quinta-feira, setembro 11, 2014

Desfaçatez ilimitada - DORA KRAMER

O ESTADÃO 11/09


Reza a história política dos últimos 12 anos que Luiz Inácio da Silva é o mais competente dos personagens que habitaram e transitaram pelo cenário do poder nesse período. Trata-se de uma avaliação que leva em conta resultados como parâmetro. Se nessa régua forem colocados quesitos relativos a limites éticos Lula ocuparia o pódio na categoria dos políticos ardilosos. São qualidades diferentes e, portanto, implicam condições competitivas distintas.

O habilidoso dotado de princípios sempre estará em desvantagem diante do esperto cujos objetivos não conhecem regras nem observam valores. São aqueles que se pautam pelo dístico segundo o qual os fins justificam os meios. Atuam à margem, atropelam e em geral chegam na frente. Transposto para o ambiente eleitoral, o conceito de “fim” é a vitória não importa quais sejam os métodos. Vale tudo. A mentira, a manipulação, a traição, a destruição de reputações à qual agora se chama pelo sofisma de “desconstrução de imagem”.

Nesse quesito o PT não tem limite. Já mostrou isso em diversas ocasiões. Na maioria, senão da totalidade delas, foi bem-sucedido do ponto de vista que interessa ao partido: o resultado imediato. Mostra-se surpreso agora com o tamanho do desgaste acumulado. Mas chega uma hora que as pessoas cansam de tanta insolência, menosprezo a regras e valores.

Decorre também daí – da economia e dos fracassos do governo – o cenário de dificuldade eleitoral para os petistas. Na economia e na administração promete “mudar mais”. Já no terreno da derrubada dos obstáculos ao alcance do objetivo principal aplica os métodos de sempre.

Desta vez com um grau de desfaçatez e falta de compromisso com a verossimilhança que dá a medida do medo que assola a tropa de vir a ser desalojada do aparelho de Estado.

A alternância de poder não lhes parece algo palatável. Só isso explica o nível da ofensiva contra a candidata do PSB, Marina Silva, desde que seu nome se firmou nas pesquisas como ameaça mais que real à reeleição de Dilma Rousseff.

O ataque começou em campo legítimo, na exploração das contradições do discurso e das posições defendidas por Marina Silva. Enveredou por comparações esdrúxulas, aludindo a dificuldades que ela poderia enfrentar por falta de apoio no Congresso e daí ter o mandato interrompido como Jânio Quadros e Fernando Collor. Uma distorção, mas só um pouco ridículo.

Em seguida entrou no campo das invencionices dizendo que a adversária venderia a Petrobras, acabaria com o Banco do Brasil, suspenderia benefícios sociais e por aí afora. Nesta semana a coisa se agravou e chegou ao ponto da afronta pessoal. A uma bobagem de Marina sobre “bolsa banqueiro”, a presidente Dilma respondeu com uma ofensa: “Eu não tenho banqueiro me sustentando”. Em que sentido, quis dizer a presidente?

Deixou o entendimento de maneira desrespeitosa ao juízo do freguês. O ex-presidente Lula, o capitão do contra-ataque, divulgara que respeita Marina e por isso não bateria nela. Ardiloso, assiste em silêncio à pancadaria para a remoção do obstáculo.

Jogo de cena. A CPI marcou o depoimento de Paulo Roberto Costa para semana que vem, mas depende de autorização do juiz Sérgio Moro, que até agora não mostrou a menor disposição de deixar o ex-diretor da Petrobras pôr os pés fora da cadeia antes de entregar nomes e provas sobre o esquema de superfaturamento de contratos e distribuição de propinas dentro da empresa.

Também são solicitados os depoimentos da delação premiada que a Polícia Federal já negou e o procurador-geral da República reiterou que continuam por enquanto sob sigilo. Quando teve oportunidade o Congresso não fez a sua parte. Agora dá a impressão de que simula providências.


