FOLHA DE SP - 03/09
Usamos a tecnologia e as redes sociais para montar pequenos altares públicos aos nossos umbigos
Você, leitor, que é pessoa versada em novas tecnologias, conhece o Google Now?
Eu não conheço. Eu não conhecia. Até ler Claire Cain Miller em prosa dominical para "The New York Times". Instrutivo.
O Google Now é um novo "app" (para usar a linguagem cafona dos ciberfanáticos) que envia informação para o utilizador mesmo antes de nós precisarmos dela.
Conta a autora que, depois da inscrição no Google Now, o bicho deu sinais de vida no celular. Com uma sugestão: era preciso sair 15 minutos mais cedo de casa para chegar no horário ao jantar. Isso porque o trânsito no centro estava uma barbaridade. Como foi possível ao Google Now saber tudo isso?
Sabendo. Cruzando informação. Primeiro, o "app" foi às reservas do OpenTable no Gmail da autora, só para confirmar a hora da reserva no restaurante.
Depois, através da localização do celular, deu uma espreitada no Google Maps, confirmou os endereços (da casa e do restaurante), fez as contas ao trânsito e deu a sua sentença. Era preciso sair 15 minutos mais cedo. O cenário é puro Philip K. Dick. Só na ficção científica o futuro é antecipado no presente de forma a alterar esse mesmo futuro. Existe até um conto de Mr. Dick, "Minority Report", que deu filme tolerável. Mas, como sempre, divago.
Ou, como sempre, talvez não. Porque essa pequena história não horroriza apenas pela forma totalitária como ela condiciona o futuro, transformando cada ser humano numa espécie de marionete da tecnologia.
A história horrorizou Claire Cain Miller pela quantidade de informação que uma empresa é capaz de saber sobre um ser humano. Onde ele está. Onde ele mora. Onde ele vai jantar. E até que rota ele costuma fazer para chegar do ponto A ao ponto B.
Não sei se o Google Now dá uma olhada no cardápio do restaurante e, atendendo ao histórico gastronômico da comensal, vai encomendando o filé no ponto e aquela garrafa de vinho que é aberta em ocasiões especiais.
Porque chegará o dia em que o Google Now saberá por antecipação quais são as nossas ocasiões especiais: lendo torpedos apaixonados ou até medindo, de cada vez que encostamos o ouvido ao celular, o nosso batimento cardíaco enamorado. E saberá tudo isso porque fomos nós a fornecer as informações mais relevantes sobre a nossa existência.
O recente escândalo com a Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos é um caso exemplar. Sim, mil vezes sim: não cabe ao governo americano violar grosseiramente a privacidade de cidadãos e estrangeiros, espiolhando e-mails e contas de Facebook.
Mas, oh Deus, é tão fácil e tão tentador! Antigamente, espionagem era coisa difícil. Perigosa. Demorada. Era preciso vigiar o suspeito --dias, semanas, meses. Conhecer as suas rotinas com precisão de mulher despeitada. Depois, era preciso entrar lá em casa, instalar grampos, sair sem deixar rastro.
E depois vinham novos dias, semanas ou meses em que era preciso escutar com paciência de santo todas as conversas, todos os suspiros, todos os roncos do sujeito.
Hoje, uma distopia como o "1984" de George Orwell seria incompreensível. Não é preciso nenhum aparato totalitário para saber quem somos, o que somos, o que fazemos, onde estamos, do que gostamos, do que não gostamos, com quem vivemos, onde nascemos, onde estudamos, o que estudamos, o que fazemos.
Nós próprios fornecemos essa longa lista de privacidades que fariam as delícias das antigas polícias secretas dos regimes totalitários. Alegremente. Publicamente. Voluntariamente. E cedemos por quê?
O filme é fraco, mas a frase é primorosa: "Vaidade: definitivamente, o meu pecado favorito". Assim falava "O Advogado do Diabo", pela boca diabólica de Al Pacino.
Que o mesmo é dizer: mergulhados na nossa irreprimível condição narcísica, usamos a tecnologia e as redes sociais para montar pequenos altares públicos aos nossos umbigos privados.
E, claro, nessa adoração onanista acabamos por destruir a mais importante conquista da civilização ocidental: esse espaço íntimo onde os olhos de terceiros não entram.
Nada disso desculpa os abusos do poder político? Fato. Mas quem não quer ser tratado como carne para canhão não deve exibir-se nas vitrines holandesas dos bairros vermelhos da internet.
terça-feira, setembro 03, 2013
Lula vem ou não vem? - ARNALDO JABOR
O Estado de S.Paulo - 03/09
Lula era linear. Dilma tem um desenho mais complicado. Lula era mais fácil de criticar, pois seu erro era mais nítido, óbvio, em sua carreira oportunista de ser um santo rei no País. Dilma é mais neurótica; não tem aquela solidez obstinada dos proletários que sobem na vida. Lula sofreu na infância, apanhou do pai e construiu uma estrutura de frieza, disfarçada de "amor aos seu povo", com a diferença de que ele se achava o povo de si mesmo. "Eu sou do povo, logo, meu desejo é o mesmo dele..."
O governo do Lula era rombudo e com rumo único. O governo Dilma é confuso em sua divisão esquizoide de querer ser moderno e antigo ao mesmo tempo. O que Lula aprontou com o Brasil vai ser a causa de muitos males que ainda vão se agravar. Dilma quer ser Lula e ela ao mesmo tempo.
A "presidenta, gerenta, comandanta" vive a missão impossível de ser socialista (ou o que isso ainda significa) e dirigir um País... Ah... Capitalista. A conclusão é que Dilma perdeu o controle da zona geral que Lula sabia "desorganizar" com esmero e competência. Sua única competência, aliás. Tudo que temos pela frente não é o fim de dois maus governos apenas; é o despertar de um caos institucional que será mais grave do que pensávamos. São erros fecundos e duradouros que vão marcar nosso caos durante muito tempo, mesmo com um governo novo. É uma herança que vai amaldiçoar o futuro.
Os diagnósticos sobre nós são iguais no mundo todo: uma presidente rachada ao meio por fissuras ideológicas e dominada pela fome eleitoral do PT, a fim de virar um partido mexicano como o PRI. Os europeus têm inveja e desprezo por nós, porque eles querem sair da crise e não conseguem, e nós temos tudo para nos salvar e não queremos.
Há alguma coisa "não acontecendo" no Brasil que me dá arrepios. As análises politicas buscam em vão uma síntese do que acontecerá. Ninguém sabe - a equação tem tantas incógnitas que torna nosso futuro imprevisível.
Este artigo é um rascunho de possibilidades, pois é impossível imaginar um futuro para nós.
Para administrar a democracia, é preciso acreditar nela. E no fundo dos petistas há um desprezo por esta "liberdade da burguesia". Assim, como administrar instituições não respeitadas? O resultado é um sarapatel de gestos e atos que se anulam mutuamente, por exemplo as concessões de obras de infraestrutura que barram a lucratividade de eventuais investidores. O governo tolera o capitalismo, mas é contra o lucro. Não acredita na sociedade, formada por uma classe média "alienada, reacionária e ignorante", no claro dizer de intelectuais orgânicos do partido. Eles acham que empreendedor é ladrão. Enfiar social-petismo no subcapitalismo do Brasil, está criando um "Bebê de Rosemary" (Noronha?).
As manifestações de rua entusiasmaram, mas também apavoraram pela falta de caminhos claros de ação. A beleza do conjunto foi grande, mas ninguém aponta uma solução para esse quebra-cabeças que somos. Claro, queremos saúde, educação, infraestrutura se instalou, mas, como romper a muralha da fortaleza do atraso? Como combater a resistência do patrimonialismo endêmico que nos corrói? Como mudar um Estado defendido pela burocracia, clientelismo, corrupção, preguiça, oligarquias regionais, incompetência tecno-ideológica? As dificuldades não são apenas "politicas", mas culturais, uma anomalia que há séculos gerou nossos conceitos de ética, leis, instituições arcaicas. Nós somos o que emanou de um torto processo civilizatório. Já sabemos um pouco o que fazer. Não sabemos como. Nem manifestantes nem os políticos, mesmo atemorizados.
E como o governo insiste nessa ambiguidade politica - muito difícil de manter - a tendência é a progressiva "bolivarização" (mais simples) do País, que já se percebe em ridículas bobagens como "médicos cubanos", timidez diante do Evo, aceitação do bode do Mercosul, isolamento terceiro-mundista, incompetência administrativa total justificada por um horror ao presente e um sonho idiota de "futuro".
Inclusive, mesmo no proposital vazio ideológico (e saneador) dos manifestantes, há uma tendência visível para uma (evitável?) aproximação com partidos da extrema esquerda e PT. É uma ideologia mais fácil de entender, com o bem de um lado e o mal de outro. Bom para slogans.
O governo só pensa em sua imagem eleitoral. Não é a mesma imagem das "celebridades", mas a imagem stalinista que se mantém pela mentira, pela manipulação de estatísticas, já na linha da Cristinita. Estou sendo muito duro? Pode ser, mas é revoltante nossa entropia, disfarçada por bravatas que o governo professa.
Também por razões ideológicas, as reformas essenciais de que o País precisa jamais serão feitas. Qualquer economista sério do mundo recomenda as mesmas medidas: ajuste fiscal, reforma tributária, eleitoral, diminuição do Estado, educação, saúde etc... Mas o governo prefere o trem-bala. Ou a Copa, onde gastou 30 bilhões, que davam para refazer o metrô de SP e construir 80 hospitais.
A falta de substancia do Executivo anima todo mundo a se lixar para a razão, a lógica, a decência. E tudo começa a se degradar diante do desconhecido.
Vai se instalando uma descompostura geral em tudo: a Câmara se suja gostosamente, já que diminuiu a pressão dos manifestantes de rua que, aliás, estão sendo desestimulados pela brutalidade dos encapuzados.
O ano de 2014 se anuncia como uma guerra suja de traições e mentiras, com cinco candidatos. As mensagens de estabilidade, as soluções apresentadas, as metas possíveis, serão tão difíceis de entender pelo eleitor comum que haverá uma grande fome de "clareza". E a resposta a esse desejo é o populismo sem peias, quando o País precisa justamente de ações pragmáticas e localizadas. O povo vai querer uma esperança qualquer e os malandros vão oferecer "previsibilidade".
E a única pessoa que sabe mentir bem e "explicar" isso tudo é Lula. Assim, o homem que, com alianças e narcisismo, trouxe de volta os piores erros do passado, vai oferecer "unidade e sentido". O restaurador do passado será a esperança de futuro.
Lula era linear. Dilma tem um desenho mais complicado. Lula era mais fácil de criticar, pois seu erro era mais nítido, óbvio, em sua carreira oportunista de ser um santo rei no País. Dilma é mais neurótica; não tem aquela solidez obstinada dos proletários que sobem na vida. Lula sofreu na infância, apanhou do pai e construiu uma estrutura de frieza, disfarçada de "amor aos seu povo", com a diferença de que ele se achava o povo de si mesmo. "Eu sou do povo, logo, meu desejo é o mesmo dele..."
O governo do Lula era rombudo e com rumo único. O governo Dilma é confuso em sua divisão esquizoide de querer ser moderno e antigo ao mesmo tempo. O que Lula aprontou com o Brasil vai ser a causa de muitos males que ainda vão se agravar. Dilma quer ser Lula e ela ao mesmo tempo.
A "presidenta, gerenta, comandanta" vive a missão impossível de ser socialista (ou o que isso ainda significa) e dirigir um País... Ah... Capitalista. A conclusão é que Dilma perdeu o controle da zona geral que Lula sabia "desorganizar" com esmero e competência. Sua única competência, aliás. Tudo que temos pela frente não é o fim de dois maus governos apenas; é o despertar de um caos institucional que será mais grave do que pensávamos. São erros fecundos e duradouros que vão marcar nosso caos durante muito tempo, mesmo com um governo novo. É uma herança que vai amaldiçoar o futuro.
Os diagnósticos sobre nós são iguais no mundo todo: uma presidente rachada ao meio por fissuras ideológicas e dominada pela fome eleitoral do PT, a fim de virar um partido mexicano como o PRI. Os europeus têm inveja e desprezo por nós, porque eles querem sair da crise e não conseguem, e nós temos tudo para nos salvar e não queremos.
Há alguma coisa "não acontecendo" no Brasil que me dá arrepios. As análises politicas buscam em vão uma síntese do que acontecerá. Ninguém sabe - a equação tem tantas incógnitas que torna nosso futuro imprevisível.
Este artigo é um rascunho de possibilidades, pois é impossível imaginar um futuro para nós.
Para administrar a democracia, é preciso acreditar nela. E no fundo dos petistas há um desprezo por esta "liberdade da burguesia". Assim, como administrar instituições não respeitadas? O resultado é um sarapatel de gestos e atos que se anulam mutuamente, por exemplo as concessões de obras de infraestrutura que barram a lucratividade de eventuais investidores. O governo tolera o capitalismo, mas é contra o lucro. Não acredita na sociedade, formada por uma classe média "alienada, reacionária e ignorante", no claro dizer de intelectuais orgânicos do partido. Eles acham que empreendedor é ladrão. Enfiar social-petismo no subcapitalismo do Brasil, está criando um "Bebê de Rosemary" (Noronha?).
As manifestações de rua entusiasmaram, mas também apavoraram pela falta de caminhos claros de ação. A beleza do conjunto foi grande, mas ninguém aponta uma solução para esse quebra-cabeças que somos. Claro, queremos saúde, educação, infraestrutura se instalou, mas, como romper a muralha da fortaleza do atraso? Como combater a resistência do patrimonialismo endêmico que nos corrói? Como mudar um Estado defendido pela burocracia, clientelismo, corrupção, preguiça, oligarquias regionais, incompetência tecno-ideológica? As dificuldades não são apenas "politicas", mas culturais, uma anomalia que há séculos gerou nossos conceitos de ética, leis, instituições arcaicas. Nós somos o que emanou de um torto processo civilizatório. Já sabemos um pouco o que fazer. Não sabemos como. Nem manifestantes nem os políticos, mesmo atemorizados.
E como o governo insiste nessa ambiguidade politica - muito difícil de manter - a tendência é a progressiva "bolivarização" (mais simples) do País, que já se percebe em ridículas bobagens como "médicos cubanos", timidez diante do Evo, aceitação do bode do Mercosul, isolamento terceiro-mundista, incompetência administrativa total justificada por um horror ao presente e um sonho idiota de "futuro".
Inclusive, mesmo no proposital vazio ideológico (e saneador) dos manifestantes, há uma tendência visível para uma (evitável?) aproximação com partidos da extrema esquerda e PT. É uma ideologia mais fácil de entender, com o bem de um lado e o mal de outro. Bom para slogans.
O governo só pensa em sua imagem eleitoral. Não é a mesma imagem das "celebridades", mas a imagem stalinista que se mantém pela mentira, pela manipulação de estatísticas, já na linha da Cristinita. Estou sendo muito duro? Pode ser, mas é revoltante nossa entropia, disfarçada por bravatas que o governo professa.
Também por razões ideológicas, as reformas essenciais de que o País precisa jamais serão feitas. Qualquer economista sério do mundo recomenda as mesmas medidas: ajuste fiscal, reforma tributária, eleitoral, diminuição do Estado, educação, saúde etc... Mas o governo prefere o trem-bala. Ou a Copa, onde gastou 30 bilhões, que davam para refazer o metrô de SP e construir 80 hospitais.
A falta de substancia do Executivo anima todo mundo a se lixar para a razão, a lógica, a decência. E tudo começa a se degradar diante do desconhecido.
Vai se instalando uma descompostura geral em tudo: a Câmara se suja gostosamente, já que diminuiu a pressão dos manifestantes de rua que, aliás, estão sendo desestimulados pela brutalidade dos encapuzados.
O ano de 2014 se anuncia como uma guerra suja de traições e mentiras, com cinco candidatos. As mensagens de estabilidade, as soluções apresentadas, as metas possíveis, serão tão difíceis de entender pelo eleitor comum que haverá uma grande fome de "clareza". E a resposta a esse desejo é o populismo sem peias, quando o País precisa justamente de ações pragmáticas e localizadas. O povo vai querer uma esperança qualquer e os malandros vão oferecer "previsibilidade".
E a única pessoa que sabe mentir bem e "explicar" isso tudo é Lula. Assim, o homem que, com alianças e narcisismo, trouxe de volta os piores erros do passado, vai oferecer "unidade e sentido". O restaurador do passado será a esperança de futuro.
Deixa para depois - CELSO MING
O Estado de S.Paulo - 03/09
Os sinais que vêm de Brasília são de que o governo Dilma parece convencido de que a política econômica dos últimos dois anos e meio já deu o que tinha de dar e que, se é para garantir melhor desempenho, é preciso mudar muita coisa.
Sexta-feira e ontem, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, advertiu para a necessidade de dar mais ênfase ao investimento. É uma afirmação de dentro do governo que embute uma crítica: a de que foi um equívoco ter puxado demais pelo consumo sem, ao mesmo tempo, ter aumentado a capacidade de oferta (produção) da economia.
Um dos grandes limitadores da oferta é a precariedade da infraestrutura. O agronegócio, por exemplo, apesar de enfrentar, como acontece também com a indústria, altos custos e impostos asfixiantes, continua dando show de produtividade. No entanto, isso acontece da porteira para dentro. Quando precisa transportar a safra esbarra no desespero logístico: condições precárias de armazenagem, estradas ruins, quilômetros e quilômetros de caminhões carregados à espera de liberação aos acessos dos portos - enfim, não é preciso alongar essa lista.
Finalmente, o governo parece ter entendido que os gargalos não estão no consumo insatisfatório, mas no baixo nível do investimento. O problema começa a ser atacado com mais leilões de concessões. Ainda é pouco, mas já é mais do que havia.
Há muitas distorções mais a desfazer. As desonerações, por exemplo, ficaram no meio do caminho e não podem prosseguir, pelo esgotamento do Tesouro. A administração das despesas públicas, por sua vez, flácida demais, não ajuda a combater a inflação, fato que sobrecarrega a política monetária (política de juros) do Banco Central. Juros altos, por sua vez, inibem os investimentos.
As manifestações de junho mostraram que as prioridades da política econômica estão erradas, porque deram pouca atenção à saúde e aos transportes públicos. A carga de populismo tarifário, na energia elétrica e nos combustíveis, sabotou a capacidade de investimento das concessionárias de energia e da Petrobrás. Por mais que a presidente Dilma e os ministros da área econômica façam apelos para que o empresário desengavete seus projetos de investimento, prevalece o desânimo.
Enfim, a "Nova Matriz Macroeconômica" deu mais errado do que deu certo e toda a economia precisa ser repensada. Mas a decisão do governo é deixar as correções de rumo para depois das eleições.
Há três pressupostos nessa escolha. O primeiro é que, apesar dos fracassos e dos descontentamentos provocados pela política econômica, nem a inflação nem o desemprego piorarão a ponto de colocar em risco a reeleição.
Segundo pressuposto: a economia mundial vai começar a jogar mais a favor do que contra. A ideia aí é que o pior está na espera das turbulências a serem desencadeadas pela virada da política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) e não nos seus efeitos propriamente ditos. Quando a operação desmonte começar, ver-se-á que o leão é mais manso do que se supõe, como tem dito o ministro Guido Mantega.
O terceiro e decisivo pressuposto é de que a oposição brasileira continuará incompetente e incapaz de propor coisa melhor, o que é difícil de desmentir.
