sábado, julho 10, 2010

RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA
A nação rubro-negra e seus bad boys
RUTH DE AQUINO
Revista Época
RUTH DE AQUINO
é diretora da sucursal de ÉPOCA no Rio de Janeiro
raquino@edglobo.com.br
Vencer, vencer, vencer. Uma vez Flamengo, Flamengo até morrer. O clube planeja processar o goleiro Bruno por perdas e danos. Danos morais, porque o crime macabro de Eliza manchou a imagem do Flamengo e traiu uma torcida apaixonada, do tamanho da população do Canadá. Danos financeiros, porque só faltava a assinatura no contrato que venderia Bruno ao Milan por 15 milhões de euros. Foi um golpe no coração rubro-negro. Foi um rombo no caixa da Gávea.
O goleiro Bruno é o exemplo mais radical e extremo de uma geração de talentosos atletas rubro-negros que, em quase duas décadas, se tornaram astros mimados, vaidosos, indisciplinados e sem limites. Foi depois da era Zico. Entrou a turma do oba-oba. Como em famílias ricas que passam a mão na cabeça dos pimpolhos que acabam em delegacias, acusados de tráfico de drogas e acidentes de trânsito com morte, o Flamengo permitiu que destrambelhados vestissem o manto rubro-negro e fizessem suas estripulias impunemente.
Um time que apostava nas categorias de base e sempre teve como lema “Craque o Flamengo faz em casa” passou a sofrer com o antiprofissionalismo e a falta de pudor de alguns elementos.
Em 1992, um artilheiro do Flamengo, o Gaúcho, foi uma das más influências sobre o grupo. Apresentou a boemia aos Gaúcho’s boys, Djalminha, Marcelinho, Marquinhos, Paulo Nunes. A partir do ano 2000, quando o Flamengo passou a lutar várias vezes contra o rebaixamento, surgiu a “turma do chinelinho”. Para quem não sabe, eram os jogadores que apareciam de chinelo alegando contusão para não treinar. Poder, dinheiro, estrelismo, vaidade, tudo isso sobe à cabeça de muitos jogadores que saíram de favelas. Alguns eram os mais promissores, os que atraíam mais torcedores aos estádios. Ou se dá limite, ou já era.
Só faltava assinar o contrato para vender Bruno ao Milan por €15 milhões. O Flamengo quer processá-lo
Quando o Edmundo, o Animal, chegou ao Flamengo, em 1995, ele e o baixinho Romário deram uma contribuição musical à glamorização da malandragem: o Rap dos Bad Boys. Com bad boys no seu time, você pode comemorar/Somos bad boys, isso não tem nada a ver/..../O point preferido: quiosque Viajandão/Tem muito futevôlei, e o pagode é da pesada. Em dezembro de 1995, Edmundo provocou um desastre de trânsito que matou três pessoas.
Não é preciso proibir sexo nem sorvete, ou virar evangélico. Mas integridade e caráter são essenciais, especialmente em ídolos que inspiram nossas crianças. É uma ironia que, logo quando a dupla exemplar Patricia Amorim e Zico assume para arrumar a casa, ídolos do Flamengo como Adriano, Vágner Love e Bruno mergulhem numa escalada de violência e escândalos envolvendo traficantes, mulheres, brigas, orgias... culminando agora com um homicídio triplamente qualificado, com requintes de crueldade. Na sexta-feira, Bruno, herói altivo de tantas disputas em campo, tinha trocado seu figurino elegante de goleiro por um uniforme vermelho de presidiário em Minas Gerais. E ouvia de populares os gritos que sempre o perseguirão: “Assassino!”. Seja qual for o desfecho da investigação.
O Flamengo gastou ao todo em torno de US$ 5 milhões para ter os direitos econômicos sobre Bruno. Em troca do goleiro, deu ao Atlético Mineiro um atacante, Tardelli, que valia US$ 2 milhões, e pagou US$ 1,5 milhão em dinheiro. O restante foi pago a Bruno e seu empresário. Agora, na negociação com o Milan intermediada por seu ex-jogador Leonardo, o Flamengo ganharia uma fortuna. “Esse pateta pôs tudo a perder”, disse a ÉPOCA uma fonte do clube. O Flamengo brigará na Justiça para não ser obrigado a pagar metade do salário a Bruno enquanto não for condenado, como prevê a lei trabalhista.
“Um débil mental que jogou sua vida no ralo e comprometeu o clube” – essa é a imagem de Bruno no Flamengo. Por que o goleiro não tirou de sua remuneração mensal de R$ 300 mil um naco para dar de pensão a Eliza e ao filho dele, Bruninho? Totalmente alheio à realidade, como se fosse um psicopata desprovido de remorso, Bruno só se preocupava, na delegacia de homicídios do Rio, com sua improvável escalação para a Copa de 2014 no Brasil.

