quinta-feira, julho 22, 2010

MÔNICA BERGAMO

REGIME JURÍDICO
MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SÃO PAULO - 22/07/10

A parceria da Nestlé com Lucilia Diniz entrou em crise. A empresária abriu um processo contra a companhia, responsável pela produção e distribuição dos produtos da linha Good Light, de baixa caloria, criada por ela. O valor da causa chegaria a R$ 20 milhões.
NADA A DECLARAR
Lucilia está nos EUA e não foi encontrada para comentar. A Nestlé confirma que foi acionada na Justiça, mas diz que, como a questão está "sub judice", não pode dar esclarecimentos adicionais.

NOSSO BOLSO
A Camargo Corrêa também foi procurada por interlocutores da Prefeitura de SP para estudar a viabilidade de construção de um estádio em Pirituba que pudesse abrigar a partida de abertura da Copa de 2014. Não se interessou. Depois dela, a Odebrecht também deu seu veredicto: erguer uma arena para o Mundial, tão grande e em tão pouco tempo, só seria possível se jorrasse dinheiro público na empreitada.
ROUPA NOVA
Além de renovar o visual com o cabeleireiro Celso Kamura, a presidenciável Dilma Rousseff (PT) está recebendo consultoria da personal stylist Tata Nicoletti na escolha das roupas que usa em eventos públicos e nas gravações dos programas de TV da campanha, que vão ao ar em agosto.
OFÍCIO ANTIGO
Tata, que já trabalhou em outras campanhas com o jornalista João Santana, que comanda o marketing da petista, também foi escalada por Duda Mendonça, no começo do governo Lula, em 2003, para cuidar do visual de Marisa Letícia. Foi ela a responsável pela adoção do estilo "terninho fino", de grifes como Lita Mortari e Max Mara, usado pela primeira-dama.
AOS POUCOS
E não são apenas as mulheres candidatas, como Dilma e Marina Silva (PV), que variaram os penteados e tentam melhorar o visual para a campanha. Orestes Quércia (PMDB-SP), candidato ao Senado em São Paulo, por exemplo, também retocou a pintura na cabeleira.

Sem exageros, no entanto: Quércia deixou alguns fios brancos aparecendo.
AGULHA MINIMALISTA
A estilista alemã Jil Sander, que já integrou a equipe da grife Prada, chega a SP na terça. Vai participar do salão de moda Inspiramais.
BOM RAPAZ
Jesus Luz, namorado de Madonna, doou uma jaqueta de couro da grife Dolce & Gabbana e uma camiseta com a palavra "Jesus" para o leilão em prol de um projeto de alfabetização na favela Paraisópolis. O lance mínimo para a peça será de R$ 5.000. O evento, organizado pelo cabeleireiro Wanderley Nunes, acontece no dia 16 de agosto, no Buddha Bar, com convites a R$ 500.
HABLE COMIGO
O cantor argentino Diego Torres desembarca em Salvador no sábado para conhecer Ivete Sangalo. Os dois se apresentarão juntos no show dela em NY, em setembro.
POR CAUSA DE VOCÊ
Roberto Carlos marcou para este sábado, data do aniversário do presidente da Sony Music, Alexandre Schiavo, a assinatura do novo contrato com a gravadora. O acordo prevê quatro discos -um deles o tão aguardado CD de inéditas- e três DVDs.
DA MODA
Fernanda Lima apresenta na semana que vem, no espaço de eventos do qual é sócia, em SP, uma coleção de roupas com seu nome. A apresentadora deu palpites nas 62 peças -camisetas, vestidos e jeans- que foram criadas para a grife Cantão.
PASSARELA EM CASA
O estilista Sergio K. reuniu amigos em seu apartamento nos Jardins, anteontem, para comemorar o lançamento de uma linha para uma loja de departamentos.

MINHA VIDA DE ARTISTA
O ator e diretor Emilio Di Biasi ganhou biografia da Coleção Aplauso, da Imprensa Oficial. A obra "Emilio Di Biasi - O Tempo e a Vida de um Aprendiz", de Erika Riedel, teve lançamento anteontem, na Livraria Cultura.

CURTO-CIRCUITO

A atriz Bete Coelho estreia amanhã, às 21h, no teatro Eva Herz, em SP, o monólogo "O Terceiro Sinal", adaptação de texto homônimo de Otavio Frias Filho, diretor de Redação da Folha.
Renato Kaufmann lança hoje o livro "Diário de um Grávido" (ed. Mescla Editorial), na Livraria Cultura do Conjunto Nacional, às 18h30.
O evento Wine Weekend, voltado ao mercado de vinhos, acontece de 19 a 22 de agosto no Jockey Club, com palestras, leilões e degustações.
Os DJs Zegon e Sanny Pitbull são as atrações da noite Mezcla, hoje, a partir das 22h, no Estúdio Emme. Classificação etária: 18 anos.
O músico Nuno Mindelis lança o CD "Free Blues" hoje, às 22h, no Ao Vivo Music. Classificação: 18 anos.
O empresário Gutti Camargo comemora aniversário com festa com discotecagem de Marc Hughes, hoje, a partir das 23h, na boate Kiss & Fly. Classificação etária: 18 anos.

GOSTOSA

CARLOS ALBERTO SARDENBERG

Lula e Geisel, crises anunciadas

Carlos Alberto Sardenberg
O Globo - 22/07/2010
 

O programa de grandes obras do governo Lula parece, sim, com o do regime militar iniciado no período do presidente Geisel.

São obras faraônicas, como eram, por exemplo, a Transamazônica, a Ferrovia do Aço e o programa de construção de nada menos que 12 usinas nucleares, entre outros projetos que ficaram pelo caminho.

São caríssimas já no lançamento e que ficam cada vez mais caras durante a execução.

O trem-bala, por exemplo, tornou-se mais caro ainda na fase do edital. Quando foi incluído no PAC, em 2008, custaria uns R$ 20 bilhões, seria licitado em 2009 e rodaria em 2014, a tempo da Copa.

Dois anos depois, o edital projeta um custo de R$ 33 bilhões um aumento de mais de 50% quando a coisa nem saiu do papel.

Não é estranhar que especialistas duvidem solenemente desse último preço. Como aliás duvidam do preço de outra megaobra, a usina de Belo Monte.

Como no programa do regime militar, o financiamento dessas obras é essencialmente do governo. É um sinal de que o equilíbrio econômico só existe com dinheiro público. As empresas privadas entram quase como contratadas para entregar determinados serviços, mas não colocam seu capital para correr o risco dos projetos.

Mesmo assim, podem se dar mal.

No período militar, várias empresas foram turbinadas pelas obras públicas, mas como não conseguiram ir além disso acabaram quebrando quando os projetos pararam.

E por que pararam? Por uma enorme crise nas contas públicas. Ou simplesmente, a moleza do dinheiro barato, pago pelos contribuintes, acabou.

O regime militar acreditou que o dinheiro barato do financiamento internacional, os petrodólares, estaria sempre à disposição. Quando foi embora, o Brasil, como outros países latinoamericanos, ficou com a dívida externa, as obras paradas e as empresas viúvas do Tesouro.

O governo Lula se baseia tanto no aumento da arrecadação de impostos quanto no financiamento internacional barato. Mas mesmo que essas condições permanecessem por muitos anos, os projetos de Lula têm problemas específicos de viabilidade e, no geral, exigem um esforço financeiro além da capacidade (e das necessidades) do país.

A proposta é na base do voluntarismo que atropela o próprio governo e suas estatais, passando por cima da análise técnica.

A Petrobras é um caso exemplar.

