quinta-feira, novembro 08, 2012

E se ele não tem grana? - IVAN MARTINS

REVISTA ÉPOCA


Por que muitas mulheres ainda hesitam em se juntar a homens sem dinheiro



Ponha-se no lugar da moça que eu conheço. Ela tem trinta e oito anos, gostaria de casar e ter filhos, mas o homem por quem está apaixonada não tem onde cair morto. É um sujeito culto, inteligente, idealista, sem a menor vocação para ganhar dinheiro. Mora num apartamento minúsculo e parece feliz em andar de ônibus e comer fora em lugares baratos, apesar de estar chegando aos 40 anos. A minha amiga não.

O pai dela foi um provedor dedicado e um marido amoroso, que criou as filhas com desvelo, para viver e casar bem. Ela admite que, no fundo, gostaria de encontrar um homem prático e bem sucedido como o pai para começar sua própria família, mas, ao mesmo tempo, sente que ama o professor de olhos tristes. Se eles vierem a casar, está claro que viverão do salário dela, que é bom. Ela hesita. Diante da possibilidade de se tornar a provedora da casa, a primeira na história da sua família, ela morre de medo. Não era bem assim que começava a história do Príncipe Encantado.

Eu imagino que nos próximos anos um número cada vez maior de mulheres vá enfrentar o mesmo dilema.

Elas trabalham duro, acabam ganhando bem e, lá adiante, quando a vida permite uma pausa para pensar em família & casamento, descobrem que nem sempre as circunstâncias a colocam diante de caras com a mesma história de sucesso econômico. O passo lógico seria abraçar a situação como ela se apresenta, fazer o que os homens fizeram por séculos, e ainda fazem, com absoluta naturalidade – tomar pra si a responsabilidade econômica pela pessoa que ama e pela família que vier a resultar dessa união.

Lembro de ter lido, tempos atrás, uma entrevista com jovens executivas que ilustra de forma extrema essa atitude. Todas elas, diante da pergunta sobre a possibilidade de se juntar a um homem com menos dinheiro, negaceavam. Uma delas dizia, com todas as letras, que não aceitaria um sujeito que houvesse conseguido menos do que ela na vida. A única medida de sucesso que ela parecia perceber era dinheiro, patrimônio, renda. Se o sujeito tivesse acumulado uma cultura imensa, se carregasse uma história de vida extraordinária, se fosse feliz, intenso, engraçado, brilhante ou sensual, nada disso parecia contar. Fiquei com a impressão de que a jovem executiva cogitava para si mesma uma fusão comercial, não uma parceria afetiva. Talvez antes de envolver-se com alguém ela requisitasse os serviços de uma empresa de consultoria... Mas, nessa hora, algo emperra na cabeça de algumas mulheres, como emperrou na cabeça da minha amiga. A inversão de papéis não lhes parece natural, e muito menos promissora. Elas puxam o freio de mão, ou pulam fora do relacionamento. Preferem o risco de ficar sozinhas a converter-se, voluntariamente, na cabeça econômica de um casal.

Ao me perguntar o que há por trás dessa atitude, eu percebo algumas coisas, nem todas elas frívolas.

Segurança econômica talvez seja a principal. Quem já passou necessidade sabe que a constante falta de grana pode provocar situações terríveis no interior dos casais e das famílias. Dinheiro traz conforto, tranquilidade, a possibilidade de fazer coisas gostosas e oferecer aos filhos horizontes que os pais muitas vezes não tiveram. Por isso tudo, é bom ter em casa alguém com capacidade e disposição para ganhar dinheiro - mas por que essa pessoa precisa, necessariamente, ser o homem?

Ao contrário do que previam alguns evolucionistas, a realidade tem demonstrando que as mulheres são perfeitamente capazes de prover o sustento da família. Segundo o IBGE apurou no censo de 2010, no Brasil 37% das casas brasileiras são mantidas exclusivamente por mulheres – e, naquelas em que vive um casal, em 46% dos casos são elas que ganham mais. Está claro, portanto, que as mulheres podem perfeitamente assumir a posição de mantenedoras principais. A de parceiras e co-responsáveis pelas despesas da casa elas assumiram faz tempo, junto com todas as tarefas domésticas que ainda sobram para elas.

Minha amiga, aquela do começo desta coluna, sabe que é capaz de ganhar dinheiro pelos dois, mas teme que o homem de quem ela gosta não seja bom marido ou bom exemplo como pai. O pai dela, afinal, era protetor, cuidava de tudo, criou em torno dela, das irmãs e da mãe uma rede de conforto e segurança econômica que o homem que ela ama, claramente, não é capaz de prover. Eu entendo o que ela sente, mas acho que talvez esteja confundindo coisas. Talvez esteja misturando a capacidade de oferecer conforto material com a capacidade de aglutinar uma família feliz.

O homem que não sabe ganhar dinheiro, mas tem seu trabalho e seus valores, pode ser o melhor marido e o melhor pai do mundo, assim como, através dos séculos, muitas da melhores mães e companheiras do mundo nunca ganharam um tostão furado. Um homem sem dinheiro pode ser amoroso, generoso, gentil com as pessoas e cuidadoso com as coisas. Pode ser ativo, espirituoso, cheio de vida, capaz de boas atitudes e bons sentimentos. Se não for vagabundo ou ressentido, pode ser um ótimo exemplo para os filhos – exemplo de que o dinheiro e o sucesso material não são a coisa mais importante da vida, exemplo de que há outros valores além dos que o dinheiro é capaz de comprar.

Talvez não haja muitas mulheres dispostas a bancar um homem desses, porém. A maioria talvez prefira a relação com um tipo convencional, com mais jeito de provedor. Esse negócio de ser o chefe econômico da casa, afinal, não é moleza. O estresse que vem com a posição é enorme, dura décadas, e no final rouba uns 10 anos de vida de quem o abraça. É um preço que os homens vêm pagando há muitas gerações. Eles escolhem a mulher com base apenas nos seus sentimentos e desejos, sabendo que terão de trabalhar duro, provavelmente pelo resto da vida, para cuidar da família que fizerem com ela. Não é uma opção fácil, como a minha amiga está percebendo, mas tem suas gratificações. Exige coragem, porém. No caso das mulheres, a coragem adicional de desafiar convenções e de romper com os preceitos da própria cabeça.

Adeus às armas - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 08/11

José Mariano Beltrame mandou recolher mais de cem fuzis do policiamento na Zona Sul do Rio.
O secretário está convencido de que os avanços da política de segurança permitem, em algumas áreas, claro, o policiamento sem uso deste tipo de arma, mais apropriada para territórios em guerra.
Faz sentido.

Osso do pé
Ivete Sangalo não vai mais participar, dia 14, em Las Vegas, EUA, de um tributo a Caetano Veloso, parte das festas do Grammy Latino 2012, que este ano homenageia o artista brasileiro.
Quebrou um osso do pé.

Tomara que não
Um personagem importante do futebol, que conhece e gosta de Adriano, teme que o craque, pelo andar da carruagem, torre toda a sua fortuna em menos de cinco anos. Meu Deus...

Mundo cão
Lembra o soldado Kennedy, do 22º BPM do Rio, que borrifou spray de pimenta numa cadela, na Rocinha, em maio (veja abaixo a cena flagrada pelo coleguinha Domingos Peixoto)? A investigação da PM concluiu que ele agiu em legítima defesa, pois o animal teria avançado em sua direção “com o ânimo de mordê-lo”. É. Pode ser.

Missa polêmica
A “Revista de História da Biblioteca Nacional” que chega às bancas amanhã deve causar polêmica com uma reportagem sobre a restauração do famoso quadro “A Primeira Missa no Brasil”, de Victor Meirelles de Lima (1832-1903).
É que o quadro, pintado entre 1859 e 1860, ganhou, na restauração, em 2006, duas faixas laterais de cor neutra que cobrem parte da pintura.

Segue...
Coordenada pelo Museu Nacional de Belas Artes, a restauração teve colaboração do Laboratório de Instrumentação Nuclear da Coppe/ UFRJ, e financiamento do BNDES.
Segundo a revista, a intervenção, que teria descaracterizado a obra, causou “o encolhimento da tela e a perda de profundidade”.

Mas...
Especialistas ouvidos pela “Revista de História” se dividem.
Alguns afirmam que as tais faixas laterais poderiam constar da obra, originalmente. Sua função seria proteger a pintura da ação do tempo. Outros discordam.

NO TEMPO DAS CARRUAGENS
Este prédio histórico, deteriorado, exemplar da arquitetura eclética de inspiração clássica e art nouveau, na esquina das ruas Gomes Freire e do Senado, no Centro velho do Rio, será, em breve, totalmente recuperado (veja na reprodução do projeto aqui acima como vai ficar). Trata-se da Garagem Poula, construída em 1910 para abrigar carruagens e uma hospedaria. Quem vai tocar a obra é a construtora WTorre, que finaliza, ali perto, o Centro Empresarial Senado, a ser usado pela Petrobras. A empresa assumiu com a prefeitura o compromisso de revitalizar parte do patrimônio arquitetônico da região, como o Solar do Marquês de Lavradio, o prédio do finado Dops e a Garagem Poula 

Conte até 10
O Ministério da Educação e o Conselho Nacional do Ministério Público anunciam hoje, em Brasília, uma campanha contra homicídios, voltada para crianças e jovens. A ideia é abordar o tema na escola no início de 2013, falando de assassinatos por impulso e motivos fúteis.

Segue...
No Rio, segundo estudo do MP baseado em números da Polícia Civil, de janeiro de 2011 a setembro de 2012, houve 7.799 homicídios dolosos.
Do total, 1.136 tiveram causa identificada — 26,85% delas foram classificadas como motivos fúteis ou por impulso. Coisas como intolerância religiosa, homofobia, alcoolismo ou ciúme, por exemplo.

Por fim...
A campanha, batizada de “Conte até dez. Paz. Essa é a atitude” (veja o cartaz lá em cima) será estrelada pelos lutadores de MMA Anderson Silva e Júnior Cigano e pelos judocas Leandro Guilheiro e Sara Menezes, medalhistas em Londres.
A música-tema será “Pra onde vai”, de Gabriel Pensador.

Pôxa, Cedae
Acredite. Só este ano, a Cedae, estatal fluminense da água, já acumula 20 mil processos nos Juizados Especiais do Rio.
Mas a empresa frustrou as expectativas do TJ-RJ ao não apresentar propostas para acordo em 90% de suas ações em pauta nesta Semana Nacional de Conciliação, que termina dia 14.

