quarta-feira, janeiro 18, 2012

Football Association - ANCELMO GOIS

O GLOBO - 18/01/12


Apesar dos tropeços, o futebol brasileiro ainda esbanja prestígio. A Federação da Inglaterra convidou a seleção de Mano para o jogo que vai celebrar 150 anos do esporte, em 2013.

O dia 26 de outubro de 1863 é considerado o do nascimento do futebol moderno: 12 clubes se reuniram em Londres e definiram as 14 regras do jogo.

Isso rola muito
A campanha de carnaval do Ministério da Saúde este ano terá também... travestis.
Serão cartazes. Numa das fotos, em Ouro Preto, um rapaz e um travesti formam um casal, e abaixo vem a frase: “Isso rola muito, mas a camisinha não pode faltar.” Será a primeira peça a ir para as ruas, em 3 de fevereiro, para aproveitar a proximidade do Dia Nacional da Visibilidade de Travestis (29 de janeiro).

Segue...
O Ministério da Saúde restringiu a parte da campanha com travestis ao material impresso, sem comercial em TV ou rádio.
Diz que é porque o público-alvo é menor. É. Pode ser.

Não sabe o que quer
Dilma parece meio displicente em relação aos Jogos de 16.
Márcio Fortes só tem seis meses no posto de Autoridade Olímpica, e já se fala na sua volta ao Ministério das Cidades.

Aliás...
De um sábio político:
— A dificuldade de mexer no primeiro escalão é que aquilo não é um Ministério, mas um castelo de cartas. Mexeu com uma, mexeu com todas.

Arigatô, Mônica
O mangá da Turma da Mônica Jovem, de Maurício de Souza, sucesso entre meninos e meninas, terá novidade em fevereiro.
Além de Cebolinha, Cascão e cia., trará personagens de Tesuka Osamo, o Disney do Japão. A história se passa na Amazônia.

Dilma e Angela
Dilma vai à Alemanha, a convite de Angela Merkel. Participará em março da CeBIT, maior feira de tecnologia digital do mundo, que homenageia o Brasil em 2012.

Enquanto isso...
A partir de amanhã, Dilma vai aproveitar o clima ainda de início de ano em Brasília para reunir grupos de ministros e cobrar os planos para 2012.
Pela disposição da presidente, as reuniões devem se estender pelo sábado e pelo domingo.

Aliás...
Terça que vem, Dilma comandará a primeira reunião ministerial do ano.

Secchin, 60
A ABL vai comemorar os 60 anos do acadêmico Antonio Carlos Secchin.Um livro reunirá depoimentos sobre o escritor.

Liquidando o estoque
A clínica de estética Dharma, do Rio, anunciava ontem num site de compras coletivas desconto de 84%, acredite, na aplicação de botox. De R$1.200, o elixir da juventude era oferecido a... R$ 195.

Diário de Justiça
A 3a- Turma Recursal do Rio condenou Josimar Denes a indenizar em R$ 3 mil a jornalista Romy Di Vitti, transexual, vizinha dele em Copacabana.

Segundo a decisão, ao reclamar de “frequentes festas” de Denes, Romy passou a ser xingada de “aidética”, “vagabunda”, “jornalista de merda” etc.

Boemia 24 horas
O La Fiorentina, tradicional templo da boemia no Leme, vai funcionar 24 horas a partir de 1 o- de fevereiro.

Quando o sol raiar, vai oferecer café da manhã. É mais um bar da cidade a adotar o sistema. Outro foi o bom Varandas, de Laranjeiras.

Em nome da ética
Pela primeira vez em 36 anos, um piloto do Rally Dakar — o brasileiro Guilherme Spinelli, que estava em 7o- lugar — comunicou aos organizadores ter recebido ajuda externa para consertar seu veículo, quebrado, o que não é permitido, e desistiu da prova, embora ninguém tivesse visto.

Mengooooo!
Do coleguinha e escritor Ruy Castro, grande rubro-negro, ontem, ao saber da saída do camisa 7 de seu time:
— Finalmente, um reforço! Ficamos livres do Thiago Neves! Há controvérsias.


QUEM REPAROU foi o poeta Alexei Bueno, ex-diretor do Instituto Estadual do Patrimônio Cultural. O conjunto de estátuas reinstalado no monumento da Praça Marechal Floriano, na Cinelândia, motivo de registro ontem aqui, está ainda incompleto. É que, repare nas fotos, falta um remo na mão de uma das estátuas. “A obra representa o poema ‘Cachoeira de Paulo Afonso’, de Castro Alves, e mostra dois escravos, Lucas e Maria, dentro de uma canoa”, diz Alexei. O prestativo secretário Carlos Osório reconhece a falta do remo. “A prefeitura não refez o remo por não ter fotos que mostrem detalhes da peça original”, argumenta. “Não podemos fazer ao bel prazer, sob pena de modificarmos a obra do escultor Eduardo de Sá.” Bueno sugere que se consulte o arquivo do Inepac. “O que não pode é uma obra belíssima como esta ficar incompleta”, pondera

ADRIANA BIROLLI, a atriz que brilha na novela “Fina estampa”, da TV Globo, exibe em Búzios o seu, digamos, formoso “mocotó” (com todo o respeito), em pose para a revista “Quem” que chega hoje às bancas

ADEMILDE FONSECA, nossa grande intérprete de choro que completa 91 anos em março, ensaia para participação em CD da jovem cantora Anna Bello, produzido pelo músico Edu Krieger.



SUSTO


Nos dias de hoje, com todo mundo de posse de celular que tira fotos, acabou o segredo. Um passageiro, veja, clicou a cena momentos depois da queda da porta da cabine deste Embraer 190, em pleno voo 4407 da Azul, que saiu de Vitória para o Rio às 9h39m de ontem. Passado o susto, a turma gostou da vista através da cabine.

Esperando o BC - CRISTIANO ROMERO

VALOR ECONÔMICO - 18/01/12

O Comitê de Política Monetária (Copom) define hoje, pela primeira vez em 2012, a taxa básica de juros (Selic) que vai vigorar nos próximos 50 dias. Dificilmente haverá surpresa e, por isso, o Comitê deve reduzir a Selic de 11% para 10,5% ao ano. A dúvida é se, dando continuidade à sinalização feita no Relatório de Inflação (RI) divulgado em dezembro, indicará diminuição no ritmo de corte daqui em diante.

Se confirmada, a indicação pode vir já no comunicado da decisão desta quarta-feira ou na ata do Copom que será conhecida no próximo dia 26. Como costuma ocorrer, isso pode ser feito nos dois documentos. O primeiro emite um pequeno sinal de que haverá mudança e o segundo procura mostrar a racionalidade da estratégia adotada.

Depois de iniciado o atual ciclo de alívio monetário, em agosto, o Banco Central (BC) fez três cortes de 50 pontos-base (0,5 ponto percentual) na taxa Selic. Mercado e analistas, sem falar do próprio governo, passaram a acreditar que o Copom reduziria os juros a 9,5% ou 9% ao ano até maio ou junho deste ano. Desde o último RI, as expectativas mudaram.

Neste momento, como demonstram os contratos futuros de juros, espera-se uma queda da Selic para, no máximo, 10,06% ao ano (janeiro de 2013). Daí em diante, os juros só aumentariam. Para janeiro de 2014, os contratos indicam Selic de 10,54%; para janeiro de 2015, 10,88% e, para janeiro de 2017, 11,15% ao ano.

A tendência é que, se não houver agravamento da crise nas economias avançadas, o Comitê reduza a taxa de juros mais duas vezes antes de parar, além da decisão desta quarta-feira. Nas duas oportunidades, o corte seria de 25 pontos-base, o que levaria a Selic para 10% ao ano em abril.

Na avaliação de um ex-dirigente do BC, um movimento mais cauteloso por parte do Copom faz sentido se o objetivo da autoridade é promover uma sintonia fina, com os agentes econômicos, quanto ao corte total dos juros, em face dos dados da economia, principalmente da inflação, que serão conhecidos ao longo do tempo. No RI, o BC demonstrou preocupação com as projeções de inflação e, talvez por essa razão, procurou corrigir as expectativas excessivamente otimistas do mercado quanto à queda dos juros.

Uma outra vantagem da cautela demonstrada pelo BC é que isso lhe permite interromper o ciclo de alívio monetário antes de ele ir longe demais. Por outro lado, dá também flexibilidade na direção contrária, ou seja, o Copom, a depender da situação da economia, pode cortar juros além do planejado inicialmente. A estratégia de movimentos lentos, mas firmes, na conclusão dos ciclos (de alta ou queda dos juros) contribui, segundo um profundo conhecedor do regime de metas para inflação, para uma boa comunicação com os agentes econômicos, se comparada a de movimentos intermitentes, de "stop-and-go".

Se a experiência diz alguma coisa, o Banco Central concluirá o ciclo de alívio monetário de forma suave, sem surpresas. Desde 2003, lembra um ex-integrante do Copom, o Brasil assistiu a sete ciclos de política monetária (sem contar com o atual). Com uma única exceção - o de 2008, quando a crise mundial obrigou o BC a interromper abruptamente o processo de alta dos juros -, todos foram concluídos de duas formas: com movimentos nunca maiores que os menores cortes ou elevações promovidos ao longo do ciclo; e com movimentos estritamente menores que a média do ciclo.

É a partir da experiência desses anos que analistas importantes acreditam que, no ciclo atual, o padrão implica um ou dois cortes de 0,25 ponto percentual por reunião, antes da interrupção do processo de alívio monetário. Foi exatamente com cortes dessa magnitude que quatro, dos seis ciclos anteriores, terminaram.

Nas próximas semanas, o governo definirá os cortes no Orçamento de 2012 e, desta forma, o Banco Central saberá se está mantido o compromisso de geração, por parte do setor público, de um superávit primário (conceito que não inclui os gastos com juros da dívida) em torno de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB). O BC deixou claro, no RI de dezembro, que apenas um superávit obtido a partir de cortes efetivos de despesas o ajudará na tarefa de combater a inflação. É bem provável que tenha feito isso para indicar ao governo que, em se tratando de controle da demanda, não basta aumentar a arrecadação.

