quinta-feira, março 06, 2014

Cabeças iluminadas - LUCAS MENDES

BBC Brasil - 06/03

Como é difícil concentrar no importante, pensar com clareza, evitar as banalidades e as chatices. Idade agrava o problema. Faço exercícios para pensar e reagir mais depressa, reforçar a memória, resolver problemas e associar ideias.


Funcionam, garantem os sábios da Universidade Stanford, um ninho de gênios em Palo Alto, na Califórnia. Lá, um grupo de professores criou este programa de exercícios chamado "lumosity".

A sacada é simples. No site Lumosity, há dezenas de exercícios provocantes, bonitos, engraçados e chatos, que medem com números exatos as forças e fraquezas da sua cabeça, progressos, regressos, e compara você com milhares de "lumositários".

Parece científico, simples, claro e preciso, mas tenho minhas dúvidas. Fiz progresso no números, mas todos os dias pergunto "como é mesmo o nome daquele cara"? E daquele filme? Daquele livro? E o pânico de não reconhecer a pessoa que te abraça, beija e convida para jantar?

Nas comparações com pessoas da minha idade, minha péssima memória é melhor do que a de 95% dos praticantes de "lumosity". Quando comparo com a turma de 20, 30 anos, caio para 65%. Números assombrosos.

Quando entrei no jogo, há pouco mais de um ano, "lumosity" era pouco conhecido. Agora brilha na internet. Há estudos pró e contra os efeitos dos exercícios, como há estudos que comprovam e desmentem que é possível exercitar a mente depois de certa idade.

Um outro gênio de Palo Alto, Michio Kaku, começou pela física. No curso secundário, montou na garagem dos pais um poderoso acelerador de partículas para gerar raios gama. Queria criar a antimatéria. Pouco depois, foi descoberto e recomendado por Edward Teller, pai da bomba de hidrogênio.

Michio se formou em primeiro lugar na turma de Física em Harvard, fez doutorado de Berkeley, escreveu livros, apresentou programas de televisão na BBC, tem mais de 70 artigos publicados, enfim, fez, faz e acontece. Mais: é um gênio para simplificar ciência para idiotas, como eu.

Ele é um homem da física quântica em busca da menor partícula do universo, um dos criadores da teoria das cordas. São filamentos parecidos com os da lâmpada incandescente, milhões - ou bilhões? - de vezes menores do que um átomo.

Ou, como ele explica: as partículas ou filamentos são como as notas musicais numa corda vibrante, a física é a harmonia destas cordas, a química é a melodia, o universo é uma sinfonia de cordas e a cabeça de Deus que Einstein tentou decifrar é a musica cósmica que ressona no espaço.

Sacou?

Se tem alguma dúvida, leia o livro dele, recém-lançado, The Future of the Mind, em que Michio Kaku nos conta que o cérebro é o maior mistério do universo e que, nos últimos dez, quinze anos, aprendemos mais sobre ele do que em toda a história. São capítulos com informações vibrantes, das mais metafísicas a aplicações práticas para nossas nossas doenças mentais - da memória fraca ao Alzheimer.

Com US$ 1 bilhão americano, outro bilhão europeu e milhões asiáticos, o cérebro está sendo mapeado, como foi feito com o genoma, mas é muitíssimo mais complicado.

O genoma tem mais ou menos 23 mil genes. O cérebro tem 100 bilhões de neurônios, cada um ligado a outros dez milhões.

Esquizofrenia, epilepsia e Asperger, são conexões defeituosas. O plano é limpar o cérebro de óleos e outras matérias e ter uma visão transparente da fiação com seus filamentos vibrantes e, aí sim, poderemos ver/ouvir a divina música cósmica.

Já é possível fazer um download do cérebro de um rato e a ressonância magnética de um cérebro humano durante um sonho. Num futuro não muito distante, daqui a uma ou duas décadas, vai ser possível fazer umdownload de todas as informações acumuladas num cérebro fragilizado ou ameaçado por doenças e reinseri-las para quando a memória começar a falhar.

Ou, mais assombroso, fazer um download de tudo o que está no nosso cérebro, inclusive voz, uma forma de vida eterna.

Quem está interessado no meu? Não tenho nenhum interesse de pegar o bonde da eternidade.

Meu sonho é um deletador de inutilidades e chatices e um download para achar os óculos e o chaveiro.

Medicina baseada em pessoas - FLAVIO JOSÉ KANTER

ZERO HORA - 06/03

Aos poucos firmei a ideia de não usar computador nos atendimentos


Tornou-se comum o uso do computador na área da saúde. Acessam-se protocolos baseados no conhecimento científico comprovado e atual, que sugerem como investigar e tratar pacientes. Há diretrizes para tratar e monitorar doenças crônicas. Praticamos medicina baseada em evidências, onde se decide apoiado no melhor conhecimento vigente. Há consensos que reúnem a informação disponível e recomendam as melhores práticas.
Prontuário eletrônico organiza e disponibiliza informação de forma ágil e eficiente. Decidi que não o usaria em meu consultório há anos. Um colega informatizou o consultório. É competente em sua área, temos vários pacientes em comum. Quando ele foi um dos primeiros a usar prontuário eletrônico, achei que deveria fazer o mesmo. Logo porém, um paciente que atendíamos contou que a consulta com o colega havia mudado: “…ele quase não me olhou, só olhava a tela e digitava no computador…” Essa observação gerou a dúvida. Aos poucos firmei a ideia de não usar computador nos atendimentos. Este instrumento entrou em nossa vida e trabalho. Em muitas ocasiões o utilizo para buscar informação, mesmo durante atendimentos. Mas não mudei, o foco da consulta é e tem que ser na pessoa. Se algo puder interferir na atenção, temos que evitar. Há quem utiliza prontuário eletrônico sem desviar o foco. Este não tem que mudar.
Há dias uma senhora sentiu-se tonta ao levantar, caiu, bateu a cabeça. Buscou atendimento no único hospital da cidade onde estava. Foi colocada no protocolo de infarto do miocárdio, embora faltassem muitos elementos para pensar em infarto. Após horas repetindo exames, já cansada e sentindo-se bem, retirou-se sob o protesto da equipe técnica, pois pelo protocolo faltava mais uma bateria de exames. Protocolos e computadores mal utilizados não ajudam, podem atrapalhar.
Atendimento médico é único e individual, não há dois iguais, cada pessoa é única, cada caso é peculiar. O encontro da pessoa com o médico não se repete nem padroniza. Se o foco for o meio (o registro) ao invés da finalidade (o atendimento), perde-se qualidade.
Pacientes perguntam por vezes se não vou aderir ao prontuário eletrônico. Conto-lhes a história do colega que deixou de olhar para os pacientes, e invariavelmente ouço situações vividas por eles que confirmam o desvio do foco. Isso acho inaceitável. O foco do médico continua e não pode deixar de ser na pessoa.

Quanto vale uma obra de arte? - CONTARDO CALLIGARIS

FOLHA DE SP - 06/03

Você acharia certo colocar vidas humanas em perigo para salvar tesouros culturais e artísticos?


Um jornalista perguntou a Marcel Duchamp: se você estivesse no museu do Louvre no meio de um incêndio e pudesse salvar só um quadro, qual obra você salvaria?

Duchamp tinha a (merecida) reputação de ser um provocador, e o jornalista talvez esperasse levá-lo a confessar algum amor envergonhado por uma obra clássica. Mas Duchamp respondeu à altura de sua reputação; ele disse, sem hesitar: "Salvaria o quadro que está mais próximo da saída".

Era também um jeito de dizer que nenhuma obra, para ele, justificaria que alguém se expusesse ao risco de perder a vida. Não é surpreendente, vindo de um artista que passou a segunda e maior parte de sua existência sem produzir obra alguma e tentando transformar sua própria vida numa obra de arte.

De qualquer forma, será que eu, se estivesse num hipotético incêndio, tentaria salvar um Duchamp? Pensei em duas obras que talvez valessem o esforço, "O Grande Vidro" e o "Nu Descendo a Escada". O "Nu", de 1912, é um quadro cubista, e eu não sou muito fã do cubismo (se fosse um Cézanne pré-cubista, já seria outra história).

"O Grande Vidro" tem o problema de ser, justamente, grande e de vidro --péssimo para transporte apressado em caso de incêndio. Os quadros que Duchamp pintou antes de 1912 são respeitáveis, mas só isso. E, quanto aos "ready-mades" (a roda de bicicleta, o urinol etc., que ele genialmente assinou e transformou em arte), o que importa é o ato, o conceito. Será que vou arriscar a vida por um urinol industrial, só porque ele foi assinado por Duchamp? Mesmo se o urinol fosse destruído, o ato de Duchamp não seria perdido; bastaria que alguém o relatasse e o interpretasse direito.

Nessa perspectiva, obras de arte conceitual ou de arte póvera, por exemplo, não valeriam o sacrifício de ninguém, nunca. Mas melhor não generalizar. (Nota. A pergunta é muito útil como quiz na hora de selecionar um casal: você encararia o incêndio para um Jackson Pollock? E para um Carpaccio?)

O filme "Caçadores de Obras-Primas", de George Clooney, é baseado em três livros de Robert M. Edsel, "Caçadores de Obras-Primas, Salvando a Arte Ocidental da Pilhagem Nazista" (Rocco) e também "Saving Italy" e "Rescuing Da Vinci" (com uma copiosa documentação fotográfica).

Edsel conta a história dos "Monuments Men", mais de 300 homens e mulheres de diferentes países que, durante a Segunda Guerra Mundial, no teatro de operações europeu, foram encarregados de salvar o patrimônio cultural da destruição e do saque. Eram diretores de museus, curadores, historiadores da arte etc.

A questão levantada pelo filme de Clooney não sai facilmente da cabeça: faz sentido colocar vidas humanas em perigo para salvar obras-primas?

Engraçado. Em geral, achamos aceitável morrer por dinheiro (muitos topariam correr riscos extremos numa grande caça ao tesouro). Também entendemos que alguém se sacrifique pelos princípios fundamentais nos quais ele acredita. E consideramos meritório morrer para salvar outras vidas. Mas para salvar uma obra de arte?

O filme de Clooney, que apresenta um verdadeiro dilema moral, responde mais ou menos assim: as obras de arte do passado (longínquo ou não) nos representam e nos definem. Sobreviver não é suficiente, é preciso preservar o patrimônio que nos lembra quem somos.

Concordo, mas a questão é complexa. As grandes obras do nosso passado, o políptico dos Van Eyck em Ghent ou a madona de Michelangelo em Bruges, são patrimônio de nossa cultura. Ora, somos todos filhos dessa mesma cultura, tanto nós, que nos identificamos com a cavalaria dos aliados, quanto os outros, que tentaram destinar a Europa à barbárie totalitária.

Os Van Eyck e Michelangelo são, em suma, antepassados de todos, de quem inventou os campos e de quem morreu neles: as obras são o passado de nossa civilização --e nossa civilização inclui nossa barbárie.

