O GLOBO - 27/05
O estilo de executar um programa econômico guiado por atos de vontade política foi adotado pelo lulopetismo na estatal, com resultados também ruinosos
Passado pouco mais de um ano da deflagração pela Polícia Federal da Operação Lava-Jato, o fio da meda que levou ao petrolão, já houve desdobramentos antes inimagináveis. Mais um tesoureiro do PT, João Vaccari Neto, foi parar na prisão — sina iniciada por Delúbio Soares no mensalão —, e o partido terminou atingido de forma direta; legendas aliadas (PMDB, PP) estão na linha de fogo, com os presidentes da Câmara e do Senado, os peemedebistas Eduardo Cunha e Renan Calheiros, sob escrutínio do Ministério Público; e grandes empreiteiras foram tragadas pelo escândalo, com executivos e acionistas também presos.
Em outro plano, transcorre a crise da Petrobras, cujos números, à medida que aparecem, traçam os contornos de uma catástrofe empresarial espantosa, porque foi construída com método. Um caso para estudos, a desmontagem da Petrobras pelo esquema lulopetista durante 12 anos é surpreendente, pelos ruinosos números que gerou.
Apenas de janeiro de 2010 a dezembro último, o valor da companhia, calculado pela cotação das ações em bolsa, convertido para o dólar, caiu 73%, mesmo com as promissoras reservas do pré-sal. A derrocada se explica pela administração temerária da empresa, em toda a gestão do petista militante José Sérgio Gabrielli, com destaque para os investimentos mal feitos. A companhia padece de um elevado endividamento — mais de R$ 300 bilhões —, construído em cima de inversões mal formuladas. Hoje é evidente que o mesmo estilo voluntarista da política econômica “desenvolvimentista”, executada a partir do final do segundo governo Lula, foi aplicado na Petrobras com resultados desastrosos idênticos.
Ainda presidente, Lula determinava a construção de refinarias sem estudos de viabilidade, e assim era feito. Abreu e Lima (PE), a que teve o custo inicial multiplicado por dez, saiu de um acerto pessoal entre Lula e o caudilho venezuelano Hugo Chávez. Não poderia dar certo. Duas outras unidades (Ceará e Maranhão), ao menos a Petrobras conseguiria tirar de seus planos, mas tendo gastado centenas de milhões em terraplenagem.
O lulopetismo viu no pré-sal a base de um projeto de capitalismo de Estado, num modelo semelhante ao tentado na ditadura militar por Geisel. Este é um sistema que se nutre do autoritarismo e o reproduz. Vieram daí o aumento da exigência do “conteúdo nacional" nos investimentos no pré-sal, a mudança do modelo de exploração etc. Também não dará certo. Mas ajudou a virtualmente quebrar a maior empresa do país.
A corrupção se aproveitou da falta de controles de um “método de gestão" que dispensava parâmetros técnicos nas decisões, para privilegiar a vontade de líderes partidários. Aplainou-se o terreno para se repetir na Petrobras, numa escala muito maior, o mensalão, também com o desvio de dinheiro público de uma estatal para o projeto de poder lulopetista. Trágico para a Petrobras e o país, mas foi simples assim.
quarta-feira, maio 27, 2015
Visão de Levy - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 27/05
Levy diz que ajuste é para "limpar o convés" e que viagem será longa. "O Brasil precisa passar por uma reengenharia para ser competitivo", diz o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, querendo dizer com isso que serão necessárias mudanças mais profundas e permanentes na economia para superar o atual momento. Ele está otimista com a possibilidade de aprovação das medidas de ajuste fiscal, mas diz que este é o começo de uma longa caminhada.
A MP 665, que altera o acesso ao primeiro pedido de seguro-desemprego, e a MP 664, que acaba com a pensão vitalícia para cônjuges jovens, reduzem gastos, mesmo com as alterações propostas pelo Congresso, e Levy tinha ontem a esperança de que seriam aprovadas no Senado. E foram. Mesmo assim, acha que a economia brasileira precisará passar por várias transformações para se tornar mais competitiva.
-É o fim de um ciclo. O Brasil passou com facilidade pelos primeiros anos da crise internacional porque a liquidez dos países desenvolvidos e os investimentos da China elevaram o preço das commodities, mas agora acabou esse ciclo - diz Levy.
Levy disse que as medidas são importantes para "limpar o convés e começar a navegação", mas alerta que a viagem será longa. Considera necessário fazer mudanças estruturais, criar condições para o investimento privado, diminuir a dualidade do crédito, abrir a possibilidade de que surjam mecanismos para financiamento privado. Do contrário, o Brasil não crescerá.
