O GLOBO - 06/03
A atenção com a contabilidade é constante, diante do risco de o Brasil vir a ser rebaixado em sua nota de risco, apurada por agências especializadas internacionais
Noticiado na sexta-feira pré-carnavalesca, o resultado das contas públicas em janeiro não foi motivo de alegria para o governo. Logo agora, no início do exercício diante do qual o Planalto faz profissão de fé numa austeridade que não demonstrou em qualquer momento nestes três anos de governo, a União obteve um superávit primário — para abater a conta de juros — pífio, o mais baixo desde janeiro de 2009.
Os R$ 12,95 bilhões de economia representaram uma queda de 50,7% em relação aos R$ 26,28 bilhões acumulados em janeiro de 2013. Assim, o superávit nos últimos 12 meses, que, em dezembro, estava em 1,9% do PIB, também meta para este ano, caiu, em janeiro, para 1,67%. Como pano de fundo, o fato de as receitas terem subido 6,6%, bastante aquém dos siderais 19,5% de crescimento das despesas.
Como sempre acontece, o discurso oficial é otimista. O secretário do Tesouro, Arno Augustin, prefere ressaltar o saldo primário acumulado no trimestre de novembro a janeiro — R$ 54 bilhões, o mais elevado na história para este período.
Há analistas que interpretam o elástico salto das despesas em janeiro como sinal de contenção contábil de gastos no final de 2013, transferidos para o início deste ano, a fim de melhorar um pouco o quadro fiscal do ano passado. Autoridades negam, mas há alternativas no manejo de planilhas para empurrar despesas de um ano para outro sem que apareçam na rubrica “restos a pagar”.
A atenção redobrada com a apresentação das estatísticas da contabilidade pública é constante, diante do risco concreto de o Brasil, muito por estripulias fiscais, vir a ser rebaixado em sua nota de risco, apurada por agencias internacionais especializadas.
Há preocupações de toda ordem. Existe mesmo quem considera que, ao contrário de um corte de R$ 44 bilhões anunciado pelo governo, haverá, na verdade, um aumento de despesas de R$ 88 bilhões sobre o que foi efetivamente gasto em 2013. O alerta, do ex-diretor do Banco Central Alexandre Schwartsman, em coluna na “Folha de S.Paulo”, significa que o corte será de “fumaça”. Não terá sido a primeira vez que se infla o Orçamento para se passar a tesoura em vento.
Também análises publicadas no jornal “Valor Econômico” apontam para um excesso de otimismo oficial nas previsões de arrecadação de receitas a serem obtidas em concessões, venda de ativos, royalties e dividendos de estatais. Em 2013, quando houve o superleilão do campo petrolífero de Libra, com o pagamento de um bônus de R$ 15 bilhões, foram arrecadados, nestas fontes, R$ 75,66 bilhões. Já para este ano, sem um outro Libra, projetam-se R$ 88,56 bilhões.
O melhor é que isso não seja mais um resultado da “contabilidade criativa”.
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