Outra complexidade vem do fato de que a ideia do valor insubstituível de cada vida humana é um achado recente. Até 200 anos atrás, havia pletora de coisas que pareciam valer mais do que a vida: a honra, a palavra dada, a fé... Por que não uma obra de arte?

Antes de negar com indignação, um teste. Você acha intolerável a troca de uma obra pela vida de um homem? Entendo. Mas imagine o pacto mágico seguinte: você poderia salvar da destruição "O Beijo", de Klimt, à condição de desejar que o pastor Feliciano contraia uma pneumonia grave. Sem hipocrisia, ok?

O sol negro da melancolia - MARIO SERGIO CONTI

O GLOBO - 06/03

‘A calma dos dias’, livro de Rodrigo Naves, mistura ensaios sobre a cena contemporânea — reality shows, Gisele Bündchen, Michael Jackson — com pequenas ficções, perfis e obituários de artistas e amigos, análises de obras e indagações filosóficas

Rodrigo Naves, ficcionista e crítico de artes plásticas, se perdeu ao andar de carro pela cidade de Santos. Buscou placas que o orientassem na barulhenta algaravia de seres, coisas e fumaça. Topou com uma que dizia: Lar das Moças Cegas. “Um retiro de paz e silêncio pousou sobre a tarde agitada”, escreveu ele a respeito da visão. As palavras obsoletas, o mundo de noite e calma ao qual a placa remetia, o tiraram de súbito do presente da cidade vibrante e confusa. Lares não há mais. Moças tampouco. E os cegos tornaram-se há tempos deficientes visuais.

O Lar das Moças Cegas não lhe inspirou pena. Imaginou que moravam ali jovens operosas. Elas recolheriam apostas na lotérica à direita da fachada. Organizariam as terapias ocupacionais anunciadas numa faixa de pano. Empenhadas no bem-estar de seus semelhantes, as ceguinhas viviam do seu trabalho. Nas horas de folga talvez conversassem, costurassem, ouvissem música. “Com a delicadeza de quem precisou aguçar os sentidos, cuidavam para não invadir territórios alheios”, prossegue Naves em “A calma dos dias”, que a Companhia dos Livros acaba de publicar.

O Lar existe, e a descrição no livro lhe é fiel. Quanto ao que se passa com as moças, é tudo imaginação de Naves, “devaneios, momentos em que a continuidade dos dias e dos hábitos se interrompe”. Perdidaço no presente nacional, Naves capta poesia densa, ainda que numa vírgula do cotidiano; deixa-se encantar pelas evocações; imagina dignidade num mundo obscuro. Não é pouco.

E é só o começo. As moças cegas o ajudam a pensar dimensões incômodas da vida contemporânea. O Lar delas é contraposto à transparência da Casa dos Artistas, do Big Brother Brasil e de tantas residências “que fazem a delícia do público televisivo mundial”. Nessas casas, nota o escritor, como tudo é devassado, os seus moradores são reduzidos a corpos, a bíceps e glúteos. E o que os corpos fazem o tempo todo é se tatearem, diminuir a distância que os separa. O excesso de tato com que as santistas anônimas compensam a cegueira corresponde ao tato excessivo dos devassados nos BBB.

Naves desdenha a explicação corriqueira para as intimidades hiperexpostas: busca de erotismo e índices de audiência. Nas casas de boneca da TV o mundo se torna doméstico e apreensível, ele diz, e quanto mais complexa a vida contemporânea, mais agradáveis se tornam as explicações caseiras. O fenômeno não se restringe à indústria cultural. Ele começou na cultura dita superior. A arquitetura pós-moderna recuperou a fachada, transformando edifícios em casinhas. As instalações imperam nas artes plásticas, e a maior parte delas não passa de ninhos. O romance, arte que buscava a vida social, foi atropelado por biografias que trombeteiam a intimidade de indivíduos tidos por excepcionais. A alta costura é vista como grande arte, o que domestica a criação artística para torná-la ponta de lança da indústria da moda.

“A calma dos dias” mistura ensaios sobre a cena contemporânea — reality shows, Gisele Bündchen, Michael Jackson — com pequenas ficções, perfis e obituários de artistas e amigos, análises de obras e indagações filosóficas. Nuns textos sobressai o ensaísta de “A forma difícil”, livro que consolidou a sua reputação de grande crítico. Noutros, brilha o ficcionista de “O filantropo”, um escafandrista das fissuras do cotidiano.

Em “A calma dos dias”, o crítico e o ficcionista estão banhados pelo sol negro da melancolia. As artes plásticas sucumbem ao mercado e ao dinheiro, quando não à teorização que oblitera obras e homens. A arte se torna tão rarefeita que o crítico perde o objeto, deixa de ter o que analisar. Já a vida passa cada vez mais rápido. Os achaques se sucedem. O álcool, as drogas, o estudo, o sexo, a amizade, a política, talvez até mesmo o amor, deixam de ter aquele gosto.

O mundo objetivo e a existência subjetiva, como se sabe, se confundem. Difícil é saber quando falta vento social para mover o moinho da arte. Ou então se não há mais obras e indivíduos que captem a mudança de vento. A metáfora do vento e do moinho é de Van Gogh, e serviu de título para o livro anterior de Naves. Em “A calma dos dias”, ela reaparece: “temo ser hoje quase inaudível o rumor que moveu tantos engenhos”. Continua a faltar algo, mas é preciso fazer alo, nem que seja arrumar a mesa.

“Há horas de lutar e horas de se entregar”, dizia Mira Schendel aos amigos pouco antes de morrer. “Ouvi várias vezes essa frase no último mês, e confesso que sem a menor cumplicidade e, talvez, sem a menor compreensão do sentido da decisão de Mira”, relata Naves no livro. O seu livro, obra de um inconformista conformado, é sobre isso: luta e entrega na calma dos dias de moinhos imóveis.

NOME E SOBRENOME - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 06/03

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais confirmou: José Alencar, ex-vice-presidente morto em 2011, é o pai da professora Rosemary Moraes. Os desembargadores endossaram o entendimento de que a recusa do político em fazer o teste de DNA gerava a presunção da paternidade.

ÚLTIMA ETAPA
O caso se arrastava há 13 anos. Em jogo, além do reconhecimento, está a possibilidade de Rosemary ser incluída na partilha de uma herança avaliada em alguns bilhões. Os advogados da família de Alencar ainda devem tentar reverter a decisão no STJ (Superior Tribunal de Justiça).

É ELE
Nelson Biondi será o marqueteiro da campanha de Geraldo Alckmin (PSDB-SP) à reeleição. Há meses ele participava de reuniões com o governador, mas sua contratação foi definida somente na semana passada.

TABULEIRO
O jornalista Marcio Aith, secretário de Comunicação de Alckmin, pode deixar o cargo para se incorporar à equipe de campanha. O governador estuda a ideia, mas ainda não bateu o martelo.

ENTRE NÓS
E o deputado federal Duarte Nogueira, presidente do PSDB, é a opção de Alckmin para ser candidato a vice em sua chapa na disputa por mais um mandato. Ele é de Ribeirão Preto e ligado ao agronegócio. Seu nome deve prevalecer caso a opção seja mesmo por uma chapa puro-sangue.

NA EQUIPE
Carente de nomes para indicar a vice, o DEM, no caso de ficar de fora da chapa de Alckmin, seria compensado com participação em secretarias em um eventual novo governo tucano.

GARFO
Ronaldo deve almoçar com ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) em Brasília até o fim do mês. Diz que a iniciativa partiu dele próprio. Em pauta, a Copa.

OLHO NO LANCE
Pela primeira vez, o homenageado do festival Risadaria não será um comediante: em ano de Copa do Mundo, o escolhido foi o locutor Silvio Luiz, por imprimir humor e irreverência às narrações esportivas e que completa 80 anos em 2014. O Risadaria ocorre entre 4 e 13 de abril em SP.

Nas edições anteriores foram homenageados os humoristas Chico Anysio, Jô Soares, Renato Aragão e Carlos Alberto de Nóbrega.

SEM PASSADO
A cineasta Tata Amaral está finalizando o longa "Trago Comigo", inspirado numa série exibida na TV Cultura. O filme, que será protagonizado por Carlos Alberto Ricelli, conta a história de um homem que perdeu todas as lembranças do período em que ficou preso na ditadura. A previsão de lançamento é para o ano que vem.

EU, HEIN?
O diretor Jayme Monjardim se diz perplexo por ter seu nome envolvido na polêmica dos anúncios de Roberto Carlos para a Friboi. "Eu só dirijo os shows dele, não tenho nada a ver com essa publicidade", afirma, desmentindo citações feitas em reportagens e redes sociais. Ele pensa até em pedir para a TV Globo divulgar uma nota esclarecendo o episódio.

DESCONHEÇO
O anúncio gerou polêmica já que Roberto Carlos se declarava vegetariano. Até o cineasta Fernando Meirelles meteu o garfo na confusão, dizendo que o cantor nem sequer tocou na carne quando gravou o comercial. "Eu nem sei se o Roberto come carne ou não", diz ainda Monjardim.


EU TAMBÉM QUERO BEIJAR

Antes da saída do bloco Me Beija que Eu Sou Cineasta, músicos e organizadores fizeram um mutirão de limpeza para recolher o lixo acumulado na praça Santos Dumont, na Gávea, na manhã de ontem. O último suspiro do Carnaval carioca atraiu logo cedo os atores Miguel Thiré e Humberto Carrão, primeiros foliões famosos a abrir o já tradicional cordão da Quarta-Feira de Cinzas.

FANTASIA DE CARNAVAL

A atriz Marina Ruy Barbosa foi tietada pelo namorado, o ator Klebber Toledo, na última noite de desfiles na Sapucaí. O diretor Jayme Monjardim também acompanhou a preparação da mulher, a cantora Tânia Mara, antes da entrada da Grande Rio na avenida. Cathy Guetta, mulher do DJ David Guetta, foi outra convidada que se produziu no camarote da escola.

CHEGUEI, RECIFE

As empresárias Carla Bensoussan e Flora Gil se associaram para levar o camarote Expresso 2222 ao Recife neste Carnaval. O casal de atores Cléo Pires e Rômulo Arantes Neto foram alguns dos convidados que passaram por lá. As atrizes Danielle Winits e Fernanda Paes Leme também estiveram no espaço, que teve sua primeira edição fora da Bahia.


CURTO-CIRCUITO

O músico Hermeto Pascoal faz ensaio aberto no Bourbon Street, no dia 18, às 21h30. 18 anos.

O espetáculo "Terça Insana" tem temporada no Teatro Folha até dia 29 de abril. 14 anos.

O cantor Sidney Magal se apresenta na casa noturna Rey Castro no dia 21, a partir das 22h. 18 anos.

