FOLHA DE SP - 08/02
RIO DE JANEIRO - Carlos Galhardo foi ao Café Nice pedir uma marchinha ao compositor Antonio Nássara para o Carnaval. Nássara olhou para Galhardo e disse: "Você tem cara de árabe". E sapecou ali mesmo o que, com retoques do parceiro Haroldo Lobo, se tornaria "Alá-la-ô" --ou assim eles pensavam. Mas aquilo era só o rascunho. Nássara foi à casa de Pixinguinha, no Catumbi, para que este fizesse o arranjo. O maestro o recebeu de cueca, mandou vir papel e lápis, abriu o piano, reescreveu tudo e "Alá-la-ô" ficou perfeita, irresistível, pronta para ser gravada.
O que Galhardo fez na Victor, e pronto: desde 1941 nunca mais houve um Carnaval sem "Alá-la-ô". Só no Brasil isso seria possível: um compositor de origem árabe (Nássara) invocar Alá com tal intimidade ("Alá-la-ô, ooô, ooô/Mas que calor, ooô, ooô") e pôr o nome do profeta amorosamente na boca dos profanos.
Galhardo era daquela turma de cantores --Francisco Alves, Mario Reis, Silvio Caldas, Carmen Miranda, Orlando Silva-- que surgiu nos anos 30 e construiu a música popular. A ele devemos a marchinha de Natal "Boas Festas", de Assis Valente, a toada "Maringá", de Joubert de Carvalho, o samba "Sei Que É Covardia", de Ataulpho Alves e Claudionor Cruz, e uma quantidade de valsas que o Brasil deveria insistir em preservar --porque poucos ritmos se revelaram tão brasileiros.
Mas, de toda aquela geração, Galhardo é hoje o menos lembrado. Seus cem anos de nascimento, feitos em 2013, teriam sido ainda mais ignorados se não fosse a luta de sua filha, Carla Guagliardi, para tentar produzir shows, vídeos e discos a seu respeito. A luta continua.
Galhardo merecia uma caixa de CDs com, no mínimo, cem faixas, e, mesmo assim, muitos sucessos ficariam de fora. Mas vá dizer isso à Sony, a múlti que se senta em cima de boa parte do nosso patrimônio musical.
sábado, fevereiro 08, 2014
Dramas da vida privada - ZUENIR VENTURA
O GLOBO - 08/02
Acusação a Woody Allen e separação de Grazi e Cauã saltaram do âmbito particular para o espaço público da mídia
De um lado, uma grave denúncia de abuso sexual de criança; de outro, uma acusação de roubo de marido de colega. São duas histórias de artistas famosos que saltaram do âmbito particular para o espaço público da mídia — uma nos EUA e outra no Brasil. No primeiro episódio, a filha adotiva de Mia Farrow e Woody Allen, hoje com 28 anos, conta em carta ao “NY Times” como foi molestada pelo cineasta na infância. A suspeita surgiu em 1993, durante a separação do casal, mas só agora, pela primeira vez em público, Dylan Farrow dá a sua versão, e com tantos detalhes, que parecia não deixar dúvida de que se tratava do retrato de um tarado. “Quando eu tinha 7 anos, ele me levou pela mão para o sótão da casa (...), me mandou deitar de bruços e brincar com o trenzinho elétrico de meu irmãozinho e me agrediu sexualmente.” Dylan alega que só resolveu falar agora porque Allen foi indicado ao Oscar por “Blue Jasmine”. A aceitação geral dele a teria silenciado por esse tempo todo. “Desta vez me recuso a desmoronar.” E desafiou alguns atores do filme: “E se fosse com sua filha, Cate Blanchett? Louis CK, Alec Baldwin? Ou você, Scarlett Johanson?”
Como era esperado, Allen revidou qualificando a acusação de “mentirosa e infame”. Outras pessoas vieram em seu apoio, mas a principal defesa foi feita por Moses Farrow, de 36 anos, que abalou certezas, desmentindo a irmã Dylan e acusando a mãe de ter incentivado os filhos a odiar Allen por meio de lavagem cerebral. “Ele não molestou minha irmã. Eu o odiei por muitos anos. Hoje vejo que foi uma vingança dela por ele ter se apaixonado por Soon Yi (filha adotiva de Mia). No dia (do alegado abuso) havia seis ou sete de nós em casa.” O caso novamente dividiu opiniões, mas como tomar posição em histórias como essa de vida em família?
No Brasil, porém, uma separação bem mais civilizada, sem acusações mútuas nem implicações incestuosas, tem produzido reações medievais na internet. A atriz Isis Valverde sofreu há uma semana um acidente de carro, fraturou uma vértebra da coluna cervical e foi internada. Pois um grande número de internautas postou mensagens comemorando o fato — “bem feito”, “mereceu a lesão sofrida por ter destruído um lar” — com base no boato não confirmado de que ela teria sido o pivô da separação de Grazi Massafera e Cauã Raymond, com quem fez par romântico na série “Amores roubados”.
Isis defendeu-se da acusação: “Não há em minha biografia quaisquer resquícios de tais procedimentos. Isso não faz parte de minha ética afetiva.” Será que adiantou? A web é escoadouro de muita coisa boa, mas também do que o gênero humano tem de pior em matéria de frustração, inveja e baixaria em geral.
Acusação a Woody Allen e separação de Grazi e Cauã saltaram do âmbito particular para o espaço público da mídia
De um lado, uma grave denúncia de abuso sexual de criança; de outro, uma acusação de roubo de marido de colega. São duas histórias de artistas famosos que saltaram do âmbito particular para o espaço público da mídia — uma nos EUA e outra no Brasil. No primeiro episódio, a filha adotiva de Mia Farrow e Woody Allen, hoje com 28 anos, conta em carta ao “NY Times” como foi molestada pelo cineasta na infância. A suspeita surgiu em 1993, durante a separação do casal, mas só agora, pela primeira vez em público, Dylan Farrow dá a sua versão, e com tantos detalhes, que parecia não deixar dúvida de que se tratava do retrato de um tarado. “Quando eu tinha 7 anos, ele me levou pela mão para o sótão da casa (...), me mandou deitar de bruços e brincar com o trenzinho elétrico de meu irmãozinho e me agrediu sexualmente.” Dylan alega que só resolveu falar agora porque Allen foi indicado ao Oscar por “Blue Jasmine”. A aceitação geral dele a teria silenciado por esse tempo todo. “Desta vez me recuso a desmoronar.” E desafiou alguns atores do filme: “E se fosse com sua filha, Cate Blanchett? Louis CK, Alec Baldwin? Ou você, Scarlett Johanson?”
Como era esperado, Allen revidou qualificando a acusação de “mentirosa e infame”. Outras pessoas vieram em seu apoio, mas a principal defesa foi feita por Moses Farrow, de 36 anos, que abalou certezas, desmentindo a irmã Dylan e acusando a mãe de ter incentivado os filhos a odiar Allen por meio de lavagem cerebral. “Ele não molestou minha irmã. Eu o odiei por muitos anos. Hoje vejo que foi uma vingança dela por ele ter se apaixonado por Soon Yi (filha adotiva de Mia). No dia (do alegado abuso) havia seis ou sete de nós em casa.” O caso novamente dividiu opiniões, mas como tomar posição em histórias como essa de vida em família?
No Brasil, porém, uma separação bem mais civilizada, sem acusações mútuas nem implicações incestuosas, tem produzido reações medievais na internet. A atriz Isis Valverde sofreu há uma semana um acidente de carro, fraturou uma vértebra da coluna cervical e foi internada. Pois um grande número de internautas postou mensagens comemorando o fato — “bem feito”, “mereceu a lesão sofrida por ter destruído um lar” — com base no boato não confirmado de que ela teria sido o pivô da separação de Grazi Massafera e Cauã Raymond, com quem fez par romântico na série “Amores roubados”.
Isis defendeu-se da acusação: “Não há em minha biografia quaisquer resquícios de tais procedimentos. Isso não faz parte de minha ética afetiva.” Será que adiantou? A web é escoadouro de muita coisa boa, mas também do que o gênero humano tem de pior em matéria de frustração, inveja e baixaria em geral.
Mudanças climáticas e a água de São Paulo - FERNANDO REINACH
O Estado de S.Paulo - 08/02
Olhe para o céu e para o termômetro. Se o primeiro estiver azul e o segundo alto, faça como nossas autoridades, reze. Mas, se você prefere lidar com a realidade, que tal entender o funcionamento do Sistema Cantareira? O Sistema Cantareira fornece 45% de toda a água da Região Metropolitana de São Paulo. Vinte milhões de pessoas, 10% da população brasileira, dependem dele.
O Sistema Cantareira está à beira do colapso. Ele nunca esteve com tão pouca água. E continua esvaziando quando já deveria estar enchendo desde dezembro. O maior dos reservatórios (Jacareí/Jaguari) está com menos de 17% de sua capacidade, e a água se encontra na cota 826 metros. Essa represa possui seis tomadas de água que levam o precioso líquido para São Paulo. As quatro mais altas, nas cotas 836 e 827, já estão no seco, fora da água. As duas mais baixas, na cota 818, ainda estão captando água. Mas, se a represa chegar à cota 818, é o fim, nem uma gota de água poderá ser captada.
O governo continua otimista e acredita que São Pedro esqueceu de ligar o despertador. Se isso for verdade será a primeira vez nos últimos 40 anos. Mas, se não chover muito nos próximos 30 dias, São Paulo e outra dezena de municípios vão ter de sobreviver a partir de abril sem os 36.000.000 de litros de água por segundo (36 m³/seg) que este conjunto de represas e túneis pode trazer até São Paulo.
O que poucos sabem é que em agosto de 2014 a outorga do Sistema Cantareira terá de ser renovada. Nesse processo o governo vai decidir quanto de água pode ser retirada do sistema a cada dia, quem vai ter o direito a essa água, e com que prioridade. A má notícia é que aparentemente o Sistema Cantareira não tem mais capacidade de fornecer os atuais 36 m³/seg. Se a decisão for baseada em critérios técnicos, a vazão total deveria ser reduzida. É o que está escrito nas entrelinhas do documento preparado pelos técnicos para embasar a renovação da outorga (veja link abaixo). São 113 páginas de gráficos, tabelas, mapas e explicações. Vale a pena ler.
Em 1976, com base nos dados coletados desde 1930, os técnicos decidiram outorgar à Sabesp o direito de retirar 33 m³/seg do Sistema Cantareira até 2004. Em 2004, a renovação ocorreu durante uma grande seca, quando o sistema chegou pela primeira vez a 20% de sua capacidade máxima e houve racionamento de água. Foi decidido na época que seria possível aumentar em 10% a quantidade máxima de água que poderia ser retirada do sistema, que passou a ser 36 m³/seg. Essa renovação foi feita por um prazo de 10 anos e vence agora (veja na página 69 do documento).
Nas série histórica em que foi baseada a renovação da outorga em 2004 (dados coletados entre 1930 e 2003) a capacidade dos rios que compõem o Sistema Cantareira foi estimada em 44,8 m³/seg. Já as medidas feitas nos últimos anos (2004 a 2012) mostram que esta capacidade se reduziu para 39,7 m³/seg, uma redução de 13%. Se você quiser ser generoso pode comparar os dados de 1930 a 2003 com os dados de 1930 e 2012 e, neste caso, a redução é menor, aproximadamente 10% (veja página 36 do documento).
Esses dados bastariam para justificar uma redução no volume da próxima outorga, mas, além disso, o relatório demonstra que nos últimos anos a variabilidade da quantidade de chuva aumentou significativamente (em alguns anos chove muito e em outros chove pouco). Essa variabilidade é uma das consequências previstas nos modelos de mudança climática. No futuro, teremos mais anos com pouca chuva e mais anos com um grande excesso de chuvas. Para garantir o suprimento de água nos anos secos, os reservatórios deveriam ser administrados com uma folga maior. Menos água pode ser retirada, e os níveis médios devem ser mantidos mais altos.
Esses são os fatos. Resta saber como o governo vai se comportar. Vai aceitar a realidade e renovar a outorga com um volume menor (o que força a Sabesp a investir ainda mais em novas fontes de água) ou vamos continuar acreditando em São Pedro e torcer para que a seca final só ocorra em um governo futuro (que, claro, será o culpado).
A Sabesp já emitiu sua opinião. Em uma carta que pode ser encontrada no site da ANA, sua presidente solicitou a renovação da outorga. Pediu que, desta vez, a outorga seja concedida por 30 anos e não mencionou uma possível redução de volume (http://bit.ly/1e92mjq).
Olhe para o céu e para o termômetro. Se o primeiro estiver azul e o segundo alto, faça como nossas autoridades, reze. Mas, se você prefere lidar com a realidade, que tal entender o funcionamento do Sistema Cantareira? O Sistema Cantareira fornece 45% de toda a água da Região Metropolitana de São Paulo. Vinte milhões de pessoas, 10% da população brasileira, dependem dele.
O Sistema Cantareira está à beira do colapso. Ele nunca esteve com tão pouca água. E continua esvaziando quando já deveria estar enchendo desde dezembro. O maior dos reservatórios (Jacareí/Jaguari) está com menos de 17% de sua capacidade, e a água se encontra na cota 826 metros. Essa represa possui seis tomadas de água que levam o precioso líquido para São Paulo. As quatro mais altas, nas cotas 836 e 827, já estão no seco, fora da água. As duas mais baixas, na cota 818, ainda estão captando água. Mas, se a represa chegar à cota 818, é o fim, nem uma gota de água poderá ser captada.
O governo continua otimista e acredita que São Pedro esqueceu de ligar o despertador. Se isso for verdade será a primeira vez nos últimos 40 anos. Mas, se não chover muito nos próximos 30 dias, São Paulo e outra dezena de municípios vão ter de sobreviver a partir de abril sem os 36.000.000 de litros de água por segundo (36 m³/seg) que este conjunto de represas e túneis pode trazer até São Paulo.
O que poucos sabem é que em agosto de 2014 a outorga do Sistema Cantareira terá de ser renovada. Nesse processo o governo vai decidir quanto de água pode ser retirada do sistema a cada dia, quem vai ter o direito a essa água, e com que prioridade. A má notícia é que aparentemente o Sistema Cantareira não tem mais capacidade de fornecer os atuais 36 m³/seg. Se a decisão for baseada em critérios técnicos, a vazão total deveria ser reduzida. É o que está escrito nas entrelinhas do documento preparado pelos técnicos para embasar a renovação da outorga (veja link abaixo). São 113 páginas de gráficos, tabelas, mapas e explicações. Vale a pena ler.
Em 1976, com base nos dados coletados desde 1930, os técnicos decidiram outorgar à Sabesp o direito de retirar 33 m³/seg do Sistema Cantareira até 2004. Em 2004, a renovação ocorreu durante uma grande seca, quando o sistema chegou pela primeira vez a 20% de sua capacidade máxima e houve racionamento de água. Foi decidido na época que seria possível aumentar em 10% a quantidade máxima de água que poderia ser retirada do sistema, que passou a ser 36 m³/seg. Essa renovação foi feita por um prazo de 10 anos e vence agora (veja na página 69 do documento).
Nas série histórica em que foi baseada a renovação da outorga em 2004 (dados coletados entre 1930 e 2003) a capacidade dos rios que compõem o Sistema Cantareira foi estimada em 44,8 m³/seg. Já as medidas feitas nos últimos anos (2004 a 2012) mostram que esta capacidade se reduziu para 39,7 m³/seg, uma redução de 13%. Se você quiser ser generoso pode comparar os dados de 1930 a 2003 com os dados de 1930 e 2012 e, neste caso, a redução é menor, aproximadamente 10% (veja página 36 do documento).
Esses dados bastariam para justificar uma redução no volume da próxima outorga, mas, além disso, o relatório demonstra que nos últimos anos a variabilidade da quantidade de chuva aumentou significativamente (em alguns anos chove muito e em outros chove pouco). Essa variabilidade é uma das consequências previstas nos modelos de mudança climática. No futuro, teremos mais anos com pouca chuva e mais anos com um grande excesso de chuvas. Para garantir o suprimento de água nos anos secos, os reservatórios deveriam ser administrados com uma folga maior. Menos água pode ser retirada, e os níveis médios devem ser mantidos mais altos.
Esses são os fatos. Resta saber como o governo vai se comportar. Vai aceitar a realidade e renovar a outorga com um volume menor (o que força a Sabesp a investir ainda mais em novas fontes de água) ou vamos continuar acreditando em São Pedro e torcer para que a seca final só ocorra em um governo futuro (que, claro, será o culpado).
A Sabesp já emitiu sua opinião. Em uma carta que pode ser encontrada no site da ANA, sua presidente solicitou a renovação da outorga. Pediu que, desta vez, a outorga seja concedida por 30 anos e não mencionou uma possível redução de volume (http://bit.ly/1e92mjq).
#pasdebaguette - MARCELO RUBENS PAIVA
O Estado de S.Paulo - 08/02
RIP o "ary-barroquismo" da nossa gente. Algumas instituições nacionais têm se desfeito com o tempo. Por onde anda o brasileiro inzoneiro, sorridente e feliz?
"Esse coqueiro que dá coco"? Custa os olhos da cara. "Onde amarro minha rede"? Cuidado com o arrastão, que não é de peixe. "Nas noites claras de luar"? Checou se o alarme está ligado? "Por essas fontes murmurantes onde mato a minha sede"? Racione, pois os reservatórios se encontram abaixo do nível.
Levantamento recente da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, que avaliou 156 países, indica que o Brasil ocupa a 24.ª posição quando o assunto é felicidade da população. Para a consultoria IMS Health, numa pesquisa encomendada em 2012, o Clonazepam aparece como o oitavo medicamento mais vendido nas farmácias do País; perde para o Neosoro, ícone da descongestão nasal, Ciclo 21 e Microvlar, anticoncepcional campeão absoluto na temporada de 2008, mas desbanca gigantes da automedicação, como Dorflex, Tylenol, Engov, melhor amigo de um boêmio, e o lendário e proustiano Hipoglós, que tem cheirinho de mamãe.
Do Laboratório Roche, o tranquilizante vem em forma de comprimidos e gotas, é indicado isoladamente ou como adjuvante no tratamento das crises epilépticas.
Ansiolítico, ajuda no tratamento de transtornos de ansiedade, distúrbio do pânico com ou sem agorafobia, transtornos de humor e afetivo bipolar, tratamento de mania e depressão maior, como adjuvante de antidepressivos na fase inicial.
Ainda segundo a bula, é empregado em síndromes psicóticas, tratamento da síndrome das pernas inquietas, da vertigem e sintomas relacionados à perturbação do equilíbrio, náuseas, vômitos, quedas, zumbidos, hipersensibilidade a sons (hiperacusia e hipoacusia), plenitude aural, tratamento da síndrome da boca ardente, e não deve ser usado por pacientes com histórico de sensibilidade aos benzodiazepínicos, insuficiência respiratória ou hepática grave.
Como causa depressão no Sistema Nervoso Central, não é recomendável realizar ocupações perigosas que requerem agilidade mental, operar máquinas ou dirigir veículos, nem o uso concomitante com álcool ou outras drogas.
Clonazepam é o princípio ativo do Rivotril, o tarja preta mais pop e idolatrado, tranquilizante do grupo dos benzodiazepínicos. Barato, vendido desde 1960, pode causar dependência. Por que o brasileiro está precisando dele?
Não viramos todos epiléticos. Andam em falta plenitude aural e astral. Adquirimos:
1. Agorafobia (fobia social), especialmente os que dependem de transporte público para ir e vir e ainda costumam cruzar com Black Blocs pelo caminho, negociando a passagem com a PM ou entrando numa agência para fazer operações em caixas eletrônicos.
2. Insônia, para se calcular o prejuízo que tomamos de serviços precários, impostos em cascata e desorganização do Estado.
3. Transtorno de humor, se ficamos parados num congestionamento, num avião que não sai do chão ou numa estrada interrompida por passarelas desabadas.
4. Zumbido, cercados por buzinas, obras irregulares, pancadões e vizinhos que tretam o tempo todo e não tomam Rivotril, Lexotan, Frontal, Maracugina, água com açúcar, nem chá de camomila.