RUY CASTRO

Cérebro com pernas
RUY CASTRO
FOLHA DE SÃO PAULO - 10/07/10


RIO DE JANEIRO - Paul, o polvo inglês de dois anos e meio, cidadão de um aquário em Oberhauser, no norte da Alemanha, previu ontem que a Espanha baterá a Holanda e levará a Copa. Previu também que a Alemanha ganhará hoje do Uruguai e ficará em 3º lugar, magro consolo para quem já se imaginava mais uma vez campeão mundial.
Paul acertou todos os seus palpites na Copa até agora, e é isto que está injuriando os alemães -porque, depois de adivinhar os bons resultados da Alemanha nas primeiras fases, o polvo prognosticou que ela seria derrotada na semifinal. O que, pela já notória infalibilidade do molusco, teria abatido o moral dos jogadores contra a Espanha e os levado a perder. Em retaliação, os alemães querem comer o polvo com salada de batata.
Tal reação, puramente emocional, não faz justiça a um povo que, nos últimos 500 anos, nos deu Lutero, Kant, Hegel, Schopenhauer, Marx, Engels, Nietzsche, Freud, Lukács, Walter Benjamin, Heidegger e Adorno, sem os quais o ser humano teria de ser levado ainda menos a sério. E isso para ficarmos apenas nos filósofos de carteirinha, porque, na Alemanha, qualquer poeta, dramaturgo, músico, designer ou vendedor de chicletes de bola é capaz de produzir uma vibrante "Weltanschauung" sobre a "Weltschmerz" -uma visão do mundo pelo tédio, desencanto e depressão, ou coisa parecida.
Que os alemães acreditem num polvo vidente é normal -afinal, anatomicamente, um polvo é quase um cérebro com pernas, definição que se poderia aplicar também a seus pensadores. O injusto é que, por revanchismo, queiram jogar sobre os tentáculos do bicho o custo da derrota na Copa.
Se as ameaças a Paul continuarem, o Brasil deveria oferecer-lhe asilo e emprego num instituto de pesquisa. Com a corrida presidencial sujeita a tantas variantes, o palpite do polvo seria tiro e queda.

MÔNICA BERGAMO

DESPERTA O TIGRE
MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SÃO PAULO - 10/06/10

Mais um capítulo na disputa entre o Ministério Público e fabricantes de cereais para crianças: a Kellogg's recorreu à Justiça para se defender e tentar derrubar a ação que sofre por suposta publicidade irregular para a garotada. Acusada de estimular o consumo de produtos não saudáveis, a fabricante do Sucrilhos diz que a propaganda é regulamentada pela Anvisa. Afirma que não estimula o consumo excessivo e que "não há evidências" de que seus produtos tenham altos índices de açúcar, sódio e gordura.

NÃO ENGORDA 
"Há posicionamento de especialistas opinando que outros fatores, tais como falta de exercício físico e de equilíbrio na dieta, seriam os grandes responsáveis pela obesidade", escreve o advogado Ruy Dourado, que assina a defesa. 

CARTILHA
O ministro do Esporte se impressionou com a fluência do presidente da Fifa, Joseph Blatter, no nosso idioma. Os dois se encontraram na Copa da África. "O português dele melhorou bastante, está ótimo. Quando eu elogiei, ele respondeu: "Estou me preparando para 2014'", diz Orlando Silva. O brasileiro, por sua vez, está estudando inglês. 

NOVELEIRO
Miguel Falabella enviou a sinopse de uma nova novela das sete para a TV Globo. A trama, que terá uma butique com o nome de "Comprai", se dará em torno de duas costureiras que fazem vestidos falsificados. O autor escreveu as personagens para Zezeh Barbosa e Mary Sheila. 

