domingo, maio 11, 2014

Cada mãe a seu modo - MARTHA MEDEIROS

ZERO - HORA - 11/05

Costumam citar a nós, mães, como se fizéssemos parte de uma confraria homogênea, todas pensando e sentindo da mesma forma e com as mesmas necessidades.

O que temos em comum são justamente histórias distintas umas das outras. Que a gente viva uma realidade parecida com a de nossas amigas, é explicável, já que originadas do mesmo meio, mas e as outras tribos de mulheres? As indígenas, as faveladas, as evangélicas, as socialites, as presidiárias, as analfabetas, as PhD, as atletas, as aposentadas? Terão todas as mesmas necessidades, serão todas iguais?

Existe mulher de todo tipo. Nossas semelhanças? Somos ao mesmo tempo frágeis e fortes. Leoas, às vezes; em outras, gatas – conforme a exigência do momento. Todas vaidosas, umas mais e outras menos. Todas com a cabeça funcionando em carga máxima – mulher pensa demais, muito, exageradamente, o que não significa que esteja pensando certo. Falantes? A maioria. Doces? É parte da lenda.

Fora isso, uma é diferente da outra. Tem a que humilha a atendente da loja e tem a atendente de loja que aguenta calada porque não pode perder o emprego. Tem a que nunca trabalhou porque não precisa, e a que nunca trabalhou porque até agora não lhe deram uma chance. Tem a que é professora de dia e aluna à noite – segue tentando se qualificar para ver se melhora o salário.

Tem a que ganha a vida fazendo sexo, a que aguarda um primeiro amor, a que aguarda um novo amor e a que deseja que seu marido desapareça e que a libere para si mesma. Tem a que apanha do seu homem e tem a que bate nos filhos, tem as honestas e as nem tanto.

Tem mulher que não sabe se defender e tem mulher que sabe atacar, tem as muito bacanas e as muito chatas, tem as feias, as belas e a maioria.

Tem mulher que é magra de ruim, tem a gorda sem culpa e tem a que não se pesa. Tem as que gostam de homens, as que gostam de mulher e as que gostam de ambos.

Tem a maluca. A turma das malucas forma um contingente considerável, vale ressaltar. E tem as certinhas, as que jamais erram, o que não deixa de ser uma maluquice também. Tem a que se arrepende secretamente de ter tido filhos e a que teve e nunca imaginou que seria uma experiência tão espetacular e intensa, e tem as que não tiveram, mas que são mães das árvores, mães dos bichos, mães do planeta. E todas, sem exceção, são filhas de uma mulher com suas próprias necessidades secretas.

Mãe é mãe, só muda de endereço. Essa frase virou um clássico. Reforça a ideia de que em cada endereço há uma mulher idêntica a todas as outras, com o mesmo padrão de comportamento, fazendo e sentindo tudo igual. Reproduzidas em série.

O que pouco se diz é que em cada endereço há uma mulher parindo a si mesma – diariamente.

Novo foco de tensão - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 11/05

Vencida a etapa das coligações, os aliados do governo Dilma esperam um novo foco de tensão: a presença do ex-presidente Lula no pleito. O PMDB quer que ela seja reduzida onde houver dois palanques. Mas um de seus líderes reconhece: “Não vai ser fácil segurar”. No Encontro Nacional do PT, Lula avisou: “Eu não sou obrigado a seguir os acordos firmados pelo (presidente do PT) Rui Falcão”.

As leis criadas nos tribunais
O STF reescreve a legislação eleitoral e a Justiça do Trabalho, a legislação trabalhista. O presidente da CNI, Robson Andrade, protesta contra essa conduta: “Estão sendo ampliados direitos sem considerar a competitividade da economia”. Cita dois casos. No setor elétrico, a Justiça tem decidido que os trabalhadores de empresas prestadoras de serviço devem ganhar salários e direitos como se fossem funcionários das estatais. As empresas que colocam ônibus próprios, para transportar seus trabalhadores, poupando-os do transporte coletivo superlotado, estão sendo condenadas a pagar como hora trabalhada o tempo gasto com o percurso até a empresa.

"A preferência nas pesquisas pelo voto nulo, pelo voto em branco, é uma tragédia nacional! É o descontentamento com as lideranças (políticas)" 
Cristovam Buarque 
Senador (PDT-DF), sobre a sucessão presidencial 

Habilidade e base parlamentar
Desde a gestão do ex-presidente Sarney que não se via presidente com tantos contenciosos com sua base. Os partidos que apoiam a presidente Dilma têm 360 votos, inferior apenas aos 395 do ex-presidente Fernando Henrique (1999-2002).

Divisão de trabalho
O comando da campanha petista ainda não decidiu se a presidente Dilma virá ao Rio na campanha. Ela tanto pode não vir quanto promover um ato com os quatro candidatos aliados: Pezão (PMDB), Lindbergh (PT), Garotinho (PR) e Crivella (PRB). Já o ex-presidente Lula, afirmam que sua tendência é a de vir ao Rio pedir votos para Lindbergh Farias.

Piada de salão
Contam que o comentário está sendo feito nas cidades-sede da Copa: “Depois que o ministro Gilberto Carvalho começou a promover reuniões com os movimentos sociais, as manifestações contra a Copa do Mundo voltaram às ruas”.

Só no sapatinho
Para avaliar a evolução da CPI da Petrobras e definir estratégias, o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), concordou em se reunir uma vez por semana com o governo. A operação foi acertada quarta-feira, no Jaburu, com o vice Michel Temer; o presidente da Câmara, Henrique Alves; e os ministros Aloizio Mercadante e Ricardo Berzoini.

Em debate a qualidade
O presidente do PSDB de Minas, Marcus Pestana, contesta comparação de Eduardo Campos (PSB) na Educação. Diz: “Quantidade não é qualidade. Pernambuco investiu mais no ensino médio, mas Minas é o terceiro do ranking e eles, o nono”.

Na mesa, a credibilidade
O líder do PSB na Câmara, Beto Albuquerque, avalia que os tucanos têm um problema de credibilidade: “Quem acredita quando dizem que vão manter os programas sociais?”. Sua avaliação é que Aécio representa apenas o antipetismo.

A FIFA INFORMA: foram vendidos 2,3 milhões de ingressos para a Copa do Mundo. Destes, 44% (um milhão) foram adquiridos por estrangeiros.


Antidepressivo - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE S. PAULO - 11/05

Dilma Rousseff e o comando de sua campanha à reeleição apostam em dados compilados por Marcelo Neri, da Secretaria de Assuntos Estratégicos, para construir um discurso contra o pessimismo com a economia. De acordo com os números, apresentados à presidente e a vários ministros há uma semana, a renda média do brasileiro voltou a crescer a partir do segundo semestre do ano passado, e a desigualdade social teria caído mais sob Dilma que no governo Lula.

Curva A Pesquisa Mensal do Emprego do IBGE mostra que o rendimento médio real do trabalhador patinou no início de 2013. Em julho, era de R$ 1.937, abaixo do valor de junho de 2012. A partir de agosto, voltou a crescer e chegou a R$ 2.026 em março.

Cilada 1 Coordenadores da campanha de Dilma notaram que Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) engataram discurso "reativo" às ações do governo e vêm sendo cobrados sobre a continuidade ou encerramento de programas lançados pelo PT.

Cilada 2 Para os dilmistas, a continuidade desse cenário garante à presidente o poder de pautar o debate eleitoral nos próximos meses.

Na Copa Depois de discussões internas sobre a data da convenção que oficializará a candidatura de Dilma, o PT marcou o evento para o dia 21 de junho, um sábado, provavelmente em Brasília.

Cipoal O modelo de discussão do programa de governo de Campos e Marina Silva afugentou parte dos especialistas convidados. Um colaborador disse não ter ido à oficina sobre energia porque "centenas" de propostas seriam levantadas.

Brainstorm Mas ao menos um mote surgido no debate deve ir para a campanha: "racionalizar agora para não racionar depois", que alfineta tanto Dilma quanto Aécio, devido ao racionamento do governo FHC, em 2001.

Mudou Antes avessos a uma aliança, deputados do PSD agora defendem abertamente que Gilberto Kassab seja vice de Geraldo Alckmin (PSDB) em São Paulo. "Se a candidatura Kassab não prosperar, defendo caminharmos com o governador", diz Guilherme Campos.

Canetada 1 O PSDB acionou a presidência do Tribunal de Contas paulista colocando sob suspeição a conduta do conselheiro Roque Citadini, que mandou paralisar o processo licitatório da linha 18-bronze do metrô após pedido de uma empresa alheia ao assunto.

Canetada 2 "Qual seria o incômodo ou interesse do conselheiro no modelo [de licitação] que está sendo realizado?", questiona o deputado estadual tucano Orlando Morando, que assina a representação contra Citadini.

Vacina David Uip, secretário de Saúde de Alckmin, se reúne amanhã com militantes tucanos para orientá-los no debate que será travado com Alexandre Padilha (PT) sobre o tema. Um dos objetivos é fornecer dados para um discurso de tentar desconstruir o Mais Médicos.

Importação O delegado federal Márcio Anselmo, que coordenou a Operação Lava Jato, relatou a colegas que, às vésperas de deflagrar as prisões no Paraná, teve de recrutar agentes em outros Estados, porque detectou tentativa de boicote à ação por parte de policiais locais.

Na mira A corregedoria da PF no Paraná também abriu procedimento para investigar a tentativa de representantes do sindicato local dos policiais federais de entrar na carceragem onde estão presos acusados de envolvimento no esquema de lavagem de dinheiro.

TIROTEIO

"Empresários aplaudiram promessa de ações impopulares. Aécio revela a primeira: acabar com créditos a juros baixos para a indústria."

DA SENADORA GLEISI HOFFMANN (PT-PR), ex-ministra da Casa Civil, ironizando as críticas feita pelo tucano aos créditos subsidiados do BNDES.


CONTRAPONTO

Milagre da popularidade


No início da campanha de Antonio Anastasia (PSDB) ao governo de Minas, em 2010, sua equipe sofreu com a descrença de alguns em sua vitória. Com 4% nas pesquisas, chegou a levar um chá de cadeira de horas quando visitou Valdemiro Santiago, da Igreja Mundial.

Assim que disparou nas pesquisas, Anastasia foi recebido como rei pelo pastor, e convidado a acompanhar uma sessão de cura. A vontade de agradar era tão grande que tucanos estranharam quando Valdemiro tentou curar uma mulher muda. Sua primeira palavra depois de curada foi:

""A-A-A-Anastasia!

Mais um diário de mamãe - JOÃO UBALDO RIBEIRO

O ESTADÃO - 11/05

Antigamente, a família se reunia e eram sempre as mesmas caras, os mesmos nomes e as mesmas histórias


Querido Diário,

No tempo do Coelho Neto, não tinha churrascaria, tinha? Claro que não.