5. Enjoos e náuseas, quando vemos pelos telejornais máfias do serviço público se esbaldarem com nossos impostos e a tática da polícia contra manifestações populares.
O brasileiro está inquieto e furioso. Odeia. Muitos odeiam. Muitos se odeiam no trânsito. Muitos odeiam políticos. Todos odeiam operadoras de celular e TV a cabo, companhias aéreas, servidores públicos, bancos, filas nos bancos, ladrões de bancos, lucros dos bancos, e tem os que odeiam e vandalizam bicicletas patrocinadas por bancos.
O ódio é disseminado por redes sociais, o paraíso de antissociais. Mas acredito que as pessoas odeiam odiar. Restará às autoridades uma saída: despejar, com o flúor, gotas de Rivotril nos reservatórios de água potável, para recuperarmos a plenitude astral e aural. Se houver água nos reservatórios.
Antes que eu me esqueça, odeio ser contrariado. Nem vem discordar do que escrevi.
*
RIP a "pátria de chuteiras". Outra instituição nacional é alvejada. O que é o movimento #naovaitercopa? Não vai ter? Quem disse? Está agendada. Não erraram a data? O movimento não deveria ter se manifestado antes de o Brasil anunciar a candidatura?
Claro que vai ter Copa, os estádios estão quase prontos. Temo pela integridade física e mental desses moleques mascarados, que imaginam barrar torcedores hooligans ingleses e alemães bêbados, russos barra-pesada, gregos, algerianos e argentinos "barra brava", iranianos, gregos, croatas, colombianos e coreanos, furiosos por terem desembarcados em aeroportos improvisados, que não têm trem nem metrô para a cidade, depois de pagarem passagens com preços abusivos, pegarem táxis que não falavam língua estrangeira e com preços abusivos, não acharem vagas em hotéis, apesar dos preços abusivos, e passarem horas em aviões cruzando o Brasil entre uma rodada e outra, matando a sede em botecos e restaurante com preços abusivos.
Não vai ter Copa no país que mais Copas ganhou? O único que esteve em todas as Copas e chegou a sete finais? É como se franceses organizassem o movimento social #pasdebaguette (nada de baguete), e americanos, #noturkeyonthanksgiving (sem peru no Thanksgiving).
Copa do Mundo não é brasileira, é no Brasil, é uma instituição mundial que amamos a cada quatro anos desde 1930. Fui sorteado e paguei pelos ingressos para a abertura, final, e pleiteio os das semifinais. Espero por esse momento desde quando nasci.
Entendo que queiram protestar contra os gastos abusivos, o trem-bala que não saiu, as promessas de obras de mobilidade urbana, que não passaram de promessas, e que não será a Copa das Copas, longe disso, que estaremos cercados por tapumes e obras superfaturadas, que é uma insanidade 13 cidades com 13 estádios, e que no final das contas a conta será paga pelo contribuinte, como sempre.
Mas então organizem o movimento #prestemcontas na porta do BNDES, não nas dos estádios, digo arenas. E se não foi a Copa das Copas, chequem quem assinou a Matriz de Responsabilidades e não arcou com as suas. As urnas eletrônicas serão abertas quatro meses depois.
RIP o "ary-barroquismo" da nossa gente. Algumas instituições nacionais têm se desfeito com o tempo. Por onde anda o brasileiro inzoneiro, sorridente e feliz?
"Esse coqueiro que dá coco"? Custa os olhos da cara. "Onde amarro minha rede"? Cuidado com o arrastão, que não é de peixe. "Nas noites claras de luar"? Checou se o alarme está ligado? "Por essas fontes murmurantes onde mato a minha sede"? Racione, pois os reservatórios se encontram abaixo do nível.
Levantamento recente da Rede de Soluções para o Desenvolvimento Sustentável da ONU, que avaliou 156 países, indica que o Brasil ocupa a 24.ª posição quando o assunto é felicidade da população. Para a consultoria IMS Health, numa pesquisa encomendada em 2012, o Clonazepam aparece como o oitavo medicamento mais vendido nas farmácias do País; perde para o Neosoro, ícone da descongestão nasal, Ciclo 21 e Microvlar, anticoncepcional campeão absoluto na temporada de 2008, mas desbanca gigantes da automedicação, como Dorflex, Tylenol, Engov, melhor amigo de um boêmio, e o lendário e proustiano Hipoglós, que tem cheirinho de mamãe.
Do Laboratório Roche, o tranquilizante vem em forma de comprimidos e gotas, é indicado isoladamente ou como adjuvante no tratamento das crises epilépticas.
Ansiolítico, ajuda no tratamento de transtornos de ansiedade, distúrbio do pânico com ou sem agorafobia, transtornos de humor e afetivo bipolar, tratamento de mania e depressão maior, como adjuvante de antidepressivos na fase inicial.
Ainda segundo a bula, é empregado em síndromes psicóticas, tratamento da síndrome das pernas inquietas, da vertigem e sintomas relacionados à perturbação do equilíbrio, náuseas, vômitos, quedas, zumbidos, hipersensibilidade a sons (hiperacusia e hipoacusia), plenitude aural, tratamento da síndrome da boca ardente, e não deve ser usado por pacientes com histórico de sensibilidade aos benzodiazepínicos, insuficiência respiratória ou hepática grave.
Como causa depressão no Sistema Nervoso Central, não é recomendável realizar ocupações perigosas que requerem agilidade mental, operar máquinas ou dirigir veículos, nem o uso concomitante com álcool ou outras drogas.
Clonazepam é o princípio ativo do Rivotril, o tarja preta mais pop e idolatrado, tranquilizante do grupo dos benzodiazepínicos. Barato, vendido desde 1960, pode causar dependência. Por que o brasileiro está precisando dele?
Não viramos todos epiléticos. Andam em falta plenitude aural e astral. Adquirimos:
1. Agorafobia (fobia social), especialmente os que dependem de transporte público para ir e vir e ainda costumam cruzar com Black Blocs pelo caminho, negociando a passagem com a PM ou entrando numa agência para fazer operações em caixas eletrônicos.
2. Insônia, para se calcular o prejuízo que tomamos de serviços precários, impostos em cascata e desorganização do Estado.
3. Transtorno de humor, se ficamos parados num congestionamento, num avião que não sai do chão ou numa estrada interrompida por passarelas desabadas.
4. Zumbido, cercados por buzinas, obras irregulares, pancadões e vizinhos que tretam o tempo todo e não tomam Rivotril, Lexotan, Frontal, Maracugina, água com açúcar, nem chá de camomila.
5. Enjoos e náuseas, quando vemos pelos telejornais máfias do serviço público se esbaldarem com nossos impostos e a tática da polícia contra manifestações populares.
O brasileiro está inquieto e furioso. Odeia. Muitos odeiam. Muitos se odeiam no trânsito. Muitos odeiam políticos. Todos odeiam operadoras de celular e TV a cabo, companhias aéreas, servidores públicos, bancos, filas nos bancos, ladrões de bancos, lucros dos bancos, e tem os que odeiam e vandalizam bicicletas patrocinadas por bancos.
O ódio é disseminado por redes sociais, o paraíso de antissociais. Mas acredito que as pessoas odeiam odiar. Restará às autoridades uma saída: despejar, com o flúor, gotas de Rivotril nos reservatórios de água potável, para recuperarmos a plenitude astral e aural. Se houver água nos reservatórios.
Antes que eu me esqueça, odeio ser contrariado. Nem vem discordar do que escrevi.
*
RIP a "pátria de chuteiras". Outra instituição nacional é alvejada. O que é o movimento #naovaitercopa? Não vai ter? Quem disse? Está agendada. Não erraram a data? O movimento não deveria ter se manifestado antes de o Brasil anunciar a candidatura?
Claro que vai ter Copa, os estádios estão quase prontos. Temo pela integridade física e mental desses moleques mascarados, que imaginam barrar torcedores hooligans ingleses e alemães bêbados, russos barra-pesada, gregos, algerianos e argentinos "barra brava", iranianos, gregos, croatas, colombianos e coreanos, furiosos por terem desembarcados em aeroportos improvisados, que não têm trem nem metrô para a cidade, depois de pagarem passagens com preços abusivos, pegarem táxis que não falavam língua estrangeira e com preços abusivos, não acharem vagas em hotéis, apesar dos preços abusivos, e passarem horas em aviões cruzando o Brasil entre uma rodada e outra, matando a sede em botecos e restaurante com preços abusivos.
Não vai ter Copa no país que mais Copas ganhou? O único que esteve em todas as Copas e chegou a sete finais? É como se franceses organizassem o movimento social #pasdebaguette (nada de baguete), e americanos, #noturkeyonthanksgiving (sem peru no Thanksgiving).
Copa do Mundo não é brasileira, é no Brasil, é uma instituição mundial que amamos a cada quatro anos desde 1930. Fui sorteado e paguei pelos ingressos para a abertura, final, e pleiteio os das semifinais. Espero por esse momento desde quando nasci.
Entendo que queiram protestar contra os gastos abusivos, o trem-bala que não saiu, as promessas de obras de mobilidade urbana, que não passaram de promessas, e que não será a Copa das Copas, longe disso, que estaremos cercados por tapumes e obras superfaturadas, que é uma insanidade 13 cidades com 13 estádios, e que no final das contas a conta será paga pelo contribuinte, como sempre.
Mas então organizem o movimento #prestemcontas na porta do BNDES, não nas dos estádios, digo arenas. E se não foi a Copa das Copas, chequem quem assinou a Matriz de Responsabilidades e não arcou com as suas. As urnas eletrônicas serão abertas quatro meses depois.
O cigarro eletrônico - DRAUZIO VARELLA
FOLHA DE SP - 08/02
O cigarro eletrônico pode ser uma forma menos maligna de lidar com a dependência de nicotina
Inalar a fumaça liberada na combustão do cigarro é o mais mortal dos comportamentos de risco, no Brasil.
Não é de hoje que os fabricantes procuram uma forma de administrar nicotina, sem causar os malefícios da queima do fumo nem tirar o prazer que o dependente sente ao fumar. E, acima de tudo, sem abrir mão do lucro obtido com a droga que provoca a mais escravizadora das dependências químicas conhecidas pela medicina.
Com essa finalidade, foram lançados no comércio os cigarros eletrônicos, uma coleção heterogênea de dispositivos movidos a bateria que vaporizam nicotina, para ser fumada num tubo que imita o cigarro.
Em menos de dez anos, as vendas na Europa atingiram 650 milhões de dólares, e 1,7 bilhão nos Estados Unidos. O sucesso tem sido tão grande que alguns especialistas ousam predizer que o cigarro convencional estaria com os dias contados.
Na literatura médica, entretanto, as opiniões são divergentes.
1) Os detratores
A demonstração de que fumantes passivos correm mais risco de morrer por ataque cardíaco, derrame cerebral, câncer e doenças respiratórias deu origem à legislação que proibiu o fumo em lugares fechados, providência que beneficiou fumantes e abstêmios.
Especialistas temem que esse esforço da sociedade seja perdido, quando os cigarros eletrônicos forem anunciados em larga escala pelos meios de comunicação.
Comerciais exibidos recentemente nas TVs americanas justificam a preocupação: "Finalmente, os fumantes têm uma alternativa real" ou "Somos todos adultos aqui. É tempo de tomarmos nossa liberdade de volta". Mensagens como essas não seduzirão as crianças, como aconteceu com as campanhas de cigarros anos atrás?
Os Centers for Diseases Control, nos Estados Unidos, revelaram que embora o consumo de cigarros comuns entre adolescentes americanos tenha caído, entre 2011 e 2012, o de eletrônicos duplicou.
Não existe padronização na quantidade de nicotina vaporizada pelas diferentes marcas de eletrônicos; nem controle de qualidade. Os testes mostram que alguns conseguem liberar o dobro ou o triplo de nicotina, em cada tragada.
Ainda não há comprovação científica de que o cigarro eletrônico substitua os convencionais. O uso concomitante pode levar ao consumo de doses exageradas de nicotina, eventualmente próximas de limites perigosos.
2) Os defensores
Consideram que o cigarro eletrônico se enquadra nas chamadas estratégias de redução de riscos, semelhantes às de distribuição de seringas para usuários de drogas injetáveis, adotadas como medida de prevenção à Aids.
Há quem acredite que ao lado de outras formas de administrar nicotina sem utilizar combustão (chicletes, pastilhas e adesivos), os dispositivos eletrônicos têm potencial para se tornar um dos maiores avanços na história da saúde pública.
Para eles, o vapor de nicotina inalado através do cigarro eletrônico mimetiza as experiências prévias do fumante, sem deixar de estigmatizar o cigarro comum.
Lembram que no mundo ocorrem 6 milhões de óbitos por ano, por causa do fumo, e que as previsões para o século 21 não poderiam ser mais sombrias: um bilhão de mortes, predominantemente entre os mais pobres e menos instruídos.
Defendem que a estratégia de reduzir, mesmo sem eliminar, o risco de morte associado ao cigarro, é um imperativo moral.
Difícil não reconhecer que os dois lados apresentam argumentos consistentes. Minha opinião é de que os cigarros eletrônicos devem obedecer leis que os obriguem a passar por controle de qualidade, que proíbam fumá-los em bares, restaurantes, escritórios e outros espaços públicos fechados, e que vedem a publicidade pelos meios de comunicação de massa.
Seria fundamental, ainda, proibir que os fabricantes adicionassem mentol, essências de morango, baunilha ou chocolate para torná-los mais palatáveis às crianças, prática criminosa que a Anvisa não consegue impedir que a indústria do fumo continue utilizando no cigarro comum.
Na falta de melhor alternativa, o cigarro eletrônico pode ser uma forma menos maligna de lidar com a dependência de nicotina. Mas, é preciso criar com urgência uma legislação para lidar com ele.
O cigarro eletrônico pode ser uma forma menos maligna de lidar com a dependência de nicotina
Inalar a fumaça liberada na combustão do cigarro é o mais mortal dos comportamentos de risco, no Brasil.
Não é de hoje que os fabricantes procuram uma forma de administrar nicotina, sem causar os malefícios da queima do fumo nem tirar o prazer que o dependente sente ao fumar. E, acima de tudo, sem abrir mão do lucro obtido com a droga que provoca a mais escravizadora das dependências químicas conhecidas pela medicina.
Com essa finalidade, foram lançados no comércio os cigarros eletrônicos, uma coleção heterogênea de dispositivos movidos a bateria que vaporizam nicotina, para ser fumada num tubo que imita o cigarro.
Em menos de dez anos, as vendas na Europa atingiram 650 milhões de dólares, e 1,7 bilhão nos Estados Unidos. O sucesso tem sido tão grande que alguns especialistas ousam predizer que o cigarro convencional estaria com os dias contados.
Na literatura médica, entretanto, as opiniões são divergentes.
1) Os detratores
A demonstração de que fumantes passivos correm mais risco de morrer por ataque cardíaco, derrame cerebral, câncer e doenças respiratórias deu origem à legislação que proibiu o fumo em lugares fechados, providência que beneficiou fumantes e abstêmios.
Especialistas temem que esse esforço da sociedade seja perdido, quando os cigarros eletrônicos forem anunciados em larga escala pelos meios de comunicação.
Comerciais exibidos recentemente nas TVs americanas justificam a preocupação: "Finalmente, os fumantes têm uma alternativa real" ou "Somos todos adultos aqui. É tempo de tomarmos nossa liberdade de volta". Mensagens como essas não seduzirão as crianças, como aconteceu com as campanhas de cigarros anos atrás?
Os Centers for Diseases Control, nos Estados Unidos, revelaram que embora o consumo de cigarros comuns entre adolescentes americanos tenha caído, entre 2011 e 2012, o de eletrônicos duplicou.
Não existe padronização na quantidade de nicotina vaporizada pelas diferentes marcas de eletrônicos; nem controle de qualidade. Os testes mostram que alguns conseguem liberar o dobro ou o triplo de nicotina, em cada tragada.
Ainda não há comprovação científica de que o cigarro eletrônico substitua os convencionais. O uso concomitante pode levar ao consumo de doses exageradas de nicotina, eventualmente próximas de limites perigosos.
2) Os defensores
Consideram que o cigarro eletrônico se enquadra nas chamadas estratégias de redução de riscos, semelhantes às de distribuição de seringas para usuários de drogas injetáveis, adotadas como medida de prevenção à Aids.
Há quem acredite que ao lado de outras formas de administrar nicotina sem utilizar combustão (chicletes, pastilhas e adesivos), os dispositivos eletrônicos têm potencial para se tornar um dos maiores avanços na história da saúde pública.
Para eles, o vapor de nicotina inalado através do cigarro eletrônico mimetiza as experiências prévias do fumante, sem deixar de estigmatizar o cigarro comum.
Lembram que no mundo ocorrem 6 milhões de óbitos por ano, por causa do fumo, e que as previsões para o século 21 não poderiam ser mais sombrias: um bilhão de mortes, predominantemente entre os mais pobres e menos instruídos.
Defendem que a estratégia de reduzir, mesmo sem eliminar, o risco de morte associado ao cigarro, é um imperativo moral.
Difícil não reconhecer que os dois lados apresentam argumentos consistentes. Minha opinião é de que os cigarros eletrônicos devem obedecer leis que os obriguem a passar por controle de qualidade, que proíbam fumá-los em bares, restaurantes, escritórios e outros espaços públicos fechados, e que vedem a publicidade pelos meios de comunicação de massa.
Seria fundamental, ainda, proibir que os fabricantes adicionassem mentol, essências de morango, baunilha ou chocolate para torná-los mais palatáveis às crianças, prática criminosa que a Anvisa não consegue impedir que a indústria do fumo continue utilizando no cigarro comum.
Na falta de melhor alternativa, o cigarro eletrônico pode ser uma forma menos maligna de lidar com a dependência de nicotina. Mas, é preciso criar com urgência uma legislação para lidar com ele.
Itália! Troco Pizzolato pelo Pato! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 08/02
Troco o Pizzolato pelo Pato! Porque o Pato tá mais pra pato desarranjado: uma cagada após a outra! Rarará!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Sensação térmica: DERRETI! E essa: "Agência bancária fecha as portas por causa do calor em Praia Grande". Não dá mais nem pra filar ar condicionado de banco!
E uma amiga quer saber quanto custa pra dormir no palco do show do Elton John em Fortaleza, a 19 graus". Ele exigiu 19 graus pra não derreter o make! Aliás, o Elton John tá a cara do Milton Neves! Rarará!
E o Pizzolato?! Como disse o Twitteiro: se ele tivesse fugido pro Líbano, seria Esfiholato!
E o mais engraçado no Pizzolato é que ele usou o passaporte do irmão morto, votou com nome do irmão morto e quem tem cara de morto é ele! Parece um defunto amanhecido! Rarará!
E avisa pra Itália que eu não quero o Pizzolato! Eu quero dois tênis da Prada. E o povo no Twitter: "E eu quero um perfume Light Blue do Dolce & Gabbana". E uma outra: "Eu quero o papa! Deixem o Pizzolato AÍ". Manda o papa. Manda o papa, mas não pra Papuda! Rarará!
E uma outra no Facebook teve uma grande ideia: "Proponho trocar o Pizzolato pelo Pato. Devolve o Pato pra Barbara Berlusconi". Rarará! Isso! Troco o Pizzolato pelo Pato! Porque o Pato que vai jogar no São Paulo tá mais pra pato desarranjado: uma cagada após a outra! Rarará!
E outros ainda mais politizados querem trocar o Pizzolato pelo Battisti. O Battisti não pode. Porque ele é de uma organização de ultraesquerda chamada Proletários Armados pelo Comunismo. PAC! O PAC tem que ficar! O PAC É NOSSO!
E o chargista Zop revela que se o Pizzolato vier pra Papuda, ele vai fazer uma "piccola vaca" também! Rarará. E nós já devolvemos pra Itália aquele mafioso, o Buscetta! Que é a coisa que italiano mais gosta! Rarará!