No último 9 de junho, em Natal, o presidente Lula disse que as refinarias de petróleo em construção no país não seriam feitas se a decisão dependesse da Petrobras. O parecer técnico da estatal, segundo o presidente, sustentava que as refinarias existentes já davam conta da demanda.

E esse é mesmo um ponto de vista bem espalhado não apenas no Brasil, mas no mundo de que há capacidade suficiente nas refinarias.

Mas Lula mandou fazer. Em Natal, disse que foi uma decisão de governo.
Mas algum tempo atrás, em entrevista ao jornal Valor Econômico, menos modesto, havia dito que ele mandara mudar os planos da Petrobras.
Segundo o presidente, as refinarias são necessárias para gerar atividade econômica no país e para a exportação.

Mas o que ocorre se o parecer técnico da Petrobras estiver correto, de que haverá excesso de capacidade? As refinarias ou não serão concluídas ou ficarão ociosas, em qualquer caso, dinheiro jogado onde não havia prioridade.

Em resumo, Lula está impondo enormes tarefas e, pois, investimentos ao governo e às estatais (como o caso da Eletrobrás com Belo Monte), que vão se endividar.

Mas, como no caso do regime militar, o problema aparece mais à frente.
Quem pagou pela crise foram os governos democráticos.
Lula certamente colocará a culpa nos derrotistas.

COBRANÇA
O presidente Lula reagiu com veemência às dúvidas levantadas acerca dos riscos da exploração de petróleo do pré-sal. A questão tinha a ver com o vazamento no Golfo do México, ocorrido em um poço de uma companhia, a BP, que até então tinha o prestígio de ser uma das melhores petrolíferas do mundo, cuidadosa com as questões ambientais.

Lula, porém, decretou que o pessoal lá era incompetente, ao contrário da Petrobras, que teria capacidade acima de qualquer dúvida. A propósito, leitores e ouvintes atentos lembraram de um outro momento em que Lula se fiou na capacidade da estatal brasileira.

Foi quando do acidente do Airbus da Air France, que caiu no Atlântico, costa brasileira. O presidente disse então que se a Petrobras achava petróleo a 5 mil metros, estava claro que os brasileiros saberiam encontrar a caixa preta do jato.

Não foi encontrada. Culpa dos franceses, por certo.

DONOS DO BOLSA FAMÍLIA
Sobre essa disputa em torno da autoria do Bolsa Família, convém observar alguns dados concretos, como diria o presidente Lula.

O programa foi criado pela Lei 10.836, de 9 de janeiro de 2004. No parágrafo do primeiro artigo se diz que o Bolsa Família tem por finalidade a unificação do Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e o Cadastramento Único, todos os quatro programas instalados no governo FHC.

A parte de Lula foi ampliar o número de beneficiários, além de elevar o valor das bolsas (e fazer uma certa vista grossa para as condicionalidades).

O mesmo vale para o salário-mínimo, que é também o piso do INSS. A política de elevação real do salário foi iniciada no momento mesmo do lançamento do Plano Real. De novo, Lula acelerou os aumentos e o gasto público.

DEMÉTRIO MAGNOLI

Os caçadores e o elefante
Demétrio Magnoli 
O Estado de S.Paulo - 22/07/10

Dois dias atrás, no meio da tarde, em cerimônia no Palácio do Itamaraty, Lula sancionou a primeira lei racial da História do Brasil. São 65 artigos, esparramados em 14 páginas, escritos com o propósito de anular o artigo 5.º da Constituição federal, que começa com as seguintes palavras: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza." O conjunto leva o título de Estatuto da Igualdade Racial, uma construção incongruente na qual se associa o princípio da igualdade ao mito da raça, que veicula a ideia de uma desigualdade essencial e, portanto, insuperável.

O texto anticonstitucional, aprovado em 16 de junho por um acordo no Senado, é uma versão esvaziada do projeto original. No acordo parlamentar suprimiram-se as disposições que instituíam cotas raciais nas universidades, no serviço público, no mercado de trabalho e nas produções audiovisuais. Pateticamente, em todos os lugares, exceto no título, o termo "raça" foi substituído pela palavra "etnia", empregada como sinônimo. Eliminou-se ainda a cláusula que asseguraria participação nos orçamentos públicos para os "conselhos de promoção da igualdade étnica", órgãos a serem constituídos paritariamente nas administrações federal, estaduais e municipais por representantes dos governos e de ONGs do movimento negro.

Mas o que restou é a declaração de princípios do racialismo. A lei define uma coletividade racial estatal: a "população negra", isto é, "o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas ou pardas". Dessa definição decorrem uma descrição racial do Brasil, que se dividiria nos grupos polares "branco" e "negro", e a supressão oficial das múltiplas identidades intermediárias expressas censitariamente na categoria "pardos". Implicitamente, fica cassado o direito de autodeclaração de cor/raça, pois o poder público se arroga a prerrogativa de ignorar a vontade do declarante, colando-lhe um rótulo racial compulsório. O texto funciona como plataforma para a edificação de um Estado racial, uma meta apontada no artigo 4.º, que prevê a adoção de políticas raciais de ação afirmativa e a "modificação das estruturas institucionais do Estado" para a "superação das desigualdades étnicas".

A fantasia que sustenta a nova lei consiste na visão do Brasil como uma confederação de nações-raças. Nessa confederação o princípio da igualdade deixaria de ser aplicado aos indivíduos, convertendo-se numa regra de coexistência entre coletividades raciais. Os cidadãos perdem o estatuto de sujeitos de direitos, transferindo-o para as coletividades raciais. Se o Poder 
Judiciário se curvar ao esbulho constitucional, estudantes ou trabalhadores da cor "errada" não poderão apelar contra o tratamento desigual no acesso à universidade ou a empregos arguindo o princípio da igualdade perante a lei, pois terão sido rebaixados à condição de componentes de um grupo racial.

Nos termos do estatuto racial, que é um estatuto de desigualdade, a "população negra" emerge como uma nação separada dentro do Brasil. O capítulo I fabrica direitos específicos para essa nação-raça no campo da saúde pública; o capítulo II, nos campos da educação, da cultura, do esporte e do lazer; o capítulo IV, nas esferas do acesso à terra e à moradia; o capítulo V, na esfera do mercado de trabalho; o capítulo VI, no tereno dos meios de comunicação. O pensamento racial imagina a África como pátria da "raça negra". A nova lei enxerga a "população negra" como uma nação diaspórica: um pedaço da África no exílio das Américas. O capítulo III determina uma proteção estatal particular para as "religiões de matriz africana".

A supressão do financiamento público compulsório para os "conselhos de promoção da igualdade étnica" e dos incontáveis programas de cotas raciais na lei aprovada pelo Senado refletiu, limitada e parcialmente, o movimento de opinião pública contra a racialização do Estado brasileiro. Uma vertente das ONGs racialistas interpretou o resultado como uma derrota absoluta - e pediu que o presidente não sancionasse o texto esvaziado. Surgiram até vozes solicitando uma consulta plebiscitária sobre o tema racial, algo que, infelizmente, não se fará.

O Ministério racial, que atende pela sigla enganosa de Seppir, entregou-se à missão de alinhar sua base na defesa do "estatuto possível". Para tanto reuniu pronunciamentos de arautos do racialismo, como o antropólogo Kabengele Munanga, uma figura que chegou a classificar os mulatos como "seres naturalmente ambivalentes", cuja libertação dependeria de uma opção política pelo pertencimento ao grupo dos "brancos" ou ao dos "negros". Na sua manifestação o antropólogo narrou uma fábula sobre os caçadores mbutis, da África Central, denominados pigmeus na época da expansão imperial europeia.

