O Estado de S. Paulo - 30/06
Desde que a Lava Jato demonstrou que o PT é o Eduardo Cunha e vice-versa, e que há muito pouca coisa entre os dois que se diferencie radicalmente de ambos, o Brasil está paralisado na sua perplexidade.
Seriam, de fato, os R$ 0,85 de cada mensalidade embolsados pelo ministro Paulo Bernardo o maior escândalo desses “empréstimos consignados” com juros subsidiados, que já montam a R$ 281 bi (4,5% do PIB), para a casta dos “com tudo” ao lado dos mais de 400% ao ano de juros do cartão do desespero dos “sem nada”, de quem o Estado já toma outros 46% do PIB (36% de carga + 10% de déficit)? Pense bem: o Bolsa Família, sempre aventado como desculpa para manter os ladrões onde estão, custa 0,3% do PIB...
Este país de avessos, onde as escolas é que estão “ocupadas” e estudar passou a ser uma atividade clandestina que a polícia reprime de preferência a quem trata de impedi-la, teve tempo de sobra para acostumar-se com isto em que se transformou. Os sindicatos-impostos de Getúlio Vargas evoluíram do primeiro e único ao 15.º milésimo de hoje e a metástase prossegue sem combate ao ritmo de 280 novos por ano. E daí saltamos com toda a naturalidade para os nossos por enquanto 35 partidos-impostos, aos quais pagamos horários-impostos para que nos ofendam e humilhem diariamente na TV, tudo sob a proteção dos “movimentos sociais-impostos” recheados de militantes-impostos que nos cobram hora extra para viajar em ônibus-impostos para onde quer que sejam convocados para defender a intocabilidade dos “seus” impostos. Passados 80 anos eis-nos bancando festas nos palácios com impostos diretamente arrancados às favelas...
Com toda a barreira de silêncio que ainda protege da exposição à execração pública que merece o mundo da corte movida a impostos onde “demissão” não consta do dicionário, “auxílio” não é renda e os salários continuam subindo 60 bilhões por ano em meio ao pânico aqui fora, bate na cara do País inteiro o verdadeiro divisor de águas – contribuintes x “contribuídos” – que separa os dois Brasis e não se encaixa nem a murro no repertório “esquerda-direita” dos nossos ditadores de “correção política”.
Agora temos o ciclo completo. Do imperador ao proletário, todos os que estiveram no comando do “Sistema” colheram variações do desastre que é só o que ele pode produzir ou, no máximo, suspenderam temporariamente seus efeitos. Caiu finalmente a ficha. É tudo uma fraude. Tudo tem sido uma fraude. E o País que não se assume como desonesto calou-se...
Tão perto! Tão longe!
O buraco é de dar vertigem, mas o tamanho do nosso atraso é o nosso maior trunfo. O mundo está todo numa encruzilhada, mas é uma encruzilhada lá na frente. Tudo o que diferencia o Primeiro do Último Mundo é, hoje, estrada batida. Para percorrê-la basta se dispor a tanto. Você saberá que o Brasil tem cura quando se começar a afirmar em voz alta, por aí, as duas balizas mais elementares da democracia, plantadas há mais de 300 anos. Apoiar o discurso do ajuste das contas públicas no princípio da igualdade perante a lei colocando na linha de cortes todos os “direitos” e isenções que não sejam comuns a todos os brasileiros é a única maneira de desarmar o torneio entre padrinhos de privilégios à custa do aprofundamento da corrupção e da miséria em que ele, mais uma vez, se vai transformando. Redefinir o direito de representação confirmando exclusivamente o dos sindicatos, partidos políticos e entidades que forem capazes de conquistá-lo e mantê-lo por livre eleição e financiamento dos seus representados é o único modo objetivo de sairmos do feudalismo e começarmos a nos beneficiar do processo de depuração recorrente inerente aos sistemas democráticos. A “cláusula de barreira” que o STF matou não era mesmo a melhor solução, pois cuidava só de represar a lama incessantemente produzida por um sistema torto e corrupto que acabará sempre, inevitavelmente, em “desastres da Samarco” com “danos ambientais” permanentes.
Para que “as instituições funcionem” de fato não é a letra, é a essência democrática da Constituição, definida nos seus artigos iniciais, que tem de ser imposta acima de tudo e de todos, começando pelo desafio jurídico de toda a vasta massa de exceções e penduricalhos esboçados nos que lhe foram acrescentados na sequência e estão em conflito insanável com eles.
Quando não foram diretamente protagonizadas pelo Poder Judiciário, como as da Inglaterra do século 17 que criaram a democracia moderna, as poucas revoluções verdadeiras que a História da humanidade registra – não confundir com os banhos de sangue recorrentes para troca de comandantes de monarquias ou ditaduras das culturas latinas – consolidaram-se (ou não) nas reformas jurídicas que foram empurrando a humanidade para fora do padrão geral do privilégio institucionalizado e para dentro da igualdade perante a lei cujo corolário obrigatório é sair do “a cada um segundo o seu grau de cumplicidade para com os crimes do rei” e enveredar pelo muito menos venenoso “a cada um segundo o esforço investido na obra coletiva”.
O que houve de empolgante no atual processo brasileiro foi exatamente o fato de ter ele partido do Poder Judiciário. Com as condenações do “mensalão” o Brasil acordou para o fato de que não é obrigatório, afinal, que o crime vença sempre, e foi às ruas para comemorar esse quase milagre e empurrar para adiante a “marolinha” que, a partir de Curitiba, assumiu ares de tsunami e ameaça fazer escola.
O Brasil Velho está vivo, como prova o fato de todos os ladrões estarem presos e continuarem soltos os seus chefes. Mas o Novo não dá sinal de abandonar a arena. Seria uma excelente bandeira para essa OAB reconciliada com sua tradição histórica de alinhamento com o que é justo tomar a si, junto com os movimentos de rua, esse “Mutirão pela Igualdade Perante a Lei”, de modo a forçar o País inteiro a tomar posição em relação ao que há de mais essencial numa ordem realmente democrática.
*Fernão Lara Mesquita é jornalista
quinta-feira, junho 30, 2016
'Brexit' do Brasil - MATIAS SPEKTOR
FOLHA DE SP - 30/06
Se você tem apreço pela Grã-Bretanha ou pelos valores da Europa unida, o voto da semana passada a favor da saída da União Europeia foi um evento deprimente. A sociedade britânica e o projeto europeu ficaram menores, com repercussões para todos.
Mas uma análise fria da nova situação revela um quadro potencialmente positivo para o Brasil. No caso brasileiro, o "Brexit" mais abre oportunidades do que cria constrangimentos. Eis os porquês.
O declínio econômico britânico, que será inevitável a curto prazo, não vai contagiar a economia brasileira: exportamos para eles 1,52% do que vendemos mundo afora e compramos deles apenas 1,63% das nossas importações totais. Uma base tão pequena blinda o Brasil, ao passo que abre uma enorme oportunidade, agora que as autoridades britânicas terão de buscar novos acordos comerciais para mitigar sua perda de riqueza e o possível fim do acesso privilegiado ao mercado comum europeu e aos 53 mercados não europeus com os quais a UE tem acordos de livre-comércio.
As perspectivas de comércio novo entre o Brasil e o Reino Unido existem em boa medida pela atitude relativamente aberta de Londres para tratar de questões agrícolas. Bastaria o governo argentino de Maurício Macri implementar seu projeto para reduzir o peso das ilhas Malvinas sobre sua relação com os britânicos para viabilizar uma eventual negociação comercial entre o Reino Unido e o Mercosul. Além de factível, algo assim enfrentaria menos interesses obstrucionistas que a famigerada negociação ora em curso entre o Mercosul e toda a União Europeia.
Sem dúvida, uma crise na praça financeira de Londres seria péssima para o Brasil, pois capitais britânicos respondem por 7,3% do estoque total dos investimentos estrangeiros que chegam por aqui. Mas o "Brexit" tende a forçar um aumento da liquidez no sistema financeiro internacional, e nada sugere que venhamos a enfrentar uma fuga desses recursos.
Para o Brasil, as implicações geopolíticas do "Brexit" estão longe de ser uniformemente negativas. Os Estados Unidos ficam sem seu principal ponto de apoio na Europa e seu aliado mais fiel em negociações multilaterais e organismos internacionais. Isso dificulta, nem que seja na margem, a capacidade de Washington de impor suas decisões mundo afora. Além disso, ganham força a Rússia e, a longo prazo e se jogar bem, a Alemanha (embora o governo em Berlim sinta estar perdendo a curto prazo).
Para quem acredita que a geometria mais benéfica ao Brasil é a multipolaridade — e assim pensa a maioria dos analisas e diplomatas brasileiros —, o "Brexit" acabou de abrir um futuro potencialmente promissor.
Se você tem apreço pela Grã-Bretanha ou pelos valores da Europa unida, o voto da semana passada a favor da saída da União Europeia foi um evento deprimente. A sociedade britânica e o projeto europeu ficaram menores, com repercussões para todos.
Mas uma análise fria da nova situação revela um quadro potencialmente positivo para o Brasil. No caso brasileiro, o "Brexit" mais abre oportunidades do que cria constrangimentos. Eis os porquês.
O declínio econômico britânico, que será inevitável a curto prazo, não vai contagiar a economia brasileira: exportamos para eles 1,52% do que vendemos mundo afora e compramos deles apenas 1,63% das nossas importações totais. Uma base tão pequena blinda o Brasil, ao passo que abre uma enorme oportunidade, agora que as autoridades britânicas terão de buscar novos acordos comerciais para mitigar sua perda de riqueza e o possível fim do acesso privilegiado ao mercado comum europeu e aos 53 mercados não europeus com os quais a UE tem acordos de livre-comércio.
As perspectivas de comércio novo entre o Brasil e o Reino Unido existem em boa medida pela atitude relativamente aberta de Londres para tratar de questões agrícolas. Bastaria o governo argentino de Maurício Macri implementar seu projeto para reduzir o peso das ilhas Malvinas sobre sua relação com os britânicos para viabilizar uma eventual negociação comercial entre o Reino Unido e o Mercosul. Além de factível, algo assim enfrentaria menos interesses obstrucionistas que a famigerada negociação ora em curso entre o Mercosul e toda a União Europeia.
Sem dúvida, uma crise na praça financeira de Londres seria péssima para o Brasil, pois capitais britânicos respondem por 7,3% do estoque total dos investimentos estrangeiros que chegam por aqui. Mas o "Brexit" tende a forçar um aumento da liquidez no sistema financeiro internacional, e nada sugere que venhamos a enfrentar uma fuga desses recursos.
Para o Brasil, as implicações geopolíticas do "Brexit" estão longe de ser uniformemente negativas. Os Estados Unidos ficam sem seu principal ponto de apoio na Europa e seu aliado mais fiel em negociações multilaterais e organismos internacionais. Isso dificulta, nem que seja na margem, a capacidade de Washington de impor suas decisões mundo afora. Além disso, ganham força a Rússia e, a longo prazo e se jogar bem, a Alemanha (embora o governo em Berlim sinta estar perdendo a curto prazo).
Para quem acredita que a geometria mais benéfica ao Brasil é a multipolaridade — e assim pensa a maioria dos analisas e diplomatas brasileiros —, o "Brexit" acabou de abrir um futuro potencialmente promissor.
Reformas, por necessidade - CARLOS ALBERTO SARDENBERG
O GLOBO - 30/06
Eleitos pela direita desistem das reformas diante de protestos. Os de esquerda ganham dizendo que nada precisa mudar
A coisa mais fácil do mundo é entender a necessidade da reforma da Previdência: as despesas com o pagamento de benefícios crescem mais depressa que as receitas. Logo, o sistema está quebrado. Como os brasileiros já pagam impostos elevados, inclusive para a Previdência, é preciso cortar a expansão das despesas. Isso significa que as pessoas terão que trabalhar mais do que trabalharam os atuais aposentados.
É uma questão universal. Em toda parte, as pessoas vivem mais, logo ficam mais tempo aposentadas e isso custa cada vez mais caro, especialmente para o sistema de repartição — aquele em que os da ativa pagam contribuições com as quais são pagos os aposentados e pensionistas.
Em muitos países, governos conseguiram maiorias parlamentares para fazer reformas previdenciárias, sempre com elevação da idade mínima de aposentadoria.
Mas os líderes desses governos não tiveram vida fácil. Nunca, em lugar nenhum, se viu uma passeata de jovens gritando “65 anos já!”. Sim, de jovens, porque são eles os mais interessados em evitar uma quebra futura do sistema. Mas todo mundo já viu manifestação de aposentados ou quase aposentados contra qualquer mudança.
Por que os mais jovens não se manifestam? Em parte, porque não pensam no problema. Isso está tão longe.
É uma atitude bem forte por aqui. Dados e pesquisas mostram que o brasileiro médio demora muito tempo para começar a se preocupar com poupança e aposentadoria.
Mas também é universal. No Reino Unido, por exemplo, muitos jovens, favoráveis à permanência na União Europeia, não se animaram a votar. Agora, estão arrependidos, foram às ruas tentar melar a consulta popular, mas já era. Por um bom tempo.
Em muitos países, as sociedades simplesmente não conseguiram fazer reforma alguma. Grécia, por exemplo, com consequências dramáticas. Os aposentados ficaram algum tempo sem receber e, depois, passaram a receber pensões reduzidas. País mais pobre, o dinheiro simplesmente acabou.
A França está no clube dos ricos. Produz bastante riqueza, mas sua capacidade de crescer é cada vez menor, e sua competitividade global cai. É lógico: no clube dos desenvolvidos grandes, os franceses trabalham menos horas por semana, se aposentam com idade menor e ganham mais. Também tiram férias mais longas.
Os presidentes eleitos pela direita prometem reformas e acabam desistindo diante das violentas manifestações. Os de esquerda ganham dizendo que não precisa mudar nada — ou porque acreditam nisso ou porque simplesmente mentem. Mas todos percebem que têm de fazer — como entendeu o atual presidente François Hollande —, apresentam umas reformas meio aguadas e também acabam sucumbindo nas ruas.
