, contra o favoritismo do PMDB de Fogaça. No Rio, o caos de sempre. E o clima de guerra se expande para o resto do país.
Qualquer coisa vira tempestade, como a demissão de irmãos e ex-mulheres na Infraero. Sarney, Renan, Temer, Geddel, Jucá, Henrique Alves abandonam o bom-mocismo da época do marasmo (e da candidatura Dilma virtualmente consagrada) e mostram a cara.
O pipocar da CPI da Petrobras, portanto, combina perfeitamente com o clima. A misteriosa alteração contábil e a política de ocupação de espaços do PT nas estatais apenas vieram bem a calhar, deram o pretexto que faltava. A única surpresa é que esse clima e esse pretexto são tudo que qualquer oposição pediu aos céus, mas justamente agora o DEM, que sempre primou por uma ação muito mais viril contra o governo, está miando. Aí, tem!
Até a volta!

VINÍCIUS TORRES FREIRE

Lixando a poupança popular

FOLHA DE SÃO PAULO - 17/05/09


Dinheiro no FGTS perde da inflação, poupança rende 2%, e fundos populares de bancos, menos ainda. Quem liga?


HÁ MUITA GENTE que se diz indignada por causa do imposto sobre a poupança. A oposição, em especial, tem faniquitos populistas por causa do assunto. Mas o que governo e oposição têm feito pelas poupanças populares? Em termos reais, a poupança rende quase nada, assim como os fundos de investimento aos quais os brasileiros comuns têm acesso. O FGTS dá prejuízo -está encolhendo. Alguém ouviu algum protesto de políticos? Não. A maioria "se lixa".
No ano passado, o rendimento real da poupança foi de 1,9%. Isto é, descontada a inflação (IPCA), esse foi o seu rendimento (vide gráfico ao lado com o rendimento real da poupança). Nos últimos 12 meses, o rendimento real anda pela casa dos 2%. E vai diminuir mais. O juro da poupança tem de cair, o.k. Mas quais as alternativas oferecidas ao público?
Fundos de investimento em renda fixa mais populares, com taxas de administração alta e rendimento pior, estão pagando mais ou menos a mesma coisa. Pode haver CPI da Petrobras. Vai haver CPI das taxas de administração dos bancos?
Pelo Tesouro Direto, é possível investir em títulos da dívida pública sem precisar de um fundo de banco como intermediário. No Tesouro Direto, você empresta diretamente ao governo. Devido ao tumulto financeiro mundial, em outubro de 2008 as taxas de juros subiram. O governo chegou a pagar 11% mais a taxa de inflação (IPCA) para quem comprou títulos públicos naquele mês, pelo Tesouro Direto. Isto é, quem investiu naquele mês e não vai mexer no dinheiro até maio de 2015 vai receber 11% de juros anuais mais o quanto a inflação variar (há investimentos com prazos menores).
Descontados o Imposto de Renda e a taxa de custódia, dá 9,4% ao ano mais a inflação. Agora, as taxas estão mais baixas (7% mais IPCA, para o mesmo título citado acima). Mas maiores que a do fundo de seu banco (que cobra pelo serviço prestado, mas cobra demais). Não se procura, porém, facilitar o investimento popular no Tesouro Direto. Os bancos o dificultam o quanto podem.
No ano passado, o dinheiro guardado no FGTS perdeu da inflação, como quase de costume. Quem não investiu parte do FGTS em ações da Petrobras ou da Vale tem perdido dinheiro. Desde 2003, o dinheiro parado no FGTS encolheu 3%, em termos reais. O FGTS paga apenas 3% de juros mais uma taxa chamada TR. No ano passado, isso deu menos de 5%. A inflação foi de quase 6%.
Não é fácil mexer no FGTS. Os mais de R$ 200 bilhões do fundo ajudam a financiar moradias e obras de saneamento, por exemplo, ou subsidiam casas para pobres. Se o juro sobe, o custo de casas e obras também sobe. Se o FGTS for aplicado em investimentos de risco, o dinheiro poderá sumir. Mas sabemos qual o retorno dos investimentos do fundo? O trabalhador é remunerado adequadamente? Quem liga?

LAMA


ELIO GASPARI

Mais uma do Pai dos Pobres e Mãe da Banca

O GLOBO 17/05/09

A ekipekonômica e o comissariado de informações do governo conseguiram transformar a limonada da remuneração das cadernetas de poupança num limão azedo. O que é uma questão ainda remota virou grande barafunda.