SUPERSHIRLEY 
A top model brasileira Shirley Mallmann, 33, fotografa amanhã, no Rio, a campanha da marca de moda praia Adriana Degreas. O ensaio será feito na casa de Olavo Monteiro de Carvalho, em Santa Tereza. 

RIO NEGRO
Os músicos Zola e Seun Kuti, filho de Fela Kuti, e o escritor nigeriano Chris Albani são alguns dos participantes confirmados para a segunda edição do festival africano "Back2Black", no Rio de Janeiro, em agosto. 

SOBRE NÓS 
Paula Goldman, filha do governador Alberto Goldman, de SP, lança no próximo dia 13 "Eldorado". O docudrama dirigido por ela, sobre tráfico de pessoas, será exibido no 5º Festival de Cinema Latino-Americano, no Memorial da América Latina. 

DIREITO AUTORAL
O Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor) realizará um debate sobre a reforma da Lei do Direito Autoral no dia 19, no Tuca, em SP, com a presença do ministro Juca Ferreira, da Cultura. O músico Fernando Anitelli, do grupo O Teatro Mágico, e o rapper Gog serão alguns dos palestrantes.

TALHERES E TELAS 
O designer Hugo França promoveu um jantar em seu apartamento, nos Jardins, nesta semana, em torno de Zesty Meyers, dono da galeria R 20th Century, em Nova York. Artistas plásticos e escritores estavam entre os convidados.

BALADA PRÉ-FERIADO
O músico e documentarista Márcio Werneck comemorou seu aniversário de 40 anos, anteontem, com festa no Centro Cultural Rio Verde, na Vila Madalena. O evento teve shows de Skowa e do Gueto.

CURTO-CIRCUITO
O empresário João Doria Jr. recebe convidados para um almoço hoje no restaurante Badebec Montanha, em Campos do Jordão.
Caco Galhardo dá oficina de quadrinhos na Escola São Paulo, a partir de segunda. 
O grupo de dança Corpo apresenta o espetáculo "Imã" de 11 a 15 de agosto, no Teatro Alfa. Classificação: 12 anos. 
A cantora Maitê Perroni se apresenta no dia 20 de agosto, às 20h, no Via Funchal. Livre. 
O Festival de Arte Serrinha começa hoje e vai até o dia 31, em Bragança Paulista. 
O cantor Pierre Aderne faz show em Nova York no dia 15.

GOSTOSA

CLÓVIS ROSSI


Brasil, o líder impotente
CLOVIS ROSSI
FOLHA DE SÃO PAULO10/07/10
 



País foi incapaz de resolver um só problema na sua região. Agora, perde o bonde no caso de Cuba

Louvado por toda a parte como potência emergente, como participante ativo em todos os grandes temas que ocupam a agenda do planeta, o Brasil não consegue, paradoxalmente, acertar uma, uma que seja, no subcontinente, a América Latina, que seria o seu quintal natural, sem qualquer conotação pejorativa.
Não serviu para arbitrar o conflito entre Argentina e Uruguai, na crise das "papeleras", a fábrica de celulose na divisa entre os dois vizinhos, crise que virtualmente paralisou o Mercosul. Não serviu para pacificar Hugo Chávez e Álvaro Uribe.
Não serviu para resolver o conflito hondurenho.
Gritou e rangeu os dentes, mas não conseguiu evitar a cessão aos EUA de bases na Colômbia.
Agora, está perdendo o bonde da história no caso de Cuba, se é que a história ainda anda de bonde.
A ilha mora na memória sentimental da esquerda brasileira e latino-americana, inclusive de integrantes do atual governo brasileiro que deixou desde o nascedouro de ser de esquerda.
Não obstante, cabe a outros agentes atuar na hora em que Cuba vive a sua mais grave crise desde que o colapso da União Soviética privou-a do padrinho e financiador generoso.
O presidente Raúl Castro teve a coragem de admitir os problemas, a ponto de prometer reformas.
É verdade que "reformas" é uma muleta retórica a que recorrem todos os governantes na hora da dificuldade, mesmo quando não especificam de que reformas se trata.
Ainda assim, o regime cubano até faz pouco achava-se imune a elas, pela perfeição do socialismo que implantara.
Para fazer reformas que de fato melhorem as condições de vida na ilha, era preciso, no entanto, livrar-se do problema dos presos políticos, sem o que não haveria hipótese de cooperação da União Europeia, por exemplo.
O Brasil, grande amigo de Cuba, ajudou nesse processo? Nadica de nada.
O grande agente foi a Igreja Católica, que negocia saídas desde maio, até obter, na quarta-feira, o anúncio da libertação imediata de cinco presos e, em três ou quatro meses, de mais 47.
O cardeal Jaime Ortega, arcebispo de Havana, consultou até Washington, o arqui-inimigo de Havana.
Depois, envolveu-se a Espanha, que também consultou Washington.
Foi justamente durante a estada do chanceler espanhol Miguel Ángel Moratinos que se deu o anúncio da libertação de presos, em uma insólita concessão do regime a uma ação externa.
O próprio cardeal Ortega, segundo o "El País", constatou a peculiaridade: "Esperávamos libertações, mas foi um pouco interessante e quiçá surpreendente que se fizessem públicas estando aqui o chanceler Moratinos".
Omisso nesse capítulo, o Brasil ainda pode ter um papel.
Em outubro passado, o presidente Barack Obama comentou com o presidente do governo espanhol, José Luis Rodríguez Zapatero, que não podia dar novos passos, na aproximação com Cuba, "se eles [os cubanos] não os dessem também".
Vai ser difícil achar, fora Lula, outro interlocutor, tanto de Obama como de Raúl Castro, capaz de levar essa mensagem a Havana.
Só é preciso ter a coragem da franqueza, dever dos amigos, aliás.

