terça-feira, maio 15, 2012

Cadeia nacional para a mãe do PAC - GUILHERME FIUZA


REVISTA ÉPOCA 


Enquanto Dilma Rousseff se especializa em falar sozinha na TV, o presidente do PT avisa que o governo popular vai “peitar” a mídia. É compreensível.

A mídia é praticamente o único problema do Brasil atualmente. Se não fosse ela, não existiria corrupção no governo popular (o que os olhos não vêem, o coração não sente).

Infelizmente, a rede parasitária montada pelos companheiros em pelo menos sete ministérios foi parar nas manchetes. Não fosse essa invasão de privacidade, esquemas como o do Dnit com a Delta continuariam firmes na aceleração do crescimento.

Se não fosse a mídia para atrapalhar, o governo da presidenta falaria diretamente com o povo – sem esses assuntos azedos que só interessam à imprensa.

E já que jornalista só gosta de coisa ruim, o PT resolveu falar sozinho, em cadeia obrigatória de rádio e TV.

Dia da Mulher, Dia do Trabalhador, Dia das Mães e todas as datas simpáticas do calendário passaram a ser, também, Dia da Dilma. São os momentos em que a presidenta olha nos olhos do Brasil e diz a ele só coisas lindas, de arrepiar.

O comício contra os bancos no Primeiro de Maio foi inesquecível. Como governar é muito chato e trabalhoso, o PT resolveu voltar a ser estilingue (sem sair do palácio).

É o primeiro governo de oposição da história.

É muito melhor fazer comício contra juros altos (“peitar os bancos!”) do que organizar as finanças públicas, acabar com a farra tributária, abrir mão do fisiologismo, parar de gastar o dinheiro que não tem e controlar toda essa bagunça institucional que empurra para o alto a inflação – e os juros.

O povo está adorando esse governo de oposição, liderado por uma mulher corajosa que faz faxina em sua própria lambança e vira heroína.

No pronunciamento emocionante do Dia das Mães, que lançou o programa Brasil Carinhoso, só faltou uma palavra de carinho para a construtora Delta, que cresceu e engordou sob a guarda da Mãe do PAC.

Foi dentro do projeto de peitar a mídia que Lula insuflou a CPI do Cachoeira. A idéia era mostrar que a imprensa burguesa também estava no bolso do bicheiro e que o mensalão não existiu.

Quem sabe essas pérolas do romantismo petista não viram verdade no Dia dos Namorados, em mais um pronunciamento oficial da presidenta?

Bye, bye, Brasil - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 15/05

Está previsto para hoje, na Alemanha, o anúncio oficial pela ThyssenKrupp da venda da noviça Companhia Siderúrgica do Atlântico, no Rio, onde o grupo alemão investiu uns R$ 15 bi. A Vale tem participação de cerca de 25% na usina.

De pernas para o ar

Um conhecido advogado carioca está convencido de que a TAM pirou. Um bilhete Rio-Curitiba, pelo voo 3903, com escala em São Paulo, custa R$ 715,57. Mas se o passageiro descer na escala, fazendo só a ponte Rio- São Paulo, paga mais: R$ 972,57.

Pedofilia

Uma das melhores escolas do Rio flagrou um professor estrangeiro no Facebook em conversas íntimas com alunas. Ao ser descoberto, o cara retornou a seu país. As autoridades foram alertadas.

Posto-chave

Valdemar Carneiro Leão será o novo embaixador em Pequim.

Nome de peso

David Cameron, o premier britânico, deve vir à Rio+20.

Antes do anoitecer

Um médico brasileiro voltou de Cuba impressionado com os avanços da cirurgia de mudança de sexo na ilha. A perseguição aos gays cubanos, no passado, foi retratada no longa “Antes do anoitecer”, sobre o escritor Reinaldo Arenas.

Mistura musical
Emicida, o rapper paulistano preso domingo em Belo Horizonte por desacato, participa de um projeto de shows, incentivado pela Lei Rouanet, com a Allegro Coral e Orquestra. A produtora Misiuk e Andreola poderá a captar R$ 1.459.700.

LEQUINHO, ESTE filhote de macaco-verde, nasceu dia 5 de março no zoológico do Rio, com 340g e 20cm. Só que, coitadinho, perdeu a mãe com um dia de vida apenas. O bebê foi, imediatamente, acolhido pela avó, que até tentou amamentá-lo. Mas, já idosa, não teve sucesso. A saída encontrada pelos veterinários do zoo foi negociar com a diligente vovó para que o miúdo recebesse cuidados dos humanos. Agora, Lequinho bebe leite para crianças recém-nascidas (veja na foto). O macaquinho, além da avó, tem a irmã, Bibi, e o pai, Bebeto, assim batizado, como o ex-craque da seleção, porque nasceu no período da Copa de 1994. Hoje, Lequinho e outros novos bebês do zoo serão apresentados ao público. Que Deus os proteja e a nós não desampare

O Rio está caro

Paula Lavigne, a produtora, rodou um comercial de TV estes dias e precisou filmar os principais pontos turísticos da cidade. Ao pedir autorização aos órgãos competentes, recebeu os seguintes custos das locações, acredite: Cristo Redentor, R$ 41 mil; Pão de Açúcar, R$ 45 mil; Jardim Botânico, R$ 29,5 mil; rampa do voo livre, R$ 10 mil; Engenhão, R$ 60 mil.

Resultado...

Paula chia: — Precisamos fazer alguma coisa. Assim vão acabar inviabilizando vários filmes e projetos no Rio. Imagine quando chegar mais perto da Copa.

Diz que fica

A família Ermírio de Moraes voltou a negar os rumores do mercado bancário de que estaria vendendo sua parte no Banco
Votorantim.

Salão da Angélica
Angélica, a apresentadora, uniu-se ao cabeleireiro e maquiador Celso Kamura, responsável pelo visual de artistas globais, e à Wella. Vão montar um salão-referência no shopping Village Mall, na Barra, no Rio.

Tudo de Villa

A Petrobras Sinfônica vai fazer uma série de apresentações no Rio só com as sinfonias do carioca Villa-Lobos, regidas por Isaac Karabtchevsky. A primeira será dia 16 de junho, no Teatro Municipal.

Comer bem

Roberta Sudbrack vai comandar a cozinha do centro de treinamento dos nossos atletas nos Jogos de Londres. A badalada chef, que cuidava da comida de FH na Presidência, fechou com o COB.

Dá o ágape, louro

Padre Marcelo Rossi é quem vai celebrar o casamento do pagodeiro falso louro Belo com Gracyanne Barbosa, rainha de bateria da Unidos da Tijuca no carnaval passado. A cerimônia será dia 18, sexta agora, na Candelária, no Rio.

Faz sentido

Em seu depoimento, ontem, para a juíza Nearis dos Santos Arce, no Rio, o traficante Nem disse que sua profissão era “supervisor de entregas”. De certa forma, era isto que ele fazia na Rocinha: “supervisionava” a entrega de drogas.

CPI em risco - PEDRO SIMON

O GLOBO - 15/05/12

A CPI do Cachoeira recém-começou e corre o risco de se transformar num palco de disputas partidárias. O centro das atenções, conforme percebemos pelo noticiário, é o procurador-geral da República. Muitos pretendem envolver Roberto Gurgel em névoas de suspeição pela demora na autorização de procedimento contra o senador Demóstenes Torres. Preocupação elogiável mas, infelizmente, de natureza seletiva, não alcançando, por exemplo, outros casos que se arrastam há anos na Justiça, como o processo que se convencionou denominar de “mensalão” — há tantos anos no Supremo Tribunal Federal (STF) e sujeito já à prescrição de possíveis penalidades.

Como numa peça em que os papéis foram bem distribuídos, há também entre os membros da CPI quem se dedica a acusar jornalistas, numa clara ação de vindita que libera mágoas e ódios gerados em acontecimentos passados. Atuação histriônica que busca estabelecer uma farsa, em lugar da descoberta e punição dos envolvidos numa gigantesca malha de corrupção organizada para saquear os cofres públicos.

Nada estará perdido, no entanto, se os trabalhos dessa Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) forem acompanhados e fiscalizadosatentamente pela sociedade. A possibilidade de êxito do trabalho da comissão dependerá da mobilização do povo e da capacidade das redes sociais de interferirem no processo político. Essa CPMI tem que cair na rede, contar com a saudável pressão das ruas para seguir adiante. Nesse esforço, cogita-se a presença de observadores indicados por instituições comoa Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Historicamente, as CPIs cumprem importante papel institucional e político no Brasil. Sua atuação é fundamental numa democracia
por exercerem a importante função de fiscalização e controle. Para tanto, a Constituição confere às comissões de inquérito o poder de realizar investigação judicial, quebrar sigilos bancário, fiscal e telefônico dos depoentes. Uma CPI provocou a queda de um presidente da República, num processo político de impeachment pioneiro no mundo. Outra, determinou a prisão de um presidente do Banco Central que se negara a depor.

A CPI do Cachoeira está em seu estágio inicial. É cedo para arriscar palpites sobre seus desdobramentos. É hora, no entanto, de um alerta para que se evitem desvios de natureza político-partidária. A CPI deve funcionar com total transparência na busca da verdade, contribuindo assim para o fim da impunidade e o fortalecimento da democracia.

Sarney pede resgate - DENISE ROTHENBURG

CORREIO BRAZILIENSE - 15/05




Sarney fala de "legado social do governo do PMDB" e se mostra disposto a limpar a imagem dos políticos. Em ano eleitoral, é o início de uma conversa para evitar o avanço do PT sobre municípios peemedebistas


Podem falar o que quiser do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Fernando Collor, por exemplo, hoje colega de plenário na Casa, ganhou muitos votos quando candidato a presidente da República xingando o ocupante do Planalto. A mesma coisa fez Lula, atualmente, um dos melhores amigos. É, a vida dá voltas. Na imprensa, então, Sarney é tratado a ferro e fogo. Mas uma coisa ninguém pode negar: Ele entende de política como ninguém. E, do alto dos 80 e tantos anos, fez um discurso que, para os desatentos, pode ter sido mais um blá-blá-blá. Mas sua fala delineou caminhos e um vislumbre de futuro rumo ao resgtate da imagem do PMDB.