Quando Levy diz "acabou o dinheiro", está falando não apenas das conhecidas restrições orçamentárias. Explica que o país vive o esgotamento do financiamento a juros subsidiados garantidos pelo Estado e dos recursos de fundos constitucionais. Acha que será importante haver uma onda de novas concessões, mas antes será preciso criar condições regulatórias para atrair o capital privado.
O ministro da Fazenda explica que há uma relação direta entre enfrentar o déficit público e aumentar o investimento privado no país: - O maior risco é o fiscal. Ninguém arrisca o seu se não houver estabilidade. E, quando eu digo que é preciso ajuste fiscal, não estou preocupado apenas com o tamanho do corte, mas sim com a dimensão do gasto. Se as despesas continuarem subindo, e as receitas ficarem paradas, nós teremos um desequilíbrio fiscal crônico. Um país assim não cresce. O país será esmagado pelo gasto.
Levy esteve, nos últimos dias, no centro da polêmica da sua ausência na entrevista que anunciou o contingenciamento. Não adianta perguntar, nem insistir, sobre o motivo que o levou a não comparecer. Ele tenta minimizar o assunto e afirma que o protagonismo no anúncio de contingenciamento sempre foi do ministro do Planejamento: - A economia brasileira tem vários problemas, certamente a minha gripe não é um deles - diz o ministro com uma voz ainda fanhosa, interrompida por acessos de tosse.
Não foi a gripe que o impediu de ir, tanto que ele estava trabalhando, na sexta-feira, na Fazenda, a poucos metros do Planejamento. Mas, sim, ele permanece visivelmente gripado. As secretárias, preocupadas, durante a conversa levaram mel e chá para o ministro tomar. A sala de reunião ao lado do gabinete nunca esteve tão quente quanto ontem.
No balanço do ministro, muitas correções foram feitas desde que começou o governo. A primeira e mais importante foi nos preços de energia. A segunda foram as medidas do ajuste que estão no Congresso. Ele defende a alteração na política das desonerações, lembrando que não se está acabando com elas, mas apenas reduzindo sua dimensão. Lembra ainda que o desequilíbrio previdenciário não permite uma queda da receita que a sustenta. Levy se diz preocupado também com a inclusão da medida que muda a fórmula de aposentadoria, principalmente porque não está claro como funcionará a proposta que se pensa pôr no lugar. Isso, na hipótese de a mudança ser mesmo aprovada.
O ministro admite que há muitas dificuldades na conjuntura, mas acha que temos grandes chances de retomar o crescimento de forma sustentada:
- Este é um grande país que tem tudo para dar certo: tamanho, riqueza, população na medida exata. Mas precisamos entender que é necessário fazer muitas mudanças na economia para garantir o crescimento futuro.
Levy diz que ajuste é para "limpar o convés" e que viagem será longa. "O Brasil precisa passar por uma reengenharia para ser competitivo", diz o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, querendo dizer com isso que serão necessárias mudanças mais profundas e permanentes na economia para superar o atual momento. Ele está otimista com a possibilidade de aprovação das medidas de ajuste fiscal, mas diz que este é o começo de uma longa caminhada.
A MP 665, que altera o acesso ao primeiro pedido de seguro-desemprego, e a MP 664, que acaba com a pensão vitalícia para cônjuges jovens, reduzem gastos, mesmo com as alterações propostas pelo Congresso, e Levy tinha ontem a esperança de que seriam aprovadas no Senado. E foram. Mesmo assim, acha que a economia brasileira precisará passar por várias transformações para se tornar mais competitiva.
-É o fim de um ciclo. O Brasil passou com facilidade pelos primeiros anos da crise internacional porque a liquidez dos países desenvolvidos e os investimentos da China elevaram o preço das commodities, mas agora acabou esse ciclo - diz Levy.
Levy disse que as medidas são importantes para "limpar o convés e começar a navegação", mas alerta que a viagem será longa. Considera necessário fazer mudanças estruturais, criar condições para o investimento privado, diminuir a dualidade do crédito, abrir a possibilidade de que surjam mecanismos para financiamento privado. Do contrário, o Brasil não crescerá.
Quando Levy diz "acabou o dinheiro", está falando não apenas das conhecidas restrições orçamentárias. Explica que o país vive o esgotamento do financiamento a juros subsidiados garantidos pelo Estado e dos recursos de fundos constitucionais. Acha que será importante haver uma onda de novas concessões, mas antes será preciso criar condições regulatórias para atrair o capital privado.