Já governos que conseguem fazer as reformas com frequência perdem as eleições seguintes. Exemplo clássico: Gerhard Schröder, o social-democrata que governou a Alemanha de 1988 a 2005, e implantou reformas previdenciária, trabalhista e no ambiente de negócios. Foram essas mudanças que permitiram à Alemanha retomar competitividade e capacidade de crescimento — situação que, entretanto, beneficiou o governo de Angela Merkel, eleita pela oposição 11 anos atrás.
De todo modo, Merkel teve a sabedoria de não reverter as reformas, até avançou em outras. Não é por acaso que a Alemanha está hoje melhor que a França e saiu da crise recente com menos danos.
Tudo considerado, qual o prognóstico para o governo Temer? Fará as necessárias reformas para estancar a sangria do déficit das contas públicas?
A dificuldade óbvia é que não foi eleito para isso. Mas há possibilidades. Uma, a melhor coisa que pode acontecer a ele é encerrar a carreira entregando um país melhor em 2018. Não precisa buscar outros mandatos. A segunda vantagem, digamos, é o estado de necessidade em que se encontram as finanças públicas. Em diversos estados, os governos têm que escolher entre pagar ao pessoal ou comprar gasolina para as ambulâncias e carros da polícia.
Isso é uma antecipação do que pode acontecer com o governo federal. Este tem a prerrogativa de emitir dinheiro, de modo que, antes de quebrar, ainda pode destruir as finanças de todo o país gerando uma baita inflação.
As sociedades são como as pessoas, mudam por virtude ou por necessidade. Mas, mesmo na necessidade, é preciso que o governo tenha ideias claras e avance reto. Pregar austeridade para a maioria e salvar vantagens de alguns — isso não pode dar certo.
Eleitos pela direita desistem das reformas diante de protestos. Os de esquerda ganham dizendo que nada precisa mudar
A coisa mais fácil do mundo é entender a necessidade da reforma da Previdência: as despesas com o pagamento de benefícios crescem mais depressa que as receitas. Logo, o sistema está quebrado. Como os brasileiros já pagam impostos elevados, inclusive para a Previdência, é preciso cortar a expansão das despesas. Isso significa que as pessoas terão que trabalhar mais do que trabalharam os atuais aposentados.
É uma questão universal. Em toda parte, as pessoas vivem mais, logo ficam mais tempo aposentadas e isso custa cada vez mais caro, especialmente para o sistema de repartição — aquele em que os da ativa pagam contribuições com as quais são pagos os aposentados e pensionistas.
Em muitos países, governos conseguiram maiorias parlamentares para fazer reformas previdenciárias, sempre com elevação da idade mínima de aposentadoria.
Mas os líderes desses governos não tiveram vida fácil. Nunca, em lugar nenhum, se viu uma passeata de jovens gritando “65 anos já!”. Sim, de jovens, porque são eles os mais interessados em evitar uma quebra futura do sistema. Mas todo mundo já viu manifestação de aposentados ou quase aposentados contra qualquer mudança.
Por que os mais jovens não se manifestam? Em parte, porque não pensam no problema. Isso está tão longe.
É uma atitude bem forte por aqui. Dados e pesquisas mostram que o brasileiro médio demora muito tempo para começar a se preocupar com poupança e aposentadoria.
Mas também é universal. No Reino Unido, por exemplo, muitos jovens, favoráveis à permanência na União Europeia, não se animaram a votar. Agora, estão arrependidos, foram às ruas tentar melar a consulta popular, mas já era. Por um bom tempo.
Em muitos países, as sociedades simplesmente não conseguiram fazer reforma alguma. Grécia, por exemplo, com consequências dramáticas. Os aposentados ficaram algum tempo sem receber e, depois, passaram a receber pensões reduzidas. País mais pobre, o dinheiro simplesmente acabou.
A França está no clube dos ricos. Produz bastante riqueza, mas sua capacidade de crescer é cada vez menor, e sua competitividade global cai. É lógico: no clube dos desenvolvidos grandes, os franceses trabalham menos horas por semana, se aposentam com idade menor e ganham mais. Também tiram férias mais longas.
Os presidentes eleitos pela direita prometem reformas e acabam desistindo diante das violentas manifestações. Os de esquerda ganham dizendo que não precisa mudar nada — ou porque acreditam nisso ou porque simplesmente mentem. Mas todos percebem que têm de fazer — como entendeu o atual presidente François Hollande —, apresentam umas reformas meio aguadas e também acabam sucumbindo nas ruas.
Já governos que conseguem fazer as reformas com frequência perdem as eleições seguintes. Exemplo clássico: Gerhard Schröder, o social-democrata que governou a Alemanha de 1988 a 2005, e implantou reformas previdenciária, trabalhista e no ambiente de negócios. Foram essas mudanças que permitiram à Alemanha retomar competitividade e capacidade de crescimento — situação que, entretanto, beneficiou o governo de Angela Merkel, eleita pela oposição 11 anos atrás.
De todo modo, Merkel teve a sabedoria de não reverter as reformas, até avançou em outras. Não é por acaso que a Alemanha está hoje melhor que a França e saiu da crise recente com menos danos.
Tudo considerado, qual o prognóstico para o governo Temer? Fará as necessárias reformas para estancar a sangria do déficit das contas públicas?
A dificuldade óbvia é que não foi eleito para isso. Mas há possibilidades. Uma, a melhor coisa que pode acontecer a ele é encerrar a carreira entregando um país melhor em 2018. Não precisa buscar outros mandatos. A segunda vantagem, digamos, é o estado de necessidade em que se encontram as finanças públicas. Em diversos estados, os governos têm que escolher entre pagar ao pessoal ou comprar gasolina para as ambulâncias e carros da polícia.
Isso é uma antecipação do que pode acontecer com o governo federal. Este tem a prerrogativa de emitir dinheiro, de modo que, antes de quebrar, ainda pode destruir as finanças de todo o país gerando uma baita inflação.
As sociedades são como as pessoas, mudam por virtude ou por necessidade. Mas, mesmo na necessidade, é preciso que o governo tenha ideias claras e avance reto. Pregar austeridade para a maioria e salvar vantagens de alguns — isso não pode dar certo.
Hora do convencimento - MIRIAM LEITÃO
O Globo - 30/06
Proposta do governo para a Previdência mais assustou do que convenceu. O governo até agora seguiu o melhor roteiro de como não fazer a reforma da previdência: montou um grupo de trabalho grande com destaque para quem já é contra a reforma e anunciou, em pedaços, ideias que aparecem como ameaças às pessoas. O melhor caminho seria o diálogo, mas com a população em geral e não com centrais sindicais que têm opiniões já formatadas.
As notícias saem picadas e parecem péssimas. Primeiro, falou-se na idade mínima de 65 anos para homens e mulheres. Depois, circulou que a idade mínima seria, na verdade, de 70 anos. Redução do valor dos benefícios. Corte em pensões. E foi assim desde a posse de Michel Temer.
É difícil fazer essa reforma, ainda mais num governo interino e dando primeiro as más notícias. Assim não se sai do lugar. A previdência é um pacto de solidariedade entre gerações, no sistema de repartição como no Brasil. Quem está trabalhando contribui para sustentar quem está aposentado. Mas os trabalhadores entendem como se o regime fosse de capitalização, aquele em que a pessoa guarda para si mesmo, faz a sua poupança. Essa diferença, entre o sistema vigente e a impressão que a população tem, torna o diálogo mais difícil. É preciso explicar, mostrar os números, convencer que estamos caminhando para um colapso. Em vários países são feitas sucessivas mudanças no sistema previdenciário porque ele tem que ser sólido, do contrário a ameaça pesa sobre todos.
O mundo inteiro tem idade mínima para aposentadoria, menos o Brasil e outros dois ou três países. Mas Paulinho da Força saiu de uma das reuniões, com ar de autoridade com poder de veto, dizendo: “somos contra a idade mínima”. Para isso seria preciso revogar a demografia. As estatísticas mostram que os brasileiros estão vivendo cada vez mais e os grupos etários de mais idade são os que crescem. Por enquanto, apenas 12% da população brasileira têm 60 anos ou mais, e a idade média de se aposentar no Brasil é de 54 anos. Isso e os benefícios para determinados grupos fizeram com que a previdência virasse um peso enquanto a população brasileira ainda é jovem.
O rombo das aposentadorias é muito maior do que tem sido dito pelo governo. Quando as autoridades falam em déficit de R$ 130 bilhões estão se referindo apenas ao INSS, que cobre o custo de aposentadorias e pensões dos trabalhadores do setor privado. É o mais pesado e o que tem subido mais fortemente. Em 2014, foi de R$ 60 bilhões e mais que dobrou em dois anos. A recessão piorou o quadro porque reduziu a arrecadação.
Para se ter uma noção exata do custo das aposentadorias tem que se somar também o desequilíbrio da previdência dos servidores do setor público federal — que supera R$ 60 bilhões por ano — e mais os déficits dos servidores estaduais. E agora um novo custo do saneamento dos fundos de pensão de estatais, vítimas de erros de gestão e desvios.
Um país em que 88% da população têm até 59 anos não pode estar com um peso previdenciário desta dimensão. É completamente insensato, porque o gasto que for destinado a cobrir as aposentadorias fará falta para despesas como as de educação. O próprio sistema em si tende ao colapso se nada for feito para reequilibrá-lo.
Os que são contra a reforma sustentam que a Previdência precisa de boa gestão, de combate aos privilégios e de cobrar das empresas que não pagam porque sonegam ou têm isenções. É verdade, deve ser feito, mas não é o suficiente. O governo, se quiser convencer as pessoas de que as mudanças são necessárias, precisa combater ralos e privilégios.
A proposta de 70 anos de idade mínima é alta demais, maior do que a adotada atualmente nos Estados Unidos e Alemanha, por exemplo. Porém, o que está sendo formulada é a ideia de que, no futuro, se caminhe para isso diante do aumento da expectativa de vida. E mesmo a idade de 65 anos terá, pelo que está sendo estudado, um período de transição. A este limite se chegará gradativamente.
Por enquanto o governo assustou as pessoas, conversou com quem já tem posição cristalizada contra qualquer mudança, e tentou agradar os que já são favoráveis à reforma, prometendo aprová-la o mais rapidamente possível. Até o momento errou tudo. É preciso ter uma estratégia de convencimento para avançar nesse terreno, que é sempre pedregoso.
Proposta do governo para a Previdência mais assustou do que convenceu. O governo até agora seguiu o melhor roteiro de como não fazer a reforma da previdência: montou um grupo de trabalho grande com destaque para quem já é contra a reforma e anunciou, em pedaços, ideias que aparecem como ameaças às pessoas. O melhor caminho seria o diálogo, mas com a população em geral e não com centrais sindicais que têm opiniões já formatadas.
As notícias saem picadas e parecem péssimas. Primeiro, falou-se na idade mínima de 65 anos para homens e mulheres. Depois, circulou que a idade mínima seria, na verdade, de 70 anos. Redução do valor dos benefícios. Corte em pensões. E foi assim desde a posse de Michel Temer.
É difícil fazer essa reforma, ainda mais num governo interino e dando primeiro as más notícias. Assim não se sai do lugar. A previdência é um pacto de solidariedade entre gerações, no sistema de repartição como no Brasil. Quem está trabalhando contribui para sustentar quem está aposentado. Mas os trabalhadores entendem como se o regime fosse de capitalização, aquele em que a pessoa guarda para si mesmo, faz a sua poupança. Essa diferença, entre o sistema vigente e a impressão que a população tem, torna o diálogo mais difícil. É preciso explicar, mostrar os números, convencer que estamos caminhando para um colapso. Em vários países são feitas sucessivas mudanças no sistema previdenciário porque ele tem que ser sólido, do contrário a ameaça pesa sobre todos.
O mundo inteiro tem idade mínima para aposentadoria, menos o Brasil e outros dois ou três países. Mas Paulinho da Força saiu de uma das reuniões, com ar de autoridade com poder de veto, dizendo: “somos contra a idade mínima”. Para isso seria preciso revogar a demografia. As estatísticas mostram que os brasileiros estão vivendo cada vez mais e os grupos etários de mais idade são os que crescem. Por enquanto, apenas 12% da população brasileira têm 60 anos ou mais, e a idade média de se aposentar no Brasil é de 54 anos. Isso e os benefícios para determinados grupos fizeram com que a previdência virasse um peso enquanto a população brasileira ainda é jovem.
O rombo das aposentadorias é muito maior do que tem sido dito pelo governo. Quando as autoridades falam em déficit de R$ 130 bilhões estão se referindo apenas ao INSS, que cobre o custo de aposentadorias e pensões dos trabalhadores do setor privado. É o mais pesado e o que tem subido mais fortemente. Em 2014, foi de R$ 60 bilhões e mais que dobrou em dois anos. A recessão piorou o quadro porque reduziu a arrecadação.
Para se ter uma noção exata do custo das aposentadorias tem que se somar também o desequilíbrio da previdência dos servidores do setor público federal — que supera R$ 60 bilhões por ano — e mais os déficits dos servidores estaduais. E agora um novo custo do saneamento dos fundos de pensão de estatais, vítimas de erros de gestão e desvios.
Um país em que 88% da população têm até 59 anos não pode estar com um peso previdenciário desta dimensão. É completamente insensato, porque o gasto que for destinado a cobrir as aposentadorias fará falta para despesas como as de educação. O próprio sistema em si tende ao colapso se nada for feito para reequilibrá-lo.
Os que são contra a reforma sustentam que a Previdência precisa de boa gestão, de combate aos privilégios e de cobrar das empresas que não pagam porque sonegam ou têm isenções. É verdade, deve ser feito, mas não é o suficiente. O governo, se quiser convencer as pessoas de que as mudanças são necessárias, precisa combater ralos e privilégios.
A proposta de 70 anos de idade mínima é alta demais, maior do que a adotada atualmente nos Estados Unidos e Alemanha, por exemplo. Porém, o que está sendo formulada é a ideia de que, no futuro, se caminhe para isso diante do aumento da expectativa de vida. E mesmo a idade de 65 anos terá, pelo que está sendo estudado, um período de transição. A este limite se chegará gradativamente.
Por enquanto o governo assustou as pessoas, conversou com quem já tem posição cristalizada contra qualquer mudança, e tentou agradar os que já são favoráveis à reforma, prometendo aprová-la o mais rapidamente possível. Até o momento errou tudo. É preciso ter uma estratégia de convencimento para avançar nesse terreno, que é sempre pedregoso.