Sarney conseguiu ontem marcar com estilo seu retorno à Presidência da Casa depois da licença médica — ele passou por cateterismo em 14 de abril. Declarações sobre autonomia de CPI à parte — divulgadas logo cedo nos sites de notícias —, o discurso de plenário pelsa manhã vale uma lupa. Nas entrelinhas, ele apresentou três eixos básicos: o governo do social, os políticos como uma turma do bem e a importância dos partidos, com destaque, obviamente, para o que considera as vantagens do PMDB.

O primeiro eixo tenta acabar com a velha cantilena “o povo não esquece, Sarney é PDS”, frase batida no bumbar de várias greves durante seu governo. O próprio governo Sarney deixou de existir. Na fala de quem comandava o país naquela época, virou “o governo do PMDB”, cuja marca frisada no pronunciamento foi o “tudo pelo social”. E assim Sarney foi desfiando os números para corroborar a sua tese: “6 milhões atendidos pelo programa do leite, 18 milhões com o vale-refeição, 11 milhões de beneficiados pela alimentação suplementar às crianças”. Falou ainda da redução da mortalidade infantil, da farmácia básica “concedida naquele tempo”. Tudo feito pelo governo do PMDB.

Por falar em tempo…
Sarney pulou um pedaço da história política do Brasil. Depois de citar o “governo do PMDB” como do legado social, emendou com um “que veio a consolidar-se no governo Lula e continua no governo Dilma Rousseff”. Ora, cadê Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso? Não digo nem o de Fernando Collor, primeiro sucessor de Sarney. Afinal, o governo Collor não durou três anos. É mais lembrado pela corrupção e pelo confisco da poupança do que por algum benefício à população. O de Itamar fez o Plano Real, que permitiu avanços sociais, e o de Fernando Henrique Cardoso seguiu na mesma linha, consolidou o Real, fortaleceu o sistema financeiro e a responsabilidade fiscal, sem contar a bolsa-escola e outros programas sociais. Se algum estudante for se basear no pronunciamento de Sarney para aprender história, pode pensar que os governos desses políticos não existiram.

Por falar em políticos…
Sarney fez o que pode em sua fala para limpar a imagem da classe. Ao se referir ao país como uma construção política e de políticos, lembrou que eles são “atacados, insultados, responsabilizados por tudo, mas foram eles que construíram as instituições” e mantiveram a unidade nacional. Foram os construtores do Brasil. E, sendo assim, nada mais injusto do que falar mal deles.

A sessão ordinária do Senado ontem à tarde, entretanto, é a prova de que durou pouco a felicidade dos senadores com o discurso de Sarney — justiça seja feita, não totalmente desprovido de razão. Outro peemedebista, o senador Pedro Simon (PMDB-RS) descascou os políticos da CPI do Cachoeira e aqueles que, ao longo da história, jamais permitiram uma CPI para investigar corruptores, em especial, empreiteiras como a Delta. Agora, diz Simon, um histórico do PMDB, a CPI perdeu a oportunidade: a Delta acabou, Fernando Cavendish pode sair do país e o retorno de algum dinheiro aos cofres públicos, ó…

Por falar em históricos do PMDB…
O terceiro eixo citado por Sarney em seu discurso é aquele que o mantém unido a Simon: o PMDB é um partido aberto, no qual cabe de tudo. Nos tempos de Movimento Democrático Brasileiro (MDB), foi o pai de todos os partidos de esquerda. Na hora do “vamos ver”, é ao PMDB, com sua grande bancada, que todos recorrem. Itamar, Fernando Henrique Cardoso, Lula e agora Dilma, que tem o vice-presidente Michel Temer, um ícone peemedebista.

Enquanto o PMDB for grande e unido, esse senhor de 46 anos não é páreo para nenhum partido “garotão”. E, por incrível que pareça, quem tenta resgatar a imagem tanto do partido é Sarney, a maior raposa política da legenda. Esse discurso, em ano eleitoral, é o início de uma conversa para tentar o avanço do PT sobre os municípios peemedebistas.

O casamento é para todos - JOÃO PEREIRA COUTINHO

FOLHA DE SP - 15/05


Espero que Obama continue a "evoluir" no assunto e nos brinde com a defesa apaixonada da poligamia



TENHO PENSADO ultimamente nas vantagens da poligamia. O amor exige fidelidade e exclusividade?
Admito que sim. E também admito que existe uma certa nobreza na velha ideia platônica de que somos seres incompletos, em busca da outra metade que nos falta. Os românticos não inventaram nada. Limitaram-se a ler "O Banquete".

Mas, por outro lado, não é justo, nem fácil, nem humanamente possível exigir de uma mulher que ela seja tudo e o seu contrário. Boa amante. Ótima confidente. Excelente dona de casa. Mãe aprumada. Parceira intelectual distinta. Enfermeira nas horas funestas.

A mulher perfeita não existe. Ou, melhor dizendo, ela existe, sim. Só que é composta por várias mulheres distintas.

Anos atrás, em viagem pelo Marrocos, visitei um amigo que me levou a conhecer as suas duas famílias: uma em Casablanca, a outra em Agadir.

A primeira mulher era a encarnação perfeita da sensualidade magrebina -olhos negros, cabelo idem, lábios generosos e carnudos. Cinco minutos bastaram para perceber a função daquela senhora na vida daquele homem feliz.

A segunda mulher era menos exuberante (digamos assim); mas fazia um cuscuz como só voltei a provar em viagem recente ao Nordeste do Brasil. Tão diferentes, mas tão complementares.

Fiquei convencido sobre as vantagens do arranjo. E antes que a leitora me acuse de machismo obscurantista, esclareço já: quem fala em poligamia fala em poliandria.

Nenhum homem pode ser tudo para uma só mulher. Por isso esperava um pouco mais das declarações de Barack Obama sobre o casamento gay -mais do que apenas "hélas" sobre o casamento gay.
O presidente americano, em gesto inédito para ano eleitoral, disse na televisão que "evoluiu" sobre o assunto. É agora favorável à união matrimonial de lésbicas e homossexuais, embora deixe para os Estados a decisão final sobre o assunto.

O raciocínio de Obama é conhecido: quem somos nós, a maioria heterossexual e opressora, para negar a felicidade a duas pessoas do mesmo sexo que querem se casar?
Eis, em resumo, a essência do pensamento progressista. Um pensamento que os filósofos Sherif
Girgis, Robert P. George e Ryan T. Anderson analisaram no melhor ensaio que conheço sobre o tema: "What is Marriage?".

O casamento, para o pensamento progressista, é uma mera construção social, sem uma história ou um propósito distintos. O casamento deve apenas basear-se no afeto; e basta que exista afeto entre dois seres humanos adultos para que o Estado reconheça o vínculo matrimonial, distribuindo direitos e deveres pelos cônjuges.

O problema, escrevem os autores do ensaio, é que essa definição sentimental de casamento não pode se limitar a lésbicas e homossexuais.

Se o casamento pode ser tudo o que quisermos, não há nenhum motivo para recusar o privilégio a um homem que queira se unir a várias mulheres. Ou a uma mulher que queira se unir a vários homens.
O próprio Obama deveria saber disso: só nos Estados Unidos, é possível que existam mais de 500 mil relações poligâmicas, informava há tempos a revista "Newsweek", citada no ensaio. O número de homossexuais que desejam casar-se é superior a esse número?

Talvez. Mas falamos de um princípio, não de uma questão numérica: se 500 mil relações poligâmicas vivem à margem da lei, não devemos também respeitar a felicidade -no fundo, o "afeto" dessa vasta legião de apaixonados?

Por mim, ficaria encantado. Até porque as relações poligâmicas não vivem apenas à margem da lei. Elas são punidas pela lei. Eu invejo o meu amigo marroquino. Mas, se pretendesse imitar o seu modo de vida, casando-me com duas donzelas da minha preferência, a Justiça não perdoaria o crime.

Moral da história? O mundo não acaba com os direitos dos homossexuais. E não é possível defender o casamento gay sem defender também todas as outras formas de união conjugal. Abrir uma exceção é abrir todas as exceções. Negar isso é perpetuar a intolerância.

Espero que o presidente Obama continue a "evoluir" sobre o assunto e nos brinde em breve com a defesa apaixonada que a poligamia merece.

Vade retro, Delta! - ILIMAR FRANCO


O GLOBO - 15/05

A presidente Dilma está irritada e não quer que a operação J&S/Delta caia no colo de seu governo. Assessores não sabiam ontem dizer exatamente o que vai acontecer, mas disseram que algo será feito para dar uma demonstração cabal de que não há cumplicidade. Aliado, o deputado Miro Teixeira (PDT-RJ) vai acionar a AGU para que esta obtenha na Justiça decisão de que todos os pagamentos à Delta sejam feitos em juízo para assegurar o ressarcimento aos cofres públicos de perdas.

A pressão sobre o PGR
Não são mais apenas os petistas da CPI do Cachoeira que questionam o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, no caso da Operação Vegas. Gurgel começou dizendo que ele não abrira inquérito contra o senador Demóstenes Torres (GO) para não prejudicar outra operação. Ocorre que os fatos derrubaram essa versão. A Operação Monte Carlo foi deflagrada muito tempo depois e a pedido do Ministério Público de Goiás. Já, no caso da Operação Vegas, criada para investigar corrupção de policiais federais, no governo se considera esquisito que a Procuradoria tenha parado a investigação, inclusive sobre corrupção policial.

"Quem decide sobre procuradores é o Conselho do Ministério Público. Quem decide sobre governadores? O STJ” — Walter Pinheiro, líder do PT no Senado (BA)

NO LIMITE. O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, não gostou nem um pouco de ter entrado na agenda negativa da Delta, devido à compra da empreiteira pela J&S, holding de um leque de empresas que inclui a JBS. Ocorre que a J&S não tem razões legais para informar o banco sobre seus negócios. Mesmo assim, por ter jogado o BNDES no meio da confusão, há grande mal-estar na instituição contra o acionista majoritário da JBS.