TUTTY VASQUES

Que vença, enfim, o futebol!

TUTTY VASQUES
O ESTADO DE SÃO PAULO - 10/07/10


Só um jogão daqueles, amanhã, salvará esta Copa de uma chatice quase total. Nada tão medíocre quanto o futebol praticado na Itália, em 1990, o que de certa forma mostra uma evolução entre o início e o fim da era Dunga, sem deixar de caracterizar um período sofrível até o fim em matéria de craques, de lances inesquecíveis e de apresentações de gala.
Tirando o polvo, o Mick Jagger, a Jabulani, o frango do goleiro inglês, o gol que só o juiz não viu contra a Alemanha, o finalzinho de Uruguai x Gana e o pisão do Felipe Melo no Robben, sobram os beijos do Maradona no Messi, o sobretudo do Dunga, o belíssimo gol de mão do Luís Fabiano, a gravidez do Cristiano Ronaldo, a sensualidade da namorada do Casillas, os seios da musa paraguaia, a visita da rainha ao vestiário...
Apesar de tudo, entretanto, Espanha e Holanda decidem amanhã a sorte da Copa da África do Sul com boas chances de nos fazer esquecer até da vuvuzela. Do jeito que a rapaziada anda carente de bons espetáculos, 90 minutos de magia no Soccer City bastarão para salvar a reputação do futebol. É por ele, afinal, que a gente precisa torcer na final. Bom jogo a todos!
Símbolo da vitória
O governo da Argentina ainda não se pronunciou sobre a localização em Buenos Aires da estátua que se projeta para Maradona. Isso quer dizer o seguinte: não está de todo afastada a ideia de colocá-lo pelado nas imediações do obelisco do cruzamento das Avenidas 9 de Julho e Corrientes.
Bye, bye África
"Não vou ficar pra botar azeitona na empada de ninguém!"
Lula, justificando sua ausência na final da Copa.
Repescagem da sorte
A torcida holandesa voltou a sorrir! Como Lula decidiu de última hora não assistir à final no Soccer City, talvez aquele polvo vidente queira mudar seu prognóstico favorável à Espanha.
Sem casquinha
Num primeiro exame do fiasco brasileiro na Copa do Mundo, Dunga diagnosticou que "vai ficar uma ferida". Que nojo, né não?
Quem?
Prova maior de que o brasileiro não está mais nem aí pra Copa do Mundo, já tem torcedor por aí chamando a vuvuzela de vuvulani e a Jabulani de Jabuzela.
Vai encarar?
A rainha Sofia ficou de voltar com amigas ao vestiário da Espanha, caso a Fúria sagre-se campeã no Soccer City. É mais um motivo para Xavi, Iniesta & Cia amarelarem na final.
Nada é pra já!
Ricardo Teixeira não vai comemorar seus 21 anos na presidência da CBF. Está juntando um dinheirinho para, em 2014, festejar bodas de prata em grande estilo.
Efeito dominó
Dispensado por sua equipe do GP da Inglaterra, Bruno Senna está considerando a hipótese de mudar de nome. A coisa está feia pro lado dos Brunos. 