Os sinais que vêm de Brasília são de que o governo Dilma parece convencido de que a política econômica dos últimos dois anos e meio já deu o que tinha de dar e que, se é para garantir melhor desempenho, é preciso mudar muita coisa.
Sexta-feira e ontem, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, advertiu para a necessidade de dar mais ênfase ao investimento. É uma afirmação de dentro do governo que embute uma crítica: a de que foi um equívoco ter puxado demais pelo consumo sem, ao mesmo tempo, ter aumentado a capacidade de oferta (produção) da economia.
Um dos grandes limitadores da oferta é a precariedade da infraestrutura. O agronegócio, por exemplo, apesar de enfrentar, como acontece também com a indústria, altos custos e impostos asfixiantes, continua dando show de produtividade. No entanto, isso acontece da porteira para dentro. Quando precisa transportar a safra esbarra no desespero logístico: condições precárias de armazenagem, estradas ruins, quilômetros e quilômetros de caminhões carregados à espera de liberação aos acessos dos portos - enfim, não é preciso alongar essa lista.
Finalmente, o governo parece ter entendido que os gargalos não estão no consumo insatisfatório, mas no baixo nível do investimento. O problema começa a ser atacado com mais leilões de concessões. Ainda é pouco, mas já é mais do que havia.
Há muitas distorções mais a desfazer. As desonerações, por exemplo, ficaram no meio do caminho e não podem prosseguir, pelo esgotamento do Tesouro. A administração das despesas públicas, por sua vez, flácida demais, não ajuda a combater a inflação, fato que sobrecarrega a política monetária (política de juros) do Banco Central. Juros altos, por sua vez, inibem os investimentos.
As manifestações de junho mostraram que as prioridades da política econômica estão erradas, porque deram pouca atenção à saúde e aos transportes públicos. A carga de populismo tarifário, na energia elétrica e nos combustíveis, sabotou a capacidade de investimento das concessionárias de energia e da Petrobrás. Por mais que a presidente Dilma e os ministros da área econômica façam apelos para que o empresário desengavete seus projetos de investimento, prevalece o desânimo.
Enfim, a "Nova Matriz Macroeconômica" deu mais errado do que deu certo e toda a economia precisa ser repensada. Mas a decisão do governo é deixar as correções de rumo para depois das eleições.
Há três pressupostos nessa escolha. O primeiro é que, apesar dos fracassos e dos descontentamentos provocados pela política econômica, nem a inflação nem o desemprego piorarão a ponto de colocar em risco a reeleição.
Segundo pressuposto: a economia mundial vai começar a jogar mais a favor do que contra. A ideia aí é que o pior está na espera das turbulências a serem desencadeadas pela virada da política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) e não nos seus efeitos propriamente ditos. Quando a operação desmonte começar, ver-se-á que o leão é mais manso do que se supõe, como tem dito o ministro Guido Mantega.
O terceiro e decisivo pressuposto é de que a oposição brasileira continuará incompetente e incapaz de propor coisa melhor, o que é difícil de desmentir.
A arte de flutuar e intervir - ILAN GOLDFAJN
O GLOBO - 03/09
Dizem que inventaram a taxa de câmbio para nos manter humildes. Se até o passado é difícil de explicar, imagine projetar o futuro. Menos de 18 meses atrás o real caiu abaixo de 1,70 por dólar e no mês passado alcançou 2,45, após uma depreciação intensa. O Banco Central (BC) anunciou novo mecanismo de intervenção, o que colocou um pouco de água fria na fervura, mas manteve aceso o (eterno) debate. Para onde vai o real? Qual a melhor forma de atuar nesta situação?
Divido o atual debate sobre câmbio e intervenção em duas visões (não necessariamente excludentes). A primeira entende que o câmbio deve ir aonde precisar para a economia mais rapidamente encontrar o novo equilíbrio, recuperar a competitividade e estimular o crescimento. Esse processo adquire ainda mais relevância quando a atual depreciação do câmbio parece ter importante componente global. É, na verdade, o dólar que está se apreciando, agora que as perspectivas são de recuperação nos EUA, aumento de juros por lá e volta dos fluxos de capital. De fato, várias outras moedas emergentes também depreciaram fortemente, sinalizando o novo protagonismo dos EUA, com a volta da força do dólar.
O problema é que o câmbio flutuante está longe de ser perfeito. É apenas o “menos ruim” dos regimes cambiais disponíveis (como o fixo, o administrado). Sofre de alguns males comuns a outros regimes cambiais e um específico.
O “mal” comum é que nenhum regime cambial é capaz de fazer milagre. Todos precisam de políticas macroeconômicas consistentes. A flutuação só leva a um novo equilíbrio estável se as políticas monetária (juros) e fiscal proverem âncora para os preços. Caso contrário, a flutuação levará à inflação, que induzirá mais depreciação (para manter o valor em termos reais), e o risco é uma espiral depreciação-inflação.
O problema específico desse regime é que pode flutuar em excesso, para além dos fundamentos. Na realidade, existe o “overshooting”, termo eternizado pelo trabalho de Rudiger Dornbusch, que se refere a movimentos do câmbio que vão para além do seu equilíbrio de médio e longo prazos e acabam voltando. Esses movimentos são hoje amplamente conhecidos na literatura e na prática.
Para preservar a flutuação, mas ficar alerta a excessos, intervenções têm sido prática comum. Mas o entendimento é que deveriam restringir-se ao objetivo de evitar volatilidade excessiva, proveniente, por exemplo, de falta de liquidez (em que não há mercado, devido à incerteza) e processos instáveis (como bolhas).
Mas a dificuldade está na prática. Não há forma certa de separar os excessos de flutuação daqueles justificados pelos fundamentos. No caso atual do Brasil, quanto da incerteza doméstica pode estar potencializando o choque global? Em muitos casos, alguma avaliação sobre aonde o câmbio deveria ir é requerida. Tarefa mais fácil de enunciar do que de calcular.
No caso do Brasil há pelo menos duas formas de pensar no equilíbrio do real. A primeira é partir da observação de que o Brasil está caro, quando medido em dólar, e calcular qual seria a taxa de câmbio que faria os preços no Brasil se igualarem aos preços internacionais. É uma vertente da teoria da Paridade do Poder de Compra (PPC), que diz que os preços vão acabar convergindo ao longo do tempo. Nesse caso o câmbio no Brasil ainda teria de depreciar um bom pedaço. No entanto, a evidência empírica mostra que esse tipo de desvio dos preços só é corrigido ao longo de muito tempo, décadas, não anos. Uma segunda forma é calcular qual seria a taxa de câmbio que ajustaria nosso déficit em conta corrente para níveis consistentes com a nova realidade mundial. Um ajuste do déficit em conta corrente dos atuais 3,5 do PIB para algo em torno de 1,5% em alguns anos requer um câmbio em torno de 2,30 por dólar.
A segunda visão sobre intervenção acredita nos benefícios de suavizar o atual choque ao longo do tempo. Nos últimos anos, o Brasil valeu-se de intervenção e acumulou reservas (U$ 370 bilhoes) custosas de manter, mas vistas como um seguro para amortecer choques. Nessa visão, o sinistro está ocorrendo e o seguro deve ser utilizado. A intervenção é a forma de financiar ao longo do tempo o déficit em conta corrente (e o ajuste de portfólio dos investidores) até que a nova taxa de câmbio estimule as exportações e reduza as importações. O risco aqui é o clássico: que a intervenção, em vez de suavizar, substitua a necessidade de outros ajustes econômicos (fiscal, monetário, estrutural).
Há que se buscar evitar artificialismos no câmbio, que levem à paralisia e à falta de ajuste na economia. Mas, também, é necessário evitar processos perversos (bolhas e “overshootings”), assim como buscar a melhor trajetória de ajuste usando as reservas disponíveis. Alcançar o balanço adequado é tanto ciência quanto arte.
Dizem que inventaram a taxa de câmbio para nos manter humildes. Se até o passado é difícil de explicar, imagine projetar o futuro. Menos de 18 meses atrás o real caiu abaixo de 1,70 por dólar e no mês passado alcançou 2,45, após uma depreciação intensa. O Banco Central (BC) anunciou novo mecanismo de intervenção, o que colocou um pouco de água fria na fervura, mas manteve aceso o (eterno) debate. Para onde vai o real? Qual a melhor forma de atuar nesta situação?
Divido o atual debate sobre câmbio e intervenção em duas visões (não necessariamente excludentes). A primeira entende que o câmbio deve ir aonde precisar para a economia mais rapidamente encontrar o novo equilíbrio, recuperar a competitividade e estimular o crescimento. Esse processo adquire ainda mais relevância quando a atual depreciação do câmbio parece ter importante componente global. É, na verdade, o dólar que está se apreciando, agora que as perspectivas são de recuperação nos EUA, aumento de juros por lá e volta dos fluxos de capital. De fato, várias outras moedas emergentes também depreciaram fortemente, sinalizando o novo protagonismo dos EUA, com a volta da força do dólar.
O problema é que o câmbio flutuante está longe de ser perfeito. É apenas o “menos ruim” dos regimes cambiais disponíveis (como o fixo, o administrado). Sofre de alguns males comuns a outros regimes cambiais e um específico.
O “mal” comum é que nenhum regime cambial é capaz de fazer milagre. Todos precisam de políticas macroeconômicas consistentes. A flutuação só leva a um novo equilíbrio estável se as políticas monetária (juros) e fiscal proverem âncora para os preços. Caso contrário, a flutuação levará à inflação, que induzirá mais depreciação (para manter o valor em termos reais), e o risco é uma espiral depreciação-inflação.
O problema específico desse regime é que pode flutuar em excesso, para além dos fundamentos. Na realidade, existe o “overshooting”, termo eternizado pelo trabalho de Rudiger Dornbusch, que se refere a movimentos do câmbio que vão para além do seu equilíbrio de médio e longo prazos e acabam voltando. Esses movimentos são hoje amplamente conhecidos na literatura e na prática.
Para preservar a flutuação, mas ficar alerta a excessos, intervenções têm sido prática comum. Mas o entendimento é que deveriam restringir-se ao objetivo de evitar volatilidade excessiva, proveniente, por exemplo, de falta de liquidez (em que não há mercado, devido à incerteza) e processos instáveis (como bolhas).
Mas a dificuldade está na prática. Não há forma certa de separar os excessos de flutuação daqueles justificados pelos fundamentos. No caso atual do Brasil, quanto da incerteza doméstica pode estar potencializando o choque global? Em muitos casos, alguma avaliação sobre aonde o câmbio deveria ir é requerida. Tarefa mais fácil de enunciar do que de calcular.
No caso do Brasil há pelo menos duas formas de pensar no equilíbrio do real. A primeira é partir da observação de que o Brasil está caro, quando medido em dólar, e calcular qual seria a taxa de câmbio que faria os preços no Brasil se igualarem aos preços internacionais. É uma vertente da teoria da Paridade do Poder de Compra (PPC), que diz que os preços vão acabar convergindo ao longo do tempo. Nesse caso o câmbio no Brasil ainda teria de depreciar um bom pedaço. No entanto, a evidência empírica mostra que esse tipo de desvio dos preços só é corrigido ao longo de muito tempo, décadas, não anos. Uma segunda forma é calcular qual seria a taxa de câmbio que ajustaria nosso déficit em conta corrente para níveis consistentes com a nova realidade mundial. Um ajuste do déficit em conta corrente dos atuais 3,5 do PIB para algo em torno de 1,5% em alguns anos requer um câmbio em torno de 2,30 por dólar.
A segunda visão sobre intervenção acredita nos benefícios de suavizar o atual choque ao longo do tempo. Nos últimos anos, o Brasil valeu-se de intervenção e acumulou reservas (U$ 370 bilhoes) custosas de manter, mas vistas como um seguro para amortecer choques. Nessa visão, o sinistro está ocorrendo e o seguro deve ser utilizado. A intervenção é a forma de financiar ao longo do tempo o déficit em conta corrente (e o ajuste de portfólio dos investidores) até que a nova taxa de câmbio estimule as exportações e reduza as importações. O risco aqui é o clássico: que a intervenção, em vez de suavizar, substitua a necessidade de outros ajustes econômicos (fiscal, monetário, estrutural).
Há que se buscar evitar artificialismos no câmbio, que levem à paralisia e à falta de ajuste na economia. Mas, também, é necessário evitar processos perversos (bolhas e “overshootings”), assim como buscar a melhor trajetória de ajuste usando as reservas disponíveis. Alcançar o balanço adequado é tanto ciência quanto arte.
Futebol de crianças e gigantes - VINICIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 03/09
País corre atabalhoado atrás de polêmicas sucessivas e sem fim; povo não trata de economia
AS NOTÍCIAS e a atenção dos "formadores de opinião", de todos nós opinionados ou comentaristas de redes sociais, lembram o futebol das crianças pequenas. Um aglomerado tumultuoso e barulhento de perninhas segue a bola a esmo pelo campo, sem muito sentido ou "consciência tática".
O "gigante acordou" para o curto inverno da utopia caseira de Junho. De lá para cá, tantas polêmicas terminais não terminaram nem renderam. O despertar do gigante levou filósofos de várias disciplinas a rejubilar-se com "movimentos horizontais", fim das hierarquias, "devir das personalidades", coletivos, democracia direta e reinvenção da política --quase revolução.
Reafirmaram-se também teses da inovadora sociologia da "nova classe média", como aquela que atribui as manifestações a uma mudança de fase na evolução dos desejos.
Depois que passa a ganhar certa renda "de classe média", a pessoa sofre uma mutação que a leva a reivindicar "serviços públicos de qualidade", diz a tese. Antes, o cidadão seria um mero "ser-para-comer" (ou "para-comprar"), sem ambições avançadas da vida tais como tomar um ônibus decente ou não esperar por seis meses um exame para o filho doente. Mas passemos, pois o assunto não é sociologia evolutiva.
Da reinvenção da política, nossos desejos e debates desceram a um nível mais modesto, mas não menos apaixonado, para o buraco da reforma política, que, enfim, não passava de má reforma eleitoral e, antes de ser esquecida, tornara-se apenas chicana politiqueira.
Depois de um breve interregno dominado por debates sobre a Mídia Ninja, os Black Blocs (Falsos anarquistas? Embrião fascista?) e os pelos pubianos de uma moça da "Playboy" (Excessivos? Falsos?), nos entregamos à polêmica furiosa sobre mais ou menos médicos, se cubanos ou outros.
Jamais se tratou de um debate sobre política de saúde, pois o governo não tem uma nem nós nos dedicamos a reivindicar que tivesse, na maior parte dos casos adeptos que somos da algazarra populista, governista, racista, demófoba ou seja lá o gosto do freguês. A mania talvez em breve também passe.
O dólar chegou a deixar os nativos inquietos. Dólar caro nos empobrece de pronto e cutuca a memória de crises operísticas. Como trovejou, mas não choveu, como o dólar não pareceu liderar uma tropa de cavalinhos do apocalipse, essa poeira por ora também assentou.
Nem tudo se desmanchou no ar. A conversa sobre "mobilidade urbana" reservou um pouco mais do chão das ruas para ônibus em São Paulo. Sérgio Cabral foi ao chão. Da costela quebrada pelo tombo de Dilma nas pesquisas renasceu Marina Silva e nasceu o amor entre Aécio Neves e Eduardo Campos.
Passemos outra vez, pois este também não é um balanço de Junho. De resto, 7 de Setembro está aí, com muitas câmeras para televisionar um novo ataque de insônia, ou quiçá consciência, do "gigante".
Curioso nessa agitação incessante é que a economia mal faz parte do tumulto. A carestia da comida temperou, de leve, a ira de Junho. Mas a sucessão de polêmicas sobre o país ou o governo não parece ter sido resultado de nenhum grande mal-estar econômico. A elite da elite está furiosa com a economia deste governo. A povo do povo, não.
Peçam asilo, cubanos! - RODRIGO CONSTANTINO
O GLOBO - 03/09
Muitas coisas nessa importação de médicos cubanos não cheiram bem. O governo usou as manifestações nas ruas como pretexto para anunciar a medida, mas já vinha negociando com a ditadura cubana há meses. Era algo premeditado, que fazia parte dos planos do governo.
Além disso, sabe-se que não há liberdade na ilha, sob uma tirania comunista há meio século. Não podemos assumir que esses médicos estão vindo de livre e espontânea vontade. O governo brasileiro está importando trabalho escravo!
Tanto é assim que não há negociação direta com os médicos, que sequer podem reter seus próprios salários. Quem ficará com o grosso do meio bilhão que nosso governo vai desembolsar por ano é a ditadura dos irmãos Castro. Gilberto Carvalho acha essa "mais-valia" socialista justa. Mas desde quando escravidão é justiça?
Levanta suspeita também o fato de ser justamente um governo de uma ex-guerrilheira comunista, com profunda afinidade ideológica com o sistema cubano, quem está trazendo esses médicos para o país. Será que é paranoia questionar se há outros interesses nessa medida?
Vale notar que circulam vídeos no YouTube em que brasileiros, alguns do MST, afirmam que estão em Cuba para cursos de medicina, e que o objetivo é retomar ao Brasil e divulgar as maravilhas do modelo socialista. O ministro da Saúde garantiu que a língua não é barreira. Milhares de cubanos aprenderam português? Quando? Novamente: é paranoia suspeitar das reais intenções do governo?
Se for, então o grande jurista Ives Gandra Martins é paranoico. Escreveu no "Estadão" um artigo abordando exatamente essas questões. Como ele, existem milhares de outras pessoas respeitadas que se mostram incomodadas com a forma pela qual o governo está atacando o problema da falta de médicos no interior.
Para começo de conversa, por R$ 10 mil se contrata os melhores enfermeiros do país. E esses "médicos" cubanos vão atuar basicamente como enfermeiros. Ou vão fazer o teste Revalida e demonstrar que podem atuar como legítimos médicos no país? Quero só ver...
Alguns argumentam que a crítica é razoável, mas ainda assim nosso interior necessita de médicos (ou enfermeiros), e melhor os cubanos do que nada. Além da constatação do fracasso do PT na saúde, o raciocínio pragmático é perigoso. Podemos justificar a contratação de norte-coreanos para trabalhos braçais importantes por somas irrisórias, negociadas diretamente com o "proprietário" deles, o ditador comunista Kim Jong-un. Não é a mesma coisa?
O governo acusou os críticos dos médicos cubanos de preconceito. Do meu ponto de vista, preconceito tem quem trata gente feito gado, quem pensa que pode lidar com um tirano diretamente e depois importar pessoas como se fossem mercadorias. Eis o maior preconceito!
Por acaso esses cubanos vão gozar da mesma liberdade que todos os demais gozam em nosso país? Estarão sujeitos às leis trabalhistas? Estarão eles livres para ir e vir, dar entrevistas a quem quiser, casar, criticar seu governo ou até mesmo pedir asilo ao nosso governo? Ou, como há precedentes, ficarão escondidos e vigiados, com nosso próprio governo fazendo o papel de carcereiro dos Castro?
Não tenho preconceito algum contra cubanos. Tenho, ao contrário de Chico Buarque e companhia, pena deles. Vivem na miséria criada por décadas de socialismo. São vítimas de uma ditadura cruel, assassina, que já ceifou a vida de milhares de inocentes cujo único "crime" fora discordar do regime. Defender o modelo cubano em pleno século 21 é atestado de falta de caráter.