Os dois Cachoeiras
Quando a CPI foi instalada, o contraventor Carlos Cachoeira falou grosso e ameaçou contar tudo. Ontem, às vésperas de depor, afinou a viola e pediu para seus advogados impedirem que ele fosse à CPI exercer sua bravura.

Boca no trombone
O governador Marconi Perillo (PSDB-GO) está convencido de que a CPI vai convocá-lo para depor. Ele decidiu que vai comparecer. Fará sua defesa e aproveitará para propor a criação de uma CPI para investigar as empreiteiras.

Ataídes contesta relato de sessão secreta
O suplente de senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) ligou para dizer: "O (delegado) Matheus (Mella Rodrigues) me disse que não disse à CPI que havia suspeita de lavagem de dinheiro." Fica o registro. Os integrantes da CPI garantem que não foi assim. Um deles reproduziu suas anotações: "O delegado relatou: "Interceptamos um telefonema em que uma pessoa queria apresentar Ataídes Oliveira para uma mulher que trabalha com contas no exterior em bancos da Suíça"." E acrescentou que o assunto seria investigado.

Jeitinho
A presidente Dilma vai aproveitar a Lei de Acesso à Informação para cumprir decreto de 2002, que nunca foi atendido, e publicar a agenda detalhada dos ministros, secretários e chefes de gabinete. A sugestão foi feita pela CGU.

Grau de acesso
A Lei de Acesso à Informação não muda a classificação das informações governamentais. Os gastos com o cartão corporativo da Presidência com custeio, viagens presidenciais e manutenção dos palácios continuarão secretos.

OS MINISTÉRIOS terão que informar, com a vigência da Lei de Acesso, quem os ministros receberam, o assunto tratado e a duração da reunião.

A excluída. A única pessoa que não vai cumprir esse item do decreto será a presidente Dilma. A justificativa é a de sempre: informação protegida por motivo de segurança institucional.

A SALVO. As regras também não mudam, com a Lei de Acesso, para aquelas informações que foram classificadas como sigilosas nos governos militares. 

Ateus de Jeová - HÉLIO SCHWARTSMAN

FOLHA DE SP - 15/05

Jack Terpins, presidente do Congresso Judaico Latino-Americano, escreveu um texto (Folha, 10/5) em que corretamente criticava as novas modalidades de antissemitismo, mas acabou recaindo no mesmo tipo de preconceito que condenava ao incluir o ateísmo entre as novas faces da intolerância.

Afirmar que não existem provas da existência de Deus e sugerir que o fenômeno religioso pode não passar de uma exacerbação de certos vieses da mente humana, como fazemos os ateus, não implica tomar posição contra os judeus ou Israel.

Autoridades religiosas judaicas, porém, andam preocupadas com o avanço do secularismo em geral e do ateísmo em particular pela simples razão de que esses movimentos são particularmente fortes entre judeus.

Como diz Phil Zuckerman em Invitation to the Sociology of Religion, os judeus talvez sejam o menos religioso dos grupos "religiosos" do mundo. Nos EUA, onde existem quase tantos judeus quanto em Israel, só 22% dizem que a religião é "muito importante" em suas vidas, contra uma média nacional de 60%. Os judeus americanos são a categoria que menos frequenta o templo, reza, crê na vida após a morte e considera que a Bíblia é a palavra de Deus.

Em Israel, oficialmente um Estado judaico, a situação não é muito diferente. O país aparece entre os 20 primeiros na lista de nações com maior proporção de ateus e agnósticos do mundo -entre 15% e 37%. Um trabalho de 1995 indicou que quase 50% da população se classificava como não religiosa (lo dati, em hebraico), contra 20% de ortodoxos. É fato que estes, por contingências partidárias, têm um poder político desproporcional à demografia.

Para Zuckerman, faz mais sentido hoje classificar os judeus como grupo étnico do que como constituindo uma religião. Isso não resolve o problema dos rabinos, mas "salva" o judaísmo do ateísmo. Eu pelo menos me considero um bom judeu ateu.

Pão, pão… - SONIA RACY


O ESTADÃO - 15/05

“Para alguém querer comprar, alguém tem de querer vender.” Com esta frase, fonte do Pão de Açúcar descarta a aquisição, pela família Klein, da participação majoritária do grupo na Viavarejo – empresa que reúne as redes Casas Bahia e Ponto Frio.

A mesma fonte atesta que os Klein não procuraram o Pão de Açúcar, até este momento, para fazer qualquer oferta – e tampouco acredita na capacidade de eles levantarem recursos para tanto.

Mais: acha que os Klein… “não têm vontade para o trabalho”.

…queijo, queijo
A divulgação da intenção de compra teria como objetivo tumultuar ainda mais o complicado processo entre Abilio Diniz e Jean-Charles Naouri.

Boca fechada
Atendendo à convocação, Cachoeira vai depor na CPI – o que deve acontecer hoje.

Márcio Thomaz Bastos avisa: “Vou aconselhar meu cliente a ficar em silêncio respeitoso até que tenhamos acesso a todo o material probatório. Afinal, vivemos em um estado de direito…”

Boca fechada 2
Indagado após o jogo do Santos, domingo, José Eduardo Cardozo não quis comentar o caso Cachoeira. Pouco antes de adentrar o gramado do Morumbi – para acompanhar os meninos da Vila –, repetiu refrão adotado por boa parte dos ministros de Dilma. “A CPI é do Poder Legislativo, e o governo não vai interferir ou opinar”.

Em tempo: Cardozo é torcedor do São Paulo.

Pecado capital
Foi sábado o casamento de princesa, para 1.200 pessoas no Copacabana Palace, de Fabíola, filha de José Batista Junior– mais velho dos três irmãos da JBS e candidato ao governo de Goiás –, com Gabriel, neto do lendário João Fortes, da Fortes Engenharia. Cerimonial de Roberto Cohen, decoração de Daniel Cruz, show de Netinho.

O assunto na festa não foi outro: a compra da Delta.

Fonte da coluna na comemoração acredita que, com a recente declaração de Junior – de que o governo aprovou a aquisição da Delta –, foi criado o “fogo irmão”. Ainda que presentes (e sorridentes) os manos Joesley e Wesley.

Céu, o limite
Conhecido executivo achou curioso o nome escolhido pela família Batista, da JBS, para batizar seu iate: Why Not?

Agendado
Dilma deve receber hoje Ricardo Flores, da Previ. Para dizer que ele vai assumir a BrasilPrevi.

Tic-tac
Faltando pouco mais de um mês para a convenção nacional, o PT tenta evitar o isolamento de Fernando Haddad.

Lula foi “convocado” para atrair o PR. Ou seja, convencer a presidente a dar mais espaço à sigla no governo federal. Para evitar desgaste, os recados serão enviados por meio de um interlocutor: Rui Falcão.

Tic-tac 2
As negociações com o PCdoB também estão encrencadas. Ala do partido, capitaneada por Netinho de Paula, ameaça fechar com Gabriel Chalita. Dirigente do PT-SP minimiza: “Eles estão se valorizando. Eu faria o mesmo”.

Superstição
A equipe de comunicação da campanha de Serra investiu no simbolismo. Está instalada, desde ontem, nos estúdios da GW, na Barra Funda. Mesmo “batlocal” de onde saíram vitoriosos os times de comunicação deCovas, em 1998; Alckmin, em 2002; do próprio Serra, em 2004; e de Kassab, em 2008.

Martelo batido
O grupo catalão Kalakan participará dos shows de Madonna no Brasil. Deve cantar Open Your Heart com a diva – que se apresentará por aqui em dezembro.

My mom
Obama entrou total na onda do Dia das Mães. Criou álbum em seu perfil no Facebook, com seis fotos de sua“mom”. Cerca de 84 mil pessoas “curtiram” a ação.

Quem vai
Carlos Ayres Britto, Paulo Bernardo, Ana de Hollanda, Aloizio Mercadante e Aldo Rebelo já confirmaram presença no lançamento doAcervo Estadão. Gilberto Gil, Ná Ozzetti, Arthur Nestrovski, Dinho Ouro Preto e Jair Rodrigues garantirão o ritmo. Dia 23, no Auditório Ibirapuera.

Na frente
Depois de assistir ao jogo do Santos, Alckmin voltou a pé para o Palácio dos Bandeirantes. Haja fôlego…

Paula Mendes Pinto abre, amanhã, sua Empório Body Store. No Shopping Vila Olímpia.

O Arábia faz jantar harmonizado com vinhos libaneses, trazidos da cidade de Eddé, região de Batroun. Hoje.

É sábado, no Tuca, a estreia da peça Enlace – A Loja do Ourives, sobre a vida do papa João Paulo II. Com Leka Begliomini no elenco.

A peça Véspera, de Camila Appel, tem pré-estreia amanhã. No Teatro Itália.

Soraya Soubhi Smaili fala no evento Imigrantes e Refugiados: Deslocamentos em um Mundo em Crise. Hoje, no CCBB.

Gisele Bündchen lança sua coleção de lingerie. Hoje, na Hope dos Jardins.

Adriana Praça pilota inauguração de sua marca homônima. Amanhã, nos Jardins.

A Tania Bulhões Home oferece jantar. Quinta.

Quem assistiu ao Elle Summer Preview desconfia que as marcas de beachwear evitaram antecipar muita coisa. Afinal, em duas semanas tem Fashion Rio na cidade maravilhosa.

Imóvel como bem social - VLADIMIR SAFATLE

FOLHA DE SP - 15/05




Ontem, esta Folha publicou uma pesquisa do Banco Interamericano de Desenvolvimento segundo a qual 62% da população da cidade de São Paulo não tem condições de comprar uma casa própria.

O motivo central é o preço extorsivo dos imóveis. No mesmo dia, descobrimos que um alto funcionário da prefeitura, responsável pela liberação de empreendimentos imobiliários, aproveitou-se da situação para demonstrar seus dotes de especulador imobiliário e comprar, em sete anos, a bagatela de 106 imóveis.