Estranhas conexões - LUIS FERNANDO VERISSIMO

O Estado de S.Paulo - 06/03

Aquela teoria de que no máximo seis graus separam qualquer pessoa de qualquer outra pessoa no mundo, viva ou morta, pode levar a conexões surpreendentes. Quem se lembra de uma musica cantada pelo Sacha Distel num filme da Brigitte Bardot, se não me falham os neurônios, chamada Scoubidou ("Les pommes, les poires et les scoubidoubidou-ah"), não sonha que a origem da música é uma composição do americano Lewis Allan, Apples, Peaches and Cherries, maçãs, pêssegos e cerejas, popularizada pela cantora Peggy Lee, nem que Lewis Allan era o pseudônimo de Abel Meeropol, poeta comunista, autor de, entre outras coisas, um poema que ele mesmo transformou em música chamado Strange Fruit, que a Billie Holiday cantava chorando. As "estranhas frutas" pendendo de árvores no Sul dos Estados Unidos, no poema de Meeropol, são os corpos de negros linchados.

Billie Holiday insistia em cantar Strange Fruit apesar de protestos. Não era uma música adequada para o público branco que a ouvia, em lugares muitas vezes racialmente segregados, e sua insistência quase lhe custou a carreira. Era incomum, na época, artistas negros se manifestarem abertamente contra o racismo, ainda mais na forma pungente da composição de Meeropol. Alguém chegou a dizer que se a revolta contra o racismo no Sul americano um dia chegasse a crescer e se organizar, o movimento já tinha a sua Marseillaise. Mas enquanto isto não acontecia, quem manteve a música viva, de maneira quase clandestina, foi Billie Holiday. Que morreu sem ver a revista Time citar Strange Fruit como uma das músicas mais importantes do século 20.

Abel Meeropol foi um compositor de sucesso popular como "Lewis Allan" mas nunca deixou de ser um ativista político, chamado muitas vezes a explicar suas atividades - inclusive a autoria de Strange Fruit - diante da inquisição anticomunista. Foi ele quem adotou os filhos de Julius e Ethel Rosemberg, executados na cadeira elétrica como espiões soviéticos em 1953.

De Strange Fruit a Scoubidou, do casal Rosemberg ao casal Brigitte Bardot-Sacha Distel... Não sei quantos graus separam estes dois extremos, de gravidade e frivolidade. Certamente menos do que os seis da teoria. Como é mesmo aquela frase? O mundo dá muitas voltas. Às vezes, tonteia.

Ueba! Acabou o Lepo Lepo! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 06/03

As peladas do sambódromo estão mais costuradas que o Frankenstein. Se um peito explodisse, ia ter luta de gel


Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! ACAAAABÔ! Acabou a Grande Festa da Esculhambação Nacional! Chega de bunda! Agora tem que encarar o Brasil de frente! Com ou sem tapa-sexo? Rarará!

E como eu digo todo ano: agora é rebolar pra pagar o cartão. Passa cinco dias rebolando nos blocos e um ano rebolando pra pagar o cartão! E hoje cedo um pernambucano levantou a placa: "Faltam 364 dias pro Carnaval!".

E adorei os blocos de Quarta-Feira de Cinzas. Direto do Rio: Bate Pra Mim Que Eu Tô Cansado. Cansado, nada. Exausto. Bate pra mim que eu tô exausto!

E direto de Jacarepaguá: Pau Com Cãibra. Efeito colateral do Carnaval: pau com cãibra! E este de Osasco: Dei Tanto Que Tô Até Rouco. E Quarta-Feira de Cinzas se chama Quarta-Feira de Cinzas porque o seu dinheiro virou cinzas.

E em São Paulo teve um bloco sem música: Bloco Sem Música! Bloco mudo! E em outro bloco apareceu um grupo de Fridas Kahlos. Todos fantasiados de Frida Kahlo. Só paulista se fantasia de Frida Kahlo no Carnaval!

E o Aécio Neves foi vaiado em Maceió e foi vaiado em Salvador. Carnavaia! E eu passei dois dias ouvindo a Valesca Popozuda cantando "Mamãe, Eu Quero". Carnatrash!

E as peladas apeladas? As peladas do sambódromo estão mais costuradas que o Frankenstein. E se um peito daquele explodisse, ia ter luta de gel na avenida! E aquela que saiu com um paetê na perereca e ainda elogiou o estilista. Estilista de perereca!

E o site "OCocoTaSeco" fez uma lista das coisas que se precisa recuperar depois do Carnaval: os pés, a carteira, o fígado, o juízo, o caráter e o bom gosto musical!

E esse bloco de psiquiatras: Quem Ri Por Último, RIVOTRIL! Como disse uma amiga: "Finalmente um bloco pra chamar de meu!". E em Pernambuco saiu o bloco Chupa e Faz Tudo. Deve ser o bloco do PMDB! Rarará!

E acabou o Lepo Lepo! Lepo Lepo agora só na Copa!

E adorei o Oscar. Só teve pizza e "selfie"! No próximo ano vai ter Oscar pra Melhor Pizza e Melhor "Selfie"! E o Oscar de Melhores Defeitos Especiais: os estádios da Copa! Oscar de Melhor Defeito Especial: Itaquerão. Rarará!

Nóis sofre, mas nóis goza!

Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!

Embala que o filho é teu - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 06/03


Partidos da base, encabeçados pelo PMDB, apelam pela volta do ex-presidente Lula ao comando da articulação política eleitoral, como em 2010. Reclamam da falta de tato do presidente do PT, Rui Falcão, e da dificuldade em conversar com a presidente Dilma. Lula é o pai da ampla aliança que sustenta o governo e deve assumir as rédeas, dizem os aliados, que temem um desgaste irreversível.

Assim caminha a Humanidade
Por pouco não acontece uma tragédia durante o desfile do bloco Simpatia É Quase Amor, em Ipanema. Depois de furtar algumas pessoas, um menino foi interceptado por dois pitboys. Um deles deu um chute violento na cabeça do garoto, e ele voou até o meio-fio. Os dois começaram a gritar "bandido bom é bandido morto!" e começaram a espancá-lo, até ficar desacordado no chão. Passando pelo tumulto, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) parou para ver o que estava acontecendo. Os pitboys só pararam porque ela ameaçou filmar e chamar a polícia. Jandira fez procedimentos de primeiros socorros até que o garoto acordou e acabou fugindo.



“As ruas ficaram imundas por causa da greve dos garis ou porque a maioria das pessoas joga lixo no chão, sem cerimônia?”
Ricardo Berzoini
Deputado federal (PT-SP)

Apagando o incêndio
Ex-líder do PT na Câmara, o deputado José Guimarães (CE) entrou em campo ontem propondo entendimento com os peemedebistas. Está conversando com deputados e dirigentes sugerindo trégua de ambas as partes.

Dona do tempo
Em reunião com líderes aliados, o ministro Aloizio Mercadante falava no tempo de TV da presidente Dilma à reeleição. "Ela tem 13 minutos, hegemonia e o governo", dizia, até ser interrompido por um deputado que atravessou: "Dilma não tem 13 minutos, tem quatro. Quem tem 13 minutos somos nós, o conjunto da base, e não o PT".

Discutindo a relação
O presidente do PSDB, Aécio Neves, ouviu do principal aliado, o DEM, reclamação de que o partido foi preterido em Minas Gerais, ficando fora da chapa majoritária. Os democratas esperam que o mesmo não ocorra na composição nacional.

Cães de caça
Certos de que a Câmara vai aprovar a criação de uma comissão externa para ir à Holanda investigar contratos da Petrobras, três deputados já se habilitaram em suas siglas para a tarefa: Fernando Francischini (SDD-PR), Carlos Sampaio (PSDB-SP) e Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), que renovou o passaporte às pressas para não perder a viagem.

Sarney na avenida
O senador José Sarney (PMDB-AP) virou tema da escola Embaixada de Samba Cidade de Macapá, com o enredo "Do Maranhão ao Amapá, a viagem de um poeta vencedor". Ele não foi ao desfile. A escola ficou em 2° lugar no Grupo de Acesso.

Deu a louca
Elevadores do Planalto passaram a ter mensagens de voz, invariavelmente, erradas. "Hoje é 20 de dezembro de 2012", disparou a gravação a um ministro e assessores. "Achei que fosse a máquina de voltar no tempo", brincou, às gargalhadas.

O SENADO BRASILEIRO sediará, dos dias 6 a 9 de agosto, o G-20 Parlamentar. Foram convidados Espanha e Colômbia, que não integram o grupo.

Pé na estrada - VERA MAGALHÃES - PAINEL

FOLHA DE SP - 06/03

A menos de um mês de deixar o governo de Pernambuco para se dedicar à campanha presidencial, Eduardo Campos inicia hoje maratona de visitas a 18 microrregiões do Estado. O pré-candidato do PSB vai visitar mais de 70 empreendimentos, muitos ainda em fase de execução, principalmente nas áreas de transportes, recursos hídricos, educação e saúde. O objetivo é dar subsídios ao discurso, que será usado no pleito, de que seu governo tem mais a entregar que o de Dilma Rousseff.

Escudeiros Na caravana, Campos deverá estar sempre acompanhado da chapa majoritária do PSB pernambucano: o secretário de Fazenda, Paulo Câmara, candidato ao governo, e o ex-ministro Fernando Bezerra Coelho, postulante ao Senado.

Símbolo A escolha de Câmara para sucedê-lo teve também um componente de comparação com o PT: Campos quis sinalizar ao mercado que o sucessor é responsável pela saúde fiscal do Estado, no momento em que o governo federal é questionado nesse fundamento.

Procuração A reunião de ontem entre Dilma e Lula, da qual participou todo o comando da pré-campanha, teve por objetivo fortalecer o presidente do PT, Rui Falcão, para enfrentar o líder do PMDB e mentor do chamado "blocão" independente da Câmara, Eduardo Cunha (RJ).

Recreio Principal fiador da aliança PT-PMDB, o vice-presidente Michel Temer passou o Carnaval nos parques da Disney, em Orlando. Diante da crise entre as siglas e a rebelião peemedebista, um aliado brinca: "Melhor o Pateta original que os daqui".

Pós-folia Com o aval do presidente da Câmara, Henrique Alves (PMDB-RN), os líderes do "blocão" querem destrancar a pauta de votações na Casa a partir da semana que vem, para tentar reverter a marca de pior índice de produção em dez anos.

Piloto O primeiro projeto a testar a disposição legiferante dos deputados deve ser o marco civil da internet, que o governo quer ver aprovado, mas que conta com grande resistência de parcela dos deputados, capitaneada peplo próprio Cunha. Depois dessa, há várias matérias da chamada pauta-bomba fiscal.

Avant... Dilma receberá nessa semana uma cópia do filme "Corte seco", do cineasta Renato Tapajós. A presidente, ex-presa política, será a primeira a assistir ao longa-metragem, que conta a história de quatro militantes presos na Operação Bandeirante que foram torturados.