Eis a campanha que gostaria de lançar: cubanos, peçam asilo por aqui! O histórico é ruim, pois quando dois pugilistas fizeram isso, foram devolvidos de forma fria e insensível por nosso governo petista ao regime ditatorial. Mas vocês contam com o apoio da maioria dos brasileiros. Em grande quantidade, a situação ficará bastante delicada para as autoridades subservientes ao "senhor feudal" de vocês.
Tenho certeza de que encontrarão no povo brasileiro um aliado de peso contra sua escravidão opressora. Sei que muitos têm suas famílias como reféns lá na ilha-presídio. Decisão difícil. Mas acho que entenderiam, e mais poderia ser feito para ajudá-los daqui, em liberdade, do que de lá, sob a vigilância totalitária do governo.
No limite, busquem asilo na embaixada americana, que é mais garantido. Olhem os colegas que fizeram isso, e hoje estão em Miami, ajudando a denunciar essa ditadura abjeta. Garanto que dormem em paz com suas consciências, por terem mudado de lado. Denunciem seu algoz ao mundo também. Peçam asilo, cubanos!
Os cinco olhos - MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 03/09
O governo brasileiro elevou um pouco um tom contra o governo americano. Pediu explicações não mais ao embaixador. Quer uma resposta por escrito, formal e rápida da Casa Branca. O governo Obama havia dado respostas falsas de que apenas acessava os metadados. Agora se vê que há interceptação direta de comunicação pessoal até da presidente da República.
A reportagem de Sônia Bridi e Glenn Greenwald não deixou margem à dúvida: eles interceptam comunicação da presidente do Brasil, congratulam-se pelo objetivo atingido e dizem que estão aptos a repetir a façanha.
O que a imprensa insistentemente perguntou ontem na entrevista coletiva conjunta dos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo, e das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo, é o que de concreto será feito. Quando o ministro Luiz Alberto Figueiredo frisou que não pediu ao embaixador Shannon uma explicação, mas que ele ontem mesmo — a despeito de ser feriado nos Estados Unidos — comunicasse que o Brasil quer uma resposta por escrito e formal, em linguagem diplomática, estava elevando o tom.
Mas há um silêncio para ser ouvido. Figueiredo repetiu que não iria tratar da viagem da presidente na entrevista de ontem. Assim, ficou em suspense a ameaça de simplesmente cancelar a visita aos Estados Unidos se a resposta que vier da Casa Branca não for satisfatória.
Tudo somado é pouco. Há questões de Estado, sensíveis, que devem ser protegidas de governos de outros países na comunicação de um chefe de governo. Há interesses comerciais e econômicos que precisam ser defendidos. Há estratégias de negociações internacionais que têm que ser reservadas.
Só para ficar num exemplo simples. O Canadá faz parte do grupo privilegiado dos países com os quais os Estados Unidos aceitam compartilhar as informações que bisbilhotam. São os five eyes, os cinco olhos — Estados Unidos, Grã-Bretanha, Austrália, Canadá e Nova Zelândia. Brasil e Canadá tiveram uma longa briga em torno dos aviões da Bombardier e da Embraer. Imagine se tudo o que foi dito no Brasil, seja na empresa, seja no governo, a esse respeito, fosse direto para os olhos canadenses? Há, portanto, dois tipos de risco que essa prática generalizada e compulsiva de espionagem cria: o político e o econômico.
Barack Obama não tem conseguido dar qualquer resposta minimamente convincente sobre a abusiva e intolerável invasão da privacidade dos cidadãos e governantes de países amigos. O episódio de Edward Snowden é uma das marcas do pior momento do seu governo. Ele naufraga em indecisões na Síria, em paralisias decisórias internas e na tentativa de justificar o inaceitável dessa espionagem global. Eles sempre espionaram, mas o que as informações de Snowden têm revelado ao mundo é muito mais vasto do que o imaginado.
Pior ainda é a avaliação equivocada feita sobre o Brasil, ao colocá-lo no mesmo grupo de países em que está o Irã, por exemplo. Países sobre os quais há dúvidas se são amigos, inimigos ou problemas.
Outro ponto a ser anotado nas palavras do novo chanceler é a insistência com que Figueiredo falou que está consultando os Brics, leia-se China e Rússia, para saber como se defender nessa questão. A liberdade da internet e a integração com o mundo têm que ser preservada. O Brasil não quer o modelo chinês. Ao mesmo tempo não pode estar exposto a esta invasão cibernética. Ameaçar com mais aproximação da China e da Rússia em tema tão delicado é uma forma de enviar um recado aos Estados Unidos de que amigos podem começar a ser problemas.
Ueba! Dilma escapa de moto! - JOSÉ SIMÃO
FOLHA DE SP - 03/09
Se eu fosse a Dilma, pegava a moto e não voltava mais. Escapava de vez: "Hasta la vista, Mantega"
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
E novidades do deputado Donadon, o deputado presidiário. Já imaginou a cena? "O deputado Donadon apareceu pra votar?". "Ainda não, o camburão das dez tá preso no trânsito!". Rarará! Ou então vota pelo celular do traficante.
E o chargista Aroeira revela que o Donadon tá organizando A BANCADA DA PAPUDA! Como vão chegar mais outros, os mensaleiros, a Bancada da Papuda tá organizada. E um deputado preso não pega carro e nem usa jatinho da FAB. É um deputado supereconômico!
E a Dilma? As escapadas da Dilma. Eu dei um depoimento pro TV Folha sobre as escapadas da Dilma! Quando a Dilma escapa, todo mundo sofre: seguranças, motoqueiros e parentes.
Driblar segurança tá na onda: o Papa, Angelina Jolie escapa disfarçada de refugiada e agora a Dilma! Já pensou nos coitados dos seguranças? "Sai da minha aba, caraca". "Eu já disse: longe, LONGE, porra!".
E a melhor escapada foi de moto. Hell's Dilma! Na garupa da moto dum ministro. Já imaginou o que esse ministro levou de cascudo? "Direita, caraca". "Não inclina, porra". Rarará.
A Dilma é autoritária até na liberdade! Devia ter virado entregadora de pizza! Pra combinar com o clima das ruas de Brasília. Ia jogando as pizzas: mozarela, calabresa, pepperoni! Motobóia!
Se eu fosse a Dilma, sinceramente, eu pegava a moto e não voltava mais. Escapava de vez: "Hasta la vista, Mantega". A Exterminadora do Futuro. Rarará! A Dilma é autoritária até na liberdade!
E o meu São Paulo! O São Paulo vai ter que importar jogadores cubanos. Rarará!
E quando o Sarney pegou catapora, o Ceni já era goleiro do São Paulo. E quando caiu o primeiro dente de leite do Sarney, o Ceni ainda era goleiro do São Paulo. E quando o Sarney não morrer, o Ceni ainda será goleiro do São Paulo! É mole? É mole, mas sobe!
E o Corinthians X Flamengo! Gambá X Urubu! O jogo foi no lixão? O jogo devia ser no lixão! Rarará. Parabéns Pato! Comeu até urubu!
E o tuiteiro Daniel Perrone: "Três torcedores de Oruro identificados na briga! Aí pediram o Hino do Corinthians no Fantástico!" Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Se eu fosse a Dilma, pegava a moto e não voltava mais. Escapava de vez: "Hasta la vista, Mantega"
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República!
E novidades do deputado Donadon, o deputado presidiário. Já imaginou a cena? "O deputado Donadon apareceu pra votar?". "Ainda não, o camburão das dez tá preso no trânsito!". Rarará! Ou então vota pelo celular do traficante.
E o chargista Aroeira revela que o Donadon tá organizando A BANCADA DA PAPUDA! Como vão chegar mais outros, os mensaleiros, a Bancada da Papuda tá organizada. E um deputado preso não pega carro e nem usa jatinho da FAB. É um deputado supereconômico!
E a Dilma? As escapadas da Dilma. Eu dei um depoimento pro TV Folha sobre as escapadas da Dilma! Quando a Dilma escapa, todo mundo sofre: seguranças, motoqueiros e parentes.
Driblar segurança tá na onda: o Papa, Angelina Jolie escapa disfarçada de refugiada e agora a Dilma! Já pensou nos coitados dos seguranças? "Sai da minha aba, caraca". "Eu já disse: longe, LONGE, porra!".
E a melhor escapada foi de moto. Hell's Dilma! Na garupa da moto dum ministro. Já imaginou o que esse ministro levou de cascudo? "Direita, caraca". "Não inclina, porra". Rarará.
A Dilma é autoritária até na liberdade! Devia ter virado entregadora de pizza! Pra combinar com o clima das ruas de Brasília. Ia jogando as pizzas: mozarela, calabresa, pepperoni! Motobóia!
Se eu fosse a Dilma, sinceramente, eu pegava a moto e não voltava mais. Escapava de vez: "Hasta la vista, Mantega". A Exterminadora do Futuro. Rarará! A Dilma é autoritária até na liberdade!
E o meu São Paulo! O São Paulo vai ter que importar jogadores cubanos. Rarará!
E quando o Sarney pegou catapora, o Ceni já era goleiro do São Paulo. E quando caiu o primeiro dente de leite do Sarney, o Ceni ainda era goleiro do São Paulo. E quando o Sarney não morrer, o Ceni ainda será goleiro do São Paulo! É mole? É mole, mas sobe!
E o Corinthians X Flamengo! Gambá X Urubu! O jogo foi no lixão? O jogo devia ser no lixão! Rarará. Parabéns Pato! Comeu até urubu!
E o tuiteiro Daniel Perrone: "Três torcedores de Oruro identificados na briga! Aí pediram o Hino do Corinthians no Fantástico!" Rarará!
Nóis sofre, mas nóis goza!
Que eu vou pingar o meu colírio alucinógeno!
Protagonistas & coadjuvantes - DENISE ROTHENBURG
CORREIO BRAZILIENSE - 03/09
Mais uma vez o STF, provocado pelos deputados, dá ordens ao Parlamento. Sinal da incapacidade do Congresso de resolver suas próprias mazelas
Há tempos não tínhamos um início de semana tão movimentado, com governo e congressistas meio atônitos. No Planalto, as denúncias de que os Estados Unidos espionaram a presidente Dilma Rousseff. Na Câmara, a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso de suspender a sessão que preservou o mandato do deputado presidiário Natan Donadon, deixou os deputados zonzos. A diferença, do ponto de vista da política interna, é que as denúncias de espionagem colocam Dilma como a mocinha, vítima dos americanos. Os congressistas, entretanto, mais uma vez ficaram mal na foto perante o eleitor.
Não foi a primeira vez que uma decisão em caráter liminar de algum ministro do Supremo Tribunal Federal abalou a combalida imagem do Congresso. Foi assim no caso dos vetos, quando os deputados não fizeram o dever de casa e passaram pelo vexame de ver o STF mandar votar tudo.
Nos dois casos, vale observar que o Supremo Tribunal Federal foi provocado pelos próprios parlamentares. Só o fato de um deputado — no caso de Donadon, o líder do PSDB, Carlos Sampaio — precisar recorrer ao STF para que os parlamentares façam seu dever de casa pode ser visto como um absurdo. Esses recursos das excelências ao STF deixam cada vez mais transparente a incapacidade de diálogo entre os partidos para que o Congresso resolva suas mazelas. Ou seja, o STF está cada vez mais protagonista. E os deputados cada vez mais coadjuvantes, invariavelmente, no papel de vilões.
No caso de Donadon, o circo está armado. Uma das propostas em estudo é convocar uma nova sessão e refazer a votação ainda hoje, de forma a reduzir o impacto das manifestações de 7 de Setembro sobre o Congresso. Mas tem um problema aí, porque o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves, já deu posse ao suplente e Donadon não poderia se defender como fez na semana passada. Além disso, a decisão do ministro Luis Roberto Barroso ainda precisa ir ao pleno. Em suma, um nó que os próprios parlamentares ainda não sabem como desatar. Hoje, o dia será no sentido de tentar transformar esse limão do desgaste numa limonada. E bem docinha.
Enquanto isso, no Planalto…
Nas entrevistas de ontem, em que as autoridades brasileiras se desdobraram em cobrar explicações do governo de Barack Obama, vale a pena observar o esforço do Brasil em não misturar a viagem da presidente Dilma Rousseff aos Estados Unidos em outubro com as denúncias de espionagem. Isso, no entender de muitos integrantes do corpo diplomático, representa uma ação do Brasil no sentido de preservar as relações entre os dois países. Mostra ainda que o governo brasileiro separou muito bem as estações, ou seja, viagem é uma coisa, espionagem é outra. Basta ver a declaração do ministro Luiz Alberto Figueiredo, de que não trataria da viagem.
Figueiredo obviamente não entrou em detalhes, mas a leitura feita por muitos foi a da velha imagem da criança e da bacia. Jogue fora a água suja da espionagem, não as relações com os Estados Unidos. Ao que tudo indica é por aí que o Brasil seguirá, afinal não é o único país vítima dessa prática. Nesse sentido, vem a calhar a reunião do G-20 em São Petersburgo, na Rússia. Sem dúvida, o palco das cobranças está armado. Depois dele, será a vez da ONU. Especialmente, se os Estados Unidos seguirem na linha do que disse o secretário de estado, John Kerry, quando esteve por aqui. Apesar do linguajar polido e educado que o caracteriza, Kerry não escondeu o fato de que a proteção do povo americano passava por práticas de espionagem. Resta saber se essa linha inclui até mesmo a presidente do pacífico Brasil. Se for, é sinal de que os EUA extrapolaram todos os limites. Afinal, em termos de combate ao terrorismo e busca do diálogo entre as Nações, o Brasil buscou sempre o papel de mocinho pacificador e não de vilão coadjuvante. A palavra agora está com os Estados Unidos. Que dêem uma resposta convincente.
Mais uma vez o STF, provocado pelos deputados, dá ordens ao Parlamento. Sinal da incapacidade do Congresso de resolver suas próprias mazelas
Há tempos não tínhamos um início de semana tão movimentado, com governo e congressistas meio atônitos. No Planalto, as denúncias de que os Estados Unidos espionaram a presidente Dilma Rousseff. Na Câmara, a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Luis Roberto Barroso de suspender a sessão que preservou o mandato do deputado presidiário Natan Donadon, deixou os deputados zonzos. A diferença, do ponto de vista da política interna, é que as denúncias de espionagem colocam Dilma como a mocinha, vítima dos americanos. Os congressistas, entretanto, mais uma vez ficaram mal na foto perante o eleitor.
Não foi a primeira vez que uma decisão em caráter liminar de algum ministro do Supremo Tribunal Federal abalou a combalida imagem do Congresso. Foi assim no caso dos vetos, quando os deputados não fizeram o dever de casa e passaram pelo vexame de ver o STF mandar votar tudo.
Nos dois casos, vale observar que o Supremo Tribunal Federal foi provocado pelos próprios parlamentares. Só o fato de um deputado — no caso de Donadon, o líder do PSDB, Carlos Sampaio — precisar recorrer ao STF para que os parlamentares façam seu dever de casa pode ser visto como um absurdo. Esses recursos das excelências ao STF deixam cada vez mais transparente a incapacidade de diálogo entre os partidos para que o Congresso resolva suas mazelas. Ou seja, o STF está cada vez mais protagonista. E os deputados cada vez mais coadjuvantes, invariavelmente, no papel de vilões.
No caso de Donadon, o circo está armado. Uma das propostas em estudo é convocar uma nova sessão e refazer a votação ainda hoje, de forma a reduzir o impacto das manifestações de 7 de Setembro sobre o Congresso. Mas tem um problema aí, porque o presidente da Casa, Henrique Eduardo Alves, já deu posse ao suplente e Donadon não poderia se defender como fez na semana passada. Além disso, a decisão do ministro Luis Roberto Barroso ainda precisa ir ao pleno. Em suma, um nó que os próprios parlamentares ainda não sabem como desatar. Hoje, o dia será no sentido de tentar transformar esse limão do desgaste numa limonada. E bem docinha.
Enquanto isso, no Planalto…
Nas entrevistas de ontem, em que as autoridades brasileiras se desdobraram em cobrar explicações do governo de Barack Obama, vale a pena observar o esforço do Brasil em não misturar a viagem da presidente Dilma Rousseff aos Estados Unidos em outubro com as denúncias de espionagem. Isso, no entender de muitos integrantes do corpo diplomático, representa uma ação do Brasil no sentido de preservar as relações entre os dois países. Mostra ainda que o governo brasileiro separou muito bem as estações, ou seja, viagem é uma coisa, espionagem é outra. Basta ver a declaração do ministro Luiz Alberto Figueiredo, de que não trataria da viagem.
Figueiredo obviamente não entrou em detalhes, mas a leitura feita por muitos foi a da velha imagem da criança e da bacia. Jogue fora a água suja da espionagem, não as relações com os Estados Unidos. Ao que tudo indica é por aí que o Brasil seguirá, afinal não é o único país vítima dessa prática. Nesse sentido, vem a calhar a reunião do G-20 em São Petersburgo, na Rússia. Sem dúvida, o palco das cobranças está armado. Depois dele, será a vez da ONU. Especialmente, se os Estados Unidos seguirem na linha do que disse o secretário de estado, John Kerry, quando esteve por aqui. Apesar do linguajar polido e educado que o caracteriza, Kerry não escondeu o fato de que a proteção do povo americano passava por práticas de espionagem. Resta saber se essa linha inclui até mesmo a presidente do pacífico Brasil. Se for, é sinal de que os EUA extrapolaram todos os limites. Afinal, em termos de combate ao terrorismo e busca do diálogo entre as Nações, o Brasil buscou sempre o papel de mocinho pacificador e não de vilão coadjuvante. A palavra agora está com os Estados Unidos. Que dêem uma resposta convincente.
G20 vem aí, nada de pânico - CLÓVIS ROSSI
FOLHA DE SP - 03/09
Brasil gostaria de que os EUA fossem cautelosos ao retirar estímulos, mas não quer parecer desesperado
O governo brasileiro chega para a cúpula do G20, quinta e sexta-feira em São Petersburgo, com uma prece em voz baixa para que os Estados Unidos sejam extremamente cautelosos ao implementar a retirada dos estímulos monetários que adotaram na crise e foram uma injeção de dinheiro na veia da economia.
Por que a prece? O simples anúncio de que os estímulos acabariam, feito há três meses, provocou o que o ministro Guido Mantega batizou recentemente de "minicrise", uma desagradável turbulência cambial. É fácil deduzir que a implementação do que foi anunciado poderia forçar a retirada do "mini" e deixar só crise.
Por que em voz baixa? Para evitar dar a impressão de que o governo brasileiro está em pânico.
O Brasil não estará sozinho na oração por uma retirada organizada dos estímulos norte-americanos.
A questão passou a ser central para a oitava cúpula do grupo que reúne as principais economias do planeta, responsáveis por quase 90% de tudo o que se produz no mundo.
É o que deixa claro Ksenia Yudaeva, a representante pessoal do presidente anfitrião, o russo Vladimir Putin: "O que pode ser o problema de amanhã é a ausência de mecanismos de segurança adequados em caso de problemas com a saída de uma política econômica não convencional. A história nos mostra que, quando os Estados Unidos e, em alguns casos, a Alemanha e os países desenvolvidos apertaram suas políticas, isso levou frequentemente a estresse financeiro ou crises".
Yudaeva inclui entre as crises o contágio da crise asiática de 1997/98 no Brasil (e na Rússia).