Essas duas notícias são, na verdade, dois lados da mesma moeda. A explosão dos preços dos imóveis em São Paulo, assim como em outras grandes cidades, está vinculada ao ataque especulativo.

Novos empreendimentos são comprados não por famílias que procuram, enfim, aproveitar o crescimento econômico e escapar dos aluguéis, mas por imobiliárias e especuladores. Seus interesses restringem-se a inflacionar o mercado fazendo, por exemplo, com que o preço médio dos imóveis na cidade tenha triplicado em quatro anos.

Como os imóveis são vistos, acima de tudo, como um tipo de investimento, o interesse maior consiste em criar situações de concentração de propriedade que facilite a "rentabilização" financeira.

Era de esperar que os governos transformassem o combate à especulação imobiliária em luta maior. No entanto, em vez de procurar defender seus cidadãos, o que vemos é uma associação incestuosa entre prefeituras e interesses do mercado. O que não é de estranhar, pois o setor da construção civil está entre os maiores doadores de campanhas eleitorais municipais.

Uma política realmente zelosa dos reais interesses dos cidadãos deveria começar por simplesmente impedir indivíduos e empresas de terem mais do que dois imóveis na mesma cidade.

Imóveis não são ativos de investimento, mas bens sociais. Não devem servir para que aqueles que nada produzem façam mais dinheiro sem nada fazer. Antes, eles são um bem maior que o Estado deve garantir para a segurança das famílias.

É claro que alguns verão nisso um atentado à propriedade privada. Entretanto mesmo a Constituição brasileira não hipostasia o direito de pro-priedade, pois a submete à exigência dela preencher uma função social.

Limitar a concentração oligopolista da propriedade no setor imobiliário é a maneira mais eficaz de ampliar o direito dos cidadãos a um bem fundamental.

Com isso, parcelas majoritárias da população não precisariam mais presenciar o triste espetáculo de ver suas economias espoliadas para valorizar as fortunas dos mais ricos.

O tempo fechou de novo - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 15/05


Ainda que a temporada de tumulto europeu passe logo, crise deixará mais sequelas -no Brasil também


DIAS NUBLADOS e feios como os de ontem em São Paulo são deprimentes e suscitam ideias melancólicas. A sucessão de más notícias sobre a economia mundial neste maio pode também passar a impressão de que o futuro é cinza-chumbo. Será?

A esta altura do ano, sabemos tão pouco do que será da crise mundial quanto do tempo em São Paulo na semana que vem. Mas alguns estragos econômicos já estão feitos, como se tivesse havido uma seca. Pode chover, mas já houve prejuízo, no Brasil também.

Talvez o Brasil cresça em 2012 tanto quanto no sofrível 2011: 2,7%.

Sim, trata-se outra vez do tumulto europeu e da indecisão chinesa. Depois de mais de três anos de crise aberta, talvez já tenha ficado claro que a agonia europeia, afora incertezas sino-americanas, afeta a sua poupança, leitor, suas aplicações, o valor da sua aposentadoria e, talvez, em breve, o tamanho da sua renda e da oferta de empregos.

Exagero? Veja o que ocorre na Bolsa -fuga de estrangeiros, do risco e, claro, os resultados ruins das empresas brasileiras derrubam o Ibovespa, estagnado neste ano. Os juros estão baixos também, principalmente devido à crise -lentidão aqui, risco de colapso lá fora. Quem der uma olhada no rendimento real de suas aplicações ou, talvez pior, de sua previdência privada vai levar um susto ruim. Não há rendimento bom em quase lugar algum.

Além do ritmo ainda mais decepcionante do crescimento europeu, que já seria levemente recessivo em 2012, o tumulto político recomeçou, o que vai deixar sequelas nos mercados financeiro e de crédito. Vai se espalhar o medo ou no mínimo cautela nos empresários do mundo inteiro.

Empresários menos confiantes contratam menos, investem menos. A gente viu isso no ano passado, aqui no Brasil também. Além das medidas do governo para conter o crédito e a crise de final de ano na Europa, a desacelerada americana de meados de 2011 ajudou a aguar o crescimento brasileiro.

Nem se mencionem os problemas contínuos causados pelo marasmo mundial, como a supervalorização do real (que encarece nossos produtos industriais) e a sobra global de produtos industriais num mundo em que se consome pouco (o que derruba ainda mais as vendas da nossa indústria, o que, por tabela, afeta investimentos no setor).

Mesmo que não termine em colapso, o tumulto europeu vai demorar uns dois meses para passar, na melhor das hipóteses. Quanto mais durar, mais estrago, podendo atrapalhar mesmo a já medíocre retomada americana.

Para piorar, há números esquisitos na China. Os especialistas se entendem ainda menos sobre a China, uma economia difícil de acompanhar. Mas está mais difícil ver sinais de recuperação (quando não se veem de deterioração) para onde quer que se olhe na economia chinesa: imóveis, crédito, exportações, importações e até investimentos, o motor da economia deles.

Faz dois meses, em março ainda, fazia-se festa nos mercados e na mídia econômica, tal e qual ocorre no início de todos os anos desde 2009, no pós-crise. Espera-se que desta vez a queda de meio de ano é que seja o alarme falso, não a recuperação.

No mínimo, está tudo tão difícil de prever quanto o tempo em São Paulo.

O clube do Nextel - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 15/05


Um balanço dos depoimentos dos delegados das operações Vegas, Raul Alexandre Marques, e Monte Carlo, Matheus Mella Rodrigues, à CPMI do Cachoeira mostra para onde essas investigações podem ir, pois eles nada mais fizeram do que reproduzir o que está na íntegra dos inquéritos que comandaram.

O deputado Chico Alencar, que participa da comissão na qualidade de líder do PSOL, chama a atenção para um fato: existem nada menos que 60 números em série de aparelhos Nextel, relação que a Polícia Federal ficou de enviar à CPMI, assim como das pessoas que ligavam para esses números.

A verificação desses nomes é fundamental para se definir nível de vínculo com a organização, pois tais aparelhos, habilitados nos EUA e supostamente à prova de monitoramento e grampos, eram "exclusivos para a diretoria".

Usuários checavam habitualmente a "blindagem" das conversas sobre seus negócios escusos: "É seguro mesmo? Posso falar?"

Ainda está em análise, por peritos, material de "malotes" originário de 28 locais de busca, com cerca de 150 mídias: CDs, DVDs, pen drives, notebooks. Novos indícios, nomes e vínculos com a organização criminosa ainda podem surgir.

Pelo que a Polícia Federal descobriu, a organização criminosa de Cachoeira inicialmente explora jogos ilegais e, mediante propina, monta rede de proteção "oficial", envolvendo policiais civis, militares e federais, além de apoio político e busca de influência na Justiça.

A base inicial em Anápolis expandiu-se para Goiânia, Brasília e vários estados. Valparaíso e Águas Lindas eram chamadas pela organização e usuários de "Las Vegas do entorno".

Detectada, na investigação, prática dos crimes de corrupção ativa e passiva, peculato, contrabando, evasão de divisas, sonegação fiscal, violação de sigilo funcional, formação de quadrilha.

Entre autoridades públicas vinculadas à organização, segundo os delegados, são corriqueiros o tráfico de influência e a exploração de prestígio.

O faturamento bruto médio por casa de jogos era de R$ 1,2 milhão por mês, montante que no fim de ano subia para R$ 3 milhões. O Capo Cachoeira fica com 30% do lucro (assim como famiglia Quiroga, do "entorno").
A Polícia Federal identificou que, em parceria com a empreiteira Delta Construções, se promoveu um projeto de diversificação de atividades.

O dinheiro das atividades ilegais era depositado em contas-correntes de empresas em nome de laranjas: J.R. Construções, Alberto e Pantoja e Brava Construções. Com todo mês uma nova empresa de fachada sendo aberta: empresa laranja no Uruguai; Souza Ramos Corporation nas Ilhas Britânicas. É necessária investigação detalhada sobre cada uma delas.

Cachoeira tirou seu nome do quadro societário das empresas, só ficando com uma. Sua declaração de Imposto de Renda, em vista dos seus multinegócios "empresariais" e dos recursos de que dispunha e ostentava, é pífia.

Mas a disparidade entre a declaração e os gastos não é considerada crime, o que deve mudar na reforma do Código Penal.

A empreiteira Delta fazia depósitos sistemáticos e frequentes nas contas das empresas de laranjas da organização criminosa. O diretor de Goiás da empreiteira, Cláudio Abreu, que está preso, tinha conversas diárias e diversas com Cachoeira: "eram sócios em tudo".

Para a Polícia Federal, a tese de que Abreu fazia negócios sem conhecimento da direção da Delta é impossível. Há indícios de que ele reportava-se a seus colegas da direção da empresa, entre eles, Fernando Cavendish, envolvendo-a diretamente nos negócios da organização. Delta e Cachoeira aparecem nas investigações entrelaçados, em parceria societária oculta crescente.

Os contatos e referências da organização criminosa envolveram empresários, jornalistas ("setor" de comunicação era importante para ela) e agentes públicos de níveis municipal, estadual e federal, como secretários, prefeitos, vereadores, deputados estaduais, distritais, federais, ministros (também de tribunais superiores), funcionários de agências reguladoras e assessores. Eram as "pessoas politicamente expostas".

Inequivocamente, a autoridade pública mais íntima da organização era o senador Demóstenes Torres. "Ao angariar contratos para Delta no Centro-Oeste e em outras áreas do país, ele tornava-se sócio oculto da empresa", informa a Polícia Federal.

"Colocava-se sempre à disposição para usar sua influência política, em todas as esferas de poder, em favor dos negócios da organização". Cachoeira tinha grande articulação política, "suprapartidária", procurava influenciar vários detentores de mandatos.

Também se movimentava no campo eleitoral, discutindo candidaturas, sugerindo nomes e tratativas entre potenciais candidatos, em especial com o senador Demóstenes Torres.

Os vínculos políticos e a proteção policial mediante suborno davam a Cachoeira a sensação de intocabilidade: "Todo mês falam que estão me investigando, vão me pegar... e nada acontece", comentava no telefone Nextel supostamente inviolável.