... première "Passei por isso", disse Tapajós à coluna. O filme custou R$ 1,2 milhão, teve patrocínio da Petrobras e traz cenas explícitas de tortura. Uma delas dura dez minutos, nos quais um personagem é submetido a sessões de pau de arara, choque e afogamento em água e sal grosso.

Torneira A ANA (Agência Nacional de Águas) determinou à Sabesp que limite a 27,9 m³ por segundo a retirada de água do sistema Cantareira. A média histórica é de 33 m³/s, e hoje esse volume está em 29 m³/s. Ainda assim, o governo de São Paulo descarta adotar rodízio de água.

Vem cá 1 Enquanto o STF (Supremo Tribunal Federal) não define de vez a regra para pagamento de precatórios, a Prefeitura de São Paulo vai convocar, a partir da semana que vem, os credores interessados em fazer acordo para receber esses títulos, desde que com 50% de deságio.

Vem cá 2 O estoque de precatórios é, juntamente com a dívida, o principal problema financeiro da capital. Depois de fechar o acordo com os credores, a prefeitura vai esperar a decisão do STF para fazer os pagamentos.

com BRUNO BOGHOSSIAN e PAULO GAMA

tiroteio
"As fichas dos equívocos do governo estão caindo. Agora, banco oficial não vai mais usar o Tesouro para subsidiar o crédito."

DE LUIZ PAULO VELLOZO LUCAS, ex-prefeito de Vitória e assessor econômico do PSDB, sobre o Tesouro não injetar mais recursos para empréstimo na Caixa.

contraponto


Questão de ponto de vista

O deputado Izalci Lucas (PSDB-DF) chegou ao plenário do Senado há algumas semanas animado após ver uma pesquisa recente sobre intenções de voto para presidente da República, realizada em Brasília, em que Aécio Neves (PSDB) aparecia com ligeira vantagem na liderança, à frente da presidente Dilma Rousseff.

--E aí? Já viu nosso presidente hoje? --perguntou o deputado ao chegar a uma roda de conversa.

--Não, hoje ainda não falei com Eduardo Campos --respondeu o senador Rodrigo Rollemberg, líder do PSB no Senado, que também é de Brasília.

Mais um capítulo da crise - DENISE ROTHENBURG


CORREIO BRAZILIENSE - 06/03

Daqui a uma semana, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado pode votar o projeto que altera o indexador da dívida de estados e municípios. Originalmente, apoiado pelo Planalto, a ideia foi abortada pelo próprio Executivo Federal para não passar a imagem de irresponsabilidade fiscal.
Na semana passada, o ministro Aloizio Mercadante pediu ao presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao líder do governo na Casa, Eduardo Braga (PMDB -AM) e do PMDB, Eunício Oliveira (CE), que adiassem a análise do projeto, pois as agências de rating estarão no país para avaliar a saúde
financeira do país.
Mas a CCJ é presidida pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), o ex-quase-futuro ministro de Dilma. E, além do prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, também pressionam para aprovar o projeto o prefeito do Rio, Eduardo Paes, e o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro. A pressão será grande.

Uma coisa…
O PT sabe que terá dificuldades na campanha ao governo estadual em São Paulo. A luta, por enquanto, é levar a disputa para o segundo turno, algo que não acontece desde 2002, quando o mesmo Geraldo Alckmin derrotou Jose Genoino.

…de cada vez
Para isso, mesmo que Alexandre Padilha atinja os 30% de votos válidos que o PT tradicionalmente conquista, é preciso que haja outras candidaturas competitivas para drenar votos do PSDB. E elas seriam, pela ordem, Paulo Skaff (PMDB) e um nome apoiado pelo PSB/Rede.

Piloto automático
O PT também reconhece que enfrentará uma batalha no interior. “São Paulo talvez seja o estado em que a influência do governo seja menos perceptível. O paulista tradicional pede apenas que o governador não atrapalhe os negócios dele”, resumiu o presidente da Associação Brasileira dos Municípios, Eduardo Tadeu Pereira.

www.vaquinha.com
A Secretaria de Organização do PT distribuiu um e-mail ontem afirmando que os filiados e filiadas inadimplentes que não quitarem suas dívidas com o partido não poderão concorrer a nenhum cargo Executivo ou Legislativo.

Charminho
Novo cotado para assumir o Ministério do Turismo, o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), que há seis meses está para ser chamado ao Executivo, e a nomeação nunca chega, admite que pode não aceitar a nova pasta que está sendo oferecida. A desculpa é que não quer comprar brigar com o PMDB na Câmara, que indicou o atual titular, Gastão Vieira (MA).

Samba…./ O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (foto) aproveitou o carnaval de domingo na Marquês de Sapucaí ao lado da nova esposa Patrícia Kundrát e o filho Paulo Henrique. Até arriscou uns passinhos de samba no pé. Quem viu, garante que ele dança melhor que o filho.

…do grande amor/ Mangueirense de coração, FHC não deu sorte à escola, que ficou apenas em 8º lugar na classificação geral. Mas Patrícia gostou do que viu, principalmente porque, segundo ela, a escola “trouxe à tona os protestos de junho”.

Longa data/ FHC e Patrícia começaram a namorar há cerca de dois anos, mas quem conhece a musa do tucano afirma que o “F” que ela tatuou no braço foi feito antes desta data, quando ela ainda era apenas secretária no Instituto Fernando Henrique Cardoso.

Os cupins da democracia - EVERARDO MACIEL

O Estado de S.Paulo - 06/03

A ação dos cupins é lenta, persistente, eficaz e de difícil enfrentamento, sem que se saiba ao certo quando ela alcança um estágio de letalidade, a despeito de algumas evidências. A democracia brasileira, a "plantinha tenra" no dizer de Octávio Mangabeira (1886-1960), está sujeita a "cupins" que podem minar a festejada estabilidade institucional, condição indispensável à construção do desenvolvimento. O mais letal desses cupins é a violência disseminada contra as pessoas e contra a propriedade.

A violência pode ser admitida, ainda assim sujeita a regramentos, em situações extremas, como a guerra, a insurgência contra a ruptura do Estado Democrático de Direito ou a ação legítima do Estado justamente para deter a própria violência.

O acelerado processo migratório interno para as médias e grandes cidades, a partir dos anos 1960, produziu grandes bolsões de pobreza no entorno das maiores cidades, correspondendo a verdadeiras zonas de exclusão social, sem lei e sem Estado. Assim, as cidades brasileiras, relativamente seguras no passado, foram, nas últimas décadas, se convertendo em territórios do crime, desde os de baixo poder ofensivo, como as pichações, até a banalização dos assaltos, os sequestros, os arrastões, as explosões de caixas eletrônicos, as agressões de fundo homofóbico ou racista, etc. Os ricos tentam se proteger com seguranças armados, carros blindados e condomínios que mais parecem fortalezas. Já os pobres, porque indefesos, se tornam, não raro, reféns da marginalidade.

A tudo isso se soma a violência contra a propriedade. Movimentos políticos que se autoqualificam como sociais, na busca bem-sucedida por financiamento público, sentem-se investidos no direito de invadir propriedades privadas e edifícios públicos. As desocupações, determinadas pela Justiça, não geram qualquer ônus para os invasores. A destruição de pastagens, silos, laboratórios, etc., serviu como prenúncio da funesta ação dos black blocs.

Esses fenômenos, em tese isolados, compõem a matriz da violência no Brasil, que admite várias causas, como a incapacidade de o Estado lidar com o fenômeno da urbanização maciça e acelerada, a ineficácia no enfrentamento da violência e a condescendência perniciosa com as transgressões à lei. Se a primeira dessas causas pode ser cuidada com políticas públicas, as outras têm soluções complexas, difíceis e controversas.

A ineficácia no enfrentamento da violência começa pelas disfunções de um aparelho policial sem motivação, vulnerável à corrupção, despreparado e sujeito a inadmissíveis greves. Prossegue com um Judiciário moroso e excessivamente formalista, do que resulta uma clara sensação de impunidade. Culmina com a prisão em masmorras ofensivas à dignidade humana, verdadeiras escolas do crime.

A tolerância é a generosidade civilizatória. Tem, entretanto, limites (est modus in rebus, já dizia Horácio). Quando ela se torna excessiva, converte-se em condescendência perniciosa.

É admirável a preocupação com os jovens. A atenção ao menor infrator, contudo, é deplorável, limitando-se apenas a um discurso politicamente correto. As casas de reeducação são apenas sucursais das masmorras. A consequência disso é o crescente envolvimento de menores em práticas criminosas.

As pretensões de liberalizar as ditas drogas "leves" decorrem de teses ingênuas. Será que ficaria mais fácil enfrentar os traficantes se sua atividade ficasse restrita às drogas "pesadas"? Os que hoje traficam drogas "leves" iriam se inscrever num programa de reinserção profissional? Não há uma política pública voltada para os adictos, tanto quanto inexiste para a saúde mental. Algumas iniciativas, nessa área, são impressionantemente caricatas.

As manifestações públicas são o oxigênio da democracia, mas não podem ser abusivas. Não devem tolher o direito de ir e vir dos demais cidadãos. De igual forma, são inadmissíveis o vandalismo e as agressões a terceiros.

Urge cuidar da violência em suas diferentes vertentes, porque ela afinal é a negação da liberdade.

Os tributos nos tribunais - CARLOS ALBERTO SARDENBERG

O GLOBO - 06/03

O sistema tributário brasileiro é o pior do mundo, segundo a pesquisa ‘Fazendo Negócios’, do Banco Mundial


Há 14 anos, uma companhia de leasing de São Bernardo do Campo (SP) financiou um carro vendido por uma concessionária em Tubarão (SC). Recolheu o Imposto sobre Serviços (ISS, tributo municipal) na cidade em que estava sediada. A prefeitura de Tubarão, porém, argumentou que o ISS era devido na cidade em que o veículo fora vendido ou registrado. E mandou ver uma autuação de R$ 6 mil.

A companhia de leasing foi para os tribunais e, surpresa, acaba de ganhar o caso, neste ano. O Superior Tribunal de Justiça confirmou a tese de que o ISS deve ser recolhido na sede da empresa de leasing e, mais, determinou que a prefeitura devolva os valores cobrados indevidamente, assim como os depósitos judiciais já sacados.

A prefeitura de Tubarão disse que simplesmente não tem dinheiro para devolver nada. Seriam cerca de R$ 30 milhões. Não, aqueles R$ 6 mil não sofreram essa multiplicação. Ocorre que a prefeitura cobrou de todas as demais companhias de leasing que faziam negócios na cidade — e todas foram beneficiadas pela última decisão da Justiça. Na verdade, são milhares de casos espalhados pelo país, pois, como era de se esperar, outras prefeituras embarcaram na mesma prática. Em resumo, é possível que todas as companhias de arrendamento mercantil tenham sido cobradas e/ou autuadas — o que obviamente encareceu a operação de crédito.