Ela e muita gente
Ontem, no salão Werner do Humaitá, no Rio, uma manicure se virou para a recepcionista e disse:
— Eu não dormi nada esta noite.
Fiquei esperando o Obama ganhar...

BEBÊ A BORDO
Maria Rita, a cantora filha da saudosa Elis Regina, grávida do segundo filho, recebe um paparico de boas-vindas das irmãs Mart’nália e Maíra Freitas, filhas de Martinho da Vila, nos bastidores de gravação na Biscoito Fino

DE VOLTA AOS PALCOS
Renata Sorrah, a grande atriz, em cartaz no CCBB com a peça “Esta criança”, recebe o carinho de Alessandra Negrini depois do espetáculo, dirigido por Márcio Abreu

Ponto Final
Palpite infeliz. Ao decidir em 2009 mexer na regulação do setor de petróleo, Lula e Dilma arrumaram sarna para se coçar. E o que é mais greve: muita gente séria sustenta que não era preciso mudar a legislação para alcançar alguns objetivos perseguidos pelo governo, como maximizar os ganhos da União com o pré-sal. Com todo o respeito.

Investimento social com base em resultados - ANTONIO MATIAS


O Estado de S.Paulo - 08/11


O ingresso num programa de educação integral desenvolvido em Belo Horizonte possibilitou que os alunos do 4.º ao 9.º ano do ensino fundamental melhorassem significativamente suas notas de Português e Matemática, além de alterar hábitos que favorecem o aprendizado, como ler jornais e revistas, usar a internet, frequentar atividades culturais e fazer lição de casa. Já os participantes do Jovens Urbanos, um programa educativo e de inclusão desenvolvido na periferia da capital paulista, aumentaram sua renda e a empregabilidade com os conhecimentos adquiridos em ações que estimulam a capacidade de expressão e a circulação por diversos espaços da cidade. Eles também passaram a ler muito mais desde então.

Os dados mencionados sobre ambos os programas foram obtidos com o emprego de uma metodologia de avaliação que compara dois grupos, um participante (tratamento) e outro não participante da ação (controle), que estavam em condições muito similares em todos os aspectos no início do projeto. Assim foi possível verificar se os resultados obtidos são atribuídos de fato ao investimento social realizado. Essas avaliações permitem também encontrar efeitos que não eram esperados no planejamento.

Esse tipo de informação vem ganhando importância para governos e investidores privados que desejam destinar recursos à área social com transparência e eficácia, tomar decisões assertivas e aprimorar a gestão de projetos e programas voltados para a melhoria das condições de vida da população. Para chegar a elas se torna cada vez mais oportuno realizar a avaliação de impacto social e calcular o retorno econômico da ação para a sociedade. Essa metodologia responde a duas perguntas-chave: o programa ou projeto social conseguiu cumprir o seu objetivo? Qual é a relação custo-benefício da ação, considerando o investimento necessário e o retorno para a sociedade?

De acordo com a Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, o Brasil investe hoje quase 25% do produto interno bruto em políticas sociais. É importante considerar que o País vive hoje uma transição, saindo do patamar de 18%, que é o padrão de investimento social de nações de renda média, rumo aos 33% ou mais, média das nações mais desenvolvidas. Com isso a tendência é de que a sociedade brasileira exija cada vez mais transparência e qualidade no gasto dos recursos públicos. Para isso a avaliação do retorno econômico dos investimentos é imprescindível.

Outro fator relevante quando se trata de políticas públicas é que os programas sociais em curso são bastante recentes e requerem tempo para sua maturação. Os investimentos são operados em estruturas de colaboração das esferas municipal, estadual e federal, para atender realidades distintas e heterogêneas, que dificultam de fato uma padronização. Nesse contexto, é ainda mais importante desenvolver ferramentas de monitoramento e de mensuração de resultados que possibilitem aprimorar as ações.

Dados do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife), rede que congrega os maiores investidores sociais privados do Brasil, indicam que em 2010 foram investidos R$ 2 bilhões por seus associados na área social. Num cenário de grandes desigualdades e recursos escassos, como no Brasil, não basta destinar investimentos para a inclusão social. É preciso garantir que sua utilização seja eficaz.

A avaliação econômica de projetos sociais pode contribuir, dentro dessa perspectiva, para aprimorar a gestão dos investimento públicos e privados na área social, pois possibilita verificar a efetividade das iniciativas e conhecer detalhadamente as mudanças ocorridas no processo. Podemos tomar como exemplo o investimento previsto pelo governo federal no programa Brasil Carinhoso, que deverá consumir R$ 10 bilhões entre 2012 e 2014. O uso dessa metodologia de avaliação poderia ajudar os gestores a refletir sobre as escolhas feitas na implementação da política e verificar, por meio da avaliação, se os objetivos realmente estão sendo atingidos, no médio e no longo prazos.

Pesquisa realizada pela Fundação Itaú Social, em parceria com o Instituto Fonte e o Ibope Inteligência, em 2010, mostrou que 91% das organizações sociais consultadas em todo o País afirmavam já ter realizado avaliação de algum programa ou projeto nos últimos cinco anos. Dentro da amostra, 26% consideravam a avaliação uma ferramenta estratégica e 33%, apenas instrumento de promoção. Infelizmente, porém, uma parcela que soma 41% do grupo via a avaliação como desperdício de tempo e de recursos ou como atividade burocrática.

Os dados revelam que, embora seja crescente a conscientização sobre a necessidade de avaliar projetos e programas sociais nos últimos anos, seu uso ainda permanece como um grande desafio. A prática é muitas vezes impossibilitada pela carência de profissionais especializados e pelo desconhecimento de metodologias e ferramentas adequadas. Ou seja, mais importante do que advogar a necessidade de avaliar, é essencial criar as condições para que as avaliações sejam usadas como instrumento da gestão dos projetos sociais.

A ampliação das parcerias público-privadas no País corrobora a necessidade de avaliar o impacto e o custo-benefício dos programas sociais. Uma vez que os investidores sociais privados têm condições de experimentar novas tecnologias e aprimorá-las antes que sejam disseminadas em caráter amplo e universal, apoiando o poder público na implantação de inovações, é primordial disseminar práticas avaliativas que possibilitam verificar com objetividade os resultados de cada investimento realizado, a fim de se garantir o melhor retorno possível para a sociedade.

Qual Obama? - FÁBIO ZANINI

FOLHA DE SP - 08/11


SÃO PAULO - Barack Obama foi eleito em 2008 com a promessa de ser um presidente acima de divisões pessoais e partidárias. O termo pós-racial, em sua fala, ganhou respeito e não apenas suspiros de incredulidade. Uma nova era na política parecia se abrir.

A reeleição, ontem, é um banho de realidade. Obama perdeu por 27 pontos percentuais entre homens brancos (a diferença era de 16 pontos há quatro anos). Ele, presidente charmoso, antenado e com família modelo, teve menos votos entre eleitores que se dizem independentes do que Mitt Romney, que pede corte de verbas para a saúde dos

velhinhos e se cercou de malucos que não acham um problema sério gravidez por estupro.

Obama escanteou a agenda bipartidária (não só por sua culpa), fez uma aposta na divisão do eleitorado americano e venceu. Os EUA nunca foram tão desunidos, já se sabe, mas alguns números mostram cruelmente como raça, renda e religião ainda definem a política do país. O presidente teve 96% dos votos de mulheres negras, 60% do apoio entre os mais pobres e 70% entre os sem religião. Índices longe das margens de erro.

Obama tem a seu lado os hispânicos, um grupo ascendente demograficamente, e o eleitorado mais jovem, que não o abandonou completamente. Joga com o futuro, enquanto os republicanos têm no colo uma bomba populacional: parece não haver mais americanos brancos em quantidade suficiente para mantê-los no poder.

Ele agora terá de decidir que presidente será no segundo mandato: um líder que aproveita a nova chance para negociar um legado compatível com sua capacidade política; ou um líder que governa com a base tradicional democrata, joga com as transformações na sociedade e passa à história como o líder que matou o conservadorismo americano. É bom lembrar de um presidente que tentou algo parecido no passado recente, com sinal invertido: George W. Bush. Terminou como nanico.

Nesta linguiça, porco não entra - DIAS LOPES


O Estado de S.Paulo - 08/11


A pequena Maracaju, a 160 quilômetros de Campo Grande, no sudoeste do Mato Grosso do Sul, ganhou fama por uma linguiça. Não foi por acaso. A cidade faz a melhor do País. Todos os anos, legiões de turistas aparecem ali para saboreá-la, sobretudo entre o final de abril e início de maio, em uma feira anual em que são consumidas 27 toneladas do embutido, acompanhadas de vinagrete, farofa, repolho agridoce e arroz de guariroba (palmito amargo). Além disso, em 1998 Maracaju foi parar no Livro Guinnes dos Recordes por fazer a maior linguiça contínua do mundo, com 32,5 metros de comprimento. Só não superou o próprio recorde por falta de uma tripa mais longa, obviamente natural e sem emendas.

A linguiça é o mais antigo embutido (ou enchido, como dizem os portugueses) do mundo. Foi citada na Odisséia, o poema épico do século 8º a. C. atribuído ao grego Homero. O escritor romano Petrônio (27 d.C.- 66 d. C., referiu-se no Satyricon a "linguiças fumegantes em uma churrasqueira de prata". Inicialmente, preparava-se o embutido com a carne fresca de caça, sobretudo de javali. Depois, utilizou-se a de porco. O objetivo era conservá-la.

A gordura e os condimentos ajudavam a preservar e apurar o sabor. Com as mesmas finalidades, o embutido passou a ser seco, defumado, cozido e guardado na gordura, etc. Surgiram linguiças de cavalo, asno, cordeiro e boi. Hoje, existem pelo menos 200 tipos do alimento, que virou riqueza gastronômica.

As linguiças não se diferenciam apenas pelo tipo de carne, quantidade de gordura ou condimentos utilizados. Distinguem-se também pelo calibre e granulação da carne. O involucro pode ser a tripa natural, celulose ou material sintético. Às vezes entram farinhas ou grãos de cereais para dar liga. O acréscimo de aditivos para conservar ou manter a cor vermelha da carne recebe críticas da FDA, o organismo do governo dos EUA que estabelece os níveis de qualidade dos alimentos e medicamentos.