Até aqui, o governo de Goiás, do tucano Marconi Perillo, foi aquele sobre o qual a organização criminosa mais ampliou seus tentáculos, podendo se falar mesmo, segundo a Polícia Federal, de um "governo paralelo": até o corregedor da Secretaria de Segurança Pública era do esquema.

A Organização tinha "cota" de indicações políticas no governo. O governador Marconi Perillo, citado 237 vezes em conversas, teve encontros diretos com Cachoeira, tratava-o amistosamente e vendeu sua casa para o próprio, recebendo cheques assinados por Leonardo Ramos, sobrinho do capo
.
As investigações mostram também intensas gestões para negócios com o governo do Distrito Federal, através de busca de contratos, legalização de terras (Ibran, Terracap, Incra) e outros "serviços".

Não foi detectado, até aqui, qualquer diálogo do governador petista Agnelo Queiroz com Cachoeira, mas há, porém, gestões de intermediários para que Agnelo e Cachoeira se encontrassem e indícios de que os encontros podem ter ocorrido, mas não havia autorização para investigação e eventual registro.

Velhos fantasmas - ELIANE CANTANHÊDE


FOLHA DE SP - 15/05


Os "velhos fantasmas" estão voltando, como alertou a presidente Dilma Rousseff ontem, uma segunda-feira particularmente caótica mundo afora e Brasil adentro.

As Bolsas despencaram e a Bovespa caiu 3,21%, praticamente zerando os ganhos do ano. O dólar ultrapassou pela primeira vez em anos a marca dos R$ 2 e fechou o dia bem perto dela. A inflação já extrapolou a meta e ninguém mais se lembra que existe (ou existia) um centro da meta.

A coisa parece ficar feia, com o Brasil baixando alegremente os juros, mas convivendo com dois riscos -ou seriam fantasmas? Inflação em alta, crescimento em baixa. As novas previsões já ficam abaixo dos 3% para 2012, com o detalhe de que a indústria é quem mais ajuda a puxar as expectativas para baixo.

A desindustrialização já acende uma luz amarela, que converte para vermelha em alguns setores, como o têxtil, graças à carga tributária infernal, aos buracos, trancos e barrancos da infraestrutura e ao custo da energia elétrica. Dizem os empresários que é o terceiro maior do mundo.

Enquanto isso tudo, e enquanto a CPI patina em manobras diversionistas e protelatórias, o que faz Dilma? Abre o saco de bondades. Pior: bondades que todos nós só podemos aplaudir, deixando o esperneio para um ou outro economista "morrinha".

Dilma formalizou um reajuste de mais de R$ 1,5 bilhão para um milhão de servidores ativos, aposentados e pensionistas, quase que simultaneamente ao anúncio do Brasil Carinhoso, que incrementa os desembolsos do Bolsa Família. Coisas de fada madrinha, talvez um tanto dissonantes em ambientes cheios de fantasmas ameaçadores.

Mas, enfim, ela deve ter uma avaliação precisa das contas públicas, tanto quanto todo mundo já sabe de antemão o resultado político: a economia mundial vai ladeira abaixo e a brasileira começa a sofrer solavancos, mas a popularidade de Dilma continua subindo que é uma beleza.

Nada mais que a verdade - NIZAN GUANAES

FOLHA DE SP - 15/05

 

Não existe mais empresa e marca; elas são uma coisa só, uma experiência só, uma verdade só



A era da informação significa, entre muitas coisas, que seremos cada vez mais transparentes, mais verdadeiros. Cada vez mais publicamos dados pessoais, profissionais e empresariais para quem quiser ver ou para quem queremos que veja. Os perfis nas redes são cada vez mais ricos e detalhados. As redes são cada vez mais ricas e detalhadas.

Se só o começo das novas tecnologias disparou esse big bang social, imaginem as redes sociais daqui a três, cinco, dez anos. Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, fala numa “lei do compartilhamento” (“law of sharing”), segundo a qual a quantidade de informações compartilhadas digitalmente dobrará a cada ano.

É muita informação.

Claro que é possível fazer circular informações falsas nas redes - elas são ótimas para isso também. Mas parece haver em nós uma vontade mais forte de comunicar o que somos, o que pensamos e o que sentimos.

Essa eterna busca da verdade, tão velha quanto o ser humano, agora tem ao seu serviço a tecnologia perfeita. O que não é casual nem subproduto de outras buscas. Criamos toda essa tecnologia de comunicação e informação justamente porque ansiamos por nos comunicar e informar. O conhecimento é a mãe do valor. Conhecer é valorizar.

As empresas abertas há muito tempo têm o saudável hábito de abrir seus dados ao público, o que revolucionou a economia. Quando mais pessoas souberam mais sobre as empresas, mais pessoas se sentiram seguras e estimuladas a investir nelas.

A verdade constrói. Constrói valor, constrói confiança, constrói prosperidade. Estamos cada vez mais perto dela.

Outro dia o Google abriu para o público seu Project Glass. Um protótipo de óculos que coloca no campo de visão todas as informações e conexões que a web pode oferecer. E ainda obedece ao seu comando de voz. É difícil explicar, de tão futurista. Sugiro dar uma olhada no vídeo que o Google subiu no YouTube para explicar. Basta digitar Project Glass e acompanhar o dia de um usuário dos óculos.

Já outro cientista quer criar um software que irá analisar automaticamente as coisas que você lê ou escreve num computador para dizer se aquilo é verdade ou não. São (r)evoluções como essas que colocarão cada vez mais em xeque o antigo regime no qual vivemos tão confortavelmente, inclusive na propaganda.

É o fim da marca fantasia e o começo da marca verdade. Não existe mais empresa e marca. Elas são uma coisa só, uma experiência só, uma verdade só. As marcas agora precisam ter personalidade, integridade e opinião.

E se devemos mais informação aos consumidores, temos muito mais informação para atendê-los. O turbilhão de dados que deixamos disponíveis nos softwares que nos cercam e nos servem 24 horas por dia começa a ser estudado e estruturado por estatísticos e outros cientistas e terão, em muitas áreas, o mesmo efeito que o sol rompendo a madrugada.

É uma luz que torna nossos hábitos transparentes para os bons pesquisadores. O estudo dos hábitos inclusive tornou-se área expoente da ciência, muito bem financiado por corporações, por institutos e por universidades.

Já sabemos que os hábitos muitas vezes são mais importantes do que o raciocínio na hora de tomarmos decisões e que, ao transformamos uma sequência de ações num hábito, como pegar o sabão durante o banho, a nossa atividade mental é muito menor. É muito difícil quebrar um hábito de compra - os publicitários sabem disso.

Em outra coluna que escrevi aqui, disse que a pesquisa estava sufocando a criatividade e a ousadia na propaganda, nos levando a uma acomodação em nome da acomodação do consumidor pesquisado. Uma acomodação hoje fatal.

Defendo esse outro tipo de pesquisa, não sobre o que o cliente/consumidor/cidadão quer, mas sobre o que ele é.

Note bem: a transparência total é inviável, até porque o direito à privacidade é fundamental e inviolável. Mas a tendência é clara, e precisamos nos adaptar. A nova realidade, ou a nova verdade, exigirá muito de nós.

Tributação e crescimento - ANTONIO DELFIM NETTO


Valor Econômico - 15/05/12


Como a história ensina, há aritméticas "desagradáveis" que impõem realismo às políticas sociais e econômicas com excessivo viés quer para o consumo (como é o caso brasileiro) quer para o investimento (como é o caso chinês). Elas sempre terminam de forma traumática quando não pressentidas e corrigidas no momento adequado. Há poucos dias a presidenta Dilma deu uma indicação precisa desse pressentimento quando afirmou que precisamos reduzir e melhorar a qualidade de nossa estrutura tributária, sem prejudicar as políticas públicas civilizatórias. No fundo foi uma reafirmação do seu programa inaugural: "Fazer mais com menos", ou seja, aumentar a eficiência do governo para acelerar o crescimento sem reduzir a política social de inclusão social.

A carga tributária bruta do Brasil é, de longe, a mais elevada de todos os países que têm uma renda per capita parecida com a sua e, pior: 1º) é absolutamente disfuncional. Tributa demais os investimentos que são o crescimento futuro e as exportações que financiam esse crescimento sem criar problemas externos; 2º) é absolutamente injusta e regressiva; 3º) é, talvez, a mais complexa do mundo; 4º) o Fisco persegue apenas a "facilidade" da tributação, como é o caso generalizado do "contribuinte substituto"; e 5º) conserva o mau hábito que tinha justificativa quando havia hiperinflação: o imposto é recolhido antes de o produto ser faturado e seu valor recebido pelo produtor.

É sempre difícil (e contestável) estimar as consequências sobre a taxa de crescimento do PIB de um sistema tributário que não começou muito bem na Constituição de 1988 e foi cuidadosa e sistematicamente distorcido ao longo das últimas duas décadas. Mas é possível ter uma ideia das profundas modificações estruturais que ele produziu nas relações entre o Estado e o setor privado.

Para ter uma intuição física do que aconteceu desde então, até 2011, imaginemos o PIB como a soma de uma "mistura" cujos componentes são, proporcionalmente, representados por todos os produtos produzidos no país. Suponhamos que em 1995 escolhemos uma unidade de medida que meça o PIB em 100 unidades dessa "mistura" (que inclui proporcionalmente desde o mais simples produto ou serviço, até o mais sofisticado equipamento de comunicação). Com um pouco mais de esforço, suponhamos que a população do Brasil (159 milhões de habitantes) no mesmo ano, seja também dividida em 100 unidades. Assim teríamos, em 1995, 100 unidades de PIB produzidas por 100 unidades de população, ou seja, "idealmente", uma unidade de PIB produzida por uma unidade de população.