Não tinha nem churrascaria nem Dia das Mães e, portanto, ele não entendia nada de padecer no paraíso. Naquela época era moleza. E este ano, para variar, está prometendo: vai ser mais um Dia das Mães inesquecível. Não quanto ao local das homenagens, que é churrascaria de novo. Como sempre, houve debates acalorados sobre isto. Todo ano alguém diz que é preciso variar e que, desta vez, não vai ser churrascaria, mas sempre acaba sendo, eu nem presto atenção mais na discussão. Minha última intervenção foi há vários anos, em legítima defesa, para deixar claro que considero insultuoso me levarem para comer peixe cru com arroz papa sem sal e que, nesse caso, prefiro a sopa dos pobres do padre Celso. Não me levando para comer peixe cru, tudo bem. Eu como qualquer coisa, pizza, pastel, hambúrguer, rabada, mocotó e aquelas comidas baianas molengas e amarelosas, mas peixe cru não, tudo tem seu limite, tem que haver respeito.

Mas, como eu já te contei, haverá uma grande novidade, que é a presença de Vó Eulália, que chegou de Alagoas na quarta. Mandaram buscá-la porque ela está fazendo 90 anos, embora pareça muito menos. Eu tenho um medozinho, mas gosto dela. O mesmo, com certeza, não pode ser dito de todo o resto da família. No aeroporto mesmo, aquele lourinho, filho do outro casamento da Selminha, um chatinho catarrento e esganiçado, cujo nome eu sempre esqueço, só acho que é Fred, mas sei que não é, esse, vamos dizer, Fred, começou a encher o saco e Vó Eulália deu-lhe um puxão de orelha caprichado, que ele chegou a ficar roxo. “Se é para chorar, pelo menos chore com razão", disse ela, com aquele sorrisinho de cangaceira. A Selminha não gostou, mas eu, claro, adorei e Vó Eulália não quer nem saber se alguém não gostou. E o Fred merece. Meu Deus, o nome dele não é Fred. Ted? Eu só lembro que tem um E. Ernesto?

Isso traz à baila o problema da identidade dos familiares. No começo, eu achei até que podia estar ficando de Alzheimer, porque dei para esquecer os nomes de uma porção deles, mas depois percebi que isto está acontecendo com praticamente todo mundo numa situação parecida com a minha, até porque a família nunca é a mesma, como no meu tempo. Antigamente, a família se reunia e eram sempre as mesmas caras, os mesmos nomes e as mesmas histórias, mas agora todo mês alguém anuncia uma alteração, muito mais que a escalação de um time de futebol. É bem verdade que eu não tinha nada que tirar uma de coelha e parir seis filhos, eu era uma cretina que achava lindo ter uma família enorme e tinha fantasias de comandar a hora do almoço com um apito. Diga-se em meu favor, porém, que seis filhos naquele tempo e no meu caso não queriam dizer oito noras mais ou menos duradouras e um número indefinido de outras mais passageiras, quatro genros, sendo que um repetido, e 12 netos, entre legítimos e postiços. Isso, para não falar nos parentes dos parentes e contraparentes, é muito duro de acompanhar. Ninguém consegue se lembrar direito de oito noras e quatro genros em rodízio permanente. No hora em que a pessoa vai se acostumando, vem uma troca . Agora que tudo é informatizado, bem que eles podiam botar um chip que acendesse o nome deles no celular.

Aliás, grande bênção o celular, pelo menos na churrascaria do Dia das Mães, porque agora a juventude fica em silêncio enquanto manda mensagens para lá e para cá, ou seja, o tempo todo. Desconfio que alguns deles ainda não aprenderam a falar direito e o único órgão deles capaz de comunicação verbal é o polegar, ali teclando kd vc rsrsrs bjs e outras informações cruciais, que eles ficam mostrando uns aos outros, em vez de conversar. Me lembra cachorros cheirando uns aos outros, não sei por quê. O Marcelo, o gordinho de cabelo cacheado, também filho da Selminha, só que com o Haroldo, com certeza não sabe conversar, porque o universo dele são os joguinhos dos computadores e, quando alguém fala com ele, ele responde bzzz-strrp-vjjj-tueen, com os olhos esgazeados. E tem as fotos também, para as quais eles só olham uma vez e nunca mais, antes de distribuí-las às redes sociais do mundo todo, a gente com cara de besta e deficiente mental em todas elas.

De resto, não há razão para imaginar grandes surpresas. O meu novo genro por parte da Bia — que já não é mais tão novo assim, já vai fazer cinco anos que estão juntos, embora até hoje eu não saiba por quê e o que foi que eles viram um no outro —, o Gilberto, o nosso Betão, vai encher a cara de chope, vai ficar com os olhos marejados e fazer um discursinho em que vai me chamar de bimãe outra vez. Bi, como em bicampeonato. Bimãe porque eu sou avó, mãe duas vezes, sacou? Ele é um gênio. Espero que não fique muito entusiasmado e não chame Vó Eulália de trimãe porque não vai resultar bem, até porque ninguém sabe tantos palavrões e tem tanta disposição para mostrar isso do que Vó Eulália.

Mas, querido, eu fico falando assim e parece que não gosto da família, que sou uma desnaturada insensível, que não dou valor às coisas mais importantes desta vida. Mas nada pode estar mais longe da verdade. Eu adoro a família, adoro ser mãe e avó, sério mesmo. Esses senões acontecem a todos de uma forma ou de outra, e devemos pôr as mãos para o céu porque não temos nenhum problema grave, como tantos outros. É só que, de vez em quando, dá vontade de ter uma folguinha de tanto padecimento paradisíaco. E, sim, bimãe não sou eu. Betão e Vó Eulália sabem quem é.

Quadriênio perdido - GUSTAVO LOYOLA

O Estado de S.Paulo - 11/05

Configura-se no horizonte o cenário de um quadriênio perdido para o Brasil. Relatório divulgado pela OCDE na semana passada trouxe uma revisão para pior das projeções da entidade para a economia brasileira no corrente ano, juntando-se às previsões igualmente pessimistas do FMI e dos analistas participantes da pesquisa Focus do Banco Central (BC). A expectativa da maioria é a de que o PIB cresça abaixo de 2% neste ano, com a inflação beirando o teto da banda de tolerância estabelecido no regime de metas (6,5%). Se tais prognósticos se confirmarem, o Brasil apresentará crescimento médio em torno de 2% e inflação ao redor de 6% ao ano, entre 2011 e 2014.

O quadriênio perdido é filho bastardo da "Nova Matriz Econômica" que pretendia impunemente combinar juros baixos, câmbio competitivo e afrouxamento fiscal. O tiro saiu pela culatra. O País cresce menos, sua indústria continua pouco competitiva, apesar da depreciação da moeda, e a inflação se mantém teimosamente elevada. A "Nova Matriz" gerou também perda de credibilidade na política econômica e prejuízos à imagem do País perante os investidores internacionais.

É verdade que, nos últimos meses, o governo deu sinais de recuo em relação ao seu projeto da "Nova Matriz". Não se veem mais discursos presidenciais sobre "juros baixos" e o Banco Central conseguiu promover uma elevação da taxa básica de 7,25% para 11% nos últimos 12 meses. As restrições cambiais fruto da veleidade do "câmbio competitivo" foram desmontadas e o BC luta agora para evitar que a depreciação excessiva do real jogue mais combustível na inflação. Todavia a gestão fiscal continua frouxa e dependente de receitas extraordinárias ou de jogadas contábeis.

Além dos problemas na esfera macroeconômica, a gestão microeconômica também deixa muito a desejar e igualmente dificulta o desempenho da economia. Numa situação de baixo desemprego como ora existente, o crescimento maior do PIB depende do aumento do investimento e da aceleração do crescimento da produtividade. Porém, a intervenção do governo na economia vem produzindo o resultado oposto. As regras do jogo ficaram opacas para os empresários e cada vez mais as decisões de investimento tornam-se dependentes de alguma prebenda do Estado. Ora são as linhas de crédito subsidiadas do BNDES, ora é um regime especial de tributação, ora é a proteção contra a importação do exterior. Tais vantagens, porém, não estão disponíveis para todos os empreendedores e mesmo seus beneficiários têm dúvidas sobre a sustentabilidade dessa política ao longo do tempo.

Por outro lado, acumularam ineficiências e distorções na economia. O regime tributário é cada vez mais disfuncional e custoso para os contribuintes. As exigências burocráticas se multiplicaram pela necessidade de "enquadramento" do contribuinte a cada um dos regimes especiais.

Além disso, a má gestão setorial trouxe à baila o risco de falta de energia elétrica. Obviamente, existe uma séria questão hidrológica, mas o melhor gerenciamento do modelo em vigor poderia ter minimizado o risco de apagão. A redução voluntariosa de 20% nas tarifas de energia no ano passado está custando caro, principalmente por causa do aumento das incertezas para os operadores atuais e potenciais do setor elétrico e pela ampliação da necessidade de subsídios fiscais. Vale lembrar que a miopia nessa questão não foi monopólio do governo, já que entidades empresariais como a Fiesp apoiaram demagogicamente a medida.

O setor de combustíveis também sofre com os equívocos acumulados. A Petrobrás vem arcando com os custos do artificialismo de preços no mercado doméstico, além de estar sobrecarregada pela necessidade de investir no pré-sal em razão do modelo de exploração adotado pelo governo.

Por tudo isso, não será boa a herança que Dilma deixará para o próximo governo. Ajustes fortes e dolorosos serão necessários para evitar mais quatro anos perdidos de baixo crescimento e alta inflação. O retorno pleno às políticas macroeconômicas responsáveis e ao realismo dos preços administrados afetará o crescimento em 2015. Porém, seria um primeiro e necessário passo para a retomada sustentável do crescimento a partir do ano seguinte.

Chances perdidas - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 11/05

Há duas vitórias a buscar quando um país é sede da Copa do Mundo. O campeonato, em si, e a chance de aproveitar bem a vitrine mundial. Com todos os olhos sobre nós, o Brasil poderia mostrar capacidade de realização, organização, boa estrutura de tecnologia de informação, bons serviços. Isso ampliaria as possibilidades de atrair turistas e investidores. Poderia.

Aesta altura, já estamos na fase de administrar o dano à imagem. A copa da vitrine já perdemos. Passamos, ao longo da preparação, a ideia de país que improvisa, não cumpre prazos e assusta organizadores com a incerteza. Os estádios não estão prontos e o da abertura do evento, na melhor das hipóteses, estará com a parte do futebol pronta e o resto no meio do caminho.

Há riscos que ainda estamos correndo e que dificilmente conseguiremos evitar. Um é o de não ter uma boa infraestrutura de comunicação com internet nos estádios. O próprio ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, admitiu que metade dos estádios da Copa pode ter problemas com a rede de telefonia móvel.

Na era da comunicação, no meio de um evento em que haverá jornalistas do mundo inteiro e consumidores intensos de TI para a transmissão de imagens e som, o Brasil tem a apresentar deficiência na cobertura de celular. É espantoso e sinal de subdesenvolvimento.