É o dólar caindo, caindo - CELSO MING
O ESTADÃO - 30/06
A nova perspectiva de valorização do real tem como fundamento a retomada da confiança na economia
As cotações do dólar mergulharam 10,35% apenas em junho (até esta quarta-feira) e já não se enxerga o fundo da barroca.
É uma situação que começa a exasperar dirigentes da indústria e outros analistas que identificam nesse movimento tendência perigosa a nova temporada de perda de competitividade do setor produtivo. São os mesmos que, no passado, acusaram os governos anteriores de usar e abusar do câmbio como âncora contra a alta de preços.
A nova perspectiva de valorização do real tem como fundamento a retomada da confiança na economia. É menos capital medroso que sai e mais corajoso que entra.
O Banco Central poderia evitar novos tombos do dólar por meio de compras de moeda estrangeira no mercado. No entanto, na entrevista que concedeu na última terça-feira, o novo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, lembrou o distinto público que o regime vigente é de câmbio flutuante e que eventuais intervenções não se farão contra tendências firmes do mercado - serão feitas “com parcimônia”. A informação foi entendida como disposição de deixar que a retomada da confiança e a baixa do dólar, que a ela se seguir, trabalhem a favor da queda da inflação.
Os mais aflitos com mais essa robusta valorização do real argumentam que um dos fatores que mais atraem capitais para cá, especialmente os especulativos - e que assim concorrem para acentuar a baixa da moeda estrangeira -, são os juros excessivamente altos no Brasil. Por enquanto, é um argumento que não encontra respaldo nos fatos. Não há indícios de entrada significativa de capitais que aportem por aqui para ganhar com os juros. As informações mais recentes, divulgadas terça-feira no Relatório de Inflação, mostram que, nos cinco primeiros meses do ano, houve saída líquida (e não entrada líquida) de recursos aplicados em carteira. Foram nada menos que US$ 11,8 bilhões negativos e, pelas projeções do Banco Central, deverão ser de pelo menos US$ 12,8 bilhões, também negativos, ao longo de todo o ano.
A questão de fundo consiste em saber como fica a indústria que aparentemente terá de remar contra mais essa corrente adversa. Essa pergunta não tem resposta fácil. O que se pode dizer é que o câmbio não é a causa da baixa competitividade da indústria brasileira. Ela tem de ser procurada na carga tributária excessiva, nas péssimas condições de infraestrutura, na falta de reformas e na falta de acordos comerciais que lhe deem acesso preferencial a seus produtos. É descabido tentar compensar esse jogo contra apenas com o câmbio, especialmente se esse câmbio supostamente favorável à indústria acabe por acentuar a desarrumação da economia.
A melhor maneira de fortalecer a indústria não é jogo de retranca, mas é garantir solidez aos fundamentos da economia. É o que dará previsibilidade e condições de investimento. Um câmbio artificial teria efeito contrário, porque cria incertezas: a qualquer momento estaria sujeito a enfrentar o realismo da dança das moedas.
CONFIRA:
Continua ruim
O índice de desocupação no Brasil medido pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua manteve-se nos 11,2% no trimestre móvel terminado em maio. É resultado ligeiramente melhor do que o esperado que, no entanto, não deve enganar. As condições do mercado de trabalho ainda não apontam para melhora. Ao contrário, tendem a piorar. Mesmo se a atividade econômica (PIB) voltar a crescer, é improvável que o emprego siga no mesmo ritmo porque o empresário tentará produzir mais ocupando capacidade ociosa, e não aumentando os fatores de produção.
A nova perspectiva de valorização do real tem como fundamento a retomada da confiança na economia
As cotações do dólar mergulharam 10,35% apenas em junho (até esta quarta-feira) e já não se enxerga o fundo da barroca.
É uma situação que começa a exasperar dirigentes da indústria e outros analistas que identificam nesse movimento tendência perigosa a nova temporada de perda de competitividade do setor produtivo. São os mesmos que, no passado, acusaram os governos anteriores de usar e abusar do câmbio como âncora contra a alta de preços.
A nova perspectiva de valorização do real tem como fundamento a retomada da confiança na economia. É menos capital medroso que sai e mais corajoso que entra.
O Banco Central poderia evitar novos tombos do dólar por meio de compras de moeda estrangeira no mercado. No entanto, na entrevista que concedeu na última terça-feira, o novo presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, lembrou o distinto público que o regime vigente é de câmbio flutuante e que eventuais intervenções não se farão contra tendências firmes do mercado - serão feitas “com parcimônia”. A informação foi entendida como disposição de deixar que a retomada da confiança e a baixa do dólar, que a ela se seguir, trabalhem a favor da queda da inflação.
Os mais aflitos com mais essa robusta valorização do real argumentam que um dos fatores que mais atraem capitais para cá, especialmente os especulativos - e que assim concorrem para acentuar a baixa da moeda estrangeira -, são os juros excessivamente altos no Brasil. Por enquanto, é um argumento que não encontra respaldo nos fatos. Não há indícios de entrada significativa de capitais que aportem por aqui para ganhar com os juros. As informações mais recentes, divulgadas terça-feira no Relatório de Inflação, mostram que, nos cinco primeiros meses do ano, houve saída líquida (e não entrada líquida) de recursos aplicados em carteira. Foram nada menos que US$ 11,8 bilhões negativos e, pelas projeções do Banco Central, deverão ser de pelo menos US$ 12,8 bilhões, também negativos, ao longo de todo o ano.
A questão de fundo consiste em saber como fica a indústria que aparentemente terá de remar contra mais essa corrente adversa. Essa pergunta não tem resposta fácil. O que se pode dizer é que o câmbio não é a causa da baixa competitividade da indústria brasileira. Ela tem de ser procurada na carga tributária excessiva, nas péssimas condições de infraestrutura, na falta de reformas e na falta de acordos comerciais que lhe deem acesso preferencial a seus produtos. É descabido tentar compensar esse jogo contra apenas com o câmbio, especialmente se esse câmbio supostamente favorável à indústria acabe por acentuar a desarrumação da economia.
A melhor maneira de fortalecer a indústria não é jogo de retranca, mas é garantir solidez aos fundamentos da economia. É o que dará previsibilidade e condições de investimento. Um câmbio artificial teria efeito contrário, porque cria incertezas: a qualquer momento estaria sujeito a enfrentar o realismo da dança das moedas.
CONFIRA:
Continua ruim
O índice de desocupação no Brasil medido pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua manteve-se nos 11,2% no trimestre móvel terminado em maio. É resultado ligeiramente melhor do que o esperado que, no entanto, não deve enganar. As condições do mercado de trabalho ainda não apontam para melhora. Ao contrário, tendem a piorar. Mesmo se a atividade econômica (PIB) voltar a crescer, é improvável que o emprego siga no mesmo ritmo porque o empresário tentará produzir mais ocupando capacidade ociosa, e não aumentando os fatores de produção.
Quando a virtude não encontra limite - MARIA CRISTINA FERNANDES
VALOR ECONÔMICO - 30/06
É difícil falar mal de uma instituição que tem como principal inimigo público o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas o Ministério Público parece inebriado com a fama e o poder adquiridos em Curitiba.
Os sinais foram captados por Daniela Lima, da 'Folha de S.Paulo', ao revelar que o MP achou por bem abocanhar uma fatia de até 20% dos acordos de leniência celebrados pela força-tarefa. Em resposta, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, que calculou uma arrecadação de R$ 300 milhões a partir dos atuais acordos de colaboração e leniência, disse que os "órgãos de persecução se beneficiariam muito do aporte de recursos para a aquisição de equipamentos e softwares sofisticados, essenciais em investigações modernas e eficientes".
Lima, um dos mais frequentes porta-vozes da força-tarefa, já havia sido informado de que o ministro Teori Zavascki impedira a Procuradoria-Geral da República de replicar cláusula semelhante. A despeito da decisão do ministro do Supremo, os procuradores de Curitiba se veem protegidos pela lei da lavagem de dinheiro e pelo Código Penal que preveem a restituição do butim recuperado à União.
A mesma Constituição que definiu os poderes da República e abrilhantou o Ministério Público preservou o Legislativo como a instância deliberativa do Orçamento da União. É no exercício deste poder que o Congresso, em resposta a uma iniciativa do Executivo, está para chancelar um aumento salarial que premia a casta do funcionalismo, encabeçada pelo Judiciário, num país afundado em desemprego recorde.
Como agem com o termômetro das ruas e nenhuma delas se encheu em protesto contra este reajuste, os procuradores devem ter concluído que os brasileiros concordam em premiá-los pelos bons serviços prestados. Como não se ouviram panelas contra essa apropriação dos recursos devidos à União, é possível que a autonomia da força-tarefa seja vista como o preço a pagar para que o Brasil se livre da chaga da corrupção.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, reconhece a não previsão legal da cláusula adotada em Curitiba, diz ser bem-vinda a aprovação de uma lei que regulamente o repasse, comum em outras instituições, como Ibama ou Detran, mas, em cumprimento de seu dever, sai em defesa dos colegas. A decisão, argumenta, foi homologada pelo juiz Sergio Moro, um dos primeiros, no país, a autorizar que carros apreendidos em operações de combate à lavagem de dinheiro fossem vendidos antes de virarem sucata. O procedimento, depois autorizado pelo Conselho Nacional de Justiça, permitiu que uma parte dos recursos, depositados em contas, fossem destinados à infraestrutura das operações.
Em artigo publicado no ano passado, Wanderley Guilherme dos Santos lembrou que quando as instituições falham, é o caráter que prevalece. Ex-colaborador de governos petistas, na secretaria de Comunicação Social e no BNDES, o pesquisador da Fundação Casa Rui Barbosa, Fábio Kerche se vale da inspiração do cientista político carioca para resgatar a singularidade de um ministério público brasileiro cuja autonomia moldou o caráter de procuradores que hoje só respondem a ruas e panelas.
Autor de "Virtudes e limites: atribuições e autonomia do Ministério Público" (Edusp, 2009), Kerche custou a encontrar em outro lugar uma instituição tão poderosa. Ainda que integre a estrutura do Judiciário, o ministério público na Alemanha, na Espanha e na Holanda tem seu orçamento subordinado ao Ministério da Justiça. Não por acaso, os modelos mais próximos estão nas pátrias inspiradoras da Lava-jato. Na Itália a carreira se confunde com a de juiz, e nos distritos americanos os procuradores são escolhidos diretamente pelo voto, o que leva a uma inflação de ações judiciais em anos eleitorais e a carreiras políticas, como a de Bill Clinton.
Kerche questiona a vigilância exercida pelo Conselho Nacional do Ministério Público, formado majoritariamente por integrantes da carreira, e o modelo de escolha do procurador-geral da República. A Constituição prevê a escolha pelo presidente da República, mandato de dois anos e recondução ilimitada. O último a exercer mais de dois mandatos sem nominação a partir de lista tríplice foi Geraldo Brindeiro, no governo Fernando Henrique Cardoso.
A previsão constitucional, diz Kerche, tanto permite que o procurador aja de olho em seu principal eleitor (o presidente), quanto no seu eleitorado (os pares que elegem a lista tríplice). Advoga que o modelo da lista tenha algum filtro de participação popular para evitar que as promessas corporativas se sobreponham às do interesse público.
O precedente aberto pelo bônus reivindicado pela força-tarefa de Curitiba, exacerba um modelo em que a legitimidade ao Ministério Público se dá em detrimento dos poderes eleitos. Todos os poderes enfrentam restrições orçamentárias, mas aquelas impostas ao Legislativo e ao Executivo limitam o alcance de políticas públicas sem as quais seus representantes não conseguem renovar seus mandatos. O procurador apoia-se na Constituição para determinar, sob aplausos, que um município aumente seus leitos de hospital, enquanto o prefeito é obrigado a cumprir a decisão judicial a despeito de restrições orçamentária para cumprir a decisão judiciais. A definição de prioridades pelo ministério público judicializa a essência da política.
É possível reconhecer a discricionaridade do MP frente a poderes eleitos atados por uma crise fiscal - e moral - sem concordar com retrocessos no combate à corrupção. Em discurso no início da semana, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot comparou os "grilhões do patrimonialismo" àqueles que há 130 anos foram rompidos nas senzalas. Citou Isaac Newton, que viu mais longe porque subiu nos ombros de gigantes. Kerche lhe contrapõe um contemporâneo de Newton, do outro lado do canal da Mancha. É de Charles-Louis de Secondat, que passaria à história como o barão de Montesquieu, o lembrete de que até a virtude precisa de limites.
É difícil falar mal de uma instituição que tem como principal inimigo público o presidente afastado da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas o Ministério Público parece inebriado com a fama e o poder adquiridos em Curitiba.
Os sinais foram captados por Daniela Lima, da 'Folha de S.Paulo', ao revelar que o MP achou por bem abocanhar uma fatia de até 20% dos acordos de leniência celebrados pela força-tarefa. Em resposta, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, que calculou uma arrecadação de R$ 300 milhões a partir dos atuais acordos de colaboração e leniência, disse que os "órgãos de persecução se beneficiariam muito do aporte de recursos para a aquisição de equipamentos e softwares sofisticados, essenciais em investigações modernas e eficientes".
Lima, um dos mais frequentes porta-vozes da força-tarefa, já havia sido informado de que o ministro Teori Zavascki impedira a Procuradoria-Geral da República de replicar cláusula semelhante. A despeito da decisão do ministro do Supremo, os procuradores de Curitiba se veem protegidos pela lei da lavagem de dinheiro e pelo Código Penal que preveem a restituição do butim recuperado à União.
A mesma Constituição que definiu os poderes da República e abrilhantou o Ministério Público preservou o Legislativo como a instância deliberativa do Orçamento da União. É no exercício deste poder que o Congresso, em resposta a uma iniciativa do Executivo, está para chancelar um aumento salarial que premia a casta do funcionalismo, encabeçada pelo Judiciário, num país afundado em desemprego recorde.