Todas também adquiriram direito à devolução. Sem condição, argumentam as prefeituras. Essas empresas vão ter que entrar na fila do precatório — esse mesmo que todos os governos (federal, estaduais e municipais) passam o tempo todo tentando não pagar. Como o precatório é um pagamento que a Justiça impõe aos governos, reconhecendo o crédito das pessoas e empresas contra o setor público, não pagá-lo é um duplo calote — que ainda vai gerar um precatório do precatório.

Se apenas a prefeitura de Tubarão tem que devolver R$ 30 milhões, imaginem o tamanho da conta nacional.

A boa prática administrativa indicaria que a prefeitura não deveria gastar o dinheiro de um imposto que estava sendo contestado na Justiça. Mas a coisa foi pior: muitas prefeituras, como a de Tubarão, conseguiram nos tribunais o direito de sacar e gastar os depósitos judiciais, dinheiro que o contribuinte precisa deixar depositado para tocar a ação judicial.

Simplesmente, as prefeituras conseguiram o direito de torrar a garantia. E, agora, dizem que não é possível devolver.

Quer dizer, esses contribuintes levaram 14 anos para demonstrar que não precisavam pagar aquele ISS e vão levar muito mais para receber o que pagaram indevidamente, se é que vão receber. Lembram-se daquele debate — em torno do julgamento do mensalão — sobre a quantidade de recursos? Pois é a mesma coisa nessas pendências tributárias.

Todo dia está rolando um caso desses. Só de uma olhada nos jornais da semana: o Supremo Tribunal Federal está julgando, desde 2009, se os governos estaduais podem cobrar o ICMS sobre contratos de leasing de mercadorias importadas. Repararam? Todos querendo tirar casquinha do leasing.

O mesmo STF está julgando se a prefeitura do Rio pode cobrar ISS sobre as apostas feitas no Jockey Club Brasileiro (se decidir que pode, prefeituras de todo o país vão cobrar o ISS até de rifa de igreja).

O sistema tributário brasileiro é o pior do mundo, segundo a pesquisa “Fazendo Negócios”, do Banco Mundial. Não se trata da carga tributária, que é muito elevada para um país emergente. Trata-se, naquela pesquisa, do custo que as empresas têm para se manter em dia com suas obrigações fiscais. Calcula-se que uma empresa média brasileira gasta 2.600 horas/ano nisso.

É tão complexo o sistema que tudo acaba sendo discutido. Empresas têm espaço para tentar planejar e pagar menos, mas as receitas e procuradorias fiscais têm mais ainda para cobrar. Cobradas na Justiça, as empresas ficam diante de dois pesadelos: o tributário e a disputa nos tribunais. Segundo a mesma pesquisa, o Judiciário brasileiro também está entre os mais custosos do mundo.

No fim do ano passado, o governo federal arrecadou um bom dinheiro ao dar uma anistia parcial a grandes companhias, incluindo multinacionais brasileiras, que estavam sendo cobradas por impostos de renda e outros. Se desistissem das ações e pagassem um tanto à vista, o caso estava encerrado. Muitas companhias, como a Vale, que sustentavam suas teses há anos, simplesmente desistiram.

Pagaram para ficar só com um pesadelo, pelo menos por um tempo.

A aritmética do crescimento - FERNANDO ROCHA

Valor Econômico - 06/03

Os economistas podem não ser muito bons para projetar variáveis econômicas mas são hábeis na arte de simplificar o complexo mundo econômico e reescrevê-lo em algumas equações simples. Vejamos o caso do crescimento dos países. O processo costuma ser descrito por uma função de produção simples, onde o PIB (Y) depende de dois fatores, trabalho (L) e capital (K). O crescimento do PIB resulta do crescimento do estoque de capital e da quantidade de trabalho, em geral medida pela população ocupada. Ocorre que a soma ponderada do crescimento dessas duas variáveis costuma ser menor do que o crescimento do PIB. A diferença é explicada por um termo (A) que é chamado de produtividade total dos fatores. Esse termo é achado por diferença na equação, ou seja, é a diferença entre o crescimento do PIB e o crescimento dos fatores de produção, ponderado pelo peso de cada um na equação. Em geral, esse termo (A) é positivo e, nos países de crescimento rápido como a China, é altamente significativo e chega a explicar quase 50% do crescimento do PIB.

O termo (A) da função de produção não é usado apenas para se fazer uma conta de chegada. Ele é facilmente compreensível em termos intuitivos, pois representa as instituições, a qualidade da mão de obra (educação), o ambiente de negócios, a maior ou menor burocracia, a qualidade da infraestrutura, a inovação científica e tecnológica, enfim, coisas que não são capturadas diretamente pelo estoque de fatores de produção (capital e trabalho), mas que fazem muita diferença no desempenho de uma economia.

Quem já teve oportunidade de viajar para o exterior, seja para países desenvolvidos, como EUA, Europa e Japão, ou para países emergentes da Ásia, já deve ter notado a brutal diferença de infraestrutura entre esses países e o Brasil. Logo na chegada, percebe-se a diferença na dimensão e eficiência dos aeroportos. Em seguida, tem-se à disposição uma variedade de modais de transporte cuja integração acelera o deslocamento das pessoas e cargas a um custo mais baixo. O viajante se surpreende ainda com os processos mais eficientes no setor de serviços, como uma simples refeição, aluguel de veículo ou serviço de hospedagem, em que um número menor de pessoas consegue atender de forma mais rápida e eficiente as demandas. As comparações vão além para quem é empresário e se estabelece nesses países. A burocracia para abrir ou fechar uma empresa é menor, os impostos são bem mais simplificados, os serviços de apoio e fornecedores em geral são mais eficientes, o que resulta em maior produção com a mesma quantidade de trabalho e capital empregados. É isso que o termo (A) da equação representa.

Segundo o artigo "Crescimento Brasileiro Revisitado", de Edmar Bacha e Regis Bonelli, publicado em 2012, entre 2000 e 2010, o crescimento do PIB brasileiro foi de 3,7% ao ano, sendo a contribuição do fator trabalho de 1,3% e a contribuição do capital de 1,2%. Desse modo, a soma ponderada dos fatores de produção é de 2,5% e a sua diferença para o crescimento total do PIB é de 1,2%, o que é a produtividade total dos fatores (PTF). Na China, segundo um estudo do Morgan Stanley ("Asia Insight: Assessing China's current slowdown and long term potential growth", de 2012), no mesmo período, a contribuição do crescimento da força de trabalho foi de 0,8% ao ano, a contribuição do crescimento do estoque de capital de 4,6% ao ano e a PTF de 5,0%, explicando quase a metade do ritmo total de crescimento do período (10,4% ao ano). Ou seja, a produtividade na China cresceu quatro vezes mais do que no Brasil em uma década.

Se olharmos o que aconteceu em países como a Inglaterra, EUA, Japão ou Coreia do Sul, nos seus respectivos ciclos de crescimento acelerado, veremos que o mesmo fenômeno aconteceu. A conclusão é que não existe crescimento acelerado sem aumento substancial da produtividade. Isso se consegue com educação e treinamento da força de trabalho, melhoria do ambiente de negócios, simplificação da burocracia, redução de impostos e investimentos em infraestrutura. O Banco Mundial tem uma publicação chamada "Doing Business", em que há uma classificação dos países em quesitos que avaliam a facilidade de se fazer negócios em cada um. O Brasil figura em 116º lugar entre 189 países. Países em desenvolvimento como África do Sul (41º), Peru (42º), México (53º) e Turquia (69º) aparecem em posições bem melhores enquanto países da Ásia se destacam nos primeiros lugares: Cingapura (1º), Hong Kong (2º) e Coreia do Sul (7º). Melhorar a posição nessa lista deveria ser o objetivo número 1 de um governante brasileiro.

Por fim, é importante acrescentar que o Brasil não é mais um país de mão de obra abundante. Passamos por uma importante transformação demográfica, com queda substancial da natalidade. A população brasileira em idade ativa cresce atualmente a uma taxa que se aproxima de 1% ao ano. Por outro lado, o desemprego teve uma redução substancial ao longo dos últimos dez anos, o que garantiu um crescimento da população ocupada bem acima do crescimento da população em idade ativa. Isso não deve acontecer mais. Deste modo, a contribuição do fator trabalho para o crescimento do PIB tende a decrescer bem, do 1,3% ao ano apurado por Bacha e Bonelli (2012) para algo próximo de 0,5% ao ano. É urgente, portanto, a agenda do aumento da produtividade para se avançar mais rapidamente.

Governo federal ameaça aumentar impostos - ROBERTO MACEDO

O Estado de S.Paulo - 06/03

A carga tributária brasileira é pesadíssima, alcançando valor próximo de 36% do produto interno bruto (PIB), número mais típico de alguns países desenvolvidos. Eles, entretanto, têm PIB médio por habitante bem mais alto que o do Brasil e, portanto, mais condições de suportá-la. Em termos aproximados, o PIB por habitante também mede a renda per capita de um país.

Assim, uma coisa é cobrar 36% dos cidadãos de um país rico, com PIB por habitante, digamos, de US$ 40 mil por ano, com o que seu valor líquido de impostos cai para US$ 25.600. Outra é tomar os mesmos 36% num país como o Brasil. Nele, o PIB por habitante está perto de US$ 10 mil por ano e seu valor líquido de impostos é de apenas US$ 6.400. Percebe-se, portanto, que aqui o ônus é mais pesado, pois fixado em cima de um rendimento médio bem mais baixo. Isso fere um dos princípios da boa administração tributária, o da capacidade contributiva.

As distorções dessa elevada carga são tão conhecidas como não corrigidas. E vale repetir duas. Calcada principalmente em impostos indiretos, que oneram preços dos bens e serviços, ela é um ingrediente do chamado "custo Brasil", pois diminui a competitividade das exportações brasileiras e também afasta consumidores e investidores da aquisição desses bens e serviços dentro do País. Mais bens e serviços seriam demandados e produzidos no Brasil se não fossem tão onerados por impostos desse tamanho e com essa predominante forma de incidência. Noutro impacto, a carga tem efeito nefasto sobre a distribuição de renda, pois as pessoas mais pobres consomem proporção maior de sua renda em bens e serviços do que as mais ricas, com o que seu ônus tributário é proporcionalmente mais alto do que o deste último grupo.

Por essas e outras razões, há quase um consenso de que nossos governantes precisam interromper sua enraizada prática de ampliar a carga tributária. Mas quem está fora desse quase consenso é o próprio governo, que tem o poder de realizar novas ampliações.

Hoje a oposição da sociedade se coloca como obstáculo, a ponto de até os governantes entenderem ser cada vez maior o ônus político de aumentar impostos. Mas, ainda assim, recorrem a artimanhas para impingir novos aumentos, utilizando meios enganosos nas tentativas de justificá-los.