Hoje, quem não tem uma boa estrutura de TI em eventos globais passa o recibo do atraso. E país que teve tempo para se preparar e não conseguiu fazer o básico a tempo passa a imagem de incapacidade de organização. Ter boa imagem não é apenas para sair bem na foto, não é uma questão de vaidade nacional. É o caminho para atrair investidores e turistas. O Brasil, com baixa taxa de investimento e com uma balança cronicamente deficitária em turismo, poderia ter aproveitado melhor essa chance. Poderia. Mas hoje já se sabe que tudo o que se pode fazer é torcer para que o pior não aconteça. Já não deixa-
remos boa impressão; temos que tentar evitar um colapso nos serviços de comunicação.

Aeroportos não estão com obras concluídas e as obras de estrutura de energia para os estádios da Copa estão atrasadas em metade das cidades-sede. Em quatro delas há atrasos significativos, de acordo com a Aneel, como Porto Alegre, Belo Horizonte, Manaus e Curitiba. O que causa espanto é por que o país não foi sendo alertado pela agência, com maior frequência e rapidez, e por que não se corrigiu esse problema a tempo. Imagina o risco que se corre sem a estrutura de energia para os estádios?

Há episódios mais dolorosos, como os das mortes de operários. São nove os casos. Quando isso acontece porque o trabalhador de uma empreiteira grande, prestadora de serviços para o governo, não cumpre requisitos de segurança mínimos exigidos por lei, é ainda mais incompreensível.

Quando o secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, diz que viveu o inferno ao conviver com os três níveis de governo no Brasil, ou quando reclama que o Itaquerão ficará pronto, mas só no último minuto, temos a noção de que o país já passou péssima impressão. Pode-se não gostar de Valcke, mas é inegável que a burocracia e a dificuldade de entendimento entre níveis de governo diferentes são velhos defeitos do Brasil. Outro é o de atraso sistemático de qualquer obra e incapacidade crônica de se cumprir prazos.

Sediar uma Copa é uma chance de mostrar virtudes do país e oportunidades para turistas e investidores. É também o momento certo para se quebrar os estereótipos que se tem no exterior em relação a nós. Pelo conjunto da obra, até agora, estamos confirmando o estereótipo e mostrando mais defeitos que qualidades. Também é uma chance para nos apressarmos em obras necessárias para nós mesmos. Nisso, também perdemos oportunidade.

A realização de um evento desse porte é a melhor forma de jogar no ataque para assim ganhar esse jogo mais permanente, que vai além da disputa entre as seleções. Mas o máximo que se pode fazer agora é reforçar a zaga e torcer pelo goleiro, porque teremos que ficar na retranca lutando para que não aconteça um grande apagão de energia em um dos estádios, ou seja possível aos jornalistas transmitir informações mesmo sem infraestrutura boa de comunicação durante os jogos. No mais, resta torcer pela seleção do Felipão para ganhar pelo menos uma das duas copas.

Diminuir o Estado: a solução - SACHA CALMON

CORREIO BRAZILIENSE - 11/05

A Petrobras é uma sociedade anônima cotada nas bolsas de São Paulo e Nova Iork, tendo por maior acionista a União. Os desmandos políticos colocam em risco a sua saúde financeira e gerencial. Impõe-se pensar os limites do Estado na economia. Tem-se dito que o poder político corrompe e que o poder político absoluto corrompe muito mais. O ditado é veraz.

Por um lado, o ditado nos leva à conclusão - mais imediata - da necessidade de apear o PT do governo. O partido que pregava a ética na política foi tomado de um cinismo florentino. Protesta inocência e perseguição mesmo diante das evidências mais claras e das provas mais lídimas. Seus próceres e militantes desacatam o presidente do STF, chamando-o de "ditador".

André Vargas, então vice-presidente da Câmara dos Deputados, surpreendido com a mão na botija, tem a audácia de continuar no Congresso. Uma presidente não se exime de seus erros, pondo na imprensa a culpa. O ex-presidente Lula reúne seus blogueiros para se dizer favorável à censura aos meios de comunicação. Até quando roubarão, mentirão, aparelhando o Estado em todos os níveis? E agora esta: o mensalão foi 80% político e 20% jurídico. O ministro Marco Aurélio não resistiu: "É troço de doido". Parece mas não é. É de propósito, para impressionar "o povão".

Por outro lado, o velho ditado nos indica - mediatamente - a necessidade de diminuir o Estado, quer como pessoa política quer como dono de empresas. Toda essa roubalheira inexistiria se o Estado não tivesse tantos cargos de recrutamento amplo a ser preenchidos pelos quadros partidários. Essa indecente roubalheira, repita-se à exaustão, não estaria ocorrendo se o Estado brasileiro não fosse dono de tantas empresas estatais.

O caso da Petrobras é emblemático. A impressão é de que todos os seus contratos exigem propina para se perfazerem. Sabemos de dois casos apenas: o da incrível refinaria de Pasadena, nos EUA, adquirida por quase US$ 2 bilhões (hoje não vale nem US$ 200 milhões), e o do ex-diretor de suprimentos da empresa, a cobrar comissão em centenas de contratações para dois fins repugnantes: o enriquecimento ilícito e a formação de caixa 2 para campanhas eleitorais. A Petrobras tornou-se cabide de empregos, perdeu valor, ficou sem gestão, virou plataforma de negócios escusos.

O mesmo ocorre, com absoluta certeza, na chamada administração indireta e noutras estatais. Como lembrou Lula, não foram aqueles R$ 3.500 recebidos por um chefete dos Correios (à época enfeudado ao PTB do Sr. Roberto Jefferson) que desatou o nó do mensalão? Bastou o líder do PTB dizer que tinha um "carequinha" de Minas distribuindo dinheiro em Brasília, para toda a trama tornar-se visível (ao menos uma parte). O resto ficou nas sombras...

Quem nos garante inexistir outras tenebrosas transações em nosso gigantesco Estado, suas autarquias, empresas públicas, fundações, sociedades de economia mista, bancos governamentais e agências reguladoras? E o que dizer dos milhares de sindicatos, associações e ONGs a receberem verbas de todo tipo para repassá-las aos "aparelhos" dos donos do poder? Organização não governamental no Brasil é sinônimo de "repartição pública". As empresas estatais, por sua vez, não visam lucros, mas a dar lucros aos partidos aboletados no poder, que as controlam como "cosa nostra".

Nos EUA, a mais poderosa economia do mundo, o Estado não é dono de uma empresa sequer nem tem "administração indireta", prova acabada da superioridade das economias baseadas na livre iniciativa. Sei que são histórias diferentes. Mas, no século 21, bem podemos reorientar nossas posições e reconverter a economia, a teor do artigo 170 da CF/88. Economias estatizadas sofrem inevitavelmente de intromissão política, de ineficácia gerencial e de corrupção generalizada. É ver Cuba e Coreia do Norte, duas nações penitenciárias mal administradas pelo Estado.

A história é mestra, basta ver a Venezuela e a Argentina. A privatização das empresas estatais é a solução mais adequada. As empresas particulares visam resultados e não se deixam roubar. Mal dirigidas, correm o risco dos negócios e entram em falência. As estatais - caso da Petrobras - são socorridas pelo Tesouro e pelo BNDES às nossas expensas. Podem fazer absurdos e fica por isso mesmo.

Os do governo estão a proclamar que estamos a difamar a empresa para fins políticos. Dizem que se quer "privatizar" o que é do povo. Não, eles é que apropriaram-se do que deveria ser do povo. A Petrobras merece melhor sorte. O controle acionário da empresa (ações com direito a voto) deveria ser dos brasileiros e de suas pessoas jurídicas, não do governo, com a transformação em preferencial das ações votantes passados a estrangeiros, de modo a perpetuar a bandeira nacional. Do modo como está é que não pode ficar. É preciso salvar a Petrobras, livrando-a do seu algoz, o governo federal.

Mais uma do doutor - PERCIVAL PUGGINA

ZERO HORA - 11/05
Doutor Honoris Causa significa doutor por causa da honra. Nosso ex-presidente Lula abiscoitou, em Salamanca, o 27º desses diplomas. Todos por causa da honra. De Salamanca foi a Lisboa, comemorou os 40 anos da Revolução dos Cravos e concedeu uma entrevista à RTP Rádio e Televisão de Portugal que deve ter escandalizado seus companheiros na Papuda. Vão-se os amigos, mas se conservam os dedos, ora pois.
Em trecho da matéria (basta procurar no YouTube por "entrevista de Lula à RTP"), a repórter o indaga sobre o fato de "pessoas de sua confiança" terem sido presas. E Lula buscou salvar a própria pele: "Não se trata de gente de minha confiança". Acrescentou à fala um gesto como que afastando de si os condenados e tentou arredondar: "Tem companheiros do PT presos". Ele estava falando de Dirceu, Genoino, Delúbio! E por aí foi desandando o grande ídolo do petismo nacional, acusando o STF de haver produzido um julgamento 80% político e concluindo com uma frase bem ao gosto do seu auditório caseiro: "Essa história ainda vai ser recontada, para saber o que aconteceu na verdade". Pelo jeito vem aí outra comissão da verdade...

No entanto, a melhor frase em toda a entrevista foi: "O que eu acho é que não houve mensalão". Pronto! Com essa sacada no repertório das esquivas afastou de si a sombra do maior escândalo da história da República. Ele estava afirmando que não pode ser atingido por algo que "acha" que não houve. Entretanto, vejamos como ficam as coisas se o mensalão não aconteceu. Os muitos milhões que circularam por agências de publicidade e bancos durante quase dois anos não teriam chegado aos líderes de bancada que atualmente estão presos. Se o dinheiro não chegou a eles e, por meio deles, a parlamentares dos respectivos bancados, então o ervanário se desfez no ar porque, materialmente, existiu. Existiu, foi lavado, foram assinados cheques e recibos, foram transportados valores, e há banqueiros e empresários condenados a penas ainda maiores do que as que atribuídas aos réus políticos.

Mais, se há no STF um ministro cuja lealdade ao governo ninguém põe em dúvida é o Dias Toffoli. Pois mesmo ele, com a parceria de Ricardo Lewandowski, ao apreciar o crime de corrupção passiva imputado a nove réus do mensalão, condenou sete dos acusados! E assim foram os dois ministros, em relação aos crimes de lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta, peculato e evasão de divisas. Sempre condenaram a vários no processo do mensalão. Por um crime que não aconteceu, doutor Lula?

Aécio, ou Tancredo Neves 2.0 - ELIO GASPARI

FOLHA DE SP - 11/05

Até agora o neto rodou o programa que em 1984 deu a Presidência ao avô: joga parado, e está dando certo


A indicação da pesquisa Datafolha de que hoje Aécio Neves é o candidato com mais probabilidades de chegar a um eventual segundo turno numa disputa com Dilma Rousseff recomenda que seus adversários estudem a campanha que levou seu avô à Presidência em 1985.

