sábado, julho 16, 2016

Atentado ao pacto federativo - RONALDO CAIADO

FOLHA DE SP -16/07

A voracidade fiscal da União não tem limites. Além de impor ao contribuinte uma das cargas tributárias mais pesadas do planeta, sem a contrapartida de serviços que a justifiquem, não hesita em usurpá-la dos Estados e municípios, ainda que, para tanto, atropele cláusula pétrea da Constituição.

É o caso da proposta de emenda constitucional 96/2015, em exame na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, que delega à União a cobrança de imposto adicional sobre grandes heranças e doações.

Não questiono (embora questionável) o mérito da matéria, que cria mais um tributo. Atenho-me a outro ponto: o desprezo ao princípio federativo, cláusula pétrea constitucional (inciso I, parágrafo 4º, artigo 60).

Dentro desse princípio, o artigo 151, inciso I, atribui aos Estados e ao Distrito Federal —e tão somente a eles— a prerrogativa de criar impostos sobre transmissão causa mortis e doação de quaisquer bens ou direitos. A PEC, de maneira nada sutil, viola essa exclusividade ao permitir que a União estabeleça a progressividade dessas alíquotas e se aproprie da receita.

Ora, a Constituição é clara: se houver aumento da carga tributária sobre heranças e doações, o recurso pertence aos Estados —e não à União. O aumento da alíquota máxima, dos atuais 8% para 20%, é pleito antigo dos Estados, já manifestado pelo Conselho Nacional de Política Fazendária.

Eis que a União, por meio dessa PEC, se apossa dessa bandeira, alegando que sua ingerência, elevando a alíquota máxima a 27,5%, não exclui o direito de os Estados também o fazerem. É uma alegação enganosa: se ambas as instâncias assim o fizerem, a tributação sobre heranças resultará em confisco puro e simples.

Estamos enfrentando um avanço arrecadatório dos cofres federais sobre a riqueza dos cidadãos e das empresas, sem que o produto gerado tenha sido repartido com Estados e municípios.

O nome disso é concentração de poder. A PEC destina esses recursos ao FNDR (Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional), deixando nas mãos do governo federal o comando e o destino de recursos que deveriam se manter na esfera estadual.

É absolutamente injusto que a superação das desigualdades regionais, que a União não consegue resolver, seja patrocinado pela tomada de parcela da base tributável que cabe aos Estados. E não é só: implica ainda bitributação, impedindo que se identifique a alíquota efetiva, dada a incidência de duas exações diferentes, provenientes de dois entes distintos, sobre o mesmo fator gerador –heranças e doações–, sem que uma carga tributária possa sequer ser deduzida da outra.

Além de prejudicar o já frágil equilíbrio federativo, é imposto ruim do ponto de vista econômico. Nada menos que 13 países —emergentes como a Rússia e a Eslováquia; ricos, como Áustria, Hong Kong e Cingapura; e adeptos do "welfare state", como Suécia e Noruega— já o eliminaram desde o início deste milênio. Mesmo os EUA, que o aplicam em alíquotas de até 40%, vêm aumentando as faixas de isenção.

O ponto central, no entanto, é o que isso representa na redução da autonomia financeira dos Estados, carentes de fontes de financiamento de suas dívidas. Os governadores continuarão, sempre e cada vez mais, protagonizando o caricato papel de mendigos de gravata, a esmolar recursos na Esplanada.

É um governo central absoluto, cercado de corporações, indiferente a quem delas não faça parte. Democracia e federalismo são coisas bem diferentes. O Senado não pode compactuar com mais esse golpe ao pacto federativo.


Petrobras, a central das propinas - DOSSIÊ DAS ESTATAIS

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Por: Hugo Cilo


A maior companhia brasileira, hoje a mais endividada do setor, foi usada para alimentar um complexo sistema de financiamento de partidos aliados, desvios de recursos e suporte à corrupção. O roubo, segundo a Polícia Federal, pode chegar a R$ 42 bilhões


"Fundo do poço: Os números do estrago na Petrobras: R$ 492 bilhões era o endividamento da estatal ao final de 2015, o maior do setor em todo o mundo, R$ 34,8 bilhões foi o prejuízo da companhia em 2015, resultado da corrupção, do aparelhamento e da queda do petróleo"


Nos últimos anos, a maior empresa brasileira, a Petrobras, brilhou nos noticiários internacionais, para o bem e para o mal. O ápice da reputação da estatal ocorreu entre 2007 e 2008, quando descobertas do pré-sal fizeram a companhia decolar como um dos principais cartões de visita do governo e se tornar uma das maiores petrolíferas do mundo. Naquela época, dado o potencial das jazidas de petróleo em alto mar, a companhia chegou a ser chamada de “diamante da economia brasileira”, pelo The Wall Street Journal, e de “protagonista de um conto de fadas”, em editorial do The New York Times.

Mas não demorou muito para o príncipe virar sapo. Fortemente aparelhada pelos governos petistas de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, a estatal do petróleo se viu envolvida – em escala proporcional a seu tamanho – no mais assombroso escândalo de corrupção da história da República. A operação Lava Jato tem mostrado que a maior fonte de riqueza e empregos para economia brasileira se tornou também a maior fonte de pagamento de propinas, distribuição de cargos e desvios de recursos que se tem notícia.

“A Petrobras é uma aula prática de anti-administração”, disse à DINHEIRO o economista e escritor americano Paul Roberts, tido como um dos maiores gurus da indústria petrolífera global e autor do best-seller The End Of Oil (O Fim do Petróleo). “Faz uma década tenho alertado que a Petrobras, ancorada em um produto que se tornará obsoleto e gerida por profissionais incapazes de enxergar um palmo além do nariz, está fadada ao fracasso.”

A afirmação de Roberts pode soar exagerada, mas os recentes balanços da estatal endossam a enrascada em que a Petrobras, de fato, mergulhou. No ano passado, com um prejuízo de R$ 34,8 bilhões e uma dívida de R$ 492,8 bilhões – um aumento de 40,4% na comparação com 2014 –, a companhia liderou com folga o ranking das petroleiras mais endividadas do planeta. “O uso da Petrobras como instrumento político afugentou os investidores e reduziu a previsibilidade da companhia”, afirmou Robert Wood, especialista em Brasil da consultoria Economist Intelligence Unit.

Com motivos de sobra, que incluem ainda queda no preço do petróleo, controle artificial dos preços dos combustíveis – visando a reeleição de Dilma – e dúvidas sobre a capacidade de pagamento das dívidas, as principais agências de classificação de risco, Moody’s, Standard & Poor’s e Fitch rebaixaram as notas da companhia, dificultando o acesso da estatal a linha de financiamento e encarecendo o crédito. A reviravolta da Petrobras, agora sob comando do Pedro Parente, ganhou contornos dramáticos depois que ex-diretores da estatal investigados pela Lava Jato, Paulo Roberto Costa (abastecimento), Nestor Cerveró (negócios internacionais) e Renato Duque (serviços), fecharam acordo de delação premiada para terem suas condenações reduzidas pela Justiça.

Pedro Barusco, gerente subordinado a Duque, também fechou acordo e aceitou devolver US$ 100 milhões que estavam em uma conta pessoal. Com riqueza de detalhes, os ex-executivos revelaram valores pagos ao PT e a partidos da base aliada, nomes de políticos e empresários, além de esquemas fraudulentos de licitações, desvios de 1% a 3% em contratos com fornecedores e investimentos bilionários injustificáveis, como a compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, avalizada pela então presidente do conselho de administração da estatal Dilma Rousseff, que custou US$ 1,3 bilhão.

Dois anos antes, a mesma unidade havia sido vendida para a Astra Oil por um total de US$ 126 milhões. O saqueamento da Petrobras, que ficou popularmente conhecido como “Petrolão”, gerou a condenação de 57 pessoas em menos de 12 meses de investigações. As sentenças do juiz federal Sergio Moro em razão dos desvios da estatal somaram 680 anos de prisão. Pelos cálculos da Polícia Federal, mais de R$ 42 bilhões teriam sido roubados da empresa entre 2004 e 2014. “Hoje não restam dúvidas do papel exercido pela Petrobras no plano sujo da corrupção federal”, afirma Mark Pieth, ex-chefe do Departamento de Crime Organizado do Ministério da Justiça da Suíça, que tem se dedicado a estudar a fundo os estragos políticos causados à companhia.

“A Petrobras simboliza, com precisão, os tropeços do Estado brasileiro nos últimos anos. Só uma gestão muito profissional, limpa e transparente poderá tirar a companhia do atoleiro.” Por meio de sua assessoria de imprensa, a Petrobras afirmou que “foi criada uma diretoria de governança, riscos e conformidade, com o objetivo de assegurar os processos e mitigar riscos, dentre eles os de fraude e corrupção, e garantir a aderência às leis, normas, padrões e regulamentos, internos e externos à companhia.”

Banco do Brasil, uma vítima do populismo - DOSSIÊ DAS ESTATAIS

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Por: Cláudio Gradilone



Objeto das pedaladas fiscais, o BB foi um instrumento do PT para expandir artificialmente o crédito e serviu para desviar recursos



O Banco do Brasil é uma potência. Suas 17.462 agências e postos atendem todos os municípios do País. É líder em empréstimos, com R$ 592 bilhões. Também é o maior em depósitos. Segundo os dados do dia 31 de março, o BB guardava R$ 482,5 bilhões em poupanças e investimentos de seus clientes. No entanto, nos últimos 15 anos, essa máquina foi vítima do populismo. Em vez de servir seus 63 milhões de correntistas e clientes, ele prestou-se a desviar dinheiro e a executar políticas públicas equivocadas. O aparelhamento do banco o tornou menos rentável que os seus concorrentes privados de varejo.

O BB tem um corpo técnico de qualidade. No entanto, o aparelhamento e o uso político da institução vêm comprometendo seus resultados. Os números mostram isso. Segundo a consultoria Roland Berger, entre 2011 e 2015, a rentabilidade patrimonial do BB foi de 17,1% ao ano, ante 21,9% do Itaú Unibanco e de 19,8% do Bradesco. Apesar de maior e de poder desfrutar ganhos de escala, o BB rende menos que seus concorrentes. O resultado pode ser medido na Bolsa. Entre o fim de 2010 e a quarta-feira 13, as ações dos três maiores bancos privados, Itaú, Bradesco e Santander, haviam acumulado uma alta média de 37,2%. Já os papéis do BB haviam recuado 11,5%.