O governo, por sua vez, está preocupado com as perspectivas da economia. Acha que, sem um empurrãozinho nos investimentos públicos, o PIB pode decepcionar novamente, como já ocorreu em 2011. Com a economia crescendo de forma mais rápida, a arrecadação também se expande de maneira mais célere e, assim, fica mais fácil cumprir a meta de superávit primário.

O BC tem uma visão diferente. Acredita que o alívio monetário iniciado em agosto impulsionará os investimentos privados a partir do segundo trimestre. Alega, ainda, que o calendário de obras para a Copa das Confederações, a ser realizada em meados de 2013, e para a Copa do Mundo, em 2014, forçará o aumento dos investimentos a partir de agora. Novos estímulos fiscais, além dos já realizados (como o aumento de 14,2% do salário mínimo), apenas dificultarão o controle da inflação.

A discussão sobre o cumprimento da meta "cheia" de superávit está aberta. A decisão só será conhecida após a definição do contingenciamento do Orçamento. Aqui, vale observar uma possível mudança de comportamento da presidente Dilma Rousseff.

Ao contrário de seu antecessor, Dilma trabalha com a ideia de ordem unida. Não tolera divergências públicas entre ministros e assessores. O discurso oficial é sempre único. Duas mensagens distintas sobre o rumo da política econômica começaram, no entanto, a vir do mesmo local - o Ministério da Fazenda.

É sabido que o secretário-executivo da Fazenda, Nelson Barbosa, é da estrita confiança da presidente. Em novembro, Barbosa, que só fala com autorização prévia da presidente, começou a defender publicamente a elevação dos investimentos do governo. Paralelamente, seu chefe, o ministro Guido Mantega, adotou discurso fiscalista não só para 2012, mas também para 2013 e 2014: em todos esses anos, assegurou ele, o governo cumprirá a meta cheia de superávit.

A exemplo de Lula, Dilma pode estar liberando o debate de seus principais assessores para testar reações a diferentes cenários. É uma novidade.

PCHs - em coma induzido - ADRIANO PIRES e ABEL HOLTZ

O ESTADÃO - 18/01/12

O atual e pujante setor elétrico brasileiro começou nos idos dos séculos passados com a construção de centrais hidrelétricas que não atingiam sequer 30 MW de potência instalada. Eram, então, construídas para suprir de energia o incipiente parque fabril do País, notadamente nas regiões do centro-sul, e um ou outro pequeno empreendimento ao longo do território. À noite parte da energia era dirigida para residências e a restrita iluminação pública.

Com a ampliação da demanda houve necessidade de recursos financeiros e tecnológicos para expandir a produção de energia elétrica. Foi quando se instalaram no Brasil as empresas de origem norte-americana e canadense: a Rio de Janeiro Tramway Light and Power, criada no Canadá em 1904; e a norte-americana American & Foreign Power (Amforp), que adquiriu dezenas de pequenas concessionárias que atuavam no interior de São Paulo. Na sequência, a Light and Power construiu e inaugurou a Hidrelétrica Fontes, no Ribeirão das Lajes, de 24 MW de potência instalada, que era uma das maiores usinas do mundo em operação. Durante os anos 20, a capacidade de geração instalada duplicou, atingindo 475,7 MW, em que 77,8% eram de pequenas centrais hidrelétricas (PCHs). Hoje o Brasil dispõe de um potencial para implantação de PCHs estimado em 11.800 MW de potência instalada, dos quais apenas 1.567 MW estão em operação, resultando num potencial de 10.233 MW em condições de exploração. Esse potencial equivale a cerca de mil aproveitamentos que estão nas diversas fases do processo de licenciamento e implantação de PCH.

Em que pesem os reconhecidos méritos das pequenas centrais hidrelétricas e o extraordinário potencial existente, o Programa de PCHs no Brasil se desenvolve em ritmo bastante lento. Registre-se que o prazo médio de implantação da PCH é de só 18 meses a partir do início efetivo das obras, o que significa desonerar a conta juros durante a construção, tão representativa para as obras das grandes centrais hidrelétricas. Atualmente, a complexidade para a implantação de grandes centrais hidrelétricas - começando pelas questões ambientais e considerando o longo prazo de implantação e as extensas linhas de transmissão que têm de ser construídas - assegura que o Programa de PCHs no País é a alternativa que deve ser priorizada.

Contrariamente à ideia geralmente aceita de que PCHs são uma coisa velha e ultrapassada e de que seu uso não pode ser melhorado, sabemos que existe um caminho longo para evoluir, especialmente em performance de equipamento e adequação de projetos. Assim, PCHs, sempre que forem estimuladas, vão retomar o espaço de direito para continuar a contribuir de forma efetiva através do seu desenvolvimento, porque são uma solução econômica, técnica e ambientalmente eficiente. Cabe ressaltar que, sem suporte de pesquisa e desenvolvimento do governo e sem instituições financeiras que queiram participar da sua recuperação, as PCHs continuarão no coma induzido.

O leilão de energia elétrica de dezembro retratou o atual equívoco do governo em não aproveitar o fato de o País possuir uma diversidade de fontes energéticas. Senão, vejamos: a pouca presença das hidrelétricas se deveu à não obtenção das licenças ambientais; as usinas termoelétricas estavam ausentes porque a Petrobrás alegou não ter gás para comprometer seu fornecimento; e no caso das demais fontes, como as PCHs e a biomassa, o motivo da baixa presença foram os preços pouco atraentes do leilão. Isso enquanto o carvão é penalizado pelo preconceito de ser uma fonte altamente poluente. E às eólicas será imputada a responsabilidade de suprir a demanda, mesmo sem linhas de transmissão para transportar a energia gerada no Nordeste para o centro de carga na Região Sudeste.

Em 2012 o governo deveria pensar em leilões regionais e por fontes de energia, para aproveitar melhor as vantagens comparativas de cada uma, diversificando a matriz elétrica e garantindo o suprimento energético.

Cano alto - ANTONIO PRATA

FOLHA DE SP - 18/01/12


Na 7ª série, troquei com um colega um relógio Casio, em bom estado, por um Pony de cano alto, em farrapos



Caminhando os 50 metros do carro ao restaurante, me senti estranhamente calmo: ia tranquilo, pisando firme, os braços não sobravam, tais quais duas trombas inúteis a balançar ao lado do corpo, como tantas vezes acontece. Entrei na cantina de cabeça erguida, sentei-me próximo à janela e foi só então, ao cruzar as pernas, que descobri a origem de minha segurança: os tênis de cano alto.

Passei a infância inteira de galochas. Fizesse chuva ou sol: moletom e galochas, shorts e galochas, sunga e galochas. Botas, afinal, eram a única peça da indumentária de super-herói que você podia vestir sem estar fantasiado e calçá-las era como ter consigo o cinto de utilidades do Batman, o escudo do Capitão América ou, escondida num frasco, para qualquer eventualidade, a poção mágica de Panoramix. Talvez venha daí a conexão entre a firmeza dos tornozelos e a contenteza do espírito.

Talvez tenha surgido mais tarde. No final dos anos 80, houve uma revolução no estilo dos tênis. Os Kichutes, Bambas e All Stars de lona foram solapados por rechonchudos Nikes, Reeboks ou Ponys. Os modelos mais legais, de cano alto, eram feitos para se jogar basquete; aos meus olhos, contudo, pareciam ter sido fabricados para andar por Marte, com traje espacial. Por anos cobicei um daqueles pares, mas meus pais não me davam. Até que, na sétima série, troquei com um colega de classe um relógio Casio, em bom estado, por um Pony de cano alto, em farrapos -o pé esquerdo todo remendado com silver tape, partes do couro retocadas com Liquid Paper...

À boca miúda, correu pela 7ªB a opinião de que eu havia feito um péssimo negócio. Eu sabia que, financeiramente, não havia sido uma boa troca, mas quem liga para finanças na sétima série? Ainda mais com um Pony de cano alto nos pés? Aquele tênis trazia de volta a fortaleza das galochas e, ao mesmo tempo, me oferecia o ticket de entrada para uma nova fase: era minha primeira peça da indumentária adolescente. Foi seu cano alto, aliás, que sustentou as pernas bambas, no ano seguinte, quando, numa escada pouco iluminada da escola, durante o recreio, dei meu primeiro beijo.

Então veio o colegial: Sex Pistols, Mano Brown e Drummond fizeram-me ver nos tênis importados a submissão ao materialismo e ao imperialismo ianque. Mesmo que, de lá pra cá, eu tenha me rendido em muitas áreas ao materialismo e ao imperialismo ianque, passaram-se 20 anos sem que amarrasse um cadarço acima do tornozelo.

No último domingo, contudo, estava no shopping trocando um presente de Natal e vi numa vitrine o par de Vans. Trata-se de um tênis de skatista, de cano alto, que desejei imensamente entre os 10 e os 14 anos. Não é espalhafatoso como os modelos de basquete, mas tampouco tem a neutralidade pseudoarrojada de um sapatênis. Ainda não sei se usá-los remete-me à infância ou se é o primeiro passo no caminho sem volta de juvenilização do vestuário (vírus que se manifesta principalmente em homens, em torno dos 35 anos). O que sei é que, com eles nos pés, vou tranquilo, piso com firmeza e os braços não sobram, tais quais duas trombas inúteis, a balançar ao lado do corpo. Cano alto. Que saudades.

Especulações chinesas - VINICIUS TORRES FREIRE

FOLHA DE SP - 18/01/12

China cresce menos, mas não muito menos, e mercado especula que virá mais estímulo econômico 

LÁ POR VOLTA do ano 2000, o do "bug do milênio", era comum ouvir da China que sua economia tinha também um "bug" que a impediria de crescer tão rápido por mais uma década, se tanto.

Para fazer um resumo curto e meio grosso, muito "analista" (economista de banco, em geral) e economista-padrão dizia que o dirigismo e a alocação ineficiente de capital (investimento ruim) dariam cabo do milagre chinês.

Lá por volta de 2006, o alarmismo se tornou mais sofisticado. A China viveria uma crise de superinvestimento, em especial no setor imobiliário, no qual se desenvolveriam bolhas (investimento excessivo, que segue a alta de preços passada, mas que não chegará a dar retorno).