Como agem com o termômetro das ruas e nenhuma delas se encheu em protesto contra este reajuste, os procuradores devem ter concluído que os brasileiros concordam em premiá-los pelos bons serviços prestados. Como não se ouviram panelas contra essa apropriação dos recursos devidos à União, é possível que a autonomia da força-tarefa seja vista como o preço a pagar para que o Brasil se livre da chaga da corrupção.
O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti, reconhece a não previsão legal da cláusula adotada em Curitiba, diz ser bem-vinda a aprovação de uma lei que regulamente o repasse, comum em outras instituições, como Ibama ou Detran, mas, em cumprimento de seu dever, sai em defesa dos colegas. A decisão, argumenta, foi homologada pelo juiz Sergio Moro, um dos primeiros, no país, a autorizar que carros apreendidos em operações de combate à lavagem de dinheiro fossem vendidos antes de virarem sucata. O procedimento, depois autorizado pelo Conselho Nacional de Justiça, permitiu que uma parte dos recursos, depositados em contas, fossem destinados à infraestrutura das operações.
Em artigo publicado no ano passado, Wanderley Guilherme dos Santos lembrou que quando as instituições falham, é o caráter que prevalece. Ex-colaborador de governos petistas, na secretaria de Comunicação Social e no BNDES, o pesquisador da Fundação Casa Rui Barbosa, Fábio Kerche se vale da inspiração do cientista político carioca para resgatar a singularidade de um ministério público brasileiro cuja autonomia moldou o caráter de procuradores que hoje só respondem a ruas e panelas.
Autor de "Virtudes e limites: atribuições e autonomia do Ministério Público" (Edusp, 2009), Kerche custou a encontrar em outro lugar uma instituição tão poderosa. Ainda que integre a estrutura do Judiciário, o ministério público na Alemanha, na Espanha e na Holanda tem seu orçamento subordinado ao Ministério da Justiça. Não por acaso, os modelos mais próximos estão nas pátrias inspiradoras da Lava-jato. Na Itália a carreira se confunde com a de juiz, e nos distritos americanos os procuradores são escolhidos diretamente pelo voto, o que leva a uma inflação de ações judiciais em anos eleitorais e a carreiras políticas, como a de Bill Clinton.
Kerche questiona a vigilância exercida pelo Conselho Nacional do Ministério Público, formado majoritariamente por integrantes da carreira, e o modelo de escolha do procurador-geral da República. A Constituição prevê a escolha pelo presidente da República, mandato de dois anos e recondução ilimitada. O último a exercer mais de dois mandatos sem nominação a partir de lista tríplice foi Geraldo Brindeiro, no governo Fernando Henrique Cardoso.
A previsão constitucional, diz Kerche, tanto permite que o procurador aja de olho em seu principal eleitor (o presidente), quanto no seu eleitorado (os pares que elegem a lista tríplice). Advoga que o modelo da lista tenha algum filtro de participação popular para evitar que as promessas corporativas se sobreponham às do interesse público.
O precedente aberto pelo bônus reivindicado pela força-tarefa de Curitiba, exacerba um modelo em que a legitimidade ao Ministério Público se dá em detrimento dos poderes eleitos. Todos os poderes enfrentam restrições orçamentárias, mas aquelas impostas ao Legislativo e ao Executivo limitam o alcance de políticas públicas sem as quais seus representantes não conseguem renovar seus mandatos. O procurador apoia-se na Constituição para determinar, sob aplausos, que um município aumente seus leitos de hospital, enquanto o prefeito é obrigado a cumprir a decisão judicial a despeito de restrições orçamentária para cumprir a decisão judiciais. A definição de prioridades pelo ministério público judicializa a essência da política.
É possível reconhecer a discricionaridade do MP frente a poderes eleitos atados por uma crise fiscal - e moral - sem concordar com retrocessos no combate à corrupção. Em discurso no início da semana, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot comparou os "grilhões do patrimonialismo" àqueles que há 130 anos foram rompidos nas senzalas. Citou Isaac Newton, que viu mais longe porque subiu nos ombros de gigantes. Kerche lhe contrapõe um contemporâneo de Newton, do outro lado do canal da Mancha. É de Charles-Louis de Secondat, que passaria à história como o barão de Montesquieu, o lembrete de que até a virtude precisa de limites.
Falência da política - CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP - 30/06
Cartazes a favor da saída britânica da União Europeia são colocados em prédio de Redcar, na Inglaterra
Na manifestação da terça (28) contra o Brexit, diante do Parlamento britânico, um jovem carregava um cartaz tosco mas eloquente: "Políticos são como espermatozoide. Um em um milhão vira [ser] humano".
Não creio que ganhe um Nobel de Biologia, mas seguramente é candidato a aplausos de uma parte considerável da humanidade.
Se já havia desconfiança universal em relação aos políticos, o Brexit, a saída britânica da da União Europeia, levou-a ao paroxismo. Prova-o coluna de Ellie Mae O'Hagan (Centro para Estudos Sociais e do Trabalho) em "The Guardian": "Não há nada como uma crise constitucional para expor o que só pode ser descrito com a abjeta porcaria de nossa classe política".
Bem-vinda ao clube, Ellie: há três meses, o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima (Lava Jato) já dissera que o o sistema político-partidário brasileiro está "apodrecido". É uma "porcaria" ou apodreceu porque se abriu insanável brecha entre representantes e representados. Aliás, suspeito que estes até se ofendem quando dizem que são representados por essa classe política.
No Reino Unido, o Brexit tornou a brecha uma fratura exposta: os líderes dos três grandes partidos (Conservador, Trabalhista e Liberal-Democrata) fizeram campanha pela permanência na União Europeia e não foram ouvidos pela maioria.
Na verdade, a fratura vai além da política: a elite britânica, na economia e na academia, também era majoritariamente pela permanência. Basta dizer que uma pesquisa interna do grupo de lobby "TheCityUK" previa que 84% da City, o coração financeiro do Reino Unido e da Europa, votaria contra o Brexit.
É tão imensa a brecha que James Traub, pesquisador do Centro para a Cooperação Internacional, ousou desafiar o politicamente correto, em artigo desta quarta (29) para o sítio da "Foreign Policy", cujo título diz tudo: "É tempo de as elites se rebelarem contra as massas ignorantes".
Forte, não? Na verdade, o artigo é um grito contra demagogos como Donald Trump, por exemplo, que vendem tolices e/ou mentiras que são compradas pelos "ignorantes", que acabam votando por disparates como o Brexit.
Suspeito que o problema é um pouco mais complexo e tem a ver com o funcionamento da democracia, ainda o pior dos regimes fora todos os outros, para citar Winston Churchill (1874-1965).
Trata-se do que Mark Blyth, professor de Economia Política na Brown University, chama de "tensão inerente entre capitalismo e políticas democráticas: capitalismo aloca recursos por meio dos mercados, enquanto a democracia aloca poder por meio do voto".
É um tema que Delfim Netto tem tocado com alguma frequência no seu espaço na Folha, como o fez, aliás, nesta quarta (29).
Nos anos mais recentes, essa tensão se resolveu da seguinte maneira, segundo Blyth: "Hoje, os mercados de capitais e os capitalistas estabelecem as regras que governos democráticos têm que seguir".
O que parece que está acontecendo no mundo todo é uma reação contra essa dominação, na base mais de sentimentos do que de informação.
O muro de Dover - DEMÉTRIO MAGNOLI
O GLOBO - 30/06
Um Reino Desunido e uma Pequena Inglaterra insular surgem como frutos prováveis do Brexit
Um muro caiu em Berlim e, então, um outro foi erigido em Dover. O Brexit será descrito assim nos futuros manuais de História. As falésias brancas de Dover, formações calcárias riscadas por quartzitos, erguem-se mais de cem metros acima das águas do Canal da Mancha, que os separam de Calais, na França. Na evacuação de Dunquerque, final de maio de 1940, 340 mil soldados britânicos e franceses atravessaram o estreito, rumo a Dover, sob assédio das forças alemãs. Mais de meio século depois, a inauguração do Eurotúnel, que corta os arredores de Dover, simbolizou a união entre as Ilhas Britânicas e a Europa continental, cujo arcabouço geopolítico estabelecera-se em 1973, com o ingresso britânico no que hoje se chama União Europeia (UE). O Brexit, um ato de destruição, essa Dunquerque imposta pela democracia, é um golpe contra a ordem mundial criada no pós-guerra.
O plebiscito do Brexit não era necessário, pois a polêmica sobre a UE tinha escassa ressonância fora das fileiras do Partido Conservador. A solução plebiscitária decorreu de uma aposta irresponsável do primeiro-ministro David Cameron, como um golpe fatal contra a corrente eurocética de seu partido. No lugar disso, Cameron colheu uma derrota pessoal definitiva, uma duradoura cisão entre os conservadores, a ascensão da direita xenófoba agrupada no Ukip e o espectro da dissolução do próprio Reino Unido.
Dois anos atrás, os eleitores escoceses rejeitaram a opção separatista justamente para permanecer na UE. O Brexit significa que, por terem votado daquele modo, sairão da UE junto com o Reino Unido. No horizonte imediato, assoma um novo plebiscito sobre a independência escocesa, no qual a cisão com o Reino Unido aparecerá como único caminho para seguir na UE. Um Reino Desunido e uma Pequena Inglaterra insular surgem como frutos prováveis do Brexit.
Mas a Escócia é só um lado do problema. Na margem oposta do Canal do Norte, o Brexit coloca em risco a estrutura de estabilidade na Irlanda do Norte. O Acordo da Páscoa, de 1998, encerrou o conflito entre protestantes (unionistas) e católicos (nacionalistas), ligando a Irlanda britânica à República da Irlanda por instituições supranacionais apoiadas sobre a cidadania europeia comum e o livre fluxo de bens e pessoas. O pilar oculto do acordo tende a desaparecer com o Brexit, que produzirá uma “fronteira dura” entre as Irlandas e converterá os católicos da Irlanda do Norte em estrangeiros na Irlanda do Sul.
Atrás do resultado do plebiscito, espreita uma “excepcionalidade inglesa” incrustada no passado distante. Os defensores do Brexit insistiram na ideia de “recuperar o controle”, tocando no nervo sensível do conceito de soberania. Desde a Magna Carta, a Inglaterra elaborou uma identidade política organizada em torno de um foco único de soberania, que é o Parlamento. Na Europa continental, em contraste, a autoridade política dividiu-se em complexas camadas superpostas, entrelaçando ducados, principados e reinos. A submissão parcial do Parlamento nacional a Bruxelas — isto é, às instituições europeias — nada tem de chocante na experiência histórica alemã, mas representa uma anomalia para os ingleses. Nesse sentido, é temerário prever que o Brexit produza efeitos em cascata, derrubando uma a uma as peças que formam a coleção da UE.
A “história profunda” conta, mas existe a história recente. O projeto da unidade europeia recebeu impulso decisivo do “fator Stalin”, ou seja, da percepção de que a URSS representava uma ameaça existencial às democracias ocidentais. O Tratado de Paris de 1951, ponto de partida da aventura europeia, foi firmado apenas dois anos depois do Tratado do Atlântico Norte, que criou a Otan e conectou aos EUA o destino geopolítico da Europa Ocidental. A Otan, por sua vez, nasceu no berço da primeira grande crise da Guerra Fria: a bipartição da Alemanha em dois Estados. “Europa”, na Guerra Fria, significava uma fortaleza protegida pelos mísseis americanos e pelas instituições supranacionais da Comunidade Europeia. O Reino Unido, que ingressou nessa fortaleza sob a dupla pressão de Washington e do desmantelamento do Império Britânico, decide abandoná-la quando já não mais existe a ameaça original.
O muro de Dover será construído com os materiais de entulho do finado Muro de Berlim. No canteiro de obras, ecoarão canções nostálgicas sobre o Parlamento e o Império, bem como invocações odientas contra os imigrantes. O Brexit, apesar de tudo, exprime algo mais que o “excepcionalismo inglês” — e, por isso, foi celebrado na outra margem do Canal da Mancha por um cortejo de partidos nacionalistas. “Para aqueles que disseram que tudo é irreversível, que a UE é irreversível, o povo britânico mostrou o caminho da saída”, comemorou Marine Le Pen, a líder da Frente Nacional, candidata à Presidência francesa nas eleições de 2017. Na longa sombra das falésias de Dover, movem-se os representantes de uma outra Europa, eclipsada desde o pós-guerra mas que nunca desapareceu.
Boris Johnson, o chefe conservador da campanha do Brexit, já parece arrependido de seu triunfo, como tantos britânicos que votaram pela saída. Pateticamente, ele anunciou uma “intensificação” da cooperação do Reino Unido com a Europa, como se os cacos pudessem ser colados, restaurando a taça estilhaçada. Johnson entendeu errado: o lugar no pódio não é dele, mas de Nigel Farage, o líder dos ultranacionalistas do Ukip. O plebiscito provou, para júbilo de Vladimir Putin, que tudo é reversível, inclusive a UE.
“O fato de que a fragmentação não é mais inimaginável deve gravemente nos preocupar a todos”. Jeanine Hennis-Plasschaert, a ministra da Defesa da Holanda, entendeu certo. Dover é sobre o Reino Unido, mas também sobre o futuro da Europa e a integridade dos valores políticos que propiciaram a reconstrução do Ocidente depois da maior catástrofe do século XX.
Demétrio Magnoli é sociólogo
Um Reino Desunido e uma Pequena Inglaterra insular surgem como frutos prováveis do Brexit
Um muro caiu em Berlim e, então, um outro foi erigido em Dover. O Brexit será descrito assim nos futuros manuais de História. As falésias brancas de Dover, formações calcárias riscadas por quartzitos, erguem-se mais de cem metros acima das águas do Canal da Mancha, que os separam de Calais, na França. Na evacuação de Dunquerque, final de maio de 1940, 340 mil soldados britânicos e franceses atravessaram o estreito, rumo a Dover, sob assédio das forças alemãs. Mais de meio século depois, a inauguração do Eurotúnel, que corta os arredores de Dover, simbolizou a união entre as Ilhas Britânicas e a Europa continental, cujo arcabouço geopolítico estabelecera-se em 1973, com o ingresso britânico no que hoje se chama União Europeia (UE). O Brexit, um ato de destruição, essa Dunquerque imposta pela democracia, é um golpe contra a ordem mundial criada no pós-guerra.