Ela tem razão: quando os juros passam a ser atraentes nos países ricos, o dinheiro que circula pelo mundo vai para eles, mais seguros, levando à desvalorização das moedas dos emergentes, como está ocorrendo agora.
Nos oito primeiros meses do ano, com ênfase nos três últimos, o dólar se valorizou 63% ante o real.
É por isso que Zhu Guangyao, vice-ministro chinês de Finanças, pede consultas dos EUA com seus parceiros ao retirar os estímulos, "para evitar riscos desnecessários para a economia global e desordem nos mercados cambiais".
Quais as chances dessa coordenação ser adotada na cúpula do G20? Baixa. "O G20 pode fazer muito pouco além de intensificar a percepção de que os países desenvolvidos têm que ser cuidadosos", ouviu a Folha na delegação brasileira que participará da cúpula de São Petersburgo.
Seria o que o jargão diplomático batiza de "peer pressure" (pressão dos parceiros, em tradução livre).
O momento não é exatamente o ideal para que os Estados Unidos atendam à pressão. O país está em duplo curso de colisão com o anfitrião, a Rússia --primeiro pelo asilo dado a Edward Snowden, que revelou a megaespionagem americana, e agora pela resistência de Putin em aceitar a tese de que o ditador sírio Bashar al-Assad usou armas químicas e deve ser punido por isso.
Por mais que o G20 tenha a economia como foco, reuniões de líderes não conseguem escapar de temas políticos.
Brasil gostaria de que os EUA fossem cautelosos ao retirar estímulos, mas não quer parecer desesperado
O governo brasileiro chega para a cúpula do G20, quinta e sexta-feira em São Petersburgo, com uma prece em voz baixa para que os Estados Unidos sejam extremamente cautelosos ao implementar a retirada dos estímulos monetários que adotaram na crise e foram uma injeção de dinheiro na veia da economia.
Por que a prece? O simples anúncio de que os estímulos acabariam, feito há três meses, provocou o que o ministro Guido Mantega batizou recentemente de "minicrise", uma desagradável turbulência cambial. É fácil deduzir que a implementação do que foi anunciado poderia forçar a retirada do "mini" e deixar só crise.
Por que em voz baixa? Para evitar dar a impressão de que o governo brasileiro está em pânico.
O Brasil não estará sozinho na oração por uma retirada organizada dos estímulos norte-americanos.
A questão passou a ser central para a oitava cúpula do grupo que reúne as principais economias do planeta, responsáveis por quase 90% de tudo o que se produz no mundo.
É o que deixa claro Ksenia Yudaeva, a representante pessoal do presidente anfitrião, o russo Vladimir Putin: "O que pode ser o problema de amanhã é a ausência de mecanismos de segurança adequados em caso de problemas com a saída de uma política econômica não convencional. A história nos mostra que, quando os Estados Unidos e, em alguns casos, a Alemanha e os países desenvolvidos apertaram suas políticas, isso levou frequentemente a estresse financeiro ou crises".
Yudaeva inclui entre as crises o contágio da crise asiática de 1997/98 no Brasil (e na Rússia).
Ela tem razão: quando os juros passam a ser atraentes nos países ricos, o dinheiro que circula pelo mundo vai para eles, mais seguros, levando à desvalorização das moedas dos emergentes, como está ocorrendo agora.
Nos oito primeiros meses do ano, com ênfase nos três últimos, o dólar se valorizou 63% ante o real.
É por isso que Zhu Guangyao, vice-ministro chinês de Finanças, pede consultas dos EUA com seus parceiros ao retirar os estímulos, "para evitar riscos desnecessários para a economia global e desordem nos mercados cambiais".
Quais as chances dessa coordenação ser adotada na cúpula do G20? Baixa. "O G20 pode fazer muito pouco além de intensificar a percepção de que os países desenvolvidos têm que ser cuidadosos", ouviu a Folha na delegação brasileira que participará da cúpula de São Petersburgo.
Seria o que o jargão diplomático batiza de "peer pressure" (pressão dos parceiros, em tradução livre).
O momento não é exatamente o ideal para que os Estados Unidos atendam à pressão. O país está em duplo curso de colisão com o anfitrião, a Rússia --primeiro pelo asilo dado a Edward Snowden, que revelou a megaespionagem americana, e agora pela resistência de Putin em aceitar a tese de que o ditador sírio Bashar al-Assad usou armas químicas e deve ser punido por isso.
Por mais que o G20 tenha a economia como foco, reuniões de líderes não conseguem escapar de temas políticos.
Fogo às vestes - DORA KRAMER
O Estado de S.Paulo - 03/09
Volto ao assunto Donadon para confessar dificuldade de compreender a real motivação do conjunto de deputados que agiu ou se omitiu para assegurar a permanência do título parlamentar ao colega preso na Papuda.
Situação ainda mais confusa e constrangedora em face da decisão do ministro Luís Roberto Barroso de aceitar liminarmente suspender a validade da sessão do perdão. Barroso contrariou (corrigiu?) o próprio voto na recente condenação do senador Ivo Cassol em que optou pelo artigo da Constituição que dá a última palavra ao Legislativo.
Ele viu impossibilidade "física e jurídica" no exercício do mandato de um preso em regime fechado, mas não havia enxergado o mesmo no caso de Cassol, cuja pena lhe dá direito ao regime semiaberto; de dia no Parlamento, de noite na cadeia.
Para a absolvição por enquanto anulada, há uma série de explicações à disposição. Seria uma ação preventiva para evitar que amanhã ou depois deputados e senadores venham a receber o mesmo castigo, uma vez que não são poucos os que têm processos correntes no Supremo Tribunal Federal e que não são pequenas as chances de serem condenados.
Donadon foi o primeiro, os mensaleiros Pedro Henry, João Paulo Cunha, José Genoino e Valdemar Costa Neto integraram a segunda leva e Cassol o mais recente exemplo de uma nova era inaugurada em 2001, quando o Congresso mudou a regra do jogo no tocante à imunidade parlamentar.
Até então, o STF só podia processar uma excelência mediante autorização do Legislativo - o que obviamente nunca acontecia - e desde então vale o oposto: o tribunal abre o processo se considerar que há razão para tal e o Congresso pode suspendê-lo mediante manifestação explícita, mas nunca o fez nesses 12 anos. Ou faltou coragem ou ninguém teve a ideia.
A outra explicação para aquele perdão ao par condenado por formação de quadrilha e desvio de dinheiro da Assembleia Legislativa de Rondônia é o misto de "pena e compadrio" aludido pelo presidente da Câmara, Henrique Alves, em entrevista neste domingo ao Estado.
Fala-se também que influiu na decisão o desagrado reinante na Casa com ações judiciais envolvendo políticos. Acrescenta-se à lista uma tentativa de criar jurisprudência para favorecer os deputados condenados no mensalão.
Todas essas alegações podem até explicar em parte, mas não justificam o todo. Qual seria o interesse do Parlamento em tomar decisões insensatas (para dizer o mínimo) que não rendem benefícios objetivos, ao contrário, produzem um enorme prejuízo coletivo?
O que ganha a Câmara com um deputado preso? O que ganha cada parlamentar que se expõe mais e mais à reação popular na rua, no aeroporto, na escola dos filhos? Para eles seria muito melhor desfrutar de algum prestígio, integrar uma instituição menos desgastada, inspirar um pouco de respeitabilidade.
A mesma lógica aplica-se ao PT em relação aos seus deputados condenados. Supondo que a bancada petista tenha facilitado a absolvição de Donadon para criar um precedente aos seus, é de se perguntar qual vantagem o partido leva com isso.
Aparentemente, só fica em desvantagem. Não faz a tão desejada virada de página e se mantém como alvo de críticas, sem que nada de concreto possa fazer para salvar os correligionários.
Se a ideia é ganhar um embate com a Justiça, francamente, é uma ideia fadada ao fracasso. Além de não existirem objetos de disputa entre os Poderes Legislativo e Judiciário, não há vitória nem afirmação de coisa alguma no fato de se criar a figura do parlamentar presidiário.
Só piora o conceito dos políticos, alimenta a ira pública, fragiliza a instituição, fomenta o desrespeito e não produz um mísero ganho. De onde a tendência do Congresso de atear fogo às próprias vestes continua sem explicação convincente.
Volto ao assunto Donadon para confessar dificuldade de compreender a real motivação do conjunto de deputados que agiu ou se omitiu para assegurar a permanência do título parlamentar ao colega preso na Papuda.
Situação ainda mais confusa e constrangedora em face da decisão do ministro Luís Roberto Barroso de aceitar liminarmente suspender a validade da sessão do perdão. Barroso contrariou (corrigiu?) o próprio voto na recente condenação do senador Ivo Cassol em que optou pelo artigo da Constituição que dá a última palavra ao Legislativo.
Ele viu impossibilidade "física e jurídica" no exercício do mandato de um preso em regime fechado, mas não havia enxergado o mesmo no caso de Cassol, cuja pena lhe dá direito ao regime semiaberto; de dia no Parlamento, de noite na cadeia.
Para a absolvição por enquanto anulada, há uma série de explicações à disposição. Seria uma ação preventiva para evitar que amanhã ou depois deputados e senadores venham a receber o mesmo castigo, uma vez que não são poucos os que têm processos correntes no Supremo Tribunal Federal e que não são pequenas as chances de serem condenados.
Donadon foi o primeiro, os mensaleiros Pedro Henry, João Paulo Cunha, José Genoino e Valdemar Costa Neto integraram a segunda leva e Cassol o mais recente exemplo de uma nova era inaugurada em 2001, quando o Congresso mudou a regra do jogo no tocante à imunidade parlamentar.
Até então, o STF só podia processar uma excelência mediante autorização do Legislativo - o que obviamente nunca acontecia - e desde então vale o oposto: o tribunal abre o processo se considerar que há razão para tal e o Congresso pode suspendê-lo mediante manifestação explícita, mas nunca o fez nesses 12 anos. Ou faltou coragem ou ninguém teve a ideia.
A outra explicação para aquele perdão ao par condenado por formação de quadrilha e desvio de dinheiro da Assembleia Legislativa de Rondônia é o misto de "pena e compadrio" aludido pelo presidente da Câmara, Henrique Alves, em entrevista neste domingo ao Estado.
Fala-se também que influiu na decisão o desagrado reinante na Casa com ações judiciais envolvendo políticos. Acrescenta-se à lista uma tentativa de criar jurisprudência para favorecer os deputados condenados no mensalão.
Todas essas alegações podem até explicar em parte, mas não justificam o todo. Qual seria o interesse do Parlamento em tomar decisões insensatas (para dizer o mínimo) que não rendem benefícios objetivos, ao contrário, produzem um enorme prejuízo coletivo?
O que ganha a Câmara com um deputado preso? O que ganha cada parlamentar que se expõe mais e mais à reação popular na rua, no aeroporto, na escola dos filhos? Para eles seria muito melhor desfrutar de algum prestígio, integrar uma instituição menos desgastada, inspirar um pouco de respeitabilidade.
A mesma lógica aplica-se ao PT em relação aos seus deputados condenados. Supondo que a bancada petista tenha facilitado a absolvição de Donadon para criar um precedente aos seus, é de se perguntar qual vantagem o partido leva com isso.
Aparentemente, só fica em desvantagem. Não faz a tão desejada virada de página e se mantém como alvo de críticas, sem que nada de concreto possa fazer para salvar os correligionários.
Se a ideia é ganhar um embate com a Justiça, francamente, é uma ideia fadada ao fracasso. Além de não existirem objetos de disputa entre os Poderes Legislativo e Judiciário, não há vitória nem afirmação de coisa alguma no fato de se criar a figura do parlamentar presidiário.
Só piora o conceito dos políticos, alimenta a ira pública, fragiliza a instituição, fomenta o desrespeito e não produz um mísero ganho. De onde a tendência do Congresso de atear fogo às próprias vestes continua sem explicação convincente.
Pedagogia espartana - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 03/09
SÃO PAULO - A espionagem é tão velha quanto a civilização. Não serão o Itamaraty nem o governo Dilma Rousseff que acabarão com a prática. Ainda assim, a notícia, revelada pelo "Fantástico", de que a presidente e seus principais assessores foram diretamente bisbilhotados pela NSA norte-americana não pode passar sem resposta vigorosa.
Diz a lenda que em Esparta as crianças eram incentivadas a roubar comida de seus colegas. Mas pobre daquela que fosse pega. Seria severamente punida. Não tanto pelo roubo, mas pela incompetência ao executá-lo. É fácil condenar a pedagogia espartana. Há uma indisfarçável hipocrisia em estimular a burla e, ao mesmo tempo, aplicar uma sanção ao trapaceador.
O sistema fica menos ilógico se o concebermos como uma tentativa de conciliar a necessidade de implementar regras de convivência intragrupo, como as disposições antifurto, com o beabá do realismo político. Ao atribuir um custo para a violação da norma, os espartanos cumprem o objetivo de buscar a coesão social e, ao incitar o descumprimento, apenas reafirmam um subtexto que, gostemos ou não, vale para qualquer lei em qualquer circunstância: se você não for apanhado, vai se dar bem.
Os EUA, como potência com múltiplos recursos e um número ainda maior de interesses, sempre espionaram, tanto seus inimigos como seus aliados. E qualquer um que não fosse um romântico ingênuo já sabia disso antes do WikiLeaks e de Snowden. Mas há uma diferença entre saber em teoria e dar de cara com provas materiais. Dilma, a exemplo do pedagogo espartano, precisa reagir.
Não fazê-lo equivaleria a dizer que só o que rege as relações internacionais é a lei do mais forte. Ela decerto dá o tom, mas, se desejamos um dia constituir uma comunidade de nações guiada também por princípios, precisamos começar por criar desconforto para países que se deixam apanhar em situação embaraçosa.
SÃO PAULO - A espionagem é tão velha quanto a civilização. Não serão o Itamaraty nem o governo Dilma Rousseff que acabarão com a prática. Ainda assim, a notícia, revelada pelo "Fantástico", de que a presidente e seus principais assessores foram diretamente bisbilhotados pela NSA norte-americana não pode passar sem resposta vigorosa.
Diz a lenda que em Esparta as crianças eram incentivadas a roubar comida de seus colegas. Mas pobre daquela que fosse pega. Seria severamente punida. Não tanto pelo roubo, mas pela incompetência ao executá-lo. É fácil condenar a pedagogia espartana. Há uma indisfarçável hipocrisia em estimular a burla e, ao mesmo tempo, aplicar uma sanção ao trapaceador.
O sistema fica menos ilógico se o concebermos como uma tentativa de conciliar a necessidade de implementar regras de convivência intragrupo, como as disposições antifurto, com o beabá do realismo político. Ao atribuir um custo para a violação da norma, os espartanos cumprem o objetivo de buscar a coesão social e, ao incitar o descumprimento, apenas reafirmam um subtexto que, gostemos ou não, vale para qualquer lei em qualquer circunstância: se você não for apanhado, vai se dar bem.
Os EUA, como potência com múltiplos recursos e um número ainda maior de interesses, sempre espionaram, tanto seus inimigos como seus aliados. E qualquer um que não fosse um romântico ingênuo já sabia disso antes do WikiLeaks e de Snowden. Mas há uma diferença entre saber em teoria e dar de cara com provas materiais. Dilma, a exemplo do pedagogo espartano, precisa reagir.
Não fazê-lo equivaleria a dizer que só o que rege as relações internacionais é a lei do mais forte. Ela decerto dá o tom, mas, se desejamos um dia constituir uma comunidade de nações guiada também por princípios, precisamos começar por criar desconforto para países que se deixam apanhar em situação embaraçosa.
Defesa preventiva? - LUIZ GARCIA
O GLOBO - 03/09
É um ladrãozinho barato. Não seria absurdo dizer que alguns de seus companheiros de mandato já fizeram igual ou pior
Deputados federais — assim como todos os políticos que ganham mandatos pelo voto popular — têm uma dívida permanente com quem os elege. Na verdade, são duas dívidas: uma, de votarem projetos que sejam do interesse público; e outra, de zelarem pela qualidade moral do Legislativo. E isso não aconteceu na votação da Câmara na semana passada, que manteve o mandato do deputado Natan Donadon, que no momento representa seus eleitores de Rondônia com alguma dificuldade, uma vez que cumpre pena — com provas impecáveis — pelos crimes de peculato e formação de quadrilha. É um ladrãozinho barato, mas talvez não seria absurdo dizer que alguns de seus companheiros de mandato já fizeram igual ou pior.
Não é exagero, certamente, considerar que alguns dos deputados que votaram a favor de Donadon agiram em ilegítima defesa preventiva de seus próprios mandatos, beneficiados pelo sistema de votação secreta. O que é, em si, um absurdo. Membros do Legislativo deveriam, por respeito aos cidadãos que os elegeram, votar, em todos os casos, abertamente — numa permanente prestação de contas a quem lhes deu seus votos e sua confiança.
A decisão da Câmara é obviamente escandalosa. Ministros do Supremo Tribunal Federal consideram-na inconstitucional. E reagiram com a necessária indignação, principalmente porque o STF não apenas condenara Donadon à pena de cadeia: também suspendeu os seus direitos políticos, o que, obviamente impede o exercício de um mandato no Legislativo. E com certeza membros do STF entendem mais de leis do que a grande maioria dos membros do Congresso.
Os deputados, no momento, correm atrás do prejuízo. E se preparam para votar uma emenda à Constituição que determine a cassação automática de parlamentares condenados por crimes ou flagrados em falta de decoro. A opinião pública certamente gostaria que isso não fosse necessário. Mas, obviamente, o sistema atual, agravado pela votação secreta, favorece um inaceitável tipo de coleguismo no Legislativo — e, em alguns casos, com certeza, ele significa uma espécie de defesa ilegítima preventiva.
É um ladrãozinho barato. Não seria absurdo dizer que alguns de seus companheiros de mandato já fizeram igual ou pior
Deputados federais — assim como todos os políticos que ganham mandatos pelo voto popular — têm uma dívida permanente com quem os elege. Na verdade, são duas dívidas: uma, de votarem projetos que sejam do interesse público; e outra, de zelarem pela qualidade moral do Legislativo. E isso não aconteceu na votação da Câmara na semana passada, que manteve o mandato do deputado Natan Donadon, que no momento representa seus eleitores de Rondônia com alguma dificuldade, uma vez que cumpre pena — com provas impecáveis — pelos crimes de peculato e formação de quadrilha. É um ladrãozinho barato, mas talvez não seria absurdo dizer que alguns de seus companheiros de mandato já fizeram igual ou pior.
Não é exagero, certamente, considerar que alguns dos deputados que votaram a favor de Donadon agiram em ilegítima defesa preventiva de seus próprios mandatos, beneficiados pelo sistema de votação secreta. O que é, em si, um absurdo. Membros do Legislativo deveriam, por respeito aos cidadãos que os elegeram, votar, em todos os casos, abertamente — numa permanente prestação de contas a quem lhes deu seus votos e sua confiança.
A decisão da Câmara é obviamente escandalosa. Ministros do Supremo Tribunal Federal consideram-na inconstitucional. E reagiram com a necessária indignação, principalmente porque o STF não apenas condenara Donadon à pena de cadeia: também suspendeu os seus direitos políticos, o que, obviamente impede o exercício de um mandato no Legislativo. E com certeza membros do STF entendem mais de leis do que a grande maioria dos membros do Congresso.