O caso mais emblemático de aparelhamento foi o de Henrique Pizzolato. Sindicalista e político ligado ao PT paranaense, ele foi indicado para a diretoria de marketing do BB em 2003. Aproveitou-se do cargo para desviar dinheiro de um contrato da agência DNA Propaganda, do publicitário Marcos Valério, a quem favoreceu, nesse ano, na renovação de um contrato de R$ 152,8 milhões. Envolvido no Mensalão, ele foi condenado a 12 anos e sete meses de prisão por formação de quadrilha, peculato e lavagem de dinheiro. Pizzolato fugiu para a Itália, mas foi capturado e extraditado para o Brasil.

A Procuradoria Geral da República afirma, textualmente, que o esquema destinou-se a desviar dinheiro para financiar a compra de apoio de parlamentares ao governo do PT. O BB também foi usado como um instrumento para reaquecer a economia após a crise internacional de 2008 e para, artificialmente, baixar os juros e expandir o crédito nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff. A primeira intervenção ocorreu no fim de 2008. Naquela ocasião, dez milhões dos 30 milhões de correntistas tiveram seus limites de crédito elevados.

Em 2009, segundo o Banco Central (BC), o crédito concedido pelos 50 maiores bancos cresceu 14,9%. Nada mau, só que o avanço dos bancos privados foi de modestos 3,9%. Liderados por BB e Caixa, os estatais elevaram seus créditos em 42%. Além de arriscada, essa prática distorce o mercado. “A participação do cheque especial é muito alta no crédito”, diz Roberto Troster, que comandou o departamento de economia da Federação Brasileira de Bancos. “Esse tipo de crédito é mais adequado em um cenário de hiperinflação.” Troster não analisa especificamente o BB, mas avalia que o mercado de crédito poderia ter sido beneficiado pela mudança do perfil de endividamento das pessoas físicas.

O governo fez mais. O BB, como outros bancos federais, teve de usar recursos próprios para honrar programas sociais. O Tesouro atrasou pagamentos aos bancos para disfarçar o rombo nas contas públicas, as pedaladas fiscais. “O governo Dilma Rousseff praticou fraude fiscal e contabilidade destrutiva”, disse Júlio Marcelo Oliveira, representante do Ministério Público Federal no Tribunal de Contas da União em seu depoimento à comissão de impeachment no Senado. Só para o BB, a conta das pedaladas entre 2010 e 2015 ficou em R$ 14,8 bilhões. As dívidas só foram quitadas no fim de 2015. Mau negócio para o banco. E para o Brasil.

Os desvios no cofre da Caixa - DOSSIÊ DAS ESTATAIS

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Por: Rodrigo Caetano


Apadrinhamento, uso político, erros na estratégia: o que pintou de vermelho o balanço da Caixa Econômica Federal e, agora, ameaça o futuro da instituição


"O custo do calote: agência da Caixa em São Paulo. O aumento da inadimplência levou o banco a registrar prejuízo de R$ 303 milhões no quarto trimestre de 2015"


No segundo semestre de 2002, pouco antes de Luiz Inácio Lula da Silva assumir a presidência do Brasil, a Caixa Econômica Federal preparou a divulgação dos resultados do primeiro semestre e anunciou que tinha planos de captar recursos no mercado internacional. No futuro, disse Wilson Risolia, então vice-presidente de investimentos da Caixa, a intenção era inserir o bancão estatal no mercado de capitais, tanto aqui quanto no Exterior. Quase duas décadas depois, o cenário que se observa ao contemplar o prédio na Asa Sul, em Brasília, é desolador.

Os sucessivos governos de Lula e de Dilma Rousseff transformaram o segundo maior banco brasileiro por ativos, maior até que o Itaú Unibanco, em uma instituição que desperta muita preocupação sobre o seu futuro. De depositório das poupanças nacionais e grande financiador da casa própria, a Caixa Econômica Federal tornou-se um instrumento político. Ela não só serviu para azeitar os caminhos tortos da corrupção, viabilizando o pagamento de propinas e as pedaladas fiscais, que somaram mais de R$ 72 bilhões só em 2015, como também inundou o mercado com empréstimos a juros subsidiados, concedidos sem critério.

Tantos erros acabaram por pintar de vermelho seu balanço e, ao lado do uso político e do aparelhamento, geram preocupações sobre o futuro do banco. Na ânsia por colocar em prática seus programas sociais, o governo do PT impulsionou a carteira de crédito da Caixa, que dobrou de tamanho em três anos, atingindo R$ 679 bilhões no fim do ano passado. Mais da metade desse total, 57%, destina-se à habitação. Em 2013, durante a gestão do ex-presidente Jorge Fontes Hereda, a Caixa passou a ter a segunda maior carteira de crédito do País, ultrapassando o Itaú.

O problema não foi emprestar muito, mas sim emprestar mal. A inadimplência cresceu aceleradamente. Entre 2013 e 2015, ela passou de 2,3% do total para 3,6%, o que representa perdas de cerca de R$ 7 bilhões, segundo a consultoria Roland Berger. No crédito imobiliário, o índice de calote do banco é de 0,6%. Parece pouco. Mas representa o triplo da média dos bancos privados, cujos índices oscilam ao redor de 0,2%, de acordo com o economista João Melo, professor do Insper. O resultado não poderia ser diferente: prejuízo.

A Caixa divulgou um prejuízo recorrente de R$ 303 milhões no último trimestre do ano passado. No acumulado de 2015, a instituição teve um lucro de R$ 1,15 bilhão, número 82,6% menor do que o registrado no ano anterior. Segundo Márcio Percival, vice-presidente de finanças da instituição, o resultado é fruto, justamente, do aumento das despesas com captação e das provisões contra calotes, que cresceram 50%, para R$ 19,65 bilhões, em 12 meses. Para oxigenar sua carteira, a Caixa vendeu, em novembro, R$ 13 bilhões em créditos podres. Apesar disso, Percival não espera um salto nas provisões, em 2016, uma vez que já está sendo adotada uma postura prudencial.

Essa postura, no entanto, pode ter vindo tarde demais. Analistas estimam que, no atual cenário, o banco precisa de um aporte de R$ 40 bilhões apenas para recuperar o fôlego. No início do segundo mandato de Dilma Rousseff, havia a expectativa de que seria feito um choque de gestão na instituição. Mas a nomeação de Miriam Belchior, ex-ministra do planejamento de Dilma, para a presidência da estatal logo jogou por terra qualquer esperança do mercado. A indicação de Belchior resume como o aparelhamento prejudicou o banco.

Sem experiência na área ou conhecimento técnico, mas com fortes ligações com o PT, ela acabou gerando uma paralisia geral na Caixa ao colocar em prática um plano de reestruturação “de cima para baixo”. Com o afastamento de Dilma, Miriam foi substituída por Gilberto Occhi. Como se não bastasse, as investigações da operação Lava Jato mostram que a Caixa foi usada para o pagamento de propinas por meio da liberação de recursos do FGTS para obras superfaturadas.

Em depoimento, Fábio Cleto, ex-vice-presidente do banco, relatou ao menos dez casos de fraudes cometidas no período em que ocupou o cargo. Cerca de 80% do dinheiro teria como destino o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, diz Cleto. Em abril do ano passado, a PF descobriu um esquema de repasse de dinheiro por meio de uma agência de publicidade contratada pela Caixa. Os recursos tinham como destino duas empresas de fachada, ligadas ao ex-deputado André Vargas, do PT. O cenário é de terra arrasada.

BNDES a serviço dos amigos do Rei - DOSSIÊ DAS ESTATAIS

REVISTA ISTO É DINHEIRO

O banco de fomento ajudou pessoas próximas a Lula e tinha um diretor apadrinhado por Dilma Rousseff para cobrar propinas ao PT. entenda como isso sugou bilhões de reais de seus cofres


"Vale alegria: o pecuarista José Carlos Bumlai, preso pela PF, conseguiu quase R$ 500 milhões do BNDES e não pagou pelo empréstimos"



O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) é o mais recente elo de fraude, corrupção e desvios de recursos públicos descoberto pela Operação Lava Jato. Até aqui, o envolvimento do banco de fomento aparecia de forma indireta em todo o esquema que envolveu as empresas estatais. A ligação era com os empréstimos concedidos a pessoas próximas ao ex-presidente Lula, como o pecuarista José Carlos Bumlai. Entre dezembro de 2008 e março de 2009, ele conseguiu a liberação de quase R$ 500 milhões para suas usinas de cana-de-açúcar, que estavam à beira da falência.

O pecuarista deveria ter pago o financiamento no final de 2010, mas não honrou o compromisso. O BNDES, que estava absorvendo o prejuízo, só começou a cobrar as garantias de Bumlai após a divulgação do trabalho da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público, há dois anos. Na semana passada, um extenso documento mostrou que os privilégios não estavam restritos apenas aos amigos de Lula. O BNDES também fez parte do esquema montado pelo Partido dos Trabalhadores (PT) para aparelhar as empresas estatais.

O ex-diretor Guilherme Narciso de Lacerda, indicado pela presidente afastada Dilma Rousseff, é acusado de ser o responsável pela cobrança de propinas dentro do banco de fomento. Um relatório de 375 páginas da PF mostrou como Lacerda agia em favor do PT. Filiado à legenda e ligado a Luiz Gushiken (falecido em 2013) e José Dirceu, Lacerda fez parte da equipe de economistas que escreveu o plano de governo de Lula nas eleições presidenciais de 1989 e 1994. Quando Lula foi eleito, em 2002, ele foi colocado na presidência do Funcef, o fundo de pensão dos funcionários da Caixa, onde acumula uma extensa lista de serviços prestados.

Como diretor de infraestrutura social, meio ambiente, agropecuária e inclusão social do BNDES, Lacerda fazia cobranças diretas aos executivos, principalmente de repasses não realizados para o PT. Em mensagens trocadas, em 2012, com Otávio Azevedo, então presidente da construtora Andrade Gutierrez, ele pede explicações sobre o atraso nos depósitos, que não foram identificados pelo tesoureiro da legenda, João Vaccari Neto. “Foi uma surpresa e já criei expectativa em vários lugares. Por favor, veja isso com urgência”, escreveu ele.