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Olha o cartaz num restaurante a quilo em São Paulo: "Devido a trabalheira pra fazer a panqueca, hoje não temos ovo frito". Mas eu quero. Eu quero ovo frito. Não consigo viver sem ovo frito! E essa placa num armazém em Campo Maior, Piauí: "Temos ovos e outras frutas!" Rarará!
E mais um predestinado. É que em Belém do Pará tem um proctologista chamado Alberto Gomes SALAME! Ah, doutor, salame não! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Troco o Pizzolato pelo Pato! Porque o Pato tá mais pra pato desarranjado: uma cagada após a outra! Rarará!
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Sensação térmica: DERRETI! E essa: "Agência bancária fecha as portas por causa do calor em Praia Grande". Não dá mais nem pra filar ar condicionado de banco!
E uma amiga quer saber quanto custa pra dormir no palco do show do Elton John em Fortaleza, a 19 graus". Ele exigiu 19 graus pra não derreter o make! Aliás, o Elton John tá a cara do Milton Neves! Rarará!
E o Pizzolato?! Como disse o Twitteiro: se ele tivesse fugido pro Líbano, seria Esfiholato!
E o mais engraçado no Pizzolato é que ele usou o passaporte do irmão morto, votou com nome do irmão morto e quem tem cara de morto é ele! Parece um defunto amanhecido! Rarará!
E avisa pra Itália que eu não quero o Pizzolato! Eu quero dois tênis da Prada. E o povo no Twitter: "E eu quero um perfume Light Blue do Dolce & Gabbana". E uma outra: "Eu quero o papa! Deixem o Pizzolato AÍ". Manda o papa. Manda o papa, mas não pra Papuda! Rarará!
E uma outra no Facebook teve uma grande ideia: "Proponho trocar o Pizzolato pelo Pato. Devolve o Pato pra Barbara Berlusconi". Rarará! Isso! Troco o Pizzolato pelo Pato! Porque o Pato que vai jogar no São Paulo tá mais pra pato desarranjado: uma cagada após a outra! Rarará!
E outros ainda mais politizados querem trocar o Pizzolato pelo Battisti. O Battisti não pode. Porque ele é de uma organização de ultraesquerda chamada Proletários Armados pelo Comunismo. PAC! O PAC tem que ficar! O PAC É NOSSO!
E o chargista Zop revela que se o Pizzolato vier pra Papuda, ele vai fazer uma "piccola vaca" também! Rarará. E nós já devolvemos pra Itália aquele mafioso, o Buscetta! Que é a coisa que italiano mais gosta! Rarará!
É mole? É mole, mas sobe!
O Brasil é Lúdico! Olha o cartaz num restaurante a quilo em São Paulo: "Devido a trabalheira pra fazer a panqueca, hoje não temos ovo frito". Mas eu quero. Eu quero ovo frito. Não consigo viver sem ovo frito! E essa placa num armazém em Campo Maior, Piauí: "Temos ovos e outras frutas!" Rarará!
E mais um predestinado. É que em Belém do Pará tem um proctologista chamado Alberto Gomes SALAME! Ah, doutor, salame não! Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
A volta de Mandrake - SÉRGIO AUGUSTO
O ESTADÃO - 08/02
Grandes e complexos personagens não faltam em nossa literatura, mas somos bem modestos em matéria de personagens que ressurgem e se perpetuam na obra de um autor. Criamos um Brás Cubas, uma Diadorim, um Paulo Honório, mas não criamos um Sherlock Holmes, um James Bond, um Poirot, um Maigret, um Jeeves, um Harry "Rabbit" Angstrom. Nesse quesito perdemos feio para os gringos.
Também entre nós as tentativas mais bem-sucedidas se deram na ficção policial: o Dr. Leite de Luiz Lopes Coelho, Mandrake (Rubem Fonseca), Espinosa (Garcia Roza), e, em clave humorística, Ed Mort, o inspetor Clouseau de Luis Fernando Verissimo. O segundo só não é o primeiro na ordem cronológica. Presente nas narrativas de Fonseca desde 1969, Mandrake, dublê de inspetor de polícia e detetive particular, sujeito cínico, sarcástico, mulherengo, dado a falar difícil até quando o assunto é banal, é o nosso mais afamado private eye.
Mandrake é apelido (do advogado criminalista Paulo Mendes), e uma indisfarçável, embora nunca explicitada, homenagem ao homônimo mágico dos quadrinhos, que, por seu turno, teve o nome inspirado na mandrágora, planta cujos atributos afrodisíacos, alucinógenos, analgésicos e entorpecentes a transformaram em sinônimo de feitiçaria. Tudo a ver com o bas fond em que o detetive carioca circula.
Nosso mágico sem cartola, cuja derradeira aparição na obra de Fonseca (Mandrake - A Bíblia e a Bengala, de 2005) acaba de ser relançada pela Nova Fronteira em versão eletrônica, já era um quarentão ao estrear num dos contos (O Caso de F.A.) de Lúcia McCartney. "A cidade não é aquilo que se vê do Pão de Açúcar", vai logo dizendo, dando a entender que o Rio de Janeiro por onde habitualmente circula não se presta a cartões-postais. Ele próprio nasceu e passou a infância numa zona central da cidade sem appeal turístico.
Esbocei-lhe um perfil biográfico, juntando dados pinçados das peripécias que protagonizou em Feliz Ano Novo (Dia dos Namorados), O Cobrador, A Grande Arte e Mandrake - A Bíblia e a Bengala. Ele merece o esforço.
Menino retraído e taciturno, Paulo perdeu a mãe muito cedo e foi criado pelo pai, pobre imigrante português do ramo de secos e molhados. Ingênuo, custou a duvidar da existência de Papai Noel e engoliu todas as histórias que lhe contaram sobre Zwig Midgal, associação de judeus dedicada ao tráfico de escravas brancas que, entre o final do século 19 e o início da Segunda Guerra Mundial, importou judias jovens e pobres da Europa para entregá-las à prostituição, as tais "polacas" que seu avô traçaria nos puteiros da Lapa e em breve serão personagens de uma minissérie da Globo, dirigida pelo cineasta argentino Daniel Burman.
A infância foi dura e a juventude não menos sofrida. Lavou chão e espanou balcões, vendeu meias, mourejou de sete às sete, emendando, sem jantar, com o curso noturno. Moleque, divertia-se cuspindo na cabeça dos enfarpelados passantes que a caminho do Teatro Municipal desfilavam debaixo do sobrado na rua Evaristo Veiga, quase esquina da 13 de Maio, onde morou na adolescência. Mais inteligente que estudioso, formou-se em segundo lugar no curso de Direito e revelou-se um advogado dedicado, íntegro e idealista; até que, cansado das petições, defesas e burocracias da lei, concentrou quase toda sua energia no que mais gosta na vida: sexo. Para desespero de seu sócio, Leon Wexler, com quem divide um escritório, de cuja janela, dali sim, avista-se uma paisagem de postal: o mar da baía, o parque do Flamengo e o Morro da Urca.
Wexler (ou Weksler, como é grafado na última aparição de Mandrake) é um profissional sério, experiente, misto de mentor e pai adotivo de Paulo Mendes. Cuida exclusivamente das causas cíveis, que não rendem quiproquós policiais, e só se mete nos casos de extorsão, chantagem e latrocínio assumidos por seu protegido se este correr algum perigo de que o safo delegado Raul não possa dar conta. Há muito acostumou-se ao humor ácido e ao pernosticismo intelectual do amigo, mas sua ginecomania ainda o desconcerta. "Gostar de mulheres dessa maneira é ainda mais neurótico do que odiá-las", jogou-lhe na cara o paternal parceiro.
Mandrake alega que as mulheres sempre o provocam e aos assédios não consegue opor resistência. A cicatriz que exibe na testa desde a adolescência foi causada, involuntariamente, por uma mulher. Ela, boasuda, passava na rua, na direção oposta, ele se virou para admirar-lhe o traseiro e enfiou a cara num poste. As demais - Marina e suas nádegas apetitosas, Gilda, Lili, a impulsiva Bertha Bronstein, sua sparring no xadrez, a nabokoviana Ada, Helô, a doida que tirou de um sanatório em Botafogo, etc., etc., etc. - só lhe deixaram marcas no coração e na memória. Se tanto.
Comer por via oral também gratifica seu penchant epicurista. Frugal no café da manhã (laranjada e queijo cavalo), não teme abusar das calorias no almoço, preferencialmente em restaurantes portugueses do centro do Rio e sempre regado a vinho luso (Periquita, Acácio, Terras Altas), que até em jejum é capaz de beber. Já teve uma cozinheira que no almoço lhe preparava franguinho com farofa, rosbife com champignon e salada de aspargos frescos, complementados por um Grão Vasco, "esvaziado" com queijo Serra da Estrela e torradas. Fechando o repasto, o indefectível charuto, se possível cubano: os Havanas Médio e Supremo, Partagas D-4.
Como o gosto por vinhos, charutos, mulheres, restaurantes portugueses e tantas outras coisas, sua felinofilia se confunde com a do próprio escritor, que também teve uma gata siamesa chamada Elizabeth, vesga de olhos azuis, a quem amou mais do que a qualquer mulher, como prova o breve e comovente relato (Betsy) que abre a coletânea Histórias de Amor.
Detesta dormir ("uma fraqueza") e qualquer distração - ler, ver televisão ou filme, ouvir música - lhe tira o sono. Sofre de insônia desde garoto. Chegou a passar dois meses inteiros fingindo que dormia. "Esse menino precisa dormir", alertou o pediatra, "dormir para sonhar." Só que ele sonhava acordado, imaginando o que seria na vida, indeciso entre o legionário Beau Sabreur, o galante aristocrata Pimpinela Escarlate e Pardaillan, o cavaleiro errante de Michel Zévaco cujas aventuras, aliás, também encantaram o pubescente Jean-Paul Sartre. Como é do conhecimento público, Paulo Mendes acabou se transformando, mesmo, foi no Philip Marlowe carioca.
Grandes e complexos personagens não faltam em nossa literatura, mas somos bem modestos em matéria de personagens que ressurgem e se perpetuam na obra de um autor. Criamos um Brás Cubas, uma Diadorim, um Paulo Honório, mas não criamos um Sherlock Holmes, um James Bond, um Poirot, um Maigret, um Jeeves, um Harry "Rabbit" Angstrom. Nesse quesito perdemos feio para os gringos.
Também entre nós as tentativas mais bem-sucedidas se deram na ficção policial: o Dr. Leite de Luiz Lopes Coelho, Mandrake (Rubem Fonseca), Espinosa (Garcia Roza), e, em clave humorística, Ed Mort, o inspetor Clouseau de Luis Fernando Verissimo. O segundo só não é o primeiro na ordem cronológica. Presente nas narrativas de Fonseca desde 1969, Mandrake, dublê de inspetor de polícia e detetive particular, sujeito cínico, sarcástico, mulherengo, dado a falar difícil até quando o assunto é banal, é o nosso mais afamado private eye.
Mandrake é apelido (do advogado criminalista Paulo Mendes), e uma indisfarçável, embora nunca explicitada, homenagem ao homônimo mágico dos quadrinhos, que, por seu turno, teve o nome inspirado na mandrágora, planta cujos atributos afrodisíacos, alucinógenos, analgésicos e entorpecentes a transformaram em sinônimo de feitiçaria. Tudo a ver com o bas fond em que o detetive carioca circula.
Nosso mágico sem cartola, cuja derradeira aparição na obra de Fonseca (Mandrake - A Bíblia e a Bengala, de 2005) acaba de ser relançada pela Nova Fronteira em versão eletrônica, já era um quarentão ao estrear num dos contos (O Caso de F.A.) de Lúcia McCartney. "A cidade não é aquilo que se vê do Pão de Açúcar", vai logo dizendo, dando a entender que o Rio de Janeiro por onde habitualmente circula não se presta a cartões-postais. Ele próprio nasceu e passou a infância numa zona central da cidade sem appeal turístico.
Esbocei-lhe um perfil biográfico, juntando dados pinçados das peripécias que protagonizou em Feliz Ano Novo (Dia dos Namorados), O Cobrador, A Grande Arte e Mandrake - A Bíblia e a Bengala. Ele merece o esforço.
Menino retraído e taciturno, Paulo perdeu a mãe muito cedo e foi criado pelo pai, pobre imigrante português do ramo de secos e molhados. Ingênuo, custou a duvidar da existência de Papai Noel e engoliu todas as histórias que lhe contaram sobre Zwig Midgal, associação de judeus dedicada ao tráfico de escravas brancas que, entre o final do século 19 e o início da Segunda Guerra Mundial, importou judias jovens e pobres da Europa para entregá-las à prostituição, as tais "polacas" que seu avô traçaria nos puteiros da Lapa e em breve serão personagens de uma minissérie da Globo, dirigida pelo cineasta argentino Daniel Burman.
A infância foi dura e a juventude não menos sofrida. Lavou chão e espanou balcões, vendeu meias, mourejou de sete às sete, emendando, sem jantar, com o curso noturno. Moleque, divertia-se cuspindo na cabeça dos enfarpelados passantes que a caminho do Teatro Municipal desfilavam debaixo do sobrado na rua Evaristo Veiga, quase esquina da 13 de Maio, onde morou na adolescência. Mais inteligente que estudioso, formou-se em segundo lugar no curso de Direito e revelou-se um advogado dedicado, íntegro e idealista; até que, cansado das petições, defesas e burocracias da lei, concentrou quase toda sua energia no que mais gosta na vida: sexo. Para desespero de seu sócio, Leon Wexler, com quem divide um escritório, de cuja janela, dali sim, avista-se uma paisagem de postal: o mar da baía, o parque do Flamengo e o Morro da Urca.
Wexler (ou Weksler, como é grafado na última aparição de Mandrake) é um profissional sério, experiente, misto de mentor e pai adotivo de Paulo Mendes. Cuida exclusivamente das causas cíveis, que não rendem quiproquós policiais, e só se mete nos casos de extorsão, chantagem e latrocínio assumidos por seu protegido se este correr algum perigo de que o safo delegado Raul não possa dar conta. Há muito acostumou-se ao humor ácido e ao pernosticismo intelectual do amigo, mas sua ginecomania ainda o desconcerta. "Gostar de mulheres dessa maneira é ainda mais neurótico do que odiá-las", jogou-lhe na cara o paternal parceiro.
Mandrake alega que as mulheres sempre o provocam e aos assédios não consegue opor resistência. A cicatriz que exibe na testa desde a adolescência foi causada, involuntariamente, por uma mulher. Ela, boasuda, passava na rua, na direção oposta, ele se virou para admirar-lhe o traseiro e enfiou a cara num poste. As demais - Marina e suas nádegas apetitosas, Gilda, Lili, a impulsiva Bertha Bronstein, sua sparring no xadrez, a nabokoviana Ada, Helô, a doida que tirou de um sanatório em Botafogo, etc., etc., etc. - só lhe deixaram marcas no coração e na memória. Se tanto.
Comer por via oral também gratifica seu penchant epicurista. Frugal no café da manhã (laranjada e queijo cavalo), não teme abusar das calorias no almoço, preferencialmente em restaurantes portugueses do centro do Rio e sempre regado a vinho luso (Periquita, Acácio, Terras Altas), que até em jejum é capaz de beber. Já teve uma cozinheira que no almoço lhe preparava franguinho com farofa, rosbife com champignon e salada de aspargos frescos, complementados por um Grão Vasco, "esvaziado" com queijo Serra da Estrela e torradas. Fechando o repasto, o indefectível charuto, se possível cubano: os Havanas Médio e Supremo, Partagas D-4.
Como o gosto por vinhos, charutos, mulheres, restaurantes portugueses e tantas outras coisas, sua felinofilia se confunde com a do próprio escritor, que também teve uma gata siamesa chamada Elizabeth, vesga de olhos azuis, a quem amou mais do que a qualquer mulher, como prova o breve e comovente relato (Betsy) que abre a coletânea Histórias de Amor.
Detesta dormir ("uma fraqueza") e qualquer distração - ler, ver televisão ou filme, ouvir música - lhe tira o sono. Sofre de insônia desde garoto. Chegou a passar dois meses inteiros fingindo que dormia. "Esse menino precisa dormir", alertou o pediatra, "dormir para sonhar." Só que ele sonhava acordado, imaginando o que seria na vida, indeciso entre o legionário Beau Sabreur, o galante aristocrata Pimpinela Escarlate e Pardaillan, o cavaleiro errante de Michel Zévaco cujas aventuras, aliás, também encantaram o pubescente Jean-Paul Sartre. Como é do conhecimento público, Paulo Mendes acabou se transformando, mesmo, foi no Philip Marlowe carioca.
Veio mais fraca - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 08/02
A inflação de janeiro trouxe seu lado boa surpresa, mas mostrou, também, que é cedo para comemorar.
A alta de preços em relação a dezembro foi de 0,55%, substancialmente inferior ao 0,92% apurado em dezembro (veja o gráfico). Também boa notícia foi o ritmo forte da desaceleração. A evolução do IPCA-15, que é o mesmo índice de inflação em 30 dias, com a diferença de que mede o período compreendido entre o dia 15 de um mês ao dia 15 do mês seguinte, já havia acusado menos intensidade (evolução de 0,74%).
Um dos conjuntos de preços que mostraram desaceleração mais forte foi o dos serviços. Eles haviam subido 1,16% em dezembro e ficaram com uma alta bem mais moderada em janeiro, de 0,47%. O item que mais pesou nesse segmento foi o das tarifas das passagens aéreas. Em dezembro haviam saltado nada menos que 20,13%; em janeiro, recuaram 15,88%. Como o setor de serviços foi o que há alguns meses vinha entre os que mais estavam expostos à alta de preços, essa desaceleração pode indicar nova tendência.
A nota negativa é a forte difusão da inflação. O IBGE não aponta um índice oficial de difusão, mas ele pode ser medido pelas estatísticas gerais. Índice de difusão é o número de componentes da cesta de consumo em ascensão. Mostra se a alta de preços está espalhada ou se está concentrada em alguns poucos produtos. E, desta vez, o índice de difusão ficou muito em cima, de 72,1% (em dezembro, havia sido de 69,3%).
É precipitação concluir que a inflação finalmente está sob rédea curta e em convergência para a meta de 4,5%, porque algumas variáveis não estão sob controle. Entre elas, a mais premente é o alcance da estiagem que está sendo sentida principalmente no Sudeste e no Centro-Oeste. Em algumas semanas pode prejudicar a oferta de alimentos de peso na cesta de consumo, como já ocorre com carnes e hortaliças. Este parece um caso de fator sazonal às avessas porque, nessa época do ano, o maior causador de alta dos hortigranjeiros não é propriamente a seca, mas, ao contrário, as chuvas, que dificultam o escoamento da produção para os grandes centros urbanos.
Outra variável de difícil controle é o comportamento dos preços administrados, aqueles que são determinados por decisão das autoridades. Chegou, por exemplo, o momento dos reajustes dos transportes urbanos, item que, desde o ano passado, se revelou altamente sensível à população. Esses reajustes estão muito atrasados e a tendência do governo agora é puxá-los para perto dos 10%, como já se confirmou no Rio de Janeiro.
Mesmo que ainda não se possa contar com a convergência da inflação para a meta, ficou agora mais provável que o Banco Central reduzirá a dose da alta dos juros básicos (Selic) de 0,50 ponto porcentual para 0,25 ponto porcentual ao ano.
É que a essa desaceleração da inflação pode-se acrescentar outro fator baixista, que é a mais fraca atividade econômica neste início do ano, como mostram os números decepcionantes da produção industrial. Convém ficar de olho nos recados do Banco Central que, em caso de mudança de ritmo, prefere antecipar de alguma maneira seus passos seguintes.
A inflação de janeiro trouxe seu lado boa surpresa, mas mostrou, também, que é cedo para comemorar.
A alta de preços em relação a dezembro foi de 0,55%, substancialmente inferior ao 0,92% apurado em dezembro (veja o gráfico). Também boa notícia foi o ritmo forte da desaceleração. A evolução do IPCA-15, que é o mesmo índice de inflação em 30 dias, com a diferença de que mede o período compreendido entre o dia 15 de um mês ao dia 15 do mês seguinte, já havia acusado menos intensidade (evolução de 0,74%).