O plebiscito do Brexit não era necessário, pois a polêmica sobre a UE tinha escassa ressonância fora das fileiras do Partido Conservador. A solução plebiscitária decorreu de uma aposta irresponsável do primeiro-ministro David Cameron, como um golpe fatal contra a corrente eurocética de seu partido. No lugar disso, Cameron colheu uma derrota pessoal definitiva, uma duradoura cisão entre os conservadores, a ascensão da direita xenófoba agrupada no Ukip e o espectro da dissolução do próprio Reino Unido.
Dois anos atrás, os eleitores escoceses rejeitaram a opção separatista justamente para permanecer na UE. O Brexit significa que, por terem votado daquele modo, sairão da UE junto com o Reino Unido. No horizonte imediato, assoma um novo plebiscito sobre a independência escocesa, no qual a cisão com o Reino Unido aparecerá como único caminho para seguir na UE. Um Reino Desunido e uma Pequena Inglaterra insular surgem como frutos prováveis do Brexit.
Mas a Escócia é só um lado do problema. Na margem oposta do Canal do Norte, o Brexit coloca em risco a estrutura de estabilidade na Irlanda do Norte. O Acordo da Páscoa, de 1998, encerrou o conflito entre protestantes (unionistas) e católicos (nacionalistas), ligando a Irlanda britânica à República da Irlanda por instituições supranacionais apoiadas sobre a cidadania europeia comum e o livre fluxo de bens e pessoas. O pilar oculto do acordo tende a desaparecer com o Brexit, que produzirá uma “fronteira dura” entre as Irlandas e converterá os católicos da Irlanda do Norte em estrangeiros na Irlanda do Sul.
Atrás do resultado do plebiscito, espreita uma “excepcionalidade inglesa” incrustada no passado distante. Os defensores do Brexit insistiram na ideia de “recuperar o controle”, tocando no nervo sensível do conceito de soberania. Desde a Magna Carta, a Inglaterra elaborou uma identidade política organizada em torno de um foco único de soberania, que é o Parlamento. Na Europa continental, em contraste, a autoridade política dividiu-se em complexas camadas superpostas, entrelaçando ducados, principados e reinos. A submissão parcial do Parlamento nacional a Bruxelas — isto é, às instituições europeias — nada tem de chocante na experiência histórica alemã, mas representa uma anomalia para os ingleses. Nesse sentido, é temerário prever que o Brexit produza efeitos em cascata, derrubando uma a uma as peças que formam a coleção da UE.
A “história profunda” conta, mas existe a história recente. O projeto da unidade europeia recebeu impulso decisivo do “fator Stalin”, ou seja, da percepção de que a URSS representava uma ameaça existencial às democracias ocidentais. O Tratado de Paris de 1951, ponto de partida da aventura europeia, foi firmado apenas dois anos depois do Tratado do Atlântico Norte, que criou a Otan e conectou aos EUA o destino geopolítico da Europa Ocidental. A Otan, por sua vez, nasceu no berço da primeira grande crise da Guerra Fria: a bipartição da Alemanha em dois Estados. “Europa”, na Guerra Fria, significava uma fortaleza protegida pelos mísseis americanos e pelas instituições supranacionais da Comunidade Europeia. O Reino Unido, que ingressou nessa fortaleza sob a dupla pressão de Washington e do desmantelamento do Império Britânico, decide abandoná-la quando já não mais existe a ameaça original.
O muro de Dover será construído com os materiais de entulho do finado Muro de Berlim. No canteiro de obras, ecoarão canções nostálgicas sobre o Parlamento e o Império, bem como invocações odientas contra os imigrantes. O Brexit, apesar de tudo, exprime algo mais que o “excepcionalismo inglês” — e, por isso, foi celebrado na outra margem do Canal da Mancha por um cortejo de partidos nacionalistas. “Para aqueles que disseram que tudo é irreversível, que a UE é irreversível, o povo britânico mostrou o caminho da saída”, comemorou Marine Le Pen, a líder da Frente Nacional, candidata à Presidência francesa nas eleições de 2017. Na longa sombra das falésias de Dover, movem-se os representantes de uma outra Europa, eclipsada desde o pós-guerra mas que nunca desapareceu.
Boris Johnson, o chefe conservador da campanha do Brexit, já parece arrependido de seu triunfo, como tantos britânicos que votaram pela saída. Pateticamente, ele anunciou uma “intensificação” da cooperação do Reino Unido com a Europa, como se os cacos pudessem ser colados, restaurando a taça estilhaçada. Johnson entendeu errado: o lugar no pódio não é dele, mas de Nigel Farage, o líder dos ultranacionalistas do Ukip. O plebiscito provou, para júbilo de Vladimir Putin, que tudo é reversível, inclusive a UE.
“O fato de que a fragmentação não é mais inimaginável deve gravemente nos preocupar a todos”. Jeanine Hennis-Plasschaert, a ministra da Defesa da Holanda, entendeu certo. Dover é sobre o Reino Unido, mas também sobre o futuro da Europa e a integridade dos valores políticos que propiciaram a reconstrução do Ocidente depois da maior catástrofe do século XX.
Demétrio Magnoli é sociólogo
O sonho da TV pública acabou? - NELSON HOINEFF
O GLOBO - 30/06
Criação da EBC foi bela conquista política, mas, no momento seguinte, ficou claro que não havia a mínima intenção de colocar em prática tudo o que havia sido prometido
A manchete do GLOBO desta segunda-feira mostra que as estatais contrataram 56 mil servidores em quatro anos e revela um dado estarrecedor sobre a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Seu número de funcionários cresceu nada menos que 180%; foi de 913 para 2.564.
A EBC é a controladora da TV Brasil, também conhecida por TV Lula, que, desde sua criação, há nove anos, não apenas não conquistou um ponto sequer de audiência, como deixou de cumprir ou mesmo de estabelecer metas artísticas, criativas ou de qualquer natureza televisiva.
A título de comparação, vale a pena lembrar que a Rede Bandeirantes, uma das mais modernas do país, tem menos de quatro mil funcionários. E que a Rede Globo, uma das cinco maiores do mundo, tem cerca de 18 mil.
O governo Temer, que vem ameaçando extinguir a empresa desde que o presidente interino se viu impedido de substituir um diretor, ganha agora forte munição para isso. Os opositores do atual governo despejam na opinião pública frases de efeito como “Temer quer destruir a TV pública”, quando, na verdade, o quadro é o oposto.
Logo no início do primeiro governo Lula, o PT criou inéditas condições políticas para que o país investisse meio bilhão de reais na formação de uma rede pública de TV. O governo acenava para algo que era verdadeiro: a necessidade de se construir uma televisão pública forte, que trafegasse lado a lado com a poderosa estrutura da TV privada do país. Alavancou para isso pelo menos dois grandes seminários nacionais — um no Rio, outro em Brasília — onde especialistas do Brasil e do mundo debateram os valores de uma televisão gerida pela sociedade e a conveniência da medida.
A criação da EBC foi uma bela conquista política, mas, no momento seguinte, ficou claro que não havia a mínima intenção de colocar em prática tudo o que havia sido prometido. Seminários e o desfile de nobres intenções eram apenas a máscara para a construção de mais uma estatal voltada para o aparelhamento, o empreguismo e o desperdício de dinheiro público.
Tudo isso é quase nada em comparação com a ética desse engodo; com o que representou a mobilização da consciência da sociedade brasileira em torno da necessidade de se criar uma TV pública, imediatamente derrubada pela revelação do que efetivamente se estava fazendo. Foi, portanto, o PT, e não o governo Temer, que destruiu a televisão pública no Brasil — e não há dinheiro que pague isso.
Dos quase três mil funcionários que hoje são pagos pelo contribuinte, contam-se nos dedos os que foram instruídos para moldar uma TV capaz de criar, ousar, retornar de alguma forma à sociedade aquilo que ela está gastando. A uma televisão privada que é respeitada em todo o mundo, a TV pública brasileira sequer procurou agregar um frame de inovação. E se tivesse agregado, isso não seria percebido. A TV Brasil até hoje não entra em São Paulo e, no Rio, o sinal para as operadoras de cabo ainda é enviado por VHF — razão pela qual é provavelmente a única emissora do mundo que chega aos usuários de TV por assinatura com fantasmas, ruídos e outras imperfeições típicas da TV aberta dos anos 80.
Por ironia, o bom exemplo está na porta do vizinho. Em São Paulo, a TV Cultura desenvolve hoje uma das melhores programações do país, com um jornalismo — através de programas como o “Jornal da Cultura” e o “Roda Viva”, por exemplo — que nada deixa a dever às melhores televisões públicas do mundo.
Ainda assim, a virtual extinção da EBC não representaria apenas o fechamento de mais uma empresa corrompida. Poderia ser o sepultamento de um sonho bom que, ainda com más intenções, foi propagado quando o primeiro governo petista ainda tinha um imenso aval popular. Este é um ativo que o governo tem como preservar. O desafio agora consiste em apagar o que foi feito e, ainda assim, manter a ideia de uma TV pública de verdade — o que é muito maior que simples políticas viciosas. Empresas podem morrer; utopias, não.
Nelson Hoineff é jornalista, diretor de TV e presidente do Instituto de Estudos de Televisão
* NOTA DO BLOG
Criação da EBC foi bela conquista política, mas, no momento seguinte, ficou claro que não havia a mínima intenção de colocar em prática tudo o que havia sido prometido
A manchete do GLOBO desta segunda-feira mostra que as estatais contrataram 56 mil servidores em quatro anos e revela um dado estarrecedor sobre a Empresa Brasil de Comunicação (EBC). Seu número de funcionários cresceu nada menos que 180%; foi de 913 para 2.564.
A EBC é a controladora da TV Brasil, também conhecida por TV Lula, que, desde sua criação, há nove anos, não apenas não conquistou um ponto sequer de audiência, como deixou de cumprir ou mesmo de estabelecer metas artísticas, criativas ou de qualquer natureza televisiva.
A título de comparação, vale a pena lembrar que a Rede Bandeirantes, uma das mais modernas do país, tem menos de quatro mil funcionários. E que a Rede Globo, uma das cinco maiores do mundo, tem cerca de 18 mil.
O governo Temer, que vem ameaçando extinguir a empresa desde que o presidente interino se viu impedido de substituir um diretor, ganha agora forte munição para isso. Os opositores do atual governo despejam na opinião pública frases de efeito como “Temer quer destruir a TV pública”, quando, na verdade, o quadro é o oposto.
Logo no início do primeiro governo Lula, o PT criou inéditas condições políticas para que o país investisse meio bilhão de reais na formação de uma rede pública de TV. O governo acenava para algo que era verdadeiro: a necessidade de se construir uma televisão pública forte, que trafegasse lado a lado com a poderosa estrutura da TV privada do país. Alavancou para isso pelo menos dois grandes seminários nacionais — um no Rio, outro em Brasília — onde especialistas do Brasil e do mundo debateram os valores de uma televisão gerida pela sociedade e a conveniência da medida.
A criação da EBC foi uma bela conquista política, mas, no momento seguinte, ficou claro que não havia a mínima intenção de colocar em prática tudo o que havia sido prometido. Seminários e o desfile de nobres intenções eram apenas a máscara para a construção de mais uma estatal voltada para o aparelhamento, o empreguismo e o desperdício de dinheiro público.
Tudo isso é quase nada em comparação com a ética desse engodo; com o que representou a mobilização da consciência da sociedade brasileira em torno da necessidade de se criar uma TV pública, imediatamente derrubada pela revelação do que efetivamente se estava fazendo. Foi, portanto, o PT, e não o governo Temer, que destruiu a televisão pública no Brasil — e não há dinheiro que pague isso.
Dos quase três mil funcionários que hoje são pagos pelo contribuinte, contam-se nos dedos os que foram instruídos para moldar uma TV capaz de criar, ousar, retornar de alguma forma à sociedade aquilo que ela está gastando. A uma televisão privada que é respeitada em todo o mundo, a TV pública brasileira sequer procurou agregar um frame de inovação. E se tivesse agregado, isso não seria percebido. A TV Brasil até hoje não entra em São Paulo e, no Rio, o sinal para as operadoras de cabo ainda é enviado por VHF — razão pela qual é provavelmente a única emissora do mundo que chega aos usuários de TV por assinatura com fantasmas, ruídos e outras imperfeições típicas da TV aberta dos anos 80.
Por ironia, o bom exemplo está na porta do vizinho. Em São Paulo, a TV Cultura desenvolve hoje uma das melhores programações do país, com um jornalismo — através de programas como o “Jornal da Cultura” e o “Roda Viva”, por exemplo — que nada deixa a dever às melhores televisões públicas do mundo.
Ainda assim, a virtual extinção da EBC não representaria apenas o fechamento de mais uma empresa corrompida. Poderia ser o sepultamento de um sonho bom que, ainda com más intenções, foi propagado quando o primeiro governo petista ainda tinha um imenso aval popular. Este é um ativo que o governo tem como preservar. O desafio agora consiste em apagar o que foi feito e, ainda assim, manter a ideia de uma TV pública de verdade — o que é muito maior que simples políticas viciosas. Empresas podem morrer; utopias, não.
Nelson Hoineff é jornalista, diretor de TV e presidente do Instituto de Estudos de Televisão
* NOTA DO BLOG
Essa porcaria tem que fechar, o Brasil não precisa desse cabide de emprego para os apaniguados de plantão.
Boca-livre – EDITORIAL FOLHA DE SP
Folha de SP - 30/06
Cada vez mais, felizmente, verifica-se que as investigações da Operação Lava Jato vão deixando de constituir um ponto fora da curva no combate à corrupção no país.
Registraram-se, recentemente, iniciativas da Polícia Federal fora do âmbito do chamado petrolão, em casos como o das contas de campanha de Eduardo Campos (PSB), morto em 2014, e o da Operação Custo Brasil —que levou o ex-ministro petista Paulo Bernardo a ser preso por seis dias.
Numa ação conjunta da PF em São Paulo, no Rio e em Brasília, abre-se agora a caixa-preta das irregularidades na Lei Rouanet. Segundo os investigadores da Operação Boca-Livre, armara-se desde 2001 um esquema destinado a obter vantagens dos mecanismos de isenção tributária previstos na legislação de incentivo à cultura.