Os caçadores de Munanga almejam abater um elefante, mas voltam para a aldeia com apenas três antílopes, "cuja carne cobriria necessidades de poucos dias". As mulheres e crianças, frustradas, contentam-se com tão pouco e não culpam os caçadores, mas Mulimo, deus da caça, a divindade desse povo monoteísta. Os caçadores voltarão à savana e, um dia, trarão o elefante.

A fábula é apropriada, tanto pelo seu sentido contextual como pelas metáforas que mobiliza. Ela remete a um povo tradicional, fechado nas suas referências culturais, que serviria como inspiração para a imaginária nação-raça diaspórica dos "afro-brasileiros". Os caçadores simbolizam as lideranças racialistas, que já anunciam a intenção de usar o estatuto racial para instituir, por meio de normas infralegais, os programas de cotas rejeitados no Senado. O elefante representa o Estado racial completo, com fartas verbas públicas para sustentar uma burocracia constituída pelos próprios racialistas e dedicada à distribuição de privilégios.

Munanga não falou das guerras étnicas na África Central. É que o assunto perturba Mulimo e prejudica a caçada.

SOCIÓLOGO, É DOUTOR EM GEOGRAFIA HUMANA PELA USP

GOSTOSA

MARCIA DE HOLANDA MONTENEGRO

A eterna ciranda
Marcia de Holanda Montenegro 
O Estado de S.Paulo - 22/07/10

Retoma-se a discussão recorrente sobre a necessidade da reforma da legislação de combate às drogas no País. Vozes de prestígio levantam, às vésperas da eleição majoritária, a bandeira da descriminação do uso de drogas - tese que, relançada, parece tomar corpo e expressão nos jornais.

Em verdade, estamos perdendo a guerra para o narcotráfico - que tem o Brasil como grande mercado consumidor e rota para a Europa e os Estados Unidos.

Uma das consequências do ineficiente combate tem sido o aumento constante do número de usuários. A solução de alguns especialistas é aparentemente simples: descriminar a conduta do uso próprio de drogas, mesmo que hoje os simples usuários já não sejam condenados à pena privativa de liberdade. Algumas propostas sugerem tornar atípica apenas a conduta do uso da maconha, droga considerada leve, enquanto outras teses mais ousadas propõem a descriminação dos entorpecentes em geral.

Não há dúvida que o Brasil nunca combateu com eficácia o uso e o comércio das drogas. O aparato repressivo do Estado esteve sempre aquém do andar da carruagem dos narcotraficantes. O crime organizado instalou-se com facilidade no País e tem crescido em berço esplêndido.

Entretanto, o narcotráfico jamais se desenvolveria com o vigor que exibe, não fosse o combate capenga à lavagem de dinheiro - crime que lhe dá sustentação e sem o qual não sobrevive.

Por outro lado, dados divulgados pelo Ministério da Justiça e publicados recentemente por este jornal mostram que cerca de 90% dos traficantes condenados são pequenos varejistas, aqueles que se expõem nas ruas, nas portas das escolas, em praças, bares, botecos de periferia e nas entradas de favelas para realizar a transação com os usuários. As prisões, concentradas nesses pequenos criminosos, ainda que profiláticas, em nada afetam a alta organização do narcotráfico, que permanece intocada. Parte desse contingente, que engorda as estatísticas da máquina repressiva, é de traficantes eventuais, os não-profissionais, surpreendidos nas transgressões entre amigos em casa, em bares, em festas, no interior de veículos, etc.

Minha experiência de mais de uma década no Fórum Criminal da capital, que recebe os inquéritos policiais de tráfico, instaurados nas delegacias de polícia da cidade e no departamento especializado, confirma os dados do Ministério da Justiça. De fato, o grosso dos traficantes investigados e condenados é inexpressivo diante da organização criminosa que os mobiliza e recruta, posto que facilmente substituídos.

Com a prisão dos varejistas o narcotráfico não se desestabiliza, ainda que sejam eles imprescindíveis ao êxito do negócio, responsáveis que são pelo abastecimento dos consumidores de rua, pelo crescimento das vendas e, em consequência, pelo aumento do número de usuários e dependentes. (E há quem defenda dever ser atípica a conduta dos pequenos traficantes.)

Presos os pequenos traficantes, outros surgem nas ruas, repostos pela organização criminosa. Presos, processados, condenados e novamente substituídos... É um enxugar constante de gelo, sensação que toma parte de muitos profissionais do Direito, comprometidos com a defesa da sociedade.

Os varejistas desconhecem quem são os grandes distribuidores de drogas e os responsáveis pelo fabrico e pela movimentação do entorpecente pelo País, e assim deve ser para que a empresa não quebre. Conhecem apenas o distribuidor imediato, que na maior parte das vezes também não é identificado. Com a prisão dos soldados não se chega aos oficiais do tráfico. As interceptações telefônicas que buscam a identificação e prisão de megatraficantes, na maior parte das vezes, fracassam.

Quando, em operações excepcionais, algum "chefão" é preso, não se duvida possa ele continuar a comandar a empresa criminosa de dentro da prisão.

A venda e o consumo de drogas, notadamente o crack - a cocaína dos pobres -, barato e de efeito devastador, crescem entre os jovens. O Estatuto da Criança e do Adolescente - lei de Primeiro Mundo na intenção de reeducar e ressocializar menores infratores - parece divorciado da nossa realidade social. Mas também não se pode esperar que a eficácia das medidas socioeducativas impostas aos jovens traficantes e usuários dependa unicamente da lei e de seus aplicadores.

Muitos desses jovens infratores se convertem em traficantes depois de adquirirem o vício. Dependentes da droga que comercializam, atados estão à profissão ilegal, que muitas vezes passa de pai para filho.

Num país em que a educação não chega a parte expressiva da população; em que o desemprego e os baixos salários - com ou sem crise - estão presentes; em que a legislação penal, quando rígida, leva a interpretações benéficas aos criminosos nas altas Cortes; em que o alvo principal das investigações são os traficantes de rua, falar em descriminação do uso de drogas é desviar o foco do problema.

Num país que tem dificuldade de acabar com a Cracolândia, instalada há anos nesta capital (apenas a tirada de circulação dos traficantes varejistas e dos usuários que ali ficam tem gerado novos varejistas e o retorno dos usuários ou, na melhor das hipóteses, a mudança geográfica de ambos), em que a desigualdade social cresce de forma alarmante, com famílias inteiras fazendo das ruas sua morada - como se vê até mesmo em bairros nobres da cidade de São Paulo, como Higienópolis e Pacaembu -, o prognóstico é o pior possível.

O combate ao tráfico e ao uso de entorpecentes não se resolve com a simples alteração da legislação. É oportuno citar a mensagem contida no editorial Ação policial na Cracolândia, publicado pelo Estado no dia 1.º de março (A3): a questão é complexa e as autoridades públicas precisam se entender.

PROCURADORA DE JUSTIÇA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO

Brasil alcança França em produção de asfalto
Maria Cristina Frias

Folha de S.Paulo - 22/07/2010

A produção de asfalto no Brasil segue em alta. Alcançou 2,7 milhões de toneladas nos últimos 12 meses e 270 mil toneladas em junho.
Com tais números, o Brasil acaba de ultrapassar a França. O cenário, no entanto, ainda está distante do considerado razoável, de acordo com Manuel Rossitto, diretor do Sinicesp (Sindicato da Indústria da Construção Pesada de São Paulo) e coordenador do grupo de vias da Fiesp, responsável pelo levantamento.
"O território francês inteiro equivale ao Estado de São Paulo. O Brasil é muito mais extenso, porém, só agora se equiparou à França na produção de massa asfáltica", afirma Rossitto.
Com o avanço das obras de infraestrutura, o consumo de asfalto no Brasil atingiu níveis recordes e, no ano passado, o país necessitou importar mais material para suprir a demanda.
"Hoje, a Petrobras, principal fornecedora desse produto, já consegue lidar com a necessidade de importação. Não paramos mais obras por carência de asfalto", afirma o especialista.
A demanda da região Nordeste é hoje constantemente suprida por importação, segundo ele. As refinarias do país abastecem Sul e Sudeste com eficiência.
Rossitto afirma que nas rodovias federais o setor tem caminhado com rapidez e conseguido executar os orçamentos. A carência está nos projetos municipais de pavimentação rural e urbana.
"O que está desacelerado agora são os projetos municipais, que precisam de um programa de gestão de recursos mais bem definido", diz.