A bolha seria resultado da falta de opções de investimento da poupança familiar chinesa (os juros são tabelados e negativos) e de um sistema bancário desembestado, incentivado por autoridades regionais ineptas, que emprestaria mal e demais. Quando a bolha estourasse, a banca chinesa iria à breca e o país viveria uma crise à japonesa.

Mas a China continuou a crescer. O Produto Interno Bruto chegou a correr a 14% ao ano em 2007. Desde então, cresce a 9,5%. Vale sempre lembrar que a China é o maior parceiro comercial do Brasil. Sem a carreira chinesa, não teríamos crescido na toada em que temos andado desde 2006.

Desde meados de 2010, o governo chinês tem apertado as torneiras do crédito a fim de, entre outras coisas, evitar superinvestimento no setor imobiliário (e inflação em geral).

Os preços de imóveis começaram a cair mais ou menos em meados de 2011. Seria o primeiro anúncio de fim da bolha e de um "hard landing" (pouso difícil, queda abrupta do crescimento chinês).

Difícil saber o que vai ser da China. É possível ler e ouvir dúzias de relatórios e relatos inteligentes e até ponderados sobre a economia chinesa, mas que, no entanto, por vezes estimam taxas de crescimento muito diferentes para o país.

Isto posto, ontem os donos do dinheiro grosso do mundo fizeram alguma festa para o resultado do crescimento chinês. Não foi tão ruim quanto a "média das previsões" chutava, mas foi fraco o suficiente para os povos dos mercados considerarem que virá mais estímulo econômico do governo chinês.

Subiu o preço de ações, de minérios, de metais e do petróleo. A gente podia ler na mídia financeira mundial muito comentário do gênero "o governo chinês consegue se antecipar às tendências e controlar altas e baixas do crescimento". Pois é, o governo dirigista chinês.

É possível acreditar nas manhas de curto prazo do mercado financeiro? Ou melhor, deduzir daí alguma opinião séria sobre alguma economia ou investimento? Claro que não.

É mais provável que a China tenha um primeiro trimestre fraco, mesmo com o governo soltando as amarras da economia de novo: de menos exportações, de investimento andando em ritmo menor.

Mesmo o "proativo" governo dirigista chinês talvez não consiga esquentar a economia de pronto. Menos ainda a ponto de chutar para cima os preços de commodities. Que, no entanto, estão voltando a níveis especulativamente absurdos, como o do petróleo, que não sai da casa dos US$ 100 mesmo com o mundo crescendo menos neste ano.

A PERUA DÉBIL MENTAL E O IDIOTA


Arrogância não ensina - MARTHA MEDEIROS


ZERO HORA - 18/01/12 

Quando soube da polêmica causada pela redação da prova de vestibular da UFRGS deste ano, corri para ler seu enunciado. Estava com uma leve suspeita de que o barulho era desproporcional ao fato. Que nada, os vestibulandos têm todo o direito de chiar. Foi provocação.

A vida hoje não é melhor ou pior do que em outros tempos, é diferente. Décadas atrás, aprendiam-se latim e francês nas escolas, e a leitura de clássicos não amedrontava. Na ausência de TV e internet, a introspecção favorecia uma vida intelectual mais rica. A comunicação – fator de evolução de todas as sociedades – se dava em bases mais sólidas.

Porém, muita coisa mudou. A tecnologia decretou novos hábitos e costumes. Mexeu com o vocabulário e com os sistemas de interatividade. A educação perdeu espaço para a economia. A população quadriplicou. O mundo virou uma aldeia global. A informação passou a chegar a qualquer canto, mas nem assim a alienação foi exterminada, ao contrário, se propagou. O mundo hoje é mais individualista, mais brega e mais burro. Generalizando, é.

Os idealizadores da prova de redação da UFRGS sabem disso, e essa consciência faz deles pessoas mais cultas e inteligentes do que a maioria. Bravo. Cultura é um valor inquestionável, e pobre do país que desprestigia o conhecimento. Porém, não houve bom senso na elaboração da prova, e bom senso também é uma forma de inteligência.

Pouquíssimos jovens – aliás, raros adultos também – sabem quem é Adamastor, se uma figura mitológica ou se o dono do botequim da esquina. E não é imprescindível que saibam se querem se tornar bons médicos, bons engenheiros, bons jornalistas.

Aos 17 e 18 anos, faixa etária de quem pleiteia uma vaga na faculdade, o importante é saber escrever corretamente, desenvolver um raciocínio lógico, não se perder em abstrações, ter firmeza de caráter, conhecer o significado da palavra ética, ter um projeto de vida que vá muito além da ganância e... ops, me excedi. Vamos ficar apenas com “saber escrever corretamente” e “desenvolver um raciocínio lógico” – as outras exigências eles terão que demonstrar para a vida, não para uma banca acadêmica de avaliadores.

Indo direto ao ponto: o enunciado da redação foi pedante. Poderiam ter solicitado o desenvolvimento do mesmo tema – o papel do idioma na formação da identidade de um país – sem fazer “buuuu” para essa garotada que é chegada a cenas de terror, sim, mas no cinema. Qual o motivo de nausear estudantes que, pela situação competitiva em que se encontram, já estão suficientemente nervosos? Com que propósito, senão arrogância?

O ensino precisa melhorar muito no Brasil. Exigir mais dos alunos. Se adaptar às novas ferramentas. Formar cidadãos mais preparados. Valorizar a História, o português, investir nos alicerces que sustentam nossa evolução. Ninguém discute: estamos retrocedendo. Mas que não se queira avançar na marra, através da humilhação.

Corpo & alma - ROBERTO DaMATTA


O Estado de S.Paulo - 18/01/12


Ao tentar fazer minha memória falar, seguindo o exemplo de Vladimir Nabokov do Speak, Memory - uma das mais belas narrativas que li em minha vida -, ouço o seguinte:

- Robertinho é canhoto!

Foi como canhoto que eu comecei a atuar no mundo. E o meu problema era saber a natureza daquele qualificativo. Logo descobri que ser canhoto era ser errado. Nada perturba tanto quanto ser diferente e, na maioria dos casos, ser diferente para menos. O ser diferente e o ser igual é o problema. Pois todos somos feitos de semelhanças e diferenças e sabemos que crescer é aprender esse complicado diálogo entre o que nos iguala e o que nos diferencia. Ficou uma lembrança: eu era tão radicalmente canhoto que podia escrever como o grande Leonardo da Vinci, da esquerda para a direita. Quem me guiava no mundo, arrumando-o e construindo-o, o meu lado e a minha mão esquerda. Confirmei que ser canhoto era ser errado porque a professora me obrigava a escrever com a mão direita. Essa direita dos politicamente corretos e 'bem resolvidos', que foi a minha primeira inimiga neste mundo.

Foi essa polaridade entre as mãos, cujo intenso simbolismo estudei depois num texto clássico de Robert Hertz, quem primeiro sinalizou como o corpo falava mais alto do que alma e com ela lutava.

* * * *

As oposições são simplificadoras. Não resolvem, mas - como dizia Lévi-Strauss - são saborosas para pensar. Sem elas, não há orientação, conforme descobri ainda menino quando ia pegar alguma coisa e um olho interno me via e dizia que eu estava usando a mão torta. A mão do coração e não a da cabeça.

Faz, pois, parte do meu aprendizado que o corpo e alma batalham. Muitos amigos não viveram tal luta. Os que eu mais invejava eram os que aparentemente só tinham alma e - é claro - escreviam com a mão direita.

* * * *

Homem feito, aprendi que o corpo era mais confiável do que a alma. Tal como a minha mão esquerda é, até hoje, muito mais garantida do que todo o meu lado direito. Como esses nossos políticos especializados em enchentes, sou muito mais confiável pelo lado esquerdo ou errado do que pelo meu lado direito e correto.

A prática esportiva e uma tentativa de construir uma estante, bem como tantas outras coisas, me mostraram como o corpo não permite o abuso ou o erro. Que falem os meus eventuais excessos com o mero e mortal álcool; que o digam os meus planos de estudar a noite toda; que testemunhem os meus pigarros carregados de nicotina quando eu abusava do fumo. E que confirme tudo isso as vezes em que, durante um exercício físico, minha alma coloca diante do meu corpo algum objetivo mais ambicioso. A alma cobiça, mas o corpo não acompanha. Não porque não queira, mas porque não pode. Afinal, o corpo parece fácil: ele tem um assento físico, concreto, visível e verdadeiro; ao passo que a alma é abstrata, intangível, fugaz e ganha concretude mais quando recusa ou ilude do que quando acompanha o corpo.

* * * *

Era um corpo velho e sua alma tinha sido dilacerada por mil e uma memórias e experiências - por muitos sofrimentos advindos da inveja, da generosidade, da compaixão, do ressentimento, do esforço e da comiseração. Mas - Deus do céu! - era um corpo impávido na sua beleza e no seu orgulho de estar vivo. Um corpo que nos abria para o amor e nos tornava orgulhosos de pertencer àquela casa. Havia uma alma habitando aquele corpo, sem dúvida. Seu fulgor iluminava-o, dando-lhe um equilíbrio conquistado. Ali não havia ódio nem ressentimento. Corpo e alma estavam em paz, mas - eis a surpresa - estavam vivos.

* * * *

Eu sentei ao lado dela, que havia se transformado numa figura de campo de concentração e extermínio, tal a sua fragilidade física e mental. Mas o rosto... Ah! O rosto, embora pálido, guardava a face da mulher amada. Da jovem cujo sorriso abriu o caminho para a felicidade neste mundo. E, quem sabe, no outro, conforme logo descobrimos com os nossos experimentos corporais. Porque é o corpo que permite a peregrinação da alma. A alma é difícil de encontrar. Quantas pessoas sem alma você já encontrou na sua vida? O Diabo (aquele Canhoto) leva as almas. Antigamente ele as comprava caro, com moedas de ouro; hoje elas estão se oferecendo num vasto mercado e valem menos do que um político blindado.