Querem cobrar Imposto de Renda de quem tem mais de R$ 50 mil na caderneta, mas pretendem baixar em 30% o mesmo tributo para quem tem dinheiro aplicado em fundos de investimento.

Algumas mudanças vêm logo; outras, só ano que vem. Alguns descontos serão feitos na fonte; outros, nas declarações de renda. Como se isso fosse pouco, a oposição diz que a medida tunga a classe média. Quem mantém R$ 100 mil numa caderneta durante um ano não pode ser chamado de especulador, mas, com esse saldo, que lhe concede um rendimento mensal de R$ 575, pagará R$ 13,75 ao Imposto de Renda. Isso não o mandará ao andar de baixo.

Como há 90 milhões de cadernetas de poupança e só 1% dos aplicadores tem depósitos superiores a R$ 50 mil, pode-se dizer que a confusão está restrita ao andar de cima. Falso. Sempre que a caderneta ameaçar o cofre dos fundos de investimento, coisa que ainda não ocorreu, a ekipekonômica avançará sobre o seu rendimento. Fará isso porque o governo inovou a piada do pudim. Ele quer comê-lo (pedindo dinheiro aos bancos para financiar suas despesas), guardá-lo (garantindo a renda dos pequenos depositantes) e vendê-lo (protegendo as taxas cobradas pelos administradores dos fundos).

Os sábios querem preservar a convivência irracional de duas taxas de remuneração dos investimentos, a Bolsa Copom (8% líquidos ao ano) e o rendimento das cadernetas (cerca de 7,5%, em valores de hoje).

Enquanto esse regime remunerou o andar de cima, tudo bem. Agora que as quedas da Selic aproximam as taxas, o céu ameaça cair. O problema continua do mesmo tamanho: juros flutuantes só podem conviver com remunerações tabeladas se uma se destinar a cevar os cavalcantis e outra a ferrar os cavalgados. O rendimento das contas do FGTS continua negativo, mas falar no pecúlio compulsório da patuleia é falta de educação.

Todo mundo quer juros baixos para seus empréstimos e taxas altas para suas aplicações. O papel do governo é reconhecer que esse jogo não existe. O atrelamento da renda das cadernetas à Selic é inevitável.

Por enquanto, o que a ekipekonomica quer é preservar o brilho do rentismo que financia as arcas do governo. Seus sábios protegem os fundos sabendo que a Caixa Econômica cobra apenas 1,5% de taxa de administração, enquanto os bancos cobram, na média, acima de 2%. (O Tesouro Direto, do Banco Central, remunera pela Selic e cobra 0,4% no primeiro ano e 0,3% daí em diante.)

Se o problema estivesse na defesa do rendimento dos 45 milhões de cadernetas com até R$ 100 no saldo, o governo não precisaria fabricar uma barafunda. Nosso Guia poderia fazer o que bem entendesse, distribuindo um rendimento adicional de 10% sobre os saldos de todas essas cadernetas e o mimo custaria, no máximo, R$ 450 milhões por ano.

Reduzindo em 30% o imposto de renda dos aplicadores em fundos de investimento, a ekipekonômica impõe à Viúva uma renúncia fiscal estimada cerca de R$ 3 bilhões.

O comissariado de informações do governo tem uma opção preferencial pela construção de realidades virtuais. Desta vez, transformaram as cadernetas em ameaça. Há um mês, com algum sucesso, converteram dissimulação em transparência. Em abril montaram um teatro, fingindo que a ministra Dilma Rousseff anunciou seu câncer linfático logo depois da confirmação do diagnóstico. Lorota. Quando a ministra revelou a doença, os repórteres Mônica Bergamo e Diógenes Campanha já haviam contado que ela colocara um cateter para receber medicação quimioterápica. Pior: em seguida a repórter Adriana Dias Lopes mostrou que o tratamento da ministra começara quatro dias antes. Há algo de compulsivo na enganação. Na quinta-feira, a agenda da doutora dizia que durante a manhã ela se ocupara com “despachos internos”. Já o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, informou que ela passou pela segunda sessão de quimioterapia.

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Ação e reação

A demonstração de simpatia pelo voto de lista do governador José Serra, candidato a presidente da República, deverá acionar a Lei de Newton. Numa reação igual e contrária, o deputado Ciro Gomes deve baixar em Brasília para combater a iniciativa. Em 2007, quando o voto de lista foi mandado ao sarcófago, Ciro perguntava: “Amanhã, quando chegar a notícia de que o eleitor não vai mais votar nas pessoas, mas nos partidos, qual será a reação da população?”.