Ao longo desse período, cerca de R$ 180 milhões teriam sido desviados em benefício de atividades estranhas aos projetos originais.
No exemplo mais gritante, uma cerimônia de casamento numa praia em Florianópolis foi financiada com recursos oficialmente destinados a atividades culturais.
O noivo era o herdeiro de um grupo empresarial especializado em conseguir a benesse tributária, com atuação no Ministério da Cultura e na Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo.
Apresentações musicais para público de baixa renda eram irregularmente substituídas por shows de interesse privado, como os que, segundo a PF, serviram para entretenimento de convidados de um escritório de advocacia ou de uma empresa de produtos químicos.
Tudo, repita-se, financiado por isenções de impostos: o que equivale a dizer que provinha do conjunto da população brasileira o pagamento de tertúlias voltadas ao deleite de alguns convivas.
O escândalo coincide com uma crescente onda de críticas ao funcionamento da Lei Rouanet, instrumento que sem dúvida necessita de urgente aprimoramento.
O sistema de renúncia fiscal para incentivo à cultura não se confunde, entretanto, com uma fraude em que não se incentivou a cultura, e sim o puro proveito privado.
Por ausência de fiscalização, projetos em tese meritórios —como a distribuição de livros à população carente— financiaram publicações de cortesia para clientes de empresas ou a biografia de um empresário que, com isso, liberava-se de pagar parte de seus impostos.
Abusos desse tipo haverão de se ter multiplicado ao longo da vigência da Lei Rouanet. Cabe revisá-la em seus critérios e amplitudes, mas nenhuma modificação terá eficácia se faltar a fiscalização adequada —e, sempre que necessário, a pronta punição dos corruptos.
Cada vez mais, felizmente, verifica-se que as investigações da Operação Lava Jato vão deixando de constituir um ponto fora da curva no combate à corrupção no país.
Registraram-se, recentemente, iniciativas da Polícia Federal fora do âmbito do chamado petrolão, em casos como o das contas de campanha de Eduardo Campos (PSB), morto em 2014, e o da Operação Custo Brasil —que levou o ex-ministro petista Paulo Bernardo a ser preso por seis dias.
Numa ação conjunta da PF em São Paulo, no Rio e em Brasília, abre-se agora a caixa-preta das irregularidades na Lei Rouanet. Segundo os investigadores da Operação Boca-Livre, armara-se desde 2001 um esquema destinado a obter vantagens dos mecanismos de isenção tributária previstos na legislação de incentivo à cultura.
Ao longo desse período, cerca de R$ 180 milhões teriam sido desviados em benefício de atividades estranhas aos projetos originais.
No exemplo mais gritante, uma cerimônia de casamento numa praia em Florianópolis foi financiada com recursos oficialmente destinados a atividades culturais.
O noivo era o herdeiro de um grupo empresarial especializado em conseguir a benesse tributária, com atuação no Ministério da Cultura e na Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo.
Apresentações musicais para público de baixa renda eram irregularmente substituídas por shows de interesse privado, como os que, segundo a PF, serviram para entretenimento de convidados de um escritório de advocacia ou de uma empresa de produtos químicos.
Tudo, repita-se, financiado por isenções de impostos: o que equivale a dizer que provinha do conjunto da população brasileira o pagamento de tertúlias voltadas ao deleite de alguns convivas.
O escândalo coincide com uma crescente onda de críticas ao funcionamento da Lei Rouanet, instrumento que sem dúvida necessita de urgente aprimoramento.
O sistema de renúncia fiscal para incentivo à cultura não se confunde, entretanto, com uma fraude em que não se incentivou a cultura, e sim o puro proveito privado.
Por ausência de fiscalização, projetos em tese meritórios —como a distribuição de livros à população carente— financiaram publicações de cortesia para clientes de empresas ou a biografia de um empresário que, com isso, liberava-se de pagar parte de seus impostos.
Abusos desse tipo haverão de se ter multiplicado ao longo da vigência da Lei Rouanet. Cabe revisá-la em seus critérios e amplitudes, mas nenhuma modificação terá eficácia se faltar a fiscalização adequada —e, sempre que necessário, a pronta punição dos corruptos.
O Judiciário mais caro do mundo - REIS FRIEDE
O Estado de S. Paulo - 30/06
O Poder Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo. Segundo dados consubstanciados por Luciano da Ros, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em estudo intitulado O Custo da Justiça no Brasil, com exceção de El Salvador, com expressivos 1,35% do PIB, o Brasil tem o Judiciário mais dispendioso do mundo, com gastos (em 2014) na ordem de R$ 68,4 bilhões (1,2% do PIB), em comparação com os EUA (0,14% do PIB), a Itália (0,19% do PIB) e a Alemanha (0,32% do PIB). Portanto, nas olimpíadas judiciais nosso país tem grandes chances de subir ao pódio.
Sem correspondente em nenhuma parte do planeta, o valor despendido com o Poder Judiciário guarda proximidade com o que foi gasto com as Forças Armadas no mesmo ano (R$ 74,4 bilhões, ou 1,4% do PIB). Tal cenário se reproduz em relação ao efetivo empregado nas duas instituições. De acordo com o Relatório Justiça em Números/2015, o Judiciário tinha, em 2014, 278,7 mil servidores (efetivos, requisitados, cedidos de outros órgãos e comissionados sem vínculo efetivo), além de 139,3 mil trabalhadores auxiliares (terceirizados, estagiários, conciliadores, juízes leigos), totalizando 418 mil pessoas. Isso sem computar o número de cargos (previstos) de juízes, da ordem de 22,5 mil. Por sua vez, o efetivo das Forças Armadas atingiu, em 2014, cerca de 330 mil servidores.
Mesmo ostentando esses números hiperbólicos, a prestação da tutela jurisdicional, no Brasil, é uma das mais morosas do mundo, refletindo a ineficiência do Estado como prestador de serviços públicos. Afinal, no Brasil a criança educação ainda tenta alfabetizar-se, a jovem saúde respira por aparelhos, a senhora segurança pública sente-se atemorizada e o senhor serviço judiciário, após esperar tantos anos por uma decisão judicial, faleceu sem receber o bem da vida.
Malgrado as tentativas de combater o problema, o insucesso tem sido evidente, notadamente porque são atacadas as consequências, quando o foco deveria ser as causas. Apenas para ilustrar o que se afirma, apesar do estratosférico número de 105 milhões de ações em tramitação no País, os juízes, na verdade, têm muitos processos cuja temática é repetida, restando aos magistrados o absurdo de decidir quase que uma a uma, algo que o novo Código de Processo Civil, por meio do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), busca, de forma muito tímida e burocrática, debelar.
Portanto, é preciso implantar, cada vez mais, instrumentos que tornem viável a reunião de processos em um único julgador, tais como o instituto da afinidade, em adição à conexão e à continência, e também ressuscitar figuras análogas à antiga avocatória, de modo a permitir que o Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, possa decidir de uma única vez questões que sejam comuns aos cidadãos brasileiros.
Com efeito, ações que tenham o mesmo fato motivador do pedido e a mesma causa de pedir devem ser julgadas por meio de um único ato decisório, medida que acarretará não apenas economia processual, mas uma verdadeira racionalização do trabalho, melhorando a eficiência operacional do Judiciário. Tal expediente impedirá que diversos magistrados julguem casos idênticos, o que não raro ocasiona interpretações variadas sobre o mesmo tema, problema que, cabe reconhecer, decorre do hábito de alguns juízes de imporem uma particular visão de justiça, em detrimento da correta hermenêutica na aplicação da lei, causando inflação interpretativa. Ao contrário, a diversidade de soluções adotadas por diversos juízes para a mesma questão acaba por causar perplexidade no jurisdicionado, que não consegue entender como uma interpretação pode ser absolutamente contrária à outra, se o que se postula em juízo é exatamente o mesmo.
Na Justiça Federal, em particular, cumpre reconhecer que os custos públicos(custas e emolumentos) são absurdamente baixos, em contraposição aos elevados custos privados (honorários advocatícios), o que, entre outros fatores, funciona como incentivo à litigância de má-fé e ao abuso quanto ao exercício do direito de ação e ao manejo de recursos. É pertinente, pois, que se reflita não somente quanto ao gasto, mas também quanto à correta utilização da máquina judiciária. Não se trata de cercear o amplo acesso ao Judiciário, mas, ao reverso, organizar e disciplinar, pois é inadmissível que a coletividade pague pelo uso indevido de um serviço público, acarretando sérios problemas à prestação jurisdicional.
Cabe ponderar, ainda, que grande parte dos 105 milhões de ações tem um seleto grupo de empresas no polo passivo, refletindo uma prática contumaz de descumprimento do Direito. São milhões de processos versando sobre questões relativas, por exemplo, a direitos do consumidor, assolando o Judiciário de causas perfeitamente evitáveis, não fosse a lógica empregada por alguns segmentos empresariais, cuja tônica é postergar o pagamento daquilo que é devido ao autor da ação. A sociedade, sem alternativa, socorre-se do Judiciário, o que se dá a um custo altíssimo para a coletividade, isto é, o custo judicial. Ao contrário da falácia que se propala, ou seja, de que é preciso estancar o número de demandas que chegam à Justiça, entendemos que o correto seria adotar estratégia que permitisse que a sociedade fosse ressarcida por aqueles que insistem em descumprir a norma. Assim, é necessário estabelecer mecanismos que possibilitem ainda mais a condenação de tais empresas ao ressarcimento do dano social (modalidade de danos morais coletivos) causado pela reiterada inobservância do Direito.
Destarte, urge inaugurarmos o Judiciário do século 21, o que demanda ações novas, em contraposição às antigas e ineficientes medidas de combate às consequências, tais como as ultrapassadas soluções dispendiosas, das quais o aumento do número de tribunais, juízes e servidores é o exemplo mais atual.
*Reis Friede é vice-presidente do TRF/2ª região
O Poder Judiciário brasileiro é um dos mais caros do mundo. Segundo dados consubstanciados por Luciano da Ros, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), em estudo intitulado O Custo da Justiça no Brasil, com exceção de El Salvador, com expressivos 1,35% do PIB, o Brasil tem o Judiciário mais dispendioso do mundo, com gastos (em 2014) na ordem de R$ 68,4 bilhões (1,2% do PIB), em comparação com os EUA (0,14% do PIB), a Itália (0,19% do PIB) e a Alemanha (0,32% do PIB). Portanto, nas olimpíadas judiciais nosso país tem grandes chances de subir ao pódio.
Sem correspondente em nenhuma parte do planeta, o valor despendido com o Poder Judiciário guarda proximidade com o que foi gasto com as Forças Armadas no mesmo ano (R$ 74,4 bilhões, ou 1,4% do PIB). Tal cenário se reproduz em relação ao efetivo empregado nas duas instituições. De acordo com o Relatório Justiça em Números/2015, o Judiciário tinha, em 2014, 278,7 mil servidores (efetivos, requisitados, cedidos de outros órgãos e comissionados sem vínculo efetivo), além de 139,3 mil trabalhadores auxiliares (terceirizados, estagiários, conciliadores, juízes leigos), totalizando 418 mil pessoas. Isso sem computar o número de cargos (previstos) de juízes, da ordem de 22,5 mil. Por sua vez, o efetivo das Forças Armadas atingiu, em 2014, cerca de 330 mil servidores.
Mesmo ostentando esses números hiperbólicos, a prestação da tutela jurisdicional, no Brasil, é uma das mais morosas do mundo, refletindo a ineficiência do Estado como prestador de serviços públicos. Afinal, no Brasil a criança educação ainda tenta alfabetizar-se, a jovem saúde respira por aparelhos, a senhora segurança pública sente-se atemorizada e o senhor serviço judiciário, após esperar tantos anos por uma decisão judicial, faleceu sem receber o bem da vida.
Malgrado as tentativas de combater o problema, o insucesso tem sido evidente, notadamente porque são atacadas as consequências, quando o foco deveria ser as causas. Apenas para ilustrar o que se afirma, apesar do estratosférico número de 105 milhões de ações em tramitação no País, os juízes, na verdade, têm muitos processos cuja temática é repetida, restando aos magistrados o absurdo de decidir quase que uma a uma, algo que o novo Código de Processo Civil, por meio do incidente de resolução de demandas repetitivas (IRDR), busca, de forma muito tímida e burocrática, debelar.
Portanto, é preciso implantar, cada vez mais, instrumentos que tornem viável a reunião de processos em um único julgador, tais como o instituto da afinidade, em adição à conexão e à continência, e também ressuscitar figuras análogas à antiga avocatória, de modo a permitir que o Supremo Tribunal Federal (STF), por exemplo, possa decidir de uma única vez questões que sejam comuns aos cidadãos brasileiros.
Com efeito, ações que tenham o mesmo fato motivador do pedido e a mesma causa de pedir devem ser julgadas por meio de um único ato decisório, medida que acarretará não apenas economia processual, mas uma verdadeira racionalização do trabalho, melhorando a eficiência operacional do Judiciário. Tal expediente impedirá que diversos magistrados julguem casos idênticos, o que não raro ocasiona interpretações variadas sobre o mesmo tema, problema que, cabe reconhecer, decorre do hábito de alguns juízes de imporem uma particular visão de justiça, em detrimento da correta hermenêutica na aplicação da lei, causando inflação interpretativa. Ao contrário, a diversidade de soluções adotadas por diversos juízes para a mesma questão acaba por causar perplexidade no jurisdicionado, que não consegue entender como uma interpretação pode ser absolutamente contrária à outra, se o que se postula em juízo é exatamente o mesmo.
Na Justiça Federal, em particular, cumpre reconhecer que os custos públicos(custas e emolumentos) são absurdamente baixos, em contraposição aos elevados custos privados (honorários advocatícios), o que, entre outros fatores, funciona como incentivo à litigância de má-fé e ao abuso quanto ao exercício do direito de ação e ao manejo de recursos. É pertinente, pois, que se reflita não somente quanto ao gasto, mas também quanto à correta utilização da máquina judiciária. Não se trata de cercear o amplo acesso ao Judiciário, mas, ao reverso, organizar e disciplinar, pois é inadmissível que a coletividade pague pelo uso indevido de um serviço público, acarretando sérios problemas à prestação jurisdicional.