Os deputados, no momento, correm atrás do prejuízo. E se preparam para votar uma emenda à Constituição que determine a cassação automática de parlamentares condenados por crimes ou flagrados em falta de decoro. A opinião pública certamente gostaria que isso não fosse necessário. Mas, obviamente, o sistema atual, agravado pela votação secreta, favorece um inaceitável tipo de coleguismo no Legislativo — e, em alguns casos, com certeza, ele significa uma espécie de defesa ilegítima preventiva.
Marketing da discórdia - XICO GRAZIANO
O Estado de S.Paulo - 03/09
Toni Ramos que se cuide. Ao virar garoto-propaganda da Friboi, o ator meteu-se numa encrenca que mobiliza o setor de carne bovina no Brasil. Os pecuaristas vislumbram, com temor, a formação de poderoso cartel entre os frigoríficos. Ruim para a boiada, péssimo para o churrasco.
Começou há meses esse embaraço. Articulada com o apoio da conceituada ONG Amigos da Terra, uma série de reportagens do Fantástico (TV Globo) mostrava, com imagens horríveis, a triste situação dos abatedouros municipais no País. Moscas, ratos, urubus misturavam-se à sujeira sanguinolenta, atestando absoluta falta de higiene no descarne das reses. As matérias induziam o telespectador a descobrir a origem da carne que consumiam. Cuidado com a carne clandestina.
A tese está correta. O serviço de inspeção veterinária é fundamental para verificar a existência, no animal abatido, de certas zoonoses, como tuberculose e cisticercose, potencialmente transmissíveis aos humanos. Ademais, somente profissionais habilitados conseguem averiguar as adequadas condições de asseio, impedindo a contaminação local da carne. A morte do bicho ainda deve seguir as regras do abate humanitário, amenizando seu sofrimento. Nenhum frigorífico poderia funcionar sem obedecer a tais exigências.
Ao que tudo indica, porém, houve um jogo combinado. Logo na sequência daquele impactante jornalismo, começou a ser veiculada uma forte campanha de marketing enaltecendo a excelência da carne oriunda da Friboi. As peças publicitárias sugerem ao consumidor que somente o produto dessa empresa garante a qualidade do bife. Foi essa mensagem que irritou profundamente a senadora Kátia Abreu (PR-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Em discurso na tribuna do Senado, a líder ruralista denunciou um "marketing enganoso" no ramo de comércio da carne bovina. Reforçando sua posição em artigo publicado na Folha de S.Paulo (Arquitetura do monopólio, 19/8), a parlamentar acusou o Grupo JBS, dono da marca Friboi, de se aproveitar de vultosos empréstimos obtidos no BNDES (acima de R$ 7 bilhões) para buscar o monopólio do setor. Com respaldo do poder público, estaria ocorrendo um "massacre publicitário" contra as demais empresas frigoríficas do País.
A polêmica avolumou-se. Roberto Smeraldi, sério ambientalista, responsável pela ONG Amigos da Terra, safou-se do conluio em favor do monopólio da carne. Disse apenas lutar, honestamente, pelo direito do consumidor de usufruir um produto sadio, mostrando ter servido de inocente útil na jogada do poderio econômico. O núcleo da questão reside no seguinte: seria saudável apenas a carne oriunda de grandes frigoríficos, ou os pequenos abatedouros também conseguiriam assegurar a qualidade de seu produto?
A legislação sobre a inspeção sanitária de produtos de origem animal no Brasil vem desde 1950. Atualizada em 1989, estabeleceu três níveis, crescentemente rigorosos, para o trabalho de fiscalização. Funciona assim: para a venda apenas dentro de cada município, vale o Serviço de Inspeção Municipal (SIM), a cargo das prefeituras; a distribuição em nível intermunicipal exige o Serviço de Inspeção Estadual (SIE), mantido pelos governos; sendo o negócio nacional ou internacional, manda o Serviço de Inspeção Federal (SIF), exercido pela União. Em qualquer um deles, a inspeção é obrigatoriamente realizada por médico veterinário pertencente ao quadro público. Um serviço estatal.
Esse modelo de inspeção, territorial e estatizante, vem sendo questionado há tempos. Em contraposição, defende-se um sistema integrado com as empresas processadoras, imputando a estas a responsabilidade de garantir a qualidade de seus produtos. Nesse caso, caberia ao Estado, com poder de polícia, verificar o cumprimento da legislação. Haveria vantagens para a produção artesanal, que seria certificada num processo distinto do industrial, e as barreiras geográficas seriam substituídas por requisitos tecnológicos. Assim se procede em quase todo o mundo.
Hoje se toma como princípio, equivocado, que o rigor na inspeção é exclusividade do SIF, sobrevalorizando o âmbito federal. Sim, é verdade, suas normativas são bastante exigentes. Mas, infelizmente, acabam definindo um padrão, oneroso e burocrático, incompatível com o processamento de pequena escala, favorecendo os grandes frigoríficos. O problema atinge outros setores. Boa parte, por exemplo, do queijo fresco, típico do interior, elaborado historicamente pelos agricultores familiares, é jogada na clandestinidade pelas normas que, em nome da qualidade, beneficiam sempre os maiores laticínios. A legislação conspira contra os singelos.
O atributo da carne na panela, ou do queijo na goiabada, não se mede necessariamente pela escala do negócio. Mais importante que fechar os abatedouros vagabundos, cabe ao poder público ajudar na transformação tecnológica dos pequenos e médios empreendimentos, que precisam ser melhorados, devidamente fiscalizados. Não é justo, nem realista, supor que as periferias metropolitanas e o interior do Brasil venham a ser abastecidos somente pelos grandes conglomerados da alimentação.
Não se pode recriminar Toni Ramos nem seus colegas artistas por ganharem seu pão. Nem mesmo a Friboi deve ser condenado por investir em sua imagem. Errado, isso sim, opera um sistema que, seja na política do BNDES, seja no esquema da inspeção sanitária, atua em favor dos poderosos. Existem cerca de 1.300 frigoríficos espalhados pelo País que contribuem, bem ou mal, para oferecer a proteína e o gosto da carne na mesa das famílias. Seria bom vê-los aprimorados, não engolidos pela truculência capitalista.
Toni Ramos que se cuide. Ao virar garoto-propaganda da Friboi, o ator meteu-se numa encrenca que mobiliza o setor de carne bovina no Brasil. Os pecuaristas vislumbram, com temor, a formação de poderoso cartel entre os frigoríficos. Ruim para a boiada, péssimo para o churrasco.
Começou há meses esse embaraço. Articulada com o apoio da conceituada ONG Amigos da Terra, uma série de reportagens do Fantástico (TV Globo) mostrava, com imagens horríveis, a triste situação dos abatedouros municipais no País. Moscas, ratos, urubus misturavam-se à sujeira sanguinolenta, atestando absoluta falta de higiene no descarne das reses. As matérias induziam o telespectador a descobrir a origem da carne que consumiam. Cuidado com a carne clandestina.
A tese está correta. O serviço de inspeção veterinária é fundamental para verificar a existência, no animal abatido, de certas zoonoses, como tuberculose e cisticercose, potencialmente transmissíveis aos humanos. Ademais, somente profissionais habilitados conseguem averiguar as adequadas condições de asseio, impedindo a contaminação local da carne. A morte do bicho ainda deve seguir as regras do abate humanitário, amenizando seu sofrimento. Nenhum frigorífico poderia funcionar sem obedecer a tais exigências.
Ao que tudo indica, porém, houve um jogo combinado. Logo na sequência daquele impactante jornalismo, começou a ser veiculada uma forte campanha de marketing enaltecendo a excelência da carne oriunda da Friboi. As peças publicitárias sugerem ao consumidor que somente o produto dessa empresa garante a qualidade do bife. Foi essa mensagem que irritou profundamente a senadora Kátia Abreu (PR-TO), presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Em discurso na tribuna do Senado, a líder ruralista denunciou um "marketing enganoso" no ramo de comércio da carne bovina. Reforçando sua posição em artigo publicado na Folha de S.Paulo (Arquitetura do monopólio, 19/8), a parlamentar acusou o Grupo JBS, dono da marca Friboi, de se aproveitar de vultosos empréstimos obtidos no BNDES (acima de R$ 7 bilhões) para buscar o monopólio do setor. Com respaldo do poder público, estaria ocorrendo um "massacre publicitário" contra as demais empresas frigoríficas do País.
A polêmica avolumou-se. Roberto Smeraldi, sério ambientalista, responsável pela ONG Amigos da Terra, safou-se do conluio em favor do monopólio da carne. Disse apenas lutar, honestamente, pelo direito do consumidor de usufruir um produto sadio, mostrando ter servido de inocente útil na jogada do poderio econômico. O núcleo da questão reside no seguinte: seria saudável apenas a carne oriunda de grandes frigoríficos, ou os pequenos abatedouros também conseguiriam assegurar a qualidade de seu produto?
A legislação sobre a inspeção sanitária de produtos de origem animal no Brasil vem desde 1950. Atualizada em 1989, estabeleceu três níveis, crescentemente rigorosos, para o trabalho de fiscalização. Funciona assim: para a venda apenas dentro de cada município, vale o Serviço de Inspeção Municipal (SIM), a cargo das prefeituras; a distribuição em nível intermunicipal exige o Serviço de Inspeção Estadual (SIE), mantido pelos governos; sendo o negócio nacional ou internacional, manda o Serviço de Inspeção Federal (SIF), exercido pela União. Em qualquer um deles, a inspeção é obrigatoriamente realizada por médico veterinário pertencente ao quadro público. Um serviço estatal.
Esse modelo de inspeção, territorial e estatizante, vem sendo questionado há tempos. Em contraposição, defende-se um sistema integrado com as empresas processadoras, imputando a estas a responsabilidade de garantir a qualidade de seus produtos. Nesse caso, caberia ao Estado, com poder de polícia, verificar o cumprimento da legislação. Haveria vantagens para a produção artesanal, que seria certificada num processo distinto do industrial, e as barreiras geográficas seriam substituídas por requisitos tecnológicos. Assim se procede em quase todo o mundo.
Hoje se toma como princípio, equivocado, que o rigor na inspeção é exclusividade do SIF, sobrevalorizando o âmbito federal. Sim, é verdade, suas normativas são bastante exigentes. Mas, infelizmente, acabam definindo um padrão, oneroso e burocrático, incompatível com o processamento de pequena escala, favorecendo os grandes frigoríficos. O problema atinge outros setores. Boa parte, por exemplo, do queijo fresco, típico do interior, elaborado historicamente pelos agricultores familiares, é jogada na clandestinidade pelas normas que, em nome da qualidade, beneficiam sempre os maiores laticínios. A legislação conspira contra os singelos.
O atributo da carne na panela, ou do queijo na goiabada, não se mede necessariamente pela escala do negócio. Mais importante que fechar os abatedouros vagabundos, cabe ao poder público ajudar na transformação tecnológica dos pequenos e médios empreendimentos, que precisam ser melhorados, devidamente fiscalizados. Não é justo, nem realista, supor que as periferias metropolitanas e o interior do Brasil venham a ser abastecidos somente pelos grandes conglomerados da alimentação.
Não se pode recriminar Toni Ramos nem seus colegas artistas por ganharem seu pão. Nem mesmo a Friboi deve ser condenado por investir em sua imagem. Errado, isso sim, opera um sistema que, seja na política do BNDES, seja no esquema da inspeção sanitária, atua em favor dos poderosos. Existem cerca de 1.300 frigoríficos espalhados pelo País que contribuem, bem ou mal, para oferecer a proteína e o gosto da carne na mesa das famílias. Seria bom vê-los aprimorados, não engolidos pela truculência capitalista.
200 milhões, 70% em ação - GUSTAVO PATU
FOLHA DE SP - 03/09
BRASÍLIA - Eram 90 milhões em ação na canção que embalava a torcida nacional na Copa do Mundo de 1970, vencida gloriosamente pelo Brasil. Hoje, segundo as estimativas mais recentes do IBGE, já foi ultrapassada a casa dos 200 milhões.
Ufanismo futebolístico à parte, nem todos estão em ação. Para as convenções da estatística econômica, estão em idade ativa pouco menos de 70% da população brasileira, aqueles com idade entre 15 e 65 anos, entre a adolescência e a aposentadoria.
Isso significa que o país está muito perto do auge da contribuição das transformações demográficas para o crescimento da produção e da renda. Com o número de crianças em queda e o de idosos ainda relativamente pequeno, há menos inativos a serem mantidos com as riquezas geradas pelo trabalho dos demais.
O mundo desenvolvido já atravessou essa etapa do amadurecimento, quando há maior margem para poupança, chances de aprimorar a educação com o aumento dos gastos dos governos e das famílias por criança e até melhora da segurança pública.
Economistas, propensos à intranquilidade, alertam cada vez mais frequentemente para o risco de o país não aproveitar ao máximo essa oportunidade. Afinal, depois da Copa de 2022, no Qatar, o envelhecimento dos brasileiros já estará tão avançado que a proporção de inativos reassumirá a tendência de alta.
Se o critério for enriquecimento material, as preocupações procedem. Após o surto de prosperidade da segunda metade da década passada, o Brasil voltou a progredir em ritmo lento. No entanto, com mais escolarizados e menos ingressos no mercado de trabalho, a distância entre ricos e pobres passou a cair.
É o oposto do que acontecia nos anos 70, quando a economia e a desigualdade social ganhavam impulso juntas. A contradição entre o crescimento do bolo e sua divisão, então atribuída pela esquerda à ditadura militar, ainda não foi superada.
BRASÍLIA - Eram 90 milhões em ação na canção que embalava a torcida nacional na Copa do Mundo de 1970, vencida gloriosamente pelo Brasil. Hoje, segundo as estimativas mais recentes do IBGE, já foi ultrapassada a casa dos 200 milhões.
Ufanismo futebolístico à parte, nem todos estão em ação. Para as convenções da estatística econômica, estão em idade ativa pouco menos de 70% da população brasileira, aqueles com idade entre 15 e 65 anos, entre a adolescência e a aposentadoria.
Isso significa que o país está muito perto do auge da contribuição das transformações demográficas para o crescimento da produção e da renda. Com o número de crianças em queda e o de idosos ainda relativamente pequeno, há menos inativos a serem mantidos com as riquezas geradas pelo trabalho dos demais.
O mundo desenvolvido já atravessou essa etapa do amadurecimento, quando há maior margem para poupança, chances de aprimorar a educação com o aumento dos gastos dos governos e das famílias por criança e até melhora da segurança pública.
Economistas, propensos à intranquilidade, alertam cada vez mais frequentemente para o risco de o país não aproveitar ao máximo essa oportunidade. Afinal, depois da Copa de 2022, no Qatar, o envelhecimento dos brasileiros já estará tão avançado que a proporção de inativos reassumirá a tendência de alta.
Se o critério for enriquecimento material, as preocupações procedem. Após o surto de prosperidade da segunda metade da década passada, o Brasil voltou a progredir em ritmo lento. No entanto, com mais escolarizados e menos ingressos no mercado de trabalho, a distância entre ricos e pobres passou a cair.
É o oposto do que acontecia nos anos 70, quando a economia e a desigualdade social ganhavam impulso juntas. A contradição entre o crescimento do bolo e sua divisão, então atribuída pela esquerda à ditadura militar, ainda não foi superada.
STF se harmoniza - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 03/09
Ao suspender a decisão do plenário da Câmara de não cassar o mandato do deputado federal Natan Donadon, o ministro do Supremo Tribunal Federal Luiz Roberto Barroso se reaproxima, mesmo que de maneira indireta, da jurisprudência sobre perda de mandatos parlamentares que ajudara a modificar na decisão sobre o caso do senador Ivo Cassol.
Naquela ocasião, os votos dos dois novos ministros, Barroso e Teori Zavascki, mudaram o entendimento do Supremo quanto à cassação de mandatos, fazendo com que a decisão final passasse a ser do Congresso. No julgamento do mensalão, o STF havia decidido pela perda dos direitos políticos dos condenados, o que levaria automaticamente à cassação do mandato de acordo com o parágrafo IV do artigo 55 da Constituição.
Nos casos fora do mensalão as penas não se referem à perda dos direitos políticos, e, portanto, abriu-se uma brecha para que fosse usado o artigo VI do mesmo artigo 55 da Constituição, que determina que perderá o mandato o deputado ou senador "que sofrer condenação criminal em sentença transitada."
Nesse caso, a cassação, em vez de ser automática, depende de votação secreta do plenário, que acabou livrando Donadon. Mas Barroso avaliou em sua liminar que todo condenado em regime fechado que tenha que permanecer detido por prazo superior ao que lhe resta de mandato não pode exercer cargo político.
Ele esclarece que sua decisão não produz perda automática do mandato, "cuja declaração - ainda quando constitua ato vinculado - é de atribuição da Mesa da Câmara" Os ministros que votaram, no julgamento do mensalão, pela perda dos direitos políticos dos parlamentares condenados, basearam-se no artigo 15 da Constituição, segundo o qual a perda ou suspensão dos direitos políticos acontece devido a (...) III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.
Como não é possível haver deputado ou senador sem direitos políticos, a cassação do mandato é automática, bastando que a Mesa da Câmara formalize. A "impossibilidade jurídica" de um condenado exercer o mandato ficou claramente exposta na decisão do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, que convocou o suplente de Donadon para assumir o cargo.
O ministro Luiz Roberto Barroso considera que a diferença entre os casos é o regime fechado a que Donadon está condenado, mas os cinco ministros que haviam votado pela cassação automática viam o mesmo problema para os condenados em regime semiaberto, pois seriam parlamentares que teriam que dormir na cadeia depois de trabalhar durante o dia como congressistas, uma situação esdrúxula.
Ao determinar que Donadon não poderá exercer sua função, o ministro chegou à mesma conclusão, por outros caminhos, dos que decretaram a cassação automática pela perda dos direitos políticos. Apenas Barroso é mais restrito ao definir a "impossibilidade jurídica".
No seu voto, Barroso deixa claro, no entanto, que concorda com a tese de que um parlamentar condenado por crime grave deve perder o mandato, e avalia que é papel do Legislativo deixar clara a punição na Constituição, livrando-a de contradições. O caso demonstra também que não será possível à defesa do deputado federal João Paulo Cunha, condenado ao regime fechado, questionar a perda automática do mandato nos embargos de declaração.
Outros três deputados, porém, estão condenados a regime semiaberto: José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), e eles poderão pedir a atualização da jurisprudência do STF. Mas como a decisão no mensalão cassou seus direitos políticos, os casos não se assemelham aos demais, o que indica que não será através dos embargos de declaração que conseguirão ter as penas reduzidas.
Com relação aos embargos infringentes, o presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, pretende definir a questão esta semana. Vai fazer tudo para que os cinco casos de embargos de declaração que ainda restam sejam analisados na sessão de amanhã, para que na quinta-feira os ministros decidam a questão dos infringentes.
Se for preciso, é possível que ele convoque uma sessão extra na sexta-feira para que a situação esteja resolvida antes do dia 7 de setembro, quando estão sendo esperadas manifestações pelo país, sendo que uma das principais bandeiras é a prisão para os mensaleiros.
Naquela ocasião, os votos dos dois novos ministros, Barroso e Teori Zavascki, mudaram o entendimento do Supremo quanto à cassação de mandatos, fazendo com que a decisão final passasse a ser do Congresso. No julgamento do mensalão, o STF havia decidido pela perda dos direitos políticos dos condenados, o que levaria automaticamente à cassação do mandato de acordo com o parágrafo IV do artigo 55 da Constituição.
