domingo, junho 05, 2011

J. R. GUZZO - O ministro não conta


O ministro não conta
J. R. GUZZO
REVISTA VEJA
Entre os sinais que marcamum país como subdesenvolvido, ninguém mais discute, há muito tempo, que o baixo nível da educação está. na linha de frente. Não dá para disfarçar; uma ferida bem no meio da testa. Há muitas outras marcas desse tipo, claro, todas visíveis quando se presta um mínimo de atenção à paisagem pública, e nenhuma delas está em falta no Brasil que se pode ver à nossa volta. São coisas muito simples. Todo país subdesenvolvido, por exemplo, tem mosca; não há exceções. Os aeroportos, em vez de terem à sua volta hotéis operados pelas grandes cadeias internacionais, são cercados por favelas. Homicidas confessos podem começar o cumprimento de suas penas onze anos após o crime que cometeram, quando não são ""cidadãos comuns". É uma estrada que vai longe. A cada realidade dessas, é como se uma placa de sinalização avisasse: "Atenção: você está num país subdesenvolvido". Não adianta, aí, ter um PIB que passa dos 2 trilhões de dólares, assistir ao lançamento de imóveis com preços de Manhattan ou anotar o que diz a máquina de propaganda do governo. O atraso continua do mesmo tamanho, indiferente a tudo isso - e não vai mudar por mais que se avance aqui ou ali, enquanto esses sinais estiverem presentes. Não vai mudar, para começo de conversa, enquanto a educação pública no Brasil for o que é hoje.
As autoridades que mandam hoje no ensino público nacional estão convencidas de que a função principal do MEC nao e transmitir conhecimento, mas colocar a sociedade brasileira no molde político e ideológico que elas consideram ideal para o país

Ela é o que se sabe. Nos oito anos e meio da atual gerencia, a educação brasileira continuou solidamente estagnada na sua situação de calamidade, entre as piores do mundo a cada pesquisa que sai. Os professores não sabem ensinar, os diretores não sabem dirigir e os alunos não conseguem aprender. Os burocratas do Ministório da Educação, é claro, jogam em cima do cidadão e da mídia uma apavorante massa de números e estatísticas, o tempo todo, para mostrar quanto progredimos; dez minutos depois ninguém se lembra de mais nada do que disseram, e a realidade não se altera. Não, nem de longe, no ritmo que seria indispensável para dar condições mínimas de competição ao aluno da escola pública - e diminuir a desvantagem que o separa, em termos de conhecimento, de quem pôde estudar nas boas escolas. Numa situação dessas, a população brasileira que vai acabar pagando perto de 1,5 trilhão de reais em impostos até o fim do ano - teria o direito de esperar que o MEC estivesse trabalhando dia e noite para tirar nossas escolas do terceiro ou do quarto mundo em que vivem. Mas não é o que acontece. É verdade que o MEC, ultimamente, não sai do noticlário, o que pode dar, até, uma impressão de grande operosidade. O problema é que não aparece por estar cumprindo melhor a sua obrigação, que é ensinar. Aparece porque deu para produzir episódios cada vez mais esquisitos, um depois do outro. Nenhum deles tem qualquer coisa a ver com o ensino da regra de três ou com a Batalha de Tuiuti. Todos têm a ver, apenas, com o deslumbramento dos atuais burocratas do ministério em dar à educação brasileira uma abordagem "popular", "democrática", "moderna", "avançada" ou de "esquerda" - ou tudo isso junto.

As autoridades que mandam hoje no ensino público nacional estão convencidas de que a função principal do MEC não é transmitir conhecimento, mas colocar a sociedade brasileira no molde político e ideológico que elas consideram ideal para o país. Em vez de ensinar, acham que a prioridade do ministério é combater o racismo, resolver o problema da renda ou promover a "diversidade" de preferências sexuais. Acreditam que os alunos tem de receber instrução politicamente "correta" e que devem ser treinados para admirar as realizações do governo. Querem, inclusive, transformar o português numa língua "democrática" e livre de regras criadas pela elite. O primeiro resultado disso é a sequência de disparates que o MEC tem criado nos últimos tempos. Vai-se, ai, da condenação por "racismo" da Tia Nastácia, de Monteiro Lobato, ao "kit" de incentivo à homossexualidade, uma ideia tão ruim que o próprio governo desistiu de levar a coisa adiante. Ou, então, da inércia na organização dos exames do Enem à licença para escrever "nós vai pescar". O segundo resultado é que, com todas essas preocupações, não sobra tempo para ensinar o que é o ângulo reto.

Como um país pode ser desenvolvido se a grande maioria da sua população não aprende o que precisa? O ministro da Educação talvez saiba a resposta - mas, se souber, não está contando para ninguém.

FERNANDA TORRES - Catumbi



Catumbi
FERNANDA TORRES
REVISTA VEJA - RIO
Uma vez, à noite, caminhando em direção a um restaurante em uma avenida de Los Angeles, cruzei com um grupo ruidoso de rapazes. Na penumbra, os dreadlocks dos cabelos e as bermudas largas deram ao conjunto um ar de gangue. Talvez as imagens da rebelião nas ruas de LA em 1992 tenham me vindo à cabeça, não sei, o fato é que, quando os vi chegando perto, agarrei discretamente o braço do meu consorte em busca de proteção.
Um dos jovens percebeu e me perguntou em voz alta: “Você está com medo de mim?!”. Em seguida se dirigiu jocosamente para os amigos e repetiu: “Ela está com medo de mim!” — e foi embora entre o espanto, a ofensa e a galhofa.
Passada a vergonha, uma revista involuntária das razões que me levaram a ter medo de um bando de moleques inofensivos me fez lembrar que, fora a falta de coragem congênita, eu nasci em uma cidade violenta.
Não se anda distraído no Rio de Janeiro. Já vi gatuno de faca furtando em ônibus, já sofri assalto à mão armada. Já tive o lar invadido por larápios noturnos e parei de correr nas Paineiras por quase dez anos, depois de dar duas vezes de cara com cadáveres desovados na estrada.
É por essas e outras que nem na Suécia eu caminho despreocupada.
A violência urbana, impregnada em nós, é o lado mais sombrio do Rio de Janeiro. O país inteiro sofre desse mal, mas aqui ele formou impérios. Bairros inteiros, zonas preciosas da memória da cidade, sucumbiram em meio à pobreza e às armas.
O motorista escolheu subir para Santa Teresa pelo Catumbi. O percurso incluía um bordejo pela Rua Itapiru. Há muito tempo eu não visito minhas primas no casarão da Rua Itapiru. Quando passamos em frente ao endereço, abri a janela para vê-lo melhor.
Parte da minha infância foi ali, no sobradão de dois andares com frontispício esculpido em pedras gigantescas. Ele foi herdado por meu tio Viriato, em um inventário que dizimou o que restava dos bens da família portuguesa proprietária de incontáveis imóveis na redondeza.
Minha tia Áurea gostava de fazer a lista dos morros vizinhos à propriedade: Querosene, Coroa, Formiga... Não sei nem se são esses mesmo, mas guardei assim. Os anos agravaram a tragédia geral e os estampidos de tiros se tornaram frequentes.
Minhas primas herdaram a casa depois da morte de minha tia. Foram elas que assistiram ao exército de homens de moto e escopeta descendo para o asfalto, foram elas que testemunharam o sumiço da polícia, em um pacto sinistro de temor e respeito ao território inimigo. Foram as duas que se viram obrigadas a criar os filhos em uma zona de guerra.
E não estou falando de uma viela tomada pelo poder paralelo, mas de uma rua larga, de duas mãos, com alta circulação de ônibus e caminhões que desemboca no Centro.
O carro seguiu, estávamos com hora marcada para uma entrevista no hotel em Santa Teresa.
Inúmeros prédios de uma arquitetura lusa preciosa se insinuavam pelo vidro. “E se as UPPs pacificarem minimamente esta cidade? E se o investimento que entrar for aplicado corretamente?”, ponderei incrédula. Talvez um dos poucos bairros que resistiram à corrida imobiliária do fim do milênio tenha a chance de recuperar a elegância.
Passado o cemitério, viramos à direita em uma ladeira íngreme. Como é linda Santa Teresa. Pura Graça, bairro lisboeta onde ainda circulam os elétricos. Residências antigas, banhadas pelo sol do outono, faziam parecer insano escolher outro lugar para viver.
Mas Santa Teresa preservou sua nobreza, mesmo com todos os dissabores. O Catumbi, não. Dele sai ou desemboca grande parte das favelas do alto do morro. Desde “os salões da Rua Itapiru, na casa das Novaes”, quando a rainha do rádio Marlene cantava “o calor estava abrasador”, versos de Tome Polca, que o Rio se esqueceu do Catumbi.
De localização estratégica, entre o Centro, a Tijuca e a Zona Sul, a região merece atenção. Com a relativa trégua das metralhadoras, seria emblemática a devolução do Catumbi aos cariocas.
Quem sabe, nesse dia, eu me cure da sina de tremer diante de meia dúzia de guris imberbes.