Um dos conjuntos de preços que mostraram desaceleração mais forte foi o dos serviços. Eles haviam subido 1,16% em dezembro e ficaram com uma alta bem mais moderada em janeiro, de 0,47%. O item que mais pesou nesse segmento foi o das tarifas das passagens aéreas. Em dezembro haviam saltado nada menos que 20,13%; em janeiro, recuaram 15,88%. Como o setor de serviços foi o que há alguns meses vinha entre os que mais estavam expostos à alta de preços, essa desaceleração pode indicar nova tendência.
A nota negativa é a forte difusão da inflação. O IBGE não aponta um índice oficial de difusão, mas ele pode ser medido pelas estatísticas gerais. Índice de difusão é o número de componentes da cesta de consumo em ascensão. Mostra se a alta de preços está espalhada ou se está concentrada em alguns poucos produtos. E, desta vez, o índice de difusão ficou muito em cima, de 72,1% (em dezembro, havia sido de 69,3%).
É precipitação concluir que a inflação finalmente está sob rédea curta e em convergência para a meta de 4,5%, porque algumas variáveis não estão sob controle. Entre elas, a mais premente é o alcance da estiagem que está sendo sentida principalmente no Sudeste e no Centro-Oeste. Em algumas semanas pode prejudicar a oferta de alimentos de peso na cesta de consumo, como já ocorre com carnes e hortaliças. Este parece um caso de fator sazonal às avessas porque, nessa época do ano, o maior causador de alta dos hortigranjeiros não é propriamente a seca, mas, ao contrário, as chuvas, que dificultam o escoamento da produção para os grandes centros urbanos.
Outra variável de difícil controle é o comportamento dos preços administrados, aqueles que são determinados por decisão das autoridades. Chegou, por exemplo, o momento dos reajustes dos transportes urbanos, item que, desde o ano passado, se revelou altamente sensível à população. Esses reajustes estão muito atrasados e a tendência do governo agora é puxá-los para perto dos 10%, como já se confirmou no Rio de Janeiro.
Mesmo que ainda não se possa contar com a convergência da inflação para a meta, ficou agora mais provável que o Banco Central reduzirá a dose da alta dos juros básicos (Selic) de 0,50 ponto porcentual para 0,25 ponto porcentual ao ano.
É que a essa desaceleração da inflação pode-se acrescentar outro fator baixista, que é a mais fraca atividade econômica neste início do ano, como mostram os números decepcionantes da produção industrial. Convém ficar de olho nos recados do Banco Central que, em caso de mudança de ritmo, prefere antecipar de alguma maneira seus passos seguintes.
Com açúcar e com afeto - ILIMAR FRANCO
O GLOBO - 08/02
O vice Michel Temer e o presidente do Senado, Renan Calheiros , levaram uma raquetada da presidente Dilma no debate sobre a participação do PMDB na reforma ministerial. Terça-feira à noite, no calor das negociações, Dilma cita o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, indicado pelo partido, e afirma: "Essa posição é mais importante que qualquer ministério".
A sacada do Mercadante
Informado da alta temperatura no PMDB, o novo coordenador político do governo, o ministro Aloizio Mercadante, pediu ao presidente do PMDB, senador Valdir Raupp, que fosse à reunião da bancada na Câmara, quarta-feira. Antes de cumprir a tarefa, Raupp ouviu integrantes da cúpula. E estes lhes disseram: "Você está louco. Se for, ou vai virar comida de 70 leões, ou vai ter que assinar a nota". No dia seguinte, Mercadante foi ao Jaburu colocar panos quentes e quis saber se a presidente Dilma fora alertada que a ideia de convidar Eunício Oliveira para a Integração não daria certo. Ouviu: "Mais de 30 vezes. Por isso, a reunião no Planalto durou seis horas."
"Vou fazer a campanha 'chega de poste'! O poste do governador Cid Gomes, o prefeito Roberto Cláudio (Fortaleza), está muito mal avaliado"
Eunício Oliveira Líder do PMDB no Senado e candidato a governador do Ceará
No cyber espaço
O PT começa por São Paulo, dia 14, as oficinas sobre ação na internet. O coordenador das redes sociais, o vice do partido Alberto Cantalice, vai se reunir com 100 ativistas petistas. Na agenda, a criação de uma rede para divulgação de ações e notícias do PT. O alvo: a juventude, os 50 mil dirigentes do partido e o 1,8 milhão de filiados.
Dilema socialista na telinha
Marina Silva insiste em candidaturas do PSB ao governo em São Paulo, Minas Gerais e Rio. Socialistas relutam. A prioridade é se engajar em palanques vitoriosos e eleger forte bancada à Câmara. Deputado é sinônimo de tempo na TV.
Um problema a menos
Com o circo pegando fogo, Michel Temer e o ministro Fernando Pimentel resolveram a aliança PT-PMDB em Minas Gerais: o vice de Pimentel deverá ser o ministro Antônio Andrade (Agricultura) e Josué Gomes vai ao Senado.
É sempre assim
Durante os oito anos do governo Fernando Henrique, o esporte predileto do PSDB era detonar o PMDB, o acusando de fisiológico. Durante 13 anos, nos governos de Lula e de Dilma, o PT pegou o bastão dos tucanos e segue praticando a mesma modalidade. Até parece que há partidos que não querem cargos nos governos.
O arremate
O presidente do PSDB de Minas Gerais, deputado Marcus Pestana, decidiu se retirar da disputa ao governo. Na segunda-feira, ele anuncia apoio à candidatura do ex-ministro Pimenta da Veiga, que será formalmente lançada no próximo dia 20.
Compras para relaxar
Para espairecer da crise no Rio Grande do Norte, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) foi às compras. Numa loja de grife em Brasília, experimentou maiôs e saídas de banho. O ajudante de ordens saiu carregando duas sacolas.
A PRESIDENTE DILMA não gostou das manifestações machistas de petistas contra a médica cubana Ramona Rodríguez, que deixou o Mais Médicos.
O vice Michel Temer e o presidente do Senado, Renan Calheiros , levaram uma raquetada da presidente Dilma no debate sobre a participação do PMDB na reforma ministerial. Terça-feira à noite, no calor das negociações, Dilma cita o presidente da Transpetro, Sérgio Machado, indicado pelo partido, e afirma: "Essa posição é mais importante que qualquer ministério".
A sacada do Mercadante
Informado da alta temperatura no PMDB, o novo coordenador político do governo, o ministro Aloizio Mercadante, pediu ao presidente do PMDB, senador Valdir Raupp, que fosse à reunião da bancada na Câmara, quarta-feira. Antes de cumprir a tarefa, Raupp ouviu integrantes da cúpula. E estes lhes disseram: "Você está louco. Se for, ou vai virar comida de 70 leões, ou vai ter que assinar a nota". No dia seguinte, Mercadante foi ao Jaburu colocar panos quentes e quis saber se a presidente Dilma fora alertada que a ideia de convidar Eunício Oliveira para a Integração não daria certo. Ouviu: "Mais de 30 vezes. Por isso, a reunião no Planalto durou seis horas."
"Vou fazer a campanha 'chega de poste'! O poste do governador Cid Gomes, o prefeito Roberto Cláudio (Fortaleza), está muito mal avaliado"
Eunício Oliveira Líder do PMDB no Senado e candidato a governador do Ceará
No cyber espaço
O PT começa por São Paulo, dia 14, as oficinas sobre ação na internet. O coordenador das redes sociais, o vice do partido Alberto Cantalice, vai se reunir com 100 ativistas petistas. Na agenda, a criação de uma rede para divulgação de ações e notícias do PT. O alvo: a juventude, os 50 mil dirigentes do partido e o 1,8 milhão de filiados.
Dilema socialista na telinha
Marina Silva insiste em candidaturas do PSB ao governo em São Paulo, Minas Gerais e Rio. Socialistas relutam. A prioridade é se engajar em palanques vitoriosos e eleger forte bancada à Câmara. Deputado é sinônimo de tempo na TV.
Um problema a menos
Com o circo pegando fogo, Michel Temer e o ministro Fernando Pimentel resolveram a aliança PT-PMDB em Minas Gerais: o vice de Pimentel deverá ser o ministro Antônio Andrade (Agricultura) e Josué Gomes vai ao Senado.
É sempre assim
Durante os oito anos do governo Fernando Henrique, o esporte predileto do PSDB era detonar o PMDB, o acusando de fisiológico. Durante 13 anos, nos governos de Lula e de Dilma, o PT pegou o bastão dos tucanos e segue praticando a mesma modalidade. Até parece que há partidos que não querem cargos nos governos.
O arremate
O presidente do PSDB de Minas Gerais, deputado Marcus Pestana, decidiu se retirar da disputa ao governo. Na segunda-feira, ele anuncia apoio à candidatura do ex-ministro Pimenta da Veiga, que será formalmente lançada no próximo dia 20.
Compras para relaxar
Para espairecer da crise no Rio Grande do Norte, a governadora Rosalba Ciarlini (DEM) foi às compras. Numa loja de grife em Brasília, experimentou maiôs e saídas de banho. O ajudante de ordens saiu carregando duas sacolas.
A PRESIDENTE DILMA não gostou das manifestações machistas de petistas contra a médica cubana Ramona Rodríguez, que deixou o Mais Médicos.
Nova temporada - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 08/02
Ministros do Supremo Tribunal Federal acham que o mensalão mineiro não vai despertar o mesmo interesse nem a mesma pressão externa que o escândalo nacional. Segundo um integrante da corte, como o STF só decidirá sobre Eduardo Azeredo (PSDB) e Clésio Andrade (PMDB), já que os demais réus serão julgados por outras instâncias, o processo está "desidratado". "Não tem a magia do enredo do Ali Babá e os 40 ladrões", compara esse observador dos humores do tribunal.
Nunca antes Chamou atenção no STF que Janot tenha fixado em 22 anos de prisão a pena recomendada para Azeredo. Nos bastidores da corte, ministros afirmam que é a primeira vez que um procurador-geral da República opina na dosimetria.
Força O vice-presidente da Câmara, André Vargas (PT-PR), diz que a pena pedida para Azeredo "parece pesada demais". "Não li os autos. Não sou daqueles que torcem que ocorra com o PSDB o mesmo que ocorreu com o PT", diz o deputado.
Porta fechada O PT procurou prefeitos das cidades paulistas pelas quais vai passar a caravana de Alexandre Padilha, mas enfrenta resistência dos gestores filiados a partidos rivais ao PT. "Estamos preocupados em governar", diz um prefeito paulista, não disposto a posar para fotos com o ex-ministro.
Toma lá Padilha discursava ontem no Tênis Clube de São Joaquim da Barra, na abertura da turnê petista, quando o microfone parou de funcionar. Em fase belicosa com os tucanos, ele lançou: "Esse microfone está como o PSDB: sem bateria".
Dá cá Por sua vez, o presidenciável do PSDB, Aécio Neves, também usou evento no interior paulista para fustigar o PT. Ao chegar ao ato realizado numa cervejaria em Araçatuba brincou, fazendo alusão aos recentes apagões: "Vocês viram? Na dúvida mandei colocar gerador ".
Questão de fé O Itamaraty renovou por três anos os passaportes diplomáticos de Valdemiro Santiago, líder da Igreja Mundial do Poder de Deus, e de sua mulher, Franciléia de Castro Gomes de Oliveira. O casal já havia recebido o documento em 2013, com validade de um ano.
Barreira 1 O secretário de Energia paulista, José Aníbal (PSDB), enviou representação à Procuradoria-Geral da República para pedir providências que evitem a saída de Everton Rheinheimer do país.
Barreira 2 O tucano diz ter informações de que o delator do cartel de trens em São Paulo pretende deixar o Brasil e teme que, assim, ele não responda às acusações de calúnia por tê-lo citado como beneficiário do esquema.
Convocação Geraldo Alckmin estuda o nome do líder do PSDB na Câmara paulistana, Floriano Pesaro, para integrar seu governo a partir da reforma do secretariado prevista para o fim deste mês.
Rearranjo O vereador é cotado para duas pastas: Desenvolvimento Social ou Habitação. A primeira secretaria atualmente é ocupada pelo PRB, que pode ser deslocado para outro posto.
Como está O governo paulista também decidiu que não vai desalojar o PSB e o PV das secretarias que ocupam, por enquanto. As duas siglas não fecharam apoio a Alckmin, mas o tucano quer manter as negociações.
Antecipado Paulo Frateschi toma posse como secretário de Relações Governamentais da prefeitura de Fernando Haddad (PT) na segunda-feira. No dia seguinte, deve ser votada a indicação do atual ocupante da pasta, João Antonio, para o Tribunal de Contas do Município.
com ANDRÉIA SADI e BRUNO BOGHOSSIAN
tiroteio
Gleisi é a ministra que ajudou o país a parar. Não tem credenciais para atacar o governador mais bem avaliado do país.
DO DEPUTADO BETO ALBUQUERQUE (PSB-RS), respondendo à ex-ministra, que acusou o presidenciável do partido, Eduardo Campos, de "ingratidão".
Contraponto
Daqui ninguém me tira
Ao receber o pré-candidato do PT ao governo de São Paulo, Alexandre Padilha, ontem, a prefeita de Ribeirão Preto, Dárcy Vera (PSD), contou um episódio de quando pegou carona numa marcha de prefeitos de capitais para tentar falar com o então presidente Lula.
Ela queria pedir ajuda para manter a Agrishow, feira agrícola que ameaçava se mudar para São Carlos. Os organizadores objetaram por ela não ser prefeita de capital.
-Sou prefeita da capital brasileira do agronegócio e só saio daqui depois que falar com o Lula!
Deu certo: ela foi recebida e a feira ficou em Ribeirão.
Questão de honra - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 08/02
A ideia do ministro é promover esses encontros o mais rápido possível, dependendo apenas da agenda dos governadores. Logo, irá encontrar Eduardo Campos, o governador de Pernambuco, um dos adversários de Dilma Rousseff nas eleições deste ano.
A aposta de Magela
Empenhados e confiantes na reeleição de Dilma Rousseff, alguns petistas já vislumbram o tratamento de “ministro” num futuro governo da presidente. Um deles é o secretário Geral do PT, Geraldo Magela, apontado dentro do Movimento PT, como o primeiro da fila para ocupar um cargo de alto escalão.
Ou vai ou racha
Se o PSB insistir em ficar longe da campanha pela reeleição de Geraldo Alckmin em São Paulo corre o risco de ver o PPS fraturado na corrida presidencial. É que a maioria do diretório paulista do PPS deseja a aliança com o PSDB de forma a garantir alguma vaga na eleição de deputados federais e estaduais.
Apoio impositivo
Os políticos viram com uma certa desconfiança a definição de 8 de maio para as liberações de recursos dentro do Orçamento Impositivo. Quem fez as contas, garante que dificilmente os recursos pingarão nos municípios antes da eleição. Ou seja: os políticos ficarão presos à campanha de Dilma para garantir a liberação das verbas no período pós-eleitoral.
Depois da tempestade
O senador Vital do Rêgo Filho (PMDB-PB) só ocupará um ministério se houver espaço extra para o PMDB. Mantido o atual número de pastas, a correlação Câmara-Senado no governo não mudará. Essa é a premissa de uma tentativa de acordo em fase de desenho para a semana que vem.
Saldo da estreia
O ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, nem bem assumiu o acompanhamento das ações de governo e já trombou com o ministro da Fazenda, Guido Mantega (foto). O motivo foi a troca de diretores do Banco do Nordeste (BNB). Juntando com o imbroglio no PMDB, as crises parecem ter vencido a primeira semana.
Nova prova
Há quem diga que Mercadante só conseguirá se redimir e calar seus críticos se conseguir salvar a relação entre a presidente Dilma e o PMDB. Do jeito que a semana termina, parece ser bem mais fácil passar nos exames do Enem, do Enad, do vestibular e por aí vai.
Dúvidas dissipadas
Depois da prisão de Henrique Pizzolato por uso de documentos falsos na Itália, ninguém da cúpula petista se levantou para defender o ex-diretor do Banco do Brasil.
Enquanto isso, no PSDB...
Os tucanos se manterão unidos na defesa do ex-senador Eduardo Azeredo e na inocência dele quanto à Ação Penal 536, que tratou de irregularidades na campanha do ex-senador ao governo de Minas Gerais, em 1998. Mas, nos bastidores, há quem diga ser interessante frisar que não tem relação com a alta cúpula partidária.
Em 2014, muito risco e pouca escolha para Dilma - ROLF KUNTZ
O Estado de S.Paulo - 08/02
Inflação oficial em queda foi a novidade boa, mas nem tanto, da primeira semana de fevereiro, marcada por mais um apagão, pelo miserável balanço da produção industrial em 2013 e pela notícia de um déficit comercial recorde em janeiro. A boa nova foi divulgada na sexta-feira. Ficou em 0,55%, no mês passado, a alta do IPCA, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo, referência para a política de metas de inflação. Em dezembro o aumento havia chegado a 0,92% e a alta acumulada no ano, a 5,91%. Para janeiro as consultorias e instituições do mercado financeiro haviam projetado uma variação de 0,76%. O resultado efetivo foi bem melhor e o resultado de 12 meses caiu para 5,59%, ainda muito longe da meta, 4,5%, mas bem menos feio que o alcançado em dezembro.
Mas o governo deveria ser moderado na comemoração. Ainda há um longo caminho até se alcançar uma taxa mensal compatível com a meta de inflação anual. Nem para 2015 os técnicos do Banco Central (BC) projetam esse resultado. Além disso, o contágio inflacionário foi maior em janeiro que no mês anterior. O índice de difusão passou de 69,3% em dezembro para 72,1% no mês passado, segundo cálculo da Votorantim Corretora, divulgado logo depois de conhecidos os dados gerais do IPCA. Em resumo, quase três quartos dos itens cobertos pela pesquisa ficaram mais caros. Obviamente, os aumentos e repasses ocorrem com muita facilidade e isso torna mais complicado o combate à inflação.
A presidente Dilma Rousseff inicia seu quarto ano de governo com uma assustadora coleção de desafios - indústria emperrada, baixo nível de investimento público e privado, contas externas em deterioração, contas públicas novamente em perigo e intensa vigilância das agências de classificação de risco. A agenda é extensa e complicada e, para evitar um desastre maior, o governo terá de levar em conta, em todas as suas decisões, a persistente alta de preços.
Precisará resolver, em primeiro lugar, se o Executivo participará do combate à inflação ou se apenas continuará tentando maquiar os indicadores e deixando o trabalho sério para o BC. Não pode haver dúvida, neste momento, quanto a um novo aumento de juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), prevista para os dias 25 e 26. Mas a presidente e sua equipe cometerão dois erros se escolherem o caminho mais cômodo e mais compatível, à primeira vista, com as conveniências eleitorais.
Para continuar maquiando os indicadores de inflação o governo terá de aumentar o subsídio ao consumo de eletricidade e a ajuda às empresas do setor. O custo fiscal dessa política poderá subir de R$ 9,7 bilhões em 2013 para algo entre R$ 16 bilhões e R$ 18 bilhões neste ano. As contas públicas serão prejudicadas, o espaço de manobra orçamentária será menor, as pressões inflacionárias persistirão e os consumidores de energia elétrica receberão um sinal errado.
Nenhum investidor ou financiador estrangeiro será enganado pela repetição de manobras desse tipo. A confiança na política econômica, já reduzida, continuará diminuindo. Se a piora da imagem externa comprometer o ingresso de capitais, uma das saídas será ajustar a política de juros para atenuar também esse problema.
No ano passado o investimento estrangeiro direto, US$ 64,04 bilhões, foi insuficiente para cobrir o déficit externo em transações correntes, US$ 81,37 bilhões. Para este ano o BC projeta um déficit de US$ 78 bilhões e investimento direto de US$ 63 bilhões. O superávit comercial, US$ 2,56 bilhões nos cálculos oficiais de 2013, deve subir para US$ 10 bilhões, segundo a mesma projeção.