Para fazer com que esse esquema desse certo, o Tesouro Nacional passou a liberar recursos. Até o final de 2015, mais de R$ 520 bilhões foram repassados para o banco de fomento. Na estrutura de capital do BNDES, quase 60% dos recursos vêm desses repasses. O tamanho exagerado do BNDES, que aumentou 3,7 vezes o volume de desembolsos entre 2006 e 2014, tinha uma explicação: ser o braço ativo do governo para atuar na economia e eleger seus campeões nacionais. O comando dessa operação ficou a cargo do presidente Luciano Coutinho, um esquerdista pragmático e cérebro da tentativa de formação de grandes empresas nacionais com relevância internacional.

Esse desenvolvimentismo buscado por Coutinho, que atendia aos interesses dos presidentes Lula e Dilma, ajudou na fusão entre Oi e Brasil Telecom, um projeto mal sucedido. A Oi pediu recuperação judicial em junho deste ano ao acumular dívidas de R$ 65,4 bilhões. A Sete Brasil, empresa criada para gerir as sondas do pré-sal, tinha no BNDES seu porto-seguro financeiro. Mas, as investigações da Lava Jato atrapalharam o plano desenhado pelo governo do PT e o banco teve de cancelar o financiamento de R$ 8 bilhões.

Os investimentos bilionários em obras fora do País também são controversos. Entre 2007 e 2015, o banco brasileiro finaciou US$ 11,9 bilhões em obras em Cuba, Venezuela, Equador, Angola, Moçambique entre outros países. “O BNDES precisava de uma mudança de orientação, após 13 anos de uma ideologia equivocada de campeões nacionais com subsídios excessivos”, diz a economista Elena Landau. Os que defendem essa política expansionista do BNDES argumentam que o banco não acumulou prejuízo nos últimos anos.

Mas, no ano passado, o lucro líquido de R$ 6,2 bilhões foi quase 40% menor do que em 2010, quando Lula entregou a faixa presidencial à Dilma. E, como os outros bancos estatais, o BNDES também não escapou das pedaladas fiscais. Nos últimos três anos, o atraso proposital para a melhoria das contas públicas chegou a R$ 24,5 bilhões. Essa conta vai ser paga. O mais difícil será consertar os erros de filosofia acumulados nos últimos anos.


Fundos de pensão usados em benefício próprio - DOSSIÊ DAS ESTATAIS

REVISTA ISTO É DINEIRO

Como investimentos controversos e a influência política-partidária ajudaram a acentuar o rombo nos principais planos de previdência estatais



Em meio à euforia em torno do pré-sal, no final da década passada, um projeto ambicioso de governo tentou aproveitar a demanda futura de sondas da Petrobras para impulsionar a indústria naval brasileira. A Sete Brasil foi criada para reunir as encomendas a estaleiros nacionais sem comprometer o endividamento da petroleira. Só saiu do papel graças ao apoio dos três maiores fundos de pensão do País (Funcef, Petros e Previ), responsáveis por metade do capital inicial da nova companhia, de quase R$ 2 bilhões.

A empresa não cumpriu o cronograma de entregas, passou a figurar nos escândalos de corrupção e, pressionada pelos efeitos da queda no preço do petróleo, entrou em recuperação judicial em abril deste ano, gerando perdas bilionárias aos planos responsáveis por aposentadorias e pensões de funcionários de três das maiores estatais brasileiras. Casos como o da Sete Brasil integram um conjunto de suspeitas sobre investimentos realizados pelos principais fundos de pensão estatais nos últimos anos.

Os indícios vão desde ingerência político-partidária e gestão temerária até ações fraudulentas. Algumas dessas operações foram contabilizadas recentemente como perdas nos balanços das entidades e contribuíram para engrossar os déficits acumulados pelo efeito conjuntural da recessão nos principais ativos das carteiras. Em 2015, o rombo dos quatro maiores fundos públicos do País – Petros (Petrobras), Previ (Banco do Brasil), Funcef (Caixa) e Postalis (Correios) – somou cerca de R$ 60 bilhões.

Em três deles, os funcionários e a patrocinadora terão de contribuir com um aporte adicional para compensar as perdas. A situação gerou um alerta vermelho entre os participantes e mobilizou o Congresso a convocar, no ano passado, uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). As entidades também entraram no alvo da Polícia Federal e do Ministério Público Federal. No relatório final da CPI, os parlamentares concluíram que as 15 operações investigadas geraram um prejuízo de R$ 6,6 bilhões aos quatro principais fundos estatais e recomendaram o indiciamento de 146 pessoas.

No caso da Sete Brasil, por exemplo, ficou demonstrado que os fundos confiaram demasiadamente nas informações prestadas pela investida e, em alguns casos, desconsideraram pareceres técnicos sugerindo cautela, além de ignorar os indícios que apontavam para problemas futuros ao serem convocados para fazer novos aportes na companhia. O relatório considera provável ainda a interferência política de atores como o tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, apontado pelo ex-gerente da Petrobras, Pedro Barusco, em delação premiada, como um dos operadores das propinas envolvendo a Sete Brasil.

Vaccari, atualmente preso em Curitiba, está entre os indiciados da CPI por ter contribuído para a aprovação de um investimento da Funcef num negócio da OAS, com perda estimada de R$ 200 milhões ao fundo. A empreiteira foi uma das principais beneficiárias do esquema de corrupção na Petrobras. As negociações envolviam propinas que eram destinadas aos partidos. Para os membros da CPI, a filiação partidária de dirigentes dos fundos reforça a tese de uso político.

Três das quatro entidades investigadas tinham gestores ligados ao PT. O potencial dos fundos de pensão fora identificado pela cúpula do partido antes mesmo da ascensão à Presidência, com um esforço para emplacar filiados entre os seus membros. Após a eleição de Lula, em 2003, nomes ligados à sigla assumiram o comando das principais entidades estatais. “Chega um momento em que os responsáveis pela nomeação levam orientações de como fazer o investimento”, afirma Sergio Souza (PMDB-PR), relator da CPI dos Fundos de Pensão.

A partir de um caso envolvendo um contrato da Funcef com a Desenvix, do Grupo Engevix, a CPI encontrou indícios de que o esquema usado pela empresa de engenharia para viabilizar contratos com a Petrobras – alvo da Operação Lava Jato – pode ter se repetido em fundos de pensão. No aporte avaliado pela comissão, laudos superavaliados geraram um prejuízo de R$ 240 milhões ao fundo. Em nota, a Funcef diz ter enviado 44 ofícios à CPI e reforça o compromisso com os princípios de liquidez, solvência e equilíbrio nos investimentos.

A Previ informou que nenhum dos seus representantes foi apontado e seu modelo de governança é referência, pautado por diretrizes bem definidas e análises técnicas. A Petros afirma ter criado comissões internas para investigar os casos e contratado um escritório para analisar o relatório para tomar medidas cabíveis. Segundo o Postalis, a diretoria está fazendo esforços para recuperar recursos que impactam o déficit e para tomar as medidas cabíveis para preservar o interesse dos assistidos.

Eletrobras dominada por um Cardeal - MÁRCIO KROEHN

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Sucateada, sem dinheiro e com uma dívida bilionária. Esse é o resultado da ingerência política e da corrupção comandada pelo braço direito de Dilma Rousseff



Os fracassos dos leilões das linhas de transmissão foram a confirmação para o setor elétrico de que a situação da Eletrobras era preocupante. Desde 2012, cerca de 40% dos projetos apresentados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) não recebem propostas de empresas privadas. No último certame, realizado em meados de abril, dos 24 lotes oferecidos, apenas 14 foram arrematados. Sempre que esses buracos apareciam, a estatal, maior empresa de energia da América Latina, era obrigada a arrematar as obras.

A Eletrobras servia como o ponto de equilíbrio e evitava que a falta de fios pudesse causar um descasamento, no futuro, entre as geradoras e as distribuidoras. Essa garantia não existe mais. Com um prejuízo de R$ 31 bilhões nos últimos quatro anos e uma dívida superior a R$ 40 bilhões, a empresa ficou sem caixa para investir, uma consequência do populismo de preços, da ingerência política e da corrupção sistêmica. “A corrupção e os baixos retornos são os dois gatilhos que levaram a empresa para o buraco”, diz Thais Prandini, sócia da consultoria Thymos Energia.

Com 14 subsidiárias em geração, transmissão e distribuição de energia e 178 participações diretas e indiretas em companhias do setor, como em obras das usinas de Belo Monte, Teles Pires e Jirau, os problemas da Eletrobras estão distribuídos por todos os lados. Um nome, porém, aparece como a principal ligação entre os esquemas fraudulentos que envolveram a empresa: o engenheiro elétrico Valter Cardeal. Temido por todos os participantes do sistema elétrico nacional, ele era conhecido por ser os olhos e os ouvidos da presidente afastada Dilma Rousseff.

A união entre eles é antiga e remete aos anos 1990, quando ambos ocupavam cargos públicos no Rio Grande do Sul. A estreita confiança fez com que trocassem o PDT pelo PT no início dos anos 2000. Quando Dilma assumiu o Ministério de Minas e Energia, Cardeal foi alocado na Eletrobras. Na gigante do setor elétrico, todos sabiam que ele trabalhava como operador de Dilma, assim como Pedro Paulo Leoni atuava, no início dos anos 1990, pelo então presidente Fernando Collor na Petrobras.

Entre 2007 e 2008, por exemplo, Cardeal ocupou a presidência da estatal e só escapou da Polícia Federal e do Ministério Público por influência da madrinha. Denunciado na Operação Navalha, que descobriu desvios de recursos em obras públicas, Cardeal foi acusado de gestão fraudulenta e irregularidades, mas ele não apareceu entre os 47 presos. O que mais impressiona no estilo de Cardeal é a franqueza. Os empreiteiros relataram aos investigadores da Operação Lava Jato os encontros que tiveram com o operador de Dilma para a construção da usina de Angra III.