Até agora Aécio jogou parado. Tudo o que ele precisa é chegar ao segundo turno, sem inimigos de morte e com o máximo possível de acordos. Aécio precisa de votos que há quatro, oito ou doze anos foram para o PT. Em circunstâncias diferentes, Tancredo precisava chegar a uma eleição direta com o apoio de eleitores da bancada do governo.

Indo para uma eleição direta, Aécio ainda não anunciou um programa substantivo. O avô fez melhor, elegeu-se indiretamente sem anunciar programa algum. Essa mágica foi inteiramente eficaz para o avô, mas é duvidoso que o seja nas condições de hoje. Afinal, só 42% dos entrevistados dizem conhecê-lo, e são exatamente os outros 58% que precisam de motivos concretos para votar nele.

Aécio vem sendo beneficiado pela erosão de Dilma, provocada, entre outros fatores, pelo Lula-volta-Lula-não-volta. Tancredo foi beneficiado pela ambiguidade do presidente João Figueiredo, que alimentou a ideia da própria reeleição e não foi a lugar algum.

Tancredo encarnava o fim de um regime de vinte anos. Aécio quer encarnar o fim de um domínio democrático que pretende durar dezesseis. Com uma diferença: tanto na ditadura, que durou 21 anos, como na República Velha, com seus 36, havia uma real rotação dentro do grupo governante. Com o PT no Planalto jamais houve essa rotatividade.

Rodando o programa Tancredo 2.0, Aécio respondeu a um ataque de Marina Silva ("o PSDB sabe que já tem cheiro de derrota") com um calmante ("não vou cair na armadilha do PT que é dividir a oposição"). Até agora, deu certo, pois tudo o que pode dar errado com os adversários, errado dá. Contudo, Lula continua no banco de reservas, com 58% dos entrevistados achando que ele deve ser o candidato do PT.

GRANDE NEGÓCIO

Outro dia o bilionário Warren Buffett disse que está estudando um novo grande negócio, associado ao empresário brasileiro Jorge Paulo Lemann. Ele é o terceiro homem mais rico do mundo. O outro é o mais rico do Brasil.

Faz tempo, depois de ter comprado as Lojas Americanas, Lemann disse a um sócio: "Agora vamos comprar a Brahma". O outro achou que ele queria tomar uma cerveja. Meses depois Lemann começou a negociar a compra da cervejaria.

Se Lemann disser que vai comprar um refrigerante, isso não significará que está com sede. Ele e Buffett poderão comprar a Pepsi, ou a Coca-Cola. Buffett é o maior acionista individual da Coca-Cola e votou contra os bônus milionários dados à diretoria da empresa.

RECORDAR É VIVER

Durante a campanha eleitoral de 2006, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, ligou para pelo menos um empresário paulista que tinha negócios com a companhia pedindo-lhe que recebesse um ministro. O encontro ocorreu, e o ministro pediu uma doação formal para a campanha do PT. Nada feito. Oito anos depois, vê-se no que deu o desembaraço do comissariado.

CAMINHÕES

O governo diz que a venda de caminhões caiu 14% neste ano. Um grande fabricante assegura que esse número é otimista. A queda estaria próxima dos 20%.

MAU SINAL

A doutora Dilma voltou a defender a necessidade de uma reforma política para consertar o país.

"Reforma política" é um bordão ao qual o governo recorre quando não tem o que dizer.

MET GALA

A festa anual do Metropolitan Museum foi uma beleza, mas Anna Wintour, a alma da noite, errou a mão ao sugerir que os homens fossem vestindo casaca e condecorações.

Metade dos convidados não atendeu ao pedido, no que fizeram muito bem.

Pelo menos dois foram de casaca, sem meias, o que é engraçado, mas deixa uma ponta de ridículo.

A maioria dos senhores de casaca mostraram-se desengonçados, uns pela roupa mal cortada, quase todos pelo colete branco desajustado; outros, pelo próprio chassis.

Alguns calçavam sapatos de cadarço mal engraxados. (O rigor inglês pede sapatilhas de verniz.)

O desastre deu-se com as condecorações. Apanágio na Inglaterra de La Wintour, as patacas não fazem parte da cultura americana.

Resultado: o mais enfeitado foi o fotografo Mario Testino. (O melhor conselho sobre condecorações é atribuído ao primeiro-ministro português Oliveira Salazar e também ao pensador francês Raymond Aron: "Nunca as peça, nunca as recuse e nunca as use".)

A noite foi ganha pela atriz Lupita Nyong'o, que vestiu uma instalação de pedras e penas verdes da Prada, sugestão de fantasia para o Império Serrano no próximo Carnaval.

AVISO AMIGO

As greves dos lixeiros e a dos motoristas de ônibus do Rio mandaram um recado ao empresariado: sindicatos de trabalhadores dirigidos por amigos não garantem paz.

Pelo contrário, jogam categorias nos braços de movimentos radicais e avulsos.

MAIS UM TELENEGÓCIO ESQUISITO

Está no forno, com o beneplácito do Planalto, uma curiosa transação. Articula-se na Europa a venda da TIM, a segunda maior operadora de telefonia do país, para a Oi. Uma pertence à Telecom Italia, que é controlada pela Telefónica espanhola. A outra é da Portugal Telecom. Uma empresa comprando outra e reduzindo o número de concorrentes já é coisa esquisita, mas há um segundo lance. Feita a compra, a TIM será fatiada. A Oi ficaria com um pedaço, outro iria para a Vivo, que pertence à Telefónica espanhola, que já é a maior operadora de Pindorama. O que sobrar iria para a Claro, mexicana.

São muitos os países em que a simples discussão desse enredo traz tenebrosas complicações legais. Nessa transação há mais duas curiosidades. O Brasil tem hoje quatro operadoras e sobrarão três. Não há no mundo tamanha concentração de mercado.

A segunda curiosidade será a expansão da Oi. Ela é filha da falecida Telemar, produzida pela privataria tucana e chamada de Telegang pelo então presidente do BNDES. Na privataria petista, anunciou-se que a sua associação com a Portugal Telecom criaria a SuperTele brasileira. Fantasia. Criou-se e expandiu-se a SuperTele portuguesa, para alegria de Lula, ao tempo em que ele anabolizava as "campeãs nacionais". Boa parte do dinheiro saíra do BNDES e tomara o rumo devido.

Os donos dessa ideia já convenceram o comissariado de que convém ao governo e ao mercado o sumiço de uma operadora e a contração da concorrência. Falta explicar aos consumidores.

Caminho da roça - DORA KRAMER

O ESTADÃO - 11/05


Falta um mês para a convenção do PMDB, marcada para 10 de junho. Se nas próximas quatro semanas a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer não conseguirem dar um jeito na situação, a derrota da renovação da aliança com o PT é dada como certa.

Não é coisa que se fale em voz alta no partido onde o clima é de conspiração contra. Das 27 seções regionais só reina a paz em colégios eleitorais de pouco peso, como Alagoas, Maranhão, Rondônia e Amapá. Nos demais há problema, variando apenas a gravidade.

Se a votação fosse hoje, a única dúvida seria se a rejeição seria feita de modo aberto, por aclamação dos representantes dos diretórios regionais, ou se o resultado se expressaria na urna, sob a proteção do voto secreto dos delegados.

Michel Temer tem ciência da perda de apoio crescente da renovação da aliança, certamente divide essa preocupação com o governo e trabalha para que o previsto resultado adverso não se confirme. Há chance? Sempre há, mas são pequenas, porque PT e PMDB não conseguiram se entender nas eleições estaduais e a queda da presidente das pesquisas contribuiu para que a dissidência caminhe para se transformar em maioria.

Junto a isso, há a percepção dos políticos junto às suas bases de que existe um cansaço generalizado com o governo. Não necessariamente com a presidente em particular, mas um ambiente de desagrado com o PT em geral. Ainda assim, há uma avaliação de que, se algumas questões regionais importantes fossem resolvidas, o PMDB poderia continuar na coligação mesmo só formalmente.

Para o governo já seria bom: não perderia cerca de cinco minutos do tempo no horário eleitoral nem teria o desgaste de uma sinalização politicamente muito ruim. Quais seriam as questões regionais capazes de salvar a parceria? Ceará e Rio de Janeiro. Operações difíceis, pois o que o PMDB quer é que no Ceará Dilma abandone os irmãos Ciro e Cid Gomes para apoiar o senador Eunício Oliveira e no Rio retire a candidatura de Lindbergh Farias em favor do governador Luiz Fernando Pezão.

Tal cenário de dificuldades seria inimaginável há um ou dois meses. Não obstante a insatisfação crescente no principal parceiro do governo, que em março explodiu numa crise abafada embora não dizimada no Congresso, mesmo os mais rebeldes não vislumbravam a possibilidade de o partido se recusar a renovar a aliança.

No máximo consideravam que o PMDB iria formalmente para a coligação e, na prática, cada seção regional agiria como bem entendesse, apoiando a candidatura Dilma, aliando-se implícita ou explicitamente à oposição ou simplesmente se omitindo quanto à eleição presidencial. Cada estado cuidaria de suas próprias candidaturas aos governos, ao Senado e à Câmara, a fim de que o PMDB preservasse a força oriunda do poder local, com reflexo direto na cena nacional por meio da influência no Congresso.

Hoje a percepção é a de que o compromisso da aliança teria tudo para favorecer o PT sem render benefícios ao PMDB.

Histórico. Caso venha a romper aliança com Dilma, não seria a primeira vez que o PMDB participaria de um governo sem integrar a coligação eleitoral. Em 1998, o partido ocupava ministérios no governo Fernando Henrique Cardoso e, ainda assim, decidiu por não apoiar formalmente a reeleição. Nem por isso FH perdeu.

Calma no Brasil. O país está violento, intolerante, raivoso, necessitando urgentemente de um poder moderador/pacificador, cuja tarefa se inicia pela retomada de valores como legalidade, compromisso com a verdade, probidade, civilidade e respeito ao contraditório.

O acirramento de ânimos pode ser eficaz na luta política, mas acaba contaminando a sociedade quando a dinâmica do conflito e do vale-tudo sem regras nem limites é incorporada como prática cotidiana no exercício do poder.

O lado B das pesquisas eleitorais - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 11/05

Economia importa menos do que se julga, indecisão é grande e eleitor ainda 'está em outra'


A SITUAÇÃO ECONÔMICA do país tem muita, pouca ou nenhuma influência no voto para presidente? "Muita" para menos da metade do eleitorado, 49%, segundo o Datafolha da semana que passou. "Nenhuma" ou "não sabe" (o que dá quase no mesmo) para 23%.

Mas o que quer dizer a resposta? Que a economia "em geral" não tem tanta influência ou que a economia não está influenciando tanto agora?

Para os "mais ricos" da pesquisa, famílias com renda superior a dez salários mínimos, a situação econômica tem "muita influência" no voto para 70% dos entrevistados. Entre os mais pobres, os de renda inferior a dois mínimos, para 41%.