IVAN ÂNGELO - Foi engano

Foi engano
IVAN ÂNGELO
REVISTA VEJA - SP







O telefone tocou numa hora em que ele não costumava receber telefonemas, passava das 10 da noite. Pronto para sair, atendeu preferindo que fosse engano. Demorou um pouquinho para falar e uma voz feminina, ansiosa, sussurrou antecipando- se:

— Alô? É você?

Ia questionar — “você quem?” —, mas se conteve, porque o espírito brincalhão que às vezes o dominava enxergou a possibilidade de aprontar uma. (Mais tarde, ao tentar diminuir sua culpa por algum possível estrago em uma relação, explicaria: “Ora, eu sou eu, não sou? Então não falei nenhuma mentira na minha resposta”.) O fato de a voz vir sussurrada criou um tom de coisa escondida que estimulou aquele seu lado adolescente. Sussurrou de volta:

— É, sou eu.

Vozes sussurradas criam cumplicidade e intimidade. Não se pode dizer que ele tivesse disfarçado a voz de propósito. Mesmo porque do lado de lá não estava ninguém que ele conhecesse. Se tivesse a intenção de disfarçar a voz, imitando alguém com o objetivo de enganar, nem saberia a quem imitar, claro. Pode ser que, assim sussurradas, certas vozes se pareçam. O fato é que, do lado de lá, a voz gostosinha, sim, percebeu-a então como gostosinha, entregou confiante uma confissão, entre sussurrada e excitada:

— Ai, estou morrendo de saudade.

Pensou em cortar a conversa, dizendo “olha, você ligou para o número errado”, mas aquele lado adolescente não deixou. Ardiloso, ia dizer “eu também” quando, num sussurro ainda mais baixo, ela emendou:

— Morrendo de outra coisa também.

Não sacou na hora:

— Outra coisa?

— É... Uuuuiii... Entendeu?

Entendeu, um pouco escandalizado.

— Entendi. — E acrescentou, para apimentar um pouco a relação: — Eu também.

— Ela está aí?

Epa! Ela quem? Não havia “ela”. Mas a pergunta tinha sua lógica: se ele sussurrava era porque uma esposa/ amante/namorada deveria estar por perto; e ela sussurrava porque “alguém” poderia ouvir. Antes que pudesse responder, a confirmação veio sussurrada e rápida:

— Não venha hoje. Ele voltou.

Clique. Teve a sensação de ter perdido algo ao ouvir aquele clique. Algo que não tinha, que nem era dele, mas que sentiu como perda. Jamais saberia quem havia ligado, não tinha registro de chamadas na sua linha telefônica. Fantasiou que ela poderia ligar de novo, enganos acontecem mais de uma vez, um raio pode cair duas vezes no mesmo lugar. Essas coisas.

Passou alguns dias sem sair de casa à noite, trabalhando em projetos que precisava terminar. A grande cidade se mexia lá embaixo, luzindo possibilidades. Suspeitou — e só de suspeitar irritou-se consigo, com aquele ser lotérico que habitava uns cantos da sua cabeça —, suspeitou que estava usando o trabalho em casa como desculpa para estar ao alcance de um telefonema improvável, vindo de ninguém, para outra pessoa. Pôs um fim naquilo, saiu para a rua. Na grande cidade, quem é enturmado sabe para onde ir.

Dias depois, havia acabado de tomar banho para sair quando o telefone tocou. Atendeu e uma voz clara e bem-disposta falou:

— Pode vir. Ele viajou.

Clique. Não sabia para onde ir. Não sabia para quem ligar, como desfazer o engano. Ela nunca mais ligou. Imagina que ela, magoada, nunca mais procurou o homem para quem pensava estar ligando.

Entrevista DEMÓSTENES TORRES - REVISTA VEJA


Entrevista DEMÓSTENES TORRES
REVISTA VEJA


GUSTAVO RIBEIRO


O combativo parlamentar diz que o Congresso age bovinamente, o TCU está sob fogos e os promotores cansados, situação que põe em risco o estado de direito no Brasil

Em seu segundo mandato de senador, Demóstenes Torres (DEM-GO) não nega o rótulo de direitista. ao contrário de muitos parlamentares. O ex-procurador de Justiça ganhou notoriedade pela contundência com que critica o avanço do Executivo sobre as prerrogativas do Congresso e pela defesa aberta de bandeiras consideradas conservadoras e impopulares. Com o mesmo vigor com que levanta a voz contra o governo. também combate a política de cotas raciais para o ingresso nas universidades e a expansão irrestrita de programas assistencialistas. como o Bolsa Família. Líder do DEM no Senado, Demóstenes defende a ideia de que a profunda crise pela qual passa o partido - com seu pior desempenho nas urnas, no ano passado, e a migração de parlamentares para o recém-criado PSD de seu ex-correligionário Gilberto Kassab - deve servir de gatilho para a afirmação da legenda como representante da parcela conservadora da sociedade.

O congresso tem sido palco de sucessivos escândalos. Ainda assim, não há iniciativas para eliminar as más práticas. Por quê?

Antes do mensalão, ainda havia certo pudor dos parlamentares em abrir investigações. quebrar sigilos e dar uma satisfação ao eleitor. Foram tantas as CPIs que o governo impediu que tivessem qualquer resultado prático que o Parlamento se acomodou e hoje é diretamente mandado pelo Poder Executivo. E não é só por causa do reduzido número de parlamentares na oposição. E porque realmente os congressistas não querem apurar a conduta de nenhum colega e não querem fiscalizar o governo. Vivemos um momento crítico, de total submissão. De um lado temos o Executivo mandando por meio de medidas provisórias, e de outro o Congresso sem cumprir sua obrigação, a ponto de a quase totalidade das leis aprovadas ter origem no Palácio do Planalto. No fim das contas. o Congresso se comporta bovinamente.

Se o Executivo menospreza o Congresso, não seria porque os próprios parlamentares se apequenaram?

Sem dúvida. Podemos mudar toda a Constituição, à exceção das cláusulas pétreas, e deveríamos mudar o rito das. MPs. O governo perdeu o pudor de editar MPs absurdamente inconstitucionais, sem urgência ou relevância e que, em uma mesma peça, abarcam vários temas sem nenhuma relação entre si. A MP se tornou a única forma de o Executivo se relacionar com o Parlamento.

Por que a oposição não consegue impedir esse festival de medidas provisórias?

A oposição é a maior culpada por sua falta de articulação. Ela não se acostumou a não ser mais governo. Então, muitos dos nossos parlamentares querem migrar para o governo a qualquer custo. No DEM, meu partido, vivemos uma crise imensa. Muitos parlamentares desertaram do partido, num ato que desonra a vocação que receberam das urnas. Da mesma forma, o PSDB vive uma disputa entre os diretórios de Minas Gerais e São Paulo que se tornou maior que o próprio partido. A oposição se desorientou com o êxito popular do último governo e acabou se acovardando. Muitos queriam parecer governo. Ora, entre o original e a imitação, o eleitor certamente escolheria o original, e foi o que aconteceu-nas últimas eleições.

Como pode a oposição querer "parecer governo"?