GOSTOSA

DIOGO MAINARDI


REVISTA VEJARobben, a ilha e o jogadorDIOGO MAINARDI

“Se, depois de sair da Ilha Robben, Nelson Mandela derrotou o fanatismo racista, Robben, com seus dribles, deu um passo adiante, ridicularizando o fanatismo politicamente correto e a propaganda multirracial”
A ilha Robben. Nelson Mandela passou duas décadas preso na Ilha Robben. O regime do apartheid tinha ali sua mais temida cadeia. E quem foi o mais temido protagonista da Copa do Mundo na terra de Nelson Mandela? Isto mesmo: Robben, o camisa 11 do time da Holanda, o ponta-direita repetidamente chutado por Michel Bastos e pisoteado por Felipe Melo.
Robben é branco. Van Bommel é branco. Sneijder é branco. Iniesta é branco. Casillas é branco. Villa é branco. De acordo com a Lei de Registro Populacional, promulgada pelo regime do apartheid, os finalistas da Copa do Mundo, Holanda e Espanha, foram escalados da seguinte maneira:
Holanda (4-2-1-3) – Branco; coloured, branco, branco e branco; coloured e branco; branco; branco, branco e branco. Técnico: branco.
Espanha (4-4-2) – Branco; branco, branco, branco e branco; branco, branco, branco e branco; branco e branco. Técnico: branco.
A última final de Copa do Mundo com tantos jogadores brancos ocorreu quando Nelson Mandela ainda estava preso na Ilha Robben. Só o vestiário de um campo de críquete, nos tempos do regime racista, poderia igualar-se ao vestiário do estádio de Johannesburgo, na final desta Copa do Mundo.
Além de ser branco e de ter o nome de uma temida cadeia do regime do apartheid, Robben jogou com aquele seu uniforme laranja. O laranja, da casa real holandesa, era a cor dos colonos bôeres. Trata-se de mais um símbolo do passado segregacionista encarnado por Robben. A arquibancada do estádio de Johannesburgo, com todos os torcedores vestidos de laranja, evocava o Estado Livre de Orange.
Os holandeses chegaram à Cidade do Cabo em meados do século XVII, com a Companhia das Índias Orientais. Eles ocuparam o território, disseminaram a escravatura, massacraram os zulus, combateram os ingleses, apoiaram os nazistas e, finalmente, segregaram os negros durante o apartheid. Quase 400 anos antes da canhotinha de Robben, os holandeses já eram temidos protagonistas naquele lugar.
Da Ilha Robben a Robben, porém, tudo mudou. A memória do apartheid só permaneceu como instrumento de poder do partido de Nelson Mandela, o CNA. Em vez de ser usado, como no passado, para segregar os negros em guetos nefandos, atualmente ele é usado apenas para tentar acobertar as nefandezas cometidas pelos mandatários do CNA, como o presidente Jacob Zuma, um dos antigos prisioneiros da Ilha Robben.
Se, depois de sair da Ilha Robben, Nelson Mandela derrotou o fanatismo racista, Robben, com seus dribles, deu um passo adiante, ridicularizando o fanatismo politicamente correto e a propaganda multirracial. O temido protagonista do time da Holanda fundou, com sua canhotinha, o Estado Livre de Robben.

MERVAL PEREIRA

Vexame Internacional
MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 10/07/10


Chega a ser patética a tentativa das autoridades brasileiras de se livrarem do vexame que protagonizaram diante da atuação exitosa do governo espanhol para liberar presos políticos de Cuba. Trabalhando junto à Igreja Católica de Cuba, o governo da Espanha, representado por seu ministro das Relações Exteriores, Miguel Ángel Moratinos, conseguiu obter do governo ditatorial cubano o compromisso de libertar 52 dos 167 presos políticos do país, figura que o presidente Lula dizia que não existia na sua ilha caribenha preferida.
O ministro Celso Amorim chegou a insinuar que o Brasil teve “atuação discreta” na decisão, e o assessor especial Marco Aurélio Garcia, dublê de coordenador da campanha de Dilma Rousseff, ainda menosprezou a atuação da Espanha, sugerindo que a participação brasileira teria sido mais efetiva, apesar de “discreta”, e que o chanceler espanhol apenas se aproveitou da situação para anunciar o fim das negociações.