Isso quer dizer que os mais pobres estão mais satisfeitos com a situação econômica ou que dão menos importância ao assunto? Os indicadores de ânimo com a economia não diferem de modo relevante entre as categorias de renda.

Interessante ainda é a reação a uma piora da situação econômica até a eleição. Para 50%, a piora teria pequena ou nenhuma probabilidade de provocar mudança de voto.

Mas, de qualquer modo, para 41%, a situação econômica do país vai ficar como está; para 26%, vai melhorar. Ou seja, a econo- mia não piora para dois terços do eleitorado.

A reviravolta de junho de 2013 deveria ter sido suficiente para fazer picadinho de explicações economicistas da política do voto. Se não foi o bastante, os dados do Datafolha picam tais argumentos.

Outra história comumente ouvida em campanhas eleitorais é aquela que relaciona a obscuridade de um candidato a suas possibilidades de vir a ganhar mais votos. Isto é, se o candidato ainda é pouco conhecido do eleitorado, pode vir a crescer. Pode. Pode também vir a ser objeto de ojeriza.

Um argumento semelhante pode ser empregado até para avaliar as possibilidades de candidatos muito conhecidos, como Dilma Rousseff. Sua imagem piorou estrepitosamente no junho de 2013. Mas o que vai ser quando a campanha esquentar?

O eleitorado, em especial o mais pobre e/ou menos informado, relaciona Dilma e seu governo a programas sociais benquistos?

Considere-se o caso de programas que, quando chegam ao cidadão, podem não parecer obra do governo federal, tais como o Pronatec e o Minha Casa, Minha Vida.

O Pronatec oferece formação profissional para pessoas em geral pobres. Segundo o governo, teve até agora 6,9 milhões de matrículas. O Minha Casa, Minha Vida entregou 1,65 milhão de casas (afeta uns 5 milhões de pessoas, pois) e encomendou outro 1,7 milhão. Muita gente.

O que dirá esse eleitorado que fez escola profissionalizante ou conseguiu comprar casa? Vai gostar mais de Dilma? Ou vai dizer "muito obrigado, mas não bastou"?

Dilma está apanhando, mas está de pé, ainda que trema nas bases. Num segundo turno, a distância entre os votos da presidente e os de Aécio Neves caiu de 27 pontos em fevereiro para 11, em maio. No caso de Eduardo Campos, de 32 para 17.

Mas ainda há muito eleitor fulo ou indeciso. A porcentagem de votos brancos, nulos, nenhum ou não sabe anda entre 23% e 25% desde outubro de 2013.

A eleição está perto, no calendário, mas ainda longe, na cabeça da massa do eleitor.

Futuro que não chega - SUELY CALDAS

O Estado de S.Paulo - 11/05

Foi uma semana confusa, agitada por invasões dos sem-teto, manifestações contra a Copa, greves de ônibus, a população paralisada nas ruas, indignada, desprotegida e perdida, com medo de perder emprego, a tragédia de uma mãe e dona de casa inocente linchada até a morte por "justiceiros" no Guarujá. O crescimento da sensação de descontrole social é inversamente proporcional à calmaria dos governantes - nos estados e em Brasília. Em resposta a outro descontrole mais antigo - o econômico -, todos os dias o ministro da Fazenda, Guido Mantega, repete seu desacreditado monocórdio: nos próximos meses tudo vai melhorar - inflação, investimento, crescimento econômico, etc. Bate na tecla há mais de dois anos e os próximos meses teimam em não chegar.

Na linha da esperança em um futuro inalcançável, o ministro do Desenvolvimento, Mauro Borges, acaba de erguer a taça de campeão. Em depoimento no Congresso, na quinta-feira, disse ser propósito do governo Dilma Rousseff antecipar desonerações aduaneiras para criar a área de livre-comércio na América do Sul. Se desde a criação do Mercosul, há 22 anos, os cinco países do bloco não se entendem, acumulam pendências, dívidas, impõem barreiras comerciais e estão cada vez mais distantes de um bloco homogêneo, o que esperar de conversas entre 14 países da América do Sul? Como acreditar que Chile, Peru e Colômbia, que optaram por bem-sucedidos acordos bilaterais de comércio mundo afora, abdicariam desse modelo para embarcar em um ringue de desentendimentos em que se transformou o Mercosul?

Mauro Borges tem fé. "Temos uma política comercial bem-sucedida no Brasil", afirmou a senadores que criticavam a negociação sem fim para um acordo de comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Se o Brasil negociasse sozinho, há muito teria fechado seu acordo e hoje estaria exportando bem mais para países europeus. Já os cinco do Mercosul não conseguem sequer resolver pendências regionais.

Deles, o Brasil mantém comércio mais ativo (e mais conflituoso) com Argentina e Venezuela, justamente os de pior desempenho econômico do continente. Às voltas com escassez de divisas, os dois liberam dólares para o exterior a conta-gotas. Com isso só têm crescido suas dívidas com empresas brasileiras que para lá exportam; as vendas de automóveis para a Argentina pararam à espera de um acordo de trocas; recentemente nossa indústria de calçados perdeu US$ 6,2 milhões com o cancelamento de um pedido de 410 mil pares pela Argentina. Em grave crise de desabastecimento, a Venezuela tem se suprido de alimentos no Brasil, mas não paga os fornecedores.

A queda nos preços das commodities no mundo e a mudança na política monetária nos EUA vão piorar o cenário econômico na América Latina. Projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) para 2014 e 2015 indicam para o Brasil inflação em alta, dívida pública em 66% do PIB e crescimento limitado em 1,8% e 2,7% nos dois anos. Por aqui, economistas fazem apostas piores: o ex-secretário executivo do Ministério da Fazenda do governo Dilma Nelson Barbosa projeta inflação de 7,5% e crescimento de 1% em 2015. Situação mais grave vivem os dois parceiros preferenciais do Brasil: a Argentina cresce 0,5% este ano e 1% no próximo e o PIB da Venezuela cai 0,5% e 1% com inflação de 75% nos dois anos. Inflação descontrolada (na Argentina está em 30%) é o meio mais rápido de agravar a pobreza de um país.

Maluf. Não dá para entender a permissividade e a tolerância das leis brasileiras com a corrupção. O deputado Paulo Maluf quer pagar US$ 1 milhão à Promotoria de Nova York para livrar-se de uma ordem de prisão e ter seu nome retirado da lista de procurados da Interpol. Ele e o filho são processados nos EUA por crimes de desvio de dinheiro público de obras em São Paulo quando era prefeito. Enquanto lá está ameaçado de prisão, aqui no Brasil exerce mandato de deputado federal e sai na foto com o ex-presidente Lula e o atual prefeito Fernando Haddad.

Retrato falado - FERREIRA GULLAR

FOLHA DE SP - 11/05


Alguém acredita que Lula desconhecia o uso do dinheiro público para a compra de deputados?


Lula é uma vocação política incontestável, como demonstra sua carreira vitoriosa, que o fez sair da condição de operário e chegar à Presidência da República. É verdade que alguns fatores políticos contribuíram para isso, mas não tivesse ele o tino e a sagacidade que tem, jamais chegaria onde chegou.

Há, porém, um traço de sua personalidade que igualmente contribuiu para essa carreira vitoriosa: a facilidade com que ignora toda e qualquer norma, seja ética, política, jurídica ou administrativa. Para ele, tudo é permitido, desde que favoreça a seus propósitos. Não digo que ele seja o único, dentre nossos políticos, com essas características, mas, nesse particular, indiscutivelmente, ele supera qualquer um.

E tem mais, quando se trata de seu interesse político pessoal, não distingue entre companheiros e adversários. Os exemplos são muitos e o mais notável dentre eles foi o próprio mensalão. José Dirceu, Genoino, Delúbio, todos pagaram pelos delitos cometidos, menos ele, que era o chefe da trupe.

Lembro-me bem da expressão de pânico estampada em seu rosto, quando o escândalo eclodiu. Dava para perceber que se sentia sem saída. Não duvido que, em seguida, tenha mostrado àqueles três que se ele, Lula, fosse incriminado, todos eles e o próprio PT estariam perdidos. Foi então que Delúbio assumiu toda a culpa e o Lula se safou.

Alguém acredita que Lula desconhecia o uso do dinheiro público para a compra de deputados que apoiavam o seu governo? Quer dizer que o chefe da Casa Civil, que despachava com ele todos os dias, armou tudo sem nada lhe contar; o Genoino, presidente do PT, também nada, e Delúbio, que estava todos os domingos fazendo churrasco na Granja do Torto, também guardou segredo.

Isso, embora o mensalão tivesse como beneficiário o seu governo. Pois bem, na hora em que o escândalo estourou, o que disse Lula? "Fui traído!" Passado o susto, porém, afirmou que não houve o mensalão, era tudo uma invenção de seus inimigos e da imprensa. É muita cara de pau, não acha?

Sucede que o Supremo Tribunal Federal julgou o mensalão e condenou os dirigentes do PT por crime de peculato, corrupção e lavagem de dinheiro, num julgamento que durou meses e que foi transmitido pela televisão. Tudo foi dito, exibido, discutido e votado às vistas de todo o país. Acusados foram condenados e estão cumprindo pena. Mesmo assim, recentemente, Lula afirmou numa emissora de rádio em Portugal que aquele julgamento foi 80% político e só 20% jurídico. Ele diz isso baseado em quê, se a maioria dos ministros do STF foi nomeada por ele e pela Dilma? Claro, sabia muito bem estar mentindo, que o que afirmava não tinha qualquer fundamento, mas afirmou.

Mas o que esperar de Lula, diante de uma pergunta como aquela: o que pensa da condenação de dirigentes do PT pelo STF? A resposta honesta seria, no mínimo, "é, pisamos na bola". Só que admitir que ele e sua trupe erraram, jamais admitirá. Por essa razão, sem o menor constrangimento, garantiu que o julgamento foi político e que o futuro revelará a verdade. Sim, o futuro há de revelar que ele, Lula, foi o verdadeiro chefe do golpe do mensalão.

Hoje Lula diz que o julgamento foi político, mas quem, de fato, tentou politizá-lo foi ele, que, como revelou o ministro Gilmar Mendes, do STF, armou um encontro para convencê-lo a votar contra a condenação dos mensaleiros. Como o ministro não topou, tentou dobrá-lo, ameaçando revelar um deslize que ele teria cometido, e que não houve. Isso é chantagem, não?

Convenhamos que não pega bem um ex-presidente da República fazer certas coisas como, por exemplo, tentar desmoralizar o Judiciário, um dos três poderes do Estado democrático brasileiro. Mas o que fazer? Outro dia, eu o vi, num vídeo antigo, afirmar para seus companheiros ter a vida lhe ensinado que o político não deve dizer o que pensa e, sim, o que o eleitor quer ouvir. Ou seja, o político deve enganar o eleitor. Creio não ser preciso dizer mais nada.

Esclareço que nada tenho, de pessoal, contra Lula. Preocupam-me as consequências de sua atuação no Brasil de hoje e no de amanhã.