Começa aí a diferença da linguiça de Maracaju. É feita exclusivamente com ingredientes naturais. Leva cinco tipos de carne, todas de primeira: contrafilé, filé mignon, picanha, alcatra e coxão mole. Cortam-se bifes que são subdivididos em tiras. Pica-se a carne na ponta da faca, sempre em ângulo ou na diagonal, porque em cubinhos ela correria o risco de ficar dura. Corta-se a gordura - 30% para cada quilo de carne - e se incorpora à massa picada. Acrescentam-se pimenta dedo-de-moça, alho, sal, cheiro-verde e o truque que já foi secreto: 50 ml de suco de laranja azeda a cada quilo de recheio. Deixa-se descansar uns minutos, para os temperos se incorporarem. Enche-se a tripa e está pronta a linguiça.

Maracaju é uma cidade com 38 mil habitantes, fundada por mineiros no século passado. A receita da linguiça foi levada pelos pioneiros, que igualmente a preparavam como método de conservação da carne. No início, usou-se a de porco. Entretanto, com a multiplicação do rebanho bovino, foi trocada pela de boi. O que falta para a linguiça de Maracaju ser comercializada em todo o país? O selo do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) autorizando o trânsito de mercadorias de origem animal e vegetal no território nacional. Por sinal, já está a caminho.

Mal brasileiro no fundo do mar - PAULA CESARINO COSTA

FOLHA DE SP - 08/11


RIO DE JANEIRO - Pode parecer só mais um bairrismo exacerbado típico do Rio. Com sua habitual incontinência verbal, o governador fluminense, Sérgio Cabral (PMDB), declarou ameaçada a realização da Copa do Mundo e da Olimpíada.

Foi reação à aprovação do projeto que alterou a regra do pagamento dos royalties do petróleo, colocado em votação pelo gaúcho Marco Maia (PT), presidente da Câmara. Ele aumenta os recursos repassados aos Estados e municípios não produtores, ao mesmo tempo em que reduz as receitas destinadas aos que são produtores. Ignorou proposta do governo de destinar 100% para a educação.

Na teoria, royalties são uma compensação paga a Estados e municípios produtores para cobrir custos relacionados à exploração, como danos ambientais, desgastes de infraestrutura, aportes em saúde etc.

O governo do Rio calcula que perderá R$ 4,6 bilhões do Orçamento de 2013, previsto em R$ 71,8 bilhões.

Aos especialistas cabe discutir o que é constitucional ou não -no caso, mudar contratos vigentes. À presidente Dilma cabe decidir se deve vetar ou não. Ao cidadão interessa fundamentalmente saber para onde vão tão disputados bilhões.

Como será aplicada essa verba em benefício da coletividade e como será feita a fiscalização desse uso?

Há municípios com mais de 30% da arrecadação originários dos royalties sem que a maior parte de seus habitantes veja algum resultado.

Os efeitos da dependência econômica do petróleo ou gás têm explicação teórica nos anos 70, quando foi descrito o "mal holandês". A alta das cotações do gás no mercado levou a dinheiro fácil, devastando os outros setores econômicos da Holanda.

O "mal brasileiro" poderá gerar governos complacentes com a má gestão dos recursos públicos. Ou seja, o dinheiro vai para o buraco aberto pela incompetência política antes mesmo de sair do fundo do mar.

Cartas na manga - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 08/11


A quarta-feira foi de especulações a respeito da ausência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no jantar que serviu para estreitar a aliança entre PT e PMDB. A versão oficial é a de que Lula não foi porque se tratava de um reforço à relação institucional da presidente Dilma Rousseff com o maior partido da base, e o ex-presidente não teria função nesse encontro. Ok, mas, dentro do PMDB e do próprio PT, há quem veja outras razões nessa ausência.

A primeira delas é não comprometer desde já a maior liderança do PT nem com as candidaturas do PMDB à presidência da Câmara e do Senado nem com o plano A dos dois partidos para 2014 — a chapa Dilma Rousseff-Michel Temer. Assim, Lula vira uma espécie de curinga do baralho petista, descomprometido, pairando acima do governo para outros projetos, caso a aliança PT-PMDB apresente algum problema mais à frente.

Dentro desse raciocínio, a falta de Lula no jantar já produziu alguns reflexos. Por exemplo, fez refluir os movimentos do PMDB rumo a uma candidatura alternativa à de Henrique Eduardo Alves (RN) para presidir a Câmara e uniu ainda mais a cúpula do partido ao senador Renan Calheiros (AL), o nome para o Senado. Da parte da Câmara, ninguém dentro do PMDB esquece o movimento do PT, que, em 2005, lançou dois candidatos a presidente da Casa — Luiz Eduardo Greenhalgh, de São Paulo, e Virgílio Guimarães, de Minas Gerais. Deu Severino Cavalcanti (PP-PE).

O partido de Michel Temer não quer dar essa brecha ao deputado Júlio Delgado (PSB-MG), que se movimenta a olhos vistos, tampouco ao deputado Inocêncio Oliveira (PR-PE), que, assim como Severino, tem dezenas de amigos na Casa. “Não há hipótese de que, no PMDB, alguém fique contra Henrique. Ele é unanimidade dentro do partido”, afirma o deputado Lúcio Vieira Lima, da Bahia, estado apontado como um reduto rebelde. A frase de Vieira Lima tem a seguinte leitura: se não é o céu ter Henrique na presidência da Casa, há a certeza de que será muito pior sem ele.

Enquanto isso, no Senado…

O raciocínio da Câmara vale também para o Senado. O PMDB está convencido de que as presidências das duas Casas representam um “seguro” para a composição de 2014, quando o partido conta com a candidatura a vice na chapa de Dilma e uma parceria no governo federal. Portanto, Câmara e Senado são as cartas que o PMDB deseja conquistar para ter como jogar e evitar que o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, do PSB, termine por tirar lugar de um de outro. Os peemedebistas souberam por terceiros que o governador da Bahia, Jaques Wagner, acena com a hipótese de o PT ceder a cabeça de chapa aos socialistas em médio prazo e começam a sentir cheiro de “vou sobrar” logo ali na frente. E vão jogar com todas as cartas que tiverem para que isso não ocorra.

Eduardo Campos é considerado, entre os políticos, quem mais dispõe de cartas para o futuro. Pode sair candidato a presidente em 2014 de forma a preparar o terreno. Pode ainda se aproximar ainda mais do candidato do PSDB à Presidência da República, Aécio Neves. Ou pode ficar onde está desde que o PT lhe ceda a vaga para o futuro. Mas, nesse caso, obviamente, irá pedir a vice de Dilma, e aí o bicho pega para os peemedebistas.

E no Planalto…

Para sorte do PMDB, Dilma está mais desconfiada de Eduardo Campos do que dos peemedebistas. Ela está fechada com Henrique Eduardo Alves e Renan Calheiros. Considera que é hora de impor uma derrota ao governador pernambucano, de forma a evitar que ele ganhe ainda mais fôlego para combatê-la no futuro próximo. Prefere o PMDB, que não tem candidato a presidente, do que o PSB, que, se obtiver a presidência da Câmara, pode criar asas. Da parte dos socialistas, entretanto, o jogo continua. Na semana que vem, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), outro cheio de cartas na manga, virá a Brasília. Conversará com seu partido, será homenageado e estreitará laços com os partidos da base aliada de Dilma. Mas Kassab hoje tem mais afinidade com Eduardo Campos, a quem considera um dos nomes da nova geração, do que com o PMDB.

Para azar dos peemedebistas, Lula também tem mais proximidade com Eduardo Campos do que com o partido de Michel Temer. Os socialistas são parceiros históricos dos petistas. E essa sombra do passado nas salas peemedebistas está deixando o jogo trancado. As próximas semanas deixarão claro as cartadas de cada um. Vale acompanhar.

Copa e Olimpíada - KENNETH MAXWELL

FOLHA DE SP - 08/11


Michael Palin, ex-integrante do Monty Python, grupo de comédia surrealista responsável por um famoso programa de TV britânico dos anos 70, depois de passar 25 anos viajando pelo planeta a serviço da BBC, terminou por chegar ao Brasil, "o quinto maior país do planeta", como a BBC nos informa obsequiosamente.

Michael Palin se define como "um heterossexual de 69 anos". Coisa estranha de dizer na introdução de um programa de TV. Ainda que talvez nem tanto se considerarmos o evidente problema da BBC com pedófilos envelhecidos como Jimmy Savile, morto em 2011.

Confesso que gostei bastante dos dois primeiros episódios de "Brazil with Michael Palin", que também será publicado pela BBC como livro ilustrado, com lançamento previsto para antes do Natal.

O primeiro episódio tratou do Nordeste, e o segundo, da Amazônia e de Brasília. Anthony Andrews, em artigo para o jornal "Observer", definiu a série de Palin como "uma parada de clichês culturais cuja repetição de maneira alguma requereria sua presença".

O terceiro episódio, nesta semana, mostra Palin no Rio, participando de uma parada de orgulho gay à bordo de um carro alegórico tripulado por travestis. O que pelo menos explica a declaração de heterossexualidade do apresentador.

Palin, em seguida, visita o Sul e São Paulo, onde conversa com FHC. A mensagem de Palin é a de que o Brasil é grande, diversificado e divertido.

E o país é, de fato, todas essas coisas. Mas o desafio da Copa e da Olimpíada será determinar se o Brasil é aquilo que o general De Gaulle declarou não ser: "um país sério".

Os críticos concordam com Andrews. O Brasil continua desconhecido do público em geral. O que se sabe são histórias de tráfico de drogas e esforços policiais de "pacificação".

Mas isso pode mudar em alguns anos, como demonstrou uma fascinante conferência realizada pela British Library nesta semana. A conclusão de "From London to Rio: Social Change and Sporting Mega-Events" é a de que a Copa promete impacto nacional muito maior que a Olimpíada. As estatísticas demonstram que os benefícios da Olimpíada de 2012 se concentraram de modo desproporcional em Londres. Escócia, País de Gales e as demais regiões da Inglaterra ganharam pouco.

O futebol tem escopo verdadeiramente nacional, envolve times com apoio local apaixonado e constante, e espantosos 61,1% dos brasileiros se declaram torcedores de futebol.

O Rio, como Londres, se beneficiará da Olimpíada. Mas o futebol tem o poder de transformar. Uma Copa do Mundo bem-sucedida no Brasil poderia até persuadir os jogadores brasileiros que saíram para fazer fortuna no exterior a retornarem ao seu país de origem.