No entanto, não é de hoje que a oposição cubana se queixa da posição brasileira de alegar a “não ingerência” nos negócios internos de outro país para se eximir de pressionar o governo cubano a favor dos direitos humanos.

Na primeira visita de Lula a Cuba como presidente, logo após a crise em que alguns dissidentes que tentaram fugir da ilha foram fuzilados, houve muitas queixas de que Lula não tocara no assunto em seus encontros.

Na ocasião, Frei Betto, que era assessor especial da Presidência, garantiu que Lula conversara com Fidel, que ficara irritado e cobrara dele atuação mais firme na reforma agrária, a favor do MST.

O fato é que Lula e todos os membros do governo que têm uma relação pessoal com Cuba consideram que não devem fazer críticas públicas ao governo cubano.

Alegam que é mais eficiente tratar de assuntos delicados discretamente. É uma tática de quem trata com um amigo, e não de Estado para Estado. E os resultados, até o momento, têm sido nulos.

Essa atitude já produziu fatos não condizentes com o Estado democrático, como a entrega ao governo cubano — que os resgatou em território nacional, à noite, em um avião venezuelano — dos pugilistas cubanos Guillermo Rigondeaux e Erislandy Lara, que haviam fugido da concentração durante os jogos do campeonato Panamericano no Rio em 2007, e queriam ficar no Brasil asilados.

Meses depois, desmentindo o governo brasileiro, que disse que os cubanos pediram para voltar ao seu país, Erislandy Lara, bicampeão mundial amador da categoria até 69 quilos, chegou a Hamburgo, na Alemanha, depois de ter fugido em uma lancha de Cuba para o México.

Em 2009, Rigondeaux acabou fugindo para Miami, nos Estados Unidos.

O prestígio internacional do presidente ficaria abalado depois de sua atitude diante da morte do dissidente cubano Orlando Zapata Tamayo em uma prisão, após 85 dias de greve de fome.

Lula chegou para mais uma de suas visitas a Cuba justamente no dia em que Zapata morreu, e em que outro preso político, Guilhermo Fariñas, começava a sua greve de fome, que só terminou agora com o acordo patrocinado pela Espanha e pela Igreja Católica.

Lula posou sorridente ao lado de Fidel e Raul Castro, e, quando questionado sobre a greve de fome, fez diversas declarações, todas elas defendendo o governo cubano e acusando os presos políticos.

“Temos de respeitar a determinação da Justiça e do governo cubano de prender as pessoas em função da legislação de Cuba, como quero que respeitem a do Brasil”.

Como se na ditadura cubana houvesse leis para serem acatadas.

Ou então: “Eu gostaria que não ocorresse (prisão de presos políticos), mas não posso questionar as razões pelas quais Cuba os prendeu, como não quero que Cuba questione as razões pelas quais há pessoas presas no Brasil”.

Continuando a confundir presos políticos com criminosos comuns, dentro da mesma linha adotada pela ditadura cubana, Lula saiuse com esta: “Eu acho que greve de fome não pode ser utilizada como um pretexto dos direitos humanos para libertar pessoas. Imagine se todos os bandidos que estão presos em São Paulo entrarem em greve de fome e pedirem liberdade”.

Na ocasião, o jornal espanhol “El País”, que havia lhe dado o título de homem do ano, criticou sua atitude em um editorial, afirmando que o governo brasileiro poderia exercer mais pressão sobre o regime cubano, em especial na área de defesa de direitos humanos.

Além do fato de que não é verdade que o governo brasileiro tem por princípio a não interferência nos assuntos internos de outros países — basta lembrar a atuação de nossa diplomacia no caso de Honduras —, o próprio Lula já se gabou de ter dito ao presidente Barack Obama que ele deveria ter a mesma audácia dos eleitores que o colocaram na Casa Branca, e acabar com o bloqueio econômico a Cuba.

Portanto, quando é para defender os interesses da ditadura cubana, Lula está sempre à disposição. Mas não move uma palha para conseguir de seus amigos uma atitude mais humanitária em relação aos presos políticos.