Deus, por outro lado, quer o corpo que, conforme diz a nossa esperança, voltará a viver para sempre no dia da ressurreição. Eis uma imagem amada por um menino canhoto. No dia em que os mortos acordarem do seu longo sono haverá a reconciliação de todos os dualismos. A vida vai englobar a morte. Nesse dia glorioso todos vamos nos ver de novo e nos abraçar enternecidos. Seremos então jovens, fortes, bonitos, puros, alegres, e sem conflitos, debaixo daquela luz gloriosa que virá de um céu que não conhecemos. Esse é o dia do encontro com todos os nossos mortos queridos. A experiência do corpo e com o corpo nos leva para essa imagem mágica e redentora de todas as nossas dúvidas e sofrimento. Amém.

"BBB"! Datena no lugar do Bial! - JOSÉ SIMÃO

FOLHA DE SP - 18/01/12

"Daniel foi expulso por comportamento inadequado." Tucanaram a suspeita de estupro!

Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Polícia no "BBB"! A casa caiu! Manchete do Sensacionalista: "Polícia chega no Projac e Teresa Cristina foge". Rarará!
A casa caiu! E todo mundo dizendo: Bafo no "BBB"! Bafo no "BBB"! Não teve bafo no "BBB"! Teve ABAFO no "BBB"! Tentaram abafar, mas chegou a polícia. Chegou o efeito colateral! Rarará!
E o Bial: "Daniel foi expulso por comportamento inadequado". Tucanaram a suspeita de estupro! E os outros têm comportamento adequado? Chama o Datena!
Um cara chamado Lazaro Cristiano escreveu no meu Twitter: "Agora vão chamar o Datena pra substituir o Bial". Rarará! E sabe qual filme a Globo passou depois do "BBB"? "Código de Conduta"! Rarará! Piada pronta! Enfim, expulsaram o cara! Tiraram o sofá da sala!
E a manchete do "Meia Hora": "Viu, Daniel? Estaleca de BBBêbada tem dono, sim!". E quando a polícia chega, a festa acaba, não adianta continuar! Fica tudo com cara de fuinha!
E, depois da polícia, tem que chamar a Anvisa. "BBB" é caso de vigilância sanitária! A Anvisa tem que interditar os outros BBBs! Rarará!
E não tem jeito, janeiro é o mês dos realities! Dos surrealities! E o "Mulheres Ricas"? Ops, "Mulheres Bizarras"! Essas têm LER (lesão por esforço repetitivo) de tanto digitar a senha naquela maquininha do cartão! E uma delas já está preparada para a luta de classes: "Eu sou uma mulher blindada". Diz: "Desculpe, mas adoro arma de fogo" e "Estou adorando as aulas de defesa pessoal". Blindada, atira e dá voadora!
E por que rico adora gritar pela janela? "Riioooo, eu te aaaamo!". "Vamos tacar champanhe no pooovo!" Se pobre grita na janela, os vizinhos chamam a polícia. "Tá tendo barraco no prédio!" ou "Corintiano!" Comportamento inadequado! Rarará! É mole? É mole, mas sobe! Ou como disse o outro: "É mole, mas rela pra ver o que acontece!"
E olha esta placa no supermercado Enxuto, em Rio Claro: "Temos Leitoa Suína". Rarará!
E sábado eu divulguei a pichação no muro: "Kassab sem vergonha, o busão tá mais caro que a maconha". E um cara me respondeu: "Concordo, viajar de maconha tá mais barato que viajar de ônibus em São Paulo". Rarará! E tá lançada a campanha: Datena no "BBB"!
Nóis sofre, mas nóis goza!

Cabeça de juiz - DORA KRAMER

 O Estado de S.Paulo - 18/01/12

Imagine o caro leitor, a prezada leitora qual seria a reação geral diante da notícia de que um alto servidor dos Poderes Executivo ou Legislativo recebeu R$ 150 mil em adiantamento salarial para reformar o apartamento de cobertura danificado pelas chuvas?

Ou se os órgãos de fiscalização constatassem "movimentações atípicas" de mais de R$ 855 milhões nas contas bancárias de parlamentares, ministros, servidores e familiares?

Escândalo, CPI, demissões, cassações (talvez), condenação pública, convocação de protestos via internet, diagnósticos de crise institucional, desmoralização, um bafafá.

Com direito a manifestações do Poder Judiciário na sua condição de guardião da lei e nos últimos tempos muito mais falante e atuante na oratória de combate aos desmandos.

Mas, como esses acontecimentos e muitos outros mais dizem respeito a distorções ocorridas na Justiça, associações de magistrados e excelências de respeitável reputação agem como se contassem entre outras com a prerrogativa inamovível de estar coletiva, definitiva e eternamente acima de qualquer suspeita.

Por mais suspeitas que possam parecer determinadas ocorrências. A partir da criação do Conselho Nacional de Justiça, a despeito da forte reação contrária, foram sendo revelados desvios de conduta em quantidade que chama atenção e inspira cuidados.

A atuação da corregedora Eliana Calmon em sua necessária estridência deu publicidade a fatos que a reação corporativista alega contribuírem para levar a Justiça ao descrédito junto à população.

Neste aspecto, muito mais deletérios são os argumentos de que as investigações do CNJ configuram uma ameaça ao Estado de Direito. Vale para condutas individuais ou para o que se poderia chamar de farra (assim como se faz quando algo semelhante acontece nos outros Poderes) de pagamentos milionários a títulos diversos.

De mesma forma como estatísticos fazem qualquer coisa com números, juristas encontram nas leis justificativas para quaisquer ações e, com base nelas, falam de uma forma que, aos olhos dos comuns, soa como mera defensiva.

A vantagem da corregedora Eliana Calmon é exatamente abordar os problemas do ponto de vista do que é certo ou errado. Óbvio, observada a legalidade.

Imprescindível também não descuidar da preservação da legitimidade dos atos. O caso do juiz citado acima mais pelo que guarda de pitoresco é típico: receber adiantamento para reformar um imóvel pode ser aceitável na iniciativa privada, onde o dono do dinheiro negocia e é de alguma forma compensado. Mas, no setor público qualquer desembolso requer critérios rigorosos.

A começar pela transparência, sempre lembrada pelos magistrados em seus julgamentos, como um dos preceitos constitucionais exigidos à administração pública.

Tempo pior. O ex-deputado federal Talvane Albuquerque (AL) que está sendo julgado como mandante do assassinato de Ceci Cunha em 1998, de quem era suplente, foi cassado pela Câmara no ano seguinte.

Hoje, pela regra de que atos anteriores ao mandato não podem ser objeto de processos de cassação por quebra de decoro parlamentar, não seria importunado por seus pares e, se reeleito como tantos outros, talvez ainda fosse deputado.

Um exemplo, apenas um, mas muito representativo, de como pioraram os critérios de funcionamento do Parlamento. Mal avaliado pelo público, Congresso também tem uma péssima imagem de si na medida em que aceita a convivência com notórios malfeitores.

Tempo melhor. Para o carioca que sempre estranhou certas coisas no panorama social do Rio, é um alento ver a foto do banqueiro do jogo e outros bichos Anísio Abraão no jornal como presidiário, em vez de testemunhar a desfaçatez com que durante anos desfilou sob aplausos do sambódromo como patrono da escola de samba Beija-Flor ou vê-lo paparicado por autoridades e colunistas sociais.

Era um acinte, porém perfeitamente incorporado ao cenário.

GOSTOSA


O presidente que sabia javanês - MARCUS ANDRÉ MELO


Valor Econômico - 18/01/12


Em "O homem que sabia javanês" Lima Barreto utiliza-se da Indonésia e da "língua malaia" como metáforas para criticar o que rotulou como "o Brasil imbecil e burocrático". Mas a Indonésia nos interessa também como modelo corrupto de presidencialismo de coalizão. Antes restrita aos meios acadêmicos, esta expressão popularizou-se para designar o arranjo institucional no qual o presidente governa apoiado por base multipartidária, com a qual partilha recursos de poder. Para alguns, ele é sinônimo de divisão do butim entre elites políticas. Outros enxergam nele o esteio da governabilidade, uma espécie de pedágio a ser pago para alcançá-la. Ocorre que presidencialismos de coalizão não constituem novidade, tampouco representam algo especificamente brasileiro, nem muito menos salvo conduto para malfeitos.

Afonso Arinos, em 1948, já chamava atenção para o novo presidencialismo que surgia: "nós praticamos um sistema talvez único no mundo: o presidencialismo com representação proporcional, de onde emergiram vários partidos fortes. A situação do presidente da República se aproxima mais, politicamente, dos chefes de Estado do parlamentarismo europeu do que do presidente dos EUA".

O presidencialismo de coalizão é uma "licença para roubar"?

Seu vaticínio quanto à suposta especificidade brasileira falhou. Na América Latina governos de partido único são a exceção e não a regra; apenas Costa Rica e México se enquadram nesta classificação. Um terço dos países da região tem tido apenas governos de coalizão e quatro apresentam uma mistura de governos de coalizão e de partido único. O Chile representa o modelo virtuoso, não corrupto deste arranjo institucional. Seu lugar no ranking da Transparência Internacional (21º) é mais elevado do que o dos EUA (22º)!

No polo oposto, a Indonésia é o paradigma da versão viciosa do modelo. Com 240 milhões de habitantes e marcada por clivagens étnicas profundas, o país é candidato natural a turbulências. E não só políticas. Em 1998, no olho do furacão da crise asiática, a crise derrubou o governo de Suharto, no poder havia 31 anos. Mas desde 2004, o "boom" de commodities tem garantido crescimento e uma coalizão de cinco partidos tem garantido uma surpreendente estabilidade. E como no Brasil, muitos sustentam que o preço a ser pago por ela é a elevadíssima corrupção (110º no ranking da TI). A "fórmula" do sucesso indonésio é o "presidencialismo de coalizão ao estilo javanês". E trata-se efetivamente de uma fórmula matemática acordada pelas lideranças partidárias: os cargos na administração - a começar pelo de presidente (que inicialmente era eleito pelo parlamento) - foram pontuados: presidente (10 pontos), vice-presidente (6), ministro da fazenda (4) ou do interior (3), diretores gerais (0,5) e assim por diante. Os cargos foram distribuídos de acordo com o percentual de cadeiras dos partidos.