Nossos candidatos passaram a defender algumas das principais bandeiras do governo, como a expansão do Bolsa Família. A16m disso, negaram seu próprio legado, como as privatizações. Esqueceram de reafirmar que acreditamos na necessidade de amparar as camadas mais humildes da sociedade. Foi por essa razão que o DEM criou o Fundo de Combate à Pobreza em 2000, prorrogado indefinidamente por mim em 2009. O DEM quis negar seu caráter conservador e liberal em vez de ressaltar que essas características são a melhor defesa do povo contra os desmandos do estado plenipotenciário. Apesar disso tudo, tivemos 44 milhões de votos. Esse número expressivo mostra que existe espaço para fazer oposição no Brasil, independentemente da popularidade do governo.

"O governo se aproveita da falta de freios para aparelhar o estado, empregando companheiros sem preparo para enfrentar as demandas do país. A medida que o governo se robustece, ele avança sobre os pilares da democracia"

O que falta, afinal, para a oposição agir como oposição?

Os partidos devem se fortalecer. Eu defendo a ideia de que o DEM deve abrir as porteiras e deixar sair quem não quiser mais cerrar fileiras conosco. Depois da debandada, temos de nos manter fiéis ao nosso ideário e descartar hipóteses absurdas como uma fusão com o PSDB. Os dois partidos têm origens muito diferentes. Até hoje temos visões antagônicas em determinados pontos. O que devemos fazer é nos aliar e prosseguir juntos.

Como o senhor avalia o caso que envolve o ministro Antonio Palocci?

Ainda é preciso esclarecer exatamente o que Palocci fez nessa consultoria. O silêncio dele só faz aumentar as suspeitas de que tenha enriquecido ilicitamente. Até porque sua empresa 6 bastante atípica: tem poucos clientes e um faturamento equivalente ao das maiores consultorias do país. Tudo indica que, depois do escândalo do caseiro, ele novamente tenha caído em tentação. Mais uma vez, a mão forte do governo parece estar pesando sobre o Congresso. Essa tentativa de blindagem que foi arquitetada pela base aliada só transmite duas mensagens: que Palocci realmente deve e que o governo é conivente com as atitudes dele, o que é inconcebível em um país democrático. Todo homem público deve prestar contas à população.

Quais os impactos da criação do PSD para a sobrevivência do DEM?

Esse novo partido prejudicou muito o DEM. Perdemos políticos expressivos, como a senadora Kátia Abreu, que será uma grande adversária à medida que o PSD se alinhar ao governo. Mas não adianta ficarmos com lamúrias. Por que tentar segurar quem não quer permanecer? Quem quiser ir que vá embora. A maior traição que se pode cometer com o eleitor é ser eleito para integrar a oposição e migrar para a base governista. Vivemos um momento em que muitos políticos se intimidam diante da maioria e se tornam travestis políticos. Quando terminar esse expurgo, temos de manter a unidade, ainda que em número reduzido, e largar bandeiras que não são nossas.

Quais são elas?

Defendemos uma política de segurança pública sem tantos benefícios aos detentos, como indultos e progressão de pena. A violência só refluiu em locais nos quais se aplicaram com rigor as políticas convencionais. É o caso do estado de São Paulo, onde os índices de homicídio diminuem ano a ano. A frouxidão penal 6 uma lástima e um incentivo para os criminosos. O que me estarrece é que o próprio governo reconhece isso. Na educação, defendemos firmemente o modelo de ensino integral, com incentivos para a pesquisa científica. Nas universidades, as cotas raciais devem ser substituídas por cotas sociais.

A oposição tem hoje alguém que sirva de modelo?

O maior oposicionista no Senado é, hoje, o ex-presidente Itamar Franco. Fiquei impressionado com sua capacidade de resistência. E um homem que mostra sua opinião a qualquer momento com destemor. Alguns senadores mais experientes, como Jarbas Vasconcelos e Pedro Simon, demonstram o mesmo espírito aguerrido. Aécio Neves começou bem, mas deve se acostumar com a vida parlamentar, diferente da que tinha como governador.

Qual é o perigo de um país com uma oposição debilitada?

Um país cujo governo não tem contraponto fica preso a uma "ditadura branca". O governo passa a controlar a máquina pública de tal forma que estrangula a atividade parlamentar e elimina qualquer forma de fiscalização. Vivemos em um estado de viés autoritário. Além de o Congresso já não funcionar mais, instituições de controle, como o Tribunal de Contas da União, são constantemente bombardeadas e o Ministério Público aparenta ter se cansado. Só nos resta o Supremo Tribunal Federal. Não é nossa intenção impedir o governo de agir, mas temos de ter condição de debater suas propostas.

Esse quadro impõe riscos a democracia?

O governo se aproveita da falta de freios para aparelhar o estado, empregando em todos os setores companheiros sem nenhum preparo técnico e capacidade para enfrentar de forma adequada as demandas do país. A medida que o governo se robustece, ele avança sobre os pilares da democracia, como fica evidenciado nas constantes tentativas de monitorar o trabalho da imprensa.

De que forma o gigantismo do Executivo pode ser contido?

Já propus um novo pacto federativo e. uma nova Assembleia Geral-Constituinte, que nunca andou no Congresso. Mas hoje duvido que o Congresso, tal como está, seja capaz de aprovar uma Constituição que não se contamine com os ideais autoritários do governo.

O DEM deve se assumir como um partido de direita?

Não tenha dúvida disso. É um partido que deve representar esse posicionamento conservador, e não ter vergonha disso.

O que significa ser de direita?

Significa defender o liberalismo, o livre mercado, o mérito e a eficiência máxima do estado. Embora comum, é descabida a associação automática e oportunista que a esquerda faz do pensamento de direita a extremistas monstruosos como Adolf Hitler e a governos de exceção como a ditadura militar. A direita não tem compromisso com a quebra da ordem constitucional. Ao contrário, ser de direita é justamente defender os valores institucionais, como a lei e a democracia. Por isso, a meu ver, ser de direita significa combater o ideário que põe em risco os valores mais nobres da democracia ao pregar o aparelhamento e o inchaço do estado, o desperdício de dinheiro público e o assistencialismo desmedido.

"O termo "direita" foi estigmatizado e associado a posturas retrógradas. A direita não tem compromisso com a quebra da ordem constitucional. Ao contrário, ser de direita é justamente defender os valores institucionais"

Por que o seu partido não se assume assim?

O termo "direita" foi estigmatizado e associado a posturas retrógradas, sem compromisso com a democracia. Eu defendo a ideia de que todo partido tenha um perfil muito definido e se mantenha coerente com seus princípios. O DEM precisa se assumir como um partido de direita democrático. Eu ficaria muito mal em um casaquinho vermelho, encampando ideias nas quais não acredito. Muitos dos meus colegas de partido rechaçam o rótulo de conservadores. O DEM é o quê, então? Se não podemos nos assumir conservadores, é melhor fundir o partido com um partido de esquerda, então.

O senhor acredita que a política de cotas raciais é apenas uma manifestação do assistencialismo desmedido que o senhor condena?

Sim. Sou contra qualquer tipo de cota. Se tivermos de estabelecer um critério, deve-se utilizar a renda. Uma cota social é mais justa que a racial. Os tribunais raciais que foram criados nas universidades são arbitrários. Apesar de reconhecer o sofrimento e a exclusão histórica que a população negra sofreu no Brasil, acredito que o grande problema em nosso país não é racial, mas econômico. O brasileiro é discriminado por ser pobre, e não pela cor de sua pele.

O Bolsa Familia não é um programa que faz justamente isso?

O que é absurdo nesse caso é a transformação desse programa em arma eleitoral. O Bolsa Família se tornou mais importante para o governo que qualquer projeto educacional. Não se fala em escola em tempo integral no Brasil, em políticas para robustecer nossa academia e, assim, transformar o país em uma potência nos próximos anos. Se o Bolsa Família foi mesmo um sucesso, ele já deveria estar hoje muito menor. Deveria ter um tempo limitado de participação e ser implementado junto com projetos de capacitação profissional para as famílias e acompanhamento do desempenho escolar das crianças atendidas, de modo a acabar com a dependência que elas têm do governo. Não é o que se vê. Tal como é hoje, o Bolsa Família em nada difere da benemerência interesseira dos velhos coronéis da política.