PÉTALAS

A designer floral Fatima Casarini, uma das idealizadoras da Flores Online, lança no final deste mês uma nova loja virtual voltada para o mercado de luxo.
O foco é a exclusividade. "O projeto saiu da necessidade dos clientes que me pediam arranjos personalizados e requintados, com algo diferente do que viam no mercado", diz Casarini.
O loja irá disponibilizar flores raras e exóticas, como a orquídea Cymbidium pendente de flores marrons, que está disponível no mercado apenas por 20 dias do ano. A orquídea Vanda, da Ásia, pode ser encomendada por R$ 430 e um arranjo de tulipas em vaso de cristal, por R$ 416. "O segmento de luxo estava carente de propostas que unissem exclusividade às facilidades do e-commerce", diz ela.

Cai o superavit comercial do Brasil com a União Europeia

O aumento das importações de produtos da União Europeia pode levar o Brasil a se aproximar de ter um deficit com o bloco, formado hoje por 27 países.
O Brasil acumula superavit de 300 milhões de janeiro a abril deste ano, segundo dados europeus. No mesmo período do ano passado, a vantagem brasileira era maior, de 2,2 bilhões.
A queda no superavit ocorre porque as vendas brasileiras para a União Europeia não conseguiram acompanhar o ritmo de crescimento das importações.
Entre janeiro e abril deste ano, o bloco teve aumento de 46% nas exportações para o Brasil, enquanto a via contrária de comércio se expandiu em 11% nesse período.
Os dados oficiais europeus mostram que produtos brasileiros como manufaturados e matérias-primas estão perdendo espaço na pauta de importações da região.
Em 2008, o Brasil representava 2,29% de tudo que a União Europeia comprava de países fora do bloco econômico. Esse número caiu para 2,13% no ano passado e agora está em 2,08%.

Política verde Ações e serviços públicos devem ser planejados de acordo com a realidade da população e da região onde serão implementados. Essa é a abordagem do livro "Políticas Públicas e Indicadores para o Desenvolvimento Sustentável (editora Saraiva, 178 páginas), organizado pelos pesquisadores Christian Luiz da Silva e José Edmilson de Souza-Lima. A obra mostra como planejar e executar políticas públicas municipais com recursos naturais sem prejudicar o ambiente e a saúde e evitando problemas ecológicos.

Hortifrúti O volume financeiro comercializado nos entrepostos da Ceagesp cresceu 11% no primeiro semestre deste ano, somando R$ 2,81 bilhões. No entanto, a quantidade de frutas, legumes, verduras e pescados negociada permaneceu praticamente estável. Foram 1,92 milhão de toneladas nos primeiros seis meses do ano, ante 1,93 milhão no mesmo período de 2009.

Cesta... A Ceagesp teve resultado positivo no primeiro semestre deste ano. Com alta de 27,7% ante o mesmo período de 2009, o volume geral de entrada de produtos nas 19 unidades ativas da rede atingiram 443,89 toneladas.

...básica Entre os produtos que mais se destacaram, o açúcar, com aumento de 68%, atingiu 201,54 mil toneladas. O milho, com alta de 60%, chegou a 68 mil toneladas. Juntos, os valores dos dois itens representam mais de 60% do volume total de entradas no primeiro semestre. A soma dos demais produtos recebidos pelos armazéns foi de 174 mil toneladas.

TIRO DE META

Poucos dias após o final da Copa do Mundo, os preços de TVs de LCD caíram, segundo levantamento do site de comparação de preços BuscaPé. Alguns aparelhos podem ser encontrados com diferenças de preço de quase R$ 150 depois da Copa, como a TV LG Flatron LCD IPS tela plana de 26 polegadas, que poderia ser comprada por R$ 1.148 em maio e agora é vendida por R$ 999, diferença de 15%, de acordo com a pesquisa. Outro exemplo é a TV Philips LCD de tela plana com 42 polegadas, que caiu 11%.

No clima A Fiesp levantará os custos para a indústria brasileira da adaptação e mitigação dos efeitos das mudanças climáticas. O estudo responde a pedido do México, que busca um novo acordo global do clima na COP-16, conferência da ONU marcada para novembro, em Cancún.

Repeteco Sérgio Aredes foi reeleito para a presidência do Sindicel (Sindicato da Indústria de Condutores Elétricos, Trefilação, Laminação de Metais Não Ferrosos) para o triênio 2010-2013. Aredes espera aumento de 10% no setor do cobre para este ano. Em 2009, o faturamento do setor foi de R$ 7 bilhões e a produção, de 411 mil toneladas.

Maré... Das 22 cidades brasileiras que serão visitadas pelos navios da temporada de cruzeiros 2010/2011, dez estão na região Sudeste. Três delas estão no Estado de São Paulo, de acordo com levantamento realizado pela Abremar (Associação Brasileira de Cruzeiros Marítimos).

...cheia Santos, Ilhabela e Ubatuba devem receber 985 mil turistas até maio do ano que vem, aumento de 6% em relação à última temporada. "Levando em conta que cada turista gasta a média de R$ 200 na cidade escala, a região terá a sua economia incrementada em R$ 197 milhões", afirma Ricardo Amaral, presidente da entidade.

GOSTOSA

CLÓVIS ROSSI

O risco do fiscal da esquina
CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SÃO PAULO - 22/07/10

SÃO PAULO - Duas coisas incomodam muito nesse episódio da violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge Caldas Pereira, o vice-presidente do PSDB. Uma é a óbvia: a inescapável sensação de que funcionários do Estado sentem-se à vontade para agir sordidamente.
Afinal, ninguém vai conseguir convencer ninguém, salvo os petistas hidrófobos, de que o acesso aos dados se deu por mera curiosidade ou para que a funcionária agora exposta os exibisse para a família. O objetivo, evidente, foi o de lançar sujeira na campanha eleitoral.
Objetivo, de resto, atingido, independentemente do que venha a acontecer com a funcionária: os dados tornaram-se públicos e a única coisa que a vítima da violência do Estado pode fazer é reclamar, protestar, denunciar.
O segundo incômodo está dado pela constatação de que qualquer um pode acessar dados sigilosos sob guarda do Estado.
Afinal, a investigação aberta pela própria Receita descobriu que foram feitos ao menos cinco acessos ao imposto de renda de Eduardo Jorge, mas apenas a consulta atribuída à funcionária agora afastada ocorreu sem "motivação", ou seja, fora de procedimentos de rotina do fisco e sem autorização judicial.
Primeiro: autorização judicial deveria ser a única maneira de a Receita ter acesso a dados de quem quer que seja. Aceitar que a violação faça parte de "procedimentos de rotina do fisco" é abrir uma autoestrada imensa para todo tipo de criminalidade, eleitoral ou de qualquer outra natureza.
Não dá para acreditar que todos os agentes fiscais sejam imunes à tentações, sejam os mais honestos seres humanos na face da Terra. Não existe um único conjunto humano com essas características.
Vale nesse caso o que se diz de ditaduras: o problema é menos o general que a chefia e mais a arbitrariedade do guarda da esquina. Ou, no caso, do fiscal da esquina.