Um superávit comercial de US$ 10 bilhões já ficará muito abaixo das necessidades brasileiras, por causa do enorme déficit nas contas de serviços e de rendas, mas até esse resultado medíocre parece duvidoso, neste momento. O déficit comercial de janeiro, US$ 4,06 bilhões, foi recorde, mas muito parecido com o de um ano antes, US$ 4,04 bilhões. Os saldos mensais poderão ser menos ruins no resto do ano, mas nada permite prever resultado final muito melhor que o de 2013. O pequeno superávit oficial do ano passado foi garantido pelo agronegócio (saldo de US$ 82,91 bilhões) e pelas exportações fictícias de plataformas de petróleo, no valor de US$ 7,74 bilhões. Nada justifica, neste momento, uma aposta num desempenho muito melhor da indústria no comércio exterior.
Com crescimento de 0,4% em 2011, redução de 2,5% em 2012 e nova expansão, de 1,2%, em 2013, a produção industrial do ano passado foi pouco inferior à de 2010, o último ano da gestão do presidente Luiz Inácio da Silva, quando o setor já estava enfraquecido.
A indústria, principalmente a de transformação, continuou perdendo vigor nos primeiros três anos da presidente Dilma Rousseff e a ceder espaço a concorrentes estrangeiros, tanto no exterior quanto no mercado interno. O crescimento de 13,3% da produção de bens de capital, no ano passado, festejado pelo governo como sinal de recuperação do investimento, foi insuficiente para neutralizar a queda do ano anterior e levar o resultado de volta ao nível de 2011.
No ano passado, a depreciação do real, embora tenha barateado os produtos brasileiros em dólares, foi insuficiente para impulsionar as exportações de manufaturados. Nesta altura, qual seria a taxa de câmbio necessária para compensar as ineficiências brasileiras e tornar a indústria mais competitiva? É inútil discutir esse ponto, até porque o BC tentará, em 2014 como em 2013, atenuar os efeitos inflacionários da depreciação cambial.
Uma política séria estaria voltada há muito tempo para o aumento da produtividade. No discurso, essa é uma prioridade oficial. Os fatos têm mostrado o contrário. A atenção à infraestrutura é recente e a colheita de resultados vai demorar. E isso é apenas, é bom lembrar, uma parte do enorme problema da competitividade.
Inflação oficial em queda foi a novidade boa, mas nem tanto, da primeira semana de fevereiro, marcada por mais um apagão, pelo miserável balanço da produção industrial em 2013 e pela notícia de um déficit comercial recorde em janeiro. A boa nova foi divulgada na sexta-feira. Ficou em 0,55%, no mês passado, a alta do IPCA, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo, referência para a política de metas de inflação. Em dezembro o aumento havia chegado a 0,92% e a alta acumulada no ano, a 5,91%. Para janeiro as consultorias e instituições do mercado financeiro haviam projetado uma variação de 0,76%. O resultado efetivo foi bem melhor e o resultado de 12 meses caiu para 5,59%, ainda muito longe da meta, 4,5%, mas bem menos feio que o alcançado em dezembro.
Mas o governo deveria ser moderado na comemoração. Ainda há um longo caminho até se alcançar uma taxa mensal compatível com a meta de inflação anual. Nem para 2015 os técnicos do Banco Central (BC) projetam esse resultado. Além disso, o contágio inflacionário foi maior em janeiro que no mês anterior. O índice de difusão passou de 69,3% em dezembro para 72,1% no mês passado, segundo cálculo da Votorantim Corretora, divulgado logo depois de conhecidos os dados gerais do IPCA. Em resumo, quase três quartos dos itens cobertos pela pesquisa ficaram mais caros. Obviamente, os aumentos e repasses ocorrem com muita facilidade e isso torna mais complicado o combate à inflação.
A presidente Dilma Rousseff inicia seu quarto ano de governo com uma assustadora coleção de desafios - indústria emperrada, baixo nível de investimento público e privado, contas externas em deterioração, contas públicas novamente em perigo e intensa vigilância das agências de classificação de risco. A agenda é extensa e complicada e, para evitar um desastre maior, o governo terá de levar em conta, em todas as suas decisões, a persistente alta de preços.
Precisará resolver, em primeiro lugar, se o Executivo participará do combate à inflação ou se apenas continuará tentando maquiar os indicadores e deixando o trabalho sério para o BC. Não pode haver dúvida, neste momento, quanto a um novo aumento de juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), prevista para os dias 25 e 26. Mas a presidente e sua equipe cometerão dois erros se escolherem o caminho mais cômodo e mais compatível, à primeira vista, com as conveniências eleitorais.
Para continuar maquiando os indicadores de inflação o governo terá de aumentar o subsídio ao consumo de eletricidade e a ajuda às empresas do setor. O custo fiscal dessa política poderá subir de R$ 9,7 bilhões em 2013 para algo entre R$ 16 bilhões e R$ 18 bilhões neste ano. As contas públicas serão prejudicadas, o espaço de manobra orçamentária será menor, as pressões inflacionárias persistirão e os consumidores de energia elétrica receberão um sinal errado.
Nenhum investidor ou financiador estrangeiro será enganado pela repetição de manobras desse tipo. A confiança na política econômica, já reduzida, continuará diminuindo. Se a piora da imagem externa comprometer o ingresso de capitais, uma das saídas será ajustar a política de juros para atenuar também esse problema.
No ano passado o investimento estrangeiro direto, US$ 64,04 bilhões, foi insuficiente para cobrir o déficit externo em transações correntes, US$ 81,37 bilhões. Para este ano o BC projeta um déficit de US$ 78 bilhões e investimento direto de US$ 63 bilhões. O superávit comercial, US$ 2,56 bilhões nos cálculos oficiais de 2013, deve subir para US$ 10 bilhões, segundo a mesma projeção.
Um superávit comercial de US$ 10 bilhões já ficará muito abaixo das necessidades brasileiras, por causa do enorme déficit nas contas de serviços e de rendas, mas até esse resultado medíocre parece duvidoso, neste momento. O déficit comercial de janeiro, US$ 4,06 bilhões, foi recorde, mas muito parecido com o de um ano antes, US$ 4,04 bilhões. Os saldos mensais poderão ser menos ruins no resto do ano, mas nada permite prever resultado final muito melhor que o de 2013. O pequeno superávit oficial do ano passado foi garantido pelo agronegócio (saldo de US$ 82,91 bilhões) e pelas exportações fictícias de plataformas de petróleo, no valor de US$ 7,74 bilhões. Nada justifica, neste momento, uma aposta num desempenho muito melhor da indústria no comércio exterior.
Com crescimento de 0,4% em 2011, redução de 2,5% em 2012 e nova expansão, de 1,2%, em 2013, a produção industrial do ano passado foi pouco inferior à de 2010, o último ano da gestão do presidente Luiz Inácio da Silva, quando o setor já estava enfraquecido.
A indústria, principalmente a de transformação, continuou perdendo vigor nos primeiros três anos da presidente Dilma Rousseff e a ceder espaço a concorrentes estrangeiros, tanto no exterior quanto no mercado interno. O crescimento de 13,3% da produção de bens de capital, no ano passado, festejado pelo governo como sinal de recuperação do investimento, foi insuficiente para neutralizar a queda do ano anterior e levar o resultado de volta ao nível de 2011.
No ano passado, a depreciação do real, embora tenha barateado os produtos brasileiros em dólares, foi insuficiente para impulsionar as exportações de manufaturados. Nesta altura, qual seria a taxa de câmbio necessária para compensar as ineficiências brasileiras e tornar a indústria mais competitiva? É inútil discutir esse ponto, até porque o BC tentará, em 2014 como em 2013, atenuar os efeitos inflacionários da depreciação cambial.
Uma política séria estaria voltada há muito tempo para o aumento da produtividade. No discurso, essa é uma prioridade oficial. Os fatos têm mostrado o contrário. A atenção à infraestrutura é recente e a colheita de resultados vai demorar. E isso é apenas, é bom lembrar, uma parte do enorme problema da competitividade.
Diagnóstico equivocado - MAÍLSON DA NÓBREGA
FOLHA DE SP - 08/02
Na feliz descrição de José Roberto Mendonça de Barros, a economia brasileira entrou em uma armadilha de baixo crescimento. O governo culpa o cenário externo, mas ele apenas acentuou os efeitos dos equívocos internos.
O país padece de um diagnóstico equivocado sobre as razões da aceleração do crescimento após a chegada do PT ao poder.
Para o governo, isso seria o resultado da expansão do consumo, motivada por políticas de redistribuição de renda, particularmente os aumentos reais do salário mínimo e o Bolsa Família.
Essas políticas têm sua justificava, mas aquele desempenho nasceu de duas bonanças que nada têm a ver com a gestão petista. Uma delas, a externa, veio da ascensão da China --que viabilizou o forte incremento das exportações de commodities-- e da combinação de taxas de juros baixas e liquidez abundante nos mercados internacionais.
A bonança interna veio das reformas estruturais de governos anteriores, como a abertura da economia, o Plano Real, a privatização, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a construção do tripé da gestão macroeconômica. Uma verdadeira herança benigna.
Os ganhos de produtividade, em grande parte daí derivados, explicam mais de 80% da taxa de crescimento do período Lula.
As reformas tiveram continuidade até 2006, mas foram abandonadas com a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda.
A produtividade, motor do crescimento, começou a cair, mas a fé no diagnóstico se manteve. O ritmo de crescimento foi preservado via estímulos ao consumo, mas à custa da criação de futuros e graves desequilíbrios.
A bem sucedida ação anticíclica, via consumo, para enfrentar a crise de 2008 convenceu o governo de sua estratégia. Imaginou-se que turbinar o consumo, em especial na administração Dilma, despertaria o instinto animal dos empresários, animando-os a investir.
Ocorre que o excessivo intervencionismo estatal, as mudanças de regras, a hostilidade ao capital privado e a perda de credibilidade da política econômica minaram a confiança. Sem esta, o investimento arrefece. A resposta à falta de reação do empresariado foi a avalanche de crédito subsidiado do BNDES, o que expandiu a dívida pública, e piorou a transparência e a credibilidade da política fiscal. Contribuiu pouco para o investimento.
O aumento do consumo beneficiou mais o setor de serviços, que foi capaz de conceder ganhos salariais acima da produtividade, pois podia repassar os custos aos preços (não se submete à concorrência externa). Daí vieram fortes pressões inflacionárias.
A indústria, ao contrário, viu subir o custo unitário do trabalho, o que fez cair sua competitividade. Esta foi ainda mais reduzida por pioras na infraestrutura, na logística e no sistema tributário. Grande parte da expansão do consumo se transformou em importação de bens, o que diminuiu drasticamente o superavit comercial e piorou o deficit externo. A desindustrialização avançou rapidamente.
A bonança interna se esgotou. A bonança externa diminuiu diante do menor crescimento da China e, do lado financeiro, com a mudança da política monetária americana, fruto da recuperação da economia.
O Brasil ganha com a recuperação, mas no curto prazo ela pressiona a taxa de câmbio e eleva o custo do crédito externo. Dada a frouxa política fiscal, será preciso elevar a taxa de juros, o que reduz o ritmo da atividade econômica, já em si prejudicada pela baixa produtividade.
A fragilidade da economia brasileira pouco tem a ver com o cenário externo.
Na feliz descrição de José Roberto Mendonça de Barros, a economia brasileira entrou em uma armadilha de baixo crescimento. O governo culpa o cenário externo, mas ele apenas acentuou os efeitos dos equívocos internos.
O país padece de um diagnóstico equivocado sobre as razões da aceleração do crescimento após a chegada do PT ao poder.
Para o governo, isso seria o resultado da expansão do consumo, motivada por políticas de redistribuição de renda, particularmente os aumentos reais do salário mínimo e o Bolsa Família.
Essas políticas têm sua justificava, mas aquele desempenho nasceu de duas bonanças que nada têm a ver com a gestão petista. Uma delas, a externa, veio da ascensão da China --que viabilizou o forte incremento das exportações de commodities-- e da combinação de taxas de juros baixas e liquidez abundante nos mercados internacionais.
A bonança interna veio das reformas estruturais de governos anteriores, como a abertura da economia, o Plano Real, a privatização, a Lei de Responsabilidade Fiscal e a construção do tripé da gestão macroeconômica. Uma verdadeira herança benigna.
Os ganhos de produtividade, em grande parte daí derivados, explicam mais de 80% da taxa de crescimento do período Lula.
As reformas tiveram continuidade até 2006, mas foram abandonadas com a saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda.
A produtividade, motor do crescimento, começou a cair, mas a fé no diagnóstico se manteve. O ritmo de crescimento foi preservado via estímulos ao consumo, mas à custa da criação de futuros e graves desequilíbrios.
A bem sucedida ação anticíclica, via consumo, para enfrentar a crise de 2008 convenceu o governo de sua estratégia. Imaginou-se que turbinar o consumo, em especial na administração Dilma, despertaria o instinto animal dos empresários, animando-os a investir.
Ocorre que o excessivo intervencionismo estatal, as mudanças de regras, a hostilidade ao capital privado e a perda de credibilidade da política econômica minaram a confiança. Sem esta, o investimento arrefece. A resposta à falta de reação do empresariado foi a avalanche de crédito subsidiado do BNDES, o que expandiu a dívida pública, e piorou a transparência e a credibilidade da política fiscal. Contribuiu pouco para o investimento.
O aumento do consumo beneficiou mais o setor de serviços, que foi capaz de conceder ganhos salariais acima da produtividade, pois podia repassar os custos aos preços (não se submete à concorrência externa). Daí vieram fortes pressões inflacionárias.
A indústria, ao contrário, viu subir o custo unitário do trabalho, o que fez cair sua competitividade. Esta foi ainda mais reduzida por pioras na infraestrutura, na logística e no sistema tributário. Grande parte da expansão do consumo se transformou em importação de bens, o que diminuiu drasticamente o superavit comercial e piorou o deficit externo. A desindustrialização avançou rapidamente.
A bonança interna se esgotou. A bonança externa diminuiu diante do menor crescimento da China e, do lado financeiro, com a mudança da política monetária americana, fruto da recuperação da economia.
O Brasil ganha com a recuperação, mas no curto prazo ela pressiona a taxa de câmbio e eleva o custo do crédito externo. Dada a frouxa política fiscal, será preciso elevar a taxa de juros, o que reduz o ritmo da atividade econômica, já em si prejudicada pela baixa produtividade.
A fragilidade da economia brasileira pouco tem a ver com o cenário externo.
A gigante extenuada - JORGE M. T. CAMARGO
O GLOBO - 08/02
É como se a Petrobras fosse uma superatleta tendo que enfrentar várias maratonas, mas obrigada a correr com uma mochila carregada de pedras às costas
A Petrobras tem duas tarefas hercúleas pela frente: desenvolver as formidáveis descobertas no pré-sal na Bacia de Santos e sustentar a produção dos campos maduros da mesma bacia. Ambos desafios têm apresentado dificuldades e demandado recursos além dos que a empresa antevia e dispoe.
Sustentar e estender a vida produtiva de campos de petróleo em processo de envelhecimento não tem o mesmo charme que desenvolver novas descobertas. Mas, além da obrigação de aproveitar ao máximo essas preciosas reservas, é fundamental para a saúde financeira de uma empresa de petróleo. São as receitas dos velhos campos que financiam os investimentos em exploração e desenvolvimento de novas descobertas. Campos maduros se transformam com o tempo em grandes produtores de água salgada, tendo o petróleo como subproduto.
Os campos mais antigos da Bacia de Campos vêm apresentando em média taxas de declínio da ordem de 10% ao ano. É alta, mas dentro da normalidade. Estender-lhes a vida significa perfurar mais e mais poços, adequar as plataformas para processar volumes crescentes de água. Exige sondas de perfuração, gente capacitada e pesados investimentos.
Dobrar a produção de petróleo da Petrobras dos atuais 1,9 para 4,2 milhões de barris em 2020 é uma meta ambiciosa, mesmo que a empresa tivesse recursos financeiros ilimitados e fosse capaz de mobilizar toda a capacidade de fornecimento de bens e serviços mundiais. Mas não é esse o caso da Petrobras. Além dos imensos desafios operacionais e financeiros do seu programa de investimentos, é obrigada a subsidiar o consumo nacional de gasolina e diesel — que lhe custou cerca de R$ 45 bilhões nos últimos dois anos e elevou sua dívida para além de R$ 250 bilhões, testando os limites de sua capacidade de endividamento — e fomentar o desenvolvimento da indústria local de bens e serviços. Como se a Petrobras fosse uma superatleta tendo que enfrentar várias maratonas, mas obrigada a correr com uma mochila carregada de pedras às costas.
As dúvidas sobre a capacidade da empresa de sustentar seu programa de investimentos e entregar as metas anunciadas têm contaminado não só o humor dos seus acionistas — que vêm punindo com extrema severidade seus papéis —, mas também toda a indústria no seu entorno. A falta de confiança do mercado, em virtude dos claros sinais de sobrecarga da principal locomotiva do setor, vem afetando decisões de investimento que, por sua vez, diminuem a capacidade produtiva da indústria. Demonstra também o equívoco de concentrar em uma única empresa, por mais competente que seja, as operações no pré-sal. Operador único significa cliente único e maiores riscos, como os que estão hoje evidentes, para seus fornecedores locais.
As agruras conjunturais por que passa a Petrobras também enublam a visão do brilhante futuro que a empresa e a indústria do petróleo brasileira têm pela frente. As extraordinárias reservas do pré-sal, as bases tecnológicas e produtivas já instaladas no Brasil, nos permitem sonhar em triplicar a produção e as reservas nacionais. A receita para transformar o sonho em realidade é simples: um mercado aberto, transparente e competitivo; uma Petrobras governada por objetivos comuns a todos seus acionistas, não apenas do majoritário, capaz de vender seus produtos e planejar receitas e investimentos com independência; políticas macroeconômicas e industriais executadas por ministérios e autarquias do governo, não através de empresas estatais.
A Petrobras ajuda melhor o país entregando produção e resultados, com segurança e eficiência. Uma tarefa gigantesca.
É como se a Petrobras fosse uma superatleta tendo que enfrentar várias maratonas, mas obrigada a correr com uma mochila carregada de pedras às costas
A Petrobras tem duas tarefas hercúleas pela frente: desenvolver as formidáveis descobertas no pré-sal na Bacia de Santos e sustentar a produção dos campos maduros da mesma bacia. Ambos desafios têm apresentado dificuldades e demandado recursos além dos que a empresa antevia e dispoe.
Sustentar e estender a vida produtiva de campos de petróleo em processo de envelhecimento não tem o mesmo charme que desenvolver novas descobertas. Mas, além da obrigação de aproveitar ao máximo essas preciosas reservas, é fundamental para a saúde financeira de uma empresa de petróleo. São as receitas dos velhos campos que financiam os investimentos em exploração e desenvolvimento de novas descobertas. Campos maduros se transformam com o tempo em grandes produtores de água salgada, tendo o petróleo como subproduto.
Os campos mais antigos da Bacia de Campos vêm apresentando em média taxas de declínio da ordem de 10% ao ano. É alta, mas dentro da normalidade. Estender-lhes a vida significa perfurar mais e mais poços, adequar as plataformas para processar volumes crescentes de água. Exige sondas de perfuração, gente capacitada e pesados investimentos.
Dobrar a produção de petróleo da Petrobras dos atuais 1,9 para 4,2 milhões de barris em 2020 é uma meta ambiciosa, mesmo que a empresa tivesse recursos financeiros ilimitados e fosse capaz de mobilizar toda a capacidade de fornecimento de bens e serviços mundiais. Mas não é esse o caso da Petrobras. Além dos imensos desafios operacionais e financeiros do seu programa de investimentos, é obrigada a subsidiar o consumo nacional de gasolina e diesel — que lhe custou cerca de R$ 45 bilhões nos últimos dois anos e elevou sua dívida para além de R$ 250 bilhões, testando os limites de sua capacidade de endividamento — e fomentar o desenvolvimento da indústria local de bens e serviços. Como se a Petrobras fosse uma superatleta tendo que enfrentar várias maratonas, mas obrigada a correr com uma mochila carregada de pedras às costas.