Ouro para Silver - LUCAS MENDES

BBC - 08/11


Mitt Romney disparou seis pontos na frente de Obama dez dias antes da eleição. Um choque do respeitável instituto Gallup.



Michael Barone, não menos respeitável analista conservador, e autor de três almanaques sobre política americana, anunciou a vitória de Romney com uma vantagem de cem votos no Colégio eleitoral. Choque duplo nos democratas.

Do outro lado, Nate Silver, um "nerd" de 34 anos, guru das pesquisas do New York Times , anunciava Obama com mais de 80% de chance de vencer uma semana antes antes da eleição.

Outras pesquisas nacionais não menos respeitáveis, entre elas do próprio Times e das redes de televisão, inclusive da conservadora Fox, davam números mais apertados.

Quem tinha o computador da verdade? A primeira vez que um deles entrou no cenário político foi na eleição de 1952, entre o conservador republicano general Eisenhower e o liberal Adlai Stevenson. A maioria das pesquisas favoreciam Stevenson, algumas de lavada.

A ideia de contratar o computador Univac foi da rede CBS. Walter Cronkite ancorava sua primeira eleição nacional. A máquina pesava oito toneladas e ocupava a garagem de uma casa na Filadélfia de onde dois matemáticos criaram uma fórmula de comparar os votos de 1952 com a eleição anterior.

Da garagem, o computador foi conectado com o estúdio da CBS. Custava US$ 1 milhão, US$ 8 milhões de hoje, e processava 10 mil operações por segundo. Os superchips atuais viajam a 5 bilhões por segundo.

Naquela noite, às 8h30, com apenas 3,5 milhões de votos apurados, o computador fez sua previsão: Eisenhower tem 100 chances contra 1 de vencer Stevenson, 438 votos eleitorais contra 93.

A direção da CBS não acreditou. Nem os fabricantes do Univac. Decidiram que a máquina estava errada, não queriam correr o risco da humilhação e não revelaram o resultado.

No fim da noite, o general ganhou com 442 votos eleitorais. O Univac errou por apenas quatro votos. A CBS contou a história. Os computadores nunca mais saíram das pesquisas e das previsões eleitorais.

Em 2008, o nerd Nate Silver , no seu blog FiveThirthyEight (538, o número de votos do colegio eleitoral), previu os resultados de 49 dos 50 Estados. Só errou em Indiana. Foi contratado pelo New York Times.

Nate Silver, com sua matemática, ganhou muito dinheiro no pôquer, mas fez a fama no beisebol, quando criou um sistema de estatísticas para medir a performance dos jogadores, quem contribuía mais com o time.

O método dele inspirou o filme O Homem que Mudou o Jogo, com Brad Pitt como o técnico de um time medíocre que contrata um "nerd", como Nate Silver, e cria um time sem estrelas, com jogadores baratos, mas eficientes.

Saíram do último para o primeiro lugar na liga.

Enquanto algumas pesquisas colocavam Romney na frente depois do primeiro debate em outubro, Nate dava Obama com mais de 70% de chance de vencer.

Tornou-se uma fonte diária de tormento para os conservadores, que reagiam com ataques, insultos e até apostas no ar.

Ele aceitou uma de US$ 2.000 de um âncora conservador. O vencedor daria o dinheiro para caridade, mas o Times obrigou Silver cancelar a aposta.

Pela previsão dele, no dia da eleição, Obama tinha 92% de chance de vencer com mais de cem votos de vantagem no colégio eleitoral, exatamente o oposto do conservador Michael Barone.

Se a contagem final da Flórida der a vitória a Obama, Nate terá acertado todos os Estados e 99% dos candidatos ao Senado.

O modelo de Silver é diferente das pesquisas nacionais que perguntam aos eleitores em todo país em quem planejam votar.

Nate coloca no computador de 30 a 40 pesquisas nacionais e estaduais que saem todos os dias e tranforma os números em projeções de votos levando em conta o currículo das pesquisas em eleições anteriores, mais um componente secreto, criação dele.

Das 28 pesquisas nacionais que previram os resultados, o FiveThirthyEight de Silver foi campeão, seguido de perto pelo PPP (Public Polling Policy).

Várias pesquisas chegaram perto, mas ao contrário de Nate, se dizem independentes, sem simpatias pelos candidatos. O nerd não esconde sua simpatia por Obama, um multiplicador da ira dos conservadores.

Hoje ele é o jornalista mais famoso e falado dos Estados Unidos. Medalha de ouro para Silver.

Desde ontem, seu livro The Signal and the Noise: Why So Many Predictions Fail - but Some Don’t teve um aumento de 850% nas vendas.

Ninguém acerta tudo o tempo todo. Mais cedo ou mais tarde, alguém vai inventar o modelo para calcular quando Nate Silver vai errar.

Talvez o próprio Nate saiba a fórmula. Agora, sem eleições, poderia criar um modelo para os times do Brasileirão.

O improviso como juiz - JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SP - 08/11


Outra vez, o STF mostrou que a lei mais imperativa, nas suas circunstâncias, é a do improviso


Foi a mais comum das perguntas em um tribunal colegiado. Dirigida, no caso, à ministra Rosa Weber: "Como vota Vossa Excelência?" O Supremo retomava a condenação do sócio de Marcos Valério, Ramon Hollerbach, para estabelecer a pena, depois de uma diatribe mais de promotor que de juiz por parte do ministro Joaquim Barbosa.

Ao pedir para ser tão coerente quanto em seus votos anteriores, esclarecimento sobre que critério, afinal de contas, vigoraria para os agravantes de pena, a ministra Rosa Weber escancarou sem querer: o tribunal não tem critério para coisa alguma no julgamento penal. Em vez de uma resposta pronta e segura, que nem deveria ser necessária, o desentendimento das precariedades ocupou o tribunal e o tempo.

Outra vez o Supremo demonstrou que a lei mais imperativa, nas suas circunstâncias, é a do improviso. Para a fixação dos acréscimos às penas-base, por força de fatores agravantes na conduta do réu, foi adotada uma combinação entre os pares: qualquer que seja sua convicção sobre a pena merecida -o que seria então a pena considerada justa-, depois de apresentá-la o ministro abre mão dela. E a substitui pela mais próxima, entre as do relator Joaquim Barbosa e do revisor Ricardo Lewandowski. É o improviso pelo jeitinho brasileiro.

Durante a viagem do ministro Joaquim Barbosa ao exterior, mas não por isso, os demais ministros fizeram o esforço que deveria ocorrer antes de iniciar-se o julgamento. A ideia era dar um chão menos movediço ao seu trânsito entre fatos, hipóteses de fatos, acusações, defesas e penas. Além de reconhecimento à própria perplexidade, foi também uma concessão ao espanto provocado pela balbúrdia da fase precedente do julgamento. E, com isso, um reconhecimento às angustiadas e quase isoladas críticas ao desempenho aquém da estatura de um tribunal supremo.

Com o jeitinho para a conturbada fixação das penas, o plano de arrumação buscou também apressar o julgamento, para concluí-lo antes da aposentadoria do presidente Ayres Britto no dia 18. A chave identificada para melhor ritmo foi a sintetização dos votos de Joaquim Barbosa, excluindo-lhes as longas e repetitivas exposições sobre a participação de cada réu. Era uma ideia atrevida, e assim se provou.

Joaquim Barbosa iniciou sua volta com a leitura de longo texto fora do programa, como fora de propósito. Útil, talvez, para esquentar o motor pessoal com que, já na exposição do seu voto para a pena de Ramon Hollerbach, retomou suas afrontas a ministros dele discordantes. Foi o começo de renovada sessão de balbúrdia. E confrontações até em nível pessoal.

O que quer que esteja sob o nome de mensalão não ameaçou a democracia nem o regime, como Joaquim Barbosa voltou a enfatizar. Mas é um retrato grave das complexidades deformantes que compõem o sistema e a prática da política brasileira. No seu todo adulterado e não só na particularidade de um caso tornado escândalo, contrária ao aprimoramento do regime e ao desenvolvimento da democracia. Daí que o mal denominado julgamento do mensalão merecesse um Supremo Tribunal à altura do seu significado presente e futuro. E não o que está recebendo.

Os brilhantes e os aplicados - PAULO SANT’ANA

ZERO HORA - 08/11


Conheço muita gente brilhante. E conheço muito mais gente aplicada.

Quase sempre o sujeito se torna aplicado por não ser brilhante.

O brilhante muito mais pensa do que faz. Já o aplicado mais faz do que tem a capacidade de pensar.

O aplicado realiza uma verdadeira mão de obra para chegar ao sucesso.

Já o brilhante despende menos suor para ter êxito.

Dá-se o seguinte: quando a pessoa sente que não é brilhante e quer vencer na vida, então adota a aplicação.

Só com muito esforço uma pessoa pode suprir a falta de brilhantismo.

Haja suor, haja trabalho, haja organização, isso é a aplicação.

Quando você vê uma pessoa agindo sempre, preenchendo todos os espaços, estando em todos os lugares, executando todas as tarefas, a isso se chama aplicação.

Já o brilhante não precisa esforçar-se e consegue ótimos resultados sem trabalhar muito. A força das suas ideias é poderosa, leva tudo pela frente e realiza coisas prodigiosas.

Eu admiro muito os aplicados. Mas eu gosto mesmo, eu sou apaixonado pelos brilhantes.

Quando me dizem, por exemplo, que determinada pessoa é descuidada, eu corro para conhecê-la.

É que os brilhantes são sempre descuidados, são distraídos, isto é, não se aplicam.

Eu dou um doce para ouvir uma ideia, um pensamento, uma solução de um brilhante.

O brilhante tem solução pronta para quase tudo. Já o aplicado tem de entregar-se muito ao trabalho para chegar a uma solução.

Ah, eu ia me esquecendo: nunca vi um brilhante aplicado.

Ontem cheguei a pensar que Fábio Koff estava demorando muito para contratar Vanderlei Luxemburgo com a finalidade de encontrar um pretexto para não acertar-se com ele.

Deus queira que o Fábio Koff não tenha calculado que terá ciúme de Luxemburgo, se ele for seu treinador.

A pior coisa é quando o presidente do clube começa a disputar beleza com o treinador, foi o que me parece aconteceu com o Paulo Odone, que sentia ciúme do Renato Portaluppi.

Presidente e treinador têm de entrosar-se totalmente e caminhar juntos com a mesma finalidade, de mãos dadas, têm de entender-se por ouvido.