PAINEL DA FOLHA

Mão dupla
RANIER BRAGON (interino)
FOLHA DE SÃO PAULO - 22/07/10

O vazamento do nome da analista que teria acessado os dados fiscais do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge Caldas, provocou reações adversas na aliança “demo-tucana”. No comando da campanha de José Serra, a notícia foi comemorada, já que dá fôlego ao tema do dossiê montado por integrantes da campanha de Dilma Rousseff (PT). Em Brasília, entretanto, lideranças de PSDB e DEM receberam telefonemas de Everardo Maciel, ex-secretário da Receita no governo FHC, defendendo que poderia se tratar de “pista falsa” e que a analista não teria ligação com o PT - na listagem atualizada do TSE, o nome completo dela não figura como filiada a partido político. 
GPS - Para rebater críticas de aliados sobre a imprevisibilidade da agenda de José Serra, o site de campanha do tucano criou um banner intitulado “Hoje o Serra está”. Mas quase sempre as informações estão atrasadas. 
Corrente - Para quem se registra no site, a campanha de Serra envia e-mail pedindo para que sua biografia seja repassada a quatro pessoas que o conhecem pouco. 
Aparato Grades de ferro foram dispostas no saguão do hotel por onde Dilma Rousseff (PT) passou anteontem, em Uberlândia, separando-a dos jornalistas e do público. A assessoria informou que o objetivo era organizar a entrevista que, no final, acabou se resumindo a uma rápida declaração. 
Crachá - Na mesma ocasião, a campanha de Dilma pediu aos jornalistas credenciamento prévio para acompanhá-la na caminhada de rua. Assessores argumentaram que a intenção era facilitar o acesso a ela. 
Bombeiro - Vice de Dilma, Michel Temer (PMDB) telefonou ontem a petistas para minimizar declaração dada ao “Valor” segundo a qual participará do “diálogo” para a formação do governo, caso vençam, devido ao fato de presidir “um partido grande, forte e importante”. 
Espelho - Sob o título “Um ministério para as micro e pequenas empresas”, o Blog do Planalto noticiou ontem que Lula defende a criação da pasta pelo seu sucessor. Dois detalhes: a proposta é uma das principais promessa da campanha de Dilma na área econômica - e a reunião em que Lula teria feito o comentário, ontem, foi fechada à imprensa. 
Preposto - Moreira Franco deixa a Caixa Econômica Federal na próxima semana para se integrar ao comando da campanha de Dilma. Em princípio ele cuidará da mobilização de congressistas e prefeitos peemedebistas.
Fala... - A direção do Vox Populi dissecou na reunião da coordenação da campanha de Dilma, ontem, os números de pesquisa encomendada pelo PT ao instituto que aponta a petista sete pontos à frente de Serra. 
... que eu te escuto - Assim como nas últimas ocasiões, José Dirceu estava presente na reunião da coordenação dilmista. 
Green - O staff de Marina Silva (PV) levou na bagagem a Nova York mil exemplares do programa de governo da candidata, com textos em inglês e português. 
Tiroteio
O José Alencar já até defendeu que o Brasil tenha a bomba atômica. E nem por isso ele explodiu com o Lula. 
DO DEPUTADO ACM NETO (DEM-BA), lembrando antiga declaração do vice-presidente sobre posse de armas nucleares, na tentativa de minimizar a polêmica envolvendo declarações do vice de Serra, Indio da Costa (DEM).
Contraponto
Causa e efeito 
Na cerimônia de sanção do Estatuto da Igualdade Racial, anteontem, Lula abordou a polêmica sobre o projeto que visa proibir castigo físico contra crianças afirmando que violência não ajuda ninguém. 
- Se fosse o contrário, os bandidos teriam asinhas de anjo, de tanto que apanham -, afirmou, contando em seguida ser do tempo da aplicação de “régua na cabeça”, nos colégios. 
- Acho que é por isso que o meu pescoço nem cresceu, de tanta “reguada” que eu tomei.

RONALDO RAMOS LARANJEIRA e ANA CECILIA PETTA ROSELLI MARQUES

Maconha, o dom de iludir
RONALDO RAMOS LARANJEIRA e ANA CECILIA PETTA ROSELLI MARQUES
FOLHA DE SÃO PAULO - 22/07/10

Que nem pesquisadores nem a população se iludam de que exista indicação terapêutica para utilizar maconha que já seja aprovada pela ciênc
ia


Semanas atrás, a Folha noticiou a proposta de criar-se uma agência especial para pesquisar os supostos efeitos medicinais da maconha, patrocinada pela Secretaria Nacional Antidrogas do governo federal.
Esse debate nos dias atuais, tal qual ocorreu com o tabaco na década de 60, ilude sobretudo os adolescentes e aqueles que não seguem as evidências científicas sobre danos causados pela maconha no indivíduo e na sociedade.
Na revisão científica feita por Robim Room e colaboradores ("Cannabis Policy", Oxford University, 2010), fica claro que a maconha produz dependência, bronquite crônica, insuficiência respiratória, aumento do risco de doenças cardiovasculares, câncer no sistema respiratório, diminuição da memória, ansiedade e depressão, episódios psicóticos e, por fim, um comprometimento do rendimento acadêmico ou profissional.
Apesar disso, o senso comum é o de que a maconha é "droga leve, natural, que não faz mal".
Pesquisas de opinião no Brasil mostram que a maioria não quer legalizar a droga, mas grupos defensores da legalização fazem do eventual e ainda sem comprovação uso terapêutico de alguns dos componentes da maconha prova de que ela é uma droga segura e abusam de um discurso popular, mas ambivalente e perigoso.
O interesse recente da ciência sobre o uso da maconha para fins terapêuticos deveu-se à descoberta de que no cérebro há um sistema biológico chamado endocanabinoide, onde parte das substâncias presentes na maconha atua.
Um dos medicamentos fruto dessa linha de pesquisa, o Rimonabant, já foi retirado do mercado, devido aos efeitos colaterais. Até hoje há poucos estudos controlados, com amostras pequenas, e resultados que não superam o efeito das substâncias tradicionais, que não causam dependência.
Estados americanos aprovaram leis descriminalizando o uso pessoal de maconha, que é distribuída sem controle de dose e qualidade.
Contradição enorme, pois os médicos são os "controladores do acesso" para uma substância ainda sem comprovação científica.
De outro lado, orientam os pacientes sobre os riscos do uso de tabaco. Deve-se relembrar que os estudos versam sobre possíveis efeitos terapêuticos de uma ou outra substância encontrada na maconha, não sobre a maconha fumada.
Os pesquisadores brasileiros interessados no tema devem realizar mais estudos por meio das agências já existentes, principalmente diante do último relatório sobre o consumo de drogas ilícitas feito pelo Escritório para Drogas e Crime das Nações Unidas, que aponta o Brasil como o único país das Américas em que houve aumento de apreensões e consumo da maconha.
E se, no futuro, surgir alguma indicação para o uso medicinal da maconha, o processo de aprovação, que ainda não atingiu os padrões de excelência, deve contextualizar esse cenário, assim como o potencial da maconha de causar dependência.
Espera-se que a política nacional sobre drogas seja redirecionada em caráter de urgência, pois enfrenta-se também aqui o aumento das apreensões e consumo de cocaína e crack, que exige muitos esforços e recursos para sua solução.
Que nem pesquisadores nem nossa população se iludam de que exista hoje uma indicação terapêutica para utilizar maconha aprovada pela ciência.
RONALDO RAMOS LARANJEIRA é professor titular de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador do Instituto Nacional de Políticas sobre Álcool e Drogas (Inpad/CNPQ).
ANA CECILIA PETTA ROSELLI MARQUES, doutora pela Unifesp, é pesquisadora do Inpad/CNPQ.