Tomemos como "base" o ano de 1995. Como evoluíram o volume físico do PIB e a população até 2011? Usando os números do IBGE, o primeiro atingiu 161,9 unidades da mistura equivalente de 2005 (ignorando lentas mudanças produtivas estruturais). Se alguém quiser uma imagem mais "concreta", poderá simplesmente supor que em 1995 o PIB era igual a 100 toneladas da tal mistura e em 2011 atingiu 161,9 toneladas. Estamos interessados em saber como foi apropriado pelo governo e pelo setor privado o aumento das 61,9 unidades da mistura (ou toneladas).

O quadro abaixo mostra isso de forma esquemática, usando as informações disponíveis. É evidente que uma parcela do que foi "apropriado pelo governo" voltou, sob seu comando, ao setor privado por meio das políticas sociais civilizatórias de redução da pobreza absoluta, da melhoria da distribuição de renda, do déficit da Previdência e do pagamento dos seus serviços e investimentos, cuja eficiência e qualidade o governo precisa melhorar.

Produtividade do governo é menor que a do setor privado

O quadro mostra que tivemos um crescimento medíocre nos últimos 15 anos, da ordem de 3,3% ao ano. Como a população cresceu a 1,4% ao ano, isso nos deixou com um crescimento econômico per capita da ordem de 1,9%. A linha 2 da tabela mostra o único avanço robusto: o crescimento do PIB apropriado e distribuído pelo governo cresceu a 4,8% ao ano. Isso não pode deixar de ser preocupante do ponto de vista do crescimento econômico equilibrado, que depende, fundamentalmente, dos investimentos públicos que só agora parecem adquirir musculatura com a decisão de cooptar o setor privado por meio de concessões. Na margem, o governo se apropriou e distribuiu 48% do ganho de 61,9 unidades do PIB sem que, praticamente, tenha aumentado o seu investimento.

Outro ponto significativo é que desde 1995, a carga tributária bruta cresceu à taxa de 1,5% ao ano! O crescimento apropriado e distribuído pelo governo cresceu à taxa anual de 4,8% impulsionado pelos seguintes fatores: 1) crescimento da população, 1,4%; 2) crescimento PIB per capita, 1,9%; 3) crescimento da tributação, 1,5%

Não é necessário muita sofisticação para reconhecer que a produtividade do governo é menor do que a do setor privado e que, portanto, o aumento exacerbado do setor público tende a reduzir a taxa de crescimento econômico e, no fim, do social. É preciso, portanto, que a sociedade dê suporte a uma necessária reforma tributária que, esperamos, o governo tentará implementar no futuro próximo.

Repensando crédito e seguro rural - ANTONIO M. BUAINAIN


O ESTADÃO - 15/05


A Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) reuniu, no dia 26 de abril, expressivas lideranças do setor, autoridades e acadêmicos que atuam na área para discutir os instrumentos de crédito e seguro para o agronegócio. Algumas constatações merecem destaque: 1) as perspectivas são amplamente favoráveis para o agronegócio, mas é preciso plantar, com competência, o futuro, cujas bases estão apenas dadas; 2) o Brasil tem mais de 5 milhões de estabelecimentos agropecuários, mas só 1/5 deles gera renda agropecuária suficiente para manter os agricultores e trabalhadores acima do nível de pobreza; a maioria necessita, para sobreviver, de outras fontes de renda, e ainda assim um número expressivo de produtores rurais pequenos é pobre ou muito pobre; 3) o País dispõe de uma política agrícola sofisticada. Não se trata de inventar novos instrumentos, mas de fazer funcionar melhor os já disponíveis; 4) apesar de sua importância econômica e social, a agricultura brasileira é politicamente fraca, o que se reflete na debilidade do próprio Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) para levar a cabo as boas políticas que desenha; 5) os produtores rurais têm dificuldade para se unir e viabilizar uma agenda positiva, de médio e de longo prazos, que seja de interesse do setor. Prevalece a mobilização em torno de problemas conjunturais, tratados de forma descolada dos estruturais, e que por isso vão e voltam à agenda, transmitindo à sociedade uma imagem que não corresponde ao trabalho e contribuição dos produtores; e 6) as principais ameaças ao agronegócio do País são o subfinanciamento, o alto risco, o déficit de infraestrutura e a brecha da pesquisa.

Em todos os campos as políticas públicas evoluíram muito desde os anos 90. Mas em todos a atuação do governo é insuficiente e, ainda que aperfeiçoada e ampliada, não será capaz de responder aos desafios do setor. No ano safra 2011-2012, o crédito público para a agricultura comercial foi de quase R$ 110 bilhões, que, ainda assim, atenderam a só 1/3 das necessidades de financiamento. Sávio Pereira, do Mapa, sustenta que o preço mínimo é um seguro de preço abrangente e com prêmio zero, e que os produtores que não o recebem podem, teoricamente, entrar na Justiça contra o governo. Provavelmente morrerão antes de receber. O mesmo vale para a infraestrutura: o PAC é importante, mas largamente insuficiente. A alternativa é aprofundar a transição do modelo de intervenção bruta, sustentado apenas em políticas e recursos públicos, para o modelo mais brando que se utiliza do mercado e usa os recursos do Tesouro Nacional para alavancar recursos privados.

É convergente o pensamento de que as fontes públicas serão cada vez mais insuficientes e que atrair recursos privados é vital para alavancar o crescimento do agronegócio. Para Ricardo Conceição, ex-vice-presidente do Banco do Brasil, é preciso reduzir a regulamentação, que se justifica pelo "uso de recurso público a juro barato... mas que acaba gerando um crédito muito mais caro, sob o aspecto global". Perdem todos: produtores e sociedade, pelo alto custo e pela insuficiência de recursos.

Também se mencionou a necessidade de melhorar as informações sobre os produtores e seus negócios para facilitar a concessão de financiamentos pelos bancos. Isso é, sem dúvida, necessário, mas os bancos já conhecem boa parte de seus clientes e emprestam pouco e cobram juros elevados porque, no Brasil, dinheiro custa caro e os bancos têm outras opções mais rentáveis, e não por problema de informação.

Há, também, grande convergência de que o setor público desempenha papel relevante tanto no financiamento quanto na comercialização e seguro, mas que a atração de recursos privados depende de uma parceria confiável, que não pode ficar sujeita a reorientações das políticas a cada mudança de ministro nem a cortes de recursos, como ocorreu com as subvenções ao prêmio do seguro privado. Isso afasta os investidores e quem perde são os produtores e o Brasil como um todo.

Nossa cortina de ferro - JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SP - 15/05


A tarefa da comissão é muito mais complexa e improvável do que, em geral, se tem suposto



A Comissão da Verdade concretiza-se, amanhã, apoiada no otimismo que antecede as perspectivas muito desejadas e afinal vislumbradas. Mas não é o caso de otimismo algum. A tarefa da comissão é muito mais complexa e improvável do que, em geral, se tem suposto.

A confiança que está depositada na eficácia da comissão supõe nela poderes mágicos, capazes de enfim diluir todos os obstáculos -inúmeros e muito variados- que há mais de um quarto de século são como uma cortina de ferro à brasileira, verde-oliva.

A confiança justificada é a merecida pelos componentes da comissão, escolha preciosa à qual, por mim, faltou acrescentar José Gregori.

Os obstáculos que compõem a cortina não abriram sequer frestas, por ter sido aprovada a comissão. Estão todos aí, os mesmos. O "Tortura Nunca Mais", a Comissão Justiça e Paz e outras entidades fizeram pela justiça histórica e pela verdade humana uma obra extraordinária de coragem, abnegação e competência. Até encontrarem, sem mais recursos do que aqueles valores, os obstáculos que agora cabe à comissão, dotada de novos meios, enfrentar.

A própria Comissão da Verdade resulta da cortina de ferro. Já foi dito muitas vezes, "a Comissão da Verdade é o possível, nas circunstâncias". Ou não são democratas mesmo, ou não merecem ser vistos como sinceros, os que defendem a anistia "aprovada" pelos serviçais do regime no Congresso.

Para autores de crimes de morte com esquartejamento, assassinatos de empalados, e por enforcamento, por excesso de pancadas e choques, por amputações, pelas torturas mais horrendas. São monstros de desumanidade. Nisso equivalentes aos que enojaram o mundo por fazerem as mesmas coisas nos campos de concentração nazistas e com prisioneiros, civis mesmo, nas zonas da guerra.

Não há por que contar-se com repentinos acessos de coragem dos coronéis Ustras e dos policiais que com eles agiram, para regurgitarem as verdades dos seus feitos, só porque postos diante da comissão. Arquivos vão ser descobertos e estripados, é provável que outros sejam entregues, mas não será fácil obter colaborações para as respostas mais negadas até aqui. Por exemplo, a localização dos corpos desaparecidos.

Mesmo a aparente colaboração pode ser ardilosa, levando ao desvio de pesquisas para caminhos vazios -como já se deu tantas vezes no Araguaia e com despojos em São Paulo. Exemplo disso, bastou aproximar-se a hora da Comissão, logo apareceu um ex-torturador a expor farta salada de crimes reais da repressão e ficções amalucadas (a morte do delegado Sérgio Fleury valeria por todas as histórias: morreu de uma pedrada na cabeça -pedrada em uma lancha). Já outros se oferecem.

O otimismo fará esperar por verdades a que a Comissão, provavelmente, não poderá chegar. O que tenderia a provocar deduções e cobranças. Daí a importância da escolha de seus integrantes: não cabe dúvida alguma de que todos levam para a comissão seriedade e empenho no melhor grau.

MARIA CRISTINA FRIAS - MERCADO ABERTO


FOLHA DE SP - 15/05


Contratações no setor varejista de São Paulo crescem menos neste ano

O saldo de empregados no varejo na região metropolitana de São Paulo aumentou 4,1% em fevereiro na comparação com o mesmo mês de 2011, segundo a última pesquisa da FecomercioSP.

Apesar da alta, foi o menor crescimento dos últimos 12 meses. Em fevereiro de 2011, a expansão havia sido de 7%.

"Com uma base maior de contratados, fica difícil criar vagas líquidas", afirma Fábio Pina, da Fecomercio.

A queda no ritmo de contratações no varejo também é resultado do desaquecimento econômico.