"Prima facie", o presidencialismo de coalizão brasileiro assemelha-se ao do gigante asiático, mas difere deste em um aspecto crucial: as regras do jogo eram institucionalizadas. No Brasil a distribuição do portfólio ministerial e dos cargos de primeiro escalão é discricionária. Ela fica ao sabor do estilo de gerenciamento do Executivo. Em seu primeiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não sabia javanês, engatinhava na língua: distribuiu cargos, mas não seguiu nenhuma fórmula ou proporcionalidade. Pelo contrário o PT monopolizou parte importante dos cargos no governo. No segundo, o presidente aprendeu javanês. Mas as regras não estão "escritas em pedra". A presidente Dilma ainda esbarra na "língua malaia" ou seu estilo de gerenciamento de coalizão é diferente?

Acho estas duas hipóteses pouco persuasivas e, se verdadeiras, explicam parcialmente a volatilidade ministerial recente. Afinal ela era o maestro da orquestra do arranjo anterior. Outras hipóteses me parecem mais plausíveis. A primeira é que os custos políticos da corrupção tornaram-se proibitivamente altos. Ao legalizar o que antes era ilegal, o recém-aprovado Regime Diferenciado de Contratações Públicas que entre outras coisas torna secreto o valor dos investimentos visa reduzir tais custos. Mas a opinião pública passou a ver a concessão de ministérios de porteira fechada como licença para roubar.

A segunda é que a extensão da corrupção passou a representar risco sistêmico. Ela passou a ameaçar a eficiência do governo em áreas críticas como as obras de infraestrutura da Copa. As reformas citadas objetivam também aumentar a eficiência dos projetos. A terceira é que a exposição internacional do país se ampliou enormemente, e acompanhou a expansão da economia: antes restritos à agenda doméstica, os escândalos impõem "custos reputacionais" sem precedentes ao governo. A quarta é que tais escândalos servem a estratégia de "blame shifting" da presidente - eximem-na de responsabilidades com um bônus adicional importante de livrá-la do estoque de ministros que não escolheu.

O Brasil tem sido considerado um modelo institucional bem sucedido. Em geral, as avaliações positivas centram-se em um aspecto: a capacidade do sistema em produzir governabilidade, este conceito escorregadio com o qual busca-se definir a ausência de crises. Presidentes minoritários e sem base estável de sustentação evocam o espectro de cesarismo e crise institucional. A tolerância aos desmandos origina-se daí. Supermaiorias hipertrofiadas levam, no entanto, à paralisia decisória, à perda da capacidade de dizer não e à recusa ao enfrentamento que gere custos. Com isso aniquila-se a capacidade de transformação em um país em que quase tudo deve ser mudado. Entre o modelo Indonésio e o chileno, o Brasil deve optar por este último.

Marcus André Melo é professor da UFPE, foi professor visitante da Yale University, é "Fellow" da John Simon Guggenheim Foundation e é colunista convidado do "Valor"

SEGURO RESIDENCIAL - MÔNICA BERGAMO

FOLHA DE SP - 18/01/12
A WTorre, que constrói a Arena Palestra Itália, negocia com a seguradora Aegon para que ela dê nome ao futuro estádio do Palmeiras. A empresa patrocina o Ajax, de Amsterdã, que fez amistoso com o Verdão no sábado, e quer divulgar sua marca no Brasil. A construtora pede R$ 380 milhões por 15 anos de "naming rights". A seguradora achou caro e sugeriu que o acordo tivesse duração de 20 anos.

GUARDA-ROUPA

Além de negociar os "naming rights" da Arena Palestra, a Aegon manifestou interesse em patrocinar a camisa alviverde.

DINHEIRO NA CANECA

E o Palmeiras fará hoje, durante a visita de dez torcedores às obras do estádio, o lançamento do primeiro produto licenciado da arena: uma caneca com o desenho da fachada e o rosto do ex-goleiro Marcos. Ele receberá os convidados ao lado de Ademir da Guia, outro ídolo palmeirense.

ESTRANHA NO NINHO

Maria Christina Mendes Caldeira, ex-mulher do deputado Valdemar Costa Neto (PR-SP), réu no processo do mensalão, e crítica contumaz do PSDB nas redes sociais, foi ao debate dos pré-candidatos tucanos a prefeito de SP, anteontem. "Tinha muito preconceito com o partido, mas fiquei surpresa com a participação feminina nos diretórios", diz ela.

LINGUAGEM CORPORAL

E o secretário Andrea Matarazzo (Cultura), um dos pré-candidatos, gesticulou com o dedo, sinalizando que achava "loucura" a proposta do concorrente Bruno Covas de ter segundo turno nas prévias. "É como dizer, no meio da partida, que agora são seis jogadores, não 11", disse ao final. Entre os outros pré-candidatos, o deputado Ricardo Trípoli considera o segundo turno "ficção", e o secretário José Aníbal (Energia) quer ouvir a Executiva.

CORTINA ABERTA

A atriz Flávia Alessandra será a protagonista da peça "Fora de Mim", baseada em texto de Martha Medeiros. O cineasta Francisco Ramalho dirigirá o espetáculo, com estreia prevista para julho.

DIDÁTICA DA ESFIRRA

Vera Holtz, que estudou árabe para viver uma iraquiana na peça "Palácio do Fim", que estreia em SP na sexta, aperfeiçoou a pronúncia com duas irmãs, donas de um restaurante libanês. "Levei as palavras que tinha que dizer e conversávamos entre uma esfirra e outra", conta.

LIXO DE LUXO

E o lixão cenográfico em que a personagem de Vera Holtz morará em "Avenida Brasil", próxima novela das 21h da Globo, é coberto com resíduos do Projac (roupas, papéis etc.) higienizados.

PROGRAMA DE ÍNDIO

Será prorrogada até abril a mostra "Índios no Brasil", exibida na Bélgica no festival Europalia, patrocinado pelo Ministério da Cultura.

ERA DE AQUÁRIO
Os atores Claudia Raia, Tainá Müller, Bruno Fagundes e Tiago Abravanel assistiram à estreia do musical "Hair", no Teatro Frei Caneca. A bailarina Ana Botafogo também estava entre os convidados da sessão, que aconteceu anteontem, em São Paulo.

DIA DAS BRUXAS

O ex-governador José Serra chegou 15 minutos atrasado à estreia da peça "A Saga da Bruxa Morgana e a Família Real". Ele levou a neta Gabriela, 4, para ver a encenação das histórias da bruxa do "Castelo Rá-Tim-Bum", da TV Cultura. Protagonizado por Rosi Campos, o espetáculo entrou em cartaz no Teatro Raul Cortez, na Fecomercio de São Paulo.

CURTO-CIRCUITO

O camarote Bar Brahma faz hoje, às 20h30, happy hour de Carnaval, na avenida São João. Classificação etária: 18 anos.

O espetáculo "Bob Esponja, a Esponja que Podia Voar" estreia no dia 10 de março no Credicard Hall. Menores de 12 anos devem estar com os responsáveis.

A banda Visconde, projeto paralelo do vocalista Lucas, do Fresno, estreia amanhã, às 18h, com show no clube Inferno. Livre.

A editora Panini doou 500 gibis da Turma da Mônica para a exposição "Desenhar para Sonhar", na Biblioteca Nacional, no Rio.

com DIÓGENES CAMPANHA (interino), LÍGIA MESQUITA e THAIS BILENKY

O juiz e o holofote - IGOR GIELOW


FOLHA DE SP - 18/01/12
BRASÍLIA - Enquanto os meritíssimos brasileiros engalfinham-se, Madri viu ontem Baltasar Garzón sentar-se no banco dos réus.
O juiz espanhol, que ganhou fama ao prender Augusto Pinochet fora do Chile e por ajudar a reabrir casos da ditadura argentina, é visto por seus apoiadores como um defensor universal das vítimas da opressão.
Para seus adversários, que geralmente estão no que é percebido pela opinião pública como o "lado do mal", Garzón é só um oportunista com pouco respeito às leis.
A verdade parece estar no lugar de sempre: em algum lugar no meio do caminho. Mas o voluntarismo de Garzón cobrou seu preço: ele está sendo julgado por autorizar escutas ilegais enquanto investigava uma suposta rede de corrupção envolvendo o Partido Popular (hoje no poder).
Ao que tudo indica, e como a coisa mexe com políticos e advogados cabe sempre cautela, ele exagerou. E foi buscar um privilégio inexistente de ter o direito a uma apelação superior. É forte candidato a perder a toga por 17 anos, matando sua carreira.
Garzón está na berlinda. Numa Espanha em eterno Fla-Flu, cindida por quase quatro décadas da ditadura fascista de Francisco Franco, ele tentou reabrir casos de violação, só para ser afastado e responder a outro rumoroso processo.
O juiz, disse a Justiça, atentou contra uma fundação da transição democrática, a anistia, angariando os previsíveis apoios e críticas. Nada muito diferente, guardadas as proporções, do que acontece no Brasil (com efeito, Garzón deu pitacos contra a Lei de Anistia daqui também).
Empolgados com a atuação de Eliana Calmon, magistrada cuja justa causa de combate aos privilégios do Judiciário às vezes é ofuscada pelos holofotes, juízes Brasil afora podem começar a emular a figura do procurador "combativo" que tanto prejudicou o Ministério Público.
É popular, mas nem sempre acaba bem, como Garzón demonstra.