VEIA publica nesta edição uma reportagem sobre um corajoso documentário que discute a descriminalização da maconha. Qual é sua opinião a respeito?

Acho uma bobagem rematada, pois parte do pressuposto de que isso vai acabar com o tráfico. Todos os países que liberaram o consumo de drogas estão voltando atrás, caso de Portugal e Holanda. A droga é a origem de inúmeros crimes, e o usuário não pode ser tratado apenas como uma vítima, uma vez que alimenta esse ecossistema pernicioso. Além disso, a lei já o protege, impedindo o cumprimento de pena. Em vez de liberar o consumo de drogas, o governo deve construir centros dignos de tratamento e reabilitação para viciados.

MARIA CELINA D'ARAÚJO - Ares de transição


Ares de transição 
MARIA CELINA D'ARAÚJO
O ESTADO DE S PAULO - 05/06/11

Os acontecimentos políticos das últimas semanas representaram os primeiros questionamentos sérios acerca do que esperar do governo Dilma. Qual a gravidade da doença da presidente? Quais as razões da tensão entre PT e PMDB? E, mais importante, quem é Dilma Rousseff? Se estivéssemos na França a primeira questão ficaria restrita à esfera privada, mas estamos no Brasil.

Por razões óbvias, vou me deter nas outras duas. Começo afirmando que o governo Dilma tem sido visto até agora como um governo de transição e este é seu maior fardo. Não é um fim em si mesmo. Desde a campanha, assim tem sido entendido, até mesmo com a cumplicidade da presidente. É um governo tampão. Sem muita cerimônia, tem se admitido que é um interregno até o retorno de Lula ao poder. Nada pior para o governante do que ter caráter transitório. Tira-lhe legitimidade e autoridade.

Se é tampão, que interesse teria o PMDB em criar crises? Ora, se o governo for bem-sucedido, os ganhos não serão do PMDB e sim do PT. Se for um fiasco ou medíocre, o PMDB, nas vésperas das eleições de 2014, passará para a oposição, como fez nos governos Sarney e Collor. Seus compromissos são pragmáticos e eleitoreiros, valem enquanto for bom para o sucesso eleitoral do partido. Os embates do PMDB com o governo visam fundamentalmente a conseguir cargos e verbas. Trata-se do exercício de forte poder de chantagem com vistas ao controle de posições importantes na máquina pública em termos de prestígio e orçamento. Nada, portanto, que dignifique o partido e o País.

O PMDB, no entanto, tem razão quando reclama da concentração de poder nas mãos do PT. Dados parciais de pesquisa que venho realizando mostram várias evidências a esse respeito. Entre os altos dirigentes públicos, apenas 21% e 29% eram filiados a partidos, respectivamente, nos governos FHC e Lula. No entanto, os dados são expressivos quando se olha o partido de filiação desse grupo: no governo FHC, 30% pertenciam ao PSDB e 20% ao PMDB, os partidos mais representados. No governo Lula, a parcela do PT representou 60% e a do PMDB caiu para 15%. Os dados do governo Dilma parecem indicar situação ainda mais desfavorável ao PMDB e a todos os partidos da coalizão. Quando miramos o ministério, a situação é também emblemática: o PT controla metade das pastas e o PMDB mal chegou a um quinto no governo Dilma.

Do ponto de vista da biografia política, Dilma é uma outsider, embora conte com a pajelança de governadores e com um padrinho de peso. Pelo menos por enquanto. Politicamente fraca, não soube ainda construir sua popularidade, expressa-se mal, não tem o encantamento verborrágico de Lula. Não tem experiência de negociação parlamentar e conta com um quadro de amadores na política, ao lado de um grupo de raposas mofadas e de bancadas moralistas que a fazem refém de oligarquias e credos.

Dilma tem tempo para reverter esse quadro. Tem tempo, mas não se sabe se tem vontade e autonomia. Creio mesmo que é difícil. Ela é parte de uma "obra", é criatura, não criador. Está limitada pela vontade de seu chefe político, Lula, pela falta de compostura de colegas como Palocci, pela falta de escrúpulos do PMDB em usar seu descontentamento como chantagem explícita. Sua fragilidade a torna presa fácil de outros grupos organizados no Congresso que começam a lhe impor derrotas vergonhosas. Derrotas em duplo sentido: ou porque perde votações, como no Código Florestal, ou porque tem que ceder ouvindo ameaças grotescas de garotinhos da política.

O PMDB quer partilhar poder e se sente, com razão, legitimado para solicitar uma partilha mais equilibrada de cargos. Por outro lado, não é infundado falar de possível petização do Estado. Mais do que isso, é nosso ofício pensar nessa hipótese como parte de cenários no horizonte. O PT é o mais organizado de todos os partidos, o que mais tem controle sobre a atuação e perfil de seus quadros. Além do mais, é o partido que mais tem filiados entre os funcionários públicos, que por sua vez são a categoria com maiores taxas de sindicalização no País. Nossos servidores federais têm taxas escandinavas de filiação sindical: em torno de 75%. Esse capital associativo dá ao PT recursos de poder inéditos quando se trata da ocupação de cargos estratégicos na máquina estatal e de controle político dos sindicatos. É uma rede de interesses que beneficia o corporativismo, o aparelhamento do Estado, e o partido tem sabido usá-la com competência.

Enquanto Lula era presidente foi possível beneficiar o partido e fazer acordos no Congresso, até mesmo jogar o mensalão para baixo do tapete. Foi possível conviver com a ética da frouxidão moral sob o argumento de que todos roubam, todos fazem a mesma coisa. Lula tinha popularidade e o benefício da dúvida. Com Dilma é diferente, pelo menos por enquanto. Sendo uma liderança fraca, precisaria de bons articuladores políticos, de bons auxiliares. Não parece ser o caso.

Sabemos com objetividade que política se faz com negociação e acordos. Que nada há de espúrio em dividir cargos, em premiar aliados. No entanto, em meio a essas negociações e "crises" pouco se avança em termos de melhorar os controles sobre uma máquina pública deformada que mantém o Brasil como um caso notório de corrupção, impunidade no campo e nas cidades e deficiência nos serviços públicos.

Dilma tem a seu favor a Copa do mundo de 2014. A privatização dos aeroportos atende a uma causa popular e não será vista como estelionato eleitoral, muito menos como desvio neoliberal. E ela poderá ser lembrada como a presidente da Copa no país do futebol.

SUELY CALDAS - A agenda neoliberal do PT


A agenda neoliberal do PT 
SUELY CALDAS
O Estado de S.Paulo - 05/06/11

Para provar que o governo não parou com a crise Palocci, na última semana o governo Dilma anunciou três importantes novidades da chamada "agenda positiva": a privatização de três aeroportos, o plano Brasil sem Miséria e a abertura do mercado de TV a cabo para as empresas de telecomunicações. Neste momento difícil para seu governo e para os dois maiores partidos que a apoiam, Dilma Rousseff precisava reagir rapidamente e provar ao País que sua gestão tem rumo, não está perdida nem imobilizada. Recorreu a uma agenda para sair do inferno e recuperar o otimismo, propondo ações que, em passado bem recente, o PT rotulava de "neoliberais", sem saber direito o que dizia e sem preocupação em conhecer, por puro e oportunista preconceito ideológico.

Seguindo a estrutura do programa Bolsa-Família, o Brasil sem Miséria aboliu o princípio da universalização em programas sociais - defendido por ideólogos do PT até a ascensão de Lula (vide o programa Renda Mínima, do senador Eduardo Suplicy) - e adotou o princípio da focalização, que esses mesmos ideólogos condenavam pelo simples fato de ser recomendado pelo "neoliberal" Banco Mundial. O foco na miséria e na pobreza foi o princípio que estruturou o Bolsa-Escola, criado no governo FHC e que deu origem ao Bolsa-Família, o mais bem-sucedido programa social de todos os tempos, que tirou da miséria 28 milhões de brasileiros.