Recentemente, vi mais uma dessas tentativas, em matéria neste jornal do dia 22 do mês passado, intitulada Alta de impostos de importados pode render R$ 1,5 bi (B5). Segundo a reportagem, no dia anterior o ministro da Fazenda, Guido Mantega, havia "dado a senha" para essa ampliação da carga. Na ocasião, ele tratou de um compromisso do governo, o de cumprir meta de 1,9% do PIB para o superávit primário (receitas menos despesas exceto juros da dívida) das contas públicas.

A necessidade de recorrer a novo aumento de impostos foi assim justificada: 1) No ano passado uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou inconstitucional a inclusão de outro imposto, o ICMS, na base de cálculo de tributos sobre importações, pois configurava "imposto sobre imposto"; 2) com essa decisão, tais impostos se tornaram menores para os produtos importados, diminuindo assim a competitividade dos produtos brasileiros diante deles; 3) caberia, então, o aumento de tributos sobre os importados para restabelecer o equilíbrio tributário nessa competição.

Esse argumento, contudo, não serve para justificar, por si mesmo, um novo aumento da carga tributária. Para evitá-lo o governo federal poderia instituir o aumento que pretende, mas junto com outra medida que reduzisse, de forma correspondente, o ônus de um ou mais impostos não incidentes sobre as importações.

O mesmo governo poderia retrucar que sua carga tributária foi reduzida pela decisão do STF. Mas o que este fez foi corrigir oneração juridicamente insustentável. Será que o País terá de engolir mais esta, a de que a avaliação da carga tributária a que faz jus o governo federal deve incluir o valor de impostos que vinha arrecadando inconstitucionalmente?

Essa discussão também enseja a oportunidade de retomar antiga indisposição minha quanto ao cálculo de superávits primários para avaliar a situação das contas governamentais. Tal superávit, que como foi dito exclui a conta dos juros da dívida, é comumente conceituado por alguns economistas e pela mídia como a "economia ou poupança" que o governo faz para pagar parte desses juros.

Ora, a primeira coisa que o governo faz é pagá-los, pois caso contrário se tornaria insolvente. Assim, o superávit primário é uma conta que avalia que parte desses juros tenha sido paga com suas receitas próprias, em que se destacam os tributos. Como não paga toda essa conta, o governo tem sempre um déficit, conhecido como fiscal ou nominal.

Problemas: 1) De forma conveniente para o governo, o superávit primário concentra a atenção da mídia, que com ele repetidamente transmite à sociedade a falsa noção de que o governo é superavitário; 2) às vezes, o próprio noticiário até omite o adjetivo primário ao referir-se ao mesmo superávit; 3) desde que o conceito de superávit primário foi adotado, na gestão Fernando Henrique Cardoso, predomina na história de sua obtenção o aumento da carga tributária, e não a contenção de despesas, sendo assim um completo absurdo chamá-lo de "economia ou poupança" que o governo faz, o que é muito distante de seu hábito essencialmente gastador e arrecadador; 4) se concretizada a citada ameaça de novo aumento de impostos, sem compensá-lo com uma redução tributária, novamente o mesmo processo se repetirá; 5) o superávit primário deixa em segundo plano a avaliação do que é mais importante, o déficit fiscal, nominal ou final; 6) que, aliás, deve estar até aumentando com o crescimento da dívida bruta e da taxa de juros fixada pelo Banco Central.

Galinha ou tartaruga? - MÁRCIO GARCIA

VALOR ECONÔMICO - 06/03

Nas palestras que tenho dado em universidades nos EUA, causam sempre grande espanto os números decepcionantes do crescimento da economia brasileira nos últimos três anos (2,7% em 2011, 1% em 2012 e 2,3% em 2013). Aparentemente, os bons anos 2003-2010, nos quais o Brasil cresceu, em média, 4% ao ano, criaram a ideia de que o Brasil era não só o B dos Brics, mas também um país que poderia ter taxas de crescimento asiáticas.

Um pouco de conhecimento sobre o país teria sido suficiente para dissipar a ilusão que a propaganda oficial tentou criar a propósito da expansão desmedida de 7,5% em 2010, claramente associada à disputa eleitoral. No entanto, muitos investidores internacionais compraram gato por lebre. E só notaram quando já era tarde demais. Mas, para analistas competentes da economia brasileira, a raquítica taxa média de crescimento do primeiro triênio da presidente Dilma, 2%, é menos desapontadora do que pode parecer.

As razões para o baixo crescimento estão ligadas à política econômica adotada desde 2006, sob a batuta do ministro Guido Mantega, com respaldo da presidente Dilma, pautada pela expansão do consumo, público e privado, este último turbinado pela expansão do crédito.

Enquanto a expansão de demanda pôde contar com a expansão do emprego, o Brasil cresceu a 4%. Desde 2010, contudo, atingimos patamar que parece ser o de pleno emprego, o que significa que o fator trabalho só pode contribuir para o crescimento na medida da expansão da população economicamente ativa, que tem sido menor do que a taxa de crescimento populacional, que caiu para 1% ao ano. Ilan Goldfajn estima que, no final da década, a expansão da força de trabalho contribuirá apenas com 0,6% para o crescimento do PIB (Para onde vai o desemprego?, "O Globo" e "O Estado de S. Paulo, 4/3/2014).

Do lado do capital, malgrado os vultosos recursos destinados aos empréstimos subsidiados do BNDES, as taxas de investimento não conseguem sequer chegar a 20% do PIB (18,4% em 2013 e 18,2% em 2012), abaixo da média dos países latino-americanos e aquém das necessárias para almejarmos uma taxa média de crescimento da ordem de 4%.

Sem poder contar com a diminuição da taxa de desemprego ou com o aumento da taxa de investimento, só poderíamos crescer a taxas mais altas se a produtividade total dos fatores, ou seja, o quanto se produz com a mesma quantidade de capital e trabalho, estivesse se expandindo. Entretanto, só a agricultura exibe robusta expansão da produtividade. A Embrapa é um caso raro de política pública de longo prazo bem sucedida. Os demais setores, sobretudo a indústria, não conseguem ultrapassar os gargalos estruturais da economia brasileira: educação e infraestrutura deficientes; carga tributária extremamente elevada e causadora de distorções, para financiar os gastos públicos exagerados; leis trabalhistas que incentivam a informalidade; Justiça cara e lenta; e protecionismo elevado que impede a integração internacional e maior competitividade.

Nada disso é novidade. O problema é que, desde 2006, surfamos a onda chinesa e deixamos de fazer as reformas que são indispensáveis para o crescimento de longo prazo. Dizia-se que a "nova" política econômica iria acabar com o crescimento efêmero, representado pelo voo da galinha. A realidade mostrou que não se obteve muito mais do que o vagaroso caminhar da tartaruga. Não há o que reclamar nem culpar crises internacionais. A culpa é nossa e cabe a nós mudar essa situação. Enquanto isso, há que suportar a ironia de estrangeiros, que voltam a perguntar se o Brasil continuará a ser sempre o país do futuro.

A poupança encolheu - CELSO MING

O Estado de S.Paulo - 06/03

O governo Dilma já deu sinais suficientes de que está convencido de que, sem investimento, não dá para garantir o crescimento sustentado da atividade econômica.

Mas não sabe como mudar a ênfase do consumo para o investimento. Até há poucos meses, as autoridades davam a entender que, para elas, bastaria acionar o BNDES e apelar ao empresário para que soltasse o espírito animal e tudo aconteceria porque o essencial, a força do mercado interno de consumo, estava garantido.

E não é assim. O consumo continua crescendo mais do que o PIB, o BNDES, em ligação direta com o Tesouro, deu quase tudo o que podia dar e, no entanto, o empresário não se anima.

O ministro da Fazenda, Guido Mantega, às vezes dá a impressão de que acredita no que enfia nas suas apresentações em PowerPoint. Em setembro de 2013, por exemplo, entre retas e curvas nascidas do seu cérebro, como Atena de Zeus, vendeu a ideia de que, em 9 anos, o Brasil destinará 24% de sua renda para o investimento e, então, o crescimento será inexorável, ao ritmo de mais de 4% ao ano.

O ministro baseou-se, em parte, na decisão ainda relutante do governo de acionar concorrências para a expansão dos serviços públicos, especialmente na área da infraestrutura. No entanto, também esse processo é lento demais e está sempre sujeito a insuficiências regulatórias e à baixa capacidade gerencial do setor público.

As avaliações das Contas Nacionais (as mesmas que calculam o PIB) mostraram que, em 2013, a poupança nacional não passou de 13,9% do PIB (veja o gráfico). Se o País não poupa, não pode garantir o investimento. Não cabe a argumentação de que este é um ponto isolado nas estatísticas. Há mais de 5 anos, a economia brasileira consome mais de 60% do PIB e poupa menos de 18%. Ficaram para trás os tempos do governo militar em que a poupança externa (dívida externa) se encarregou de suprir a insuficiência interna de capitais.

Nem a poupança nem o investimento são o resultado da vontade e dos apelos de quem está no comando em Brasília. São o resultado de políticas públicas consistentes voltadas para isso.

Tudo começa com firmeza nos fundamentos. Por enquanto, só há vagas promessas de que o governo será capaz de dar solidez às contas públicas a ponto de evitar o rebaixamento da qualidade da dívida e a fuga dos investidores.

Também não há determinação suficiente para garantir a convergência da inflação para a meta. Nada menos que 25% dos preços da economia dependem de autorização do governo e estes estão represados, como acontece com as tarifas dos combustíveis e da energia elétrica. Esse represamento produz enormes distorções e cria insegurança porque, a qualquer momento, pode levar a decisões intempestivas.

Além de improvisadas e pouco abrangentes, as políticas do governo são de fôlego curto. O desempenho da indústria está excessivamente condicionado à distribuição de subsídios, de reservas de mercado e de isenções tributárias temporárias. E não há clareza na disposição do governo em mudar de rumo.

O exemplo do Paraguai - EDSON CAMPAGNOLO

GAZETA DO POVO - PR - 06/03

A cada dia, temos mais provas de que o Brasil precisa buscar, de uma vez por todas, soluções para os inúmeros entraves que tiram a competitividade do setor produtivo e comprometem nosso desenvolvimento. Recentemente, representando o presidente da Confederação Nacional da Indústria, Robson Braga de Andrade, tive a honra de liderar uma missão empresarial brasileira que visitou o Paraguai. Durante a missão, um grupo de 178 empresários e representantes de entidades nacionais se reuniu com autoridades paraguaias e visitou empresas instaladas na região de Assunção para conhecer de perto a política de atração de investimentos ao país. O que se viu é que nossos vizinhos estão fazendo o dever se casa melhor do que nós.