As dúvidas sobre a capacidade da empresa de sustentar seu programa de investimentos e entregar as metas anunciadas têm contaminado não só o humor dos seus acionistas — que vêm punindo com extrema severidade seus papéis —, mas também toda a indústria no seu entorno. A falta de confiança do mercado, em virtude dos claros sinais de sobrecarga da principal locomotiva do setor, vem afetando decisões de investimento que, por sua vez, diminuem a capacidade produtiva da indústria. Demonstra também o equívoco de concentrar em uma única empresa, por mais competente que seja, as operações no pré-sal. Operador único significa cliente único e maiores riscos, como os que estão hoje evidentes, para seus fornecedores locais.
As agruras conjunturais por que passa a Petrobras também enublam a visão do brilhante futuro que a empresa e a indústria do petróleo brasileira têm pela frente. As extraordinárias reservas do pré-sal, as bases tecnológicas e produtivas já instaladas no Brasil, nos permitem sonhar em triplicar a produção e as reservas nacionais. A receita para transformar o sonho em realidade é simples: um mercado aberto, transparente e competitivo; uma Petrobras governada por objetivos comuns a todos seus acionistas, não apenas do majoritário, capaz de vender seus produtos e planejar receitas e investimentos com independência; políticas macroeconômicas e industriais executadas por ministérios e autarquias do governo, não através de empresas estatais.
A Petrobras ajuda melhor o país entregando produção e resultados, com segurança e eficiência. Uma tarefa gigantesca.
Argentina, ruína pela política - KÁTIA ABREU
FOLHA DE SP - 08/02
É do interesse nacional do Brasil de alguma forma apoiar a Argentina, se as coisas se complicarem
Alguém já disse, examinando a história, que não é verdade que as sociedades só caminham para a frente. A chance de retroceder é quase a mesma de avançar. Nada do que foi conquistado está garantido para sempre. A presente agonia da Argentina é mais uma triste lição sobre a fragilidade das conquistas humanas.
No começo do século 20, a Argentina era uma das nações mais ricas do mundo, com recursos naturais aparentemente ilimitados e uma renda por habitante superior à da maioria dos países hoje desenvolvidos. Atualmente, sua renda per capita é de pouco mais de US$ 11.000 anuais, no mesmo nível dos demais países emergentes.
Sua economia está em ruínas, com produção estagnada e inflação de 30% ao ano. O desabastecimento é generalizado, as reservas cambiais estão no limite mínimo de segurança, esgotando-se rapidamente. Por fim, o país está com acesso vedado a todos os mercados de crédito internacional, privados e públicos.
O destino da Argentina é uma mostra apavorante do que pode fazer a loucura política. Um território pleno de riquezas e uma população educada não foram capazes de deter a destruição provocada por políticas públicas ruinosas inspiradas no populismo e na mais irresponsável demagogia.
Embora tudo tenha começado pelas mãos de um homem, a ruína argentina é uma obra coletiva, uma criação de muitos governos, de muitos políticos e até mesmo de uma parte do povo.
Olhar para a Argentina de hoje e para o caminho que se descortina à sua frente deve nos servir de advertência para o potencial destrutivo de decisões políticas equivocadas. As ideologias e a covardia diante de demandas insensatas podem arruinar uma sociedade por gerações.
Para o Brasil, no entanto, contemplar o declínio argentino com indiferença não é uma alternativa. Como dizem os diplomatas do Itamaraty, nossas relações com a Argentina não são uma escolha, são um destino.
Nossas economias têm se integrado progressivamente, apesar dos problemas. Em alguns setores, como o automobilístico, já há um alto grau de complementaridade, com um volume de comércio bilateral superior a US$ 15 bilhões.
Cerca de um quarto das importações argentinas provêm do Brasil e, em grande medida, são compostas de produtos manufaturados, que não conseguimos exportar para o resto do mundo.
No conjunto, temos obtido seguidos saldos comerciais, que só não são maiores em razão de medidas protecionistas. Elas podem ser explicadas pelo rápido esgotamento das reservas cambiais argentinas e por sua incapacidade de financiar o balanço de pagamentos nos mercados financeiros.
Quando penso em tudo isso, chego à conclusão de que é do interesse nacional do Brasil de alguma forma apoiar a Argentina, se as coisas se complicarem, como é previsível. Se suas reservas se esgotarem e a taxa de câmbio disparar, desorganizando a economia e provocando um nível de inflação que desestabilize a própria sociedade, teremos que ter algum plano para socorrer o nosso vizinho e destino de boa parte das nossas exportações.
A grande questão é que, se forem mantidas as atuais políticas e o governo argentino continuar culpando empresários e economistas por problemas que derivam de fatores reais, qualquer ajuda será inútil. Tomar decisões difíceis nas áreas fiscal e monetária, além de abrir as instituições e o comércio para a iniciativa privada, são as escolhas que restam para salvar o país.
Nesse diapasão, o eventual socorro brasileiro deve ser parte de um pacote maior, condicionado à adoção de mudanças econômicas efetivas. Se houver condições políticas para tanto, deveremos apoiar uma iniciativa internacional, que poderia ser comandada pelo FMI e pelo Banco Mundial, entidades apropriadas para gerir programas de resgate.
É preciso pensar nessas ou em outras formas para apoiar a Argentina nos ajustes necessários na sua economia. É novamente uma emergência. Porém, desta vez, as medidas têm que ser de longo prazo.
Mas o Brasil não tem o direito de fazer recomendações a um país soberano, orgulhoso de seu direito de errar. Nada vai adiantar se a Argentina não se ajudar.
É do interesse nacional do Brasil de alguma forma apoiar a Argentina, se as coisas se complicarem
Alguém já disse, examinando a história, que não é verdade que as sociedades só caminham para a frente. A chance de retroceder é quase a mesma de avançar. Nada do que foi conquistado está garantido para sempre. A presente agonia da Argentina é mais uma triste lição sobre a fragilidade das conquistas humanas.
No começo do século 20, a Argentina era uma das nações mais ricas do mundo, com recursos naturais aparentemente ilimitados e uma renda por habitante superior à da maioria dos países hoje desenvolvidos. Atualmente, sua renda per capita é de pouco mais de US$ 11.000 anuais, no mesmo nível dos demais países emergentes.
Sua economia está em ruínas, com produção estagnada e inflação de 30% ao ano. O desabastecimento é generalizado, as reservas cambiais estão no limite mínimo de segurança, esgotando-se rapidamente. Por fim, o país está com acesso vedado a todos os mercados de crédito internacional, privados e públicos.
O destino da Argentina é uma mostra apavorante do que pode fazer a loucura política. Um território pleno de riquezas e uma população educada não foram capazes de deter a destruição provocada por políticas públicas ruinosas inspiradas no populismo e na mais irresponsável demagogia.
Embora tudo tenha começado pelas mãos de um homem, a ruína argentina é uma obra coletiva, uma criação de muitos governos, de muitos políticos e até mesmo de uma parte do povo.
Olhar para a Argentina de hoje e para o caminho que se descortina à sua frente deve nos servir de advertência para o potencial destrutivo de decisões políticas equivocadas. As ideologias e a covardia diante de demandas insensatas podem arruinar uma sociedade por gerações.
Para o Brasil, no entanto, contemplar o declínio argentino com indiferença não é uma alternativa. Como dizem os diplomatas do Itamaraty, nossas relações com a Argentina não são uma escolha, são um destino.
Nossas economias têm se integrado progressivamente, apesar dos problemas. Em alguns setores, como o automobilístico, já há um alto grau de complementaridade, com um volume de comércio bilateral superior a US$ 15 bilhões.
Cerca de um quarto das importações argentinas provêm do Brasil e, em grande medida, são compostas de produtos manufaturados, que não conseguimos exportar para o resto do mundo.
No conjunto, temos obtido seguidos saldos comerciais, que só não são maiores em razão de medidas protecionistas. Elas podem ser explicadas pelo rápido esgotamento das reservas cambiais argentinas e por sua incapacidade de financiar o balanço de pagamentos nos mercados financeiros.
Quando penso em tudo isso, chego à conclusão de que é do interesse nacional do Brasil de alguma forma apoiar a Argentina, se as coisas se complicarem, como é previsível. Se suas reservas se esgotarem e a taxa de câmbio disparar, desorganizando a economia e provocando um nível de inflação que desestabilize a própria sociedade, teremos que ter algum plano para socorrer o nosso vizinho e destino de boa parte das nossas exportações.
A grande questão é que, se forem mantidas as atuais políticas e o governo argentino continuar culpando empresários e economistas por problemas que derivam de fatores reais, qualquer ajuda será inútil. Tomar decisões difíceis nas áreas fiscal e monetária, além de abrir as instituições e o comércio para a iniciativa privada, são as escolhas que restam para salvar o país.
Nesse diapasão, o eventual socorro brasileiro deve ser parte de um pacote maior, condicionado à adoção de mudanças econômicas efetivas. Se houver condições políticas para tanto, deveremos apoiar uma iniciativa internacional, que poderia ser comandada pelo FMI e pelo Banco Mundial, entidades apropriadas para gerir programas de resgate.
É preciso pensar nessas ou em outras formas para apoiar a Argentina nos ajustes necessários na sua economia. É novamente uma emergência. Porém, desta vez, as medidas têm que ser de longo prazo.
Mas o Brasil não tem o direito de fazer recomendações a um país soberano, orgulhoso de seu direito de errar. Nada vai adiantar se a Argentina não se ajudar.
Começo difícil - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 08/02
O apagão desta semana não foi tão grave quanto outros, mas há uma crise no setor energético que o governo deveria enfrentar. Em vez de tapar o apagão com a peneira, ou culpar um ou outro dos seus auxiliares, a presidente deveria ver a sequência de erros cometidos por seu governo nessa área e começar a fazer o ajuste. Não há solução fácil. Corrigir preços que ficaram defasados elevará a inflação, cobrir tudo com subsídio governamental aumentará o déficit público e alimentará a desconfiança. O Brasil já está com sua nota de crédito sob revisão negativa.
Uma indicação de que há algo errado no setor de energia é a queda das ações das empresas do setor, apesar do aumento do consumo. Em condições normais, aconteceria o contrário: as ações subiriam com o aumento da demanda. O problema é que o País está produzindo uma energia mais cara e as empresas estão impedidas de repassar esse custo ao consumidor para não elevar a inflação. O ministro Guido Mantega admitiu novos aportes do Tesouro na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE). O contribuinte pagará a conta que está sendo reduzida para agradar o eleitor.
A perda de confiança na economia não está restrita ao mercado financeiro. Várias sondagens, feitas por entidades diferentes, com consumidores, empresários e comerciantes mostram isso. Em apenas 30 dias, houve uma sensível piora nas projeções do mercado financeiro para o Brasil. Subiu a estimativa de juros e de inflação e caíram as projeções para o PIB deste ano e do próximo. A queda de 3,5% da indústria em dezembro promoverá novas revisões do crescimento.
Dois índices de confiança apurados por entidades diferentes mostraram queda ao menor nível desde julho de 2009. O Índice de Confiança do Empresário Industrial, da CNI, caiu a 53,1 pontos em janeiro. A média histórica é de 58,3 pontos. O Índice de Confiança do Consumidor, da FGV, desceu a 108,9 pontos, o nível mais baixo em mais de quatro anos. O Índice dos Empresários do Comércio, medido pela CNC, recua há seis meses. Em ambiente assim, a empresa investe menos, e o consumidor adia as compras.
As ações da Petrobras fecharam em alta nos últimos dois dias, mas, na quarta-feira, atingiram o menor valor dos últimos cinco anos. A bolsa brasileira fechou o mês de janeiro com queda de 7,5%, o pior resultado para o mês desde 1995. A bolsa pode inverter por vários motivos; um deles é a percepção de que certas ações estão baratas.
O déficit de US$ 4,05 bilhões da balança comercial em janeiro aumentou a pressão sobre as contas externas, que no ano fecharam com um déficit de 3,66% do PIB. Mas os chineses têm garantido bons preços para as commodities agrícolas e minerais, e isso favorece o Brasil. Com o menor crescimento chinês, esses preços podem até ceder, mas não será queda brusca. As previsões são de superávit comercial no ano e um número maior do que em 2013.
O Brasil vai fazer uma parada esportiva no meio do ano para a realização da Copa. A torcida geral é para que os atrasos nas obras sejam superados e não atrapalhem a festa. Claro, e que a seleção brasileira ganhe.
Será um erro o governo tomar decisões, nas várias frentes, com olho unicamente nas urnas. Há um médio e longo prazo a construir e há erros a corrigir. Os números não são negativos por acaso. É colheita do que foi plantado.
Em defesa do trabalho portuário - WILEN MANTELI
O ESTADÃO - 08/02
Pressões sindicais levaram o Congresso Nacional a inserir no novo marco regulatório do setor portuário mudanças que terão impacto econômico negativo, especialmente nos portos públicos. O texto final da Lei n.º 12.815 restabeleceu o monopólio sindical do trabalho avulso, que havia sido extinto pela lei anterior (n.º 8.630/1993). Três dispositivos consumaram esse retrocesso: a proibição de recrutar, mesmo para vínculo empregatício, qualquer trabalhador não pertencente aos quadros do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo); a elevação de todos os segmentos do trabalho portuário avulso à condição de categorias diferenciadas; e a permissão para que trabalhadores aposentados permaneçam nos quadros do Ogmo. Esse conjunto de alterações configura um retorno aos anos 1940.
A obrigatoriedade do recrutamento no Ogmo de trabalhadores que até então as empresas podiam buscar no mercado, treinando-os sob medida para suas necessidades, fere a liberdade de contratar consagrada na Constituição, além de dificultar a formação de equipes afinadas, capazes de atuar como um time focado em resultados. A estratificação e a constituição dos avulsos em categorias diferenciadas, por sua vez, deixarão os portos brasileiros mais distantes da multifuncionalidade - meta indispensável à integração operacional porto-navio -, tornando o trabalho mais complexo, demorado e caro, pela impossibilidade de se implantar um comando único. Essa fragmentação irá, ainda, acirrar conflitos sindicais com os terminais privados, pois, na falta de um sindicato preponderante, as empresas serão obrigadas a negociar com cada uma das seis categorias de trabalhadores avulsos. O trabalhador mais jovem, justamente aquele com maior potencial para a multifuncionalidade, ficará engessado dentro de sua categoria, com chances limitadas de ascensão profissional.
O trabalhador avulso que se aposentar poderá permanecer no Ogmo, inchando continuamente o seu contingente e inviabilizando programas avançados de capacitação, uma vez que as empresas não terão interesse em custear treinamento para profissionais em fim de carreira ou sem condições de trabalhar. Um quarto dispositivo - o da garantia de renda mínima, que em princípio seria justo para com os trabalhadores -, articulado com os demais, servirá somente para elevar o custo da movimentação portuária, sem contrapartida em aumento de produtividade. A garantia da renda mínima deveria ser considerada somente após o atendimento das demais recomendações da Convenção n.º 137 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), firmada em 1973 para atenuar os efeitos sociais da automação das operações portuárias.
Muito citada, mas pouco respeitada no Brasil, a Convenção n.º 137 determina que os portuários registrados tenham prioridade no acesso ao trabalho e que estejam disponíveis para trabalhar de acordo com a legislação ou a prática nacionais (art. 3.º); e recomenda que os quadros profissionais sejam periodicamente revistos conforme as necessidades do porto (art. 4.º). A OIT propõe, portanto, um equilíbrio entre direitos e deveres dos trabalhadores avulsos que nunca chegou a ser estabelecido nos portos brasileiros.
Cabe ao governo a responsabilidade de administrar os conflitos que inevitavelmente virão. Será necessário criar um estímulo para o cancelamento da matrícula no Ogmo, por meio de negociações em cada região portuária entre governo, empresários e trabalhadores. Dessa forma, sim, estaremos atendendo à Convenção n.º 137 da OIT, que se aplica, expressamente, "às pessoas que trabalham de modo regular como portuários, e cuja principal fonte de renda anual provém desse trabalho" (art. 1.º). Não há melhor garantia para o trabalhador do que a qualificação técnica permanente. A postura do governo diante das relações entre capital e trabalho nos portos terá grande relevância para definir se continuaremos atados a práticas do passado ou se estamos dispostos a encarar os desafios do século 21.
Pressões sindicais levaram o Congresso Nacional a inserir no novo marco regulatório do setor portuário mudanças que terão impacto econômico negativo, especialmente nos portos públicos. O texto final da Lei n.º 12.815 restabeleceu o monopólio sindical do trabalho avulso, que havia sido extinto pela lei anterior (n.º 8.630/1993). Três dispositivos consumaram esse retrocesso: a proibição de recrutar, mesmo para vínculo empregatício, qualquer trabalhador não pertencente aos quadros do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo); a elevação de todos os segmentos do trabalho portuário avulso à condição de categorias diferenciadas; e a permissão para que trabalhadores aposentados permaneçam nos quadros do Ogmo. Esse conjunto de alterações configura um retorno aos anos 1940.
A obrigatoriedade do recrutamento no Ogmo de trabalhadores que até então as empresas podiam buscar no mercado, treinando-os sob medida para suas necessidades, fere a liberdade de contratar consagrada na Constituição, além de dificultar a formação de equipes afinadas, capazes de atuar como um time focado em resultados. A estratificação e a constituição dos avulsos em categorias diferenciadas, por sua vez, deixarão os portos brasileiros mais distantes da multifuncionalidade - meta indispensável à integração operacional porto-navio -, tornando o trabalho mais complexo, demorado e caro, pela impossibilidade de se implantar um comando único. Essa fragmentação irá, ainda, acirrar conflitos sindicais com os terminais privados, pois, na falta de um sindicato preponderante, as empresas serão obrigadas a negociar com cada uma das seis categorias de trabalhadores avulsos. O trabalhador mais jovem, justamente aquele com maior potencial para a multifuncionalidade, ficará engessado dentro de sua categoria, com chances limitadas de ascensão profissional.
O trabalhador avulso que se aposentar poderá permanecer no Ogmo, inchando continuamente o seu contingente e inviabilizando programas avançados de capacitação, uma vez que as empresas não terão interesse em custear treinamento para profissionais em fim de carreira ou sem condições de trabalhar. Um quarto dispositivo - o da garantia de renda mínima, que em princípio seria justo para com os trabalhadores -, articulado com os demais, servirá somente para elevar o custo da movimentação portuária, sem contrapartida em aumento de produtividade. A garantia da renda mínima deveria ser considerada somente após o atendimento das demais recomendações da Convenção n.º 137 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), firmada em 1973 para atenuar os efeitos sociais da automação das operações portuárias.
Muito citada, mas pouco respeitada no Brasil, a Convenção n.º 137 determina que os portuários registrados tenham prioridade no acesso ao trabalho e que estejam disponíveis para trabalhar de acordo com a legislação ou a prática nacionais (art. 3.º); e recomenda que os quadros profissionais sejam periodicamente revistos conforme as necessidades do porto (art. 4.º). A OIT propõe, portanto, um equilíbrio entre direitos e deveres dos trabalhadores avulsos que nunca chegou a ser estabelecido nos portos brasileiros.
Cabe ao governo a responsabilidade de administrar os conflitos que inevitavelmente virão. Será necessário criar um estímulo para o cancelamento da matrícula no Ogmo, por meio de negociações em cada região portuária entre governo, empresários e trabalhadores. Dessa forma, sim, estaremos atendendo à Convenção n.º 137 da OIT, que se aplica, expressamente, "às pessoas que trabalham de modo regular como portuários, e cuja principal fonte de renda anual provém desse trabalho" (art. 1.º). Não há melhor garantia para o trabalhador do que a qualificação técnica permanente. A postura do governo diante das relações entre capital e trabalho nos portos terá grande relevância para definir se continuaremos atados a práticas do passado ou se estamos dispostos a encarar os desafios do século 21.