O Brasil sem Miséria traz duas intrigantes novidades. A primeira: ao longo de dois anos 70 mil famílias muito pobres receberão doação de R$ 2.400, em parcelas trimestrais, para preservar florestas e vender sua produção de alimentos. Não se sabe como o governo mapeou e identificou essas famílias, mas, fora da Amazônia, não há pessoas muito pobres com terras tão extensas a ponto de abrigar florestas. A segunda novidade é universalizar o acesso à água, com a construção de cisternas para uso de 600 mil famílias na área rural. Uma meta factível, nada difícil de cumprir, visto que, segundo o IBGE, dos 5.564 municípios brasileiros, só 33 não dispõem de água potável. Porém, surpreendentemente, o programa que promete erradicar a miséria ignora o escasso acesso à coleta de esgotos e detritos, potencial fonte reprodutora de pobreza, doenças e exclusão social. A urgência de uma ação eficaz nessa área contrasta com a lentidão da ação de sucessivos governos: de 2000 a 2010, a rede de esgotos instalada no País cresceu só de 42% para 45% dos lares. Sem atacar o problema, fica difícil falar em acabar com a miséria.

Como chega com enorme atraso, a decisão de privatizar os Aeroportos de Brasília, Guarulhos e Viracopos exige cuidado redobrado em todo o processo, porque a pressa pode custar caro ao País. Primeiro, é indispensável capacitar e fortalecer a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), torná-la eficiente na fiscalização e regulação e não permitir exageros dos consórcios privados vencedores, a começar pelas tarifas cobradas dos 43,7 milhões de usuários desses aeroportos. Segundo, a definição do modelo operacional e dos editais de licitação deveria ser confiada a uma empresa experiente e especializada, claro, sob orientação da Secretaria de Aviação Civil e do BNDES. Esse momento é crucial em qualquer privatização, quando definições de metas de expansão, prazos de concessão, regras de reajuste de tarifas, inúmeros detalhes de interesse público são firmados em contrato com os consórcios vencedores. O governo precisa avançar nessa direção o quanto antes.

Por último, a abertura do mercado de TV a cabo para empresas de telefonia foi enfim formatada pela Anatel. Bem-vindas a expansão do serviço e a concorrência, onde hoje só há monopólio, e a banda larga e a internet, onde não há nada. Em oposição ao monopólio, a abertura de mercado é sempre acompanhada do ingresso de novas empresas no setor, aumento do faturamento, queda de preços ao consumidor e geração de empregos. No Brasil isso ocorreu com o fim do monopólio da Petrobrás e da Telebrás e a privatização das teles estaduais. Na época o PT foi contra, preferia o paralisado e anacrônico monopólio estatal.

Dinheiro do além na eleição - REVISTA ÉPOCA


Dinheiro do além na eleição
ANDREI MEIRELES E MURILO RAMOS COM MARCELO ROCHA

A saga da empresa que saiu da falência, captou R$ 67 milhões em fundos de pensão de estatais e depois bancou a campanha de quatro candidatos do PT


Leonardo Carvalho
O início A sede da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em Brasília. Em 2009, o então diretor, Agnelo Queiroz, renovou a autorização da Barenboim. Meses depois, recebeu a contribuição dela para sua campanha eleitoral
Esqueça as tradicionais doações por fora de empresas em busca de favores políticos, os inesquecíveis “recursos não contabilizados” ou, ainda, os toscos pagamentos de caixa dois em sacolas com dinheiro vivo. Nas eleições de 2010, apareceu uma nova “tecnologia” no conspurcado mundo do financiamento de campanhas políticas: o doador que tem cadastro comercial, doa oficialmente, assina recibo – mas ninguém sabe quem ele é. Nem quem recebe e – só mesmo no mal-assombrado reino da política brasileira – nem sequer quem paga. A única coisa palpável é o dinheiro que chega, limpinho, aos comitês financeiros das campanhas. É como se eles fossem doadores-fantasmas.
Só que eles acabam deixando vestígios. ÉPOCA conseguiu capturar um deles. Seu nome é M Brasil Empreendimentos, Marketing e Negócios, empresa com sede no Rio de Janeiro, registrada em nome de um motoboy e de um sargento do Corpo de Bombeiros da Bahia. Ambos moram na periferia de Salvador. Nas últimas eleições, porém, a empresa distribuiu R$ 650 mil em doações a candidatos do PT.
A M Brasil deu R$ 100 mil ao Diretório Nacional do partido, R$ 300 mil ao comitê do governador eleito de Brasília, Agnelo Queiroz, e R$ 50 mil ao deputado paulista Ricardo Berzoini, ex-presidente do PT. Receberam R$ 100 mil também outros dois importantes quadros petistas: o deputado distrital Chico Vigilante, de Brasília, e o candidato derrotado a deputado federal pelo Espírito Santo Guilherme Lacerda, ex-presidente do fundo de pensão dos empregados da Caixa Econômica Federal, o Funcef.
Há recibos e há transações bancárias. Mas ninguém se recorda dessas doações ou da M Brasil. O deputado Ricardo Berzoini diz que não conhece a empresa nem seus donos. Guilherme Lacerda não se lembra deles. Chico Vigilante não lembra. E os responsáveis pela campanha de Dilma não quiseram explicar se lembram. “O importante é que foi uma doação legal, não pedi e não sei quem fez. Essa situação só vai mudar quando for aprovado o financiamento público de campanha”, afirma Vigilante.
O motoboy e o sargento também não confirmam se lembram ou não. ÉPOCA descobriu que quem assina as contribuições em nome da empresa é outro sócio: o radialista Jair Marchesini, um apresentador de televisão com atuação política no Rio de Janeiro. Em 2006, ele concorreu pelo PDT a um mandato de deputado federal, mas não se elegeu. Marchesini foi responsável pelo recrutamento do bombeiro e do motoboy para a criação da M Brasil e de outras quatro empresas. Marchesini nega que eles sejam, bem, laranjas: “Não é nada disso. Eles seriam meus sócios, me ajudariam a dirigir as empresas aqui no Rio”. A acreditar nas palavras de Marchesini, o motoboy e o sargento comungariam de dons sobrenaturais. E não seria o único traço fantástico na história.
Uma história de sucesso
Como uma empresa de papel captou R$ 67 milhões de fundos de pensão e irrigou campanhas leitorais do PT
Fotos: Carlos Silva / Adriano Vizoni / Leonardo Arruda / Anderson Schneider