Tomara que o Fábio Koff abrace o Luxemburgo com convicção.

Se o Koff não contratar o Luxemburgo, será uma catástrofe: já sairá queimado com a torcida de cara.

É a demografia, estúpido - SÉRGIO DÁVILA

FOLHA DE SP - 08/11

Latinos ajudaram Barack Obama a vencer em lugares como Colorado


Virou moeda corrente dizer que os EUA estão mais divididos do que nunca. O país está dividido desde a vitória de Ronald Reagan nas eleições de 1980 e 1984, quando o político republicano ganhou respectivamente em 44 e 49 dos 50 Estados do país.

Nas sete eleições presidenciais desde então, nunca mais houve o que os norte-americanos chamam de "landslide", a vitória por avalanche de votos. Ganhou quem convenceu o centro moderado ou as minorias a votar em seu candidato.

A cada ano, latinos/hispânicos, negros e asiáticos, as minorias mais numerosas e ruidosas, assim como os jovens urbanos e eleitores politicamente moderados, roubam pontos percentuais preciosos da grande maioria branca mais velha.

Em 2012, embora tenha perdido pontos em quase todos os grupos demográficos em relação às eleições de 2008, de acordo com pesquisa de boca de urna da CNN, o democrata Barack Obama cresceu em eleitorados específicos de Estados-chave.

Latinos ajudaram o democrata a vencer no Colorado e, provavelmente, na Flórida, que, até a conclusão desta edição, ainda contava votos.

Já a mobilização de jovens para cabos eleitorais fez a diferença obamista em Ohio e na Pensilvânia, por exemplo.

Latinos e negros são 23% do eleitorado americano. No geral, o republicano Mitt Romney teve 27% dos votos do primeiro grupo, ante os 31% de John McCain em 2008 e os 40% de George W. Bush em 2004.

RECORDE FEMININO

Mulheres são 53% e ajudaram a eleger anteontem um número recorde de representantes para o Senado norte-americano, 20 de um total de 100, além de uma governadora, a democrata Maggie Hassan, de New Hampshire.

Os moderados politicamente são 41% do eleitorado americano, enquanto 25% se definem como liberais e 35% como conservadores. Nesse grupo, Obama saiu-se melhor que Romney, com 56% da preferência, ante os 41% obtidos pelo republicano.

Mas os republicanos continuam pregando apenas para homens brancos assustados, seu público-alvo preferencial. Como os tucanos brasileiros, esperam que o novo país se adapte ao velho partido, em vez do inverso.

O resultado foi a derrota de ontem na corrida principal, reforçada pela perda de duas cadeiras no Senado e de três na Câmara. Nesta Casa, aliás, vale ressaltar que a bancada do Tea Party, a ala radical do partido, murchou de 60 para 49 representantes.

Ao ceder àquela retórica radical durante suas primárias, o Partido Republicano perdeu o centro. Ao ignorar as minorias no resto da campanha, perdeu a corrida.

Xadrez paulista - SONIA RACY


O ESTADÃO - 08/11

Tudo caminha para que Alckmin desmembre a Casa Civil em duas pastas: Relações Institucionais e Secretaria de Governo. Mais cotados para os cargos? Os já secretários Edson Aparecido e Julio Semeghini.

Eduardo Cury, que deixa, no fim do ano, a prefeitura de São José dos Campos, e Duarte Nogueira, derrotado em Ribeirão Preto, devem ser convidados para assumir cargos no governo paulista.

E além das pastas que estão sob o comando de adjuntos, por causa das eleições, também estão na mira de Alckmin as deAgricultura, Saneamento e Justiça – esta deve ficar com Luiz Flávio D’Urso.

Xadrez 2
Na busca de maior flexibilidade, o governador pediu a assessores mais próximos que encaminhem a ele estudo sobre a estruturadogoverno. Quer saber sehápastas que podem ser agrupadas ou excluídas.

Custo paulista
Alckmine José Eduardo Cardozo bateram o martelo: São Paulo cederá seus aviões para fazer o transporte dos detentos que serão transferidos para presídios federais.

Força total
O COL aposta: a Fifa escolherá, hoj e, seis arenas para sediar aCopadasConfederações.Na Alemanha, foram cinco; na África do Sul, quatro.

É do povo
Carlos Miguel Aidar comemora: o advogado do São Paulo acaba de conseguir quebrar o registro, no Inpi, da expressão “sócio-torcedor”. Agora, todos poderão usar o termo sem pagar royalties.

Bullying
Não é só do Flamengo que Adriano está fora. O jogador não foi convidado para participar do Jogo Contra a Pobreza, ao lado de Zidane e Ronaldo.

Você me mata
E uma surpresa para a plateia de A Ópera dos Três Vinténs – montagem de Bob Wilson, anteontem, no Sesc.
Durante um momento da peça, inteiramente encenada em alemão, um ator resolveu cantar... Michel Teló. Levando o público à loucura.

Promessa quebrada
Lembram da cadelinha preta que Serra, em campanha, prometeu adotar ao visitar a Uipa? Pois é. Cansado de esperar, o vereador Roberto Tripoli resolveu levá-la para seu sítio.

Bochicho no society
Moradores dos Jardins constatam ‘invasão’ da família Batista. Wesley Batista, da J&F, comprou casa por R$ 42 milhões, do dono da Caoa, Carlos Alberto de Oliveira Andrade. E seu irmão Joesley Batista vem negociando a compra de um imóvel por valor semelhante. No entanto, está achando a casa em questão muito... pequena.

Pro espaço
A italiana Telespazio se interessoupela comprada rede de satélites da TIM, avaliada em algo em torno de R$ 160 milhões.
Avendafaz parte do processo de reestruturação da empresa em curso. Deflagrado desde a demissão de Luca Luciani por supostas fraudes na Itália.

First Lady
Michelle Obama, que repetiu anteontem, na vitória do marido, um vestido Michael Kors, não o fez sem a bênção do estilista.

First Lady 2
Mas a roupa da primeira-dama, segundo Costanza Pascolato, é o que menos importa. “Michelle superou o visual, personalizou o ‘yes, we can’ e se veste de forma coerente com seu papel. Isso é moda”, analisa a especialista.

Antes arredia, Pascolato acha que a primeira-dama, hoje, é a pura demonstração do que a condição feminina deve ser.

Ir à Justiça é única alternativa ao veto nos royalties - EDITORIAL O GLOBO


O Globo - 08/11



A disputa em torno da distribuição da receita de royalties e participações especiais incidentes sobre a produção de óleo e gás no mar é uma coletânea de equívocos que teve seu ápice na votação da noite de terça-feira na Câmara. Essa coletânea se iniciou com a decisão, absolutamente desnecessária e motivada unicamente por uma visão ideológica deformada sobre o papel do estado, do governo Lula de mudar as regras no modelo de exploração e produção para futuros campos em áreas na chamada camada do pré-sal.

Diante da expectativa - que ainda está por ser confirmada - de que essa camada pode conter "uma Venezuela", a cobiça se espraiou por políticos Brasil afora, insatisfeitos diante de uma imagem ilusória de que estaria se formando uma espécie de "emirados árabes" ao largo do Rio de Janeiro e Espírito Santo.

Assim, a discussão, antes voltada para a redistribuição de receitas relativas aos campos futuros, se estendeu para os blocos que já estão em produção ou em desenvolvimento e os licitados. A Câmara acabou aprovando no primeiro momento um projeto estapafúrdio, apoiado em uma emenda demagógica, em que estados e municípios produtores (ou "confrontantes") passariam a ter uma receita muito inferior aos demais. Além de sofrerem o ônus da pressão migratória e da demanda crescente sobre a incipiente infraestrutura, sem contar os riscos ambientais a que estão submetidos, estados e municípios produtores seriam então punidos por terem sido contemplados pela natureza com a existência de reservatórios de hidrocarbonetos em seu litoral.

Como detonador dessa confusão, o presidente Lula se sentiu na obrigação de vetar o projeto. As tentativas de se negociar no Congresso um novo texto foram infrutíferas. Prevaleceu o espírito da cobiça, e a Câmara decidiu agora por desrespeitar o Rio de Janeiro e o Espírito Santo, e mais especialmente os municípios capixabas e fluminenses que têm sua estrutura financeira calcada na receita já prevista de royalties e participações dos campos em atividade.

O que está em jogo não é uma redistribuição dos resultados da riqueza do petróleo, mas sim o pacto federativo. Não faz sentido algum que os municípios que arcam com o ônus da atividade petrolífera não sejam compensados adequadamente, princípio reconhecido pela Constituição e que é o fundamento que justifica a cobrança de royalties.

Chegou-se a uma situação política complicada que não deixa opção a não ser veto presidencial ao projeto aprovado no Congresso ou uma batalha judicial fratricida que arranhará profundamente o pacto federativo. A presidente Dilma não pode escapar da responsabilidade, como chefe do Executivo, assentada sobre ampla base parlamentar, de evitar a ida dos estados produtores ao Supremo, fazer os devidos vetos e mobilizar o Congresso em busca de uma legislação que não desrespeite a Constituição.

Campo de batalha - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 08/11

Esquenta a briga pela sucessão de Roberto Jefferson na presidência do PTB. O Planalto tem candidato: o senador Gim Argelo (DF), fechado com a reeleição da presidente Dilma. O governo não quer o deputado estadual Campos Machado (SP), considerado tucano. Nem o senador Armando Monteiro (PE), que pode abrir as portas do partido para o governador Eduardo Campos (PSB).

A saia-justa dos royalties
A despeito das declarações da presidente Dilma sobre a manutenção das regras para a exploração do petróleo já licitado, há divisão no Planalto sobre o que fazer diante da Lei dos Royalties aprovada pelo Congresso. A experiência do processo de votação do novo Código Florestal não é considerada positiva. A presidente vetou algumas vezes artigos incluídos no código e aprovados pelos deputados. Sua atuação acabou desgostando e sendo alvo de críticas dos ruralistas e também dos ambientalistas. Há um temor de que o mesmo se repita agora. O Rio e o Espírito Santo têm votos, mas os outros estados também. O mais cômodo seria esperar pelo STF.

“O Lula planejou este encontro com a presidente Dilma para sinalizar aos aliados que o PT e o PMDB estão mais fechados do que nunca”
Eunício Oliveira Senador (PMDB-CE) e presidente da CCJ

O anticandidato
Os adeptos da candidatura de Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) à presidência do Senado avaliam que ele tem 20 votos. O sonho de consumo do grupo é chegar aos 27. Na eleição anterior, Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) teve oito votos.