Sem oposição - MERVAL PEREIRA


O GLOBO - 18/01/12

A incapacidade de o PSDB se articular minimamente para exercer o papel que lhe cabe como maior partido oposicionista brasileiro resulta em uma apatia política perigosa, que não faz nada bem à democracia. A mais recente demonstração disso é o convite despropositado feito pelas regionais do Rio e do Distrito Federal para que o senador Álvaro Dias seja candidato a governador.
O governo Dilma Rousseff, mesmo sem grandes realizações em seu primeiro ano e cheio de problemas para resolver na sua base aliada, continua popularíssimo graças à sensação de bem-estar que a economia brasileira ainda é capaz de proporcionar, mesmo que os sinais de desgaste do modelo estejam evidentes, até mesmo pelo reflexo da crise internacional.
O aumento do salário mínimo em torno de 14% é um forte alavancador do consumo interno e impulsiona a popularidade do governo, mesmo que tenha chegado em uma hora em que as contas públicas andam precisando de uma forte contenção.
A oposição, minguada em números - representa cerca de 18% do Congresso, o menor índice desde a redemocratização -, não tem uma atuação qualitativa que compense a fraqueza numérica.
Tudo indica que o principal partido, o PSDB, está preso em uma armadilha que já o apanhou uma vez, na disputa contra a presidente Dilma Rousseff em 2010.
Ali se avaliou erroneamente que a candidata de Lula não teria condições de disputar a campanha presidencial com o grão-tucano José Serra, e este optou por não atacar o ex-presidente (ao contrário, chegou a elogiá-lo), na vã esperança de que os eleitores lulistas veriam nele uma alternativa melhor do que Dilma.
Como se a disputa política-ideológica não fizesse parte do pensamento estratégico de uma parte do eleitorado, e a outra não estivesse ligada à continuidade das benesses oficiais.
O ex-governador paulista mudou radicalmente sua postura depois da derrota, e anda muito mais ativo na crítica ao governo do que seu próprio partido, ou mesmo que seu adversário interno, o senador Aécio Neves, que ainda não disse a que veio.
O problema de Serra é que essa atitude que vem assumindo agora chega quando já não tem as condições políticas necessárias para se colocar como candidato a presidente pelo PSDB, uma obsessão que não corresponde à realidade do momento.
Está tudo preparado - e de modo truculento, no ponto de vista dos serristas, cada vez em menor número - para que Aécio Neves seja o candidato da vez dos tucanos.
Aliás, essa "truculência" apontada por seus seguidores pode dar a Serra a explicação para deixar o partido e tentar se candidatar à Presidência pelo PPS ou pelo PSD, caso não se acerte no PSDB.
A única maneira de clarear a situação interna dos tucanos seria Serra aceitar se candidatar à prefeitura paulistana e deixar o caminho aberto para Aécio Neves, o que significaria que desistiu de chegar à Presidência da República, o que parece improvável neste momento.
O problema de Aécio parece ser uma maneira antiquada de fazer política, que não o coloca perante a opinião pública como um líder oposicionista.
Ele tem se movimentado bastante pelos bastidores, tentando acertar acordos que podem levá-lo a quebrar a ampla coalizão partidária que dá apoio à presidente Dilma.
A questão é que esses acordos dependem do fracasso do governo, mais especificamente no enfraquecimento econômico do nosso crescimento.
A perspectiva para os próximos anos não é nada boa, e é possível que o governo Dilma mantenha-se em um patamar medíocre justamente nos anos eleitorais.
O crescimento do ano passado já deve ser abaixo de 3%, em parte porque o governo quis frear o crescimento para controlar a inflação, em parte porque a crise internacional não permitiu crescimento maior.
Segundo relatório da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad) divulgado ontem, a economia mundial beira uma nova recessão, e espera-se crescimento "anêmico" nos anos de 2012 e 2013.
O crescimento da América Latina e do Caribe será de 3,3% este ano, e o Brasil se manterá abaixo da média, como vem ocorrendo nos últimos anos: a previsão de crescimento do PIB brasileiro é de 2,7%.
São dados preocupantes, que sinalizam menos arrecadação de impostos e exigirão do governo um corte nos gastos públicos que ele não tem conseguido concretizar a não ser cortando investimentos, o que leva a menos crescimento ainda.
Dois anos seguidos de crescimento abaixo de 3% configurariam uma situação econômica difícil, mesmo que nosso PIB cresça mais que o dos países desenvolvidos.
Nesse ritmo, continuaremos nos aproximando das chamadas "economias maduras" do mundo, mas perdendo terreno para os emergentes como nós, que crescem a uma taxa mais acelerada, apesar da crise.
E, sobretudo, perdendo as condições de manter a política social que garante a popularidade do governo, mesmo em um ano medíocre em realizações.
Pois o PSDB parece estar jogando na crise econômica como única arma de argumentação para o eleitorado mudar de governo em 2014, sobretudo porque, nesse caso, a desintegração da coalizão governamental poderia oferecer um caminho para a campanha de Aécio Neves à Presidência, com a adesão de alguns partidos, descontentes ou mais pragmáticos.
Há potenciais crises para todos os lados. O PSB do governador Eduardo Campos disputa a primazia de ser o segundo partido da aliança, com direito a indicar o vice, com o PMDB, que disputa com o PT espaços no governo e nas alianças estaduais.
Qualquer dos dois partidos aderiria com prazer a uma candidatura tucana com Aécio Neves à frente, desde que a situação do governo comece a ficar difícil por causa da economia.
Se tudo continuar como está, com a presidente Dilma transformando-se em solução natural para o PT depois que Lula parece estar disposto a continuar sendo o grande eleitor, sem disputar novamente a Presidência como planejara antes de sua doença, os partidos aliados se conformarão dentro da coalizão, mesmo que insatisfeitos.
E o PSDB não parece ter uma proposta alternativa para oferecer ao eleitorado. O PT na oposição apresentava uma alternativa concreta ao governo de FHC, mesmo que fosse equivocada e tivesse que ser abandonada, por inviável. Mas durante algum tempo convenceu o eleitorado de que tinha a saída.

Símbolos de status - RUY CASTRO

FOLHA DE SP - 18/01/12

RIO DE JANEIRO - Com o Brasil passando por esse turbilhão de transformações sociais e milhões de famílias subindo de classe da noite para o dia, novos padrões de consumo e comportamento se impõem. Graças ao IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE, fica-se sabendo, por exemplo, que o brasileiro está trocando a sardinha pelo salmão.

A sardinha deve lembrar-lhe o puxadinho de alvenaria, a meia com buraco no dedão, o caçula com disenteria, a prestação vencendo, o mês no fim do dinheiro. Já o salmão representa a ida dominical ao shopping, os móveis do quarto da criança, a TV de 40 polegadas, o carro em 72 meses e, quem sabe, a casa própria. O ser humano gosta de símbolos de status, donde, neste momento, a sardinha esteja por baixo, e o peixe usado no cálculo da inflação seja o salmão.

Não importa que a sardinha, tirada artesanalmente do mar, a mãos e músculos, seja muito mais fresca e saborosa, como lembrou outro dia o mestre da gastronomia brasileira José Hugo Celidonio, na coluna "Gente Boa" do "Globo". Ao passo que o salmão servido aqui é "quase todo de cativeiro e alimentado com ração", diz Celidonio.

Só resta torcer para que, passado o deslumbramento, o brasileiro desperte e destroque esse salmão desenxabido pela fiel, autêntica e sempre excitante sardinha, sem medo de ser chamado de pobre. Mesmo porque não estão faltando símbolos para demonstrar sua nova riqueza.

Segundo o IPCA, o brasileiro está também comendo menos chuchu e chupando mais balas. Como uma coisa substitui a outra, não sei. Mas a queda do chuchu arrastará também o orgulhoso camarão para a segunda divisão, enquanto o excesso de balas provocará uma explosão de cáries per capita e tornará ainda mais prósperos os nossos dentistas. E assim vai o Brasil rumo ao seu glorioso destino.

Os doutores blindaram os implantes - ELIO GASPARI


O GLOBO - 18/01/12

Os cirurgiões plásticos e suas guildas deveriam convocar um congresso da categoria para discutir os aspectos desastrosos de suas condutas diante das adversidades provocadas pelos implantes de mamas de silicone PIP. A ruína poderia ter sido evitada em 2009, quando a Câmara aprovou um projeto do deputado Miro Teixeira exigindo que os médicos comprovassem a "ciência da parte do paciente de todos os riscos eventuais do uso de silicone quando implantado no organismo humano". A nobiliarquia médica mobilizou-se contra a exigência e prevaleceu, pois o projeto morreu no Senado.

Até abril de 2010, quando o uso dos implantes de PIP foi proibido pela Agencia Nacional de Vigilância Sanitária, estima-se que 20 mil brasileiras passaram por esse tipo de cirurgia. Desde então, a Anvisa recebeu 39 queixas de ruptura dos implantes e 55 de outros efeitos adversos. Em todos os casos as reclamações vieram de pacientes. Não houve uma só notificação de médico. Zero, mesmo sabendo-se que, antes de reclamar na Anvisa, a vítima queixou-se a ele. (É verdade que os computecas da agência avisam, no site do órgão, que só se chega ao formulário de "evento adverso" com um navegador, o Explorer, da Microsoft.)

A agência recebe anualmente 650 mil queixas de pacientes e apenas 200 notificações de profissionais. Essa disparidade resulta do ambiente promíscuo onde coabitam a indústria farmacêutica, médicos e hospitais. Mesmo assim, no primeiro semestre de 2011 ocorreram 323 queixas relacionadas com a má qualidade de luvas de procedimentos.

A revendedora das próteses - EMI Importação e Distribuição - foi obrigada pela Justiça a pagar uma nova cirurgia e a troca da prótese. Notificação do médico? Nem pensar. O silêncio persistiu ao longo de 2009 e 2010, quando o fabricante verificou que o índice de rompimento dos seus implantes oscilava entre 30% e 40%, e indenizou mais de uma centena de vítimas, na França.

Os médicos que implantaram essas mamas souberam dos problemas, e nada disseram à Anvisa. Serão obrigados a defender suas condutas na Justiça, pois não só há ações das vítimas, como o Ministério Público entrará no lance. A Anvisa, que não deu atenção às queixas das pacientes, responderá pela sua inépcia.

Ocorrida a desgraça, a Sociedade Brasileira de Mastologia informou que um estudo de 2002 revelou que os índices de ruptura dos implantes oscilavam entre 26% em quatro anos, 47% em dez anos e 69% em 18 anos. Em 2009, combatendo a exigência da comprovação do conhecimento, pelas clientes, dos riscos que corriam, o Conselho Federal de Medicina disse o seguinte: "O médico brasileiro é obrigado, por questões éticas, a explicar a seu paciente o que será usado como propedêutica e como terapêutica, sem a necessidade de um ''laudo de autorização'' que, sem trazer qualquer benefício ao paciente, irá - ao contrário - provocar uma situação de constrangimento para o médico que empregue a prótese de silicone e uma expectativa negativa por parte do paciente. Isto mostra que a exigência de autorização por escrito para a realização desse procedimento médico é incabível".