Embora fosse executivo da Eletrobras, Cardeal assumiu as negociações pela Eletronuclear. O consórcio formado pelas construtoras Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e UTC pediu um desconto de 10% num contrato de quase R$ 3 bilhões. Cardeal concordou em conceder 6%, mas a diferença de 4% deveria ser depositada na conta do PT. Ele é apontado, também, como operador dos esquemas nas obras das hidrelétricas de Belo Monte e Jirau. A estimativa é que a corrupção na Eletrobras movimentou algo em torno de R$ 1,5 bilhão – o escritório americano Hogan Lovells coordena uma investigação interna para apurar os desvios na companhia desde junho de 2015 e deve apresentar o primeiro relatório nas próximas semanas.

Há dois anos, o balanço da Eletrobras tem questionamentos sobre o real valor dos desvios de dinheiro. Esse problema suspendeu a negociação da ação da empresa na bolsa de Nova York, que decidirá, em outubro, sobre a deslistagem do papel. Mas Cardeal não é o único responsável por sangrar a Eletrobras. Sua madrinha Dilma, que se dizia uma especialista no setor elétrico, colaborou diretamente com a situação pré-falimentar da empresa.

A decisão populista da presidente em baixar o preço da energia a força, em setembro de 2012, minou o caixa da empresa e de suas subsidiárias, reduziu os ganhos e retirou a possibilidade de realizar novos investimentos. O TCU calcula que para tirar R$ 16,8 bilhões por ano da tarifa, o governo arcou com R$ 61 bilhões. A empresa, já prejudicada por um sistema corrompido, acabou estrangulada por uma interferência política.

Sindicalismo no controle dos correios - MOACIR DRSKA

REVISTA ISTO É DINHEIRO

Como o aparelhamento político sob os governos do PT levou a estatal a um prejuízo de R$ 2,1 bilhões e ao risco de não ter caixa para pagar salários



Com desdobramentos nas mais variadas camadas dos poderes executivo e legislativo, o terremoto de denúncias que abala o cenário político atual do País tem um epicentro. Em maio de 2005, os Correios foram o ponto de partida do roteiro que trouxe à tona o escândalo do mensalão. Tudo começou com a divulgação de um vídeo que mostrava Mauricio Marinho, então diretor da companhia, negociando propinas referentes a uma licitação. Onze anos depois, a empresa é mais um exemplo da má gestão e da deterioração acentuada das estatais brasileiras.

Em 2015, os Correios registraram um prejuízo de R$ 2,1 bilhões, sua maior perda em duas décadas. Um ano antes, a empresa já havia reportado um lucro líquido de R$ 9,9 milhões, o menor de toda a sua história. Como um sinal do momento conturbado, os dados consolidados do desempenho dos Correios em 2015 ainda não foram divulgados oficialmente, mesmo passados mais de dois meses da sua aprovação pelo conselho de administração. E se as informações preliminares já indicam um cenário nada animador, as perspectivas pela frente tampouco são positivas.

No acumulado de janeiro a maio, a empresa apurou um prejuízo de R$ 900 milhões. À frente da operação desde junho, Guilherme Campos tem destacado outros componentes desafiadores, inclusive no curto prazo. Entre eles, está o risco de não haver caixa para pagar os salários dos 117,4 mil funcionários - a primeira vez em seus 47 anos de história - e cumprir os contratos com fornecedores após o mês de setembro. Além da tentativa de recorrer a empréstimos, as medidas traçadas para dar um fôlego mínimo à estatal incluem o corte de patrocínios e a venda de ativos.

Diante desse quadro crítico, entender como uma companhia que detém um monopólio de serviços chegou a essa situação caótica é uma questão cada vez mais recorrente. As fontes consultadas pela DINHEIRO são unânimes em apontar a raiz do problema: a intensificação do aparelhamento e do uso político dos Correios durante os governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidente afastada Dilma Rousseff. “Assim como aconteceu em outras estatais, o PT montou um modelo cleptocrata de governança que quebrou os Correios”, afirma Jerson Carneiro, professor e especialista em gestão pública do IBMEC/RJ.

“O momento da empresa nada mais é do que o resultado de uma péssima gestão, inchada e entregue a sindicalistas e políticos, com o único objetivo de financiar o partido e os seus aliados.” Professor de administração pública da Universidade de Brasília (UNB), José Matias Pereira ressalta que, assim como na Petrobras, boa parte da base sindical dos Correios nutria enorme simpatia pelos governos e pelas causas petistas. “Isso favoreceu a ocupação dos cargos por pessoas despreparadas, sem conhecimento e experiência, e que não eram cobradas em nenhum momento pela competência e muito menos pelo desempenho da empresa”, afirma.

“Os Correios ainda estão de pé apenas porque detém um monopólio. Se fosse uma pessoa, eu diria que a empresa é um doente terminal”, diz o especialista. Parte de um grupo de petistas formado no Sindicato dos Bancários de São Paulo, Wagner Pinheiro, é talvez o principal exemplo desse modelo implantado nos Correios. O sindicalista assumiu o comando da empresa em 2010, após dirigir, por cinco anos, o fundo de pensão dos funcionários da Petrobras, o Petros. “Ele alterou as regras, ampliou o número de cargos comissionados e praticamente transformou a companhia em uma extensão do PT”, diz Maria Inês Capelli Fulginiti, presidente da Associação dos Profissionais dos Correios (Adcap).

Ela observa que a interferência política sempre existiu na gestão da companhia, mas que estava restrita à nomeação do presidente e de alguns assessores. “Com a entrada do PT, a ocupação dos cargos foi do presidente aos gerentes das agências.” Segundo Maria Inês, alguns dos principais elementos que afetaram o caixa e sustentabilidade dos Correios ocorreram durante a gestão de Pinheiro, concluída no fim de 2015. No período, ela destaca, por exemplo, o repasse de dividendos ao governo acima dos 25% obrigatórios por lei, no total de R$ 3,8 bilhões.

Em outra frente, a Adcap estima que a empresa tenha perdido R$ 1 bilhão em receitas entre 2012 a 2014 com a defasagem de preços dos serviços prestados pelos Correios. No período houve apenas um reajuste das tarifas postais. “Quem não autorizou os reajustes foi o Ministério da Fazenda, especialmente durante a campanha de reeleição de 2014”, diz Maria Inês. “Hoje, como consequência, a empresa está sucateada, sem caixa para investir e desenvolver novos produtos e serviços.”

Para Paulo Furquim de Azevedo, coordenador do Centro de Estudos em Negócios do Insper, os desmandos e ingerências que levaram os Correios a esse cenário ganham contornos ainda mais preocupantes à medida que o próprio setor da empresa passa por grandes transformações, com o aumento da demanda pela digitalização da informação. “Mesmo sob uma gestão de excelência, já seria extremamente difícil se adaptar a essa nova realidade, especialmente para uma empresa estatal”, diz. “No momento atual dos Correios, esse desafio é duplicado.”

Como Lula e Dilma minaram as joias da Coroa - REVISTA ISTO É DINHEIRO

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Corrupção, inchaço da máquina e apadrinhamento político são as marcas do PT nas estatais. Um legado de empresas que, em sua maioria, operam no vermelho e ostentam prejuízos bilionários nos seus balanços

15/07/2016 20:00

Por: Luís Artur Nogueira



Corrupção ativa: o tamanho do estrago na Petrobras R$ 42 bilhões é o valor estimado pela Polícia Federal em desvios na estatal ( foto: Ilustração: Evandro Rodrigues)


No comando da administração federal desde 2003, o PT deixou vários legados danosos às estatais. Dos escândalos bilionários de corrupção ao aparelhamento político, quase nada escapou das garras do fisiologismo. Fruto da barganha política, a máquina pública inchou e ficou ainda mais ineficiente, inclusive nas companhias com capital aberto. Apesar de a quantidade de estatais praticamente não ter aumentado – passou de 131 ao término do governo FHC para 135 no fim de 2014, último dado disponível –, o número de funcionários cresceu 49%.

Significa que, durante os oito anos de mandato do presidente Luiz Inacio Lula da Silva e os cinco anos da gestão Dilma Rousseff, as empresas públicas incorporaram 182 mil pessoas aos seus quadros. No total, há quase 553 mil trabalhadores, segundo dados levantados pela DINHEIRO no site do Departamento de Coordenação e Governança das Empresas Estatais (Dest), órgão ligado ao Ministério do Planejamento. “Esse inchaço nas estatais não tem nenhuma lógica econômica”, afirma Gilberto Guimarães, especialista em liderança e gestão de pessoas e professor do Grupo Laureate. “A máquina pública vai na contramão dos ganhos de produtividade”.

Se a quantidade excessiva de funcionários é um peso para o caixa das estatais, a presença de apadrinhados políticos no topo hierárquico dessas companhias torna-se um problema ainda maior para a sua sustentabilidade. Na linguagem dos funcionários concursados, os diretores, vice-presidentes e CEOs que assumem o cargo sem um currículo compatível são chamados de “paraquedistas”. “É o aparelhamento pelo qual uma pessoa é indicada por algum político sem entender nada do assunto”, diz Jason Vieira, economista-chefe da Infinity Asset Management, que trabalhou vários anos nos Estados Unidos.

No presidencialismo americano, salienta Vieira, a ingerência política é muito menor. “Se os ocupantes de cargos públicos cumprem as metas, eles podem permanecer mesmo quando troca-se um presidente democrata por um republicano”, diz o economista. “Aqui, no Brasil, a utilização do Estado como instrumento político leva à derrocada das estatais.” É imperioso notar que todas as cifras negativas envolvendo as estatais administradas pelo PT e seus partidos aliados giram na casa dos bilhões de reais, incluindo os desvios investigados pela Polícia Federal, que já prendeu caciques do partido como o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu.

Alguns exemplos: Prejuízo dos Correios em 2015: R$ 2,1 bilhões; Necessidade atual de aporte na Caixa: R$ 40 bilhões; Prejuízo da Petrobras em 2015: R$ 34,8 bilhões; Rombo dos quatro maiores fundos de pensão estatais em 2015: R$ 60 bilhões; Custo das operações do BNDES aos cofres públicos em 2015: R$ 30,5 bilhões; Prejuízo da Eletrobras nos últimos quatro anos: R$ 31 bilhões; e pedaladas no Banco do Brasil: R$ 14,8 bilhões. Sem falar na corrupção que, apenas na Petrobras, gerou desvios de R$ 42 bilhões, segundo estimativa da Polícia Federal.