SONIA RACY - DIRETO DA FONTE

O cerco continua 
Sonia Racy 

O Estado de S.Paulo - 22/07/2010 

O TSE está desconfiado. Pediu ao Conselho Nacional de Justiça a lista dos 14.900 cartórios brasileiros. Decidiu investigar se eles estão doando dinheiro para os candidatos nas eleições, o que é proibido por lei.
Na pessoa física, os donos dos cartórios podem fazê-lo. Mas na jurídica, não.


Concentração?
Depois da venda da Iuni Educacional para a Kroton e do Sistema Anglo de Ensino para a família Civita, vêm aí mais negociações na área de educação.
Uma delas é a venda do Grupo Universitário Maurício de Nassau, sediado em Recife.

Tentar não ofende
O Movimento Nossa São Paulo elabora proposta para federalizar a Lei do Programa de Metas, que hoje vigora na capital paulista.
Em São Paulo, o prefeito é obrigado a apresentar metas para sua gestão de acordo com as promessas da campanha eleitoral. E prestar contas a cada semestre. Kassab é o primeiro a fazê-lo.

Intimista
Ricardo Teixeira, da CBF, justifica não ter levado técnicos para a reunião com Alberto Goldman e Kassab, ontem, em São Paulo.
O governador teria pedido a ele algo menor, informando que chamaria apenas o secretario Francisco Luna.

Cera
Foi adiada, mais uma vez, a decisão se Maradona fica ou não na seleção argentina. O empecilho desta vez é a visita que o ex-craque fez a Chávez.

Sem afogadilho
Independentemente se vai ou não vencer o Pan Pacífico, dia 18, nos Estados Unidos, Cesar Cielo está arriscado a morrer na praia quando voltar a treinar no Rio de Janeiro.
O nadador do Flamengo dará de cara com uma piscina em plena reforma.

Sabedoria
Textos acadêmicos de Ruth Cardoso serão reunidos em um único livro por sua orientanda Teresa Caldeira, hoje professora da Universidade de Berkeley.
Esperando a aprovação do Ministério da Cultura, para entrar na Lei Rouanet, Ruth Cardoso - Obra Reunida abraça a trajetória intelectual da reconhecida socióloga.

Prenúncio
O PT não gostou do pito geral de Dilma Rousseff durante reunião no quartel general do partido, no Hotel Imperial, em Brasília, na semana passada.
Ela não se limitou a criticar a troca de programas entregue ao TSE indo além. Questionou também os pontos polêmicos do programa original do PT.

Prenúncio 2
Dilma ouviu de Zé Eduardo Dutra que o documento foi aprovado durante o congresso nacional do partido, ao que a candidata reclamou: "O PT não compreende o governo Lula".
Pelo que se apurou, José Eduardo Cardozo fez "cara de paisagem", enquanto Marco Aurélio Garcia, coordenador de programa de governo, falou em...contrabando de informação.

No papel
Foi batizada de Odebrecht-EADS Defesa e Segurança, a empresa que resultará da joint-venture criada pelos dois grandes grupos para atuar a partir de São Paulo.
De olho no enorme programa de reorganização das Forças Armadas e no mercado exportador.

Quem vem
Já tem nome e sobrenome o novo embaixador do Iraque no Brasil: Baker Fattar Hussen, que estava na chancelaria em Bagdá. Será recebido por Lula dia 5. O posto estava vago há 15 anos.

Na frente

Foi puro sucesso a inauguração da mostra de Wesley Duke Lee, terça, na Pinakotheke Cultural do Rio. Com grandes nomes das artes plásticas e do Grupo Rex, importante coletivo de crítica do sistema de arte dos anos 60.

Upgrade: o queijo de Minas é mote, em Londres, de palestra hoje de Ângela Gutierrez, promovida pela Unesco.

Andrucha Waddington está em SP. O diretor pega Jorge Drexler hoje no aeroporto para gravar clipe de seu longa Lope.

Dirigida por Plácido Domingo, a Orquestra Jovem das Américas (YOA) chega a SP, dia 9. Para única apresentação no Teatro Bradesco.

Bruno Bomeny recebe Penny Ballem, city manager de Vancouver, para palestrar sobre as Olimpíadas. Dia 26, no WTC.

Será com participação inédita da Orquestra Sinfônica Brasileira a trilha sonora de Nosso Lar, longa baseado no livro de Chico Xavier.

Geyse Arruda, a loira da Uniban, atacará de DJ. Domingo, no Sonique.
Trocadilho gaiato postado no falso Twitter do candidato tucano: "Serra treme sempre que seu vice versa".

GOSTOSA

DORA KRAMER

Expressão de vontade 
Dora Kramer 

O Estado de S.Paulo - 22/07/2010

No geral o eleitorado cresce, mas o registro de jovens (16 e 17 anos) votantes decresce. Eles eram 2,5 milhões na última eleição presidencial, quando havia 125,9 milhões de eleitores no Brasil, e são 2,3 milhões agora, quando há 135,8 milhões de pessoas aptas a votar no País.

A primeira e mais óbvia explicação que nos ocorre é o desinteresse motivado pela desqualificação da mão de obra do ramo: quanto menos confiança inspira a atividade política, mais afastados tenderiam ficar os jovens.

Mas por que só os jovens e não os eleitores como um todo?

É o tipo da pergunta que não se pode responder apenas pelo exame dos registros da Justiça Eleitoral, porque adolescentes de 16 e 17 foram autorizados a votar a partir da Constituição de 1988, mas o direito é facultativo. Nessa idade só vota quem quer.

Dos 18 aos 70 anos de idade (a propósito, entre os setentões o eleitorado cresceu de 5,5 milhões em 2006 para 6,2 milhões em 2010) o voto é obrigatório; o registro, portanto, compulsório.

Pelo critério aplicado aos jovens de 16 e 17 anos fica impossível saber se o desinteresse se estende, ou não, a outras faixas etárias, classes sociais e níveis de escolaridade.

Saber ninguém sabe ao certo o motivo da redução de eleitores entre os adolescentes. Culpar a torpeza dos políticos e a inépcia dos partidos é sempre mais fácil. Inclusive porque pode realmente ser um dos fatores, senão o principal.

Talvez valesse a pena perguntar a eles numa pesquisa específica. Na consulta empírica a (des)motivação varia, mas não varia muito: uns dizem que não têm paciência de pensar no assunto, outros alegam que não há estímulo temático ou pessoal.

Ou seja, a agenda em pauta não é estimulante e os candidatos também não justificam "o trabalho" de prestar atenção no tema, escolher um deles e no dia determinado ir até a seção eleitoral para votar.

Note-se um aspecto não explorado dessa questão: para o bem ou para o mal, a expressão de vontade é um dado essencial na discussão sobre o voto do adolescente, coisa que não é levada em conta no voto dos demais. O mesmo ocorre com os maiores de 70 anos.

Argumenta-se que o voto deve ser obrigatório porque o dever cívico é um imperativo sem o qual a democracia correria o risco de sucumbir à ilegitimidade, pois "o brasileiro" não teria condições de discernir sobre a importância do exercício desse direito e tenderia a se ausentar em massa. Faltaria acrescentar ao arrazoado "por preguiça".

Traça-se também um paralelo entre o voto e o pagamento de impostos. Se este é obrigatório aquele também deve ser, diz-se.

Pois bem, mas a faixas em tese economicamente não ativas e, no caso dos púberes, ainda não amadurecidas sob vários aspectos (o cívico inclusive) é conferida a prerrogativa da escolha.

Um contrassenso.