Marchesini, o homem que colheu seus dois parceiros na Bahia, também é sócio do empresário carioca Pedro Barenboim, dono de uma distribuidora de medicamentos e de uma rede de farmácias no Estado. Há três anos, as empresas de Barenboim estavam perto da falência. Para contornar o problema, ele comprou, por R$ 1.000, o controle da M Brasil. Menos de um mês depois, ela fechou o primeiro de sete contratos com diferentes fundos de pensão. Pelos contratos, os fundos compraram títulos imobiliários da M Brasil. Esses contratos renderam, entre 2008 e as eleições do ano passado, R$ 67 milhões à empresa.
A empresa doou R$ 650 mil a quatro candidatos do PT e à direção nacional do partido
Aos fundos, renderam apenas prejuízo. Entre aqueles que deram dinheiro à M Brasil constam o Cibrius, dos servidores da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), órgão subordinado ao Ministério da Agricultura, e o Faceb, mantido pelos funcionários da Companhia Energética de Brasília. Em duas operações, o Cibrius despejou R$ 13 milhões na M Brasil. De acordo com o diretor superintendente do Cibrius, Fabrício Garcia, não houve interferência política na decisão de realizar os investimentos. “Atendemos a todas as exigências técnicas necessárias”, diz. Até agora, o prejuízo do fundo com esse investimento é calculado em pouco mais de R$ 200 mil. “Vamos executar as garantias oferecidas pela M Brasil para recuperar nosso dinheiro”, afirma Garcia.
As perdas do Faceb somam cerca de R$ 130 mil, devido a atrasos no pagamento dos rendimentos por parte da M Brasil – o Faceb investira R$ 4,4 milhões nos títulos imobiliários da empresa, adquiridos em junho de 2009. O fundo dos servidores da Terracap, a empresa estatal que administra os imóveis públicos no Distrito Federal, estima prejuízos na ordem de R$ 230 mil. Permanece duvidoso o motivo por que os sete fundos investiram nos papéis da M Brasil. E todos os responsáveis dos fundos ouvidos por ÉPOCA negam que esses investimentos tenham relação com uma possível ingerência política nos fundos.
Apesar do dinheiro recebido dos fundos de pensão por meio da M Brasil, o grupo Barenboim manteve-se endividado. Os bancos credores executaram as dívidas. Agora, os fundos tentam tomar de Barenboim os imóveis dados como garantia na venda dos títulos. ÉPOCA localizou o empresário Barenboim. Ele reconheceu estar por trás da M Brasil. Mas não explicou a barafunda envolvendo a M Brasil e as doações. Disse apenas que ajudou o PT por ter se tornado um fã do ex-presidente Lula. “Também doei para a campanha do Agnelo porque acho que ele fez um bom trabalho no governo”, afirmou Barenboim.
Agnelo Queiroz foi ministro do Esporte no primeiro governo Lula e diretor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) no segundo mandato do petista. Na Anvisa, assinou ato que beneficiou a empresa de Barenboim, contrariando regras da própria agência. Em dezembro de 2009, Agnelo renovou a autorização de funcionamento da M Brasil. No ano passado, com Agnelo fora da agência, a Anvisa indeferiu um novo pedido de renovação – há uma norma da agência que proíbe que uma mesma empresa atue como distribuidora de medicamentos e farmácia. “Vamos tentar reverter essa proibição na Justiça”, afirma Jair Marchesini, o sócio de Pedro Barenboim.
Os fundos de pensão envolvidos afirmam que acumulam prejuízos com a operação
Por meio de seu advogado, Luis Alcoforado, o governador Agnelo Queiroz afirmou que os atos assinados quando estava à frente da Anvisa são legais e legítimos. “É um tempo considerável para querer identificar conexão entre o ato e a doação. Ninguém sabia, em dezembro de 2009, que Agnelo seria candidato a governador”, diz Alcoforado. Segundo ele, o governador também não conhece os donos da Barenboim. Barenboim afirma que não houve qualquer relação entre a medida de Agnelo quando estava na Anvisa e sua doação à campanha dele. “Nem sabia que ele foi diretor da Anvisa”, disse Barenboim.
O único não petista a receber dinheiro da M Brasil foi o deputado federal Fábio Faria, do PMN do Rio Grande do Norte. É um parlamentar conhecido por flanar em festas do circuito Rio-São Paulo ao lado de estrelas da televisão, como Adriane Galisteu ou Sabrina Sato. Ele recebeu R$ 50 mil. Segundo Faria, um grupo econômico interessado em investir no Rio Grande do Norte ofereceu uma doação legal a seus arrecadadores de campanha. Ele não sabe por que o recibo foi emitido em nome da M Brasil, uma empresa que ele diz nunca ter ouvido falar. “Resolvi ajudar o Fábio porque ele é meu amigo, meu amigão”, afirma Barenboim. “Não sei quem é, nunca vi esse sujeito”, diz Faria.
Alguém, na certa, está vendo fantasmas.

Da gasolina ao shopping center - REVISTA ÉPOCA


Da gasolina ao shopping center
DIEGO ESCOSTEGUY, MARCELO ROCHA E MURILO RAMOS

Os incríveis negócios do senador Romero Jucá com recursos públicos – do posto de combustível de seu filho ao centro construído com dinheiro da Lei Rouanet
Dida Sampaio/AE, Igo Estrela/ÉPOCA e Leo Caldas/ÉPOCA
SEMPRE À SOMBRA 
O lobista Magela (abaixo, à esq.) diz que o senador Romero Jucá (no alto, à esq.) usou seu nome para comprar carros. Acima, o shopping Paço Alfândega, aberto pela família Jucá com recursos públicos obtidos por meio da Lei Rouanet
Há duas semanas, ÉPOCA acrescentou algumas linhas à extensa ficha do líder do governo – qualquer governo – no Senado, o peemedebista Romero Jucá, parlamentar pernambucano que representa Roraima e mora em Brasília. Entre as principais novidades da reportagem, constavam evidências de que o senador ganhara um apartamento de uma empreiteira, relatos de como ele recorrera a laranjas tanto para abrir empresas quanto para buscar dinheiro vivo com doleiros – e, finalmente, documentos comerciais que demonstravam o inusitado crescimento recente do patrimônio de sua família. Jucá, um espécime raro de político – que aprendeu não só a pairar acima das rivalidades ideológicas entre PT e PSDB, como a lucrar (politicamente) com elas –, não quis falar sobre o assunto.
Apesar do silêncio perante a opinião pública e seus pares, Jucá tratou de desmentir, em nota, o lobista Geraldo Magela, que concedera entrevista a ÉPOCA revelando ilegalidades cometidas ao lado do senador. Jucá mantinha havia anos amizade e negócios com Magela, relação rompida somente no fim de 2009, em razão de um calote estimado por Magela em R$ 3 milhões. Diante da reação de Jucá, o lobista Magela resolveu dar nova entrevista a ÉPOCA. Ratificou o que já dissera e contou outros episódios envolvendo sua convivência com o senador. “Estou ansioso para ser chamado pelos órgãos competentes e mostrar as provas das quais disponho”, diz Magela.
Magela contou que sua proximidade com Jucá era tamanha que, no segundo semestre de 1998, o senador lhe pediu que registrasse dois carros em nome da Pool Comunicações, empresa de Magela. Eram dois Peugeots 206, presentes para os filhos de Jucá. “Não posso aparecer”, disse Jucá, segundo o relato de Magela. Magela aquiesceu e repassou os dados da empresa aos assessores de Jucá. “Dias depois, recebi as notas fiscais na sede da minha empresa. Os carros foram comprados por Álvaro Jucá (irmão do senador) em São Paulo, à vista, e emplacados em Brasília”, afirma Magela. “Como em outros episódios, fui apenas laranja do senador. Não gastei um tostão.” Cerca de um ano e meio depois, Magela afirma ter passado procuração para que os filhos de Jucá vendessem os carros.
Nesse período, enquanto ainda tinham uma relação de absoluta confiança, Jucá teria pedido um estranho favor a Magela: queria usar o telefone e o fax de seu escritório. “Preciso mandar um fax para a Suíça, e só posso fazer isso na sua casa ou em Roraima”, disse Jucá, de acordo com Magela. O senador valeu-se do escritório de Magela em três ocasiões, sempre com o mesmo propósito. Com quem Jucá falava na Suíça? Qual foi o teor dos documentos enviados pelo fax? Jucá não quis responder a ÉPOCA. Magela prefere não fazer ilações: “Deduzi, é claro, que se tratava de um banco. Mas não perguntei, nem ele comentou, naturalmente”.
Igo estrela/ÉPOCA
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O Jaguar no qual roda Jucá está em nome do irmão (no destaque). Em Roraima, a gasolina do senador é comprada, com dinheiro público, no posto do filho (foto maior)
Além das negociatas relatadas por Magela, a família Jucá também tocou prósperos negócios com o setor público. Nas últimas semanas, ÉPOCA investigou uma nova história desse segundo tipo de negócio. A família Jucá obteve autorização do Ministério da Cultura para revitalizar, com R$ 3,8 milhões em recursos obtidos por meio da Lei Rouanet, uma área histórica do Recife, em Pernambuco, terra dos Jucás. Uma empresa da família Jucá levantou o dinheiro com estatais e empresas amigas. Em seguida, a mesma empresa da família Jucá repassou a maior parte dos recursos a uma empreiteira cujo dono era sócio do filho do senador – e, com o que sobrou dos investimentos, a família Jucá abriu um shopping center na área.
O negócio da família Jucá começou em 2002, ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, em que Jucá também foi líder. Em junho daquele ano, a Alfândega Empreendimentos, empresa oficialmente em nome de Álvaro Jucá, irmão do senador, apresentou o projeto ao Ministério da Cultura. Na documentação entregue à pasta, a que ÉPOCA teve acesso, a empresa prometia revitalizar prédio na área da Alfândega no Recife, construído no século XVIII para abrigar os padres da Ordem de São Felipe, do qual sobravam então apenas ruínas. Pouco antes, a família Jucá conseguira convencer os padres da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia a alugar o terreno. Os Jucás estimaram o projeto em R$ 27 milhões, mas o governo liberou a captação de somente R$ 3,8 milhões pela Lei Rouanet, que permite às empresas abater do Imposto de Renda valores doados a programas culturais.
A iniciativa resultaria num centro de cultura, lazer, gastronomia e varejo que “privilegie a divulgação da história, cultura e da gastronomia locais”, conforme a descrição enviada ao Ministério da Cultura. O tal centro resultou no shopping Paço Alfândega, inaugurado um ano depois, em 2003. Dotado de lojas sofisticadas, o Paço nasceu destinado à elite da capital pernambucana. O shopping foi construído em nome da mesma Alfândega, de Álvaro Jucá. O estacionamento do Paço, além de duas lojas de luxo, foi registrado em nome de Rodrigo Jucá, filho do senador.
Enquanto construía o shopping, a Alfândega, com a autorização do governo em mãos, buscou patrocinadores. Sete empresas se sensibilizaram: Petrobras, Banco do Brasil-DTVM, BMG, Belgo Mineira, AmBev, Souza Cruz e Siemens. Petrobras e BMG foram os maiores doadores. Boa parte das doações aconteceu após a inauguração do shopping, em 2003.
O doador que parece ter confiado mais na palavra da família Jucá foi o banco BMG, que pagou R$ 700 mil à Alfândega dois anos após o término das obras, em maio de 2005, quando Romero Jucá era ministro da Previdência. O maior negócio do BMG, como se descobriu no escândalo do mensalão, era o empréstimo consignado por meio do INSS, órgão subordinado ao Ministério da Previdência. Procuradas por ÉPOCA, algumas empresas negaram quaisquer motivações ilícitas para as doações e outras não se manifestaram.
Onde foi parar o dinheiro doado por essas empresas? A maior parte dos recursos acabou nas contas de duas construtoras: SAM e JAG Empreendimentos. A SAM recebeu R$ 1,8 milhão; a JAG, R$ 984 mil. O dono da SAM se chama Marco Ferraz Junior, é parente de Romero Jucá e sócio de seu filho Rodrigo Jucá numa empresa que administrava a garagem do shopping. E o que diz Ferraz Junior? Que quase não fez obras no shopping. “No Paço Alfândega, fiz apenas pequenos serviços”, afirma.
Quem construiu, afinal, o shopping da família Jucá? A JAG Empreendimentos. “Fomos a principal construtora do shopping”, diz Gustavo Miranda, o dono da construtora. “A SAM não tem nada a ver com essa obra.” A família Jucá não entregou qualquer nota fiscal ao Ministério da Cultura nem foi cobrada quanto a isso até que a reportagem de ÉPOCA alertasse a pasta. Em 2009, por causa das dívidas acumuladas pelo shopping, a família vendeu a maior parte de sua participação no Paço Alfândega. Mas comprometeu-se a restaurar outro prédio na região histórica do Recife: o edifício Chanteclair. Recebeu R$ 490 mil do governo, mas o prédio continua abandonado.
Enquanto o governo não cobra explicações, o senador Romero Jucá roda tranquilo por Brasília a bordo de seu Jaguar prata X-TIPE, modelo 2007. A máquina tem motor 3.0 com potência de 230 cavalos e está avaliada em R$ 100 mil. Há três multas, por excesso de velocidade, atreladas ao carro desde 2009. Elas somam pouco mais de R$ 250. Jucá não parece preocupado em pagá-las. Nem precisa. O carro está em nome da empresa A.J. Consultoria e Participações Limitada, de seu irmão Álvaro Jucá. Jucá também não se preocupa com os gastos para encher o tanque de seus carros em Roraima. Em abril, Jucá declarou ao Senado ter gastado R$ 5.521 para abastecer no Auto Posto Roma. A quem pertence o posto? Ao filho dele, Rodrigo. A família Jucá não tem misericórdia.