Incabível era jogar para baixo do tapete uma justa "expectativa negativa" da paciente. Boa notícia: daqui a duas semanas, com a Câmara reaberta, Miro Teixeira reapresenta seu projeto, com novas salvaguardas.

GOSTOSA


É simples assim - ILIMAR FRANCO

O GLOBO - 18/01/12

É intensa a disputa de poder entre o presidente da Autoridade Pública Olímpica, Márcio Fortes, e o diretor de Relações Institucionais do Comitê Olímpico Brasileiro, Agemar Santos. Este tem ido direto ao Ministério do Trabalho e à Receita Federal resolver pendências. Fortes gostaria que as gestões passassem por ele. Ao sair de uma reunião no Planalto, sexta-feira, Fortes disse a um amigo: "Ele quer furar a APO, e o meu papel é furá-lo".

Dilma: “Não tem reforma”
A presidente Dilma, na audiência com o vice Michel Temer, informou que as mudanças na equipe serão limitadas a quatro pastas. Os ministros Fernando Haddad (Educação) e Iriny Lopes (Mulheres) vão concorrer em São Paulo e Vitória. Para substituir Aloizio Mercadante, que vai para a Educação, a presidente quer um nome técnico na Ciência e Tecnologia. Nesse perfil, os nomes mais fortes são o do deputado Newton Lima (PT-SP), ex-reitor da Universidade de São Carlos, e o do presidente da Agência Espacial Brasileira, Marco Antonio Raupp, ex-presidente da SBPC. Na pasta do Trabalho, a experiência parlamentar favorece o nome do deputado Vieira da Cunha (PDT-RS).

"O PMDB não quer tirar o espaço de ninguém na reforma ministerial” — Henrique Alves, líder do PMDB na Câmara (RN) e candidato a presidente da Casa em 2013

REGULARIZAÇÃO. O presidente do INSS, Mauro Hauschild, reuniu-se ontem com o prefeito Eduardo Paes para acertar a venda de um terreno do instituto, em Bangu, que foi invadido e abriga hoje três mil famílias. Eles também discutiram a alienação de outros imóveis do INSS no Centro, na Tijuca e em Santa Teresa. Hauschild propôs ainda a possibilidade de permuta de imóveis entre o instituto e a prefeitura, ressaltando que em alguns locais existe carência de agências da Previdência Social.




Imobilizado
O secretário Moreira Franco (SAE) fala sobre a demanda para promovê-lo: "Esta é uma informação de antes da pedra da vesícula do vice-presidente Michel Temer. Era em outro contexto. No momento, estou absolutamente parado".

Sobrevivente
Diante da resistência no PP ao retorno de Márcio Fortes e do fato de a presidente Dilma não simpatizar com as sugestões do partido, sua opção foi a de manter à frente das Cidades o atual ministro, Mário Negromonte.

Partido em duas linhas
A divisão interna do DEM levou ao surgimento do PSD. Agora, outro partido de oposição se divide. O PPS saiu de seu último congresso tendo duas alas: a que pretende amarrar o futuro da organização à candidatura presidencial de José Serra; e os que se autointitulam independentes, cuja preferência seria apoiar uma candidatura como a de Marina Silva (ex-PV). Uma turma faz oposição. A outra vê méritos nos governos petistas.

A linha
A expectativa da presidente Dilma para a reunião ministerial de segunda-feira não é o da prestação de contas. Ela já tem informações sobre o primeiro ano de gestão. Dilma quer debater o futuro e ouvir propostas de novos programas.

Na lida
Em Havana, onde foi preparar a visita da presidente Dilma a Cuba, o ministro Antonio Patriota e o chanceler Bruno Rodrigues se reuniram para tratar de cooperação em energia, agricultura, infraestrutura, saúde e farmacêuticos.

DEPOIS de 15 dias da tragédia das chuvas em Ouro Preto, cidade histórica de Minas Gerais, o senador Aécio Neves (PSDB) visitou ontem o município para prestar solidariedade. Estava de férias em Paris.

O CANDIDATO do PSDB à prefeitura do Rio, Otávio Leite, quer deflagrar sua campanha no mês que vem. "Os outros candidatos já estão na rua, temos que colocar o nosso bloco em campo", diz Leite.

O DEPUTADO Alessandro Molon (PT-RJ) nega que deseje concorrer à prefeitura do Rio. "Quero ajudar o PT a reencontrar seu rumo no Rioõ, disse ele, que é contra o apoio à reeleição do prefeito Eduardo Paes.

... E os oligarcas ainda mandam - JOSÉ NÊUMANNE


O Estado de S.Paulo - 18/01/12


O cinismo está em alta na República. A organização não governamental (ONG) Contas Abertas fez uma descoberta estarrecedora: o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho, encaminhou para seu Estado de origem, Pernambuco, 90% das verbas disponíveis no orçamento para prevenir e socorrer catástrofes naturais. Com destaque para Petrolina, seu curral eleitoral. Diante da estupefação natural de qualquer brasileiro com massa encefálica disponível para uso no cérebro, o governador do Estado aquinhoado, Eduardo Campos, chefão nacional do Partido Socialista Brasileiro (PSB) por herança do avô, Miguel Arraes de Alencar, atribuiu o abuso a absurdo maior: as verbas federais caíram no seu colo porque os técnicos pernambucanos tiveram competência para produzir projetos que justificaram o dispêndio. Se assim fosse, 90% da competência técnica da administração pública brasileira atuaria sob suas ordens. Não é uma gracinha? Ei, não me refiro a Sua Excelência, apelidado de Dudu Beleza, mas a sua conclusão estapafúrdia.

A bazófia foi repetida por personalidades ilustres: o presidente nacional do PT, Rui Falcão, e o líder no Senado, Humberto Costa, também pernambucano, entre outros, chamaram a atenção para o fato de não pesar contra Coelho nenhuma acusação de malversação de recursos públicos. Faltou-lhes o mínimo de intimidade com o vernáculo, pois, na verdade, diariamente os meios de comunicação noticiam evidências de "má administração" e "má gerência" do erário praticadas pelo comparsa defendido. E esta é a primeira definição para malversação, dada pelo linguista Antonio Houaiss no dicionário que anda fazendo falta na mesa dos maiorais deste País. A segunda definição, aí, sim, refere-se à "apropriação indébita de fundos", a velha e malfadada corrupção. Então, pernambucanos amigos, na flor do Lácio cultivada pelo caolho Luís de Camões, má gestão e corrupção habitam o mesmo verbete nos melhores dicionários.

O senador petista foi além ao acusar a denúncia de discriminatória. Seu Estado não estaria sendo criticado por ter ficado com quase toda a verba do ministério do bom filho que ama tanto seu torrão, mas por ficar no Nordeste. Nordestinos ao desabrigo de mamatas e mutretas foram usados para justificá-las.

Tão absurdo quanto um Estado entre 27 abocanhar quase toda a verba destinada a prevenir ou reparar desastres causados por intempéries naturais foi constatar que a Nação tomou conhecimento do despautério pelo trabalho independente de uma ONG do bem - enfim, uma ONG do bem no noticiário. Mas, meu Deus, que presidente da República é a sra. Dilma Rousseff se não dispõe de instrumentos de informação capazes de dar-lhe conta em tempo real de como um ministro que nomeou para cuidar de integrar a Nação entrega quase toda a verba disponível para acudir a famílias que tiveram todo o seu patrimônio carregado pelas enxurradas de verão para cevar a própria capitania partidária, na perfeita definição do deputado Miro Teixeira (PDT-RJ), parentes e afins.

A desfaçatez da justificativa técnica para o privilégio e a desculpa sórdida da discriminação regional, acompanhada de comentários estúpidos do gênero "ninguém amaldiçoou um Estado do Sudeste por isso", como se já tivesse sido registrado "antes na História deste país" (como diria o chefão de todos, Lula) algo sequer similar a tais despropósitos, manifestam um velho vezo de arrogância. Essa arrogância tem origem na mentalidade oligárquica que prevalece na condução política brasileira desde que ela começou a existir.

A Coroa portuguesa inventou as capitanias hereditárias e, depois, apelou à força da imposição da língua da metrópole pelo marquês de Pombal para garantir seu domínio sobre rincões distantes de um território imenso e hostil. Também para conservar a integridade territorial, incomum no subcontinente sul-americano, o Império distribuiu patentes de coronel da Guarda Nacional a latifundiários do interior. Os militares que erigiram a República remexendo no lixo de destroços de nosso trono nativo absorveram o sistema de domínio recorrendo ao semifeudalismo que deu certo e entregando baraço e cutelo nos ermos da Pátria a oligarquias locais. O mando dos Coelhos em Petrolina, depois estendido a Pernambuco inteiro, data da Primeira República, assentada nas bases do pacto do café com leite, que instituiu o rodízio de presidentes paulistas e mineiros até a Revolução de 1930, deflagrada para pôr fim ao poder oligárquico. Só que, ao bel-prazer do caudilho Getúlio Vargas, esta fortaleceu as oligarquias substituindo os oligarcas.

A historiadora americana Linda Lewin constatou num estudo a sobrevivência oligárquica no Brasil ao ilustrar na saga da família Pessoa, de Umbuzeiro, na Paraíba, a sobrevivência às mudanças de regimes na sucessão dos governadores daquele Estado: até publicá-lo, em 1975, todos os governadores paraibanos vinham de famílias com membros na primeira Constituinte do Brasil independente. Os Pessoas, protagonistas da Revolução de 1930 e de Politics and Parentela in Paraíba, de Lewin, não mandam mais no País nem no Estado como no tempo de Epitácio e João. Mas os Coelhos confirmam que a força oligárquica descrita pela professora de Berkeley continua. O clã sobreviveu ao destronamento das oligarquias pela Revolução de 1964 e ao projeto socialista do Partido dos Trabalhadores (PT) hoje.

E os Coelhos não estão sós: o chefão socialista Eduardo Campos descende da família Alencar, de José, não o vice de Lula, mas o romancista de Iracema. O que Dilma Rousseff tem com isso? Afinal, ela pegou em armas para pôr fim aos velhos vícios patrimonialistas que sequestram o Estado brasileiro desde sempre. E entrou no PT para "acabar com tudo o que está aí". Mas serve aos oligarcas de antanho a pretexto de empregá-los em seu projeto de poder. A luta acabou, mas a oligarquia detém a força.