Flores no jardim - DEMÉTRIO MAGNOLI
FOLHA DE SP - 08/02
Há indícios de que a aliança PSB-Rede pode evoluir para a contestação dos pilares da velha ordem
Temos o hábito de desconfiar da palavra dos políticos, especialmente na estação das eleições. O ceticismo é sempre saudável, mas não convém descartar programas de campanha sem uma leitura atenta. As flácidas 70 páginas das diretrizes programáticas da aliança PSB-Rede, anunciadas por Eduardo Campos e Marina Silva, têm um pouco de tudo --e, na hora decisiva, talvez sejam quimicamente reduzidas ao papo furado convencional. No meio daquele jardim monótono, porém, destacam-se três ou quatro flores incomuns: os sinais de uma ruptura potencial com a velha ordem política abrigada no casulo do lulopetismo.
O compromisso com uma reforma do Estado consubstancia-se nas metas de "consolidar uma burocracia pública meritocrática" e "diminuir a quantidade de cargos de livre provimento". A persistência do patrimonialismo, atualizado na "era Lula", expressa-se antes de tudo na captura da máquina da administração pública pela elite política. Os partidos brasileiros não existem para oferecer propostas doutrinárias à sociedade: são ferramentas destinadas a organizar a pilhagem de um tesouro, formado por cargos em ministérios, autarquias e empresas estatais.
"Presidencialismo de coalizão" é o eufemismo cunhado por acadêmicos cínicos para nomear um sistema político hostil ao interesse público, endemicamente corrupto, que se reproduz parasitando as pessoas comuns. Nas jornadas de junho, a sociedade rebelou-se precisamente contra isso, provocando pânico visível entre gregos e troianos. Campos e Marina dialogam com as ruas quando fazem da reforma do Estado a condição prévia de uma reforma política substantiva. Se tiverem a coragem de enfrentar a velha ordem, rompendo com as máfias encapsuladas em todos os partidos, adicionarão números radicais à equação do emagrecimento dos cargos de indicação política.
A proposta de "repactuar o federalismo brasileiro" adquire densidade no diagnóstico crítico da concentração de receitas na União e no compromisso com uma reforma tributária destinada a "assegurar maior autonomia aos Estados e municípios". A cíclica peregrinação de governadores e prefeitos ao Planalto, num vergonhoso ritual de mendicância, denuncia a natureza farsesca da Federação e esvazia o sentido das escolhas políticas dos eleitores.
O poder discricionário quase absoluto do governo central sobre tributos arrecadados em todo o país funciona como instrumento de chantagem e cooptação. No fundo, encerradas as eleições, configura-se algo como o Partido do Planalto: uma santa aliança dos governantes, em todos os níveis, disfarçada por hipócritas menções à cooperação administrativa suprapartidária. A ex-ministra Gleisi Hoffmann, braço direito de Dilma Rousseff, acusou Eduardo Campos de nada menos que "ingratidão". Essa flor do Lácio da velha ordem, esplendor e sepultura de costumes políticos anacrônicos, invocou supostos deveres de lealdade do governador de Pernambuco, derivados do "apoio financeiro que a União deu àquele Estado". Nas suas palavras deploráveis, dignas de uma monarquia, encontra-se a melhor justificativa para a reorganização do pacto federativo.
Campos e Marina já não são mais dissidentes do bloco de poder lulopetista. A constatação de que "a sociedade brasileira não tolera mais este velho pacto político que mofou" transfere-os para o campo da oposição. A crítica ao "receituário minimalista" do "choque de gestão", empregada por um PSDB carente de vitalidade nas últimas eleições presidenciais, e os ensaios na direção das reformas do Estado e da Federação são indícios de que a aliança PSB-Rede pode evoluir, surpreendentemente, para a contestação dos pilares da velha ordem.
Papo de campanha? Conversa mole de candidato minoritário em busca de um lugar ao sol? É possível. Mas convém prestar atenção nessas flores coloridas que nasceram em terra árida.
Há indícios de que a aliança PSB-Rede pode evoluir para a contestação dos pilares da velha ordem
Temos o hábito de desconfiar da palavra dos políticos, especialmente na estação das eleições. O ceticismo é sempre saudável, mas não convém descartar programas de campanha sem uma leitura atenta. As flácidas 70 páginas das diretrizes programáticas da aliança PSB-Rede, anunciadas por Eduardo Campos e Marina Silva, têm um pouco de tudo --e, na hora decisiva, talvez sejam quimicamente reduzidas ao papo furado convencional. No meio daquele jardim monótono, porém, destacam-se três ou quatro flores incomuns: os sinais de uma ruptura potencial com a velha ordem política abrigada no casulo do lulopetismo.
O compromisso com uma reforma do Estado consubstancia-se nas metas de "consolidar uma burocracia pública meritocrática" e "diminuir a quantidade de cargos de livre provimento". A persistência do patrimonialismo, atualizado na "era Lula", expressa-se antes de tudo na captura da máquina da administração pública pela elite política. Os partidos brasileiros não existem para oferecer propostas doutrinárias à sociedade: são ferramentas destinadas a organizar a pilhagem de um tesouro, formado por cargos em ministérios, autarquias e empresas estatais.
"Presidencialismo de coalizão" é o eufemismo cunhado por acadêmicos cínicos para nomear um sistema político hostil ao interesse público, endemicamente corrupto, que se reproduz parasitando as pessoas comuns. Nas jornadas de junho, a sociedade rebelou-se precisamente contra isso, provocando pânico visível entre gregos e troianos. Campos e Marina dialogam com as ruas quando fazem da reforma do Estado a condição prévia de uma reforma política substantiva. Se tiverem a coragem de enfrentar a velha ordem, rompendo com as máfias encapsuladas em todos os partidos, adicionarão números radicais à equação do emagrecimento dos cargos de indicação política.
A proposta de "repactuar o federalismo brasileiro" adquire densidade no diagnóstico crítico da concentração de receitas na União e no compromisso com uma reforma tributária destinada a "assegurar maior autonomia aos Estados e municípios". A cíclica peregrinação de governadores e prefeitos ao Planalto, num vergonhoso ritual de mendicância, denuncia a natureza farsesca da Federação e esvazia o sentido das escolhas políticas dos eleitores.
O poder discricionário quase absoluto do governo central sobre tributos arrecadados em todo o país funciona como instrumento de chantagem e cooptação. No fundo, encerradas as eleições, configura-se algo como o Partido do Planalto: uma santa aliança dos governantes, em todos os níveis, disfarçada por hipócritas menções à cooperação administrativa suprapartidária. A ex-ministra Gleisi Hoffmann, braço direito de Dilma Rousseff, acusou Eduardo Campos de nada menos que "ingratidão". Essa flor do Lácio da velha ordem, esplendor e sepultura de costumes políticos anacrônicos, invocou supostos deveres de lealdade do governador de Pernambuco, derivados do "apoio financeiro que a União deu àquele Estado". Nas suas palavras deploráveis, dignas de uma monarquia, encontra-se a melhor justificativa para a reorganização do pacto federativo.
Campos e Marina já não são mais dissidentes do bloco de poder lulopetista. A constatação de que "a sociedade brasileira não tolera mais este velho pacto político que mofou" transfere-os para o campo da oposição. A crítica ao "receituário minimalista" do "choque de gestão", empregada por um PSDB carente de vitalidade nas últimas eleições presidenciais, e os ensaios na direção das reformas do Estado e da Federação são indícios de que a aliança PSB-Rede pode evoluir, surpreendentemente, para a contestação dos pilares da velha ordem.
Papo de campanha? Conversa mole de candidato minoritário em busca de um lugar ao sol? É possível. Mas convém prestar atenção nessas flores coloridas que nasceram em terra árida.
Caixa 2 em xeque - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 08/02
O financiamento de campanhas eleitorais voltará à ordem do dia quando o Supremo tribunal Federal (STF) retomar, nos próximos meses, o julgamento, que já conta com 5 votos favoráveis, da proibição de financiamentos por empresas privadas de campanhas eleitorais.
O tema está em evidência nos últimos dias com a prisão na Itália do ex-tesoureiro do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, condenado no processo do mensalão por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, e devido à notícia de que o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, recomendou ao Supremo tribunal Federal que o ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB) cumpra uma pena de 22 anos de prisão e pague multa R$ 404 mil por crimes continuados de peculato e lavagem de dinheiro.
No mensalão petista, os condenados alegavam que o dinheiro desviado servira para pagar despesas de campanhas eleitorais passadas, mas o Supremo aceitou a tese da Procuradoria Geral da República de que o que acontecera mesmo foi uma tentativa de compra de apoio político no Congresso.
Já no caso do PSDB mineiro, a alegação oficial é a mesma: o dinheiro desviado na eleição de 1998 serviu para financiar campanhas eleitorais naquele ano. Mesmo que as evidências mostrem que de fato no caso mineiro houve a utilização de Caixa 2 eleitoral, o procurador-geral pede a condenação de Azeredo e outros por terem usado "a máquina administrativa em seu favor de forma criminosa e causando um desequilíbrio econômico financeiro entre os demais concorrentes ao cargo de governador de Minas Gerais em 1998".
De qualquer forma, no julgamento do mensalão o STF fixou uma premissa que impossibilita a alegação de simples crime eleitoral: não há Caixa 2 quando se trata de dinheiro público. Nesses casos, o que existe mesmo é peculato, desvio de dinheiro público, que merece todo o repúdio da sociedade. No caso petista, o desvio foi da verba do Banco do Brasil no VisaNet, propiciado pela ação do então diretor de marketing Henrique Pizzolato. No caso mineiro, o dinheiro desviado foi das companhias estatais Copasa (R$ 1,5 milhão), Comig (R$ 1,5 milhão) e do antigo banco do estado, o Bemge (R$ 500 mil).
O ex-procurador Antonio Fernando de Souza, o mesmo que denunciou o esquema do mensalão petista, diz na acusação original que o esquema mineiro foi o embrião para o mensalão do PT e envolve o já condenado publicitário Marcos Valério.
O relator do processo no Supremo é o ministro Luís Roberto Barroso, que coincidentemente foi o mais destacado defensor do fim do financiamento por empresas privadas de campanhas eleitorais, tema polêmico que está sendo julgado pelo STF.
A base para a representação do Conselho Federal da OAB que resultou na Ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que está sendo julgada pelo Supremo foi dada por professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), onde Barroso leciona, como Daniel Sarmento, professor-adjunto de Direito Constitucional e procurador regional da República, e Aline Osório, mestranda em Direito Público e uma das advogadas da Clínica de Direitos Fundamentais da Faculdade de Direito da Uerj que, na qualidade de amicus curiae, sustenta a procedência da ADI 4.650.
Os dois escreveram um trabalho sobre o tema onde defendem a tese de que "a alteração do arcabouço normativo vigente é um importante passo no sentido de reduzir os efeitos decorrentes da promiscuidade entre o dinheiro e a política e de tornar o sistema de financiamento de campanhas mais igualitário, democrático e republicano".
Alegam a favor da medida que ela produzirá efeitos positivos sobre o controle financeiro das campanhas, embora seja utópico imaginar que dará fim ao caixa 2 eleitoral.
No entanto, garantem que não terá o efeito contrário, como alegam seus adversários, de estimular o financiamento ilegal de campanhas eleitorais. "Ao impor o barateamento das mesmas, as restrições adicionais às doações darão maior visibilidade aos gastos eleitorais que forem desproporcionais às receitas declaradas, facilitando a fiscalização e a punição dos que se valerem do caixa 2".
Mas como impor o barateamento das campanhas sem alterar o sistema eleitoral? (Amanhã, a reforma política)
O tema está em evidência nos últimos dias com a prisão na Itália do ex-tesoureiro do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, condenado no processo do mensalão por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, e devido à notícia de que o procurador- geral da República, Rodrigo Janot, recomendou ao Supremo tribunal Federal que o ex-governador mineiro Eduardo Azeredo (PSDB) cumpra uma pena de 22 anos de prisão e pague multa R$ 404 mil por crimes continuados de peculato e lavagem de dinheiro.
No mensalão petista, os condenados alegavam que o dinheiro desviado servira para pagar despesas de campanhas eleitorais passadas, mas o Supremo aceitou a tese da Procuradoria Geral da República de que o que acontecera mesmo foi uma tentativa de compra de apoio político no Congresso.
Já no caso do PSDB mineiro, a alegação oficial é a mesma: o dinheiro desviado na eleição de 1998 serviu para financiar campanhas eleitorais naquele ano. Mesmo que as evidências mostrem que de fato no caso mineiro houve a utilização de Caixa 2 eleitoral, o procurador-geral pede a condenação de Azeredo e outros por terem usado "a máquina administrativa em seu favor de forma criminosa e causando um desequilíbrio econômico financeiro entre os demais concorrentes ao cargo de governador de Minas Gerais em 1998".
De qualquer forma, no julgamento do mensalão o STF fixou uma premissa que impossibilita a alegação de simples crime eleitoral: não há Caixa 2 quando se trata de dinheiro público. Nesses casos, o que existe mesmo é peculato, desvio de dinheiro público, que merece todo o repúdio da sociedade. No caso petista, o desvio foi da verba do Banco do Brasil no VisaNet, propiciado pela ação do então diretor de marketing Henrique Pizzolato. No caso mineiro, o dinheiro desviado foi das companhias estatais Copasa (R$ 1,5 milhão), Comig (R$ 1,5 milhão) e do antigo banco do estado, o Bemge (R$ 500 mil).
O ex-procurador Antonio Fernando de Souza, o mesmo que denunciou o esquema do mensalão petista, diz na acusação original que o esquema mineiro foi o embrião para o mensalão do PT e envolve o já condenado publicitário Marcos Valério.
O relator do processo no Supremo é o ministro Luís Roberto Barroso, que coincidentemente foi o mais destacado defensor do fim do financiamento por empresas privadas de campanhas eleitorais, tema polêmico que está sendo julgado pelo STF.
A base para a representação do Conselho Federal da OAB que resultou na Ação direta de inconstitucionalidade (ADI) que está sendo julgada pelo Supremo foi dada por professores da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), onde Barroso leciona, como Daniel Sarmento, professor-adjunto de Direito Constitucional e procurador regional da República, e Aline Osório, mestranda em Direito Público e uma das advogadas da Clínica de Direitos Fundamentais da Faculdade de Direito da Uerj que, na qualidade de amicus curiae, sustenta a procedência da ADI 4.650.
Os dois escreveram um trabalho sobre o tema onde defendem a tese de que "a alteração do arcabouço normativo vigente é um importante passo no sentido de reduzir os efeitos decorrentes da promiscuidade entre o dinheiro e a política e de tornar o sistema de financiamento de campanhas mais igualitário, democrático e republicano".
Alegam a favor da medida que ela produzirá efeitos positivos sobre o controle financeiro das campanhas, embora seja utópico imaginar que dará fim ao caixa 2 eleitoral.
No entanto, garantem que não terá o efeito contrário, como alegam seus adversários, de estimular o financiamento ilegal de campanhas eleitorais. "Ao impor o barateamento das mesmas, as restrições adicionais às doações darão maior visibilidade aos gastos eleitorais que forem desproporcionais às receitas declaradas, facilitando a fiscalização e a punição dos que se valerem do caixa 2".
Mas como impor o barateamento das campanhas sem alterar o sistema eleitoral? (Amanhã, a reforma política)
Cavalos e outras chinesices - ALBERTO DINES
GAZETA DO POVO - 08/02
Pelo zodíaco oriental, o ano lunar começado em 31 de janeiro tem como símbolo o equino e, segundo os astrólogos, deverá ser um tempo de movimento, mutação, transformação da realidade. O ano anterior, da serpente, entre outros atributos, pedia ações precisas para evitar rupturas. Se junho de 2013 foi uma revolta contra os scripts rígidos, inflexíveis, este início de 2014 está sendo um festival de surpresas e fortes sacolejos.
A roteirização excessiva trouxe um efeito perverso, pelo menos em matéria política: deu a impressão de que tudo estava decidido e o povo era desnecessário. O povo está atento, se importando e em movimento. Estamos num dos momentos mais trepidantes de nossa história recente. Quaisquer que sejam nossas crenças ou preferências astrológicas.
Nos próximos nove meses, nada será insignificante ou irrelevante. O Mundial de futebol e as eleições, juntos ou separadamente, estão condenados a funcionar como gigantescas lentes de aumento, tudo visível, forçosamente transparente, palpável, perceptível. E facilmente fiscalizável.
Candidatos, partidos e governos vão suar a camisa. Para os governados – nós –, será um maná: as autoridades e respectivas máquinas estão condenadas a adotar finalmente o regime de tempo integral movidas por um zelo e esmero que geralmente desprezam. Recolhidos os tapetes, difícil será varrer algo para debaixo deles.
Impossível saber se as elites dirigentes da China (tão bem-sucedidas nas últimas décadas) dão alguma atenção ao horóscopo ou a outros recursos esotéricos. As nossas, a pretexto de um pragmatismo ocidental, são exímias em tropeços. E isso vale para qualquer esfera de poder, tanto nas oposições como na situação.
Com possantes cavalos ou lerdos rocinantes, importa atentar para o estado do material utilizado em nossa carruagem republicana. Um calendário eleitoral regular não garante a renovação das instituições. A ferrugem e a fadiga acometem simultaneamente os contendores e seus arsenais. Sem a disposição de renovar, não se atende às dinâmicas geradas por uma sociedade que aos poucos começa a familiarizar-se com a noção de movimento.
Em qualquer calendário e inspirados por quaisquer símbolos, mitologias e horóscopos, os próximos meses parecem destinados a servir de cenário para enredos inéditos. Nosso próprio cotidiano, já indica situações insólitas. Convém acostumar-se, exercitar-se. Tomadores de decisões terão de adotar cautelas, buscar recônditas sabedorias, tentar habilidades jamais experimentadas. Para desativar situações-limite, contornar paroxismos e, sobretudo, olhar muito além dos próprios umbigos.
Em plena era digital, o cavalo chinês nos oferece a rara oportunidade de preservar o instinto analógico.
Pelo zodíaco oriental, o ano lunar começado em 31 de janeiro tem como símbolo o equino e, segundo os astrólogos, deverá ser um tempo de movimento, mutação, transformação da realidade. O ano anterior, da serpente, entre outros atributos, pedia ações precisas para evitar rupturas. Se junho de 2013 foi uma revolta contra os scripts rígidos, inflexíveis, este início de 2014 está sendo um festival de surpresas e fortes sacolejos.
A roteirização excessiva trouxe um efeito perverso, pelo menos em matéria política: deu a impressão de que tudo estava decidido e o povo era desnecessário. O povo está atento, se importando e em movimento. Estamos num dos momentos mais trepidantes de nossa história recente. Quaisquer que sejam nossas crenças ou preferências astrológicas.
Nos próximos nove meses, nada será insignificante ou irrelevante. O Mundial de futebol e as eleições, juntos ou separadamente, estão condenados a funcionar como gigantescas lentes de aumento, tudo visível, forçosamente transparente, palpável, perceptível. E facilmente fiscalizável.
Candidatos, partidos e governos vão suar a camisa. Para os governados – nós –, será um maná: as autoridades e respectivas máquinas estão condenadas a adotar finalmente o regime de tempo integral movidas por um zelo e esmero que geralmente desprezam. Recolhidos os tapetes, difícil será varrer algo para debaixo deles.
Impossível saber se as elites dirigentes da China (tão bem-sucedidas nas últimas décadas) dão alguma atenção ao horóscopo ou a outros recursos esotéricos. As nossas, a pretexto de um pragmatismo ocidental, são exímias em tropeços. E isso vale para qualquer esfera de poder, tanto nas oposições como na situação.
Com possantes cavalos ou lerdos rocinantes, importa atentar para o estado do material utilizado em nossa carruagem republicana. Um calendário eleitoral regular não garante a renovação das instituições. A ferrugem e a fadiga acometem simultaneamente os contendores e seus arsenais. Sem a disposição de renovar, não se atende às dinâmicas geradas por uma sociedade que aos poucos começa a familiarizar-se com a noção de movimento.
Em qualquer calendário e inspirados por quaisquer símbolos, mitologias e horóscopos, os próximos meses parecem destinados a servir de cenário para enredos inéditos. Nosso próprio cotidiano, já indica situações insólitas. Convém acostumar-se, exercitar-se. Tomadores de decisões terão de adotar cautelas, buscar recônditas sabedorias, tentar habilidades jamais experimentadas. Para desativar situações-limite, contornar paroxismos e, sobretudo, olhar muito além dos próprios umbigos.