RUTH DE AQUINO - O pepino de Dilma


O pepino de Dilma
RUTH DE AQUINO

REVISTA ÉPOCA


Época
RUTH DE AQUINO é colunista de ÉPOCA
raquino@edglobo.com.br
Nunca antes foi tão vertiginosa a queda em desgraça de um político acusado de multiplicar seu patrimônio à base de consultorias. Em bom português, acusado de enriquecimento ilícito por tráfico de influência. Palocci virou o pepino de Dilma. Suspeito de contaminar fatalmente o governo, ele foi abandonado por todos os partidos como se fosse portador da bactéria Escherichia coli. O que leva a crer que o alvo não seja ele, mas a presidente e seu estilo. O espetáculo de uma Dilma acuada por inimigos e aliados é constrangedor.
Não se pretende aqui defender ninguém que, até o fechamento desta coluna, se mantinha mudo. O silêncio costuma ser associado a culpa, arrogância e certeza de impunidade. Não seria nada apropriado defender Palocci com o argumento de que os R$ 20 milhões ao menos foram declarados à Receita – enquanto a multiplicação do patrimônio dos políticos à nossa custa costuma estar oculta em cofres domésticos ou no exterior.
Pior ainda seria imitar Lula. Para defender os mensaleiros, o PT, Sarney & Cia. de todos os processos por desvios de ética e de verba pública, a lenga-lenga de Lula era: “Todo mundo sempre fez assim no Brasil”. No caso de seu braço direito maranhense no Senado, a defesa era mais prosaica: “Sarney não é um homem comum”. Por isso, deveria ser poupado e blindado. Aliados e adversários eram doidos para tascar um naco da popularidade de Lula. Era o presidente teflon. Nada grudava nele.
Dilma é uma daquelas frigideiras em que tudo pega. O que incomoda no affaire Palocci é ver todos irmanados no exercício de jogar pedras – e não convencem ninguém no papel de vestais da ética. Os políticos do PMDB, do PT e do PSDB se esqueceram até de acusar a mídia de tentar derrubar o chefe da Casa Civil. No governo Lula, os jornalistas eram sempre uns irresponsáveis por divulgar verdades incômodas.
Agora, o ex-governador do Rio de Janeiro, Garotinho, do alto de sua reputação ilibada, exige que “o diamante de R$ 20 milhões” explique a origem de sua fortuna. A senadora petista Gleisi Hoffmann, mulher do ministro Paulo Bernardo, um dos nomes cotados para substituir Palocci, recomenda – sem interesse pessoal, é claro – que o chefe da Casa Civil se afaste. O PT lava as mãos e tenta dizer à nação que a crise “é do governo, não do partido”. O PMDB, na figura do vice Michel Temer, se excita por enfim se sentir em condições de negociar os cargos que a presidente adiava. Está na hora de dar o troco por estes seis meses em que a dupla Dilma-Palocci o ignorou.
O espetáculo de uma presidente acuada por inimigos e aliados é constrangedor
Faz parte da democracia o embate entre os Três Poderes. Seria ingênuo, porém, imaginar que o Congresso defenda interesses da população ao se escandalizar com o patrimônio de Palocci. A mudança, no Planalto, de um líder populista e carismático para uma técnica de poucos sorrisos foi traumática para um Legislativo acostumado a reverências.
É preciso ter estômago e jogo de cintura para a política palaciana. Dilma pode ter descoberto que não foi talhada para isso. Imaginou que o cargo em si lhe conferia autoridade. Não basta. Ela não tem ascendência sobre sindicalistas, coronéis, caciques e cobras-corais. Lula sabia disso. Dilma convocou outro pragmático para dividir o poder. Nenhum dos dois é popular entre puxa-sacos. Dilma resistiu ao toma lá dá cá dos aspones que mamam nas tetas públicas. Acabou torpedeada de tudo que é lado. Nem ao anunciar o “Brasil sem miséria”, mais um programa para retirar milhões de brasileiros da pobreza extrema, Dilma sorriu de maneira convincente.
Foi embaraçoso ver Lula irromper de seu pseudodescanso para resgatar Dilma do isolamento. Um carimbo de desconfiança, permitido por ela. Perder seu braço direito em menos de seis meses de governo, ficar refém de Michel Temer e ser obrigada a reinventar seu temperamento para governar sem solavancos não faz bem à saúde. Mas pode tornar Dilma mais hábil. Quem sabe a saída de Palocci leve a mídia a investigar a multiplicação sonegada de patrimônio de vários chefões e chefinhos? O pepino pode não ser a causa do surto que contaminou o Planalto.