Hoje, o ambiente de negócios no Paraguai é muito mais atrativo aos investidores que o do Brasil. A começar pela carga e pelo sistema tributários, infinitamente mais leves e simples. Vantagem especialmente para empresas que utilizam o território paraguaio como base exportadora. Pelo Regime de Maquila, é possível uma empresa produzir e exportar a partir do Paraguai com imposto único de 1% sobre o valor agregado dos produtos. As vantagens se estendem para o custo da energia elétrica. Apesar de a maior fonte de energia paraguaia ser a usina de Itaipu – a mesma que é a maior geradora de energia para o Brasil –, as tarifas do país vizinho correspondem a um terço das praticadas por aqui. E eventuais riscos no abastecimento foram praticamente eliminados no fim de 2013, quando foi inaugurada uma nova linha de transmissão que leva a energia de Itaipu até os arredores de Assunção.

Como se não bastasse, no Paraguai os custos com a mão de obra são aproximadamente 35% menores que os do Brasil. E isso vem acompanhado de uma força de trabalho jovem e abundante e de uma legislação trabalhista mais racional que a nossa. Sem eliminar direitos dos trabalhadores e deveres dos empregadores, ela reduz significativamente os conflitos e passivos judiciais – hoje um problema crônico para quem produz no Brasil. A tudo isso se soma uma economia estável, com inflação controlada e índices de crescimento de causar inveja – em 2013, o PIB paraguaio cresceu 14,1%. Soma-se, principalmente, um poder público que vê o empresário como propulsor do desenvolvimento do país e que busca facilitar a geração de emprego e renda. Não é de hoje que isso acontece, mas na atual gestão, do presidente Horacio Cartes, esse incentivo se intensificou.

Ao levar empresários para conhecer in loco esse ambiente de negócios altamente favorável, não queremos incentivar uma debandada de empresas brasileiras. É claro que indústrias de alguns setores que, pelos altos custos de produção, já não são mais viáveis no Brasil podem buscar alternativas e, eventualmente, instalar sucursais em um país que ofereça vantagens competitivas. É uma questão de sobrevivência.

Mas, acima de tudo, missões como essa servem como alerta para o fato de o Brasil estar ficando para trás. Definitivamente, é preciso que o país busque soluções concretas para que também aqui tenhamos condições favoráveis para o setor produtivo. A sociedade, com governo federal e congressistas à frente, assumindo as responsabilidades para as quais foram eleitos, precisa encarar com seriedade as reformas trabalhista, previdenciária, tributária e fiscal, entre outras, que nos coloquem novamente em igualdade de condições com nossos concorrentes. Se não o fizermos, muito em breve veremos, efetivamente, empregos e riquezas migrando para o outro lado da fronteira.

Mais faculdade, menos desemprego - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 06/03

Crédito estudantil tira jovens do mercado de trabalho e ajuda a manter desemprego em nível baixo


CADA VEZ MAIS, jovens têm preferido estudar a trabalhar, indicam as pesquisas de emprego e o número de matrículas no ensino superior. Ao trocar o trabalho pela faculdade, os jovens ajudam a derrubar a taxa de desemprego, fenômeno que ficou evidente em especial no ano passado.

A reviravolta se deveu em parte a um programa do governo que facilitou o financiamento dos estudos, segundo estudo dos economistas Aurélio Bicalho e Luka Barbosa, do Departamento de Pesquisa Macroeconômica do banco Itaú.

Desempregado não é quem está sem trabalho, mas quem procura e não encontra emprego. Quem deixa de querer trabalho deixa de fazer parte da população economicamente ativa (PEA). Se a oferta de empregos cai, mas cai também a PEA, o desemprego pode até diminuir. É o presente caso brasileiro: a PEA está caindo. Mais gente deixa de procurar trabalho, em especial jovens de 18 a 24 anos.

É fato que o mercado de trabalho ficou mais frio, pois a economia tem crescido mais devagar. O número de trabalhadores em janeiro deste ano era 0,1% menor que em janeiro de 2013 (nas seis regiões metropolitanas pesquisadas pelo IBGE). Parece pouco, mas a população ocupada crescia ao ritmo anual de 2% em 2011-2012 e de 3% de 2006 a 2008.

A diferença é brutal. Fica evidente também nas estatísticas do emprego formal, que aumentava ao ritmo de 120 mil vagas mensais entre 2006 e 2008, caindo para 60 mil em 2013, relembra o pessoal do Itaú.

Segundo Bicalho e Barbosa, o mercado de trabalho mais fraco desestimulou a procura de emprego. Mas outro fator deve ter contribuído para mudar as preferências dos jovens.

Em 2010, o governo melhorou as condições do crédito por meio do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Os juros caíram muito e o prazo para pagar aumentou. O número de matrículas pelo Fies foi de 76 mil em 2010 para 566 mil em 2013. O número de jovens inativos cresceu entre 2012 e 2013, a maior parte deles entre os que estudam (82%).

Obviamente, a decisão de estudar em vez de trabalhar depende das condições de vida das famílias. A renda cresceu bem na década recente. Se as famílias estivessem no aperto, os jovens teriam de ajudar em casa e/ou estariam menos inclinados a tomar um financiamento.

No presente contexto, os jovens do Fies não devem voltar ao mercado, o que deve manter o desemprego baixo e a inflação pressionada nos próximos trimestres, notam Bicalho e Barbosa.

Sem uma pesquisa específica com os jovens, é difícil cravar o motivo da mudança de comportamento. Mas o estudo de Bicalho e Barbosa fundamenta com cuidado uma hipótese razoável. O trabalho, de resto, evidencia outra mudança social que tem recebido pouca atenção.

O desemprego não está baixo apenas por causa dos jovens estudantes, claro; aliás, está curiosamente baixo, dadas a desaceleração do ritmo do PIB (de crescimento anual de 4% sob Lula para 2% na média de Dilma) e a alta de custos para as empresas. É provável que as reduções de impostos sobre a folha salarial, entre outros, tenham compensado a baixa econômica e os custos crescentes, embora tal "solução" não seja sustentável, dado o deficit crescente do governo.

Marcha contra a poluição - MIRIAM LEITÃO

O GLOBO - 06/03

A questão ambiental é um problema econômico e político. Se alguém duvida, olhe o que aconteceu na China nas últimas horas para mudar de ideia. Na reunião do que eles chamam de Congresso, o novo primeiro- ministro, Li Keqiang, declarou "guerra à poluição" e a equiparou à luta contra a pobreza. Para cumprir o que promete, terá que fazer outra longa marcha.

De 2004 a 2011, o investimento em energia limpa subiu 31% no mundo e 57% na China. Lá saiu de US$ 2,2 bilhões para US$ 52 bilhões por ano. Em 2012, US$ 63,8 bilhões e no ano passado, segundo dados da Bloomberg New Energy Finance, houve a primeira queda em uma década. A China investiu US$ 61,8 bilhões, menos 3,8% do que no ano anterior; no mundo, caiu 12% e na Europa, 41%. Considera-se energia limpa eólica, solar, biomassa, pequenas hidrelétricas, geotérmica e marés, mas não as grandes hidrelétricas. A China tem a maior capacidade instalada das novas renováveis.

A má notícia é que ainda tem uma gigantesca dependência da pior das energias fósseis: 69% vêm do carvão. E a segunda fonte na matriz é petróleo. A China vive essa dicotomia. É o país onde mais crescem as fontes de energia limpa e o que mais emite gases de efeito estufa. No fluxo, crescem as energias limpas com a força dos subsídios e investimentos; mas o estoque a condena: a China construiu seu crescimento sobre o carvão farto, barato e sujo. O carvão ou as siderúrgicas e cimenteiras movidas a carvão garantem o emprego de milhões de chineses e não há substituto imediato.

Por coincidência, a reunião anual do Congresso Nacional do Povo acontece quando o país está submerso numa nuvem de poluição que chegou ao nível máximo que acendeu a luz vermelha. Crianças são retidas em casa, as vendas de máscaras e purificadores do ar dispararam.

Li Keqiang, no discurso que fez, prometeu lutar contra a poluição com a mesma determinação com que o país enfrentou a pobreza. E criticou o modelo econômico cego e ineficiente que exige reformas.

O combate às emissões é emergencial, mas além disso, no primeiro discurso, Keqiang deu várias outras notícias. Manteve a proposta de crescimento para dentro. A meta de inflação ficou em 3,5% porque "nós não podemos baixar a nossa guarda, para que o aumento dos preços não produza efeito negativo na vida do povo". Disse que o desenvolvimento chinês atingiu "zona de águas profundas" e, por isso, é preciso "quebrar os grilhões mentais". Palavras fortes para propor mais espaço para o setor privado em todas as áreas, inclusive na financeira.

Uma das propostas que apresentou ao Congresso do Povo foi permitir a capitais não estatais participarem de projetos em áreas como bancos, petróleo, eletricidade, ferrovias, telecomunicações, desenvolvimento de recursos naturais e serviços públicos.

Ele informou também que a China continuará a negociar acordos de investimento com os Estados Unidos e União Europeia, e vai acelerar conversas sobre livre comércio com Coreia, Austrália e Conselho de Cooperação do Golfo. Atenção: a Austrália é produtora de minério de ferro, nosso principal produto de exportação para a China.

Como parte da reciclagem da economia chinesa na marcha contra a poluição, o primeiro-ministro prometeu reduzir a capacidade de produção da siderurgia obsoleta em 27 milhões de toneladas métricas de aço e das fábricas velhas de cimento em 42 milhões de toneladas métricas. Nos próximos anos, a China vai fechar 50 mil pequenas caldeiras a carvão e instalar equipamentos de retirar o enxofre das térmicas a carvão. Seis milhões de veículos velhos serão recolhidos. Se fizer tudo isso, ainda será insuficiente. A poluição é o centro do problema chinês.

A verdadeira piora no cenário fiscal de 2014 - LEANDRA PERES

VALOR ECONÔMICO -06/03

O resultado das contas públicas anunciado na semana passada decepcionou por ter sido o pior janeiro desde 2011. Mas a verdadeira deterioração no cenário fiscal de 2014 foi divulgada pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), que estimou as chuvas em março em 67% da média histórica. "Dito de outra forma: as térmicas vão ficar ligadas o ano inteiro e as premissas com que o governo vinha trabalhando terão que ser revistas", explica uma autoridade federal. E mais: cresce no governo a ideia de mudar as regras de cálculo dos preços do setor elétrico para reduzir na canetada o tamanho do problema fiscal.

O cenário com que trabalha o Tesouro Nacional é de que as chuvas de março serão suficientes para reduzir o custo da energia no mercado de curto prazo e, assim, baratear também o socorro que o governo terá que dar às distribuidoras de energia, afetadas pelo alto custo da geração termelétrica.

Para se ter uma ideia do tamanho da esperança, o Orçamento de 2014 foi elaborado com um preço médio da energia de R$ 160,00 ao longo do ano. No ano passado, o custo médio anual foi calculado em R$ 262,56 e este ano está no teto de R$ 822,63 desde o início de fevereiro.