Social-democracia à brasileira - GAUDÊNCIO TORQUATO

O ESTADO DE S. PAULO - 11/05
Que peculiaridades devem ser examinadas nas propostas dos candidatos ao Planalto?
De repente, abola chegou quadrada aos pés de Eduardo Campos: rever ou não rever o manifesto do PSB, datado de 1947, cujo item 7 prega que o objetivo do partido no terreno econômico "é a transformação da estrutura da sociedade, incluída na gradual e progressiva socialização dos meios de produção, que procurará realizar na medida em que as condições do País a exigirem". O pré-candidato à Presidência da República se vê no meio de uma enroscada. De um lado, empresários do campo privado temerosos de que a pelota seja chutada para os braços de Karl Marx; de outro, correligionários duros, que não admitem tesoura para cortar documento histórico. A par do simbolismo implícito no texto que ainda prega a "manutenção da propriedade privada nos limites da possibilidade de sua utilização pessoal, sem prejuízo do interesse coletivo", o documento suscita a indagação: de que social-democracia o Brasil necessita e que peculiaridades devem ser examinadas nas propostas dos candidatos à Presidência da República? Essa é a questão em jogo, ainda mais quando o tema da concentração de renda e igualdade social ganha o foro mundial, a partir do livro do francês Thomas Piketty, Capital no século XXI. Ao traçar o histórico da concentração de renda nos últimos três séculos, ele mostra que os ricos ficam cada vez mais ricos e a desigualdade fica cada vez pior.
O fato é que nossa social-democracia carece de aperfeiçoamentos. A título de lembrança, tal modelagem começa a tomar corpo a partir da ofensiva liberal conservadora que impacta o País nos anos 70, ganha corpo na onda de organização dos movimentos sociais impulsionados pela Constituição de 1988 e resulta na ampliação dos direitos coletivos,base do Estado do bem-estar. Não se trata, como alguns podem imaginar, de opor as bandeiras do socialismo clássico às do liberalismo ortodoxo. Trata-se de alinhar o sistema ao espírito do nosso tempo. Ganhando consistência progressiva entre 1919 e 1939, na Europa, sob a égide das identidades regionais e revisões constantes do escopo socialista, a social-democracia ganhou nuances aqui e ali, sem romper os pressupostos econômicos, políticos e sociais do liberalismo. Elege o Estado como regulador da economia, coisa necessária para corrigir desequilíbrios causadores de crises, aliás, na esteira das lições de John M. Keynes.

O modo de produção capitalista, por sua vez, atravessou um longo corredor de mudanças. As organizações foram instadas a ampliar a pletora de direitos dos trabalhadores. A configuração do mundo do trabalho adquiriu novos contornos com a multiplicação de micro e pequenos negócios, abrindo aos trabalhadores acesso ao território dos empreendimentos. Nesse ambiente, a social-democracia incorporou transformações nas esferas organizativas, políticas, econômicas e sociais. Ao perceber a impossibilidade de um só partido juntar mais de 50% dos votos de um país e chegar, sozinho, aos píncaros do poder, passou a agregar alianças. E a coabitar. Na França, pôde-se ver um presidente socialista (François Mitterrand) convivendo com um primeiro-ministro da direita conservadora (Jacques Chirac); ou um presidente direitista (Chirac) ao lado de um primeiro-ministro socialista (Lionel Jospin). A clássica luta de classes abriu vez para a conciliação entre grupos e classes; a esfera dos trabalhadores estendeu seus domínios, agora integrando as classes médias (com profissionais liberais), e não apenas os peões do chão de fábrica. Os partidos de massas substituíram os classistas.

Dito isso, cheguemos ao panorama brasileiro. Que caráter e programas devem ancorar nosso sistema social-democrata? O pressuposto inviolável, intransferível, imutável é o compromisso com o Estado dobem-estar. Em outros termos, o sistema deve desenvolver uma economia viável, ajustada aos parâmetros do território, capaz de beneficiar todas as parcelas da população e endossada por partidos que se juntem em aliança para implantar programas consensuados. Tal ideário não pode desequilibrar o orçamento público ou ancorar políticas populistas. Esse é o ponto de atenção. Urge enxugar a máquina administrativa usando critérios racionais e dar ao Estado o tamanho adequado para cumprir suas tarefas. Fernando Henrique tentou diminuir a extensão da máquina. Foi acusado de privatista. O ciclo Lula voltou a inchar a máquina com milhares de contratações. Mas não desconstruiu os pressupostos liberais. Na era Dilma, o Estado é considerado "mais intervencionista". Afinal, que instrumentos o Estado deve dispor para preservar seu papel de regulador da economia, promover o bem-estar e orientar a iniciativa privada no caminho do bem comum? Ampliar ou não as Parcerias Público-Privadas (PPPs) a concessão de serviços públicos e impor limites à privatização de bens públicos? O que cabe em nossa social-democracia? Com a palavra, os postulantes à Presidência da República.

É hora de atribuir a cada qual o que lhe pertence. É inegável que o braço assistencialista dos anos PT contribuiu para acelerar a dinâmica social. Da mesma forma, as estacas do Estado atual foram fincadas na era tucana do Plano Real. Outro ajuste seria nos vãos do nosso presidencialismo. A Tríade do Poder parece torta. O sistema presidencialista, com extrema concentração de força, precisa diminuir seu ímpeto legislativo. Tudo passa pela tinta da caneta do mandatário-mor, que mora na fortaleza que distribui verbas, cargos, empregos e favores. Todo esforço se fará necessário para atenuar aquilo que José Murilo de Carvalho chama de "estadania", contraponto à cidadania. A organicidade social, a constelação de entidades que se transformam em novos polos de poder, as manifestações de rua abrem um amanhã para a democracia participativa, cujo papel é o de fazer pressão sobre a democracia representativa. Nota de pé de página: não há por que temer o manifesto de 1947 do PSB. O mundo girou, e muito, desde os tensos anos da guerra fria.

Perdas e ganhos - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 11/05


BRASÍLIA - O Datafolha confirma que o pronunciamento na TV, o pré-lançamento pelo PT e o excesso de exposição em solenidades, jantares, no twitter e no Itaquerão conseguiram estancar a queda de Dilma. Mas a coisa não está boa.

Aécio bateu cedo nos 20%, a cinco meses das eleições, e o segundo turno já é praticamente uma realidade no cenário mais real, com os nanicos. Apesar das previsões de Marina Silva, o resultado do segundo turno a Deus pertence. A diferença entre Dilma e Aécio caiu de 27 para 11 pontos. E, entre Dilma e Campos, de 32 para 17.

Dilma, porém, tem mais do que só exposição. Tem estratégia, um cronograma a favor, programa de TV em maio e passa a contar com uma reversão gradual do mau humor com a economia. Caiu a expectativa de inflação, pela primeira vez desde 2012. Muda o humor na economia, mudam os ventos na política.

Tudo indica que Dilma não só estancou a queda na popularidade e nas intenções de voto como deve começar a recuperar parte do capital perdido. A questão é quanto.

Ela não começou a cair só com os protestos de junho de 2013. Todo mundo esquece, mas já tinha perdido oito pontos entre março e o início de junho. Há, aliás, uma simbiose entre a queda da popularidade da presidente e a ida das pessoas às ruas.

O seu pico de popularidade foi de 65%, em março de 2013. O fundo do poço foi com 30%, três meses depois. E agora? Está com 35%. Dos 35 pontos perdidos, só recuperou cinco.

Quanto à oposição: está na fase do cresça e apareça. Aécio, mais conhecido e com um partido mais estruturado e mais identificado como oposição, leva vantagem em relação a Campos. Vem subindo e vai criando a sensação de que tem mais fôlego para chegar ao segundo turno.

Eis o risco: ele passar a apanhar não só de Dilma e do PT, mas de Campos e de Marina --neste caso, sem poder revidar. Ele precisa duplamente de Campos e Marina: para chegar ao segundo turno e para disputá-lo.


O paradoxo de Ícaro - ANDRE BARCAUI

O GLOBO - 11/05

Avanço na educação é muito lento em relação a países como a Coreia do Sul, que, em meio século, saiu de um PIB per capita igual ao do Brasil para um três vez superior


Na mitologia grega, Ícaro teve asas construídas por seu pai, Dédalo, com cera de abelha e penas de gaivota, em um plano engenhoso para fuga da ilha de Creta. No entanto, o poder extraordinário adquirido acabou gerando sua queda, na medida em que se aproximou demais do sol. Da mesma forma, quando organizações são apanhadas em seu próprio círculo vicioso de gana pela manutenção do poder, vitórias e pontos fortes acabam sendo ofuscados e se transformando em ônus, eventualmente causando sua obsolescência e destruição. São vários os exemplos no mundo corporativo que ilustram esse paradoxo, assim como na política e no governo.

Tomemos o modelo de programas importantes como o Bolsa Família, que teve sua origem no governo FH, e é recursivamente explorado de maneira demagógica ou com fins eleitoreiros. Até aí, mesmo com evidente descaso quanto ao descontrole das contas públicas a serem pagas por gerações atuais e futuras, aceita-se e entende-se a promoção do programa como tentativa desesperada de salvar uma imagem que sofre com pesquisas desfavoráveis de opinião. Mas o que mais irrita qualquer brasileiro minimamente informado é a percepção do engodo, do embuste. Não se trata de oposição ao governo, até porque não falo em nome de partido algum. Mas sim, de ser contra o uso do dinheiro público de maneira ineficiente, improdutiva e escusa. Ter o pior desempenho entre os emergentes, desperdício e inchaço em uma estrutura ministerial descomedida, gastos imorais em projetos mal planejados de grandes eventos com direito a pito internacional são alguns exemplos. Uma logística pífia em um país de dimensões continentais, mas que inexplicavelmente subsidia crédito para portos em Cuba, além de importar médicos, em condições de trabalho minimamente duvidosas, do mesmo país. Ter todas as condições para assumir a liderança da América Latina, mas patinar nas relações externas, não se posicionar em casos de barbárie de países vizinhos e ficar preso a um Mercosul por ideologia anacrônica e ultrapassada são mais algumas amostras.

Apesar da evolução em suas instituições, o Brasil encontra-se vulnerável e à beira de um retrocesso econômico. A pior sensação é a de perda de tempo. Perceber que o futuro fica cada vez mais hipotecado às custas de benefícios insustentáveis de um governo excessivamente intervencionista que, inclusive, dilapida o próprio patrimônio nacional. De nada vale ser a sétima economia do mundo se continuarmos em 85º no Índice de Desenvolvimento Humano e com uma carga tributária inversamente proporcional à qualidade dos serviços recebidos.

Mesmo considerando a desigualdade histórica que enfrentamos na América Latina, o avanço na educação é muito lento em relação a outros países como a Coreia do Sul, que, em meio século, saiu de um PIB per capita igual ao do Brasil, para um três vez superior. Nesse sentido, a retórica de Abraham Lincoln sugere que não é possível enganar todos durante todo tempo, mas até que o governo tem se esforçado bastante, dado que a chave para sustentabilidade da empulhação é justamente o baixo nível educacional.