"Ainda está em um nível saudável, mas, como tendência, preocupa", diz Eugenio Foganholo, consultor especializado no setor.

Foganholo não acredita que as medidas adotadas pelo governo, como a redução da taxa de juros, irão dar mais velocidade às vendas.

"As medidas ajudam, mas não asseguram que a curva volte para cima. A perspectiva é que o ritmo permaneça em queda até o final do ano."

O economista da Fecomercio, porém, afirma que as políticas do governo devem resultar em efeitos positivos no segundo semestre.

Pina também diz que, como o número de admissões está em patamar elevado (45,5 mil em fevereiro), uma grande parcela de desligamentos pode ter ocorrido por decisão dos empregados.

"O que significa que o mercado permanece aquecido."

batom forte

A marca francesa de maquiagem Make Up For Ever, que faz parte do grupo LVMH, desembarca no país em parceria com a gigante de cosméticos Sephora, em junho, e com o site Sack's, a partir de hoje.

A empresa espera que o Brasil se torne um de seus maiores mercados na região, onde ela atua nos EUA, Canadá e México.

"Esperamos que, nos próximos três anos, nosso negócio aqui se torne um dos dois ou três principais das Américas", afirma o diretor-geral da marca para as Américas JP McCary.

"O Brasil é um mercado emergente e está afinado com a nossa grife. Também percebemos outras empresas de moda e beleza vindo e soubemos que era a hora perfeita."

No mundo, os países onde mais vende são EUA, China e França.

queda brasileira

O otimismo dos investidores em relação ao Brasil diminuiu neste ano.

Pesquisa da EIU (Economist Intelligence Unit) mostra que houve uma queda de oito pontos percentuais entre os que consideram que o país tem o melhor potencial para alta de preços de ativos. Foi a maior retração registrada.

Na Rússia, houve perda de seis pontos percentuais. Na China e na Índia, de cinco. Apenas os Estados Unidos ganharam credibilidade.

Com o crescimento do PIB do país, ainda que pequeno, os investidores voltaram a considerar os ativos americanos atraentes, de acordo com o levantamento.

Cerca de 55% dos entrevistados também afirmaram que os países emergentes oferecem potencial para o crescimento dos preços de ativos, mas que esses mercados podem estar superaquecidos.

Foram ouvidos 800 executivos e investidores institucionais de 77 países.

CLINTON JÁ SUBIU

Quando indagado sobre o preço de suas palestras, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso desconversava, brincando que já precisava subir o valor cobrado.

Agora ele tem um estímulo a mais.

Ontem, a Biblioteca do Congresso anunciou em Washington, que FHC ganhou o Prêmio Kluge 2012 "por uma vida dedicada ao estudo de humanidades".

O prêmio no valor de US$ 1 milhão destaca a atuação do ex-presidente "na transformação do Brasil de uma ditadura militar com alta inflação em uma democracia inclusiva, com forte crescimento econômico."

A premiação cobre áreas não contempladas pelo Prêmio Nobel.

"Vou ter de subir [o valor das palestras]. O [Bill] Clinton já aumentou muito", gracejava FHC há cerca de 15 dias. Quanto ele subiu?

"A última vez que ouvi alguém falar, ele queria... -não é ele, são as pessoas em torno dele- US$ 300 mil, fora viagem e o resto."

As 'coisas-zumbis' têm vida própria - ARNALDO JABOR


O Estado de S.Paulo - 15/05


Antigamente tínhamos um norte, ilusório ou não. Hoje, vivemos numa permanente incerteza que tentamos deslindar com mecanismos antigos. O colunista ou comentarista se empoleira num pódio de opiniões e fica deitando regras. Como eu, hoje em crise.

E aí? Qual é essa de um sujeito ficar dizendo o que acha certo ou errado na Paisagem? Fico falando na TV,escrevendo nos jornais, tentando ser relevante, tentando salvar alguma coisa que nem sei o que é. Salvar o quê?

Antigamente, era mole. O mal era o capitalismo e o bem era o socialismo. Agora,os intelectuais, caridosos de carteirinha, cafetões da miséria, santos oportunistas estão em pânico, pois não conseguem pensar sem almejar alguma forma de 'totalidade'.

Mas,isso acabou. As coisas estão controlando os homens. As coisas tomaram o poder e nós, seus escravos, criamos nomes: 'neoliberalismo, esquerdismo, nacionalismo', um reducionismo apressado para nos dar a ilusão de controle. Mas, hoje, a marcha das coisas zumbis já começou.

Diante dessa invasão dos vampiros de mercado e da tecnociência incontrolável, o pensamento ‘progressista’ ficou lamentoso, tristinho de tanto absurdo, tanto na guerra internacional como no caos brasileiro. De que adiantam os queixumes?Como falar em democracia com muçulmanos analfabetos que desde o século 8.º batem a cabeça nas pedras para exorcizar qualquer ‘perigo’de liberdade, repetindo mantras do Corão, enquanto, do outro lado, os caretas republicanos competem para ver quem é mais reacionário e escolhem esse Romney a repetir mantras da Bíblia fundamentalista? É terrível ver a vitória das religiões sobre a razão, é feio ver o século 21 começando na Idade Média, com bilhões de seres dominados por Alá, combatidos pelo Deus da indústria de armas.O homem bomba matou o Eu.

Surge no horizonte da crise uma nova 'razão irracional' (se é que o oximoro é possível), pois vemos a direita crescer no mundo, junto a uma esquerda cada vez mais neoestalinista, uma razão burra e organizada, fascistoide, principalmente na América Latina.

O problema é que não conseguimos abrir mão do "eu", do desejo de ser um profeta ou professor ou comandante, tanto no pensamento, na política e nas artes.E,no entanto,vemos que o mundo se move como uma máquina própria.Os indivíduos viraram apenas uma peça ínfima que às vezes dispara novas rotas para as catástrofes. O "eu" virou um privilégio para poucos. Hitler foi um "eu" que encarnou o rancor nacional da Alemanha. Décadas depois, Osama foi um novo "eu" para atacar a modernização do Ocidente, supremo pavor (e desejo) do Islã. Do outro lado, Bush arrasou a América e o mundo. Dois psicopatas mudaram o tempo. Achávamos que tudo se moveria pelas grandes forças socioeconômicas e acabamos mudados por um maluco religioso e um imbecil alcoólatra.O mal difuso elege apenas seus operadores.

E no meio,entreoindivíduoeamassa, respira a liberdade como um bicho sem dono, a 'liberdade' - essa coisa que nos provoca tanta angústia. Que liberdade? Contra um mal teórico ou a favor de um bem inapreensível? A único consolo que resta ao "eu" é o narcisismo como moda social, a acumulação de riquezas, charmes e ilusões. É o nascimento do eu-boçal. Seria o eu-burguês, ou eu-Miami. Ou então, o 'eu' como uma espécie de prêmio para quem furar o muro do anonimato, para quem conseguir criar um eu fantasioso, um eu excêntrico, um eu que mostra a bunda,um eu de silicone ou um eu-big brother. O indivíduo está cada vez mais ridículo.

Quem fala debaixo dessas duas letrinhas: o "Eu"? Quem foi que inventou essa voz, esse brado que soa de dentro de um organismo, a partir do qual o mundo é contemplado, o que é essa voz cheia de certezas, quem são esses corpos opinativos que se pensam diferentes, mas são produzidos em série? Eles pensam:" Eu quero ser inconformista como todo mundo..." O eu dos intelectuais está humilhado...

Há um grande desânimo de pensar, de escrever,de análises sobre algo morto e inevitável e que já foi decidido. Refletir, fazer obras de arte, pra Quê? Sem alguma esperança não há filosofia.

O eu está sem orgulho, inútil. E aí,volta minha crise do início deste artigo deprimido (quem aguentou ler até agora?): como analisar racionalmente um país num tempo em que ninguém comanda? Não dá. Tenho de utilizar novos conceitos para isso. Tenho de me conformar que não há mais solução para muitos problemas. Nem para o terrorismo,nem para a miséria e seus crimes. Nem na guerra, nem no tráfico de São Paulo, por exemplo. Está tudo incorporado ao arquivo morto da História.Acabou o sonho de um futuro harmônico. O século 21 vai ser uma bosta mesmo.

O encontro de Berlim - GILLES LAPOUGE


O Estado de S.Paulo - 15/05


Hoje será um dia pesado para François Hollande. Pela manhã, ele assume a presidência da França. Em seguida, recebe algumas figuras de praxe, visita o Túmulo do Soldado Desconhecido. Depois, faz um passeio para manter contato com o público. No fim do dia, parte para Berlim. No programa: salvar a Europa.

Berlim será seu batismo de fogo. Como ele se entenderá com a chanceler Angela Merkel? Que remédios ambos devem prescrever para a Europa? Os métodos de Merkel são conhecidos. Segundo ela, só um rigor implacável fará com que Grécia, Espanha, Itália e Portugal escapem do desastre.

A análise de Hollande é outra. Para ele, o rigor é importante, desde que associado a medidas que promovam o crescimento. Ele pretende renegociar o terrível pacto orçamentário imposto pela chanceler alemã aos países europeus. Hollande quer a revisão desse acordo, que seu rigor seja abrandado, acrescentando uma seção prevendo que promovam o crescimento. Merkel já respondeu a essa questão: "Não".

A posição de Hollande, presidente novato, diante de um peso pesado como Merkel, é débil. No entanto, ele tem alguns trunfos.

No domingo, a chanceler recebeu uma bofetada. O poderoso Estado da Renânia do Norte-Westfalia infligiu uma dura derrota eleitoral para ela. Hannelore Kraft, do Partido Social-Democrata (SPD), que já dirigia essa região, aumentou sua hegemonia, derrotando o candidato de Merkel.

Flexibilização. Boa notícia para o novo presidente francês. Não só porque ele é socialista, como Hannelore Kraft, mas, sobretudo, porque o SPD também gostaria de tornar flexível o rigor cego que serve de bússola para a chanceler.

Como Hollande, o SPD quer que o pacto orçamentário, que ainda não foi ratificado pelo Parlamento alemão, seja completado por medidas que favoreçam o crescimento econômico.