Trampolins para Dilma - ELIANE CANTANHÊDE

FOLHA DE SP - 11/09


BRASÍLIA - Marina Silva empurrou Aécio Neves para o terceiro lugar, fora do segundo turno, e Aécio faz tudo para derrubar Marina. Na prática, os dois armam um trampolim para a reeleição de Dilma Rousseff e a eternização do aparelhamento do Estado pelo PT. A oposição, desunida, certamente será vencida.

Marina, claro, não tinha alternativa depois da morte de Eduardo Campos. Era concorrer ou concorrer. Arrastou os quase 20% de votos de 2010, agregou a comoção nacional com o acidente e se beneficiou da forte rejeição tanto ao PT quanto a Dilma. Mas, ao entrar, pode ter apenas garantido a vitória de Dilma.

Aécio também ficou sem alternativa diante da novidade. Era bater ou bater em Marina. Com isso, ele tenta conter a sangria e dar ao PSDB um mínimo de capacidade de negociação no segundo turno, sem ter de aderir de graça a Marina. Mas o efeito favorece diretamente Dilma.

A questão de Aécio também é de calibragem --o quanto bater para garantir um patamar minimamente seguro de votos sem inviabilizar um acordo do PSDB com o PSB no segundo turno e num eventual governo Marina. A derrota já no primeiro turno será arrasadora para o PSDB, mas o partido tem quadros reconhecidos e eles podem se tornar indispensáveis para Marina governar.

Marina parou de crescer, mas mantém boas condições de ganhar. A situação de Aécio é que continua não sendo nada animadora. Ele está numa posição que candidato nenhum deseja: já que vai perder, tentar perder o mais honrosamente possível.

Do outro lado, a campanha de Dilma usa seu imenso tempo de TV para massificar mentiras e mistificações. Os bancos nunca lucraram tanto quanto com Lula e Dilma. Acusar Marina de aliada de banqueiros por causa da educadora Neca Setúbal é indigno. Tanto como compará-la a Jânio e Collor. Depois de anos desconstruindo o legado tucano, o PT tenta destruir a imagem de Marina, ex-companheira de tantos anos.

O petróleo é deles - DEMÉTRIO MAGNOLI

O GLOBO - 11/09


“O Ildo não é do governo, ele é um petroleiro”, teria dito Dilma Rousseff, segundo o próprio Ildo. A frase, real ou imaginária, lança luz tanto sobre a captura da Petrobras pelos interesses de financiamento partidário quanto sobre a narrativa nacionalista que recobre as empresas estatais. Ildo Sauer enxerga nas estatais a salvação do Brasil. O governo enxerga nas estatais uma poderosa ferramenta de um projeto partidário de poder – e, com razão, sorri com desdém da ingenuidade do “petroleiro” que acreditou nas suas proclamações retóricas. O capitalismo de Estado é um negócio, muito mais que uma doutrina.

Sauer é um comunista da vertente nacionalista, o tipo que interpreta a teoria do imperialismo de Lenin sob um viés terceiro-mundista e ainda elogia o suposto sucesso econômico da antiga União Soviética. O professor da USP ajudou a elaborar o programa de Lula para o setor elétrico e ocupou a diretoria de Gás e Energia da Petrobras entre 2003 e 2007, de onde saiu atirando obuses contra a retomada dos leilões de petróleo. Ele qualificou a concessão de campos na franja do pré-sal à OGX como “o ato mais entreguista da história brasileira”, acreditou que a empresa de Eike Batista produziria 1,4 milhão de barris/dia e, junto com a Federação Única dos Petroleiros (FUP), denunciou o leilão de Libra como mais uma traição à pátria. Hoje, seus bens estão bloqueados por um TCU engajado na seleção de bodes expiatórios.

Dias atrás, o PT decidiu acusar Marina Silva de “antinacionalista”, difundindo a mentira de que ela pretende privatizar a Petrobras. A FUP, sob controle petista, entrou na campanha de Dilma, encarregando-se de organizar atos “em defesa do pré-sal” com o objetivo de conferir substância ao discurso anti-Marina. Os sindicalistas são realistas: sabem que devem ajustar a chama de seu “nacionalismo” segundo o ritmo dos ciclos eleitorais. Sauer, um Quixote do estatismo, acredita de fato nas assombrações que invoca. O “petroleiro” nunca entendeu a lógica do lulopetismo nem o significado político da retórica nacionalista.