Nos casos fora do mensalão as penas não se referem à perda dos direitos políticos, e, portanto, abriu-se uma brecha para que fosse usado o artigo VI do mesmo artigo 55 da Constituição, que determina que perderá o mandato o deputado ou senador "que sofrer condenação criminal em sentença transitada."
Nesse caso, a cassação, em vez de ser automática, depende de votação secreta do plenário, que acabou livrando Donadon. Mas Barroso avaliou em sua liminar que todo condenado em regime fechado que tenha que permanecer detido por prazo superior ao que lhe resta de mandato não pode exercer cargo político.
Ele esclarece que sua decisão não produz perda automática do mandato, "cuja declaração - ainda quando constitua ato vinculado - é de atribuição da Mesa da Câmara" Os ministros que votaram, no julgamento do mensalão, pela perda dos direitos políticos dos parlamentares condenados, basearam-se no artigo 15 da Constituição, segundo o qual a perda ou suspensão dos direitos políticos acontece devido a (...) III - condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos.
Como não é possível haver deputado ou senador sem direitos políticos, a cassação do mandato é automática, bastando que a Mesa da Câmara formalize. A "impossibilidade jurídica" de um condenado exercer o mandato ficou claramente exposta na decisão do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves, que convocou o suplente de Donadon para assumir o cargo.
O ministro Luiz Roberto Barroso considera que a diferença entre os casos é o regime fechado a que Donadon está condenado, mas os cinco ministros que haviam votado pela cassação automática viam o mesmo problema para os condenados em regime semiaberto, pois seriam parlamentares que teriam que dormir na cadeia depois de trabalhar durante o dia como congressistas, uma situação esdrúxula.
Ao determinar que Donadon não poderá exercer sua função, o ministro chegou à mesma conclusão, por outros caminhos, dos que decretaram a cassação automática pela perda dos direitos políticos. Apenas Barroso é mais restrito ao definir a "impossibilidade jurídica".
No seu voto, Barroso deixa claro, no entanto, que concorda com a tese de que um parlamentar condenado por crime grave deve perder o mandato, e avalia que é papel do Legislativo deixar clara a punição na Constituição, livrando-a de contradições. O caso demonstra também que não será possível à defesa do deputado federal João Paulo Cunha, condenado ao regime fechado, questionar a perda automática do mandato nos embargos de declaração.
Outros três deputados, porém, estão condenados a regime semiaberto: José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT), e eles poderão pedir a atualização da jurisprudência do STF. Mas como a decisão no mensalão cassou seus direitos políticos, os casos não se assemelham aos demais, o que indica que não será através dos embargos de declaração que conseguirão ter as penas reduzidas.
Com relação aos embargos infringentes, o presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa, pretende definir a questão esta semana. Vai fazer tudo para que os cinco casos de embargos de declaração que ainda restam sejam analisados na sessão de amanhã, para que na quinta-feira os ministros decidam a questão dos infringentes.
Se for preciso, é possível que ele convoque uma sessão extra na sexta-feira para que a situação esteja resolvida antes do dia 7 de setembro, quando estão sendo esperadas manifestações pelo país, sendo que uma das principais bandeiras é a prisão para os mensaleiros.
O preço da cultura - VLADIMIR SAFATLE
FOLHA DE SP - 03/09
Diante da repercussão a respeito da decisão de permitir que estilistas financiassem desfiles de moda por meio da Lei Rouanet, o Ministério da Cultura procurou se defender.
Usando um raciocínio eminentemente estratégico, em que as palavras de ordem são a importância econômica da cultura e seu papel na ampliação do poder do Brasil no jogo internacional, o MinC acabou por demonstrar a rendição final da política cultural brasileira aos argumentos do mais crasso economicismo.
Primeiro, ninguém discute que, de uma certa forma, moda é cultura, assim como telenovelas, futebol e práticas sexuais. Todos são modos de produção simbólica de valores.
Uma definição, porém, tão genérica de cultura não tem função alguma para a construção de políticas focadas de Estado. Muito menos a alegada definição de que aquilo que colabora para a internacionalização do Brasil e a divulgação de sua simbologia deve ser financiado. Pelo argumento, a TV Globo pode pedir isenção fiscal para as suas próximas telenovelas.
Como não podia deixar de ser, é no campo da cultura que se vê, de forma mais brutal, a deposição de toda e qualquer aspiração crítica e contestadora de certa esquerda brasileira. Fala-se em "quebra de paradigma", mas o Ministério da Cultura apenas implementa o paradigma, cada vez mais hegemônico, de indistinção geral entre arte, entretenimento e mercadoria.
Afinal, há de chamar de "gato" um gato. Estilistas são, acima de tudo, comerciantes donos de loja que organizam sua produção a partir da sensibilidade às demandas de mercado e a exigências de máxima rentabilização de seu capital. Mas grupos de teatro não são empresas, escritores não são comerciantes e um quadro não é uma mercadoria, mesmo que tenha um preço.
As políticas culturais foram criadas exatamente para garantir autonomia para a produção artística contra sua colonização pela lógica mercantil, contra sua restrição à condição de mero entretenimento "cool", além de pen- sar formas de impedir a consolidação de práticas de dirigismo cultural.
Contudo, para que algo dessa natureza fosse possível, estruturas como a Lei Rouanet deveriam ser radicalmente modificadas. Um bilhão e duzentos mil reais foram perdidos pelo Estado para que empresas fizessem políticas de marketing às custas do erário, financiando, principalmente, musicais, Oktoberfest, festas gastronômicas, atividades da torcida do Palmeiras e, agora, desfiles de moda.
Pergunte, no entanto, quanto desse dinheiro foi direcionado à construção de conservatórios de música, bibliotecas ou em auxílio a saraus literários na periferia.
Diante da repercussão a respeito da decisão de permitir que estilistas financiassem desfiles de moda por meio da Lei Rouanet, o Ministério da Cultura procurou se defender.
Usando um raciocínio eminentemente estratégico, em que as palavras de ordem são a importância econômica da cultura e seu papel na ampliação do poder do Brasil no jogo internacional, o MinC acabou por demonstrar a rendição final da política cultural brasileira aos argumentos do mais crasso economicismo.
Primeiro, ninguém discute que, de uma certa forma, moda é cultura, assim como telenovelas, futebol e práticas sexuais. Todos são modos de produção simbólica de valores.
Uma definição, porém, tão genérica de cultura não tem função alguma para a construção de políticas focadas de Estado. Muito menos a alegada definição de que aquilo que colabora para a internacionalização do Brasil e a divulgação de sua simbologia deve ser financiado. Pelo argumento, a TV Globo pode pedir isenção fiscal para as suas próximas telenovelas.
Como não podia deixar de ser, é no campo da cultura que se vê, de forma mais brutal, a deposição de toda e qualquer aspiração crítica e contestadora de certa esquerda brasileira. Fala-se em "quebra de paradigma", mas o Ministério da Cultura apenas implementa o paradigma, cada vez mais hegemônico, de indistinção geral entre arte, entretenimento e mercadoria.
Afinal, há de chamar de "gato" um gato. Estilistas são, acima de tudo, comerciantes donos de loja que organizam sua produção a partir da sensibilidade às demandas de mercado e a exigências de máxima rentabilização de seu capital. Mas grupos de teatro não são empresas, escritores não são comerciantes e um quadro não é uma mercadoria, mesmo que tenha um preço.
As políticas culturais foram criadas exatamente para garantir autonomia para a produção artística contra sua colonização pela lógica mercantil, contra sua restrição à condição de mero entretenimento "cool", além de pen- sar formas de impedir a consolidação de práticas de dirigismo cultural.
Contudo, para que algo dessa natureza fosse possível, estruturas como a Lei Rouanet deveriam ser radicalmente modificadas. Um bilhão e duzentos mil reais foram perdidos pelo Estado para que empresas fizessem políticas de marketing às custas do erário, financiando, principalmente, musicais, Oktoberfest, festas gastronômicas, atividades da torcida do Palmeiras e, agora, desfiles de moda.
Pergunte, no entanto, quanto desse dinheiro foi direcionado à construção de conservatórios de música, bibliotecas ou em auxílio a saraus literários na periferia.
A força dos interesses - JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SP - 03/09
Ser amistoso em retribuição a atos inamistosos é, no mínimo, subserviência --e não parece próprio de Dilma
Na estreita margem de reação ao seu alcance, a mais (ou única) eficaz resposta do governo brasileiro ao dos Estados Unidos é pôr em suspenso a visita da presidente Dilma Rousseff a Barack Obama, marcada para o próximo mês. E confirmá-la ou sustá-la a depender do que o governo americano faça com a exigência de explicação escrita que lhe fez ontem o governo brasileiro, sobre a violação das comunicações oficiais e pessoais até da presidente brasileira.
Assuntos importantes podem haver, mas não assuntos graves para negociações de Dilma e Obama. A visita foi prevista, portanto, sobretudo como um gesto amistoso. Mas ser amistoso em retribuição a atos inamistosos é, no mínimo, subserviência. O que não parece próprio de Dilma Rousseff e, de uns poucos anos para cá, deixou de ser a atitude brasileira com os Estados Unidos.
A interceptação das comunicações da Presidência não é só uma transgressão das normais internacionais de convivências soberanas, praticada pelo governo americano contra o brasileiro. São ações inamistosas dos Estados Unidos. De duas ordens.
Uma, sub-reptícia, de violação de direitos e de sigilos brasileiros protegidos pelo direito internacional e por tratados de que os dois países são signatários. Outra, a depreciação da soberania brasileira, se não for a negação mesma.
Neste segundo aspecto, a visão de um país sob condições neocoloniais ficou explicitada outra vez, diretamente, ao ministro da Justiça brasileiro, José Eduardo Cardozo, quando levou a Washington, na semana passada, uma proposta de acordo para meios honestos e legais de coleta americana de informações no Brasil (sem embaraços, desde que autorizada judicialmente, como exige a Constituição do Brasil).
O governo americano recusou a proposta com um argumento dado como definitivo e apresentado de modo que o ministro descreveu como "peremptório": os Estados Unidos agem com base na sua legislação interna e consideram-se cumprindo uma missão internacional. As leis que regem a conduta americana no Brasil, como na violação do sigilo das comunicações presidenciais e quaisquer outras, são as leis americanas, não a Constituição brasileira e seu corpo de leis. E pronto.
Com a sugestão a Washington, o Brasil cumpriu o papel de diplomacia respeitável, mas, a rigor, mesmo o acordo seria inócuo: os Estados Unidos não são confiáveis. Vale lembrar, a propósito, um ensinamento, tão pouco aproveitado no jornalismo, dado por John Foster Dulles, o mais proeminente secretário de Estado americano desde a Segunda Guerra Mundial: "Os Estados Unidos não têm amigos, têm interesses".
E força. Da qual abusam segundo seus interesses. "Se o Congresso aprovar, a ação dos EUA na Síria ocorrerá mesmo que o Conselho da Segurança da ONU seja contrário" --é uma resolução destes dias. A desproporção de forças militares reflete-se sobre os organismos internacionais de regulação e julgamento, o que sinaliza, por antecipação, as escassas perspectivas dos recursos a cortes internacionais insinuados pelos ministros Cardozo e Luiz Alberto Figueiredo, o estreante de Relações Exteriores.
A menos que se constitua um movimento de países com alguma dose de representatividade, algo bastante problemático. E dependente, quem sabe, dos arquivos e da disposição de Edward Snowden de divulgar violações graves em outros países, como fez com seu coadjuvante Glenn Greenwald nestas revelações sobre o furto americano de sigilos da Presidência brasileira.
Se o Brasil não tem meios para dar a resposta à altura, será muito pedagógico que ao menos se mantenha ereto - como se mostra até aqui.
Ser amistoso em retribuição a atos inamistosos é, no mínimo, subserviência --e não parece próprio de Dilma
Na estreita margem de reação ao seu alcance, a mais (ou única) eficaz resposta do governo brasileiro ao dos Estados Unidos é pôr em suspenso a visita da presidente Dilma Rousseff a Barack Obama, marcada para o próximo mês. E confirmá-la ou sustá-la a depender do que o governo americano faça com a exigência de explicação escrita que lhe fez ontem o governo brasileiro, sobre a violação das comunicações oficiais e pessoais até da presidente brasileira.
Assuntos importantes podem haver, mas não assuntos graves para negociações de Dilma e Obama. A visita foi prevista, portanto, sobretudo como um gesto amistoso. Mas ser amistoso em retribuição a atos inamistosos é, no mínimo, subserviência. O que não parece próprio de Dilma Rousseff e, de uns poucos anos para cá, deixou de ser a atitude brasileira com os Estados Unidos.
A interceptação das comunicações da Presidência não é só uma transgressão das normais internacionais de convivências soberanas, praticada pelo governo americano contra o brasileiro. São ações inamistosas dos Estados Unidos. De duas ordens.
Uma, sub-reptícia, de violação de direitos e de sigilos brasileiros protegidos pelo direito internacional e por tratados de que os dois países são signatários. Outra, a depreciação da soberania brasileira, se não for a negação mesma.
Neste segundo aspecto, a visão de um país sob condições neocoloniais ficou explicitada outra vez, diretamente, ao ministro da Justiça brasileiro, José Eduardo Cardozo, quando levou a Washington, na semana passada, uma proposta de acordo para meios honestos e legais de coleta americana de informações no Brasil (sem embaraços, desde que autorizada judicialmente, como exige a Constituição do Brasil).
O governo americano recusou a proposta com um argumento dado como definitivo e apresentado de modo que o ministro descreveu como "peremptório": os Estados Unidos agem com base na sua legislação interna e consideram-se cumprindo uma missão internacional. As leis que regem a conduta americana no Brasil, como na violação do sigilo das comunicações presidenciais e quaisquer outras, são as leis americanas, não a Constituição brasileira e seu corpo de leis. E pronto.
Com a sugestão a Washington, o Brasil cumpriu o papel de diplomacia respeitável, mas, a rigor, mesmo o acordo seria inócuo: os Estados Unidos não são confiáveis. Vale lembrar, a propósito, um ensinamento, tão pouco aproveitado no jornalismo, dado por John Foster Dulles, o mais proeminente secretário de Estado americano desde a Segunda Guerra Mundial: "Os Estados Unidos não têm amigos, têm interesses".
E força. Da qual abusam segundo seus interesses. "Se o Congresso aprovar, a ação dos EUA na Síria ocorrerá mesmo que o Conselho da Segurança da ONU seja contrário" --é uma resolução destes dias. A desproporção de forças militares reflete-se sobre os organismos internacionais de regulação e julgamento, o que sinaliza, por antecipação, as escassas perspectivas dos recursos a cortes internacionais insinuados pelos ministros Cardozo e Luiz Alberto Figueiredo, o estreante de Relações Exteriores.
A menos que se constitua um movimento de países com alguma dose de representatividade, algo bastante problemático. E dependente, quem sabe, dos arquivos e da disposição de Edward Snowden de divulgar violações graves em outros países, como fez com seu coadjuvante Glenn Greenwald nestas revelações sobre o furto americano de sigilos da Presidência brasileira.
Se o Brasil não tem meios para dar a resposta à altura, será muito pedagógico que ao menos se mantenha ereto - como se mostra até aqui.
Brioches do poder - GIL CASTELLO BRANCO
O GLOBO - 03/09
Como dizia o Barão de Itararé, ‘certos políticos brasileiros confundem a vida pública com a privada’
Às vésperas da Revolução Francesa, a rainha Maria Antonieta indagou a um subordinado sobre as razões de uma manifestação popular e foi informada de que o motivo principal era a falta de pão. A rainha, surpresa, perguntou: “Por que não comem brioches?” A frase entrou para a história como símbolo da alienação da soberana, que desconhecia como viviam os seus súditos, os quais, paradoxalmente, sustentavam a realeza.
No Brasil, dois séculos depois, o governo do Ceará — do socialista Cid Gomes — assinou contrato de R$ 3,4 milhões para serviços de buffet e decoração em eventos do gabinete do governador e na residência oficial, com cardápio que incluía lagosta, escargot e caviar. O edital de licitação, explícito e exótico, não deve diferir de outros adotados Brasil afora. Na verdade, o apreço pela culinária requintada com recursos públicos é característica de vários governantes.
O ex-presidente Fernando Henrique levou para Brasília a premiada chef Roberta Sudbrack, que cultivava nos jardins do palácio horta com ervas, legumes e verduras orgânicas. Lula teve a seu serviço o pernambucano Caio Henri, que comandou conhecido restaurante em São Paulo. Já a presidente Dilma contratou a chef Andréa Munhoz, que estagiou na capital paulista com o francês Emmanuel Bassoleil e pilotou a cozinha de vários restaurantes brasilienses. Os salários desses profissionais não costumam ser divulgados e sabe-se lá como são contratados. Na contramão da sofisticação, o ex-presidente da França, François Miterrand, levou para Paris uma chef de cuisine do interior para saborear no dia a dia uma comida simples como a da avó.
Além dos presidentes e governadores, outros burocratas comem e bebem do melhor. Na semana passada, por exemplo, o Contas Abertas flagrou o Ministério das Relações Exteriores adquirindo 500 garrafas de espumante brut com a exigência de que o produto tivesse “ao menos quatro premiações internacionais em concursos posteriores a 2008 e fosse amadurecido em contato com leveduras, por período mínimo de 12 meses”. Já o gabinete do Comandante da Aeronáutica gastou R$ 34,1 mil em tortas, docinhos, bolos, croissants, rocamboles e minissonhos, entre outras guloseimas. Tomara que não seja para distribuir como lanche nos aviões da FAB quando transportam autoridades.
Aliás, a alimentação é apenas um dos marcos do patrimonialismo da política brasileira. Mal esfriou o caso das iguarias, o mesmo governador cearense passou a utilizar em suas viagens oficiais um dos três helicópteros adquiridos por R$ 78 milhões, sem licitação, quando o uso deveria ser restrito à Secretaria da Ciência, Tecnologia e Educação. Vale lembrar que Cid Gomes foi quem levou a sogra de carona para viagem oficial de dez dias à Europa em jatinho alugado pelo governo por quase R$ 400 mil durante o carnaval. No Rio de Janeiro, o uso que o governador Sérgio Cabral e familiares faziam dos helicópteros do Estado faria corar Santos Dumont.
A vocação de Ícaro, às custas da FAB, já deslumbrou várias autoridades “sem noção”. O cearense Paes de Andrade, assim que substituiu Sarney em breve interinidade na Presidência da República, voou orgulhosamente com amigos para Mombaça, a sua cidade natal. Na gestão tucana, a moda dos ministros era viajar com a família a Fernando de Noronha. Um dos filhos de Lula, na companhia de diversos amigos, excursionou a Brasília e as fotos da folia foram parar na internet.
Recentemente, como se sabe, familiares do presidente da Câmara, Henrique Alves, e do ministro da Previdência, Garibaldi Alves, usaram jatinhos da Aeronáutica para torcer pela seleção, enquanto o presidente do Senado, Renan Calheiros, requisitava avião para comparecer ao casamento da filha de um colega. Para não falar da comitiva de Dilma, que atravessou o Atlântico e gastou mais de R$ 100 mil por noite para assistir à posse do Papa Francisco. Com a turbulência das denúncias, a FAB passou a informar quem requisita os aviões, mas não divulga os caronas.