Conviria pesquisar se a maioria do eleitorado (126,5 milhões, descontados os jovens de 16 e 17 anos e os adultos entre 70 e 79 anos de idade) também não estaria profundamente desinteressada em participar da política, por meio de eleições, em virtude da pobreza da temática e do desempenho da mão de obra à disposição no mercado.

Se o voto fosse facultativo para todos isso poderia ser medido tal como se mede agora o grau de envolvimento dos adolescentes. Registradas quedas, provavelmente partidos e políticos ver-se-iam na obrigação de melhorar e estaria, portanto, estabelecida uma relação mais justa entre o direito de votar e o dever de merecer ser eleito.

Nisso se insere - em lugar de absoluto destaque, registre-se - a decisão dos candidatos de participar ou não de debates. Nesse assunto, e em vários outros, mandam os marqueteiros: reza a norma deles que quem está na frente nas pesquisas, não é bom de serviço na arte da comunicação ou não tem suficiente preparo para enfrentar um embate não deve se arriscar a um acidente de percurso.

Perfeito. Mas e o eleitor entra onde? Na obrigação de comparecer em 3 de outubro?

O ideal seria que pudesse escolher só votar mediante o estabelecimento de uma relação mais justa entre o direito de escolher e a obrigação de merecer ser eleito.

ANCELMO GÓIS

Festa em Nova York 
Ancelmo Góis 

O Globo - 22/07/2010

Um conhecido corretor de imóveis em Nova York estima em US$ 400 milhões os gastos de brasileiros com compra de apartamentos na cidade em 2010.

Um empresário do setor de cosméticos pagou US$ 19 milhões por um apartamento no Central Park South.

Pró-Memória

Em 2005, depois que a “Veja” publicou que o PT teria recebido US$ 5 milhões das Farc, o então deputado Zé Dirceu teve um encontro no Rio, a caminho de Juiz de Fora, onde ia se reunir com o ex-presidente Itamar.

No encontro, Dirceu negou que a direção petista tivesse recebido a grana. Mas disse que sabia que as Farc enviaram dinheiro para candidatos do PT no Pará e no interior de São Paulo.

Dia do amigo lojista

Veja só. As vendas na rede de lojas Leader, terça, por causa desse tal Dia do Amigo, cresceram 15% em relação ao mesmo dia do ano passado.

Jogo de abertura

Brasília e Minas Gerais, além de São Paulo, são, como se sabe, cotados para o jogo de abertura da Copa de 14.

Aliás, Ricardo Teixeira visita terça as obras do Mané Garrincha em Brasília e, no dia seguinte, as do Mineirão.

L & L

Dia 30 agora, os presidentes Lula e Lugo se encontram em Villa Hayes, no Paraguai.

Vão lançar a pedra fundamental de uma fábrica de cimento da Camargo Corrêa, que produzirá cerca de 400 mil t por ano.

Criança não vota

A conta é de Marcelo Neri, o economista das análises sociais.

A taxa de pobreza (isto é, a parte do povo com renda por pessoa abaixo de R$ 140 por mês) entre quem tem mais de 60 anos é de 4,2% da população.

Se não houvesse a previdência social, a pobreza subiria 10 vezes, chegando a 46,9%.

Já a taxa de pobreza entre as crianças até 4 anos é hoje de 28,3%, já incluindo a Bolsa Família da mãe, o salário do pai e a aposentadoria dos avós. Neri conclui: “Fizemos muito pelos idosos e pouco pelas crianças.”

Casa do Trabalhador

O Ministério do Trabalho abre dia 31 escritório piloto da Casa do Trabalhador Brasileiro em Hamamatsu, no Japão.

É para atender os 265 mil patrícios em questões trabalhistas na Justiça japonesa.

Segue...

A próxima casa deve ser no Amapá, para cuidar dos 20 mil garimpeiros que atuam na vizinha Guiana Francesa.

Sou Rio

Todo o material promocional da coleção de verão da Totem, grife carioca de Fred D’Orey, está sendo recolhido.

Em maio, a grife lançou a coleção com o slogan “Sou Rio”, mesmo slogan que Fernando Gabeira acaba de lançar em sua campanha política.

Como Fred não quer dar conotação política à grife, prefere ficar com o prejuízo.

Cor do mar

A Portela vai falar sobre navegação em 2011.

O título do enredo será “Rio, azul da cor do mar”.

Coisa civilizada

Ontem, em audiência na 5aVara de Família do Rio, Romário e Mônica Santoro, através de seus advogados, resolveram dar uma trégua na Justiça.

Vão tentar chegar a um acordo para pôr um ponto final em trinta processos. Tomara.

Convém sonhar

Ficou pronto pela Record o livro “Convém sonhar”, que reúne as crônicas mais marcantes da jornalista Míriam Leitão ao longo de duas décadas.

O lançamento é hoje, às 19h, na Livraria Argumento, na Rua Dias Ferreira, no Leblon, Rio.

Vote em mim

A atriz Myriam Rios, ex-Roberto Carlos, lembra?, panfletava outro dia no Clube Naval, Lagoa, no Rio.

Candidata a deputada estadual, ela se encontrou com as manicures do salão do clube, deu um santinho a cada uma, e disse: “Tô contando com o apoio de vocês!” Aprendeu rapidinho...

O MUSEU DO
Açude, no Alto da Boa Vista, vai “transformar tragédia em arte”, como contou à coluna a diretora dos Museus Castro Maya, Vera de Alencar. Veja só: as árvores que caíram com a força das chuvas de abril deste ano no Rio serão transformadas em mobílias de grife pelas mãos do artista Hugo França.

Ele é o responsável pelo mobiliário de Inhotim, em Minas Gerais, com móveis a partir de troncos e galhos derrubados. As enchentes também soterraram a piscina do museu — que ficou conhecida por ter sido um dos cenários prediletos da viúva Porcina, vivida por Regina Duarte, na novela “Roque Santeiro” — e, com ela, a obra “Doramar na piscina”, da artista Iole de Freitas. O que hoje é apenas um barranco vai se transformar na grande novidade do museu este ano. Os trabalhos começam em setembro e devem contar com a ajuda da comunidade local. Os recursos para a transformação sairão da Bradesco Seguros

O ESGOTO DO BRASIL

CELSO MING

A China leva vantagem 
Celso Ming 

O Estado de S.Paulo - 22/07/2010

Os dirigentes do mundo rico estão preocupados com uma dolorosa novidade. A recuperação da crise - que é frágil, mas é recuperação - está acontecendo em detrimento da criação de empregos. As empresas produzem e vendem mais, mas não contratam. Na verdade, o desemprego está aumentando ou não está caindo (veja tabela).

Há dez dias, o presidente do Fed (banco central dos Estados Unidos), Ben Bernanke, fez um apelo para que os bancos americanos não deixem de conceder crédito para as pequenas empresas. É nesse segmento que pode haver aumento significativo de postos de trabalho: "Tornar o crédito acessível para as pequenas empresas é crucial para a recuperação da nossa economia e deverá ser o centro de nossos atuais desafios políticos", disse.

Se esse apelo vai ou não ser atendido é outra conversa. O que importa é que, na atual fase de convalescença da economia ocidental, o emprego não reage a despeito do despejo de US$ 10 trilhões em recursos pelos Tesouros e bancos centrais com o objetivo de reativar a economia.

Isso está acontecendo por três razões.

Primeira, porque aumentou a utilização de Tecnologia da Informação (TI), que dispensa mão de obra. Trata-se de todo aparato de comunicação eletrônica que reduz a necessidade de formação de estoques, de almoxarifados, instalações, máquinas, equipamentos e pessoal. É provável que muitas empresas já tivessem feito investimentos em TI alguns anos atrás, mas, por inércia, tenham mantido intacto seu quadro de funcionários, até que veio a crise que as levou a enxugar custos. Quando veio a reativação, essas empresas provavelmente perceberam que poderiam aumentar sua produção e seu faturamento sem necessidade de novas contratações, porque o uso intensivo de TI ajudou a aumentar a produtividade.