Os habitantes da antiga União Soviética não estavam de acordo com Sauer sobre o desempenho econômico do “socialismo real”. O fracasso histórico do sistema soviético provocou a implosão do “império vermelho” – e, junto com ela, a falência ideológica do estatismo tout court, ainda hoje pregado por Sauer. No mundo que emergiu depois de 1991, a alternativa realista à economia de mercado é o capitalismo de Estado. Contudo, nesse modelo, como entendeu perfeitamente o lulopetismo, as empresas estatais funcionam como nexos entre o poder político e as grandes empresas transnacionais ou nacionais. Lula e Dilma sujaram as mãos de petróleo celebrando a súbita (e, viu-se, efêmera) conversão de Eike Batista num magnata genuinamente nacional. Os atos “entreguistas” que escandalizam Sauer inscrevem-se na normalidade do capitalismo de Estado. O “petroleiro” é um sonhador – mesmo se seu sonho não passa de uma reprodução do pesadelo soviético do passado.

No universo mental de Sauer, o perigo mora no investimento privado. Sua acusação básica incide sobre os leilões de campos de petróleo. “Fernando Henrique fez quatro, Lula fez cinco. Lula entregou mais áreas e mais campos para a iniciativa privada do petróleo do que Fernando Henrique”, explicou numa longa entrevista à Revista Adusp, em 2011. Entretanto, à frente de uma diretoria da Petrobras, o inflexível estatista descobriu que outros interesses privados participavam do grande jogo do petróleo. Numa entrevista concedida há uma semana a O Estado de S.Paulo, Sauer oferece testemunho da nomeação de “despachantes de interesses” na estatal: “O governo de coalizão do presidente Lula passou a permitir que grupos de parlamentares e partidos se reunissem para indicar dirigentes”. Obviamente, ele não diz que nisso reside uma das diferenças cruciais entre a Petrobras do governo Fernando Henrique e a do governo Lula.

A FUP não se importa com a captura partidária da estatal, preferindo concentrar-se em promover uma pobre contrafação eleitoral do discurso estatista de Sauer. Mas o “petroleiro”, emparedado num sonho carente de suporte político e abandonado pelo partido que escolheu, já não pode mais virar as costas à realidade. Na entrevista recente, ele aponta na direção certa, rejeitando a lenda de que os “despachantes de interesses” operavam à margem do Planalto. “Lula se queixou a um deputado que eu não ajudava muito e que ele estava muito impressionado com a ajuda de Paulo Roberto, que ajudava muito”, contou Sauer, referindo-se ao episódio de sua demissão. No capitalismo de Estado, as estatais têm dono.

Paulo Roberto Costa começou a “ajudar” em 2004, quando Lula o catapultou à Diretoria de Abastecimento da Petrobras, e continuou “ajudando” até 2012, segundo ano do governo Dilma. Sauer acompanhou, à distância, a montagem da operação que resultaria nos escândalos das refinarias de Pasadena e Abreu e Lima. “Não me envolvia com isso porque achava que não era pertinente”, justifica-se tardiamente o “petroleiro”, que consumiu 20 páginas da Revista Adusp para bombardear o “neoliberalismo” sem nunca mencionar a privatização partidária da estatal. Nitidamente, o seu novo foco reflete o impacto pessoal das decisões do TCU, que incriminam os peixes pequenos e os inocentes, resguardando Dilma e Graça Foster, as principais vozes oficiais de comando.

“Um Estado dentro do Estado” – a célebre definição da Petrobras, utilizada pelo próprio Lula, sintetiza o dilema de governança das estatais. A única alternativa à captura política do “Estado paralelo” pelo governo de turno é inscrever a Petrobras no sistema de contrapesos da economia de mercado, intensificando a concorrência no setor da exploração de petróleo e expondo-a à competição internacional. Sauer, o inimigo jurado do mercado, jamais entenderá isso.