A discussão sobre os gastos governamentais, principalmente os das autoridades, é absolutamente legítima. O limite entre o necessário e o supérfluo é tênue, e a austeridade tem que ser a regra. O bom senso recomenda que os governantes façam com os recursos públicos o que fariam com o próprio dinheiro. No entanto, pelo que temos visto, a célebre frase do Aparício Torelli, o Barão de Itararé, continua atual: “Certos políticos brasileiros confundem a vida pública com a privada.”
Como dizia o Barão de Itararé, ‘certos políticos brasileiros confundem a vida pública com a privada’
Às vésperas da Revolução Francesa, a rainha Maria Antonieta indagou a um subordinado sobre as razões de uma manifestação popular e foi informada de que o motivo principal era a falta de pão. A rainha, surpresa, perguntou: “Por que não comem brioches?” A frase entrou para a história como símbolo da alienação da soberana, que desconhecia como viviam os seus súditos, os quais, paradoxalmente, sustentavam a realeza.
No Brasil, dois séculos depois, o governo do Ceará — do socialista Cid Gomes — assinou contrato de R$ 3,4 milhões para serviços de buffet e decoração em eventos do gabinete do governador e na residência oficial, com cardápio que incluía lagosta, escargot e caviar. O edital de licitação, explícito e exótico, não deve diferir de outros adotados Brasil afora. Na verdade, o apreço pela culinária requintada com recursos públicos é característica de vários governantes.
O ex-presidente Fernando Henrique levou para Brasília a premiada chef Roberta Sudbrack, que cultivava nos jardins do palácio horta com ervas, legumes e verduras orgânicas. Lula teve a seu serviço o pernambucano Caio Henri, que comandou conhecido restaurante em São Paulo. Já a presidente Dilma contratou a chef Andréa Munhoz, que estagiou na capital paulista com o francês Emmanuel Bassoleil e pilotou a cozinha de vários restaurantes brasilienses. Os salários desses profissionais não costumam ser divulgados e sabe-se lá como são contratados. Na contramão da sofisticação, o ex-presidente da França, François Miterrand, levou para Paris uma chef de cuisine do interior para saborear no dia a dia uma comida simples como a da avó.
Além dos presidentes e governadores, outros burocratas comem e bebem do melhor. Na semana passada, por exemplo, o Contas Abertas flagrou o Ministério das Relações Exteriores adquirindo 500 garrafas de espumante brut com a exigência de que o produto tivesse “ao menos quatro premiações internacionais em concursos posteriores a 2008 e fosse amadurecido em contato com leveduras, por período mínimo de 12 meses”. Já o gabinete do Comandante da Aeronáutica gastou R$ 34,1 mil em tortas, docinhos, bolos, croissants, rocamboles e minissonhos, entre outras guloseimas. Tomara que não seja para distribuir como lanche nos aviões da FAB quando transportam autoridades.
Aliás, a alimentação é apenas um dos marcos do patrimonialismo da política brasileira. Mal esfriou o caso das iguarias, o mesmo governador cearense passou a utilizar em suas viagens oficiais um dos três helicópteros adquiridos por R$ 78 milhões, sem licitação, quando o uso deveria ser restrito à Secretaria da Ciência, Tecnologia e Educação. Vale lembrar que Cid Gomes foi quem levou a sogra de carona para viagem oficial de dez dias à Europa em jatinho alugado pelo governo por quase R$ 400 mil durante o carnaval. No Rio de Janeiro, o uso que o governador Sérgio Cabral e familiares faziam dos helicópteros do Estado faria corar Santos Dumont.
A vocação de Ícaro, às custas da FAB, já deslumbrou várias autoridades “sem noção”. O cearense Paes de Andrade, assim que substituiu Sarney em breve interinidade na Presidência da República, voou orgulhosamente com amigos para Mombaça, a sua cidade natal. Na gestão tucana, a moda dos ministros era viajar com a família a Fernando de Noronha. Um dos filhos de Lula, na companhia de diversos amigos, excursionou a Brasília e as fotos da folia foram parar na internet.
Recentemente, como se sabe, familiares do presidente da Câmara, Henrique Alves, e do ministro da Previdência, Garibaldi Alves, usaram jatinhos da Aeronáutica para torcer pela seleção, enquanto o presidente do Senado, Renan Calheiros, requisitava avião para comparecer ao casamento da filha de um colega. Para não falar da comitiva de Dilma, que atravessou o Atlântico e gastou mais de R$ 100 mil por noite para assistir à posse do Papa Francisco. Com a turbulência das denúncias, a FAB passou a informar quem requisita os aviões, mas não divulga os caronas.
A discussão sobre os gastos governamentais, principalmente os das autoridades, é absolutamente legítima. O limite entre o necessário e o supérfluo é tênue, e a austeridade tem que ser a regra. O bom senso recomenda que os governantes façam com os recursos públicos o que fariam com o próprio dinheiro. No entanto, pelo que temos visto, a célebre frase do Aparício Torelli, o Barão de Itararé, continua atual: “Certos políticos brasileiros confundem a vida pública com a privada.”
Um fraco sopro de otimismo - EDITORIAL O ESTADÃO
O Estado de S.Paulo - 03/09
A notícia positiva sobre a economia brasileira no segundo trimestre - expansão de 1,5%, puxada pelo investimento produtivo - parece haver levado algum otimismo aos especialistas do mercado financeiro e das consultorias. Os novos números das contas nacionais foram divulgados na manhã de sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A novidade refletiu-se no mesmo dia na pesquisa Focus, conduzida pelo Banco Central (BC). Segundo a pesquisa, subiu de 2,2% para 2,32% a mediana das projeções daqueles economistas para o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. Foi o número mais alto desde 5 de julho, quando a sondagem captou uma estimativa de 2,34%. Oscilações para cima têm ocorrido nas previsões de desempenho econômico, mas têm sido raras, desde o ano passado. Apesar dos aumentos ocasionais, a redução tem sido a tendência dominante ao longo dos meses. Algo novo no panorama?
Há um ano, os economistas consultados na pesquisa Focus calculavam para este ano um PIB 4% maior que o de 2012, mas também a projeção para o número final do ano passado ainda estava em queda. Essa projeção estava em 1,64% um ano atrás, e era otimista, porque o balanço divulgado meses depois pelo IBGE apontaria a modestíssima variação de 0,9%. Também as previsões para 2o13 começariam logo a cair. No fim de novembro estariam reduzidas a 3,7% e no fim de dezembro a 3,1%. Nos primeiros meses deste ano o sobe e desce das projeções ficaria na faixa de 3% a 3,2%, mas logo deslizaria para níveis mais baixos.
A mudança da sexta-feira passada pode ter sido o começo de uma nova escalada, mas isso parece duvidoso, quando se examinam outros detalhes da pesquisa do mesmo dia. Por exemplo: embora o crescimento do PIB tenha sido elevado para 2,32%, o da indústria permaneceu em 2,11%, o mesmo número da semana anterior.
Essa avaliação talvez seja reconsiderada, mas na última sexta-feira havia poucos fundamentos para isso. A produção da indústria, embora 2% superior à do primeiro trimestre e 2,8% maior que a de um ano antes, continuava muito inferior à da agropecuária. Também havia indicações de um desempenho fraco em julho, quando o nível de atividade das fábricas paulistas caiu 1,6%, segundo informou no mesmo dia a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Além disso, na pesquisa Focus o crescimento estimado para o PIB em 2012 diminuiu de 2,4% para 2,3%, embora a expansão prevista para a indústria tenha passado de 2,9% para 3%. Com pequenas variações para mais ou para menos, as projeções para o PIB e para a indústria continuaram indicando uma avaliação negativa das condições básicas da economia.
Algumas dessas condições foram examinadas em nota do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). A taxa de investimento passou de 17,9% do PIB no segundo trimestre de 2012 para 18,6% um ano depois - um "aumento significativo", segundo a nota, mas "ainda muito aquém" da taxa desejada para o País. A reação da indústria, de acordo com a mesma análise, foi insuficiente para gerar no primeiro semestre um resultado melhor que um aumento de 0,8% em relação ao de igual período do ano anterior. Enfim, o setor externo "continua preocupante", também segundo o documento divulgado pelo Iedi.
Uma avaliação semelhante das contas externas apareceu no boletim Focus da última sexta-feira. A projeção do saldo comercial de 2013 foi reduzida de US$ 3,4 bilhões para US$ 3 bilhões. O valor estimado para o próximo ano caiu de US$ 9 bilhões para US$ 8 bilhões. A fraqueza do comércio exterior é relacionada com deficiências estruturais da economia e do setor industrial. Os economistas consultados na pesquisa Focus devem ter levado em conta os possíveis efeitos benéficos da depreciação cambial para o comércio - exportações mais baratas e importações mais caras.
Mas esses efeitos - esta deve ser a ressalva - serão insuficientes para compensar os demais problemas de competitividade.
A notícia positiva sobre a economia brasileira no segundo trimestre - expansão de 1,5%, puxada pelo investimento produtivo - parece haver levado algum otimismo aos especialistas do mercado financeiro e das consultorias. Os novos números das contas nacionais foram divulgados na manhã de sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A novidade refletiu-se no mesmo dia na pesquisa Focus, conduzida pelo Banco Central (BC). Segundo a pesquisa, subiu de 2,2% para 2,32% a mediana das projeções daqueles economistas para o aumento do Produto Interno Bruto (PIB) neste ano. Foi o número mais alto desde 5 de julho, quando a sondagem captou uma estimativa de 2,34%. Oscilações para cima têm ocorrido nas previsões de desempenho econômico, mas têm sido raras, desde o ano passado. Apesar dos aumentos ocasionais, a redução tem sido a tendência dominante ao longo dos meses. Algo novo no panorama?
Há um ano, os economistas consultados na pesquisa Focus calculavam para este ano um PIB 4% maior que o de 2012, mas também a projeção para o número final do ano passado ainda estava em queda. Essa projeção estava em 1,64% um ano atrás, e era otimista, porque o balanço divulgado meses depois pelo IBGE apontaria a modestíssima variação de 0,9%. Também as previsões para 2o13 começariam logo a cair. No fim de novembro estariam reduzidas a 3,7% e no fim de dezembro a 3,1%. Nos primeiros meses deste ano o sobe e desce das projeções ficaria na faixa de 3% a 3,2%, mas logo deslizaria para níveis mais baixos.
A mudança da sexta-feira passada pode ter sido o começo de uma nova escalada, mas isso parece duvidoso, quando se examinam outros detalhes da pesquisa do mesmo dia. Por exemplo: embora o crescimento do PIB tenha sido elevado para 2,32%, o da indústria permaneceu em 2,11%, o mesmo número da semana anterior.
Essa avaliação talvez seja reconsiderada, mas na última sexta-feira havia poucos fundamentos para isso. A produção da indústria, embora 2% superior à do primeiro trimestre e 2,8% maior que a de um ano antes, continuava muito inferior à da agropecuária. Também havia indicações de um desempenho fraco em julho, quando o nível de atividade das fábricas paulistas caiu 1,6%, segundo informou no mesmo dia a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).
Além disso, na pesquisa Focus o crescimento estimado para o PIB em 2012 diminuiu de 2,4% para 2,3%, embora a expansão prevista para a indústria tenha passado de 2,9% para 3%. Com pequenas variações para mais ou para menos, as projeções para o PIB e para a indústria continuaram indicando uma avaliação negativa das condições básicas da economia.
Algumas dessas condições foram examinadas em nota do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). A taxa de investimento passou de 17,9% do PIB no segundo trimestre de 2012 para 18,6% um ano depois - um "aumento significativo", segundo a nota, mas "ainda muito aquém" da taxa desejada para o País. A reação da indústria, de acordo com a mesma análise, foi insuficiente para gerar no primeiro semestre um resultado melhor que um aumento de 0,8% em relação ao de igual período do ano anterior. Enfim, o setor externo "continua preocupante", também segundo o documento divulgado pelo Iedi.
Uma avaliação semelhante das contas externas apareceu no boletim Focus da última sexta-feira. A projeção do saldo comercial de 2013 foi reduzida de US$ 3,4 bilhões para US$ 3 bilhões. O valor estimado para o próximo ano caiu de US$ 9 bilhões para US$ 8 bilhões. A fraqueza do comércio exterior é relacionada com deficiências estruturais da economia e do setor industrial. Os economistas consultados na pesquisa Focus devem ter levado em conta os possíveis efeitos benéficos da depreciação cambial para o comércio - exportações mais baratas e importações mais caras.
Mas esses efeitos - esta deve ser a ressalva - serão insuficientes para compensar os demais problemas de competitividade.
Chance para a ética - EDITORIAL ZERO HORA
ZERO HORA - 03/09
É difícil imaginar que, mesmo depois do rechaço popular à decisão da Câmara de preservar mandato de um presidiário já condenado por corrupção, o Congresso se disponha a aprovar a reforma política cobrada nas ruas, muito menos no período de um mês que ainda resta para ser válida já nas eleições de 2014. Ainda assim, há alternativas à disposição. Uma das mais coerentes é a defendida pelo movimento Eleições Limpas, o mesmo que deflagrou a vitoriosa campanha precursora da votação da Lei da Ficha Limpa. A proposta, defendida por 51 entidades e que já conta com o aval de políticos influentes, enfrenta questões essenciais para assegurar mais ética na política, como a do financiamento de campanhas _ proibindo, por exemplo, doações de empresas e impondo um limite às contribuições de pessoas físicas. Trata-se, na prática, da mesma ideia defendida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que, aliás, faz parte do movimento. Se fosse adotado, esse modelo permitiria a redução da margem para desvios e estimularia os políticos a buscar contato mais permanente com suas bases, às quais caberia custear suas iniciativas em busca de eleição.
Evidentemente, uma mudança necessária e inadiável como o fim das doações de pessoas jurídicas terá, como impacto imediato, a redução dos custos das campanhas eleitorais, incluindo os fantásticos valores hoje pagos para produção de materiais de propaganda em versões impressa e eletrônica. Outros gastos, como aluguel de jatinhos, pagamento de cabos eleitorais e organização de megacomícios, terão de ser redimensionados. Tudo isso resultará em vantagem para o eleitor, uma vez que cessará a atual corrida do ouro pela qual os candidatos abraçam, muitas vezes de forma sub-reptícia, as causas defendidas pelos patrocinadores mais abastados. Assim, teremos campanhas eleitorais com menos ênfase em estratégias de marketing, que na maioria das vezes só servem para dissimular a ausência pura e simples de ideias e valores.
Um dos méritos da proposta é o de ser diferente de tudo que já tramitou no Congresso sobre o tema. Do ponto de vista do processo legislativo, o projeto não exige a aprovação de emendas constitucionais, mais difíceis de se aprovar, mas apenas de projetos de lei, que tramitam de forma ordinária. Não se trata, igualmente, de corrigir todas as deformações da política. Essa é uma tarefa que cabe aos cidadãos e não pode ser cumprida por meio de soluções mágicas e instantâneas. Normalmente, esse tipo de avanço depende de educação e amadurecimento, e não é ingênuo afirmar que o Brasil já deu passos consideráveis nesse sentido. O modelo sugerido acena, porém, com modificações que facilitam a melhoria do quadro político e partidário em nosso país. Por isso, depois de escárnios como a manutenção do mandato do deputado Natan Donadon, decisão suspensa ontem por ministro do STF, líderes políticos têm um mês para encarar a proposta do movimento Eleições Limpas como uma resposta à sociedade já para as eleições do próximo ano. O primeiro passo é dar margem para que possa ser debatida e aperfeiçoada no Congresso.
É difícil imaginar que, mesmo depois do rechaço popular à decisão da Câmara de preservar mandato de um presidiário já condenado por corrupção, o Congresso se disponha a aprovar a reforma política cobrada nas ruas, muito menos no período de um mês que ainda resta para ser válida já nas eleições de 2014. Ainda assim, há alternativas à disposição. Uma das mais coerentes é a defendida pelo movimento Eleições Limpas, o mesmo que deflagrou a vitoriosa campanha precursora da votação da Lei da Ficha Limpa. A proposta, defendida por 51 entidades e que já conta com o aval de políticos influentes, enfrenta questões essenciais para assegurar mais ética na política, como a do financiamento de campanhas _ proibindo, por exemplo, doações de empresas e impondo um limite às contribuições de pessoas físicas. Trata-se, na prática, da mesma ideia defendida pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que, aliás, faz parte do movimento. Se fosse adotado, esse modelo permitiria a redução da margem para desvios e estimularia os políticos a buscar contato mais permanente com suas bases, às quais caberia custear suas iniciativas em busca de eleição.
Evidentemente, uma mudança necessária e inadiável como o fim das doações de pessoas jurídicas terá, como impacto imediato, a redução dos custos das campanhas eleitorais, incluindo os fantásticos valores hoje pagos para produção de materiais de propaganda em versões impressa e eletrônica. Outros gastos, como aluguel de jatinhos, pagamento de cabos eleitorais e organização de megacomícios, terão de ser redimensionados. Tudo isso resultará em vantagem para o eleitor, uma vez que cessará a atual corrida do ouro pela qual os candidatos abraçam, muitas vezes de forma sub-reptícia, as causas defendidas pelos patrocinadores mais abastados. Assim, teremos campanhas eleitorais com menos ênfase em estratégias de marketing, que na maioria das vezes só servem para dissimular a ausência pura e simples de ideias e valores.
Um dos méritos da proposta é o de ser diferente de tudo que já tramitou no Congresso sobre o tema. Do ponto de vista do processo legislativo, o projeto não exige a aprovação de emendas constitucionais, mais difíceis de se aprovar, mas apenas de projetos de lei, que tramitam de forma ordinária. Não se trata, igualmente, de corrigir todas as deformações da política. Essa é uma tarefa que cabe aos cidadãos e não pode ser cumprida por meio de soluções mágicas e instantâneas. Normalmente, esse tipo de avanço depende de educação e amadurecimento, e não é ingênuo afirmar que o Brasil já deu passos consideráveis nesse sentido. O modelo sugerido acena, porém, com modificações que facilitam a melhoria do quadro político e partidário em nosso país. Por isso, depois de escárnios como a manutenção do mandato do deputado Natan Donadon, decisão suspensa ontem por ministro do STF, líderes políticos têm um mês para encarar a proposta do movimento Eleições Limpas como uma resposta à sociedade já para as eleições do próximo ano. O primeiro passo é dar margem para que possa ser debatida e aperfeiçoada no Congresso.
Vigilância democrática - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 03/09
Ainda não se tem notícia de projetos significativos aprovados em decorrência dos protestos de junho. A classe política foi incapaz, até agora, de dar uma resposta à altura do que pediam as centenas de milhares de manifestantes que tomaram as ruas de todo o país.
Durou pouco, além disso, a promessa, feita pelos congressistas, de trabalhar num ritmo mais forte. Já na metade de agosto eles haviam retomado a rotina velhaca de deixar o plenário do Legislativo vazio e realizar votações em somente dois dias da semana.
Nem tudo, porém, permanece inalterado na rotina de Brasília. O tradicional desfile de Sete de Setembro não será mais o mesmo. Por causa dos repetidos atos de vandalismo nas manifestações, a presidente Dilma Rousseff autorizou reforço na segurança do evento.
Haverá um aumento no número de agentes responsáveis pela proteção das autoridades. Além disso, as arquibancadas mais próximas do palanque de Dilma serão reservadas para convidados.
A principal mudança, entretanto, diz respeito à abordagem dos presentes. Aos costumeiros detectores de metais será acrescido novo procedimento: pela primeira vez, bolsas e mochilas serão revistadas.