Em plena era digital, o cavalo chinês nos oferece a rara oportunidade de preservar o instinto analógico.
A revolução é o meio - CRISTOVAM BUARQUE
O GLOBO - 08/02
Cada pessoa tem uma trincheira em casa sob a forma de computador
Não faz muito, os fins justificavam os meios usados para realizar as revoluções e a construção da igualdade justificava o sacrifício da liberdade. Mais recentemente, os propósitos sociais foram sacrificados em nome da plena liberdade comercial.
Para surpresa, as populações foram às ruas manifestar radical descontentamento com o estado das coisas. Mas esses movimentos têm carecido de objetivos transformadores e utópicos claros. Passam a impressão de que seus diversos objetivos parciais não carregam propósitos de transformação social. É como se a revolução estivesse no meio, e não nos fins. Uma revolução sem classe social vanguardista, sem líder condutor, sem partido, realizada pela desilusão, descontentamento e desespero com a realidade atual, sem proposta de outra realidade a ser colocada no lugar. Por isso, os movimentos não se enquadram nos modelos conhecidos.
É por desconhecer o que acontece que surge a tentação de negar a existência da revolução em marcha, que se caracteriza, sobretudo, pela mobilização de pessoas pela internet. Com os instrumentos tradicionais de análise, é impossível entender este processo e nada indica que novos instrumentos lógicos estejam surgindo entre os intelectuais ou os políticos.
A perspectiva é de um longo tempo de instabilidade social, decorrente não apenas de raras marchas de cem mil, mas por cinco mil marchas de 200 pessoas. Número incapaz de derrubar governos, mas suficiente para desorganizar a estrutura social sem ameaçar a estrutura política.
O que caracterizavam as revoluções com os velhos propósitos era desorganizar o tecido social para mudar o poder político e implantar um novo projeto social. Agora é extravasar o descontentamento social com centenas de pequenas reivindicações para mudar as prioridades.
Neste clima de uma revolução com propósitos diluídos, conforme os grupos que se manifestam, sem um propósito de classe nem líderes partidários, surgirá a tentação da repressão como forma de combater os movimentos. Mas os movimentos se organizam por uma forma desorganizada, quase espontânea, em que cada pessoa tem uma trincheira em casa sob a forma de computador conectado. As forças da repressão não terão êxito porque foram organizadas para os velhos padrões. Da mesma forma que os exércitos tradicionais perderam guerras para a guerrilha tradicional, a polícia tradicional perderá para esta guerrilha cibernética.
Resta aceitar os movimentos e tentar entender as causas dos descontentamentos, dos desesperos, dos desencantos. E, de preferência, fazer isto contente, porque esta revolução que não entendemos é a manifestação do fracasso do que se entendia ser a utopia, e esperando e observando o que está acontecendo e que não cabe dentro de nossos esquemas. Até que, provavelmente, de dentro dos próprios “neorrevolucionários”, surjam alternativas sociais utópicas e convincentes.
Cada pessoa tem uma trincheira em casa sob a forma de computador
Não faz muito, os fins justificavam os meios usados para realizar as revoluções e a construção da igualdade justificava o sacrifício da liberdade. Mais recentemente, os propósitos sociais foram sacrificados em nome da plena liberdade comercial.
Para surpresa, as populações foram às ruas manifestar radical descontentamento com o estado das coisas. Mas esses movimentos têm carecido de objetivos transformadores e utópicos claros. Passam a impressão de que seus diversos objetivos parciais não carregam propósitos de transformação social. É como se a revolução estivesse no meio, e não nos fins. Uma revolução sem classe social vanguardista, sem líder condutor, sem partido, realizada pela desilusão, descontentamento e desespero com a realidade atual, sem proposta de outra realidade a ser colocada no lugar. Por isso, os movimentos não se enquadram nos modelos conhecidos.
É por desconhecer o que acontece que surge a tentação de negar a existência da revolução em marcha, que se caracteriza, sobretudo, pela mobilização de pessoas pela internet. Com os instrumentos tradicionais de análise, é impossível entender este processo e nada indica que novos instrumentos lógicos estejam surgindo entre os intelectuais ou os políticos.
A perspectiva é de um longo tempo de instabilidade social, decorrente não apenas de raras marchas de cem mil, mas por cinco mil marchas de 200 pessoas. Número incapaz de derrubar governos, mas suficiente para desorganizar a estrutura social sem ameaçar a estrutura política.
O que caracterizavam as revoluções com os velhos propósitos era desorganizar o tecido social para mudar o poder político e implantar um novo projeto social. Agora é extravasar o descontentamento social com centenas de pequenas reivindicações para mudar as prioridades.
Neste clima de uma revolução com propósitos diluídos, conforme os grupos que se manifestam, sem um propósito de classe nem líderes partidários, surgirá a tentação da repressão como forma de combater os movimentos. Mas os movimentos se organizam por uma forma desorganizada, quase espontânea, em que cada pessoa tem uma trincheira em casa sob a forma de computador conectado. As forças da repressão não terão êxito porque foram organizadas para os velhos padrões. Da mesma forma que os exércitos tradicionais perderam guerras para a guerrilha tradicional, a polícia tradicional perderá para esta guerrilha cibernética.
Resta aceitar os movimentos e tentar entender as causas dos descontentamentos, dos desesperos, dos desencantos. E, de preferência, fazer isto contente, porque esta revolução que não entendemos é a manifestação do fracasso do que se entendia ser a utopia, e esperando e observando o que está acontecendo e que não cabe dentro de nossos esquemas. Até que, provavelmente, de dentro dos próprios “neorrevolucionários”, surjam alternativas sociais utópicas e convincentes.
A pior semana - FERNANDO RODRIGUES
FOLHA DE SP - 08/02
BRASÍLIA - A semana que acaba hoje já é, de longe, a pior deste ano para Dilma Rousseff. As desventuras em série da presidente foram várias.
Um apagão deixou sem luz seis milhões de pessoas. Uma médica cubana desertou do programa Mais Médicos. O PMDB espetou (pela centésima vez) a faca na barriga da presidente para arrancar mais cargos e benefícios. Mensaleiros continuaram a ser presos, seja na penitenciária da Papuda ou na Itália.
De quebra, continuam a acontecer manifestações violentas em algumas cidades. O transporte público urbano é um gargalo incontornável no nos próximos meses ou anos. Este verão tem sido um inferno para quem vive nas grandes metrópoles.
Muito do que há de ruim no país não é culpa da presidente da República. Aliás, as coisas poderiam estar piores se o Brasil não tivesse experimentado a sequência FHC-Lula-Dilma no Planalto. Mas não importa. A sensação geral de incômodo é uma realidade --e isso explica grande parte das pessoas desejarem mudança na forma de governar, como bem detectou o Datafolha.
O momento é especialmente delicado para o governo porque há fatores imponderáveis à frente. Os problemas infraestruturais são graves e insolúveis no curto prazo. Ninguém sabe se haverá novos apagões. Nesse ambiente, o principal nó é o político.
Os partidos aliados a Dilma sabem que esta é a hora de esfolar a presidente. O prazo termina em junho --quando se fecham todas as alianças para a eleição de outubro. A partir de julho, quem está dentro não sai; quem está fora, não entra.
A correlação de forças de cerca de dez partidos políticos no condomínio governista se define nos próximos cinco meses. A hora de formatar o fatiamento do poder é agora. A fórmula valerá até 2018 no caso de vitória dilmista. É por essa razão que tudo será muito tenso, pelo menos, até o final de junho. E outras semanas piores podem vir por aí.
BRASÍLIA - A semana que acaba hoje já é, de longe, a pior deste ano para Dilma Rousseff. As desventuras em série da presidente foram várias.
Um apagão deixou sem luz seis milhões de pessoas. Uma médica cubana desertou do programa Mais Médicos. O PMDB espetou (pela centésima vez) a faca na barriga da presidente para arrancar mais cargos e benefícios. Mensaleiros continuaram a ser presos, seja na penitenciária da Papuda ou na Itália.
De quebra, continuam a acontecer manifestações violentas em algumas cidades. O transporte público urbano é um gargalo incontornável no nos próximos meses ou anos. Este verão tem sido um inferno para quem vive nas grandes metrópoles.
Muito do que há de ruim no país não é culpa da presidente da República. Aliás, as coisas poderiam estar piores se o Brasil não tivesse experimentado a sequência FHC-Lula-Dilma no Planalto. Mas não importa. A sensação geral de incômodo é uma realidade --e isso explica grande parte das pessoas desejarem mudança na forma de governar, como bem detectou o Datafolha.
O momento é especialmente delicado para o governo porque há fatores imponderáveis à frente. Os problemas infraestruturais são graves e insolúveis no curto prazo. Ninguém sabe se haverá novos apagões. Nesse ambiente, o principal nó é o político.
Os partidos aliados a Dilma sabem que esta é a hora de esfolar a presidente. O prazo termina em junho --quando se fecham todas as alianças para a eleição de outubro. A partir de julho, quem está dentro não sai; quem está fora, não entra.
A correlação de forças de cerca de dez partidos políticos no condomínio governista se define nos próximos cinco meses. A hora de formatar o fatiamento do poder é agora. A fórmula valerá até 2018 no caso de vitória dilmista. É por essa razão que tudo será muito tenso, pelo menos, até o final de junho. E outras semanas piores podem vir por aí.
Boa nova para os pobres - DOM ODILO P. SCHERER
O Estado de S.Paulo - 08/02
Muito papel e muita tinta já foram gastos para discutir se a Igreja Católica deve ocupar-se apenas do "espiritual" ou se também lhe cabe interessar-se pelas questões mais concretas, referentes à vida do homem neste mundo. Não é meu propósito, nestas linhas, discorrer sobre essa controvérsia, que, a meu ver, está mal colocada: a Igreja de Cristo, neste mundo, é formada de pessoas e instituições concretas, histórica e socialmente situadas, com as quais ela exerce sua missão.
O papa Francisco, na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (A Alegria do Evangelho, 2013), aponta algumas questões às quais a Igreja precisa dar especial atenção se quiser cumprir bem a sua missão. Entre outras, destaca que a evangelização tem uma clara dimensão social e não pode contentar-se somente com a realização de ritos religiosos, sem repercussão na vida social.
Da adesão à fé cristã, quando verdadeira, decorre um compromisso social amplo e a adoração de Deus implica necessariamente o reconhecimento da dignidade de todo ser humano, amado e querido por Deus, bem como o esforço em prol da fraternidade e da justiça. Reconhecer Deus como criador e origem última das criaturas leva ao respeito por todas elas.
Até pode parecer novidade que o papa Francisco diga, de maneira tão explícita, que a evangelização possui uma dimensão social e o anúncio do Evangelho de Cristo tem inevitáveis implicações comunitárias. Francisco, no entanto, retoma conceitos já consolidados no ensino social da Igreja, com a clareza e a simplicidade que lhe são próprias, citando documentos de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI, dando-lhes novos destaques.
De fato, nada é mais antigo e originário no cristianismo do que os dois amores inseparáveis: a Deus e ao próximo. Desde os primórdios os cristãos aprenderam que "a fé sem as obras é morta em si mesma"; e que as obras da fé incluem sempre a prática do amor fraterno, a atenção aos pobres, aos doentes e aos desvalidos, sem exclusão de ninguém. Paulo, ao se confrontar com os outros apóstolos, para verificar se a sua pregação estava em sintonia com a deles, recebeu apenas esta recomendação: que não descuidasse dos pobres.
Não se trata apenas de levar assistência e socorro, sem dúvida indispensáveis para aliviar necessidades pontuais e imediatas dos pobres, mas de "ouvir o clamor dos pobres e socorrê-los", de para promover a sua inclusão social. Nem é missão reservada somente a algumas pessoas: é de todos os membros da Igreja, atuantes nas mais diversas áreas de suas competências profissionais e responsabilidades sociais. O papa convida a ir além de alguns atos esporádicos de generosidade e a formar uma nova mentalidade, uma cultura, superando o excessivo individualismo para pensar e agir solidariamente, tendo sempre presente o horizonte da comunidade e da grande família humana (cf. n. 188s).
"Precisamos crescer em solidariedade", ensina o papa Francisco, também no que diz respeito às relações entre os povos, nas quais a exacerbada defesa dos direitos individuais, ou das vantagens dos povos mais ricos, passa por cima do direito mais elementar à vida digna de populações e nações inteiras que continuam a viver na miséria e sem chances de sair dela. De maneira clara e corajosa, Francisco retoma o conceito da "destinação universal dos bens deste mundo" para todos os seus habitantes: "Respeitando a independência e a cultura de cada nação, é preciso recordar-se sempre de que o planeta é de toda e para toda a humanidade".
Usando palavras de seu predecessor Paulo VI (Octogesima adveniens, 23,1971), Francisco apela para os povos mais ricos, tocando numa questão melindrosa: "É preciso repetir que os mais favorecidos devem renunciar a alguns dos seus direitos, para colocar, com mais liberalidade, os seus bens ao serviço dos outros" (n. 190).
A opção preferencial da Igreja pelos pobres não tem motivação ideológica, nem implica a exclusão dos que não são pobres: ela tem sua origem e inspiração no exemplo e nas palavras do próprio Jesus e deverá ser traduzida em ações concretas de solidariedade para com os doentes, os pobres e todos os deserdados dos bens deste mundo; mas também na promoção da justiça social e no cuidado de todo ser humano despojado de sua dignidade. Acaso a Igreja poderia deixar de fazer isso e de convidar todos a fazerem o mesmo, como caminho para o bem comum e a paz?
A evangelização seria incompleta se não tomasse em consideração a constante interpelação recíproca constante entre o Evangelho e a vida concreta, pessoal e social (n. 181). Francisco adverte aqueles que, dentro ou fora da Igreja, pensam que deva a religião ficar reservada apenas aos espaços da vida privada: "Ninguém pode exigir de nós que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocuparmos com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciarmos sobre acontecimentos que interessam aos cidadãos" (n. 183).
Bem, e por que motivo os católicos não fazem isso? Não é que falte quem já o faça, mas, é verdade, temos muito pela frente! Entre o "dever fazer" e o "fazer" vai uma grande distância. Nada é automático na condição humana, nem também na vida dos crentes em Deus. O cristianismo apela, por princípio, à consciência e à liberdade humanas; graça divina e autonomia do homem são dois polos que precisam encontrar-se.
A palavra do papa Francisco, dirigida aos membros da Igreja, longe de ser triunfalista, é um chamado à realidade e à atitude consciente; a "alegria do Evangelho" é um bem para a comunidade humana inteira, não podendo ficar retida no coração dos fiéis: ela é "boa nova" para todos. Para os pobres, em primeiro lugar.
Muito papel e muita tinta já foram gastos para discutir se a Igreja Católica deve ocupar-se apenas do "espiritual" ou se também lhe cabe interessar-se pelas questões mais concretas, referentes à vida do homem neste mundo. Não é meu propósito, nestas linhas, discorrer sobre essa controvérsia, que, a meu ver, está mal colocada: a Igreja de Cristo, neste mundo, é formada de pessoas e instituições concretas, histórica e socialmente situadas, com as quais ela exerce sua missão.
O papa Francisco, na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (A Alegria do Evangelho, 2013), aponta algumas questões às quais a Igreja precisa dar especial atenção se quiser cumprir bem a sua missão. Entre outras, destaca que a evangelização tem uma clara dimensão social e não pode contentar-se somente com a realização de ritos religiosos, sem repercussão na vida social.
Da adesão à fé cristã, quando verdadeira, decorre um compromisso social amplo e a adoração de Deus implica necessariamente o reconhecimento da dignidade de todo ser humano, amado e querido por Deus, bem como o esforço em prol da fraternidade e da justiça. Reconhecer Deus como criador e origem última das criaturas leva ao respeito por todas elas.
Até pode parecer novidade que o papa Francisco diga, de maneira tão explícita, que a evangelização possui uma dimensão social e o anúncio do Evangelho de Cristo tem inevitáveis implicações comunitárias. Francisco, no entanto, retoma conceitos já consolidados no ensino social da Igreja, com a clareza e a simplicidade que lhe são próprias, citando documentos de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI, dando-lhes novos destaques.
De fato, nada é mais antigo e originário no cristianismo do que os dois amores inseparáveis: a Deus e ao próximo. Desde os primórdios os cristãos aprenderam que "a fé sem as obras é morta em si mesma"; e que as obras da fé incluem sempre a prática do amor fraterno, a atenção aos pobres, aos doentes e aos desvalidos, sem exclusão de ninguém. Paulo, ao se confrontar com os outros apóstolos, para verificar se a sua pregação estava em sintonia com a deles, recebeu apenas esta recomendação: que não descuidasse dos pobres.
Não se trata apenas de levar assistência e socorro, sem dúvida indispensáveis para aliviar necessidades pontuais e imediatas dos pobres, mas de "ouvir o clamor dos pobres e socorrê-los", de para promover a sua inclusão social. Nem é missão reservada somente a algumas pessoas: é de todos os membros da Igreja, atuantes nas mais diversas áreas de suas competências profissionais e responsabilidades sociais. O papa convida a ir além de alguns atos esporádicos de generosidade e a formar uma nova mentalidade, uma cultura, superando o excessivo individualismo para pensar e agir solidariamente, tendo sempre presente o horizonte da comunidade e da grande família humana (cf. n. 188s).
"Precisamos crescer em solidariedade", ensina o papa Francisco, também no que diz respeito às relações entre os povos, nas quais a exacerbada defesa dos direitos individuais, ou das vantagens dos povos mais ricos, passa por cima do direito mais elementar à vida digna de populações e nações inteiras que continuam a viver na miséria e sem chances de sair dela. De maneira clara e corajosa, Francisco retoma o conceito da "destinação universal dos bens deste mundo" para todos os seus habitantes: "Respeitando a independência e a cultura de cada nação, é preciso recordar-se sempre de que o planeta é de toda e para toda a humanidade".
Usando palavras de seu predecessor Paulo VI (Octogesima adveniens, 23,1971), Francisco apela para os povos mais ricos, tocando numa questão melindrosa: "É preciso repetir que os mais favorecidos devem renunciar a alguns dos seus direitos, para colocar, com mais liberalidade, os seus bens ao serviço dos outros" (n. 190).
A opção preferencial da Igreja pelos pobres não tem motivação ideológica, nem implica a exclusão dos que não são pobres: ela tem sua origem e inspiração no exemplo e nas palavras do próprio Jesus e deverá ser traduzida em ações concretas de solidariedade para com os doentes, os pobres e todos os deserdados dos bens deste mundo; mas também na promoção da justiça social e no cuidado de todo ser humano despojado de sua dignidade. Acaso a Igreja poderia deixar de fazer isso e de convidar todos a fazerem o mesmo, como caminho para o bem comum e a paz?
A evangelização seria incompleta se não tomasse em consideração a constante interpelação recíproca constante entre o Evangelho e a vida concreta, pessoal e social (n. 181). Francisco adverte aqueles que, dentro ou fora da Igreja, pensam que deva a religião ficar reservada apenas aos espaços da vida privada: "Ninguém pode exigir de nós que releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocuparmos com a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciarmos sobre acontecimentos que interessam aos cidadãos" (n. 183).
Bem, e por que motivo os católicos não fazem isso? Não é que falte quem já o faça, mas, é verdade, temos muito pela frente! Entre o "dever fazer" e o "fazer" vai uma grande distância. Nada é automático na condição humana, nem também na vida dos crentes em Deus. O cristianismo apela, por princípio, à consciência e à liberdade humanas; graça divina e autonomia do homem são dois polos que precisam encontrar-se.
A palavra do papa Francisco, dirigida aos membros da Igreja, longe de ser triunfalista, é um chamado à realidade e à atitude consciente; a "alegria do Evangelho" é um bem para a comunidade humana inteira, não podendo ficar retida no coração dos fiéis: ela é "boa nova" para todos. Para os pobres, em primeiro lugar.
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