“Nem mesmo as estatais com capital aberto escaparam”, diz Walter Machado de Barros, membro do conselho consultivo do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças (Ibef-SP). “Ignoraram-se as melhores práticas de governança corporativa.” Para avaliar todos esses números negativos, a DINHEIRO ouviu duas dezenas de especialistas e apresenta nas próximas páginas um resumo didático – no formato dossiê – do quadro preocupante em que se encontram as principais estatais.

A ingerência política nas empresas chegou ao ápice em 2014, ano eleitoral, quando a presidente Dilma determinou o congelamento de tarifas de energia elétrica e de preços de gasolina para controlar a inflação, gerando um passivo bilionário no caixa das companhias. Tudo foi feito para ganhar a eleição. A intervenção excessiva do PT também emperrou os projetos de infraestrutura, simbolizados no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).

Na campanha de 2010, o presidente Lula apresentou sua candidata, Dilma Rousseff, como a “mãe do PAC”, mas o “filho” não se desenvolveu. “Na área de transportes, por exemplo, perdeu-se a característica de planejar para o médio e longo prazos”, diz Mauricio Endo, sócio da KPMG para a América Latina. “Os ministérios responsáveis por infraestrutura começaram a trabalhar em cima de agendas muito politizadas, sem o devido critério técnico, e o resultado eram iniciativas díspares, que levam do nada a lugar nenhum.”

Um exemplo foi a transposição do Rio São Francisco, um plano ambicioso e complexo, que acabou sendo realizado parcialmente. Ao diminuir de tamanho, o projeto perdeu grande parte de sua lógica e deixou de atingir os benefícios projetados. Além disso, muitas licitações acabaram sendo apressadas e realizadas sem planejamento. O resultado foram leilões esvaziados e problemas que só eram percebidos depois de iniciadas as obras. Dessa forma, as empresas pediam mais dinheiro e o governo federal decidia parar as obras.

Quando houve concessões maiores à iniciativa privada, aconteceram alguns avanços, como nos aeroportos. Porém, diante da atual crise econômica, as concessionárias estão pedindo um prazo maior para pagar a parcela da outorga deste ano. Nas concessões de rodovias feitas no governo Dilma, o cenário é parecido. Os vencedores tentam renegociar os contratos em vigor diante de um estrangulamento financeiro. Trata-se de uma situação, no mínimo, curiosa, pois o governo petista tentou ao máximo limitar os ganhos do capital privado.

A estratégia do período Lula também fracassou. Ao impor uma tarifa muito baixa ao usuário final, o governo sufocou as concessionárias de rodovias que não tinham caixa para cumprir as metas de investimentos estabelecidas nos editais. “Existia uma questão ideológica muito forte, defendendo que o setor privado não poderia ter lucro na prestação de serviços públicos, o que prejudicava muito a atração de investidores”, diz o consultor Endo, da KPMG.

Dessa forma, o governo tentava adivinhar o ponto ótimo de lucro da empresa que venceria a concessão, em vez de deixar o mercado, por meio de competição e de estudos de viabilidade econômica, chegar à melhor proposta. Com isso, poucos competidores entravam na disputa, e quem ganhava descobria depois que não tinha condição de entregar um bom serviço.

Até mesmo a forma de tentar agilizar as contratações era equivocada. O governo Dilma instituiu o Regime Diferenciado de Contratações, em 2011, que permitia contratar obras sem um projeto definitivo. Mas o que devia ser um modelo especial, adotado para alguns projetos pontuais, virou a regra em obras do PAC, da Olimpíada e da Copa do Mundo, dentre outras. Isso escancarava a falta de planejamento que permeava a administração federal.

TREM-BALA Talvez não exista símbolo melhor dessa dificuldade de planejar do que o projeto de trem-bala, que ligaria os dois principais polos produtivos e consumidores do Brasil: Rio de Janeiro e São Paulo, com parada final em Campinas. Obsessão de Dilma, ele jamais saiu da fase de planejamento até ser finalmente descartado, em 2015, sem nunca ter recebido um estudo detalhado que fosse referendado como realista pela iniciativa privada.

Em 2012, o governo inclusive criou a Empresa de Planejamento e Logística (EPL), uma estatal que tinha a missão de viabilizar o trem-bala e outros projetos ferroviários de alta velocidade. Financiada totalmente pelo Tesouro Nacional, a EPL foi fundada com 65 funcionários e chegou a 181 trabalhadores em 2014, último dado disponível. Na lista de ideias despropositadas dos governos do PT, inclui-se a recriação, em 2010, da Telebras, que remunera 257 funcionários para cuidar do Plano Nacional de Banda Larga (PNBL) – eram 126 no ano da refundação.

Primeiro ocupante do cargo, o engenheiro Rogério Santanna foi demitido após um ano pelo então ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, que recentemente foi preso pela Polícia Federal no âmbito da Operação Custo Brasil. “O PNBL acabou”, afirmou Santanna, que se desfiliou do PT em 2013, após 26 anos de militância. De fato, o plano não cumpriu a meta de levar internet rápida a 40 milhões de domicílios até 2014, mas os custos da Telebras continuaram onerando os cofres públicos – é a herança da gestão pública petista.

Colaborou: Carlos Eduardo Valim

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Fiscalização desregulada

Indicações políticas e falta de verbas minaram as agências reguladoras na gestão do PT

Por Flavia Galembeck

Um recente estudo da escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV) de São Paulo com agências reguladoras mostrou em números algo que críticos já vinham alertando: o tempo para a indicação de diretores, atribuição exclusiva do presidente da República, aumentou na gestão de Dilma Rousseff. Só para citar um exemplo, entre fevereiro de 2012 e julho de 2015, por demora na escolha de candidatos, a Agência Nacional dos Transportes Terrestres (ANTT) ficou mais de três anos e cinco meses sem poder votar questões importantes.

“No governo de Dilma Rousseff aumentou muito o prazo para as indicações. É provável que isso tenha acontecido por sua falta de apoio político no Senado, responsável por sabatinar os candidatos”, diz um dos coordenadores do estudo da FGV, Bruno Meyerhof Salama. A lentidão, no entanto, vira um problema menor quando comparado a outro aspecto exposto pela pesquisa: o viés político de muitos dos indicados. “A maioria dos dirigentes das agências reguladoras vem de ente ou órgão do Estado, seja do Executivo, Legislativo ou Judiciário,” afirma Salama.

Não por acaso, um em cada cinco presidentes de agências reguladoras não termina seu mandato, por conta da troca de governo. Na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), por exemplo, o percentual de dirigentes que renuncia antes do prazo é de 39%. Para o especialista em Direito Regulatório José Del Chiaro, as indicações políticas minam a independência das agências. “Elas foram loteadas por interesse e se tornaram reféns do contexto político, quando deveriam primar pelo aspecto técnico para, assim, evitar distorções”, diz Del Chiaro.

O círculo é vicioso. As indicações políticas aumentam a instabilidade regulatória e jurídica, o que, por sua vez, reduz o interesse do empreendedor em investir, na avaliação de Tiago Lobão, sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados. “Dentro do risco Brasil, agora há o risco regulatório e os investidores já estão precificando isso”, diz Lobão, que é especialista em Direito Regulatório e Infraestrutura e não tem parentesco com o ex-ministro de mesmo sobrenome. “Outra conse-quência é a judicialização dos temas que, em algum momento, pode resultar em tarifas maiores.” Somam-se a isso os velhos problemas de falta de pessoal e de verbas, especialmente para a fiscalização, para se concluir que as dez agências reguladoras federais não conseguem cumprir o seu papel.

A Lava-Jato vai acabar? - JOAQUIM FALCÃO

O GLOBO - 16/07

O mais provável é a descentralização das investigações, o que já está ocorrendo


RIO — O juiz Sérgio Moro disse outra vez em Nova York que pretende encerrar seus processos por volta do final do ano. Isso significa que a Lava-Jato vai acabar? É pouco provável. Por dois motivos.

Primeiro, porque as colaborações premiadas ainda não acabaram. Estão em curso as colaborações da OAS e da Odebrecht. Em ambos os casos, dada a natureza descentralizada das obras, elas devem revelar informações que irão além do plano federal. Focarão nas relações entre autoridades estaduais e municipais e essas empresas.

O mais provável é a descentralização da Lava-Jato.

Segundo, porque o juiz e a força-tarefa de Curitiba não detêm o controle das informações que ainda estão por vir. E, se vierem, os delegados, os procuradores e o juiz têm a obrigação funcional de mandar apurar os atos potencialmente ilícitos. Prosseguir ou não com as investigações não é ato de vontade discricionário de qualquer deles. É dever.

O cenário mais provável já está ocorrendo. A Lava-Jato se multiplica, e as investigações se nacionalizam. Várias jurisdições, em vários estados. Justiça estadual e Justiça Federal. Várias forças-tarefas. Como já existe em São Paulo, Rio e Brasília.

O que coloca dois tipos de pressão sobre o Supremo e os demais tribunais superiores.

De um lado, o Supremo será capaz de ultrapassar a sua atual fragmentação interna? Onde cada ministro parece ter uma posição diferente? Que muda com o passar do tempo? Será capaz de indicar um rumo seguro de responsabilização para os que cometeram ilícitos?

De outro, o Supremo e os tribunais superiores serão capazes de tomar decisões em tempo? Serem ágeis? Os juízes de primeira instância têm sido. Agilidade judicial não é incompatível com o direito de defesa.

A Justiça americana, por exemplo, julga agora, dia 19 de setembro, o direito dos investidores americanos que se sentiram lesados por casos de corrupção na estatal. Vai ser mais rápida que a nossa Justiça. Respeitando plenamente o direito de defesa. E os nossos investidores? E a responsabilização pelos ilícitos praticados aqui no Brasil?

*Professor da FGV Direito Rio

Promessas olímpicas - LEANDRO COLON

FOLHA DE SP - 16/07

Painel com decoração da Rio-2016 separa a Linha Vermelha do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro (RJ). A Prefeitura do Rio de Janeiro nega que seja para esconder a favela.



BRASÍLIA - O Rio bateu Madri na briga pela sede dos Jogos Olímpicos de 2016 na eleição do COI (Comitê Olímpico Internacional) em Copenhague no dia 2 de outubro de 2009. Foi uma noite de festa, vinho espanhol, piña colada, cerveja e boca-livre na Dinamarca, conforme relatou a Folha na ocasião. Teve até ministro cantarolando Ary Barroso na balada brasileira.