Um outro elemento: o primeiro encontro entre o francês e a alemã ocorre no momento em que a crise atinge um ponto em que o retorno é impossível. A Grécia, que vem sendo ajudada há dois anos por Merkel, está no fim de suas forças. Sem dinheiro, sem governo, desesperada, ameaçada por comunistas extremistas e neonazistas.

Atenas é um barco à deriva. Claramente, o remédio oferecido por Merkel, que custou à Europa centenas de bilhões de euros e levou a Grécia ao desespero, causando suicídios e milhões de mendigos, não teve o mínimo resultado. A revista Der Spiegel, que até agora defendia a permanência da Grécia na zona do euro, mudou de ideia. "Acrópole, adeus", é o título de a matéria de capa publicada nesta semana (mais informações no Caderno Economia).

Quem dera fosse só a Grécia. Mas não. O fato é que a Espanha também está revoltada. Centenas de milhares de "indignados" gritam o seu pânico. Na Itália, o grupo chamado Federação Anarquista Informal (FAI) fez explodir coquetéis molotov e tem feito outras ameaças. Como não pensar na infâmia das Brigadas Vermelhas, que ensanguentou a península nos anos 70 e 80? É nesse cenário que se levantam as cortinas para o primeiro encontro entre Hollande e Merkel.

O que quer dizer que ambos estão condenados a se entender, caso a ideia seja mesmo impedir que o fogo se espalhe por toda a casa europeia. O que é exigido deles é uma façanha: balizar juntos o caminho invisível que passa entre o rigor glacial e uma ajuda prudente ao crescimento econômico. Se é que esse caminho realmente existe. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

Governo esquizofrênico - RODRIGO CONSTANTINO


O Globo - 15/05/12


A cruzada do governo pela queda da taxa de juros representa um fim nobre, mas com instrumentos inadequados. Ninguém pode celebrar as enormes taxas cobradas pelos bancos. Mas o governo erra feio na escolha dos alvos.

O juro nada mais é que o preço do capital, e costuma ser definido pelo encontro entre sua oferta e demanda. Quanto maior for a oferta disponível de capital na economia, menor será seu preço. E esta oferta depende basicamente da poupança existente, que serve como lastro para empréstimos bancários. Os bancos atuam como intermediários entre poupadores e investidores ou consumidores financiados.

No Brasil a poupança é muito baixa em relação ao que é produzido. O principal responsável por isso é o próprio governo, que arrecada e gasta quase 40% do PIB. Sobra pouco para se poupar no país. Como o governo não aceita reduzir seus gastos, resta pegar poupança externa emprestada para permitir o crescimento tanto dos investimentos como do consumo. Mas há claros limites a esta estratégia.

Ela dura somente até os estrangeiros aceitarem exportar capital para o Brasil. Só que esta entrada de recursos, que a presidente Dilma chamou de "tsunami monetário", pressiona o câmbio, apreciando o real frente ao dólar. A indústria nacional reclama, faz lobby em Brasília, e o governo reage com intervenção na moeda e protecionismo. Só que isso, por sua vez, produz mais inflação aqui.

O governo pretende controlar inúmeras variáveis econômicas com instrumentos limitados, gerando consequências indesejadas. Cada nova medida produz mais efeitos não intencionais, demandando nova intervenção. Cria-se um verdadeiro emaranhado complexo com os tentáculos estatais pela economia.

Os empresários acusam o golpe e retraem investimentos, e os bancos, preocupados com o aumento da inadimplência e com os excessos no crédito, decidem reduzir seu crescimento.

Mas como uma das metas do governo é o crescimento do PIB no curto prazo, este recuo é inaceitável. O que faz o governo então? Reduz seus gastos? Aprova reformas estruturais que aumentem a produtividade da economia? Não. Isso tudo dá muito trabalho.

O governo prefere comprar uma briga com os bancos, e mandar o setor baixar as taxas na marra. E ai de quem reclamar! O governo é dono de 40% do mercado por meio dos bancos públicos, e ainda conta com outros mecanismos de pressão.

Aqui aproveito para fazer um alerta contra o risco autoritário. O governo, com postura arrogante, teria exigido dos bancos uma retratação pública após uma nota da Febraban criticando as medidas estatais. Que país é este que não permite mais o contraditório? Os bancos não podem mais discordar das medidas do governo?

Reduzir os juros a fórceps vai gerar apenas mais inflação. O que nos remete finalmente à esquizofrenia do governo. Há outros fatores que justificam os juros altos: o enorme compulsório que os bancos são obrigados a manter parados no Banco Central sem retorno adequado; os bilionários desembolsos do BNDES, que responde por um quarto do total do crédito no país, a taxas de juros subsidiadas (abaixo até da inflação); e o excesso de burocracia que reduz a concorrência no setor.

Ou seja, o próprio governo cria distorções que fazem com que a taxa final de juros permaneça elevada, e depois escolhe os bancos como únicos bodes expiatórios para o problema que ajudou a criar.

É como um sujeito ocioso e obeso, que come doces sem parar, culpar o doceiro por seus problemas de saúde. O governo plantou as sementes do problema, e não adianta atacar apenas o sintoma sem olhar para suas verdadeiras causas.

Há ainda outro sinal claro de esquizofrenia. Não faz muito tempo, o então presidente Lula acusava os banqueiros pela crise financeira mundial. Os banqueiros gananciosos teriam concedido crédito demais, o que produziu a bolha que estourou. Ironia das ironias, eis que agora o governo Dilma reclama que os nossos banqueiros querem conceder crédito... de menos!

O crédito no Brasil vem crescendo a taxas perto de 20% ao ano. Como não tivemos reformas estruturais, é claro que isso vai bater na inflação em algum momento. Na verdade, a inflação já está acima do centro da meta, que já é bastante elevado. E o crescimento econômico vem caindo.

Corremos o risco de ter estagflação ou então uma bolha de crédito no país, fomentada pelo próprio governo e seu banco central subserviente (seu presidente se entrega quando chama Dilma de "presidenta" em nota oficial). Depois não vai adiantar culpar os "loiros de olhos azuis" e os banqueiros gananciosos pela crise...

Obra em aberto - DORA KRAMER

O Estado de S.Paulo - 15/05


Anunciado desde o início do ano como o escolhido de Lula para tentar tirar a Prefeitura de São Paulo da área de influência do PSDB e assim iniciar uma ofensiva - a ser concluída na eleição estadual de 2014 - sobre a mais importante cidadela da oposição, Fernando Haddad continua sendo uma incógnita.

Estacionado no patamar de 3% das intenções de voto a menos de dois meses do início oficial da campanha e a cinco da hora fatal, nem ele sabe direito o que pode acontecer nessa disputa considerada "um passeio" pelo PT antes da decisão dos tucanos de entrarem no jogo com José Serra.

Espera, evidentemente, que aconteça o melhor. A conquista de uma vaga no segundo turno sustentada nos seguintes pressupostos: a entrada de Lula na campanha, a alta avaliação negativa do prefeito Gilberto Kassab, a fadiga do material tucano, o fator "novidade", a força política do PT, a influência do partido na periferia assegurada por declarações de apoio da senadora Marta Suplicy no horário eleitoral e uma aguardada adesão de notáveis tradicionalmente ligados ao PSDB, mas agastados com Serra.

O trunfo principal, claro, é Lula, cujo peso na sedução do eleitorado seria de 8 numa hipotética escala de zero a 10, segundo avaliação do candidato feita a assessores.

Haddad entra com o perfil de moço bom, bem educado, estudado (formação em Direito, Economia e Filosofia), jovem (49 anos), finíssima estampa, um discurso de mudança - sustentado na ideia força de que São Paulo não "brilhou" como "brilhou" o Brasil nos últimos nove anos - e a direção de cena assinada por João Santana.

Traquejo político Fernando Haddad não tem. Vê-se logo que não é um profissional do ramo e ainda não adquiriu fluência no desenvolvimento do tema. Não necessariamente um defeito, antes uma característica.

A isso seus aliados contrapõem os argumentos de que Dilma tampouco exibe tais atributos e, considerando a imagem da "categoria" junto à opinião pública, quem sabe pode vir até a contar como vantagem.

Ademais, tal expertise Lula tem de sobra. Tanto que a grande expectativa de "mexida" nos índices está concentrada na participação do ex-presidente nas inserções de televisão a que o PT terá direito já nesta semana.

São três "spots", todos presumidamente estrelados pelo ex-presidente. Só e/ou na companhia do candidato. O desafio, nessa primeira operação de exposição, será fazer o eleitor estabelecer a ligação Lula-Haddad e interpretá-la como benefício para a cidade.

A conexão é um fator determinante na visão da campanha petista, mas há outros pontos considerados investimentos essenciais: alianças partidárias com vistas ao tempo de propaganda na televisão, plano de governo e estratégia para capitalizar a insatisfação do eleitorado com o campo adversário.

E por inimigo leia-se o PSDB. Mesmo a campanha petista partindo do princípio de que Serra estará na final e, portanto, havendo só uma vaga em disputa, a ideia não é brigar com nenhum dos outros candidatos.

Primeiro porque a maioria não é considerada ameaçadora, mesmo alguns com índices bem melhores que Haddad nas pesquisas, mas vistos como concorrentes de voo curto.

A segunda razão está num pacto não escrito entre os candidatos de partidos da base governista no plano nacional, de não agressão mútua e concentração dos ataques em José Serra.

Passando para o segundo turno, Fernando Haddad tem como certo um cenário de todos contra um. Reside aí o sentimento de que uma vitória é perfeitamente possível apesar dos pesares iniciais tidos como naturais na perspectiva de uma candidatura desconhecida do grande público.

O petista até tem ouvido de analistas de pesquisa que a eleição está ganha. Verdade que os especialistas em questão têm preferência por ele. Haddad gosta de ouvir isso, mas o fato de ser estreante não faz dele um crédulo.

Prefere ver as coisas assim: diante do adversário forte, se perder não fará feio e se ganhar terá entrado na política já na tribuna de honra.