O ministro da Fazenda explica que há uma relação direta entre enfrentar o déficit público e aumentar o investimento privado no país: - O maior risco é o fiscal. Ninguém arrisca o seu se não houver estabilidade. E, quando eu digo que é preciso ajuste fiscal, não estou preocupado apenas com o tamanho do corte, mas sim com a dimensão do gasto. Se as despesas continuarem subindo, e as receitas ficarem paradas, nós teremos um desequilíbrio fiscal crônico. Um país assim não cresce. O país será esmagado pelo gasto.
Levy esteve, nos últimos dias, no centro da polêmica da sua ausência na entrevista que anunciou o contingenciamento. Não adianta perguntar, nem insistir, sobre o motivo que o levou a não comparecer. Ele tenta minimizar o assunto e afirma que o protagonismo no anúncio de contingenciamento sempre foi do ministro do Planejamento: - A economia brasileira tem vários problemas, certamente a minha gripe não é um deles - diz o ministro com uma voz ainda fanhosa, interrompida por acessos de tosse.
Não foi a gripe que o impediu de ir, tanto que ele estava trabalhando, na sexta-feira, na Fazenda, a poucos metros do Planejamento. Mas, sim, ele permanece visivelmente gripado. As secretárias, preocupadas, durante a conversa levaram mel e chá para o ministro tomar. A sala de reunião ao lado do gabinete nunca esteve tão quente quanto ontem.
No balanço do ministro, muitas correções foram feitas desde que começou o governo. A primeira e mais importante foi nos preços de energia. A segunda foram as medidas do ajuste que estão no Congresso. Ele defende a alteração na política das desonerações, lembrando que não se está acabando com elas, mas apenas reduzindo sua dimensão. Lembra ainda que o desequilíbrio previdenciário não permite uma queda da receita que a sustenta. Levy se diz preocupado também com a inclusão da medida que muda a fórmula de aposentadoria, principalmente porque não está claro como funcionará a proposta que se pensa pôr no lugar. Isso, na hipótese de a mudança ser mesmo aprovada.
O ministro admite que há muitas dificuldades na conjuntura, mas acha que temos grandes chances de retomar o crescimento de forma sustentada:
- Este é um grande país que tem tudo para dar certo: tamanho, riqueza, população na medida exata. Mas precisamos entender que é necessário fazer muitas mudanças na economia para garantir o crescimento futuro.
O juiz Sérgio Moro joga xadrez - ELIO GASPARI
O GLOBO - 27/05
No 17º lance, Bobby Fischer entregou a rainha e, como tinha 13 anos, pensaram até que ele não sabia jogar
Há alguns meses o juiz Sérgio Moro perdeu uma parada feia. O caso das propinas pagas na Petrobras pelos holandeses da SBM saiu de sua jurisdição e, pelo que se teme, foi dormir. A SBM é a maior operadora de unidades flutuantes de petróleo do mundo. No ano passado, pagou uma multa de US$ 240 milhões de dólares por propinas que distribuiu mundo afora. No Brasil, despejou US$ 139 milhões de “comissões legítimas”. Moro e a força-tarefa do Ministério Público não disseram uma palavra. Pareciam Bobby Fischer entregando a rainha na partida de xadrez que mais tarde veio a ser chamada de “o jogo do século”.
Nas petrorroubalheiras das sondas e unidades flutuantes estão imersos contratos de US$ 25,5 bilhões. Desde que começou a Lava-Jato, esse braço das operações vem sendo protegido por um manto de empulhações. Em Curitiba, o jogo foi outro. Entre os empreiteiros presos em novembro estava Gerson Almada, vice-presidente da Engevix, dona de um lote de contratos para a construção de sondas. Na sexta-feira, Moro prendeu preventivamente Milton Pascowitch, o Cupido das boas relações do PT com a Engevix. Almada reconhecera que pagava comissões a Pascowitch. Entre 2004 e 2014, foram R$ 80 milhões. Segundo Pedro Barusco, Pascowitch era um dos 11 operadores que molhavam suas mãos e as de Renato Duque, ex-diretor de engenharia e serviços da Petrobras. Se há uma grande conexão entre as petrorroubalheiras e o PT, ela passa também por aí. Um dos clientes da empresa de consultoria do comissário José Dirceu era o doutor Pascowitch.
Quando Bobby Fischer entregou a rainha, sabia o que estava fazendo. Ao fim do jogo, a rainha do adversário ficou sem ter o que fazer e o garoto ganhou a partida. Moro sabe que dois bancos japoneses já jogaram a toalha em relação a seus créditos com estaleiros nacionais. Um terceiro ameaça vir com a faca nos dentes, querendo saber se o seu dinheiro foi usado para pagar propinas. Almada já contou alguma coisa. Duque e Pascowitch estão em copas, mas há razões para se supor que Moro esteja mais um lance à frente, com um novo canário interessado em cantar para o Ministério Público. Em fevereiro o juiz Moro negara um pedido de preventiva contra Pascowitch, agora deferiu-o. Mais: o Ministério Publico está puxando o fio da meada das relações financeiras de empreiteiros com alguns escritórios de advocacia.