Após o anúncio do resultado, o então presidente Lula não se conteve: "O Brasil conquistou a cidadania internacional". Figuras como Sérgio Cabral, Eduardo Paes, Carlos Arthur Nuzman, Henrique Meirelles e Pelé celebraram com o petista. Prometeram-nos um novo Rio.

Michel Temer estava na comitiva como presidente da Câmara e na condição de favorito a vice no ano seguinte na chapa de Dilma Rousseff, que chefiava a Casa Civil.

Quase sete anos se passaram do regabofe de Copenhague. Lula é personagem da Lava Jato, sua sucessora, uma presidente afastada, e Temer, o comandante interino do país.

A apenas três semanas da cerimônia de abertura da Rio-2016, o governo anuncia um novo plano para controlar a ameaça de terror no maior evento esportivo do planeta.

O general Sérgio Etchegoyen, ministro-chefe do GSI, afirmou que o atentado em Nice, na França, exige do governo "uma série de revisões" (como se fosse necessário mais um ataque do tipo para adotá-las).

O governo promete medidas ao mesmo tempo em que agentes da Força Nacional, despachados ao Rio para a vigilância dos Jogos, são impedidos por milícias de instalar internet em seus alojamentos. Conquistamos a tal "cidadania internacional" com a Rio-2016, mas nossos soldados não acessam nem e-mails.

Garoto propaganda da candidatura do Rio, o escritor Paulo Coelho avisou em 2009 que plantaria bananeira na praia de Copacabana durante os Jogos se a cidade fosse escolhida. Que pelo menos a promessa do mago seja cumprida.


O pior pelo retrovisor - MÍRIAM LEITÃO

O GLOBO - 16/07

Na visão do mercado, recessão pode estar perto do fim. Os efeitos da crise ainda são fortes, mas a bolsa de valores já acumulou a expressiva alta que passa de 45% desde o final de janeiro. O índice de ações do setor elétrico disparou mais de 60%, os papéis da Petrobras dobraram de valor. O resultado reflete a percepção de algumas melhoras, inclusive regulatórias, na economia e a avaliação de que a recessão está perdendo força, apesar de estar claro que não haverá a volta rápida do crescimento.

O momento mais crítico do ano para a bolsa foi no final de janeiro. Ela chegou a 37 mil pontos. Agora está em 55 mil pontos. Nos últimos dias, foram oito pregões consecutivos de alta. Isso é reflexo basicamente de dois fatores: a expectativa de melhora na economia brasileira, e também a aposta de que o Banco Central americano não vai elevar os juros na velocidade esperada, cenário que foi reforçado com a saída do Reino Unido da União Europeia.

— O mercado vive um momento de euforia, colocando nos preços a perspectiva de melhora em relação ao futuro do Brasil. Há um fluxo grande de capitais do exterior vindo para cá, por causa da menor chance de alta de juros nos EUA. Além disso, muitos ativos aqui ficaram baratos no auge da recessão — explicou o economista William Castro Alves, da Valor Gestora de Recursos.

Ontem, também houve alívio com a divulgação do crescimento da economia chinesa, que manteve o ritmo de 6,7% no segundo trimestre, na taxa anualizada. Uma desaceleração brusca na segunda maior economia do mundo atingiria diretamente o Brasil, porque os chineses são o nosso principal parceiro comercial. Além disso, teria reflexos no próprio crescimento global, com outros efeitos indiretos sobre o país.

Na bolsa brasileira, o índice do setor elétrico acumula alta de mais de 60% desde janeiro. William Castro Alves explica que a mudança de governo deu mais segurança aos investidores, que enxergam menos interferências públicas nas decisões das estatais e também na Aneel, que fica mais forte para desempenhar seu papel de órgão regulador. As chuvas recuperaram um pouco os reservatórios de água e diminuíram custos. A melhora do PIB no futuro irá elevar o consumo de energia.

— O setor siderúrgico também teve um ganho forte na bolsa. Basicamente, o mercado está dando novos preços a ativos que afundaram no auge da recessão. Também é importante frisar que isso tudo acontece porque ninguém espera a volta da presidente Dilma ao poder. O cenário básico é de aprovação do impeachment no Senado — explicou.

A ação da Petrobras chegou a ser cotada em R$ 4,2 em janeiro e agora voltou para a casa de R$ 11. A nova diretoria da estatal foi bem recebida pelo mercado, e as mudanças no modelo de exploração do pré-sal, em votação no Senado, serão benéficas para a companhia, que precisa focar na redução do seu endividamento. Por outro lado, empresas do setor de celulose, que vinham se beneficiando do enfraquecimento do real, estão tendo pior desempenho, assim como outras exportadoras, com a valorização da nossa moeda nos últimos meses.

O país ainda vai conviver por um bom tempo com números negativos, como os que foram divulgados esta semana nos índices de vendas de varejo, serviços e o IBC-Br do Banco Central. O mercado de trabalho também deve demorar mais para reagir, e ninguém espera a queda forte dos juros, que ajudaria a impulsionar as vendas de produtos que dependem de financiamento.

A boa notícia, neste momento, é que o mercado de capitais sempre tenta antecipar novas tendências, e a aposta agora é de que o pior momento da recessão pode ter ficado para trás.

Por um Estado mais eficiente - VLADIMIR KUHL TELES

FOLHA DE SP - 16/07

A estabilidade fiscal é uma condição necessária para o crescimento econômico, pois uma grande dívida pública implica subtração cada vez maior da poupança da economia para sustentá-la, diminuindo os investimentos produtivos.

O Brasil é, dentre as economias emergentes, o país com maior dívida em relação ao PIB (Produto Interno Bruto). A média de dívida pública desse grupo é de 45% do PIB, enquanto a nossa chega a 73,3%, com projeções de 80,5% até o próximo ano.

Além disso, o aumento contínuo e estrutural de despesas nas últimas duas décadas forçou uma elevação ininterrupta da carga tributária. Em 2016, trabalhamos até 1º de junho somente para pagar impostos.

Como o aumento de gastos é em grande parte estrutural, é urgente uma reforma do Estado, e não apenas um ajuste fiscal, para sinalizar uma trajetória sustentável no médio prazo. Assim, a imposição de um teto para a expansão de gastos, proposta pelo Ministério da Fazenda, é uma política crível para a sustentabilidade fiscal e a retomada da atividade econômica.

No entanto, a reforma não deveria se ater a limitar os gastos. Para realmente estimular a economia, precisaria aumentar substancialmente a produtividade do setor público. Um governo que subtrai cerca de 40% da renda dos brasileiros tem a obrigação de entregar serviços de comprovada eficácia.

De acordo com ranking do Global Competitiveness Index (GCI), que avalia 140 países, o Brasil é o 136º em eficiência do setor público, sendo o 133º em evitar desperdício do orçamento. Não há dúvida de que a ineficiência passa, necessariamente, pelas regras do funcionalismo público.

O setor paga salários 30% maiores, em média, que o privado (comparando-se trabalhadores com características similares) e estabelece, além disso, regras de estabilidade e isonomia que configuram todos os incentivos para a falta de produtividade de seus empregados.

A estabilidade e a isonomia no funcionalismo público devem, sim, ser extintas. Afinal, por que um professor concursado que tem por hábito faltar às aulas, prejudicando o desenvolvimento cognitivo de nossos filhos, não pode ser demitido?

Por que os médicos da rede pública não são pagos por produção, por atendimentos realizados, evitando, assim, as filas imensas que castigam a população?

Por que a promoção na carreira de um professor universitário não depende de sua produção acadêmica, como ocorre nas melhores instituições do mundo?

A sociedade não suporta mais ficar sujeita a serviços públicos de péssima qualidade, e o setor privado, confrontado com tamanha carga tributária, não possui condições de investir mais e gerar empregos.

Os funcionários públicos, como os demais cidadãos, deveriam ser avaliados pela produtividade. Não poder demiti-los, ao menos facilmente, por ineficiência ou em períodos de crise, de enxugamento da máquina, é um absurdo que pune toda a sociedade.

Aumentar salários de servidores num período de recessão, sem exigir qualquer contrapartida e sem indicar qualquer reforma, é, no mínimo, uma ofensa.

O principal problema da economia brasileira é o crescimento institucionalizado dos gastos públicos, aliado à sua falta de produtividade. A imposição do limite para o crescimento dos gastos é um passo importante para resolver esse problema. Mas o país precisa de reformas mais profundas, ajustando as regras do funcionalismo público e reduzindo a burocracia.

VLADIMIR KUHL TELES, 38, pós-doutor em macroeconomia pela Universidade Harvard (EUA), é vice-diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas

Parece loucura, mas tem método - BOLÍVAR LAMOUNIER

ESTADÃO P 16/07

Elite conspiratória houve no petrolão: empreiteiros e agentes dos governos do PT



No Brasil, os intelectuais não se criticam mutuamente. Trata-se, ao que parece, de uma decorrência da exiguidade numérica: num grupo tão pequeno, questionamentos mútuos “não pegam bem”. Pode também ser um modus vivendi: como a maioria combina a atividade docente universitária com algum envolvimento político, cada um se sente no direito de fazer proselitismo partidário ou ideológico sem ser “incomodado” pelos demais.

Tal entendimento parece-me até certo ponto razoável, por duas razões: de um lado, nossa vida universitária nunca se pautou pelo estrito ascetismo outrora cultivado em algumas universidades do Primeiro Mundo; do outro, momentos cruciais da construção democrática brasileira exigiram uma defesa enfática da liberdade de cátedra, estreitamente associada à de expressão do pensamento. Fato, seja como for, é que entre nós o debate aberto e por vezes contundente que se observa nos países academicamente adiantados nunca se desenvolveu.

Ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, onde as revistas especializadas e mesmo alguns jornais, como The New York Review of Books, regularmente publicam resenhas sérias dos novos lançamentos editoriais, no Brasil resenhar é quase sinônimo de elogiar. Essa tradição, que remonta à época nada gloriosa dos catedráticos medalhões, afigura-se esdrúxula nos dias de hoje, com o regime democrático em pleno desenvolvimento, tendo os intelectuais um papel sabidamente importante na formação da opinião pública e cada cidadão querendo saber onde vai parar o dinheiro dos impostos que paga.

