Entre os minimamente bem informados, há amplo entendimento de que contas da Previdência se tornaram insustentáveis
No início desta semana, acumulavam-se sinais de que o governo poderia estar prestes a jogar a toalha e, para efeitos práticos, dar por oficialmente abandonada a longa batalha pela aprovação da reforma da Previdência no atual mandato presidencial. E já se notava certa tensão, entre o Planalto e o Congresso, em torno da ingrata divisão do ônus político de tal desfecho.
Nos últimos dias, o governo entendeu que era preciso desfazer essa impressão. Anunciou que o Planalto estava empenhado em novo e decisivo esforço de mobilização da bancada governista para tentar aprovar, até o fim de fevereiro, uma proposta um pouco menos ambiciosa de reforma. Será a última ofensiva do governo em um longo jogo que se revelou ainda mais difícil do que de início se esperava.
Aos trancos e barrancos, ao fim de mais de duas décadas de esforços, é inegável que o país adquiriu compreensão muito mais clara da inevitabilidade da reforma. E boa parte desse avanço deve ser creditada à equipe econômica do atual governo.
Entre pessoas minimamente bem informadas, já há amplo entendimento de que as contas da Previdência se tornaram insustentáveis. Os números falam por si. Só na esfera federal, o déficit do sistema chegou a R$ 269 bilhões no ano passado. E a esta cifra tão absurda ainda têm de ser adicionados os assustadores déficits previdenciários dos governos subnacionais, cujos orçamentos vêm sendo inviabilizados pelo crescimento descontrolado das folhas de inativos. O Estado do Rio Janeiro é só o líder de uma longa fila de estados e municípios quebrados.
Tem também se disseminado a compreensão de que, sem a reforma da Previdência, não há como superar o quadro de descalabro fiscal que vem impedindo uma retomada sustentável do crescimento da economia e a eliminação do drama que hoje enfrentam 12 milhões de desempregados no país.
Em entrevista concedida em meados de janeiro, o secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, assegurou que, se a proposta de reforma fosse aprovada, não mais que 9,5% dos trabalhadores teriam perdas superiores a 1% do seu benefício de aposentadoria (“Valor”, 15 de janeiro). Com a recém-anunciada disposição do governo de flexibilizar em alguma medida a proposta de reforma, é bem provável que o percentual de trabalhadores significativamente afetados se torne ainda menor. E, no entanto, o governo está longe de estar convicto de que ainda será possível formar no Congresso a maioria de 60% requerida para aprová-la.
Entender por que uma reforma tão crucial — com resultados potenciais tão promissores e com custos mais significativos restritos a uma parcela relativamente pequena do eleitorado — continua a enfrentar tantas dificuldades para ser aprovada é tema para discussões intermináveis. Mas parcela importante da explicação tem a ver com a resistência ferrenha que as castas mais bem posicionadas de funcionários públicos vêm fazendo à reforma. Embora isso seja mais do que sabido, ainda falta compreensão clara de como tal resistência vem de fato bloqueando a formação da maioria requerida para aprovação da reforma no Congresso.
Não parece ser uma questão meramente eleitoral, que poderia advir de preocupações do parlamentar com possíveis reações da parte do seu eleitorado composta por funcionários públicos. Isto pode até explicar o comportamento das bancadas do PT e de outros partidos de esquerda. No caso dos partidos da base aliada, contudo, as razões da oposição à reforma parecem ser bem mais diretas.
Com frequência, o parlamentar está irremediavelmente enredado pela teia de interesses de toda uma extensa parentela de funcionários públicos — quase sempre bem posicionados — tanto em Brasília quanto nos estados: cônjuge, pais, irmãos, cunhados, filhos, genros, noras, sobrinhos e netos.
Seria muito bom se evidências mais objetivas e sistemáticas das reais proporções desse enredamento pudessem ser levantadas tanto pela mídia como em pesquisas de mais fôlego.