Disputa acirrada - MERVAL PEREIRA

O GLOBO - 11/09

Após ataques, candidatura de Marina mostra consistência. Depois de passar os últimos dias sob bombardeio permanente não apenas da presidente Dilma, mas também do candidato do PSDB Aécio Neves, a candidata do PSB Marina Silva mostrou a consistência de sua candidatura. Ao manter estabilizada sua situação na disputa, mesmo com um viés de alta para a presidente, Marina demonstra que continua sendo a opção dos que pretendem tirar o PT do governo.
Já a presidente Dilma deve intensificar a agressividade de sua propaganda, que tem demonstrado capacidade de pelo menos frear a subida de Marina, obrigando-a a um esforço redobrado para se manter competitiva até a chegada do segundo turno.

A má notícia para a presidente Dilma é que os desdobramentos do escândalo da Petrobras prometem marcar esses últimos dias da campanha, cujas contradições internas no PT podem abrir espaço para a recuperação de Marina.

Até mesmo a questão da independência do Banco Central, que tem dado motivos de críticas acirradas do governo, fica fragilizada com as notícias de que o próprio ex-presidente Lula está trabalhando para que o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles seja anunciado como o responsável pela política econômica do governo Dilma em caso de reeleição.

Meirelles é o exemplo típico do banqueiro internacional que o PT trouxe para o governo Lula, tirando-o do PSDB, partido pelo qual havia sido eleito deputado federal, para dar credibilidade à política econômica petista. Como acusar a adversária Marina de querer dar poder a banqueiros quando um ex-presidente do Bank Boston é a figura central da mudança econômica que ela pretenderia anunciar para tranquilizar os investidores? E como ser contrário à autonomia do Banco Central se Meirelles foi intocável durante os dois governos Lula, gozando de uma autonomia que irritava os setores mais radicais do petismo?

O candidato do PSDB, Aécio Neves, por mais que se mostre preparado para o cargo e tenha projetos de longo prazo para o país que fazem sentido e, mais que isso, são necessários, perdeu a capacidade de encarnar a indignação da maioria dos eleitores, que encontraram em Marina Silva essa representante.

Aécio tem sido instado por seus aliados a arrefecer os ataques a Marina, para permitir a organização de uma aliança para o segundo turno. A declaração de ontem, depois da sabatina do GLOBO, de que se não ganhar a eleição o PSDB irá para a oposição, certamente não é consensual no partido e nem entre seus aliados da oposição.

Ele tem razões para estar amargurado, pois a entrada em cena de Marina colocou emoção na disputa, o que retirou do primeiro plano a análise da real capacidade de governar dos que estão na disputa. O candidato do PSDB contava com a máquina partidária para se impor ao adversário Eduardo Campos, mas a entrada de Marina misturou as pedras no tabuleiro político, deslocando Aécio para a terceira colocação mesmo nos estados em que o PSDB ou seus aliados estão vencendo as eleições para os governos estaduais.

Em São Paulo, Marina está em primeiro lugar, embora o governador Geraldo Alckmin tenha condições de vencer no primeiro turno. A composição com o PSB local, que deu o vice na chapa de Alckmin, está se mostrando mais eficaz para Marina do que a máquina partidária do PSDB favorável a Aécio.

O caso mais emblemático é o de Minas, em que o PSDB perde no momento o governo estadual e Aécio disputa o terceiro lugar com Marina Silva. Ele está certo de que manterá seu território político intacto, mas terá que gastar mais energia do que imaginava, enquanto no resto do país a polarização entre a presidente Dilma e a candidata Marina Silva se impõe.

Um homem de sorte - BERNARDO MELLO FRANCO

FOLHA DE SP - 11/09


SÃO PAULO - Lobão nada explica. A manchete poderia ser publicada hoje, mas saiu no "Jornal do Brasil" em 9 de janeiro de 1994. Edison Lobão, governador do Maranhão pelo PFL, era suspeito de participar da máfia dos anões do orçamento. O delator do esquema contou que ele frequentava a casa de João Alves, que se dizia um homem de sorte e atribuía sua fortuna a vitórias seguidas na loteria. A CPI perguntou o que Lobão tinha a dizer sobre as acusações. Ele tentou ser rude, mas foi sincero: "Não há o que explicar".

