A literatura econômica sobre reformas estruturais sugere que sua realização é mais provável diante de recessões prolongadas e altas taxas de desemprego. Exemplos clássicos foram o Reino Unido nos anos 80 e a América Latina na década seguinte, ambos após períodos de sérios problemas econômicos.
Grandes recessões parecem convencer a sociedade sobre a necessidade de mudar o regime de política econômica. Ao mesmo tempo, grupos de interesse, beneficiários do status quo, tendem a se enfraquecer ao ficar claro que suas propostas não geraram prosperidade, exceto para eles próprios.
A recessão de 2014-2017 e as elevadas taxas de desemprego - tendo como pano de fundo o crescimento medíocre do PIB real per capita entre 1980 e 2016, de apenas 0,9% ao ano, e a descoberta de um processo de corrupção sistêmica - produzem ambiente propício à implementação de reformas.
Evidentemente, a venda de reformas para a sociedade não costuma ser fácil. Uma das razões é que seus benefícios, até por serem às vezes indiretos, não costumam ser tão claros quanto são para boa parte dos economistas.
A equipe econômica faz, por exemplo, grande esforço para viabilizar a reforma da Previdência Social a partir do correto argumento de que a situação atual é insustentável do ponto de vista fiscal. Contudo, isso tem esbarrado na visão predominante entre nossos políticos (e em parte da sociedade) de que os recursos são infinitos. Não reformar a Previdência é também sancionar privilégios na medida em que a aposentadoria média no setor público - defendida por corporações - varia de seis (Poder Executivo) a 23 vezes (Poder Legislativo) o valor médio recebido por dezenas de milhões de aposentados no INSS.
Todavia, mesmo um governo politicamente fraco e com integrantes acusados de corrupção tem sido capaz de promover mudanças importantes, como o teto dos gastos, a reforma trabalhista, a criação da Taxa de Longo Prazo (TLP), alguma flexibilização na regulação do petróleo e planos para concessões de infraestrutura e privatizações.
De maneira semelhante à "operação abafa" da Lava-Jato, a aliança entre corporações e políticos populistas/corruptos, que caracteriza a Velha Política, tenta bloquear as reformas econômicas.
A oposição à TLP refletiu essa coalizão, ao unir corporações e senadores do PSDB e PT. O anúncio de privatização da Casa da Moeda provocou entre os defensores do Estado-empresário a confusão entre o papel do Banco Central e o de uma gráfica ineficiente, enquanto que a intenção de privatizar a Eletrobras deu origem a movimentos liderados por políticos populistas em "defesa" de Furnas e Chesf.
Diferentemente de companhias privadas, as estatais possuem como objetivo a maximização de poder e não a maximização de lucros. Como consequência, não existem incentivos para que seus executivos persigam a eficiência.
O capital nelas investido é de propriedade da sociedade, porém substancial parcela do fluxo de caixa é apropriado pela Velha Política sob diversas formas - privilégios a corporações de servidores, cargos executivos por indicação de políticos, concessão de contratos sem concorrência, investimentos de baixíssimo retorno. Tudo isso dá a seus atores fortes incentivos para defender a intocabilidade das estatais, até sob o falso manto do nacionalismo. O processo de transferência de recursos para a Velha Política é justamente a principal fonte de desperdício de recursos da sociedade e de oportunidades potenciais para corrupção.
O Brasil possui enorme número de estatais, que segundo estimativas recentes chegaria a 442. Parcela majoritária desse montante é composta por firmas pequenas e médias, mas o grau de ineficiência resultante constitui-se em trava ao crescimento econômico no longo prazo.
Poucas empresas como a Embrapa se justificam como estatais. Muitas podem ser simplesmente extintas e outras tantas privatizadas. Por outro lado, devemos ter em mente que o desinvestimento de ativos, embora concorra para estabilizar a relação dívida/PIB, não é substituto de cortes permanentes do gasto público, sob pena de no futuro virmos a nos defrontar com novos desequilíbrios orçamentários.
A privatização é reforma a ser executada ao longo de vários anos a partir de diretrizes estratégicas claramente definidas. A nosso ver, deve ter três prioridades: foco nas grandes estatais, como Petrobras e Correios, e em instituições financeiras e o emprego de ofertas públicas de ações para a venda de empresas, em lugar de leilões do controle acionário para grupos de investidores, modelo adotado nos anos 90.
O sistema financeiro desempenha papel central na alocação de recursos na economia, e a evidência empírica internacional aponta correlação positiva entre desenvolvimento financeiro e crescimento econômico. A presença de bancos públicos estabelece a ligação, produtora de distorções, entre o mundo político e as finanças. Esta deve ser quebrada se quisermos explorar o potencial do sistema financeiro como alavanca do desenvolvimento econômico.
Nossa sugestão é privatizar os grandes bancos estatais (BB e Caixa), fechar os regionais e reduzir o tamanho e o escopo das atividades do BNDES. É fundamental a devolução ao Tesouro do restante dos recursos repassados no período 2007/2015, R$ 400 bilhões, ao mesmo tempo em que o banco se restringiria ao financiamento de projetos com retorno social superior ao privado nas áreas já definidas em janeiro deste ano, com participação máxima de 50%.
Outras mudanças desejáveis são o fim do desastroso FI-FGTS e a oferta aos trabalhadores para, nos novos depósitos do FGTS, escolher entre continuar a receber TR mais 3% ao ano ou ter uma conta de investimento administrada por instituições financeiras privadas.
Finalmente, cabe perguntar sobre o que produz maiores retornos sociais: manter bilhões de reais alocados em atividades que podem ser desempenhadas de forma mais produtiva pela iniciativa privada ou em investimentos em educação, saúde e segurança pública?