A estratégia faz sentido. Tem sido frequente, nos protestos, o uso de bombas caseiras e coquetéis molotov em ataques contra policiais, ou para atingir o patrimônio público e privado.
Talvez pelo ineditismo desse comportamento mais agressivo, as forças de segurança, oscilando entre a repressão truculenta e a passividade inútil, ainda não souberam agir de forma preventiva.
Trata-se, contudo, de um imperativo. Não só porque atos de violência devam ser coibidos mas também porque eles impedem que outros exerçam o direito inalienável de se manifestar de forma pacífica. Melhorias na segurança durante protestos representam ampliação das garantias democráticas.
É um aprendizado, e os governos, aos poucos, dão sinais de que começam a adquirir traquejo para lidar com as manifestações. A resposta oficial, no entanto, não pode se limitar à manutenção da lei e da ordem. A sociedade aguarda providências substanciais em atendimento às suas demandas.
Ainda não se tem notícia de projetos significativos aprovados em decorrência dos protestos de junho. A classe política foi incapaz, até agora, de dar uma resposta à altura do que pediam as centenas de milhares de manifestantes que tomaram as ruas de todo o país.
Durou pouco, além disso, a promessa, feita pelos congressistas, de trabalhar num ritmo mais forte. Já na metade de agosto eles haviam retomado a rotina velhaca de deixar o plenário do Legislativo vazio e realizar votações em somente dois dias da semana.
Nem tudo, porém, permanece inalterado na rotina de Brasília. O tradicional desfile de Sete de Setembro não será mais o mesmo. Por causa dos repetidos atos de vandalismo nas manifestações, a presidente Dilma Rousseff autorizou reforço na segurança do evento.
Haverá um aumento no número de agentes responsáveis pela proteção das autoridades. Além disso, as arquibancadas mais próximas do palanque de Dilma serão reservadas para convidados.
A principal mudança, entretanto, diz respeito à abordagem dos presentes. Aos costumeiros detectores de metais será acrescido novo procedimento: pela primeira vez, bolsas e mochilas serão revistadas.
A estratégia faz sentido. Tem sido frequente, nos protestos, o uso de bombas caseiras e coquetéis molotov em ataques contra policiais, ou para atingir o patrimônio público e privado.
Talvez pelo ineditismo desse comportamento mais agressivo, as forças de segurança, oscilando entre a repressão truculenta e a passividade inútil, ainda não souberam agir de forma preventiva.
Trata-se, contudo, de um imperativo. Não só porque atos de violência devam ser coibidos mas também porque eles impedem que outros exerçam o direito inalienável de se manifestar de forma pacífica. Melhorias na segurança durante protestos representam ampliação das garantias democráticas.
É um aprendizado, e os governos, aos poucos, dão sinais de que começam a adquirir traquejo para lidar com as manifestações. A resposta oficial, no entanto, não pode se limitar à manutenção da lei e da ordem. A sociedade aguarda providências substanciais em atendimento às suas demandas.
Extrapolação na espionagem americana - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 03/09
É correto levar-se a defesa da privacidade a fóruns multilaterais. No plano interno, o governo daria o exemplo se apressasse a votação no Congresso do Marco da Internet
Em mais um vazamento de informação capaz de constranger a política externa americana em relação à América Latina e ao Brasil em particular, a revelação feita no domingo pelo “Fantástico” de que a Agência Nacional de Segurança americana (NSA, na sigla em inglês) também bisbilhotou telefonemas, e-mails e mensagens enviadas por meio de celular pela presidente Dilma Rousseff tornou grave uma situação já delicada.
A prova do rastreamento eletrônico da presidente consta de slides de uma apresentação secreta montada pela NSA acerca da vigilância sobre Dilma e o presidente do México, Enrique Peña Nieto. A fonte da notícia de mais esta ilegalidade do ponto de vista brasileiro continua a ser Edward Snowden, o ex- analista terceirizado da NSA, hoje asilado na Rússia, e que tem abastecido o jornalista britânico radicado no Rio Glenn Greenwald com esses documentos. Entre eles, os expostos pelo “Fantástico” e, no início de julho, pelo GLOBO, quando ficou provado que a NSA também espionava pessoas e empresas no Brasil.
A reportagem da TV Globo aumenta a octanagem da crise com os Estados Unidos, pois agora o alvo é diretamente a presidente da República e seu círculo de amigos e assessores, numa invasão da soberania nacional, além da privacidade de Dilma como cidadã.
A reportagem de julho já havia criado mal-estar nas relações com os Estados Unidos, para onde a presidente Dilma deverá ir em outubro, em visita de representante de Estado — isso se uma das retaliações brasileiras não vier a ser a suspensão da viagem.
Em entrevista conjunta, os ministros da Justiça e das Relações Exteriores, José Eduardo Cardozo e o recém-empossado Luiz Alberto Figueiredo, não esconderam, ontem, considerar “inadmissíveis” e “inaceitáveis” os fatos revelados na noite de domingo.
Além do pedido de explicações, “por escrito”, feito por Figueiredo, pela manhã, ao embaixador Thomas Shannon — diante das quais o governo decidirá o que fazer —, o chanceler reafirmou a intenção brasileira de levar para fóruns multilaterais o tema da megaespionagem eletrônica empreendida pelos Estados Unidos no mundo. Foi mencionado o Brics, grupo de países emergentes do qual o Brasil faz parte — Rússia, Índia, China e África do Sul.
Esta intenção havia sido anunciada em julho, depois da primeira reportagem. Ontem, o ministro Luiz Alberto Figueiredo se referiu à necessidade de uma “governança” mundial que preserve direitos de Estados, pessoas e empresas. O assunto é muito oportuno, diante dos avanços das tecnologias eletrônicas de espionagem.
No plano interno, o Planalto deveria dar um passo nesta mesma direção e mobilizar sua base no Congresso para aprovar o Marco Civil da Internet, pronto para ser votado na Câmara. A legislação traz dispositivos de proteção da privacidade. Seria uma forma de o governo dar o exemplo.
É correto levar-se a defesa da privacidade a fóruns multilaterais. No plano interno, o governo daria o exemplo se apressasse a votação no Congresso do Marco da Internet
Em mais um vazamento de informação capaz de constranger a política externa americana em relação à América Latina e ao Brasil em particular, a revelação feita no domingo pelo “Fantástico” de que a Agência Nacional de Segurança americana (NSA, na sigla em inglês) também bisbilhotou telefonemas, e-mails e mensagens enviadas por meio de celular pela presidente Dilma Rousseff tornou grave uma situação já delicada.
A prova do rastreamento eletrônico da presidente consta de slides de uma apresentação secreta montada pela NSA acerca da vigilância sobre Dilma e o presidente do México, Enrique Peña Nieto. A fonte da notícia de mais esta ilegalidade do ponto de vista brasileiro continua a ser Edward Snowden, o ex- analista terceirizado da NSA, hoje asilado na Rússia, e que tem abastecido o jornalista britânico radicado no Rio Glenn Greenwald com esses documentos. Entre eles, os expostos pelo “Fantástico” e, no início de julho, pelo GLOBO, quando ficou provado que a NSA também espionava pessoas e empresas no Brasil.
A reportagem da TV Globo aumenta a octanagem da crise com os Estados Unidos, pois agora o alvo é diretamente a presidente da República e seu círculo de amigos e assessores, numa invasão da soberania nacional, além da privacidade de Dilma como cidadã.
A reportagem de julho já havia criado mal-estar nas relações com os Estados Unidos, para onde a presidente Dilma deverá ir em outubro, em visita de representante de Estado — isso se uma das retaliações brasileiras não vier a ser a suspensão da viagem.
Em entrevista conjunta, os ministros da Justiça e das Relações Exteriores, José Eduardo Cardozo e o recém-empossado Luiz Alberto Figueiredo, não esconderam, ontem, considerar “inadmissíveis” e “inaceitáveis” os fatos revelados na noite de domingo.
Além do pedido de explicações, “por escrito”, feito por Figueiredo, pela manhã, ao embaixador Thomas Shannon — diante das quais o governo decidirá o que fazer —, o chanceler reafirmou a intenção brasileira de levar para fóruns multilaterais o tema da megaespionagem eletrônica empreendida pelos Estados Unidos no mundo. Foi mencionado o Brics, grupo de países emergentes do qual o Brasil faz parte — Rússia, Índia, China e África do Sul.
Esta intenção havia sido anunciada em julho, depois da primeira reportagem. Ontem, o ministro Luiz Alberto Figueiredo se referiu à necessidade de uma “governança” mundial que preserve direitos de Estados, pessoas e empresas. O assunto é muito oportuno, diante dos avanços das tecnologias eletrônicas de espionagem.
No plano interno, o Planalto deveria dar um passo nesta mesma direção e mobilizar sua base no Congresso para aprovar o Marco Civil da Internet, pronto para ser votado na Câmara. A legislação traz dispositivos de proteção da privacidade. Seria uma forma de o governo dar o exemplo.
COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO
“Não tem nada decidido”
Governador Sergio Cabral (RJ) sobre sua renúncia em dezembro, que já está decidida
AÉCIO PROMETE A EDUARDO NÃO ATRAIR APOIO DO PPS
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) disse ao senador Aécio Neves (PSDB-MG), durante o encontro no Recife, que será candidato contra a presidente Dilma, em 2014, “desde que tenha condições mínimas” para isso, como “o apoio de um partido relevante”, citando o PPS de Roberto Freire. Aécio o tranquilizou: não tentará o apoio do PPS à candidatura tucana, ao menos no primeiro turno.
CONTRA LULA, NÃO
O socialista Eduardo Campos continua repetindo o mantra de que só tomou uma decisão: não enfrentar uma eventual candidatura de Lula.
PLANO B
Eduardo Campos age como presidenciável, mas tem dito a amigos que “não ficaria ruim” sua eventual candidatura ao Senado.
PALANQUE DUPLO
Aécio Neves e Eduardo acertaram compartilhar o palanque em Estados onde candidatos majoritários do PSDB e do PSB forem aliados.
PAPO NA PORTEIRA
A conversa foi tão amistosa que Aécio acertou uma visita de Eduardo Campos e família à fazenda da família Neves em Cláudio (MG).
‘INDIGNAÇÃO’ VIRA MUXOXO
A presidente Dilma poderia cancelar a visita de Estado a Washington, em outubro, e chamar de voltar “para consultas” o embaixador nos Estados Unidos, Mauro Vieira, como sinais da indignação brasileira contra a comprovação de que ela própria tem sido espionada da Agência Nacional de Segurança do governo Barack Obama. Mas o governo brasileiro fez opção pela “cautela”, tão acovardada quanto suspeita.
CALABOCA
Em vez de dar “explicações”, o embaixador dos EUA Thomas Shannon parece haver enquadrado o governo, logo pela manhã, no Itamaraty.
COISA FEIA...
O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) foi aos EUA mudo e voltou calado. Só ontem contou que suas “ponderações” não foram aceitas.
CHACOTA AMERICANA
Cardozo disse que “propôs” condicionar espionagem a “ordem judicial”, mas os americanos não aceitaram. Devem ter gargalhado.
BLINDAGEM
Presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC) desde 1980, Antonio de Oliveira Santos mantém o poder esmagando adversários e nomeando para órgãos da CNC figurões como o ministro Gilberto Carvalho e Carlos Eduardo Gabas, o “vice-ministro” da Previdência.
SOU DA PAZ
Está na hora de Lula se oferecer para intermediar o conflito no Oriente Médio: após condecorar o ditador assassino da Síria, Bashar al-Assad, e ser condecorado por ele em 2010, reiterou sua disposição. Vai, Lula.
HERANÇA MALDITA
Em sete meses, Antonio Patriota executou R$ 1,5 bilhão do orçamento do Itamaraty com pessoal, encargos e investimentos. Substituto, Luiz Alberto Figueiredo terá R$ 700 milhões para se virar até o fim do ano.
A VOLTA DE ADAMS
Isentado pela comissão de Ética Pública e pelo ex-procurador-geral Roberto Gurgel, que não viu crime a ser apurado no caso da Operação Porto Seguro, o ministro Luís Adams (AGU) se reabilita perante Dilma Rousseff e volta a ser cogitado para a Casa Civil ou o Supremo Tribunal Federal.
PRIORIDADES
A deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) passou mais tempo bajulando o presidente da Câmara, Henrique Alves, na sessão que não cassou Natan Donadon, do que discursando contra o deputado ladrão.
ACORDO EM RORAIMA
O senador Romero Jucá (PMDB-RR) negociou com Gilberto Kassab substituir Raul Lima por Urzeni Rocha na presidência do PSD, a fim de garantir apoio ao governador José de Anchieta (PSDB-RR) em 2014.
BATEU, LEVOU
O governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB) entrou com processo contra a deputada Íris de Araújo (PMDB), que foi membro da CPI do Cachoeira, por chamá-lo de chefe de quadrilha, em reunião interna do PMDB-GO.
VENDENDO FRANGO
Funcionários locais do Itamaraty ameaçam nova greve contra a indefinição do regime de salários no exterior: justificam que ganham menos por hora que os da rede KFC, em greve por US$ 15 a hora.
MENU INTERNACIONAL
Prato do dia na Casa Branca: espetinho Assad.
PODER SEM PUDOR
CACIFE DE CACIQUE
No início dos anos 1990, a esquerda tentava crescer no Acre. Dirigentes do PT e do PCdoB tentaram filiar lideranças indígenas, numa reunião na cidade de Tarauacá. Nilson Mourão, ex-deputado federal, atacou:
- Venham para o PT, que é um partido democrático e não aceita caciques!
Maior mal-estar na plateia de caciques de verdade. Traído pelo vício de usar o termo "cacique" de forma pejorativa, no sentido de "caudilho", Mourão não filiou um só índio ao PT. Enquanto isso, os comunistas cochichavam sua adoração por um cacique, e filiaram todos no PCdoB.
Governador Sergio Cabral (RJ) sobre sua renúncia em dezembro, que já está decidida
AÉCIO PROMETE A EDUARDO NÃO ATRAIR APOIO DO PPS
O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB) disse ao senador Aécio Neves (PSDB-MG), durante o encontro no Recife, que será candidato contra a presidente Dilma, em 2014, “desde que tenha condições mínimas” para isso, como “o apoio de um partido relevante”, citando o PPS de Roberto Freire. Aécio o tranquilizou: não tentará o apoio do PPS à candidatura tucana, ao menos no primeiro turno.
CONTRA LULA, NÃO
O socialista Eduardo Campos continua repetindo o mantra de que só tomou uma decisão: não enfrentar uma eventual candidatura de Lula.
PLANO B
Eduardo Campos age como presidenciável, mas tem dito a amigos que “não ficaria ruim” sua eventual candidatura ao Senado.
PALANQUE DUPLO
Aécio Neves e Eduardo acertaram compartilhar o palanque em Estados onde candidatos majoritários do PSDB e do PSB forem aliados.
PAPO NA PORTEIRA
A conversa foi tão amistosa que Aécio acertou uma visita de Eduardo Campos e família à fazenda da família Neves em Cláudio (MG).
‘INDIGNAÇÃO’ VIRA MUXOXO
A presidente Dilma poderia cancelar a visita de Estado a Washington, em outubro, e chamar de voltar “para consultas” o embaixador nos Estados Unidos, Mauro Vieira, como sinais da indignação brasileira contra a comprovação de que ela própria tem sido espionada da Agência Nacional de Segurança do governo Barack Obama. Mas o governo brasileiro fez opção pela “cautela”, tão acovardada quanto suspeita.
CALABOCA
Em vez de dar “explicações”, o embaixador dos EUA Thomas Shannon parece haver enquadrado o governo, logo pela manhã, no Itamaraty.
COISA FEIA...
O ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) foi aos EUA mudo e voltou calado. Só ontem contou que suas “ponderações” não foram aceitas.
CHACOTA AMERICANA
Cardozo disse que “propôs” condicionar espionagem a “ordem judicial”, mas os americanos não aceitaram. Devem ter gargalhado.
BLINDAGEM
Presidente da Confederação Nacional do Comércio (CNC) desde 1980, Antonio de Oliveira Santos mantém o poder esmagando adversários e nomeando para órgãos da CNC figurões como o ministro Gilberto Carvalho e Carlos Eduardo Gabas, o “vice-ministro” da Previdência.
SOU DA PAZ
Está na hora de Lula se oferecer para intermediar o conflito no Oriente Médio: após condecorar o ditador assassino da Síria, Bashar al-Assad, e ser condecorado por ele em 2010, reiterou sua disposição. Vai, Lula.
HERANÇA MALDITA
Em sete meses, Antonio Patriota executou R$ 1,5 bilhão do orçamento do Itamaraty com pessoal, encargos e investimentos. Substituto, Luiz Alberto Figueiredo terá R$ 700 milhões para se virar até o fim do ano.
A VOLTA DE ADAMS
Isentado pela comissão de Ética Pública e pelo ex-procurador-geral Roberto Gurgel, que não viu crime a ser apurado no caso da Operação Porto Seguro, o ministro Luís Adams (AGU) se reabilita perante Dilma Rousseff e volta a ser cogitado para a Casa Civil ou o Supremo Tribunal Federal.
PRIORIDADES
A deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS) passou mais tempo bajulando o presidente da Câmara, Henrique Alves, na sessão que não cassou Natan Donadon, do que discursando contra o deputado ladrão.
ACORDO EM RORAIMA
O senador Romero Jucá (PMDB-RR) negociou com Gilberto Kassab substituir Raul Lima por Urzeni Rocha na presidência do PSD, a fim de garantir apoio ao governador José de Anchieta (PSDB-RR) em 2014.
BATEU, LEVOU
O governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB) entrou com processo contra a deputada Íris de Araújo (PMDB), que foi membro da CPI do Cachoeira, por chamá-lo de chefe de quadrilha, em reunião interna do PMDB-GO.
VENDENDO FRANGO
Funcionários locais do Itamaraty ameaçam nova greve contra a indefinição do regime de salários no exterior: justificam que ganham menos por hora que os da rede KFC, em greve por US$ 15 a hora.
MENU INTERNACIONAL
Prato do dia na Casa Branca: espetinho Assad.
PODER SEM PUDOR
CACIFE DE CACIQUE
No início dos anos 1990, a esquerda tentava crescer no Acre. Dirigentes do PT e do PCdoB tentaram filiar lideranças indígenas, numa reunião na cidade de Tarauacá. Nilson Mourão, ex-deputado federal, atacou:
- Venham para o PT, que é um partido democrático e não aceita caciques!
Maior mal-estar na plateia de caciques de verdade. Traído pelo vício de usar o termo "cacique" de forma pejorativa, no sentido de "caudilho", Mourão não filiou um só índio ao PT. Enquanto isso, os comunistas cochichavam sua adoração por um cacique, e filiaram todos no PCdoB.
TERÇA NOS JORNAIS
- O Globo: Planalto espionado: Dilma cobra explicações e ameaça adiar visita aos EUA
- Folha: STF susta decisão que salvou mandato de deputado preso
- Estadão: Dilma ameaça cancelar visita aos EUA após espionagem
- Correio Braziliense: Ministro do STF condena cela VIP para mensaleiro
- Valor Econômico: Governo prepara extinção de ganho fiscal em fusões
- Zero Hora: Espionagem dos EUA no Brasil - “Inaceitável, inadmissível”
- Brasil Econômico: Meio rural vive ‘debandada’ de mão de obra
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