Cabe ponderar, ainda, que grande parte dos 105 milhões de ações tem um seleto grupo de empresas no polo passivo, refletindo uma prática contumaz de descumprimento do Direito. São milhões de processos versando sobre questões relativas, por exemplo, a direitos do consumidor, assolando o Judiciário de causas perfeitamente evitáveis, não fosse a lógica empregada por alguns segmentos empresariais, cuja tônica é postergar o pagamento daquilo que é devido ao autor da ação. A sociedade, sem alternativa, socorre-se do Judiciário, o que se dá a um custo altíssimo para a coletividade, isto é, o custo judicial. Ao contrário da falácia que se propala, ou seja, de que é preciso estancar o número de demandas que chegam à Justiça, entendemos que o correto seria adotar estratégia que permitisse que a sociedade fosse ressarcida por aqueles que insistem em descumprir a norma. Assim, é necessário estabelecer mecanismos que possibilitem ainda mais a condenação de tais empresas ao ressarcimento do dano social (modalidade de danos morais coletivos) causado pela reiterada inobservância do Direito.
Destarte, urge inaugurarmos o Judiciário do século 21, o que demanda ações novas, em contraposição às antigas e ineficientes medidas de combate às consequências, tais como as ultrapassadas soluções dispendiosas, das quais o aumento do número de tribunais, juízes e servidores é o exemplo mais atual.
*Reis Friede é vice-presidente do TRF/2ª região
A cultura da boca-livre - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S. Paulo - 30/06
O escândalo do desvio de recursos públicos para atividades que nada têm a ver com o estímulo à cultura, conforme apurou a Operação Boca Livre da Polícia Federal (PF), tende a radicalizar a discussão em torno da chamada Lei Rouanet, que gera controvérsia desde que foi aprovada, em dezembro de 1991. Não é para menos: afinal, quando até uma festa de casamento é bancada com recursos oriundos de renúncia fiscal, é porque alguma coisa está muito errada.
A operação da PF desmontou um esquema que funcionava desde 2001 e fraudava o processo por meio do qual o Ministério da Cultura (MinC) libera o benefício a quem o solicita. Segundo as investigações, os operadores do esquema apresentaram projetos culturais falsos e dessa forma obtiveram cerca de R$ 180 milhões. A tal festa de casamento, por exemplo, recebeu os recursos porque foi disfarçada de show.
Está claro que essa quadrilha pôde agir por 15 anos porque a fiscalização é frouxa, e talvez seja esse o maior problema da Lei Rouanet. O benefício tem sido concedido a projetos que jamais poderiam ser enquadrados na categoria de “fomento à cultura”.
O estímulo oficial à criação artística e ao desenvolvimento cultural, seja por meio de recursos advindos de renúncia fiscal, seja por investimentos diretos do governo, é indispensável como instrumento auxiliar para, entre outros objetivos, a formação da identidade cultural de um povo. A Lei Rouanet, ao longo de seus 25 anos de existência, tem cumprido esse objetivo. Apresenta, no entanto, graves distorções que precisam ser corrigidas, inclusive aquelas que dão margem a fraudes.
Para que venha a se beneficiar da Lei Rouanet é preciso que um produtor cultural submeta um projeto detalhado ao MinC, informando o montante de recursos financeiros que pleiteia. Uma comissão de técnicos analisa a proposta tanto do ponto de vista técnico quanto de seus objetivos culturais e aprova, ou não, a captação pelo pleiteante, junto às empresas privadas, da verba aprovada. Esse dinheiro é descontado pelo patrocinador de seu Imposto de Renda devido como pessoa jurídica.
Quando, em 2009, tentava negociar com o Congresso a reforma da Lei Rouanet, o então ministro da Cultura, Juca Ferreira, argumentava que a maior distorção do sistema estava na captação dos recursos junto à iniciativa privada, cujos departamentos de marketing tinham o poder de definir os projetos de sua preferência. Como consequência, dizia então o MinC, cerca de 80% dos recursos captados pelos projetos aprovados beneficiavam o Sudeste. É verdade, consequência do fato óbvio de que é em Regiões Metropolitanas como as de São Paulo e Rio de Janeiro que se concentra a maior parte do público-alvo das empresas. Seus departamentos de marketing, portanto, fazem o que deles se espera e pouco têm a ver com a difusão da cultura.
Mas é verdade também – e esse é o fulcro da questão – que os projetos que as empresas aceitam patrocinar para se beneficiarem da renúncia fiscal são aqueles, e somente aqueles, que o MinC aprova. A distorção, portanto, não está na captação, mas na aprovação dos projetos.
É claro que não faz sentido patrocinar com recursos públicos espetáculos de artistas consagrados que por definição podem contar com a bilheteria para cobrir seus custos e remunerar seu talento. É claro também que em momentos de crise como o que vivemos é muito difícil, até para celebridades, contar apenas com bilheteria. Mas, quando se trata de recursos públicos, é preciso estabelecer prioridades. A questão central, então, é que é indispensável o aporte de recursos públicos para a criação artístico-cultural, mas esses recursos devem se concentrar no fomento da atividade criativa – o que implica prioritariamente pesquisa, inovação e qualificação profissional – e não no espetáculo, o que significa a submissão de um programa de governo no campo cultural ao efeito perverso da lógica do mercado. Para não falar da falta de fiscalização, que beneficia as escandalosas bocas-livres.
O escândalo do desvio de recursos públicos para atividades que nada têm a ver com o estímulo à cultura, conforme apurou a Operação Boca Livre da Polícia Federal (PF), tende a radicalizar a discussão em torno da chamada Lei Rouanet, que gera controvérsia desde que foi aprovada, em dezembro de 1991. Não é para menos: afinal, quando até uma festa de casamento é bancada com recursos oriundos de renúncia fiscal, é porque alguma coisa está muito errada.
A operação da PF desmontou um esquema que funcionava desde 2001 e fraudava o processo por meio do qual o Ministério da Cultura (MinC) libera o benefício a quem o solicita. Segundo as investigações, os operadores do esquema apresentaram projetos culturais falsos e dessa forma obtiveram cerca de R$ 180 milhões. A tal festa de casamento, por exemplo, recebeu os recursos porque foi disfarçada de show.
Está claro que essa quadrilha pôde agir por 15 anos porque a fiscalização é frouxa, e talvez seja esse o maior problema da Lei Rouanet. O benefício tem sido concedido a projetos que jamais poderiam ser enquadrados na categoria de “fomento à cultura”.
O estímulo oficial à criação artística e ao desenvolvimento cultural, seja por meio de recursos advindos de renúncia fiscal, seja por investimentos diretos do governo, é indispensável como instrumento auxiliar para, entre outros objetivos, a formação da identidade cultural de um povo. A Lei Rouanet, ao longo de seus 25 anos de existência, tem cumprido esse objetivo. Apresenta, no entanto, graves distorções que precisam ser corrigidas, inclusive aquelas que dão margem a fraudes.
Para que venha a se beneficiar da Lei Rouanet é preciso que um produtor cultural submeta um projeto detalhado ao MinC, informando o montante de recursos financeiros que pleiteia. Uma comissão de técnicos analisa a proposta tanto do ponto de vista técnico quanto de seus objetivos culturais e aprova, ou não, a captação pelo pleiteante, junto às empresas privadas, da verba aprovada. Esse dinheiro é descontado pelo patrocinador de seu Imposto de Renda devido como pessoa jurídica.
Quando, em 2009, tentava negociar com o Congresso a reforma da Lei Rouanet, o então ministro da Cultura, Juca Ferreira, argumentava que a maior distorção do sistema estava na captação dos recursos junto à iniciativa privada, cujos departamentos de marketing tinham o poder de definir os projetos de sua preferência. Como consequência, dizia então o MinC, cerca de 80% dos recursos captados pelos projetos aprovados beneficiavam o Sudeste. É verdade, consequência do fato óbvio de que é em Regiões Metropolitanas como as de São Paulo e Rio de Janeiro que se concentra a maior parte do público-alvo das empresas. Seus departamentos de marketing, portanto, fazem o que deles se espera e pouco têm a ver com a difusão da cultura.
Mas é verdade também – e esse é o fulcro da questão – que os projetos que as empresas aceitam patrocinar para se beneficiarem da renúncia fiscal são aqueles, e somente aqueles, que o MinC aprova. A distorção, portanto, não está na captação, mas na aprovação dos projetos.
É claro que não faz sentido patrocinar com recursos públicos espetáculos de artistas consagrados que por definição podem contar com a bilheteria para cobrir seus custos e remunerar seu talento. É claro também que em momentos de crise como o que vivemos é muito difícil, até para celebridades, contar apenas com bilheteria. Mas, quando se trata de recursos públicos, é preciso estabelecer prioridades. A questão central, então, é que é indispensável o aporte de recursos públicos para a criação artístico-cultural, mas esses recursos devem se concentrar no fomento da atividade criativa – o que implica prioritariamente pesquisa, inovação e qualificação profissional – e não no espetáculo, o que significa a submissão de um programa de governo no campo cultural ao efeito perverso da lógica do mercado. Para não falar da falta de fiscalização, que beneficia as escandalosas bocas-livres.
O rombo e a dívida crescem - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S. Paulo - 30/06
Continua crescendo o buraco das contas públicas, enquanto o governo ainda ensaia os primeiros passos para arrumar as suas finanças. Com os negócios emperrados e 11,4 milhões de pessoas desempregadas, a receita de impostos e contribuições permanece em queda, enquanto a despesa aumenta sem parar. Chegou a R$ 15,49 bilhões só em maio o déficit primário do governo central – sem a inclusão, portanto, dos juros da dívida federal. Descontada a inflação, foi quase o dobro do resultado negativo de um ano antes, de R$ 8,07 bilhões em valor atualizado. Entre janeiro e maio de 2015, o poder central – representado por Tesouro, Banco Central (BC) e Previdência – ainda apresentou um balanço no azul, com superávit primário de R$ 6,49 bilhões. Neste ano, os cinco meses foram fechados com um rombo de R$ 23,77 bilhões, explicável pela combinação de dois fatores: a retração econômica e a rigidez dos gastos.
Enquanto a receita líquida encolheu 5%, o dispêndio foi 1,4% maior que o do mesmo período de 2015. Enquanto a receita do regime geral da Previdência diminuiu 6,5%, em termos líquidos, o pagamento de benefícios cresceu 5,2%. Os desempregados deixaram de recolher a contribuição, mas os aposentados continuaram a receber seu dinheiro. Excetuada a folha de pessoal, as demais despesas obrigatórias também continuaram em expansão. Com a recessão, o superávit do Tesouro tornou-se insuficiente para compensar, nas contas primárias, o déficit crônico da Previdência.
Com o retorno ao crescimento econômico, ainda sem previsão segura, a receita do Tesouro voltará a crescer, mas, ainda assim, as contas oficiais continuarão com problemas muito sérios. Poderá haver mais dinheiro para compensar o déficit da Previdência, mas será preciso muito mais que isso para aliviar o peso da dívida pública, o principal desafio, hoje, para os ministros das áreas econômica e financeira.
O tema fica mais claro quando se examina o balanço geral do setor público, preparado mensalmente pelo BC. As contas, nesse caso, são sujeitas a um critério diferente do usado nas demonstrações do Tesouro. O resultado, neste caso, corresponde simplesmente à diferença entre receitas primárias e despesas primárias. Nos cálculos publicados pelo BC, o resultado positivo ou negativo corresponde às necessidades de financiamento do setor governamental. Incluem as despesas com os juros e a amortização da dívida. Além disso, essas contas abrangem os números federais, estaduais, municipais e de parte das estatais.
Pelas contas divulgadas pelo BC, o déficit primário do setor público bateu em R$ 18,12 bilhões em maio. Todos os níveis de governo ficaram no vermelho e o pior desempenho foi o do governo central, com um buraco de R$ 17,77 bilhões. Somando os juros, obtém-se o resultado nominal e o quadro fica muito pior. O déficit nominal chegou a R$ 169,91 bilhões no ano e a R$ 604,56 bilhões em 12 meses, valor correspondente a 10,08% do Produto Interno Bruto (PIB), o triplo da média da União Europeia.
Com isso, a dívida bruta do setor público atingiu em maio R$ 4,11 trilhões, ou 68,6% do PIB. Pelo critério do Fundo Monetário Internacional (FMI) a proporção seria maior, porque a soma incluiria os papéis do Tesouro em poder do BC. Por esse padrão, a dívida bruta brasileira já está bem acima de 70%, enquanto a da maior parte dos emergentes é inferior a 50% do PIB.
Só um enorme esforço de ajuste permitirá conter e depois diminuir o endividamento público. O crescimento econômico ajudará, mas serão necessárias medidas muito severas – e dificilmente haverá condições políticas para isso antes da solução do processo de impeachment. Além disso, um ajuste duradouro dependerá de medidas mais ambiciosas, como a reforma da Previdência, por enquanto encalhada, e a redução – ou eliminação – das vinculações orçamentárias, um fator de rigidez e de irracionalidade. Nada disso será possível se faltar ao governo disposição para enfrentar a resistência de congressistas e de grupos organizados.
Continua crescendo o buraco das contas públicas, enquanto o governo ainda ensaia os primeiros passos para arrumar as suas finanças. Com os negócios emperrados e 11,4 milhões de pessoas desempregadas, a receita de impostos e contribuições permanece em queda, enquanto a despesa aumenta sem parar. Chegou a R$ 15,49 bilhões só em maio o déficit primário do governo central – sem a inclusão, portanto, dos juros da dívida federal. Descontada a inflação, foi quase o dobro do resultado negativo de um ano antes, de R$ 8,07 bilhões em valor atualizado. Entre janeiro e maio de 2015, o poder central – representado por Tesouro, Banco Central (BC) e Previdência – ainda apresentou um balanço no azul, com superávit primário de R$ 6,49 bilhões. Neste ano, os cinco meses foram fechados com um rombo de R$ 23,77 bilhões, explicável pela combinação de dois fatores: a retração econômica e a rigidez dos gastos.