Até agora a iluminação da Lava-Jato favoreceu casos como os das refinarias onde rolavam licitações fraudadas, aditivos e superfaturamentos. A mãe de um empreiteiro sempre poderá sustentar que o trabalho de seu filho resultou em obras visíveis, reais. No caso de algumas unidades flutuantes, o buraco é mais em cima, pois há equipamentos alugados, prontos. O dinheiro vai de uma caixa para outra sem empregar viv’alma.
Os investigadores de Curitiba começaram a mostrar o que sabem a respeito dos contratos do pré-sal. Logo depois de sua posse na presidência da Petrobras, o comissário Aldemir Bendine lembrou que num novo plano de investimentos “talvez você pegue a SBM, que é uma importante fornecedora”. Tão importante que foi proibida de fazer negócios com a empresa e, mesmo negociando um acordo de leniência, ainda não chegou a um acordo com a Controladoria-Geral da União.
No 17º lance, Bobby Fischer entregou a rainha e, como tinha 13 anos, pensaram até que ele não sabia jogar
Há alguns meses o juiz Sérgio Moro perdeu uma parada feia. O caso das propinas pagas na Petrobras pelos holandeses da SBM saiu de sua jurisdição e, pelo que se teme, foi dormir. A SBM é a maior operadora de unidades flutuantes de petróleo do mundo. No ano passado, pagou uma multa de US$ 240 milhões de dólares por propinas que distribuiu mundo afora. No Brasil, despejou US$ 139 milhões de “comissões legítimas”. Moro e a força-tarefa do Ministério Público não disseram uma palavra. Pareciam Bobby Fischer entregando a rainha na partida de xadrez que mais tarde veio a ser chamada de “o jogo do século”.
Nas petrorroubalheiras das sondas e unidades flutuantes estão imersos contratos de US$ 25,5 bilhões. Desde que começou a Lava-Jato, esse braço das operações vem sendo protegido por um manto de empulhações. Em Curitiba, o jogo foi outro. Entre os empreiteiros presos em novembro estava Gerson Almada, vice-presidente da Engevix, dona de um lote de contratos para a construção de sondas. Na sexta-feira, Moro prendeu preventivamente Milton Pascowitch, o Cupido das boas relações do PT com a Engevix. Almada reconhecera que pagava comissões a Pascowitch. Entre 2004 e 2014, foram R$ 80 milhões. Segundo Pedro Barusco, Pascowitch era um dos 11 operadores que molhavam suas mãos e as de Renato Duque, ex-diretor de engenharia e serviços da Petrobras. Se há uma grande conexão entre as petrorroubalheiras e o PT, ela passa também por aí. Um dos clientes da empresa de consultoria do comissário José Dirceu era o doutor Pascowitch.
Quando Bobby Fischer entregou a rainha, sabia o que estava fazendo. Ao fim do jogo, a rainha do adversário ficou sem ter o que fazer e o garoto ganhou a partida. Moro sabe que dois bancos japoneses já jogaram a toalha em relação a seus créditos com estaleiros nacionais. Um terceiro ameaça vir com a faca nos dentes, querendo saber se o seu dinheiro foi usado para pagar propinas. Almada já contou alguma coisa. Duque e Pascowitch estão em copas, mas há razões para se supor que Moro esteja mais um lance à frente, com um novo canário interessado em cantar para o Ministério Público. Em fevereiro o juiz Moro negara um pedido de preventiva contra Pascowitch, agora deferiu-o. Mais: o Ministério Publico está puxando o fio da meada das relações financeiras de empreiteiros com alguns escritórios de advocacia.
Até agora a iluminação da Lava-Jato favoreceu casos como os das refinarias onde rolavam licitações fraudadas, aditivos e superfaturamentos. A mãe de um empreiteiro sempre poderá sustentar que o trabalho de seu filho resultou em obras visíveis, reais. No caso de algumas unidades flutuantes, o buraco é mais em cima, pois há equipamentos alugados, prontos. O dinheiro vai de uma caixa para outra sem empregar viv’alma.
Os investigadores de Curitiba começaram a mostrar o que sabem a respeito dos contratos do pré-sal. Logo depois de sua posse na presidência da Petrobras, o comissário Aldemir Bendine lembrou que num novo plano de investimentos “talvez você pegue a SBM, que é uma importante fornecedora”. Tão importante que foi proibida de fazer negócios com a empresa e, mesmo negociando um acordo de leniência, ainda não chegou a um acordo com a Controladoria-Geral da União.
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