Segunda razão, o medo do desemprego ou, simplesmente, a falta de oportunidades no mercado de trabalho, devem estar levando os trabalhadores dos Estados Unidos e da Europa a aceitar produzir mais por menos salário. Os analistas internacionais têm feito menções frequentes desse fato.

E, terceira razão, a injeção de créditos e recursos oficiais destinados a reativar o consumo nos países de alta renda está produzindo um efeito inesperado. Está criando mais mercado para produtos chineses ou asiáticos. Excelente indicação disso é o fato de que as exportações da China no primeiro semestre deste ano comparadas com as do primeiro semestre de 2009 estão crescendo a ritmo impressionante, de 35,2%.

Essas mercadorias chegam mais em conta aos portos dos Estados Unidos e da Europa porque a crise está favorecendo a compressão de preços. E, cada vez que um americano ou um europeu compra um produto asiático, está ajudando a fechar um posto de trabalho no seu país. Não dá para sustentar que as grandes empresas americanas e europeias estejam sendo prejudicadas por essas exportações asiáticas porque praticamente todas elas estão solidamente fincadas na China e no resto da Ásia, tirando proveito da mão de obra bem mais barata.

Enfim, são coisas que vão acontecendo, sem que os dirigentes políticos tenham se dado conta dessas consequências.
Novo ritmo
A decisão de ontem do Copom não trouxe nenhuma surpresa. A dose do aumento dos juros básicos (Selic) foi reduzida para 0,50 ponto porcentual, o que dá juros de 10,75% ao ano.
O que vem aí
Se nada de errado acontecer logo à frente, é possível esperar mais uma alta em agosto, desta vez de apenas 0,25 ponto porcentual, para que, em setembro, o juro pare de subir e assim permaneça até o final do ano. A ata do Copom a ser divulgada no dia 29 poderá deixar isso mais claro.

MÍRIAM LEITÃO

Chávez deu errado 
Miriam Leitão 

O Globo - 22/07/2010

O preço do caminho escolhido por Hugo Chávez ficou claro no relatório divulgado pela Cepal. A América Latina cresce este ano mais de 5%. O Brasil mais de 7%. A Venezuela vai ter uma queda de 3%. É a segunda pior recessão depois do Haiti, que tem uma boa explicação para seu número negativo. A crise da Venezuela é resultado das escolhas de um governante equivocado.

Os erros políticos do presidente Hugo Chávez são mais falados, mas ele é também um péssimo administrador e tem criado para a economia venezuelana uma série espantosa de incertezas. Isso inibe o investimento.

A Venezuela enfrentou uma severa crise energética provocada por uma seca, mas como sabem todos os que têm hidrelétricas: secas acontecem. Por isso é preciso ter garantias em investimentos em outras fontes de energia que possam suprir as oscilações da oferta.

Não era de se esperar que a Venezuela, com suas enormes reservas de petróleo, tivesse que enfrentar uma crise de energia, com racionamento. Isso mostra falta de planejamento.

O autoritarismo de Chávez virou incerteza regulatória.

Ele muda as regras quando quer. As políticas e as econômicas. Tem hostilizado empresas estrangeiras e até o capital nacional privado. Qualquer divergência com um de seus ditames pode ser suficiente para que desabe sobre a empresa alguma mudança de regra. E tudo tem sempre o objetivo explícito de perseguir qualquer voz discordante.

Recentemente, o Banco Central venezuelano encampou o Banco Federal, uma instituição privada, que acabou sendo estatizada. Agora fica claro por quê. O banco tinha ações da TV que tem uma posição mais crítica a Chávez, a Globovisión. O governo está anunciando que vai nomear conselheiros para a emissora, coisa que pode fazer, já que é agora um dos acionistas.

A Venezuela já está pagando o custo político de um governo como esse. O país há muito tempo não é uma democracia. As regras das eleições são manipuladas para favorecê-lo; mas quando não favorecem, Chávez tira poderes do administrador de oposição que foi eleito. A Constituição tem sido alterada com frequência apenas para favorecer seu projeto de eternização do poder. Tudo é tão claramente autoritário que é espantoso que o regime chavista tenha tantos defensores no governo brasileiro.

Nunca é demais dizer: uma coisa é manter boas relações com a Venezuela, outra, diferente, é defender Hugo Chávez. O presidente Lula e seus dois ministros das relações exteriores — Celso Amorim e Marco Aurélio Garcia — defendem Chávez. Parecem desconhecer as lições da História de governantes que chegaram ao poder pelo voto e usaram o poder para destruir as bases da democracia que os elegeu.

A Cepal trouxe números inequívocos no relatório divulgado ontem. As projeções da instituição para o crescimento na região são: Brasil, 7,6%; Uruguai, 7%; Paraguai, 7%; Argentina, 6,8%; Peru, 6,7%; Bolívia, 4,5%; Chile, 4,3%, apesar do terremoto; México, 4,1%.

Dois países estão em recessão: Haiti, 8,5%; e Venezuela, -3%.

Outras análises mostram a mesma tendência de que a Venezuela tenha recessão este ano e continue no ano que vem com o PIB negativo.

Além disso, o país enfrenta uma longa inflação, a maior da região. Há vários anos a inflação está em dois dígitos e este ano está próximo de 30%. Em maio, a enviada especial do GLOBO a Caracas, Mariana Timóteo da Costa, mostrou que a inflação e a grave crise de desabastecimento estão tirando popularidade do presidente.

É por isso que Chávez está mais uma vez tentando um espetáculo de marketing.

Este ano há eleições para o Congresso e há risco de que ele perca. Ele saiu à cata de algo espetacular para capturar a atenção pública.

Foi mais fundo que podia: exumar o cadáver de Simón Bolívar. Seria cômico se não fosse uma forma patética de manipular a opinião pública.

O Chile pediu para enviar senadores para acompanhar as eleições venezuelanas em setembro e pediu à OEA uma atitude de maior vigilância às eleições. O Conselho Nacional Eleitoral — controlado por Chávez, como tudo mais — rejeitou com uma nota em que afirma que: “não permitiremos que nenhum ator alheio à Venezuela intervenha e coloque sob suspeita a vontade soberana do povo.” Curioso. Hugo Chávez interfere e dá palpite em todas as eleições da região — principalmente no Peru, Equador e Bolívia — sem mostrar o mínimo respeito à vontade soberana do povo desses países.

Há entre os governistas mais aguerridos a impressão de que o país deve agradecer ao presidente Lula por ter sido magnânimo e não ter tentado um terceiro mandato; que ele o teria se tivesse tentado. Um equívoco.

A indiscutível popularidade do presidente Lula não era garantia de que ele ganharia a eleição se tivesse a possibilidade de tentar. Para abrir o caminho para essa tentativa, Lula teria que mudar a Constituição. Na Colômbia, o ex-presidente Álvaro Uribe foi informado pela Suprema Corte de que nem deveria tentar um terceiro mandato apesar da popularidade que tinha. Aqui, Lula também teria os mesmos obstáculos. O Brasil não aceitaria que o presidente seguisse o caminho do continuísmo chavista e tem estado atento a qualquer tentativa de se repetir aqui alguns dos truques do modelo Hugo Chávez.

O caminho do desrespeito às leis não tem volta e leva ao fracasso político e econômico.

É apenas uma questão de tempo. Para a Venezuela, a conta econômica chegou. A proposta intervencionista e autoritária de Chávez deu errado. A Venezuela está perdendo o melhor momento da região.