Os pimentões da Anvisa - ANDRÉ MELONI NASSAR

 
O Estado de S.Paulo - 18/01/12


Dois episódios recentes puseram na berlinda a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa): a divulgação do relatório de 2011 do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (batizado de Para) e as reações aos problemas associados às próteses de silicone PIP. Pela minha formação e experiência profissional, vou-me ater apenas ao caso do relatório do Para.

Por dever de ofício, caberia à Anvisa dominar o estado da arte da ciência nas pesquisas de segurança dos alimentos, congregando os melhores cientistas e direcionando o caminho a ser perseguido pelas empresas produtoras na busca por agrotóxicos de menor impacto ambiental e mais seguros. Mas, na contramão do que seria de interesse dos consumidores, a agência prefere utilizar os resultados do Para com o objetivo de fazê-los acreditar que correm riscos iminentes de consumir alimentos produzidos com agrotóxicos. No almoço de domingo último, em casa, com meus familiares, coube a mim mesmo explicar a confusão dos pimentões.

O mais recente Para mostra que entre 18 culturas, com 2.488 amostras, 28% foram consideradas não satisfatórias. A conformidade das amostras é medida de três formas: se o agroquímico encontrado é autorizado para o produto analisado, se o resíduo encontrado de agrotóxico autorizado ultrapassa o limite permitido - limite máximo de resíduos (LMR) - e os casos em que ocorrem os dois eventos.

Os resultados revelam aspectos positivos do ponto de vista da segurança dos alimentos, mas pouco enfatizados no relatório. O primeiro refere-se à quantidade de resíduos que se encontra além dos limites permitidos (os dois últimos casos mencionados anteriormente). Foi constatado o índice médio de 3,6% nas 18 culturas - considerado bom, mesmo para os rigorosos padrões internacionais. O segundo é o fato de que em cinco alimentos - das 18 culturas analisadas - não foi detectado nenhum índice de resíduo sequer. Destaque-se que são alimentos de elevado consumo, como arroz e batata. Aliás, apontado injustamente como "vilão" no relatório, com 92% das amostras consideradas "insatisfatórias", o pimentão aparece totalmente ileso de resíduos nas amostras que utilizaram apenas produtos autorizados.

Outro dado mal explicado no monitoramento da Anvisa é o de produtos com resíduos de ingredientes ativos sem registro para aquela determinada cultura. Isso, de fato, ocorreu em culturas como pimentão, cenoura e beterraba em magnitude elevada. Mas como não existe autorização de uso daquele ingrediente ativo, não há um LMR definido - e não se pode concluir se a quantidade de resíduos é maior ou não do que o limite de segurança. Das 694 amostras insatisfatórias, 605 foram assim classificadas. Esses resultados mostram que boa parte dos problemas de resíduos de agrotóxicos encontrados nos alimentos não tem que ver com descuidos ou imprudência dos produtores na sua aplicação nas lavouras.

De fato, ainda existem problemas quanto ao uso, mas vale registrar que só 13% do total de amostras insatisfatórias se enquadra nesse caso - a parte maior decorre do uso de produtos encontrados no mercado brasileiro, com LMRs definidos para algumas lavouras, mas, por motivos que só a Anvisa poderia explicar, não autorizados para outras lavouras.

Não há dúvida que cabe aos agricultores utilizar, e às empresas e distribuidores recomendar, somente agrotóxicos com registro autorizado para a cultura determinada. No entanto, conhecendo o penoso e demorado processo de autorização de registro de ingredientes ativos pela Anvisa, não há como não responsabilizar a própria pelo uso de produtos não autorizados em certas lavouras.

A leitura do relatório dá indicações de algumas orientações políticas, não baseadas em ciência, que parecem existir na Anvisa. Na argumentação a favor do Para a agência cita as doenças crônicas não transmissíveis (DCNTs) e menciona três estudos internacionais para reforçar a associação entre agrotóxicos e elas. Ao revisar os estudos, porém, logo se constata que nenhum deles estabelece essa relação direta. Um trabalho enfoca a prevenção durante a aplicação de agrotóxicos. Outro analisa as DCNTs em geral, mas sem menção alguma a pesticidas como causa desses males. O terceiro, mais relacionado ao tema, discorre sobre os riscos para a saúde na exposição das pessoas aos ingredientes ativos de produtos. Como mostra o Para, a exposição é exceção, e não a regra, no Brasil.

A questão que me preocupa é a seguinte: é válido o órgão governamental responsável por autorizar e fiscalizar o uso de agrotóxicos no País, em vez de tomar decisões amparadas no rigor técnico-científico, fazer uso político dos instrumentos de fiscalização a ele outorgados pelo Estado? A meu ver, tal uso político é uma distorção do trabalho da Anvisa.

É um desperdício de tempo, que deveria estar sendo alocado para a realização de ações que incentivem o uso mais eficiente e correto dos agroquímicos. É um desperdício de recursos, pois, ao não informar com precisão os resultados contidos no Para, não permite à população fazer um julgamento correto sobre se os alimentos ingeridos são seguros ou não. E é um desperdício de inteligência, porque a Anvisa poderia estar liderando a construção de uma agenda positiva sobre o uso de agrotóxicos no Brasil, estimulando as empresas produtoras a dialogar com todos os órgãos governamentais que regulam o setor e, em conjunto, criar canais de comunicação com a sociedade.

Em vez de promover um debate educativo e criar medidas de treinamento dos agricultores para aproximar do zero as não conformidades que persistam, a Anvisa opta por questionar a necessidade dos agrotóxicos. Uma opção duvidosa, sobretudo vinda de um organismo importante, cujas decisões deveriam basear-se na melhor ciência disponível.

Arranjo vertical - RENATA LO PRETE

FOLHA DE SP - 18/01/12


FÁBIO ZAMBELI (interino)


Ainda que não resulte em aliança formal, a aproximação de Gilberto Kassab com Lula começa a empurrar à coalizão de Fernando Haddad partidos que gravitam no entorno do prefeito paulistano e compõem a base de apoio a Dilma Rousseff. Até então reticentes a acordo com o pré-candidato petista em São Paulo ainda no primeiro turno, PR, PC do B e PSB reabriram as tratativas com a pré-campanha haddadista.

Nos bastidores, dirigentes das siglas sustentam que a montagem de possível bloco PSD-PT, precipitada pela oferta de um vice kassabista, aniquilaria argumentos locais para voo solo ou alinhamento aos tucanos.

Deixa comigo Haddad, que já se reuniu com a direção do PC do B, tem encontro agendado com o presidente do PR paulistano, Antonio Carlos Rodrigues, e pretende ouvir Eliseu Gabriel, do PSB.

Digestivo O conselho político petista adiou para dia 28 a primeira reunião do ano, inicialmente prevista para sábado. Até lá, vereadores do partido, na oposição a Kassab desde 2006, terão mais tempo para assimilar eventual pacto com o prefeito.

A tiracolo Dilma levará o ministro da Educação hoje à inauguração de creche em Angra dos Reis (RJ). O PMDB reclama que o prefeito, Tuca Jordão, foi avisado da visita com 48 horas de antecedência. Como está em licença, o peemedebista, que injetou mais recursos na obra que o governo federal, não comparecerá à solenidade.

Comercial Constrangidos com o avanço das negociações de Gabriel Chalita (PMDB) com aliados de Geraldo Alckmin, tucanos querem que o governador faça defesa pública, se possível na TV, das prévias do PSDB para a prefeitura da capital.

Prorrogação José Serra orientou seus interlocutores a rechaçarem com veemência a hipótese de candidatura a prefeito. Mas a proposta de segundo turno na consulta interna tucana, advogada por Bruno Covas, daria mais tempo ao ex-governador.

Preliminar A Câmara paulistana fará, em fevereiro, ciclo de debates temáticos entre os postulantes à prefeitura. Um deles deve tratar das intervenções públicas na região da cracolândia.

Horizonte Dilma pediu à Casa Civil que transmitisse aos ministros recado claro sobre as reuniões setoriais que começam amanhã: "Não quero ninguém falando sobre o que fez. Isso eu já sei. Quero que mostrem o que pretendem fazer daqui para frente".

Chamada oral Em ofício, Gleisi Hoffmann avisou colegas de Esplanada de que o plano de metas de cada pasta deverá detalhar os mecanismos de acompanhamento de resultados. A exigência afligiu ministros, que sabem do risco de reprimenda pública da presidente.

Camarote Informado ontem sobre o calendário de mudanças no primeiro escalão, o vice Michel Temer (PMDB) recebeu convite para participar das reuniões ministeriais que prosseguem até segunda-feira.

QI Caso se confirme o retorno de Márcio Fortes para o Ministério das Cidades, aumenta a chance de Aldo Rebelo (Esporte) emplacar nome de sua confiança na Autoridade Pública Olímpica.

Escolta verde O Planalto autorizou ontem a atuação das Forças Armadas na segurança da conferência Rio+20.

Visita à Folha Alexandre Schneider, secretário paulistano de Educação, visitou ontem a Folha.

com LETÍCIA SANDER e DANIELA LIMA

tiroteio

"A cracolândia nasceu e cresceu sob as asas da política de segurança pública do governo do PSDB. Os tucanos se omitiram por 17 anos e agora culpam o PT de forma oportunista."
DO DEPUTADO CARLOS ZARATTINI (PT-SP), sobre os pré-candidatos tucanos à prefeitura paulistana atribuírem a responsabilidade pela expansão do consumo de crack no centro de SP à gestão de Marta Suplicy (2001-04).

Contraponto

Pugilato familiar

Durante a sessão em que Fernando Bezerra (Integração Nacional) foi ouvido no Congresso Nacional, quinta-feira passada, oposicionistas questionavam as indicações de familiares do ministro para o governo. Um dos casos apontados foi o do ex-deputado Osvaldo Coelho (DEM), tio de Bezerra e hoje seu rival em Pernambuco. O senador Renan Calheiros (PMDB-AL), à mesa, disse:
-Seria nepotismo cruzado?
O deputado Eduardo Gomes (PSDB-TO) interveio:
-Aí estaria mais para nepotismo cruzado de direita!