Fiz as observações acima instigado por declarações da doutora Marilena Chaui, professora titular de Filosofia da Universidade de São Paulo. Farei referência a três episódios: um, de dez anos atrás, associado ao “mensalão”; outro, de 2012, em que ela disse cobras e lagartos sobre a classe média brasileira; e um recente, a respeito da Operação Lava Jato e do juiz Sergio Moro.

Na primeira, contestando a veracidade das acusações referentes à compra de apoio no Congresso pelo PT, a professora Chaui interpretou-as, bem à maneira das chamadas “teorias conspiratórias”, como uma campanha difamatória urdida pela mídia, que se teria comportado como uma elite coesa. Em 2012, num evento organizado, se bem me lembro, por seu partido, num tom inusitadamente exaltado, ela declarou odiar a classe média. “Odeio-a”, especificou, “porque é ignorante e fascista”. Na mais recente, disse que os inquéritos em andamento nada têm que ver com combate à corrupção, tratar-se-ia de uma operação estrangeira (norte-americana, presumo) cujo real objetivo seria “tirar-nos o pré-sal”, hipótese ao ver dela comprovada pelo fato de o juiz Sergio Moro ter sido “treinado pelo FBI”.

A questão, como se vê, é como a comunidade intelectual – cuja segmentação ideológica tive o cuidado de ressaltar acima – reage a tais declarações. Podem elas ser aceitas como expressões normais de um determinado ponto de vista ideológico ou extrapolam tal âmbito, a ponto de merecerem alguma crítica? É óbvio que não tenho procuração para falar por outros integrantes de tal comunidade – e muito menos interesse em fazê-lo. Falo por mim.

Quanto a conspirações de elite, sou forçado a perguntar se a professora Chaui ponderou devidamente as companhias a que se reuniu ao abraçar esse tipo de teoria. Falo, naturalmente, dos Protocolos dos Sábios de Sião, cânone da virulência antissemita, da acusação, também falsa e antissemita, contra o capitão Dreyfus; e mesmo da peça também falsa e antissemita, denominada Plano Cohen, obra do então coronel Olímpio Mourão Filho, produzida na antevéspera do autogolpe getulista de 1937. Quem pensa dessa forma vê conspirações por todo lado, tramadas ora pela mídia, ora pelos judeus, ora pelo imperialismo. Karl Popper discute essa questão em seu celebrado livro A Sociedade Aberta e seus Inimigos: “Não afirmo que conspirações nunca acontecem. Ao contrário, elas são fenômenos sociais comuns. (Mas) tornam-se importantes, por exemplo, quando pessoas que acreditam em teorias conspiratórias – principalmente pessoas que acreditam saber como criar um paraíso na terra – chegam ao poder e se engajam em contraconspirações contra inexistentes conspiradores. Porque precisam explicar seu fracasso em produzir o almejado paraíso”.

Provavelmente por não ter-se debruçado sobre os problemas acima mencionados, Marilena Chaui recai na teoria conspiratória ao falar da Lava Jato, apenas substituindo a elite oculta do mensalão pelo imperialismo e pelo juiz Sergio Moro; e o mais pitoresco é que, no petrolão, houve de fato uma elite conspiratória: um conluio de grandes empreiteiros com altos agentes dos governos Lula e Dilma.

Em sua invectiva contra a classe média, não é mais a uma elite oculta que Marilena Chauí se refere, mas há um elemento comum importante a ressaltar. A ilustre filósofa ter-se-ia expressado melhor, com mais atenção à diversidade do fenômeno de que tratou, se tivesse lido Who Voted for Hitler?, de Richard F. Hamilton, mas esse não é seu método de trabalho. Ela presume, simplesmente, a existência de uma “pequena burguesia”, uma camada social homogeneamente ignorante e fascista.

Apesar de sua brilhante trajetória como professora de Filosofia, ela não vê dificuldade em atribuir determinados traços a esse coletivo abstrato e hipostasiado que é sua “classe média”. O mais curioso é ela ter declarado isso justo quando o governo petista trombeteava a entrada do Brasil no seleto grupo dos países “de classe média”. Graças a suas políticas sociais, mais de 50% da população brasileira teria ascendido ao paraíso dos ignorantes e fascistas.

BOLÍVAR LAMOUNIER É CIENTISTA POLÍTICO, SÓCIO-DIRETOR DA AUGURIUM CONSULTORIA, MEMBRO DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

O fim do centrão - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 16/07

A organização da nova correlação de forças no Congresso exigirá do presidente interino Michel Temer mais habilidade que normalmente, pois se é certo que o centrão já não tem uma liderança que o coloque em posição de disputar o poder parlamentar, o espírito que o gerou, a vontade de ser partícipe desse novo núcleo político majoritário, existe nos diversos partidos que o compõem.


Pequenos grupos políticos surgidos em conseqüência de uma lei partidária que parece ter como lema a velha máxima de que sempre cabe mais um, acabam se transformando em máquinas de criar embaraços ao governo da ocasião para literalmente vender facilidades em troca.


Um dos problemas na reforma política que necessariamente terá que ser feita é justamente permitir a criação de espécies de consórcios partidários, que teriam os mesmos benefícios e privilégios dos partidos que atingissem o mínimo necessário de votos para atuar no Congresso.


O centrão, por exemplo, poderia se transformar num consórcio desses, e em vez de desidratar, como gostaria presidente interino Michel Temer, ganharia consistência. O difícil nessas situações é unificar siglas que não têm nada em comum a não ser o desejo de participar do jogo político para benefício próprio.


E são tantos os interesses específicos dessas pequenas siglas – que já chegaram a reunir 300 deputados – que se torna impossível saber para que lado seguirão. Se esse é um problema quase insolúvel para o centrão, sua dissolução é uma boa notícia para a prática política.


Uma tendência possível é que, diante da cláusula de barreira aprovada, esses deputados procurem uma legenda mais forte, pois perderiam a facilidade da coligação proporcional, principal responsável pela eleição de vários desses deputados de poucos votos.


Diz o ministro Geddel Vieira Lima, responsável pela ligação do governo com os partidos, que é incorreto identificar esse grupo como centrão, já que os partidos teriam identidades próprias. É uma maneira sutil de inflar o ego de cada deputado desses para atraí-los para o governo, coisa que pode parecer dispensável aos neófitos como a presidente afastada Dilma, mas é fundamental nesse jogo de aproximações que, sendo um jogo, não tem necessidade de refletir a realidade, mas apenas a aparência que cada jogador gostaria de ter.


Mesmo que a maioria deles, ou todos, estejam inclinados a estar próximos do governo, qualquer governo, é preciso fingir que sua cooptação é fruto de uma negociação política, não uma conseqüência quase automática de seu adesismo.


Peguemos Gilberto Kassab, ministro das Comunicações, Ciências e Tecnologia de Temer, ministro das Cidades de Dilma, um político de múltiplas facetas como se vê. Criou do nada o PSD, um partido que, segundo sua definição, não é de direita, nem de centro, nem de esquerda.


Pois é do PSD Rogério Rosso, o candidato do Centrão que disputou o segundo turno, exemplo do que está sendo desidratado para que a maneira de fazer política fique mais transparente. Ninguém dirá isso no governo, mas o fim do centrão tal como foi criado representa um avanço democrático que deve ser comemorado.


Rodrigo Maia e a luta contra a corrupção - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 16/07

Além de se comprometer com a pauta das reformas, novo presidente da Câmara não pode se esquecer do aperfeiçoamento legal para a defesa do dinheiro público


O clima de distensão na Câmara, a partir da vitória de Rodrigo Maia (DEM-RJ) na disputa pela presidência da Casa, simbolizado pelo abraço do deputado fluminense no adversário derrotado, Rogério Rosso (PSD-DF), cria um espaço para negociações sérias sobre temas urgentes dos quais a Câmara precisa tratar. A agenda de reformas, para estabilizar a economia, se impõe, por exemplo. O próprio Maia já deu declarações sobre isso. Porém, há mais. A pauta do combate à corrupção também é prioritária, para que o Congresso aperfeiçoe os instrumento legais, com a finalidade de coibir o roubo do dinheiro do contribuinte.

Há em andamento um processo de higienização da vida pública. Mas ele precisa ganhar velocidade e não permitir retrocessos. O fortalecimento do Ministério Público, consolidado na Constituição de 88; a profissionalização e autonomia operacional da Polícia Federal e uma melhor atuação da Justiça, pela própria troca de gerações, são muito positivos. Não é, portanto, por acaso que nestes últimos dez anos têm transcorrido operações emblemáticas de enfrentamento da corrupção — o desbaratamento do mensalão e a Lava-Jato, os grandes destaques.

No âmbito do Legislativo, houve a aprovação da Lei da Ficha Limpa, um projeto de origem popular e que veio impedir que se candidate quem tiver sido condenado em segunda instância — portanto, por um colegiado de juízes —, sem ser necessário esperar o “trânsito em julgado”, um longo caminho até a última instância, repleto de chances de recursos protelatórios.

Rodrigo Maia precisa se comprometer também com a agenda do combate à corrupção. As resistências no Congresso são conhecidas. No mesmo caminho percorrido pelo projeto da Ficha Limpa, dez propostas de medidas anticorrupção, formuladas pelo MP a partir da Lava-Jato, chegaram ao Congresso sustentadas por dois milhões de assinaturas.

Waldir Maranhão (PP-MA), ainda na presidência da Câmara, resistiu a instalar a comissão para dar início à tramitação da proposta. Pressionado, a instalou. Cabe a Rodrigo Maia dar sequência à tramitação do projeto. Em palestra proferida em Washington, quinta-feira, o juiz Sérgio Moro criticou governo e Congresso, por não fazerem contribuições “significativas” neste campo. É indiscutível. No caso do Congresso, quando não é passivo, trabalha contra. Vide o projeto de lei do “abuso de autoridade”, hoje no Senado, no qual investigados pela Lava-Jato depositam esperanças para barrar o MP e a PF. Há, também, projetos lulopetistas para tornar inócuas as delações premiadas, com a proibição de que presos possam fazê-las.