Apesar da advertência de seu pai, Ícaro morreu ao cair no mar depois de se aproximar demais do sol com suas asas de cera. São várias as advertências que o povo brasileiro tem dado ao atual governo, mas a principal é que um choque de realidade e uma dose de humildade e vergonha na cara não fazem mal a ninguém.

Exemplo do Uruguai na política sobre drogas - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 11/05

Regulamentação sobre comércio e distribuição da maconha não transformará o país num narcoestado; Brasil precisa discutir a sério a descriminalização


Com a regulamentação da chamada “lei da maconha”, através de decreto assinado segunda-feira pelo presidente José “Pepe” Mujica, o Uruguai se inscreve entre os países que optam por novos e mais eficazes paradigmas na luta contra o narcotráfico e o consumo de drogas. Esse flagelo mundial desafia governos e se mostra renitentemente refratário à ortodoxia das políticas baseadas em ações policial-militares.

Ainda prevalente na maior parte das nações do planeta, essa orientação que privilegia o combate aos entorpecentes pelo viés criminal, não tem logrado obter grandes avanços; ao contrário, a ONU, por sua agência específica, o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc), alerta que o consumo, suprido pelo tráfico (crime organizado), tem aumentado. Em números, chega-se a dramas como o denunciado ano passado, em Viena, pelo Unodc: as drogas ilícitas — sem controle e em geral comercializadas em ambientes onde predominam a violência decorrente da criminalidade e inexistentes (ou tíbios) cuidados com a saúde — matam mais de 500 pessoas por dia. Ou seja, a cada hora registram-se quase 21 óbitos em decorrência de alguma relação da vítima com substâncias psicotrópicas. Essa realidade não se muda com ideologias, teimosias sociológicas ou preconceitos, mas com ações capazes de lhe dar respostas efetivas. A opção do Uruguai o coloca à frente na luta contra o narcotráfico, o monopolizador meio de abastecimento de um mercado dominado pelo crime e por suas “leis”. E abre caminho para o país enfrentar a questão pelo viés da saúde pública, em vez de tratá-lo com programas centrados no aspecto criminal do problema, ineficazes, como está provado.

Ressalvadas especificidades de cada país, o Brasil precisa mirar no corajoso exemplo uruguaio de adotar nova e mais flexível abordagem para o problema. Aqui, certamente, a questão das drogas é mais complexa, pois nela se confundem aspectos que são, de fato, puramente criminais, como a existência de quadrilhas do crime organizado enraizadas em comunidades subjugadas pela violência, e outros de ordem social, como a fragilidade das políticas sanitárias públicas, essenciais para a adoção de programas de tratamento de usuários, imperativo de um novo paradigma da questão. Outra complicação reside no fato de o território brasileiro ser, ao mesmo tempo, grande mercado consumidor e exportador de drogas.

Não está na agenda brasileira a legalização da produção e consumo da maconha. Mas mudar o protocolo da guerra contra as drogas, com ações de saúde pública na ponta do consumo, e combate intransigente ao tráfico, é a melhor política, e isso não transformará o Brasil num narcoestado, argumento frequente de grupos interessados em manter o viés policial na abordagem da questão. Por certo, o Uruguai está longe disso, assim como nações que adotaram a descriminalização, como Portugal e Holanda, onde a criminalidade caiu e o consumo de drogas se mantém sob controle.

Pressão social é padrão - EDITORIAL CORREIO BRAZILIENSE

CORREIO BRAZILIENSE - 11/05
Quanto mais se aproxima a Copa do Mundo, mais forte torna-se a pressão social no país. Belo Horizonte, Curitiba, Rio de Janeiro, São Paulo e pelo menos mais quatro grandes cidades voltaram a registrar manifestações nos últimos dias. Servidores públicos ameaçam deflagrar greve geral a dois dias da abertura do Mundial. Sindicatos de trabalhadores civis também estão mobilizados para aproveitar a ocasião e cobrar reajustes salariais e direitos diversos.
Mais grave: toda a insatisfação popular canalizada para as ruas desde junho do ano passado continua em alta. Sem o atendimento das reivindicações nem o encaminhamento de soluções plausíveis, a tendência é de nova onda de protestos. Com a autoridade de responsável pela segurança pública, o ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, apelou para que as manifestações sejam pacíficas. Mas, no momento em que fazia o pedido, na quinta-feira, ônibus eram depredados no Rio, onde motoristas e cobradores mantinham apenas 30% da frota em circulação.

É preciso mais do que discurso. Como também é necessário mais do que manter tropa de contingência para eventualidades. Nota-se, ainda, que o périplo do secretário-geral da Presidência da República, ministro Gilberto Carvalho, numa tentativa de entendimento com movimentos sociais país afora, não tem dado o retorno esperado. Ele próprio admitiu que o governo demorou a estabelecer o diálogo. Agora, o tempo urge. E não há saída, exceto em incansáveis negociações, com pauta propositiva, sobre bases reais. Ou se toma providência logo, ou o Estado ficará cada vez mais acuado, até o limite da aplicação da força, de todo desaconselhável.

A situação dos servidores públicos é caso à parte. Primeiro, porque a cobrança salarial é pela antecipação de reajuste de 5% previsto em acordo para ser concedido em janeiro de 2015. Segundo, porque o direito de greve da categoria é assunto jamais resolvido. Pela particularidade do atendimento a diversos setores da sociedade - muitos dos quais essenciais -, esse instrumento, embora tão legítimo quanto para qualquer outra classe de trabalhadores, merece regulamentação especial. Terceiro, que a decisão sobre a transformação do indicativo de paralisação, já aprovado, em greve de fato, será tomada em assembleia marcada para 30 de maio - portanto, a 13 dias da Copa.

Está óbvio o uso do poder de fogo, ou de barganha, conferido pelo Mundial à população. Por sua vez, é também evidente o despreparo das autoridades no trato das várias questões em jogo. O que os black blocs trouxeram à tona um ano atrás só foi novidade pela violência exacerbada. No mais, todos sabiam da insatisfação latente com os serviços públicos - do transporte à saúde, da educação à segurança. Pois o que ocorreu de lá para cá? O aumento do dissabor com governantes e políticos em geral. Inclusive pela percepção de que o tal padrão Fifa não se fez presente nem nas obras carimbadas pela Federação Internacional de Futebol, igualmente desgostosa com atrasos e improvisos.

Os filhos do Brasil - EDITORIAL GAZETA DO POVO - PR

GAZETA DO POVO - PR - 11/05

Políticas de abrigamento de crianças e adolescentes no país são viciadas. Se não forem modificadas, o descompasso entre as necessidades dos abandonados e os que desejam adotar vai continuar


Crianças e adolescentes brasileiros crescem e “envelhecem” nos abrigos, sem desfrutarem da oportunidade de serem adotados. Sabe-se dessa manchete. Também é sabido que os casais que se candidatam a adotar seguem um receituário pétreo – querem crianças brancas, saudáveis e com menos de 5 anos de idade, o que, em parte, explica a situação. Há quem queira adotar, quem precise ser adotado, mas essa soma de vontades não resolve o impasse, como seria desejável. E assim prosseguimos, arrastando por décadas um dos maiores impasses da vida brasileira.

Os dados da adoção foram explorados em série publicada pela Gazeta do Povo, Infância esquecida, do repórter Felippe Aníbal. O Paraná, quinto estado brasileiros com mais abrigados em instituições, tem mais pretendentes à adoção do que crianças e adolescentes em abrigos: 5 mil contra 3 mil. O descompasso tem explicações no mínimo dolorosas. Uma delas diz respeito à cor do adotado. No Sul, a condição de que seja branca chega a 41% dos casos. Não é preciso malabarismos para deduzir que quem está na fila são na maioria negros. Os números, exatos, se tornam um circo de absurdos: o Cadastro Nacional de Adoção diz que 1,2 mil crianças e adolescentes podem ser adotadas, mas esse número não passa de um grito parado no ar.

Há quem pergunte se haverá saída, pois nem o tempo para, deixando a gurizada sempre em chicas e shorts, nem os pais reescrevem seu imaginário sobre a adoção. Hoje tem um abrigado fazendo 6, 10 ou 16 anos. E tem um casal preenchendo formulários nas varas do país, na maior boa vontade, mas desfrutando do seu direito de ajustar a adoção à própria mentalidade. Melhor não atiçar: mesmo em situações ideais, acontecem “devoluções” de crianças, agregando um trauma a mais à vida de quem já carregava traumas de sobra.

O que se pode dizer é que o mecanismo das adoções pode ser aperfeiçoado. E acelerado, para felicidade geral da nação. Difícil alguém que conheça o setor e não partilhe dessa certeza. Ainda que alegue expedientes técnicos demorados, a Justiça não só pode como deve fazer as devidas e evidentes destituições do poder pátrio, permitindo à criança, em tempo hábil, encontrar um novo lar. Campanhas, claro, sempre as campanhas, se forem contínuas e impertinentes conseguiriam atrair mais pais para a adoção, e pais mais abertos. Pronto?

Todas essas verdades pisadas e repisadas precisam de um ingrediente a mais – políticas públicas que ajudem a maior parte das crianças e adolescentes abrigados a voltar para suas próprias famílias. Durante muito, muito tempo, desacreditar dessa possibilidade era uma questão, digamos, institucionalizada. O próprio sistema de abrigamento se organizou em torno da premissa de que voltar para casa estava fora de questão. Ainda hoje há quem faça expressão de horror ao ouvir que a maior parte dos que vivem em casas-lares não são órfãos, como se quer acreditar, mas vítimas da violência de padrastos ou expurgados pela miséria.

A questão é que as políticas de volta à família são caras demais, demoradas demais, sofisticadas demais. E não se acredita o bastante de que todo esse tempo, dinheiro e empenho valem a pena. Até se botou fé que o sistema dos centros de referência em assistência social, os Cras, diluiria as barreiras, dando forma à viagem de volta para casa. Mas Papai Noel não existe.

Em parte, o Cras teria poder para tanto, mas já se percebeu que a tarefa é mais dura do que a plasticidade do projeto. Sobre o Cras pesam tarefas inúmeras, comunitárias, imediatas, o que impede os centros de dar conta de uma missão tão delicada. A bola está cantada – as práticas de volta à família estão no papel, mas ainda não nasceram. Pedem coragem, determinação e investimentos. Pedem o Cras, e algo mais.

Do contrário, os números continuarão a ser uma tragédia anunciada, como mostrou a série Infância esquecida: apenas em Curitiba, 84% dos aptos à adoção têm mais de 11 anos. Suas chances se reduzem a zero a cada aniversário que completam. Ao complicador da idade, some-se haver ou não irmãos, cor, ser portador do HIV ou alguma outra enfermidade crônica. São estatísticas que incidem diretamente sobre o destino das crianças e jovens brasileiros. E esse é um assunto que não pode mais ficar para depois.