TUTTY VASQUES - Túmulo do tempo



Túmulo do tempo
TUTTY VASQUES
O ESTADÃO - 05/06/11
Já que, no final das contas, o impeachment do Collor voltará a ter lugar de destaque no chamado "túnel do tempo" do Senado, não custava nada aproveitar que vão mesmo mexer nos painéis ilustrados expostos na galeria para acrescentar outros fatos igualmente importantes para o bom entendimento do passado no Congresso Nacional.
Como deixar de fora momentos inesquecíveis como aqueles que, em 2000, se seguiram à violação do painel de votação do plenário por obra e graça de Antônio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda? Não se pode apagar daquelas paredes o que permanece vivo na memória popular.
Como esquecer, por exemplo, os momentos em que Eduardo Suplicy cantava Racionais MC, em especial aquele rap em que o senador interpretava em performance giratória os tiros da canção: "Pá, pá, pá, pá, pá, pá, pá... PÁ!" - lembra? O Brasil era feliz e não sabíamos!
Todo presidente do Senado deixou pelo caminho de acesso ao anexo 2 pegadas bem visíveis de sua gestão. Quem não se recorda, ainda que vagamente, da piada pronta do ranário da mulher de Jáder Barbalho? Tinha, salvo engano, Sudam no meio, e o escambau!
Os detalhes vão se perdendo pelo caminho. Muita gente não tem mais noção da função de um certo lobista no trepidante romance de Renan Calheiros e Mônica Veloso. Um simples desenho na parede pode ajudar a esclarecer.
Para bem contar essa história, nenhum roteiro - ilustrado ou audiovisual - pode desprezar fatos como a nomeação de funcionários fantasmas através de atos secretos da administração José Sarney. O atual presidente da Casa merecia um paredão só para ele no "túnel do tempo", né não?
Superstição

Desde que a Otan começou a bombardear a Líbia, Muamar Kadafi não troca de roupa. Cismou que a bata marrom está lhe dando sorte!
Fala sério!
Caiu de 15 para 5 minutos o tempo de participação de Ronaldo Fenômeno no amistoso Brasil x Romênia, no Pacaembu. Ele tem ainda até terça-feira para pensar se não é melhor dar só o pontapé inicial no jogo de sua despedida da seleção.
Pé na estrada
Deu na Sonia Racy que Sérgio Cabral caprichou no inglês ao cruzar dia desses com Christine Lagarde, candidata francesa ao FMI, em jantar de gala no hotel George V, em Paris: "See you in Washington!" É impressionante como gosta de viajar, né não?
Sabe o Merval?
Eleito imortal na Academia Brasileira de Letras, o jornalista Merval Pereira deve estar com a orelha em chamas de tanto que falam dele pelas costas nas principais redações do País. Pura inveja de colegas de profissão - ô, raça!
Grana da viúva
Da série "Roubar é humano", as Mães da Praça de Maio estão sendo acusadas na Argentina de enriquecimento ilícito por conta da má gestão do dinheiro público.
Tem dó!
Se levar mesmo à Presidência da República a ideia de uma campanha geral contra todas as formas de discriminação nas escolas, o ministro Fernando Haddad bem que podia incluir as louras neste pacote. As pobrezinhas não aguentam mais!
Paixão eterna
Lula trouxe de Cuba uma supercaixa de charutos para o pessoal do PMDB. Presente do Dia dos Namorados!
Não é mais aquele
Analistas políticos italianos creditaram a derrota de Berlusconi nas últimas eleições municipais à concorrência de Dominique Strauss-Kahn. Estão certos de que a popularidade do primeiro-ministro despencou depois que o ex-diretor do FMI tomou seu lugar nas manchetes de escândalos sexuais. 

ANCELMO GÓIS - Não deu no ‘NY Times’


Não deu no ‘NY Times’
ANCELMO GÓIS
O GLOBO - 05/06/11

Em dezembro, quem esteve no Rio e visitou discretamente o Morro Dona Marta foi a jornalista Jill Abramson, 57 anos, que acaba de ser anunciada como a primeira mulher a se tornar editora-chefe do “New York Times” em 160 anos de história do jornal. Jill confessou a uma coleguinha brasileira, na época, que, vista de perto, a miséria na favela pareceu menos chocante do que imaginava. 

Veja só...
Desde que Lula lançou, em agosto do ano passado, o programa Rio Top Tour, para estimular o turismo nas favelas, 24.333 pessoas já visitaram o Dona Marta, em Botafogo. O lugar atrai muitos estrangeiros. Em maio, segundo Márcia Lins, secretária estadual de Esporte e Lazer, foram 590 brasileiros e 418 estrangeiros. 

Golfe na Barra 
Reviravolta. Nem o Itanhangá Golf Clube e nem o Gávea Golf como sede das competições de golfe nos Jogos de 2016, no Rio. O COB e a prefeitura optaram pela construção de um novo campo, na Barra. João, 80 anos Até da China e da Rússia vieram convites para João ilberto fazer shows este ano. Mas nada foi fechado. 

Rock in Colômbia
Roberto Medina vai este mês a Bogotá conversar com o presidente Juan Manuel Santos. Na pauta, a realização de um Rock In Rio na Colômbia.

Pedro sem parede 
Pedro Luís, o cantor do Monobloco e da banda Pedro Luís e a Parede, finaliza seu primeiro CD solo em Londres, no Abbey Road, o lendário estúdio dos Beatles. Sai em outubro e inclui uma canção de Luiz Melodia.

Carnaval fixo
Stepan Nercessian, nosso deputado-artista, apresentou projeto na Câmara que cria uma data fixa para o carnaval. Deve gerar polêmica. O texto diz que “o feriado de carnaval será sempre na primeira terçafeira de março, independentemente do calendário religioso”. 

A razão...
A justificativa do projeto do boa-praça Stepan é econômica. Cidades como Rio, Salvador e Recife perdem muito dinheiro em turismo quando o carnaval cai no início de fevereiro, pois a pré-folia é curta. 

Brasil negro 
As Lojas Americanas e a Educafro, ONG da causa negra dirigida por frei David, marcaram um encontro para dia 15 agora. Ainda é o caso daquele rapaz negro acusado de furtar ovos de Páscoa e espancado por um segurança numa loja de Campo Grande, MS. 

‘Originales’ é a...
Estão à venda em Barcelona estas sandálias, versão chinesa das nossas Havaianas. Chamams e Bahianas, las Originales. Fala sério.

Diamante na Lapa
A Rádio Corredor diz que a WTorre está comprando muitos imóveis da quadra compreendida entre a Rua do Senado e as avenidas Gomes Freire e Henrique Valadares, na Lapa. A construtora, que ergue um prédio da Petrobras ali perto, teve Palocci entre seus consultores. 

Fecha a cortina 
O Teatro Ipanema está à venda por R$ 3,6 milhões. 

Rocinha em Paris 

A Rocinha será tema de exposição de 120 fotos em... Paris. Foram feitas pelo repórter fotográfico Alcyr Cavalcanti, convidado a mostrar suas imagens da favela na École Nationale Supérieure d’Architecture de Paris la Villette, de 7 a 27 deste mês. 

Calma, tia
De uma senhorinha enfezada, sexta, na Rua do Catete, no Rio, ao ser abordada por um mendigo que queria dinheiro: — Pede pra Dilma! Ela que prometeu erradicar a miséria! A tia seguiu andando, pisando duro, sem olhar para trás. Há testemunhas.