A longa convivência com juros altos e inflação elevada - inclusive, depois do Plano Real, se comparados aos padrões internacionais - forjou no mercado a crença de que o Brasil está condenado a conviver de forma permanente com esses problemas. De fato, duraram pouco, desde a adoção do regime de metas, em 1999, todas as tentativas de manutenção da taxa de juros nominal abaixo de 10% ao ano. A explicação para o fenômeno é relativamente simples: os juros subiram porque o país jamais reuniu as pré-condições para operar com taxas civilizadas.
Em 2012, o Banco Central (BC) baixou a taxa básica de juros (Selic) a 7,25% ao ano, a menor do regime de metas, e anunciou que ela ficaria nesse patamar por tempo "suficientemente prolongado". O mercado não acreditou naquele movimento porque todos sabiam que a decisão era política. Na ocasião, as expectativas de inflação estavam desancoradas, isto é, os agentes econômicos não acreditavam que a inflação fosse cair, de maneira a permitir que os juros permanecessem baixos.
O governo começou a desmontar, em 2011, o arcabouço macroeconômico que vigorava desde 1999. Como o resultado esperado - mais crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) - não veio, em 2012 o novo modelo, batizado de Nova Matriz Econômica, foi levado ao limite.
No melhor estilo tentativa-e-erro, mais erro do que tentativa, a então equipe econômica, depois de reduzir o juro na marra, forçou a desvalorização do câmbio por meio do aumento da taxação dos capitais que vinham para o Brasil, com o objetivo de "aumentar" a competitividade da indústria nacional; para assegurar que a inflação ficasse comportada e o BC não tivesse motivo para elevar os juros, desatrelou os combustíveis dos preços internacionais, praticamente os congelando - decisão que causou enorme prejuízo à Petrobras e provocou quebradeira no setor de etanol -; também com a intenção de conter os preços administrados para ajudar o BC a segurar a taxa Selic, tentou forçar o setor elétrico a reduzir os preços das tarifas, medida que na prática provocou um rombo nas contas da Eletrobras, a holding das elétricas federais obrigada a aderir ao plano; acabou com a política de geração de superávits no resultado primário (que não considera a despesa com juros) das contas públicas, baseado na crença de que isso estimularia a atividade econômica; aumentou a dívida pública em quase 10 pontos percentuais do PIB para bancar empréstimos subsidiados do BNDES a empresas, em sua maioria, grandes e com acesso fácil ao mercado de capitais; procurou estimular o consumo por meio da redução de tributos - já em meio a uma acentuada queda da arrecadação federal - e da adoção de uma política que pode ser chamada de superindexação do salário mínimo (correção pela inflação do ano anterior, acrescida da variação do PIB de dois anos antes); desonerou de forma errática a folha de pessoal das companhias, substituindo a contribuição sobre folha por outra, sobre o faturamento, iniciativa que também deprimiu as receitas federais; liberou os Estados de cumprir com sua parte para o superávit primário do setor público consolidado, com a justificativa de que os governos estaduais aumentariam os investimentos e isso moveria o PIB - no fim, interessados apenas na própria reeleição, os governadores usaram a folga fiscal para reajustar os salários dos funcionários públicos.
Hoje, é sabido que, para financiar uma despesa primária - o acesso de estudantes carentes a cursos em faculdades privadas -, o governo Dilma Rousseff emitiu títulos, elevando a dívida pública, em vez de usar dinheiro dos impostos. A verdade é que não havia dinheiro suficiente para bancar o projeto populista da ex-presidente e, por essa razão, entre 2008 e 2015 o gasto corrente da União cresceu 50% acima da inflação, face à expansão de "apenas" 15% da arrecadação, descompasso que majorou a dívida pública no período em R$ 2,2 trilhões.
Como dinheiro não nasce em árvore, em 2012 o governo lançou mão da contabilidade criativa para "cumprir" a meta de superávit primário. Denunciado pela imprensa, no ano seguinte começou a usar o expediente das pedaladas fiscais - o uso dos bancos federais para pagar despesas correntes, artifício vedado pela Lei de Responsabilidade Fiscal.
Gestão temerária: não há outra denominação possível para esse conjunto de ações governamentais que, no espaço de apenas cinco anos (de 2011 a 2015), destruíram as finanças públicas do país e jogaram a nação na mais profunda e longa recessão de sua história, colocando na rua mais de 14 milhões de desempregados, quebrando empresas, falindo Estados, elevando a dívida pública aos píncaros e fazendo o país viver mais uma década perdida - o custo de reorganização fiscal será alto.
Ao tornar opacas as contas públicas e acabar com a previsibilidade de preços como juros e câmbio, além de adotar medidas que apenas adiaram a explosão da inflação corrente (para depois da eleição de 2014, claro), o governo Dilma fez os empresários pisarem no freio. Mesmo aqueles que pegaram o dinheiro baratinho do BNDES, a custo inferior ao da TJLP, não investiram porque o risco de dar tudo errado cresceu de forma exponencial.
Naquele ambiente, não dava para acreditar na promessa do BC de manter os juros baixos por um período "suficientemente prolongado". A miragem durou menos de seis meses e os juros voltaram a escalar a montanha. Agora, o BC de Ilan Goldfajn caminha para uma taxa Selic ainda menor que os 7,25% de 2012. E o mercado? Acredita desta vez que o juro baixo é sustentável?
Os juros dos contratos do mercado futuro - a partir de 2019 - mostram que o ceticismo continua. Analistas, tesoureiros e gestores não veem nenhuma semelhança entre a atual equipe econômica e a de 2011-2015, pelo contrário, dão à gestão corrente o benefício da dúvida, uma vez os desequilíbrios na área fiscal remanescem - o fato é que o governo anterior criou tantas despesas que tem sido uma batalha reduzir, sem a realização de reformas institucionais, o déficit primário, estacionado em torno de 3% do PIB.
Apesar da confiança dos agentes econômicos na equipe de hoje, os prêmios de risco exigidos para o financiamento da dívida estão elevados porque paira sobre 2019 a grande incerteza: o vencedor da eleição dará continuidade à agenda de reformas do atual governo?
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