Populismo e violência - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S. PAULO - 11/05
As duas principais cidades do País, São Paulo e Rio de Janeiro, foram sacudidas na quinta-feira por manifestações públicas que em muitos pontos descambaram para a violência. Na capital paulista, cinco movimentos -três deles simultâneos - levaram às ruas militantes sem-teto que invadiram e picharam as sedes das três maiores empreiteiras responsáveis pelas obras da Copa do Mundo. No Rio, motoristas e cobradores em greve depredaram 467 ônibus - isso mesmo, quase meio milhar. O grave não são esses lamentáveis episódios em si. Gravíssimo é o fato de que eles estão se tornando banais, corriqueiros, cada vez mais descontrolados, revelando a cada dia com maior nitidez um cenário de convulsão social que ninguém sabe onde e comovai terminar. 


Manifestações populares pacíficas, movimentos reivindicatórios ordeiros, atos públicos de protesto realizados sem violência são importantes para o aperfeiçoamento e fortalecimento das instituições democráticas.

Mas, quando se olha para o que está acontecendo em todo o País, o que se vê é muito diferente disso. Há fatores perturbadores que precisam ser levados em conta na avaliação dessas manifestações e da posição que o poder público tem assumido diante delas.

Um desses fatores é, obviamente, o sistemático desrespeito à lei e o desprezo pela segurança pública. Ninguém tem o direito, por mais justa que seja a causa que defende, de violar direitos alheios e muito menos de colocar em risco a integridade física de pessoas e do patrimônio público e privado, promovendo depredações e invadindo propriedades. São atos que a lei proíbe e pune e que o bom senso repele por serem contrários à boa convivência democrática. 

Por outro lado, a intensidade com que avultam essas manifestações, abrangendo um amplo universo de agendas específicas - lamentavelmente pontuadas por atos de violência -, sugere que a sociedade brasileira está insatisfeita, inconformada, revoltada. 


Mas este não é o país maravilhoso que em dez anos promoveu o milagre do resgate social dos desvalidos e se projetou triunfante na cena antes só frequentada pelas grandes potências mundiais? Não é o país em que o povo pode contar com as promessas de que tudo vai ficar melhor ainda, pois há infinitas bondades a serem sacadas da cornucópia dos poderosos?

É claro que o governo - que para onde olhe só enxerga urnas eleitorais - tem tudo a ver com o sentimento difuso de insatisfação que permeia a sociedade. Pois predomina o sentimento, nem sempre expresso com clareza, de que as conquistas das últimas décadas, obtidas com grandes sacrifícios - desde o controle da inflação e a valorização da moeda até uma melhor distribuição de renda -, correm sério risco diante da incompetência administrativa de um governo unicamente preocupado em se manter no poder.  


A tudo isso se somam os temores gerados pela cúmplice despreocupação do governo com o gangsterismo que floresce em certos movimentos ditos sociais - aqueles que lideram a violência e o esbulho.


Afinal, que outra interpretação dar ao fato de a presidente Dilma Rousseff abrir espaço em sua agenda para dar atenção a manifestantes que, ao lado do local do encontro, estão cometendo o crime de invadir uma propriedade privada? Atitudes de mero oportunismo eleitoral como essa são, no mínimo, antipedagógicas do ponto de vista do exercício da cidadania. Afinal, se a chefe do governo é tolerante com invasores de Itaquera, por que não o será também com outros crimes?  


Aos invasores que saíram do encontro com a presidente embalados pela promessa de que tudo será feito para incluí-los no Minha Casa, Minha Vida, cabe a piedosa advertência de que, se tudo der certo, correrão o risco de se tornarem eles próprios vítimas do crime que hoje praticam, pois até mesmo no programa habitacional do governo as invasões são cada vez mais frequentes e toleradas.  


O fato é que as incertezas que hoje assombram o País têm também sua origem nas omissões e desmandos de um governo populista que há mais de dez anos entrega muito menos do que promete. E promove, com os hábitos perniciosos cultivados por setores do PT, a lassidão moral que ameaça as instituições.

Explodir ou "bombar" - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 11/05
Em declarações recentes, Dilma afirma que vai insistir na direção que deu ao seu governo, apesar dos pífios resultados econômicos
O Brasil não vai explodir em 2015, vai "bombar", declarou a presidente na semana que passou.
O sentido e os termos extravagantes da previsão importam bem menos do que mais essa reafirmação de que Dilma Rousseff (PT) tem poucas dúvidas sobre o rumo que deu ao país, apesar dos resultados sofríveis de seu governo e das perspectivas pouco animadoras.

Desde o pronunciamento do 1º de Maio, a petista tem feito promessas de manter políticas centrais de sua administração. Refuta correções de rumo. Em suma, deu indícios claros de que vai insistir em ações que reduzem a poupança do governo, alimentam a inflação e desestimulam investimentos.

Mais ainda, Dilma afirmou que não vê problemas em controlar ou manipular preços, como o de combustíveis e o de energia elétrica.

A presidente acredita ser possível segurar a inflação por meio desses expedientes artificiais e historicamente fracassados; não quer prejudicar os trabalhadores com redução da atividade econômica. Esse resultado adverso, no entanto, virá mais tarde e em intensidade maior se a política econômica não mudar rapidamente.

Pelo menos em público, a petista diz que a insegurança econômica do eleitorado é em grande parte reflexo de campanhas negativas. Onde há desempenho ruim, ela vê, ou ao menos é o que sugere, uma fase de incubação do sucesso.

Por exemplo, assevera que as obras de infraestrutura em breve ficarão prontas e eliminarão alguns dos principais fatores de insatisfação com serviços públicos. Quanto ao restante, seria só alegria, por assim dizer: a renda sobe, o desemprego é historicamente baixo e há mais benefícios sociais.

Longe da retórica presidencial, contudo, diminui a probabilidade de que a economia brasileira desabroche. A confiança de empresários e consumidores decresce faz quase dois anos e cai aos níveis de 2009, após a crise mundial.

A arrecadação de impostos federais sobe devagar, retida pelo ritmo fraco do PIB e pela seca de outras fontes de aceleração da receita, como a formalização da economia.

Com menos impostos, torna-se impossível ou irresponsável manter o progresso de programas sociais. Consumidores e empresários inseguros solapam a alta do investimento produtivo. Intervenções equivocadas do governo na economia provocam desordem e desânimo adicionais no setor privado.

Este é o Brasil real: não é explosivo, mas em nada se assemelha ao país "bombado" da presidente. Não se espera que um governante em campanha reconheça seus fracassos. Porém, não apresentar caminhos para uma transição transparece alheamento da realidade.

COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

"O pior já passou”
Rui Falcão, presidente do PT, minimizando pesquisas que deixam Dilma mal



É SÓ GRITAR ‘REFÚGIO!’, E HAITIANOS ENTRAM NO BRASIL

A Polícia Federal está proibida de conter a entrada dos haitianos no Brasil, como tem acontecido, sem qualquer controle, nem documentos. Entre os mais de 4 mil que chegaram este ano, pode haver criminosos comuns, fugitivos da Justiça, terroristas procurados etc, mas instruídos pelos “coiotes”, pagos para trazê-los do Haiti, apenas precisam gritar “refúgio!”, e os agentes são obrigados a permitir o ingresso no Brasil.

Casa de Mãe Joana
Já no Brasil, os haitianos recebem “visto humanitário” de permanência, além de carteiras de trabalho com a identidade que declaram.


Irresponsabilidade
O Brasil, irresponsável, nem sequer faz gestões junto aos governos da Bolívia e do Peru, por onde chegam os haitianos, para exigir vistos.


PF marginalizada
O Ministério Público Federal e o governo paulista criaram comissão para examinar o problema dos haitianos. E excluíram a Polícia Federal.


É só o começo
Com estímulo inconsequente do governo, o problema deve se agravar: estudo recente mostra que 91% dos haitianos querem viver no Brasil.


Vandalismo contra ônibus
Têm sido frequentes a depredação e queima de ônibus durante manifestações, em Estados como Rio de Janeiro, São Paulo e Distrito Federal. Só em 2014, foram 522 casos de vandalismo contra transporte público, quase 17 vezes o número registrado em 2013, que foi de 31 ocorrências, com perdas de mais de R$ 3,9 milhões. Em 14 anos, as empresas contabilizam prejuízo de R$ 120,5 milhões com vandalismo.


Sem seguro?
Ao contrário do que muitos pensam, os ônibus urbanos e rodoviários não possuem seguro, nem tampouco amparo financeiro do Estado.


População prejudicada?
Quando incendiados, as empresas não conseguem repor os ônibus imediatamente, pois só são produzidos por encomenda.


Na estrada
Após ter sido vaiado em aeroporto, o enrolado André Vargas agora só viaja de carro do Paraná até Brasília. São cerca de 1,2 mil quilômetros.


Engavetado?
O processo contra Rose Noronha, a amiga íntima do ex-presidente Lula, não anda. Apesar das 5 mil páginas, nenhum dos 18 acusados da Operação Porto Seguro foi julgado ou condenado.


Salão privado
Como Delúbio Soares, outro condenado do mensalão, Jacinto Lamas, também se utiliza de barbeiro em seu local de trabalho, de onde somente pode sair para retornar à cadeia, no começo da noite.


Outro mensalão
Na Câmara, deputados expõem nos bastidores o pânico com eventual delação premiada de Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras, que revelaria um mensalão, com grana para diversos partidos, que faria aquele do governo Lula parecer brincadeira de crianças.


A História de cada um
Ascendência italiana e pulso firme unem dois juízes na roda da História: Sérgio Moro, o “xerife” da Operação Lava Jato, e Aldo Moro, cinco vezes premiê da Itália, morto pelas Brigadas Vermelhas.


Faltou combinar
O governador João Lyra Filho está incomodado com o “abacaxi” que herdou de Eduardo Campos: a promessa de doar terreno ao lado da Arena Pernambuco para a “Cidade da Copa”, megaprojeto imobiliário da Odebrecht. É que, sem autorização da Assembleia, nada feito.


Sem apoio
Com os dois pés na campanha de Henrique Alves (PMDB) ao governo, o senador José Agripino (DEM-RN) descarta candidatura à reeleição de Rosalba Ciarlini: “Ela nem recorreu ao TSE, continua inelegível”.


Pontes partidas
O chanceler Luiz Alberto Figueiredo acalmou os ânimos de movimento, liderado por dois filhos de embaixadores, disposto a “resgatar” o “prestígio perdido” do Itamaraty, numa carta aberta criticando Dilma.


Briga religiosa
Na tentativa de contrapor bloco comandado por evangélicos no Distrito Federal – PTN, PP, PROS, PSC e PRB –, candidatos católicos se reuniram para lançar dez candidatos a deputado distrital e um a federal.


MAMÃE, MAMÃE
Os filhos da Dilma, “mãe do PAC”, avisam que, com a disparada da inflação, vão fazer vaquinha para ela ganhar um nariz de Pinóquio.