Sabe-se do risco que corre a moralização em curso, a partir da esfera do Judiciário, do MP e da PF, com a possibilidade real de ocorrerem no Brasil retrocessos idênticos aos verificados na Itália depois da Mãos Limpas. Grupos políticos italianos atingidos por aquela devassa, feita também por organismos de Estado, nos subterrâneos financeiros da política, reagiram com a aprovação de leis para barrar as investigações. Tentativas com o mesmo objetivo já ocorrem hoje no Brasil.

O campo parlamentar é portanto essencial para consolidarem-se um sistema e uma cultura de punição de corruptos e corruptores. O novo presidente da Câmara precisa ter consciência disso.

O terror dos lobos solitários - EDITORIAL O ESTADÃO

ESTADÃO - 16/07

Num caminhão alugado, o terrorista avançou sobre a multidão, dirigindo em ziguezague de modo a atingir o máximo de pessoas


O atentado em Nice, no sul da França, que deixou um saldo de no mínimo 84 mortos – número que pode aumentar porque entre os mais de 100 feridos havia 52 em estado grave –, tem características que confirmam as previsões mais pessimistas sobre as dificuldades do combate ao terrorismo em todo o mundo. E o que primeiro chama a atenção nesse caso é a dimensão da tragédia que um só terrorista, com recursos limitados, é capaz de provocar, num país que, por ser um dos mais visados, é em princípio também um dos que devem estar mais preparados para enfrentar esse problema.

Tudo foi bem calculado. Tanto a escolha do dia – o 14 de Julho, data nacional da França – como o local, a famosa Promenade des Anglais, que margeia a praia, um dos mais movimentados da cidade, e da hora, ao fim do espetáculo de fogos de artifícios, antes de a multidão ali reunida começar a se dispersar. Nice é uma das principais cidades turísticas do país e recebe grande número de estrangeiros no verão europeu.

Num caminhão alugado, o terrorista avançou sobre a multidão, dirigindo em ziguezague de modo a atingir o máximo de pessoas. Ele percorreu assim dois quilômetros – o que explica tantos mortos e feridos –, ao fim dos quais, atacado por policiais, desceu e morreu disparando uma pistola. No depoimento de uma testemunha, “corremos sem saber muito o que fazer. Foi um pânico incrível, com todo mundo correndo na Promenade e na praia”. A presença de famílias com filhos pequenos – há 10 crianças entre os mortos – aumentou o desespero e o descontrole.

Passado o primeiro choque da tragédia, as autoridades francesas, às voltas com o terceiro atentado em pouco tempo – os outros dois, em 2015, foram o do jornal Charlie Hebdo, em janeiro, e o de novembro, que teve vários alvos e deixou 130 mortos –, e os especialistas em terrorismo em todo o mundo tentam entender o que aconteceu. O que se sabe até agora do terrorista, Mohamed Lahouaiej Bouhiel, é que é um franco-tunisiano de 31 anos, morador de Nice, com antecedentes de delitos comuns, mas sem ligação com o Estado Islâmico, a Al-Qaeda e outros grupos terroristas que atuam no Oriente Médio.

Portanto, um lobo solitário, como tudo indica, mas diferente dos até aqui conhecidos dessa categoria, que agem manipulados a distância por aqueles grupos. Sua ligação com eles seria indireta. O terrorista de Nice seria um produto do caldo de cultura criado por extremistas, que a partir tanto do Oriente Médio como de núcleos que atuam nos países europeus pregam a luta contra os valores ocidentais, ao mesmo tempo que exploram o ressentimento de filhos de imigrantes não inteiramente integrados às sociedades em que vivem.

Lidar com esses lobos solitários – com destaque agora para o tipo que agiu em Nice – é um dos maiores desafios da luta contra o terrorismo. É muito difícil descobri-los, localizá-los, monitorá-los e, portanto, prever quando passarão à ação. Foi o que aconteceu com os dois terroristas que cometeram em abril de 2013 o atentado na maratona de Boston, que deixou 3 mortos e 264 feridos, os que agiram em Paris em novembro do ano passado e agora – o mais complicado de todos – o de Nice.

Essa incapacidade de prever cria uma sensação de impotência, que afeta desde a população até os responsáveis pelo combate ao terror. E isso tende a piorar a curto prazo, com os reveses que vem sofrendo o Estado Islâmico (EI) na Síria e no Iraque. Derrotados ali, privados dos territórios onde sonhavam implantar seu califado, os combatentes do EI devem se dispersar e apelar cada vez mais para o terrorismo, em qualquer parte do mundo, como já advertiram vários especialistas e o diretor do FBI, James Comey.

Encontrar um meio de lidar com essa complicada situação e neutralizar tanto quanto possível a ação dos terroristas é hoje o grande desafio dos serviços de inteligência, em especial os dos Estados Unidos e dos países europeus, que dispõem de mais recursos e experiência nesse terreno.

O ocaso de Lula: desprestígio, abandono e suspeitas - REVISTA VEJA


Seis anos depois de deixar o poder, petista convive com o descrédito político, o sumiço dos amigos e os inquéritos da Lava Jato

Por Thiago Bronzatto, de Caruaru, e Daniel Pereira




ENTREATOS - Lula com militantes sem-terra em Pernambuco, na semana passada: maior inclinação para reminiscências (Cristiano Mariz/O ocaso de Lula: desprestígio, abandono e suspeitas)


Às 7h50 da última quarta-feira, um segurança do ex-presidente Lula chegou ao Aeroporto Oscar Laranjeira, em Caruaru, no agreste de Pernambuco. Diligente, comunicou que um Gulfstream G200, avião executivo de luxo e alta performance, estava a caminho da cidade. Minutos depois, dois representantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e o vice-prefeito Jorge Gomes (PSB) estacionaram seus carros no local. Estavam apreensivos, porque não havia militantes para oferecer uma recepção calorosa a Lula. “Eles vão chegar. Pode ficar tranquilo”, disse um dos líderes do MST ao segurança, tentando amenizar a tensão. Uma hora mais tarde, só oito pessoas aguardavam o ex-presidente. “Vamos partir para o plano B. Acho melhor receber o Lula no hotel. Manda o pessoal para lá”, ordenou o guarda-costas. Em seguida, ele trancou a porta de entrada do saguão do aeroporto, que é público, para evitar que alguém fotografasse o deserto que aguardava Lula, aquele que já foi um dos políticos mais populares do mundo. “O cara”, como disse o presidente americano Barack Obama, numa ocasião em que se encontraram.

Lula desembarcou às 9h13 acompanhado do senador Humberto Costa (PT-PE). Driblou as poucas pessoas curiosas que o aguardavam e deixou o aeroporto pelos fundos. “Pensei que ele fosse ao menos pegar na minha mão e me cumprimentar”, reclamou Augusto Feitosa, funcionário do aeroporto. Os tempos são outros. A popularidade e o prestígio de Lula também. Caruaru é testemunha dessa transformação. Em 27 de agosto de 2010, o então presidente desembarcou no mesmo Oscar Laranjeira ao som de uma orquestra formada por estudantes de uma escola pública. O saguão estava lotado. Sorridente, Lula abraçou eleitores e posou para fotos ao lado de autoridades como Fernando Haddad, então ministro da Educação, hoje prefeito de São Paulo, e a então primeira-­dama do Estado de Pernambuco, Renata Campos. Em seu último ano de mandato, Lula beneficiava-se do crescimento econômico, que atingiu 7,5% em 2010. Nem o céu parecia lhe servir de limite. “Se a gente continuar mais dez anos do jeito que está, daqui a pouco chega a Caruaru e pensa que está em Paris, em Madri, de tão chique.”

Caruaru continua Caruaru. Figura entre as doze piores cidades para viver no Brasil. E Lula deixou de ser Lula. Lidera no quesito rejeição entre os nomes cotados para disputar a Presidência em 2018. Na quarta-feira passada, Lula discursou em Caruaru num auditório com capacidade para setenta pessoas. A plateia era formada por militantes do MST e da CUT, que preferiram tomar o café da manhã do hotel a esperar o petista no aeroporto. A programação previa uma coletiva de imprensa. Não ocorreu. Só Lula e áulicos falaram. Mas o ex-presidente mantém um fotógrafo e uma equipe de documentaristas, sempre a postos para captar as melhores cenas. Enquanto estava no hotel, um militante rompeu o cerco de seguranças e tirou uma foto com Lula, mas a equipe do ex-presidente o obrigou a apagá-la. A imagem mostrava uma garrafa de uísque ao fundo. Não pegaria bem nas redes sociais, foi a justificativa apresentada.

Depois do evento, Lula saiu pela garagem, num carro com os vidros fechados, e percorreu um trajeto de apenas 400 metros até o trio elétrico que o esperava para um novo discurso. “Ele parece estar meio distante do povo, com um olhar desconfiado”, observou a funcionária pública Conceissão Pessoa. Em cima do trio elétrico Pantera Fashion, Lula discursou para 2.000 pessoas. Cinco ônibus, com capacidade para cinquenta passageiros, foram fretados por 1.000 reais cada um, pagos em dinheiro vivo, para postar a claque diante da estrela petista. A programação da semana passada, por exemplo, previa uma passagem pela cidade do Crato, no Ceará, onde ele receberia o título de doutor honoris causa da Universidade Regional do Cariri. A segurança fora informada de que estava sendo organizado um protesto de alunos contra a concessão da honraria. A visita foi cancelada.

Em Caruaru, Lula foi ainda a um assentamento agrário do MST. Uma banda de pífanos, também contratada por cerca de 1.000 reais, animou a festa. À mesa, famílias convidadas puderam se servir de macaxeira, jerimum, cuscuz, carne guisada e suco de acerola. Lula bebia cachaça e água. Estendia o braço direito para o alto, com o punho cerrado, e discursava contra o “golpe” que derrubou Dilma. No fim da tarde, às 17 horas, o ex-presidente partiu para o Recife no avião de prefixo PR-WTR, o mesmo que as empreiteiras Odebrecht e OAS usavam para transportá-lo ao exterior. À noite, na capital pernambucana, num evento em praça pública, Lula criticou o presidente interino Michel Temer e o juiz Sergio Moro, que em breve julgará um pedido de prisão contra ele. Falou à plateia e também à equipe que produz um documentário sobre o “golpe”. Com a chuva, os militantes começaram a se dispersar, e Lula teve de encerrar o espetáculo.