Palavra empenhada
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), propôs ao líder do PMDB, Henrique Alves (RN), candidato a lhe suceder no cargo, que ambos viajem juntos, em janeiro, para reuniões com as bancadas regionais dos dez estados com maior número de deputados. Eles almoçaram ontem. Maia, eleito pelo acordo PT-PMDB, faz questão de cumpri-lo.

O jeitinho
O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), corrigiu ontem erro formal do texto da Lei dos Royalties aprovada pelo Congresso. A soma dos percentuais dava 101%. Sarney fez uma correção de autógrafo, corrigindo a soma errada.

Trabalhismo em ebulição
Sobre as articulações para tirá-lo da presidência do PDT, Carlos Lupi, que está na China, afirmou: “Não é difícil me tirar do comando do partido. Em março tem convenção. É só formar uma chapa e ganhar no voto.” Ele faz ironia de seus adversários, dizendo que “um partido político não é uma capitania hereditária”. Lupi negou que vá para o TCE: “Fui convidado e não aceitei.”

Preparando a campanha
O chefe de gabinete da ministra Gleisi Hoffmann, Carlos Carboni, deixou o cargo e vai para o Paraná organizar a candidatura de Gleisi a governadora. Seu substituto, Leones Dall'Agnol, atuava no Ministério das Comunicações.

Os amigos do vice Michel Temer
Na inauguração do busto de Ulysses Guimarães, ontem, no Bosque da Constituinte, o deputado Eliseu Padilha (PMDB-RS) proclamou: “O PMDB tem que ter candidato à Presidência.” O ministro Moreira Franco o atalhou: “Padilha! Em 2018.”

DUAS TÁTICAS. Na Câmara, o PMDB quer fechar já a sucessão na presidência da Casa. No Senado, o partido quer segurar o processo de definição.

A dependência excessiva da indústria de veículos - EDITORIAL O ESTADÃO


O Estado de S.Paulo - 08/11


Toda a indústria brasileira depende cada vez mais dos automóveis produzidos, daí a política do governo oferecendo a esse setor incentivos sempre renovados, sem levar em conta o valor acrescido que o setor de fato representa. A Confederação Nacional da Indústria (CNI), que havia previsto recuperação em setembro, dada a redução dos estoques, moderou o otimismo e reconheceu que mais uma vez o faturamento real da indústria acusou queda, de 1,7%, em relação ao mês anterior (agosto), em termos dessazonalizados. O resultado ficou próximo do do IBGE (que inclui a mineração, ao contrário da CNI), com queda da produção física de 1%.

Na análise por setores, somos tentados a afirmar que no próximo mês o resultado será melhor. Com efeito, além de o Índice Nacional de Expectativa do Consumidor de outubro acusar uma melhora, verifica-se que o faturamento real de veículos automotores cresceu em setembro, na margem, apenas 0,1% e que os outros equipamentos de transporte apresentaram queda de 37,4%.

Os dados da Anfavea do mês de outubro, que acabam de ser divulgados, apresentam para a produção de automóveis um crescimento de 12,8%, e de 10,6%, para a de caminhões - mostra de recuperação do setor, que tem grande peso no levantamento da CNI.

Não podemos negar, todavia, que no seu conjunto a indústria apresentou resultado negativo: 10 dos 19 ramos exibiram queda - particularmente importante (de 21,3%) no setor de edição e impressão, com o fim da campanha eleitoral.

O índice de confiança dos consumidores mostra um recuo no caso de vendas de maior valor, como móveis e eletrodomésticos, para o final do ano. São bens vinculados à ocupação de novas unidades de habitação, cuja compra pode ser adiada em razão de outros gastos para o final do ano. É provável que, para as festas natalinas, as famílias optem por presentes de menor valor unitário.

Sem dúvida, a indústria vai levar em conta essa reação dos consumidores. Existem, porém, algumas dúvidas em relação aos bens para os quais o governo decidiu prorrogar as isenções fiscais até o fim do ano. Diante do custo dessas renúncias de receitas, é possível que o governo não prorrogue o alívio fiscal, levando em conta que, a partir do início de 2013, a indústria vai se aproveitar de redução significativa dos custos de energia elétrica, a qual poderá transferir parcialmente para os preços oferecidos aos consumidores. De qualquer modo, não se pode prever forte reação no setor.

Transição tensa na China - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 08/11


Começa hoje o 18º Congresso do Partido Comunista Chinês, que realizará até o dia 14 a primeira transição de sua cúpula em dez anos.

A grande incógnita é se a coreografada ascensão de Xi Jinping, 59, à liderança máxima trará indicações sobre como o novo governo vai enfrentar temas difíceis como reformas na política e na economia. Xi é tido como modernizador.

Sob a liderança de Hu Jintao e Wen Jiabao, a China conseguiu avanços extraordinários na década. O país saltou de sexta para segunda economia mundial e se tornou o maior parceiro comercial de vários países, como o Brasil.

No entanto a recente desaceleração do crescimento, a desigualdade explosiva e os negócios escusos envolvendo membros da cúpula tornam cada vez mais tênue o equilíbrio entre avanços econômicos e estabilidade política.

Na origem desses problemas está o que na própria China se chama de "interesses constituídos": os de altos funcionários do governo ou de empresas estatais e grandes empresários do setor imobiliário que acumulam poder e fortuna com o "capitalismo autoritário".

Quem perde são centenas de milhões de chineses que não têm meios para reagir contra desapropriações forçadas de suas casas, são alijados dos bons empregos por falta de conexões políticas e sofrem com a degradação ambiental.

O indicador mais decisivo para aquilatar o ímpeto das reformas políticas e econômicas será a nova configuração do Comitê Permanente, colegiado que, de fato, governa o país. Atualmente com nove membros, deve ser reduzido a sete, o que em princípio facilitaria o controle de Xi sobre o órgão (já pavimentado com o expurgo do popular antirreformista Bo Xilai).

As duas alas, pró e contra uma correção de rota na China, são bem representadas pelos candidatos Li Yuanchao, que estudou nos EUA e é visto como defensor de alguma abertura, e Liu Yunshan, que controla o Departamento de Propaganda e a censura cada vez mais rígida.

Espera-se que Xi esclareça sua posição sobre a agenda reformista nos próximos dias. Ele é arrolado nas facções mais abertas a mudanças, mas sua família foi apontada em reportagem da agência Bloomberg como possuidora de US$ 376 milhões, obtidos por meio de empresas favorecidas pelo Estado.

Para ele e vários outros integrantes da cúpula, atacar os "interesses constituídos" pode significar um corte doloroso na própria carne.

Por um novo pacto federativo - ABRAM SZAJMAN


O Estado de S.Paulo - 08/11


Achar um brasileiro que não deseje a reforma tributária é tão difícil quanto encontrar agulha no palheiro. Até os governos reconhecem o problema. Mas, nas poucas tentativas sinceras de resolvê-lo, escorregam nas cascas de bananas lançadas ao chão pelos interesses setoriais, corporativos, partidários e ideológicos que querem mudança, mas apenas aquela que os privilegie.

Dono de muito ou pouco dinheiro, empresário ou artista, profissional liberal ou assalariado, há muito o brasileiro sente no bolso e na alma a pressão de um sistema tributário perverso, que lhe toma muito e lhe dá pouco em serviços públicos, infraestrutura, saúde, educação e segurança, ou seja, as necessidades básicas de um povo. Sabe, também, que o cipoal de leis, decretos e portarias que procuram ditar a política fiscal é terreno fértil para corrupção e arbitrariedades contra empresas e cidadãos.

Agora, entretanto, o Senado tem a chance de sair na frente do Executivo e dar início a uma reforma tributária factível. Seu presidente, o senador José Sarney, acaba de receber de uma comissão de notáveis instituída por ele propostas articuladas para "corrigir as desigualdades regionais com o mínimo de resistência das entidades federativas e o máximo de eficiência nos resultados pretendidos".

Presidida pelo ministro Nelson Jobim, tendo como relator o ex-secretário da Receita Federal Everardo Maciel, completam a comissão outros 11 especialistas na matéria. Um de seus componentes, o advogado e professor emérito Ives Gandra da Silva Martins, presidente do Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (Fecomércio-SP), em artigo publicado neste jornal (Reforma tributária e pacto federativo, 19/10, A2), confessa sua fé no sucesso da empreitada: "(...) Nas 12 propostas já articuladas de projetos de emendas constitucionais, leis complementares, ordinárias e resoluções do Senado, pela primeira vez, de forma coerente e sistemática, se forjou um verdadeiro sistema equacionador dos problemas mais cruciais da questão tributária".

Não cabe repetir aqui o que foi ditado de cátedra pelo tributarista. O alcance do que se pretende pode ser ressaltado pela adoção de alíquota única de 4% para o ICMS. Seria o fim da guerra fiscal fratricida desencadeada e alimentada por esse imposto e da peregrinação das empresas pelos Estados à cata de benesses, pois o Código Penal estaria pronto para impor punições.

Imperativo, entretanto, é a sociedade defender no Legislativo, de agora em diante, a reforma proposta. O senador, tudo indica, comprou a ideia e pretende lhe dar tramitação urgente. Cabe ao contribuinte, pois, exercer a legítima pressão democrática para sua aprovação.

O empenho da sociedade e o desassombro dos políticos podem viabilizar o novo pacto federativo. Difícil? Sim, mas pode ser feito. O Brasil, ao longo dos anos e pacificamente, conseguiu reverter processos políticos inconvenientes. Derrotou a inflação endêmica e moderniza o Estado. Mais investimentos privados, aumento do emprego e da renda. Mais de 30 milhões de novos consumidores.

Um novo pacto otimizaria essas conquistas e corrigiria falhas estruturais que atravancam o País. A habilidade política e o patriotismo de José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência, e a língua comum a todos os habitantes das novas terras fizeram de um território de dimensões continentais um país único, mas regionalmente desigual. As desigualdades persistem. As infrutíferas tentativas de corrigi-las sempre são feitas imputando custos à produção e à eficiência. A reforma resolverá e, como "sonhar não custa nada", trazer de volta a Federação que tinha em cada cidadão um voto. Hoje há regiões onde cada cidadão vale vários votos. Mas esta é outra história...

Bill Clinton merece os aplausos - CARLOS ALBERTO SARDENBERG


O Globo - 08/11


Sucesso mesmo nessa eleição americana foi Bill Clinton. Principal cabo eleitoral de Obama, o ex-presidente passeou pela campanha, celebrado em toda parte. O povo não esquece.