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio
No início desta semana, acumulavam-se sinais de que o governo poderia estar prestes a jogar a toalha e, para efeitos práticos, dar por oficialmente abandonada a longa batalha pela aprovação da reforma da Previdência no atual mandato presidencial. E já se notava certa tensão, entre o Planalto e o Congresso, em torno da ingrata divisão do ônus político de tal desfecho.
Nos últimos dias, o governo entendeu que era preciso desfazer essa impressão. Anunciou que o Planalto estava empenhado em novo e decisivo esforço de mobilização da bancada governista para tentar aprovar, até o fim de fevereiro, uma proposta um pouco menos ambiciosa de reforma. Será a última ofensiva do governo em um longo jogo que se revelou ainda mais difícil do que de início se esperava.
Aos trancos e barrancos, ao fim de mais de duas décadas de esforços, é inegável que o país adquiriu compreensão muito mais clara da inevitabilidade da reforma. E boa parte desse avanço deve ser creditada à equipe econômica do atual governo.
Entre pessoas minimamente bem informadas, já há amplo entendimento de que as contas da Previdência se tornaram insustentáveis. Os números falam por si. Só na esfera federal, o déficit do sistema chegou a R$ 269 bilhões no ano passado. E a esta cifra tão absurda ainda têm de ser adicionados os assustadores déficits previdenciários dos governos subnacionais, cujos orçamentos vêm sendo inviabilizados pelo crescimento descontrolado das folhas de inativos. O Estado do Rio Janeiro é só o líder de uma longa fila de estados e municípios quebrados.
Tem também se disseminado a compreensão de que, sem a reforma da Previdência, não há como superar o quadro de descalabro fiscal que vem impedindo uma retomada sustentável do crescimento da economia e a eliminação do drama que hoje enfrentam 12 milhões de desempregados no país.
Em entrevista concedida em meados de janeiro, o secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano, assegurou que, se a proposta de reforma fosse aprovada, não mais que 9,5% dos trabalhadores teriam perdas superiores a 1% do seu benefício de aposentadoria (“Valor”, 15 de janeiro). Com a recém-anunciada disposição do governo de flexibilizar em alguma medida a proposta de reforma, é bem provável que o percentual de trabalhadores significativamente afetados se torne ainda menor. E, no entanto, o governo está longe de estar convicto de que ainda será possível formar no Congresso a maioria de 60% requerida para aprová-la.
Entender por que uma reforma tão crucial — com resultados potenciais tão promissores e com custos mais significativos restritos a uma parcela relativamente pequena do eleitorado — continua a enfrentar tantas dificuldades para ser aprovada é tema para discussões intermináveis. Mas parcela importante da explicação tem a ver com a resistência ferrenha que as castas mais bem posicionadas de funcionários públicos vêm fazendo à reforma. Embora isso seja mais do que sabido, ainda falta compreensão clara de como tal resistência vem de fato bloqueando a formação da maioria requerida para aprovação da reforma no Congresso.
Não parece ser uma questão meramente eleitoral, que poderia advir de preocupações do parlamentar com possíveis reações da parte do seu eleitorado composta por funcionários públicos. Isto pode até explicar o comportamento das bancadas do PT e de outros partidos de esquerda. No caso dos partidos da base aliada, contudo, as razões da oposição à reforma parecem ser bem mais diretas.
Com frequência, o parlamentar está irremediavelmente enredado pela teia de interesses de toda uma extensa parentela de funcionários públicos — quase sempre bem posicionados — tanto em Brasília quanto nos estados: cônjuge, pais, irmãos, cunhados, filhos, genros, noras, sobrinhos e netos.
Seria muito bom se evidências mais objetivas e sistemáticas das reais proporções desse enredamento pudessem ser levantadas tanto pela mídia como em pesquisas de mais fôlego.
Rogério Furquim Werneck é economista e professor da PUC-Rio