Duas décadas se passaram. João Alves morreu, o PFL morreu, o "JB" morreu, mas Lobão continua. Aos 77 anos, é ministro de Minas e Energia do governo Dilma Rousseff, indicado pelo ex-presidente José Sarney. Demonstra pouco conhecimento da área, apesar de estar no cargo desde 2008. Em maio, disse que "com a graça de Deus" não haveria racionamento. Nem o ateu mais militante ousaria misturar o nome dEle com a gestão do maranhense.

Na semana passada, um novo delator, Paulo Roberto Costa, começou a entregar os beneficiários do esquema que saqueava os cofres da Petrobras. Além dos suspeitos de sempre do Congresso, citou um único ministro como destinatário de propina. Ganha uma passagem de ida para São Luís, com conexão de ônibus até o município de Governador Edison Lobão, quem adivinhar quem é.

Mais uma vez, Lobão nada explica. A lista dos delatados veio à tona no sábado, em reportagem da revista "Veja". No domingo, o ministro faltou ao desfile do Sete de Setembro. Na segunda-feira, saiu de férias. Questionada por repórteres, a presidente se saiu com a seguinte resposta: "Ele não sabe nem do que está sendo acusado, a revista não diz. Vocês sabem?".

No início do mandato, Dilma afastava ministros suspeitos de corrupção. Neste final melancólico, recorre a ironias de gosto duvidoso para protegê-los. Lobão não ganhou na loteria como João Alves, mas também pode ser considerado um homem de sorte.

O equivocado sacrifício do IBGE no Orçamento - EDITORIAL O GLOBO

O GLOBO - 11/09

A credibilidade das estatísticas econômicas e sociais do Brasil, que nos diferencia de outros países da América do Sul, não pode ser posta em risco


Primeiro ano de um novo governo, o exercício de 2015 certamente não escapará de um ajuste nas contas públicas. Diante do fraco desempenho da economia, com reflexo sobre o comportamento da arrecadação, esse ajuste terá de ocorrer pelo lado das despesas.

O atual ministro da Fazenda, Guido Mantega, que deixará o cargo mesmo no caso de reeleição da presidente Dilma (segundo ele, por razões pessoais), tem reconhecido que o acerto das contas públicas no ano que vem é necessário e inevitável, para que todo o esforço de controle da inflação não se concentre mais na política monetária. Mantega até estabelece como meta para o setor público consolidado um superávit primário de 2% a 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB), alvo que ele próprio, como principal gestor das finanças federais, não conseguiu atingir, a não ser recorrendo a uma contabilidade criativa.

O projeto de lei que define as dotações do Orçamento Geral da União para 2015 já tramita na comissão mista do Congresso Nacional, como determina a legislação, mas é estranho que, no corte de despesas, o governo tenha retirado das prioridades instituições fundamentais para que se possa fazer um diagnóstico dos problemas do país.

É o caso do IBGE, vítima de um corte de 73% na dotação prevista para 2015. Dos R$ 766 milhões solicitados pelo órgão, R$ 562 milhões foram cortados.

Com isso, levantamentos importantes deixarão de ser feitos, como o censo agropecuário e a contagem populacional. Esta última, especificamente, é a que permite ao IBGE recalibrar as projeções demográficas. A contagem se concentra em municípios onde a margem de erro aumenta devido a fluxos migratórios. Com base nessas projeções, são redistribuídas as verbas do Fundo de Participação de Estados e Municípios. Assim, quanto mais próximas da realidade estiverem as projeções demográficas, mais justa tende a ser a redistribuição das verbas. Não será possível pôr em prática o ajuste fiscal necessário para 2015 sem sacrifícios. O ajuste implica esforço de todo governo para se fazer mais com menos, buscando eficiência. A presidente do IBGE, Wasmália Bivar, reconhece que o órgão “não é uma ilha” e não pode ficar de fora do ajuste. No entanto, com um corte de 73% no orçamento proposto não há como se realizar as pesquisas programadas.