Casca de coco

São poderosos os argumentos dos defensores do voto lista. Já apareceu até a ideia de que se deve “experimentar” esse modelo (como se pode experimentar sorvete de casca de coco, basta querer). O que falta explicar é por que os doutores querem impor esse sistema eleitoral aos brasileiros por maioria simples. Nessa conta, basta que 129 deputados votem a favor, numa sessão que tenha a presença de 257 parlamentares. Repetindo: esse é o quorum pedido para a criação do Dia da Brotoeja. Caso se queira mudar para qualquer outro sistema, inclusive o do voto distrital, serão necessários os três quintos exigidos para as reformas constitucionais (308 dos 513 deputados).

D. Helder triste

Diante da bancarrota da ekipekonômica da Arquidiocese do Rio, que comprou um apartamento de R$ 2,2 milhões, dom Hélder Câmara foi visto no Palácio São Joaquim cantando uma paródia de uma velha marcha de carnaval composta em sua homenagem: “Obrigado, reverendo, Deus lá do céu está vendo. A nossa decepção.”

Perigo à vista

O ministro Fernando Haddad, da Educação, caminha para uma armadilha. Ele quer substituir o massacre do vestibular pela prova do Enem. Até aí, tudo bem, mas sua burocracia diz que neste ano a experiência, inédita, só permitirá a aplicação de uma prova, em outubro, ao velho estilo tudo ou nada. Os educatecas prometem que no ano que vem a garotada poderá testar seu conhecimento em dois exames, em meses diferentes. Quem vai explicar aos estudantes que, logo no primeiro ano da novidade, eles só terão uma chance? Nos Estados Unidos, um sistema semelhante oferece sete oportunidades anuais aos candidatos.

Pedra cantada

A governadora Yeda Crusius talvez não saiba, mas já no dia de sua eleição o alto tucanato achava que seu governo seria um desastre. Menos de um ano depois, a previsão piorou: ela teria dificuldade para chegar ao fim do mandato.

CARLOS EDUARDO NOVAES

A noite da estrela solitária

Carlos Eduardo Novaes

JORNAL DO BRASIL - 17/05/09

Na noite de quarta-feira três das quatro maiores torcidas do Rio estiveram mobilizadas pelos jogos dos seus times, Vasco, Flamengo, Fluminense. Os botafoguenses ficaram fazendo palavras cruzadas.

Cheguei a pensar em assistir a um dos jogos – Ronaldo, amigo rubro-negro convidou-me para ver o Flamengo no Maracanã – mas achei melhor esquecer a Copa do Brasil para não reavivar lembranças do Botafogo sendo eliminado pelo Americano nos pênaltis no Engenhão. Sem emoções para queimar e com um enorme vazio na alma entreguei-me indiferente à partida entre Grêmio e San Martin pela Libertadores.

No final da noite – e das partidas – após um largo cochilo na poltrona resolvi sair para comer em uma churrascaria do Leblon. Quem encontro? Ronaldo, o vascaíno Zé Manoel e o tricolor Ivo Mendes, sorridentes em uma mesma mesa, discutindo a atuação de seus clubes. Zé Manoel dava urros de satisfação. Disfarcei, fingi que não os havia visto, mas quando me encaminhava para outra mesa Ronaldo me chamou:

– Vem pra cá!

– Qual é o papo? – perguntei sentando-me, desconfiado.

– Estamos falando sobre a rodada de hoje da Copa do Brasil!

Tornei a levantar:

– Não tenho nada a dizer a esse respeito. Vou sentar ali para deixar vocês à vontade.

– Mas nós estamos à vontade!

Na verdade quem não estava à vontade era eu, que me sentia um excluído. Zé Manoel, excitado, deu-me um tapa nas costas com a potência do chute do Nilton no quarto gol do Vasco.

– Você viu? Você viu a vitória do Vasco sobre o Vitória?

– O Vasco venceu? – fingi ignorar para não dar corda ao vascaíno – Foi mesmo? Passei a noite trabalhando, nem liguei a televisão. Não sei dos resultados dos jogos.

Se pretendia esfriar o papo de Copa do Brasil, meu comentário provocou um efeito contrário e os três passaram a contar, ao mesmo tempo, lances dos seus times, todos com chances concretas de chegar às semifinais. Fiz uma expressão de fastio e tentei puxar a brasa para o meu surubim.