Reparem: concluídos os quatros anos de Obama, a economia terá criado pouco mais de 500 mil empregos, isso em relação ao verificado no início de seu mandato. Seu antecessor, Bush, deixou um legado de 1 milhão de novos postos de trabalho, mas em dois mandatos. E Clinton, o antecessor de Bush? Nada menos que 22 milhões de empregos nos seus oito anos.

Compreende-se por que ele se reelegeu, mesmo com o caso Monica Lewinski. E os eleitores não se arrependeram de dar um segundo mandato. Em 2000, último ano de Clinton, a taxa de desemprego foi de 3,9%, um recorde de baixa.

Os investidores também gostaram muito. Em janeiro de 1993, quando Clinton assumiu, o índice Dow Jones da Bolsa de Nova York rodava na casa dos 3.200 pontos. Oito anos depois, batia nos 11.500.

Muitos dizem que Clinton apenas deu sorte. O ciclo de crescimento seria o mesmo qualquer que fosse o presidente. Será? O fato é que aquele presidente democrata foi bastante ativo em sua política econômica, a chamada "clintonomics". Tratava-se de uma interessante combinação de austeridade nas contas públicas, liberalização na atividades das empresas, desregulação, inclusive do sistema financeiro, abertura comercial - temas do que se chamaria de uma agenda conservadora - com programas sociais diversos, aumento do salário mínimo, alíquotas maiores de imposto de renda para os mais ricos, isenções para os mais pobres - a agenda progressista.

Resultados: crescimento do Produto Interno Bruto e da renda, inflação média anual de 2,3%, outro recorde de baixa, e a transformação de um déficit nas contas públicas de 4,7% do PIB, herança do governo do primeiro Bush, em um superávit de 2,4%, que o segundo Bush destruiu em pouco tempo.

Houve também um lance especial, o estímulo à compra de casa própria. Clinton determinou que as agências estatais Fannie Mae e Fredie Mac reduzissem as taxas de juros e ampliassem os financiamentos imobiliários, em condições vantajosas, para as classes médias e mais pobres. Deu no maior boom da construção civil, deixando todo mundo feliz.

Mas com isso, dizem os críticos, ajudou a inflar a bolha imobiliária, que fez crescer outras bolhas, nas bolsas, por exemplo. Ou seja, juros muito baixos, crédito abundante e bancos desregulados para montarem suas alavancagens, tudo isso teria lançado as sementes da grande crise financeira de 2008.

Pessoal do Clinton nega, é claro. Diz que Bush estragou tudo com seus gastos militares, em duas guerras equivocadas, e isenções de impostos para os ricos, entre outros equívocos. Fica para o futuro decidir, mas que Clinton tem uma bela história para contar, disso não há dúvida.

A situação é bem diferente hoje. Obama foi o primeiro presidente a se reeleger com uma taxa de desemprego nas alturas, 7,9%, e com baixo ritmo de crescimento econômico.

Parece, entretanto, que parte dos eleitores, mais ou menos a metade, entendeu as circunstâncias. No primeiro mês do governo Obama, janeiro de 2009, a economia eliminou nada menos que 818 mil empregos - desastre que necessariamente vai para a conta do segundo Bush. Já no último mês de outubro, foram criados 171 mil postos de trabalho. Há 18 meses, a média mensal é de 160 mil novas vagas, o que dá 1,92 milhão/ano.

Isso ainda fica longe do padrão Clinton, mas em circunstâncias completamente diferentes. Mais do que acelerar o crescimento, a primeira tarefa de Obama era evitar o pior, que a crise financeira de 2008 caísse numa fatal depressão nos EUA e, pois, no mundo. E isso ele conseguiu. Depois de uma recessão de 3,1% em 2009, a economia americana se expandiu na média de 2% nos últimos três anos. Não é extraordinário, mas entre os países desenvolvidos, só a Alemanha fez melhor.

Muitos analistas entendem que a recuperação americana está em curso e que não será difícil a criação de 10 milhões de empregos nos próximos quatros anos. Nesse aspecto ao menos, o resultado nos EUA foi justo. Obama ganhou um tempo para arrematar o serviço, em ambiente melhor ou menos ruim.

Aliás, boa parte desse ambiente depende da China, a segunda potência econômica. Lá, hoje, se inicia o congresso do Partido Comunista, que promoverá uma completa troca de governo. E, acredita-se, uma mudança no modelo econômico. Somando EUA (PIB de US$ 15,2 trilhões) e China (US$ 7,5 tri) dá quase 30% da economia mundial. Ou seja, o interesse é global. Aliás, os dois principais parceiros comerciais do Brasil são China e EUA.

Um termômetro imperfeito - CÉSAR FELÍCIO

Valor Econômico - 08/11


A falta de uma "mid-term election" no Brasil, como a que existe nos Estados Unidos e na Argentina, países em que metade do Congresso é renovado no meio do mandato presidencial, faz com que a eleição municipal brasileira seja o termômetro que exista à mão para se medir como anda a consistência política de presidente e governadores.

É um indicador manco. Não é preciso teorizar muito para explicar que a escolha do prefeito da imensa maioria das cidades no Brasil não segue a lógica da disputa nacional e que a soma de situações regionais influencia pouco a correlação de forças na sucessão presidencial. Só interfere no cenário grande de modo indireto, à medida em que fortalece ou fragiliza os governos estaduais. Estreitando o leque da análise, fica mais fácil visualizar os efeitos a longo prazo da escolha paroquial no domingo retrasado.

O Rio Grande do Norte, Estado onde há tempos imemoriais clãs familiares se revezam no poder no governo estadual e nos municípios, é um laboratório interessante não por ser um caso típico, mas pelo oposto: é o único dos 26 estados brasileiros em que PT e PSDB jamais ganharam o governo estadual ou a prefeitura. Em nenhum lugar do Brasil a lógica é tão local.

Eleição municipal mostra as tendências estaduais

O resultado das eleições no Rio Grande do Norte de 2008 e de 2012 mostra, em primeiro lugar, que é o governador que organiza e administra as alianças na base. O natural é que os prefeitos eleitos estejam na órbita do governador, sejam ou não filiados ao seu partido, em uma razão inversamente proporcional ao eleitorado de cada município. Quanto mais um município é grotão, mais fiel é ao governador. A chave para a manutenção do poder está no resultado das cidades médias e grandes.

Nada mais natural, portanto, que em 2008 a então governadora Wilma de Faria tenha eleito 38 prefeitos diretamente de seu PSB nos municípios com até 10 mil habitantes, ante 28 do PMDB e 12 do DEM. A história ficou mais complexa nos municípios entre 10 mil e 50 mil eleitores.

São cidades que não exercem hegemonia. Seus prefeitos dificilmente se tornarão governadores, mas são estratégicos para a eleição proporcional. O PMDB havia conseguido vencer na maior fatia destes municípios no Estado em 2008. Com a derrota de Wilma em Natal-única que a então governadora havia sofrido na capital desde 1988-ficou claro que a eleição de 2010 não traria boas novas para seu grupo. PMDB e DEM são aliados naturais.

Abertas as urnas, Wilma não conseguiu se eleger senadora em uma disputa de duas vagas. A prefeita de Mossoró, Rosalba Ciarlini (DEM) tornou-se a governadora. Nas eleições deste ano, o cenário que se desenhou para Rosalba é preocupante. O candidato apoiado por Rosalba não foi para o segundo turno em Natal. E no conjunto dos municípios, o DEM foi superado pelo PMDB nas médias e nas pequenas cidades.

A governadora se esforçou na reta final do processo eleitoral para ao menos manter a prefeitura de Mossoró e seu destino dependerá da dupla de primos que manda no PMDB. A eleição municipal fragilizou Rosalba como havia fragilizado Wilma e a mesma lógica se aplica a governadores que estão no mundo bipolar entre PT e PSDB.

Os governadores tucanos Marconi Perillo e Beto Richa, conseguiram um resultado inexpressivo nas cidades acima de 10 mil eleitores em Goiás e no Paraná. O catarinense Raimundo Colombo (PSD) levou a capital Florianópolis, mas no conjunto dos municípios médios e grandes do Estado seu partido não se firmou, e assim por diante.

É o jogo dos governadores que relativiza o resultado vistoso obtido pelo PSB do pernambucano Eduardo Campos este ano. A vitória do candidato de seu partido em Campinas (SP), por exemplo, foi uma notícia alentadora para os planos eleitorais do governador tucano Geraldo Alckmin, e não para as ambições do neto de Arraes.

Ao se reeleger em Belo Horizonte, Márcio Lacerda tornou-se uma opção de aliança a ser testada pelo senador Aécio Neves (MG). Jamais será uma viga de sustentação para Campos. Até porque o principal vínculo do prefeito da capital mineira em seu partido é com o ex-governador cearense Ciro Gomes, que converge pouco com o governador pernambucano.

Chama a atenção que, dos 67 prefeitos tucanos em cidades acima de 50 mil eleitores, 35 sejam de São Paulo. É um indicativo forte que, sem compor com perfeição uma aliança com Geraldo Alckmin, Aécio é um candidato inviável para a presidência da República. Deve ser perturbador para o senador mineiro observar que PT e PMDB, juntos, elegeram 19 prefeitos mineiros em cidades médias e o PSDB apenas nove. A dependência de alianças para Aécio manter a base em Minas será grande.

E o PMDB irá pactuar sua participação na aliança petista em posição de força análoga a que teve em 2010. A sigla prevaleceu sobre as demais em cidades de 50 mil eleitores para cima em Santa Catarina e no Paraná e em dois Estados onde já governa, Rio e Maranhão. Quando se leva em conta cidades com mais de 10 mil eleitores, o PMDB se destaca ainda em Goiás, Paraíba, Alagoas, Rio Grande do Norte e Rondônia. É um resultado que credencia o partido a receber concessões nestes Estados.

A trinca formada pelo PT PMDB e PSDB quantitativamente quase empata no conjunto dos municípios com mais de 50 mil eleitores. Além dos 67 tucanos, foram 71 petistas e 72 pemedebistas eleitos. É um dado que mostra, ainda que de forma precária, quais são os três partidos com capilaridade. O PSB é um fenômeno concentrado em poucos estados e o DEM desapareceu do mundo dos grandes.