A contagem populacional e o censo agropecuário terão de ser adiados, e o Ministério do Planejamento terá de avaliar se a postergação não poderá prejudicar as previsões orçamentárias futuras.

A credibilidade do IBGE faz com que as estatísticas econômicas e sociais do Brasil sejam levadas a sério tanto no país como no exterior, diferentemente do que acontece com órgãos semelhantes de outras nações da América do Sul, como a Argentina. Essa credibilidade não pode ser posta em risco.

Raposas e galinheiros - EDITORIAL FOLHA DE SP

FOLHA DE SP - 11/09


"Confiança" é palavra fundamental no léxico da democracia representativa. Enquanto sistemas autoritários de governo se sustentam numa relação de força, modelos democráticos se legitimam com a delegação do poder a mandatários escolhidos pela população.

Existem diferentes teorias para explicar por que, exatamente, esse processo dá certo, mas há consenso em torno de um aspecto: ele só funciona sem sobressaltos quando os cidadãos acreditam que seus votos são colhidos e computados de forma correta, livre de manipulações. Do contrário, a própria representação é posta em xeque.

A reflexão torna-se oportuna por causa de uma notícia preocupante. A gestão das urnas eletrônicas nos 217 municípios do Maranhão foi confiada, nas eleições deste ano, a uma empresa cujo dono tem vínculos com a família Sarney.

Não se trata de prejulgar Luiz Carlos Cantanhede Fernandes e sua empresa, a Atlântica Serviços Gerais, a quem o Tribunal Regional Eleitoral maranhense, após realizar licitação, incumbiu a responsabilidade de fornecer os 616 funcionários encarregados de transportar e armazenar as urnas, carregá-las com o software e transmitir os dados da votação.

Não surgiu, por ora, nenhum indício material de que uma fraude esteja em curso. Fernandes, porém, não apenas é sócio do marido da governadora Roseana Sarney (PMDB) como também apareceu, em 2002, num episódio nebuloso envolvendo a apreensão de uma grande soma de dinheiro em espécie numa empresa de Roseana.

Tais fatos deveriam ter bastado para deixá-lo de fora da licitação. E, como se não fossem suficientes, suspeita-se de que Fernandes tenha ligações pessoais com Lobão Filho (PMDB), candidato a governador com a bênção dos Sarney.

A situação só é possível porque o Tribunal Superior Eleitoral decidiu descentralizar a gestão das urnas. Até 2010, o serviço era prestado por uma única empresa em todo o país. Agora, cada um dos TREs deve contratar seu fornecedor.

Em alguns Estados, nos quais a política e a economia são dominadas por grupos poderosos, encontrar empresas sem ligações suspeitas é tarefa inglória. Daí não decorre, por óbvio, que as precauções devam ser relaxadas. Quando existe desconfiança quanto à lisura do processo eleitoral, a própria democracia termina maculada.

Um debate abastardado - EDITORIAL O ESTADÃO

O ESTADO DE S.PAULO - 11/09


Seria engraçada se não fosse deplorável a troca de acusações entre as candidatas Dilma Rousseff e Marina Silva sobre quem é mais submissa aos banqueiros. Começou, como sabem todos quantos tiveram a desventura de ouvi-las, com um ataque rombudo da presidente à promessa da adversária de que, eleita, encaminhará projeto de lei para tornar o Banco Central (BC) autônomo em relação aos governos de turno e ao Congresso Nacional. Em um vídeo de propaganda, na segunda-feira à noite, Dilma se pôs a "explicar" ao público o que significaria, no seu entender, o que "parece algo distante da vida da gente, né?". Seria nada menos do que "entregar aos banqueiros" um poder imenso "sobre a sua vida e a de sua família". Seu fiel escudeiro, Marco Aurélio Garcia, completou a estultícia: "Se houver essa independência, que será a dependência dos bancos privados, teremos a impossibilidade de formular políticas macroeconômicas e de desenvolvimento".