Mas, se é verdade que atua com discrição nos bastidores, até o momento suas ações, tanto em Cuba quanto na ditadura teocrática do Irã, têm sido fracassadas.
Algum assessor precisa urgentemente avisar à candidata oficial, Dilma Rousseff, que rubrica é uma assinatura abreviada, de acordo com o dicionário.

Portanto, não adianta alegar que não “assinou” o programa enviado ao TSE, mas apenas “rubricou”. Dá no mesmo.

JUMENTA

DORA KRAMER

Abuso do cachimbo 
DORA KRAMER
O ESTADO DE SÃO PAULO - 10/07/10


A Receita Federal confirmou: as declarações de renda do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas, relativas aos anos de 2008 e 2009 foram consultadas por auditores autorizados. Não diz o motivo da consulta nem revela o nome, ou nomes, de quem buscou acesso aos dados que, segundo revelou o jornal “Folha de S.Paulo” em junho, teriam sido incluídos em dossiê a ser usado como arma de guerra eleitoral.

De acordo com o jornal, as informações fiscais de Eduardo Jorge faziam parte de uma série de papéis preparados pela campanha presidencial do PT, que, evidentemente, nega com veemência qualquer envolvimento em preparação de dossiês e em quebras de sigilo de quem quer que seja.
O problema é que o comportamento da Receita no episódio não é exatamente um convite ao crédito na isenção.
Primeiro porque levou quase um mês para chegar à conclusão de que não houve violação nem invasão em seus sistemas de armazenamento de dados. Protelou a divulgação de algo que teria condição de conferir muito rapidamente. 
Em segundo lugar porque não revela - e, portanto, esconde - a identidade do responsável, ou responsáveis, pela quebra do sigilo. A Receita alega que ainda precisa aprofundar as investigações para saber se os acessos às informações sobre o tucano foram motivados “por razões de serviço” ou não.
De quanto tempo mais, além do mês já transcorrido, será que a competentíssima (no que tange à arrecadação de impostos) Receita Federal ainda precisa para obter essa resposta dos auditores que consultaram as declarações de Eduardo Jorge Caldas? 
Naturalmente se a consulta tivesse sido feita “por razões de serviço” a informação teria sido dada de imediato. A demora nos remete ao caso do caseiro Francenildo Santos Costa.
Testemunha de acusação contra o então ministro da Fazenda Antonio Palocci (confirmava que o ministro frequentava uma casa de lobby em Brasília), Francenildo teve seu sigilo bancário violado por servidores autorizados da Caixa Econômica Federal.
Por motivação política. Era uma tentativa do governo de desmoralizar a testemunha mostrando depósitos de dinheiro incompatíveis com a renda do caseiro.
A urdidura acabou se voltando contra os urdidores, pegos em ato de uso do aparelho do Estado em proveito próprio. E como se sabe a visão de bocas tortas em geral denuncia abuso no uso do cachimbo.
Comparativo - A estimativa dos gastos das campanhas eleitorais por Estado mostra que o custo mais alto por eleitor será em Roraima (R$ 116,72) e o mais baixo no Rio de Janeiro (R$ 4,87).
A tabela fornece argumentos aos defensores do financiamento público de campanha, que, segundo cálculos já feitos, custaria R$ 7 por eleitor. Nesta eleição dos 26 Estados mais o Distrito Federal, só em quatro (São Paulo, Rio, Minas e Rio Grande do Sul) o custo per capita fica abaixo disso.
Mas é como argumentam os detratores do financiamento público: uma vez instituído, nada assegura que não haveria também recursos “não-contabilizados” nas finanças eleitorais. Além do mais, mesmo com custos mais elevados o dinheiro que circula hoje nas campanhas não sai diretamente do Orçamento público.
Mão dupla - A Espanha abrigará os presos políticos que a ditadura cubana se comprometeu a libertar. Já o Brasil fica com o dístico de ter devolvido a pedidos do regime castrista os dois esportistas que integravam a delegação de Cuba nos jogos Pan-americanos de 2008.
De acordo com o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, o Brasil participou das negociações com Havana, mas não anunciou porque optou pela discrição.
Pois é um caso inédito de país que vê vantagem diplomática em afagar ditadores pública e festivamente, enquanto atua em prol da democracia de forma imperceptível.
Faz um estardalhaço em defesa da paz no Oriente Médio, mas prefere ser discreto na intermediação democrática em seu próprio continente.