– Vocês souberam quem o Botafogo contratou? Toni do Boavista!

– Dá um tempo, cara! – cortou Ronaldo – Estamos falando de Copa do Brasil. A conversa ainda não chegou aos eliminados!

Os três continuaram, festivos, discorrendo sobre as defesas de Bruno, de Fernando Henrique, os gols do Vasco, os gols perdidos pelo Flamengo e eu ali sem ter o que dizer, mais mudo do que torcedor do Vitória. Esse é o problema dos torneios eliminatórios. Se seu time sai no meio do caminho você também é eliminado das discussões. Forcei a barra:

– Sabiam que o Botafogo vai trazer o Lucio Flavio de volta?

– Peraí, rapaz. Depois a gente fala sobre isso. Estamos fazendo planos para as semifinais!

Senti que estava demais – ou de menos – pedi licença e fui fazer companhia ao Otavio, um botafoguense que jantava solitário em outra mesa.

– Não aguento aqueles caras – resmunguei. – Só sabem falar da Copa do Brasil!

Otavio mudou de assunto e perguntou:

– Nosso Botafogo vence o Corintians domingo no Engenhão?

Pensei um pouco e reagi com sofrida sinceridade:

– Acho que vou voltar para a outra mesa!

GOSTOSA


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INFORME JB

Gim Argello é o cara do Planalto

Leandro Mazzini

JORNAL DO BRASIL - 17/05/09

Anotem o nome: Gim Argello. O paulista de São Vicente que ganhou o Senado pela beira de uma chapa que elegeu Joaquim Roriz (PMDB-DF) – o que renunciou e pedia a Gim que não assumisse. E o que Gim fez? Driblou o ex-titular, tomou posse no cargo que lhe cabia, chegou devagar pela sombra do fundo do plenário, foi ganhando cadeiras, galgou posições e gabinetes, e hoje aí está: Jorge Afonso Argello (foto) ocupa o 14º andar do cobiçado Anexo II. Não parou. Convenceu a bancada do PTB a fazê-lo líder. Ganhou a confiança de José Múcio Monteiro. Tornou-se articulador da ida de Fernando Collor para a presidência da Comissão de Infraestrutura. Prestigiado, é um dos senadores mais poderosos da Casa, convidado para cafés com José Sarney ou caminhadas com Dilma Rousseff. Virou vice-líder do governo no Senado e, aguardem, vai ganhar mais. Roriz pode se gabar: elegeu um senador.

Flores Espinhos

"Sou apenas o líder do PTB", comenta Gim Argello, quando incitado a falar do poder que vem conquistando. "Não tenho tempo para mais nada". E sorri.

Gim não fugiu à regra que tem ditado o currículo de muitos na Casa. Entrou sob a mira do MP, principalmente por suspeita de grilagem de luxo de terras no Distrito Federal.

Porta aberta

Gim vem ganhando a Casa e aliados suprapartidários dia a dia. E por quê? Candidato ao governo ano que vem, ele será o palanque da petista Dilma Rousseff no Distrito Federal.

Terceiro mandato...

A OAB, que tanto gritou contra a ideia de terceiro mandato levantada por aliados do presidente Lula, queimou a língua. O vazio de líderes na Ordem em alguns estados tem feito com que alguns de seus presidentes se lancem a um terceiro mandato consecutivo.

... na OAB

É o caso de Estefânia Viveiros, no Distrito Federal, e Hélio Leitão, no Ceará. O exemplo promete ser seguido em outras seccionais.

Dois poderes

Na viagem do trem do Pantanal, semana passada, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) revelou a um aliado que Lula está tão preocupado em eleger uma base forte no Senado quanto Dilma.

Pratas da casa

A maioria dos novos diretores na cúpula do Banco do Brasil é de ex-estagiários do bancão, comemora um amigo da turma.

É a crise

As Lojas Americanas, que previam maior expansão este ano, começaram a renegociar prazos e a adiar abertura de novas unidades, principalmente em shoppings.

Mundo... réptil

A corregedoria do TJ-MG condenou o juiz Adelardo Franco de Carvalho Júnior por calúnia contra dois procuradores do INSS. Numa sentença, ele os qualificou de "répteis, já definidos como seus semelhantes que mostram o que são ainda na casca do ovo, antes da eclosão".

Castigo

Isso porque os procuradores alegaram não terem poder de jurisdição para cumprir um mandado. Pela pena de censura, à qual o juiz recorre, ele não terá direito a promoção durante um ano.