Nas reuniões internas, o governo não vinha mais trabalhando com um valor de energia tão baixo como aquele usado na elaboração do Orçamento, mas considerava "realista" que o custo da energia cairia a partir de março/abril, fim do período de chuvas. Com isso, o gasto do Tesouro Nacional com o socorro ao setor elétrico oscilaria ao redor de R$ 10 bilhões.

Com a nova previsão de chuvas do ONS, as chances de o gasto do governo chegar ao teto de R$ 18 bilhões projetado pelo setor privado e inclusive ultrapassar esse valor passaram a ser o cenário mais provável, na avaliação feita por essa autoridade do governo.

A presidente Dilma Rousseff teve uma reunião na semana passada com a cúpula do setor elétrico. Avaliaram as previsões meteorológicas e decidiram continuar apostando em São Pedro. Até o fim do período chuvoso, o governo não fala nem mesmo em medidas de racionalização do uso da energia.

Tomam corpo pela Esplanada dos Ministérios, no entanto, avaliações de que o problema não está na falta de chuvas, mas na fórmula matemática que calcula o preço da energia no mercado de curto prazo. O raciocínio é mais ou menos assim: o sistema elétrico brasileiro é majoritariamente hidroelétrico. As concessões das geradoras, renovadas em 2012, tiveram como base um custo de operação de R$ 30,00 por MW. Portanto, não há motivos para os consumidores ou o Tesouro Nacional pagarem R$ 822,83 por MW. "O preço está muito alto. Tem que mexer nisso", resumem os críticos.

Mexer nos preços da energia no mercado de curto prazo pode reduzir a conta do Tesouro Nacional, mas será mais uma daquelas soluções com marca de casuísmo, contabilidade criativa e perda de credibilidade.

Há um princípio econômico para que o preço da energia seja calculado como ele é. A lógica de formação do Preço de Liquidação das Diferenças (PLD) é que ele reflita o custo marginal da energia, ou seja, o custo de produzir o último megawatt. No caso do setor elétrico, isso significa o preço da térmica mais cara em uso no momento. Contrariar esse princípio básico significa introduzir mais uma distorção nos preços do setor. Depois de segurar as tarifas para controlar a inflação e ver a estratégia naufragar, é de se imaginar que as autoridades sejam mais cautelosas com essas soluções.

Oficialmente, o governo diz que só vai tratar da questão fiscal do setor elétrico depois das chuvas, mas na prática não poderá adiar o problema por mais que algumas semanas.

As distribuidoras de energia têm que depositar garantias ao pagamento da energia comprada em janeiro até o dia 11 de março. O governo já sabe que pelos menos uma grande distribuidora em um importante mercado consumidor tem dificuldades de caixa para fazer o depósito.

Mas talvez a maior pressão venha de fora. A missão da Standard & Poor"s, uma das principais agências internacionais de avaliação de risco, chega ao Brasil no começo de março. As reuniões com o governo já estão marcadas e uma das perguntas que serão feitas é como o governo vai resolver o problema do setor elétrico.

Quem conhece o mundo das agências de rating diz que o caminho natural depois que a S&P colocou a nota de crédito brasileira em perspectiva "negativa" é um downgrade ou um retorno à perspectiva estável ou positiva. São poucos e raros os casos em que uma missão de avaliação confirmou e manteve por mais tempo a perspectiva negativa de um rating.

No governo, há uma visão de que alguns dos recentes indicadores econômicos vão dificultar o discurso do downgrade. Entre os pontos positivos estão o resultado do PIB de 2013, que ficou em 2,3% e acima do projetado, e a boa aceitação da meta fiscal para o ano, considerada realista pelo mercado. O desempenho da economia vai, inclusive, melhorar marginalmente os indicadores de endividamento do país, um dos critérios centrais de avaliação das agências de rating.

No campo contrário a esse discurso, estão os que consideram esses resultados parte do passado. Olhando adiante, a S&P enxergará uma economia em desaceleração, incertezas fiscais para as quais não há solução, um mundo mais volátil por causa da retirada de estímulos da economia dos Estados Unidos e uma eleição presidencial no calendário brasileiro.

Para esses observadores, o melhor resultado da avaliação da nota de crédito do Brasil será um downgrade que ainda deixará o país no grupo de grau de investimento e baixo risco. Esses analistas não descartam um downgrade seguido de uma perspectiva negativa, mas reconhecem que os sinais pró-mercado que o governo tem se empenhado em mandar podem ser suficientes para evitar o pior.

Mas tanto otimistas quanto pessimistas reconhecem que o governo não conseguirá construir um discurso fiscal coerente se não souber responder à S&P e a quem mais perguntar como pagará a conta do setor elétrico.

Democracia ao gosto - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 06/03

1 No campo político, o presidente da Rússia, Vladimir Putin, continua jogando pelas regras democráticas que ele manipula 

2 A China caminha para uma meritocracia que fará com que os escolhidos para o Parlamento possam representar realmente a vontade do povo e não apenas os que têm influência para atrair votos 

3 A definição do socialismo com características chinesas engloba não apenas a economia de mercado, inclui também a democracia e o Estado de Direito, mas promovidos pelo Partido Comunista

A discussão sobre os problemas que a democracia vem enfrentando em diversas partes do mundo, que a revista inglesa "The Economist" analisa em sua mais recente edição, coloca em primeiro plano o conceito mesmo de democracia. A revista inglesa atribui a decadência da democracia, entre outros fatores, ao sucesso do capitalismo de Estado na China.

No campo político, por exemplo, o presidente da Rússia (e não primeiro-secretário, como escrevi ontem), Vladimir Putin, continua jogando pelas regras democráticas que ele manipula.

A revista inglesa, aliás, ironiza o fato de Putin ter sido nos últimos anos duas vezes primeiro-ministro e duas vezes presidente. Em entrevistas recentes e artigos, Putin deixa claro que os grandes conglomerados estatais serão os coordenadores da transição econômica para a alta tecnologia de que a Rússia precisa para competir globalmente.

À medida que na Rússia a classe média vem crescendo, as reivindicações aumentam, e as críticas à corrupção se difundem na sociedade. Mas o controle pelo governo do Parlamento e do sistema Judiciário, o que caracteriza um hiperpresidencialismo próximo de uma ditadura disfarçada devido ao controle ou intimidação dos meios de comunicação, da mesma maneira que ocorre na Venezuela, impede que a insatisfação crescente se transforme, pelo menos até o momento, em uma reação mais concreta para barrar a ascensão de Putin.

A China, por sua vez, tem apresentado em diversos fóruns internacionais, através de acadêmicos chineses e estrangeiros, uma visão de democracia bastante crítica, muitas vezes correta, e ideias bastante criticáveis sobre o que seria a democracia ao estilo chinês. A The Economist cita algumas delas, como a de Zhang Weiwei, da Universidade Fudan, que diz que a democracia destrói o Ocidente por institucionalizar o bloqueio das atividades congressuais, como tem ocorrido nos Estados Unidos, e permitir que líderes de segunda classe como George W. Bush cheguem à Presidência da República.

Já Yu Keping, da Universidade de Pequim, diz que a democracia dificulta decisões simples e dá margem a que políticos populistas, mas de boa lábia, enganem o povo.

Daniel A. Bell, canadense professor de Teoria Política da Universidade Tsinghua, e Yan Xueton, reitor do Instituto Internacional de Estudos da mesma universidade, discorreram em Davos no Fórum Econômico Mundial, e eu já escrevi aqui, sobre o confucionismo, que define que o governo deve servir ao povo e ter como prioridade a moralidade, e o legalismo, que prioriza a punição e o forte controle do país.

Bell considera que a China, ao buscar essa força moral de sua liderança, pode caminhar para a implantação de um sistema político que não será a democracia como nós a conhecemos no Ocidente, mas uma meritocracia que fará com que os escolhidos para o Parlamento possam representar realmente a vontade do povo e não apenas os que têm influência para atrair votos.

Dentro da mesma linha de raciocínio, o professor de Filosofia da East China Normal University (ECNU) Tong Shijun fez na recente reunião da Academia da Latinidade em Kuala Lumpur uma análise sobre a importância do soft power , uma terceira dimensão do poder, superando em certas ocasiões o econômico e o militar, para a expansão da cultura chinesa pelo mundo dentro do atual século chinês . Num mundo multipolar, esse poder suave nas relações com aliados, na assistência econômica e em intercâmbios culturais resultaria em uma opinião pública mais favorável e maior credibilidade externa.

Segundo Tong Shijun, a importância do soft power chegou ao Congresso do Comitê Central do Partido Comunista Chinês em 2007, e, no ano passado, o próprio presidente chinês, Xi Jinping, afirmou em um discurso que, para fortalecer o ´soft power´ do país, devemos fazer nosso melhor esforço para aperfeiçoar nossa capacidade na comunicação internacional .

A definição do socialismo com características chinesas engloba não apenas a economia de mercado, inclui também a democracia e o Estado de Direito, mas promovidos pelo Partido Comunista.

Começo de conversa - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 06/03

BRASÍLIA - O primeiro ano da morte do presidente Hugo Chávez confirma que não há chavismo sem Chávez. O país, que já vivia uma crise política e econômica, agora está um verdadeiro caos.

A Venezuela não é a Ucrânia, principalmente porque não há duas potências em choque e trocando farpas em público, muito menos com risco de invasões e guerras. Nem por isso a crise venezuelana deixa de ser grave.

Suplantada pela Ucrânia, saiu da mídia norte-americana, mas não das preocupações do Departamento de Estado e, claro, mobiliza Dilma e os demais presidentes da região.

Líderes do Mercosul (Cone Sul), da Unasul (América do Sul) e da Celac (que inclui o Caribe), mais do que emitir notas a respeito, estão trocando intensos telefonemas e discutindo alternativas. A Venezuela em chamas significa incêndio na região num momento internacional delicado.

Com Chávez lá e Lula cá, o Brasil capitaneou uma comissão externa para ajudar o país a deslizar do impasse para algum nível de normalidade. Agora não poderia ser diferente, mas o chanceler Elías Jaua já deu um chega pra lá ao dizer que o país não precisa de mediação externa para problemas internos.

Não pode ser para valer. O próprio presidente Nicolás Maduro tenta minar e reduzir a base oposicionista e já estendeu a mão para setores antes rechaçados pelo chavismo. A ajuda de aliados só ajudaria.

Uma mediação entre Caracas e Washington, aliás, também deveria ser bem-vinda. Apesar de os EUA terem reduzido bastante a importação de petróleo venezuelano em 2013, o país de Chávez e Maduro é um dos maiores produtores mundiais, o Oriente Médio não é confiável e o produto continua sendo essencial.

Um bom momento para colocar tudo isso sobre a mesa será na semana que vem, coincidindo com a posse de Michelle Bachelet, que está de volta à presidência do Chile. Mas só se Maduro autorizar e Chávez abençoar. Com esses dois, nunca se sabe.