O recém criado PSD tende a consolidar sua vocação de linha auxiliar, com foco congressual. A sigla não predomina no controle de cidades médias em nenhum estado, e nem havia sido concebida para isso. Elegeu 199 prefeitos nas cidades entre 10 e 50 mil habitantes. Demonstração de força do governador da Bahia, Jaques Wagner (o vice do petista é o comandante da sigla no Estado) e do governador do Ceará, Cid Gomes (o irmão de Ciro montou o PSD, entregue à gestão de auxiliares diretos).

Notas do diário das eleições nos EUA - CONTARDO CALLIGARIS

FOLHA DE SP - 08/11


A austeridade é um remédio religioso para a crise: gastamos e pecamos, o perdão virá pela penitência


3/11 - Observadores, dentro e fora dos EUA, dizem que o país está dividido, "polarizado" entre dois extremos. Mas de que extremos estão falando?

À direita, existe, de fato, um extremismo, que hoje é encarnado pelo movimento Tea Party e que conta com representantes eleitos. Por que é um extremismo? Um traço decisivo é o revisionismo histórico: para conferir um selo de nobreza às suas ideias, o pessoal promove qualquer lorota sobre o passado dos EUA -sobre o que teriam pensado os pais fundadores, sobre o "verdadeiro" sentido da constituição etc.

Outro traço é o fundamentalismo religioso, que se expressa em ideias assustadoras, como as do candidato ao Senado para quem, se uma mulher estuprada ficar grávida, é que, na verdade, ela gostou.

Mas à esquerda não existe nada equivalente. Ou, se existe, é tão recente e marginal quanto o movimento Ocupe Wall Street.

Uma consequência dessa disparidade foi notada por E. J. Dionne (no ótimo livro sobre a pretensa polarização dos EUA, "Our Divided Political Heart", nosso coração político dividido, Bloomsbury, 2012).

Quando Romney promete governar próximo do centro, e não segundo a vontade da maioria de seus eleitores republicanos, sua promessa faz sentido, e podemos esperar que ele seja menos truculento do que muitos parlamentares de seu partido.

Mas, quando Obama faz uma promessa análoga, ele promete se afastar de qual esquerda "extrema"? Como ele faria concessões para governar o país ao centro, visto que ele já é e sempre foi o centro?

4/11 - O psicólogo Drew Westen é autor de um livro notável sobre a irracionalidade das escolhas políticas, "O Cérebro Político" (Unianchieta).

Num artigo no "New York Times" de hoje, ele afirma que, seja qual for o presidente eleito, a guinada será à direita. Eis a argumentação. 1) Se Romney perder, seu partido pensará que foi porque ele não se mostrou suficientemente conservador; 2) se Obama perder ou ganhar por um fio (dá na mesma), seu partido pensará que ele perdeu (ou quase) porque se arriscou à esquerda além da conta ou antes da hora (e, com isso, assustou os americanos, com a reforma da assistência médica e com a política de subsídios à economia).

Ou seja, é como se todos se preocupassem com o que pensa uma suposta maioria de direita.

Ora, na campanha eleitoral, Romney ganhou intenções do voto quando ele começou a desmentir tudo o que ele tinha proposto antes, tomando posições mais progressistas. E Obama recuperou sua popularidade quando começou a atacar agressivamente os privilégios fiscais dos mais ricos. Ou seja, talvez o eleitorado seja menos "de direita" do que pensam os candidatos e os políticos.

5/11 - Eis um exemplo da tese de Westen sobre o importância das emoções nas escolhas políticas. Os republicanos se dizem conservadores fiscais; segundo eles, o governo não deveria estimular a economia, mas praticar a austeridade e reduzir o deficit.

Em geral, essa "austeridade" se traduz no fato de que o povo se austeriza e alguns lucram com a austeridade dos demais. Mas, fora qualquer consideração econômica, o discurso da austeridade (tanto nos EUA como na Europa) evoca a ideia religiosa de penitência. Gastamos muito, pecamos -e agora só obteremos o perdão divino passando por uma merecida penitência (jejum, autofustigação e austeridade como soluções para a crise).

6/11 - Hoje, no distrito da rua 48 West, em Nova York, as filas eram longas. Levei duas horas para votar. Bom sinal para os democratas. Mas Nova York significa pouco numa eleição -a cidade sempre foi um reduto democrata. Mais significativos, nos últimos dias, foram os apoios a Obama de dois republicanos, o governador de Nova Jersey, Chris Christie, e o prefeito de Nova York, Michael Bloomberg. Será que a dureza do furacão Sandy, por um momento, aboliu o caráter abstrato das oposições eleitoreiras e permitiu pensar no "bem comum"?

6/11 - Obama ganhou: alívio. Uma vitória de Romney daria força, inevitavelmente, às ideias da parte pior do partido republicano. Alguns dirão que essas não são as ideias de Romney, por mais que ele as tenha defendido na campanha. Justamente, este teria sido o problema maior de uma presidência Romney: ao longo de toda a campanha, ele me apareceu como um homem sempre pronto a se transformar de maneira a ser exatamente como seus interlocutores do momento desejavam que ele fosse.

É uma qualidade? Talvez, num candidato. Num presidente dos EUA, seria catastrófico.

Ardil - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 08/11


BRASÍLIA - Embora troquem os maiores desaforos em público, os ministros do Supremo concordam numa coisa nos bastidores: os arroubos de Marcos Valério por delação premiada não convencem.

Nos seus últimos dias no STF, o presidente, Ayres Britto, tenta articular uma redução de penas do próprio Valério e de Roberto Jefferson, mas não por delações atuais e futuras, e sim por colaborações passadas.

Sem as listas de nomes entregues por Valério, o processo não seria o mesmo -nem teria tantos réus. Sem as revelações de Jefferson, simplesmente não existiria. Isso deve servir de alguma coisa na dosimetria.

Quanto às novas denúncias giratórias de Valério, podem ou não ser verdadeiras, mas não parecem nada verdadeiras. Carecem de provas e de oportunidade e, quando vão de Santo André a Marte e Saturno, perdem credibilidade a cada quilômetro percorrido rumo ao nada.

Lá entre eles, os ministros suspeitam que possa haver uma "estratégia ardilosa" por trás do que Valério tem dito, ora à Procuradoria, ora à revista "Veja".

Ele pode estar, por exemplo, operando um processo -ou uma tentativa- de procrastinação indefinida das condenações e prisões.

Pela lei, toda vez que algo novo é acrescentado aos autos, as partes terão direito a pedir vistas. Em caso de delação premiada de Valério, esse poderia ser o pretexto para que os advogados apresentassem incontáveis pedidos de vista.

Há, ainda, a possibilidade de Valério ser apenas um precursor e a moda pegar. E se os demais réus saírem também em desabalada carreira por delação premiada? Daria em congestionamento e atrasos.

A esta altura, com os ministros discutindo se são "anjos" ou "salafrários", as declarações de Valério entram por um ouvido e saem por outro. Isso só mudaria de figura se o réu mais explosivo trocasse a mera palavra por algo bem mais crível.

O bom do Tio Sam - DORA KRAMER

O Estado de S.Paulo - 08/11


Cada país tem suas peculiaridades, o que se aplica também na política. Não se trata, portanto, de dizer que o Brasil deveria copiar um modelo que está a léguas de distância da perfeição e é alvo de pressões internas por mudanças, mas há aspectos na eleição presidencial dos Estados Unidos que são de admirar.

A começar pelo processo de escolha dos candidatos, com as eleições primárias nas quais se expressa o vigor dos partidos no envolvimento dos delegados de base e do intenso debate que se dá ao longo de praticamente um ano antes das eleições. Cumprida essa etapa, democratas e republicanos mergulham na campanha do escolhido.

Por aqui as prévias, quando existem, são instrumentos da cúpula, fator de divisão nos partidos e, não raro, de derrota nas urnas.

Outro ponto são os debates: nos EUA pautados pelo embate livre sem restrições de questionamentos nem as amarras que tornam os nossos maçantes, ensaiados, tão assépticos quanto a propaganda política financiada pelo contribuinte. Até porque não são considerados programas jornalísticos e devem obediência à lei eleitoral.

É de se apontar também o apoio dos veículos de comunicação a esse ou àquele candidato. Nos Estados Unidos não é visto como ato condenável, mas como um dever de transparência para com o público consumidor de informações.

Os principais jornais e revistas americanos marcaram posição em prol de Barack Obama ou de Mitt Romney em seus editoriais sem que os partidos ou as campanhas dos candidatos vissem nisso sinais de "conspiração", muito menos de indicativo à necessidade de "controle social da mídia".

Tampouco a ilegalidade permeia o sistema de arrecadação de recursos para as campanhas.

Por fim, o voto facultativo, quase uma regra geral entre países civilizados. À ausência da reserva de mercado garantida pelo voto obrigatório, os candidatos a homens mais poderosos do mundo correram até o último minuto atrás de motivar o eleitor a exercer seu direito de votar.

Detalhes que fazem uma boa diferença.

Café com leite. No auge do poder e do prestígio, Antônio Carlos Magalhães dizia que reunião sem a presença dele não valia. Descontada a arrogância, era verdade.

A mesma medida se aplica ao ex-presidente Lula como avalista de todos os acordos políticos firmados pelo PT. Por essa razão, da ausência dele no jantar de terça-feira entre a presidente Dilma Rousseff e a cúpula do PMDB, é possível extrair uma constatação.

A despeito da versão oficial, o encontro não serve para afirmar a imutabilidade da aliança entre os dois partidos na montagem da chapa de 2014 nem para assegurar respeito ao combinado para a eleição do comando do Congresso em 2013.

Para além da produção de uma "fotografia" e da criação de um fato com prazo de validade curto há a realidade. E esta ensina que são as circunstâncias, e não um jantar no Palácio da Alvorada, o fator determinante da manutenção de qualquer acordo.

O acerto firmado no Congresso depende de um freio de arrumação nas cada vez mais explícitas demonstrações de rebeldia nas bancadas petista e pemedebista em relação ao roteiro anteriormente escrito.

A aliança para 2014 está sujeita às conveniências do PMDB nos Estados e do PT no plano federal. De ambas as partes pode haver outras prioridades caso apareçam nomes suficientemente competitivos para ameaçar a reeleição de Dilma Rousseff.

Corda bamba. O sucesso de Joaquim Barbosa ameaça criar pernas e levar o relator a perder a cabeça.

O sentido da moderação é útil ao julgamento em curso e indispensável ao bom andamento dos trabalhos do Supremo que daqui a 15 dias presidirá.