Enquanto a receita líquida encolheu 5%, o dispêndio foi 1,4% maior que o do mesmo período de 2015. Enquanto a receita do regime geral da Previdência diminuiu 6,5%, em termos líquidos, o pagamento de benefícios cresceu 5,2%. Os desempregados deixaram de recolher a contribuição, mas os aposentados continuaram a receber seu dinheiro. Excetuada a folha de pessoal, as demais despesas obrigatórias também continuaram em expansão. Com a recessão, o superávit do Tesouro tornou-se insuficiente para compensar, nas contas primárias, o déficit crônico da Previdência.
Com o retorno ao crescimento econômico, ainda sem previsão segura, a receita do Tesouro voltará a crescer, mas, ainda assim, as contas oficiais continuarão com problemas muito sérios. Poderá haver mais dinheiro para compensar o déficit da Previdência, mas será preciso muito mais que isso para aliviar o peso da dívida pública, o principal desafio, hoje, para os ministros das áreas econômica e financeira.
O tema fica mais claro quando se examina o balanço geral do setor público, preparado mensalmente pelo BC. As contas, nesse caso, são sujeitas a um critério diferente do usado nas demonstrações do Tesouro. O resultado, neste caso, corresponde simplesmente à diferença entre receitas primárias e despesas primárias. Nos cálculos publicados pelo BC, o resultado positivo ou negativo corresponde às necessidades de financiamento do setor governamental. Incluem as despesas com os juros e a amortização da dívida. Além disso, essas contas abrangem os números federais, estaduais, municipais e de parte das estatais.
Pelas contas divulgadas pelo BC, o déficit primário do setor público bateu em R$ 18,12 bilhões em maio. Todos os níveis de governo ficaram no vermelho e o pior desempenho foi o do governo central, com um buraco de R$ 17,77 bilhões. Somando os juros, obtém-se o resultado nominal e o quadro fica muito pior. O déficit nominal chegou a R$ 169,91 bilhões no ano e a R$ 604,56 bilhões em 12 meses, valor correspondente a 10,08% do Produto Interno Bruto (PIB), o triplo da média da União Europeia.
Com isso, a dívida bruta do setor público atingiu em maio R$ 4,11 trilhões, ou 68,6% do PIB. Pelo critério do Fundo Monetário Internacional (FMI) a proporção seria maior, porque a soma incluiria os papéis do Tesouro em poder do BC. Por esse padrão, a dívida bruta brasileira já está bem acima de 70%, enquanto a da maior parte dos emergentes é inferior a 50% do PIB.
Só um enorme esforço de ajuste permitirá conter e depois diminuir o endividamento público. O crescimento econômico ajudará, mas serão necessárias medidas muito severas – e dificilmente haverá condições políticas para isso antes da solução do processo de impeachment. Além disso, um ajuste duradouro dependerá de medidas mais ambiciosas, como a reforma da Previdência, por enquanto encalhada, e a redução – ou eliminação – das vinculações orçamentárias, um fator de rigidez e de irracionalidade. Nada disso será possível se faltar ao governo disposição para enfrentar a resistência de congressistas e de grupos organizados.
Atentado na Turquia é alerta para a Rio-2016 - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 30/06
A pouco mais de um mês para as Olimpíadas, ataque a aeroporto de Istambul reforça necessidade de vigilância e ação integrada internacional contra o terror
O atentato no Aeroporto Ataturk, em Istambul, que matou ao menos 41 pessoas na terça-feira e feriu cerca de 240, se soma a uma série de atos terroristas recentes na Turquia, evidenciando que o país se tornou alvo crescente de extremistas. Desde junho do ano passado, foram realizadas 14 ações por militantes separatistas curdos e extremistas do Estado Islâmico (EI), com quase 300 vítimas fatais. No ataque desta terça-feira, a maioria dos mortos era de nacionalidade turca, mas também havia cinco sauditas, dois iraquianos e um cidadão de China, Irã, Jordânia, Tunísia, Ucrânia e Uzbequistão, segundo dados oficiais.
A violência política, étnica e religiosa reflete a complexidade de uma nação que representa a fronteira — real e simbólica — entre o Ocidente e o Oriente, especialmente a cosmopolita Istambul, cujo aeroporto é um dos mais movimentados do mundo, funcionando como ponto de conexão para dezenas de milhões de passageiros entre Europa, Oriente Médio, África e Ásia.
Membro da Otan, a Turquia também participa da coalizão que vem combatendo as posições do EI na Síria e no Iraque. Tal iniciativa despertou o ódio dos radicais islâmicos.
Internamente, o país sofre com divisões políticas profundas, especialmente entre muçulmanos que apoiam o presidente Recep Tayyip Erdogan e a oposição, que defende uma nação secular e nacionalista. Há ainda uma guerra entre o governo e a minoria curda que há décadas luta para se separar, transformando o Sudeste da Turquia numa região conflagrada.
Os separatistas curdos estiveram por trás de inúmeros atentados. Já o regime turco é acusado de autoritarismo e de agir com truculência contra a minoria, o que retardou o processo de adesão formal do país à UE.
Em meio à crise humanitária provocada pelo fluxo de refugiados sírios à UE, a Turquia desempenhou um papel crucial, ao aceitar receber refugiados pegos tentando entrar irregularmente na Europa. A contrapartida do acordo foi a aceleração do processo de incorporação do país ao bloco europeu, apesar das acusações de violações de direitos humanos. Além disso, os atentados de terça-feira ocorreram um dia após o governo turco ter anunciado uma reaproximação diplomática com Israel e Rússia, reforçando seu papel como ator estratégico na região.
Os radicais, como se vê, miram alvos com alto poder simbólico, além de civis inocentes. É assim que chamam a atenção para suas causas, e isto é inadmissível. Nenhuma população pode ficar refém de extremistas. O atentado no aeroporto Ataturk é o mais recente alerta sobre a necessidade de uma ação conjunta contra o terror.
A pouco mais de um mês de sediar as Olimpíadas, o Rio se encaixa neste perfil e deve redobrar a vigilância. Por isso, é louvável a iniciativa do governo federal para uma atuação ainda mais integrada com serviços de segurança estrangeiros, sobretudo o americano e o israelense.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
TEMER AVANÇA NA ÁREA SOCIAL COM PACOTE EM JULHO
O presidente Michel Temer prepara o lançamento de um “pacote social” na primeira quinzena de julho, dentro do propósito de avançar na área em que o PT atuava quase com exclusividade. A ideia é anunciar vários programas complementares ao Bolsa Família, como o lançamento do “Cheque Construção”, que atenderá a famílias de baixa renda que precisam fazer pequenas obras de reforma em suas casas.
CRIANÇAS PROTEGIDAS
O ministro Osmar Terra (Desenvolvimento Social e Agrário) prepara um programa destinado à proteção social de crianças carentes.
MÃO NA MASSA
O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), já articula com os deputados aliados a aprovação do “pacote social”.
AMPLIAÇÃO
“É a prova de que os programas em andamento serão mantidos e ampliados”, diz André Moura, que se reuniu nesta quarta com Temer.
PRIMEIRO PASSO
O primeiro passo do projeto de avançar na área é reajuste de 12,5% do Bolsa Família, carro-chefe do governo do PT.
PROGRAMA DE ‘COMPRA DE VOTOS’ MUDA DE MÃOS
Políticos do PT evitam comentar o aumento de 12,5% do Bolsa Família, concedido por Michel Temer, mas a medida desestabilizou o partido. É que, para o PT, sua identificação ao Bolsa Família poderia garantir um desempenho minimamente digno, nas próximas eleições. No fundo, os petistas concordam com o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE): “o Bolsa Família é o maior programa de compra de votos do mundo”.
POVÃO SUBESTIMADO
Políticos petistas acham que o público atendido pelo Bolsa Família está mais interessado no dinheiro do programa do que na Lava Jato.
DIGITAIS SUMINDO
A ideia do governo Michel Temer é mesmo melhorar substancialmente o Bolsa Família, neutralizando as digitais do PT no programa.
ABRANGÊNCIA
Metade da população de estados mais pobres, como Norte e Nordeste, depende do Bolsa Família, daí a força eleitoral do programa.
VOZES DO ATRASO
O Planalto cedeu à pressão de políticos que não usam voos comerciais (ou não pagam por eles) para vetar a concorrência de empresas estrangeiras no mercado brasileiro. Recuo vergonhoso e suspeitíssimo.
EXPLORAÇÃO AUTORIZADA
Empresas aéreas “nacionais” continuarão autorizadas a cobrar por uma passagem Rio-Maceió até 4 vezes mais do que elas próprias exigem para o trecho Rio-Miami, onde enfrentam concorrência internacional.
ELVIS VIVE
Ao avistar José Medeiros (PSD-MT) na comissão do impeachment, o senador Waldemir Moka (PMDB-MS) brincou: “Elvis não morreu!” numa alusão ao vistoso topete do colega. Medeiros riu, ajeitando o cabelo.
VAI, DILMA
O presidente, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), ainda não sabe se Dilma vai pessoalmente à comissão do impeachment, dia 6. Os petistas temem que, desfilando sua arrogância, ela prejudique a própria defesa.
GENTIS OPOSITORES
“Não costumamos entrar em assuntos pessoais”, diz Ronaldo Caiado (DEM-GO), ao explicar o constrangedor silêncio do Senado sobre o roubo a servidores que levou à prisão do ex-ministro Paulo Bernardo.
APOSTA DA OI
Apesar das turbulências, a Oi atingiu notáveis 320 mil assinantes do seu combo Oi Total em todo o Brasil. Têm sido 80 mil instalações por mês. É sua grande aposta para aumentar a presença no mercado.
BAIXA ESTATURA
“É absurda a situação atual da Câmara”, protesta o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), sobre a suspensão das sessões. Para ele, Waldir Maranhão não tem “estatura moral” para comandar a Câmara.
HERMANOS SIAMESES
A inflação argentina deve começar a cair em julho, diz o ministro das Finanças, Alfonso Prat-Gay. Mas ele teme que uma recessão continuada no Brasil contamine mais a economia portenha que o Brexit.
PERGUNTA NA POLÍCIA
A “vaquinha virtual” para custear as mordomias de Dilma poderá ser usada para ressarcir os brasileiros em dificuldades, que contraíram empréstimos consignados e acabaram roubados, durante seu governo?
O presidente Michel Temer prepara o lançamento de um “pacote social” na primeira quinzena de julho, dentro do propósito de avançar na área em que o PT atuava quase com exclusividade. A ideia é anunciar vários programas complementares ao Bolsa Família, como o lançamento do “Cheque Construção”, que atenderá a famílias de baixa renda que precisam fazer pequenas obras de reforma em suas casas.
CRIANÇAS PROTEGIDAS
O ministro Osmar Terra (Desenvolvimento Social e Agrário) prepara um programa destinado à proteção social de crianças carentes.
MÃO NA MASSA
O líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE), já articula com os deputados aliados a aprovação do “pacote social”.
AMPLIAÇÃO
“É a prova de que os programas em andamento serão mantidos e ampliados”, diz André Moura, que se reuniu nesta quarta com Temer.
PRIMEIRO PASSO
O primeiro passo do projeto de avançar na área é reajuste de 12,5% do Bolsa Família, carro-chefe do governo do PT.
PROGRAMA DE ‘COMPRA DE VOTOS’ MUDA DE MÃOS
Políticos do PT evitam comentar o aumento de 12,5% do Bolsa Família, concedido por Michel Temer, mas a medida desestabilizou o partido. É que, para o PT, sua identificação ao Bolsa Família poderia garantir um desempenho minimamente digno, nas próximas eleições. No fundo, os petistas concordam com o deputado Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE): “o Bolsa Família é o maior programa de compra de votos do mundo”.
POVÃO SUBESTIMADO
Políticos petistas acham que o público atendido pelo Bolsa Família está mais interessado no dinheiro do programa do que na Lava Jato.
DIGITAIS SUMINDO
A ideia do governo Michel Temer é mesmo melhorar substancialmente o Bolsa Família, neutralizando as digitais do PT no programa.
ABRANGÊNCIA
Metade da população de estados mais pobres, como Norte e Nordeste, depende do Bolsa Família, daí a força eleitoral do programa.
VOZES DO ATRASO
O Planalto cedeu à pressão de políticos que não usam voos comerciais (ou não pagam por eles) para vetar a concorrência de empresas estrangeiras no mercado brasileiro. Recuo vergonhoso e suspeitíssimo.
EXPLORAÇÃO AUTORIZADA
Empresas aéreas “nacionais” continuarão autorizadas a cobrar por uma passagem Rio-Maceió até 4 vezes mais do que elas próprias exigem para o trecho Rio-Miami, onde enfrentam concorrência internacional.
ELVIS VIVE
Ao avistar José Medeiros (PSD-MT) na comissão do impeachment, o senador Waldemir Moka (PMDB-MS) brincou: “Elvis não morreu!” numa alusão ao vistoso topete do colega. Medeiros riu, ajeitando o cabelo.
VAI, DILMA
O presidente, senador Raimundo Lira (PMDB-PB), ainda não sabe se Dilma vai pessoalmente à comissão do impeachment, dia 6. Os petistas temem que, desfilando sua arrogância, ela prejudique a própria defesa.
GENTIS OPOSITORES
“Não costumamos entrar em assuntos pessoais”, diz Ronaldo Caiado (DEM-GO), ao explicar o constrangedor silêncio do Senado sobre o roubo a servidores que levou à prisão do ex-ministro Paulo Bernardo.
APOSTA DA OI
Apesar das turbulências, a Oi atingiu notáveis 320 mil assinantes do seu combo Oi Total em todo o Brasil. Têm sido 80 mil instalações por mês. É sua grande aposta para aumentar a presença no mercado.
BAIXA ESTATURA
“É absurda a situação atual da Câmara”, protesta o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), sobre a suspensão das sessões. Para ele, Waldir Maranhão não tem “estatura moral” para comandar a Câmara.
HERMANOS SIAMESES
A inflação argentina deve começar a cair em julho, diz o ministro das Finanças, Alfonso Prat-Gay. Mas ele teme que uma recessão continuada no Brasil contamine mais a economia portenha que o Brexit.
PERGUNTA NA POLÍCIA
A “vaquinha virtual” para custear as mordomias de Dilma poderá ser usada para ressarcir os brasileiros em dificuldades, que contraíram empréstimos consignados e acabaram roubados, durante seu governo?
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