Marina replicou por baixo; fulanizou a discussão, disparando que "nunca os banqueiros ganharam tanto" como no atual governo, graças à "bolsa empresário", à "bolsa banqueiro", à "bolsa juros altos". Trata-se de uma rajada de despropósitos, a começar do primeiro, que deve ter caído no meio empresarial, que carrega um caminhão de justas queixas da assim chamada política econômica, como uma massagem de sal nas suas feridas. De mais a mais, funcionando como funciona o BC, a inflação supera a meta e a economia cambaleia entre a recessão e um pífio crescimento de menos de 1%.

A personalização da pendenga era tudo o que Dilma queria, desde que tomou a decisão (ou tomaram por ela) de partir para cima da rival, trocando as luvas pelo soco inglês. A campanha da presidente parece ter concluído que as suas chances de dar a volta por cima no segundo turno, desmentindo as pesquisas que apontam a vitória da pregadora da "nova política", variam na razão direta da competência de Dilma em oxidar a aura graças à qual a ex-petista, concorrendo pelo Partido Verde, colheu desconcertantes 19,6 milhões de votos na disputa de 2010. A presidente há de ter intuído que, se é para falar em banqueiros - atrás apenas dos políticos entre os campeões do desafeto nacional, especialmente na população mais pobre -, o negócio é vincular a desafiante aos vice-líderes desse inglório duelo. E mandou ver.

"Não adianta querer falar que eu fiz 'bolsa banqueiro'", retrucou. "Eu não tenho banqueiro me apoiando. Eu não tenho banqueiro me sustentando." É preciso ser muito desinformado para ignorar a pontiaguda alusão à educadora Maria Alice Setubal, a Neca, cujo irmão Roberto preside o Itaú Unibanco, o que a torna herdeira da instituição. Amiga de longa data de Marina, ela coordena o seu programa de governo e faz a ponte entre a candidata e o empresariado (que a olhava de soslaio quando era vice na chapa de Eduardo Campos). Segundo a Folha de S.Paulo, no ano passado Neca doou perto de R$ 1 milhão para um instituto criado por Marina para desenvolver projetos sobre sustentabilidade. O valor equivale a 83% do total arrecadado no período.

A troca de desaforos terminou - ou ficou interrompida - com Marina perdendo o prumo. "O Banco Central autônomo", argumentou, juntando tudo e misturando, "é para ter autonomia dos grupos que acabaram com a Petrobrás." Mas isso é o de menos. O de mais é que é de pasmar: a naturalidade com que as candidatas mais cotadas para adentrar ou permanecer no Planalto em 2015 se puseram a abastardar um debate de grande importância para a condução do Brasil - como é naqueles países com os quais aspiramos a ser comparados. O grau de liberdade da autoridade monetária não apenas para fixar a taxa básica de juros, mas também a política de câmbio, além de zelar pela integridade do sistema financeiro, não deveria ser objeto de tiradas marqueteiras.

A escassa familiaridade da grande maioria dos brasileiros com o assunto deveria ser um motivo a mais para que os presidenciáveis se guardassem de usá-lo como tacape eleitoral. Fazendo a coisa errada, escancaram a pobreza substantiva das suas campanhas. A videopolítica, que privilegia o componente pessoal da competição pelo voto sobre o que efetivamente os competidores têm a oferecer ao País, completa o desserviço.


COLUNA DE CLAUDIO HUMBERTO

“Quem gosta de dinheiro deve evitar a política”
José Mujica, presidente do Uruguai, a políticos brasileiros em sua visita a Porto Alegre



PSDB QUER O EXPURGO DE POLÍTICOS DENUNCIADOS

Com o objetivo de promover estrago na base governista no Congresso, o PSDB tentará usar a lista de políticos citados na delação premiada do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa para impedir a reeleição deles em outubro. O PSDB tenta reeditar “expurgo” de 2006, quando Carlos Sampaio (SP), sub-relator da CPI dos Sanguessugas, pediu a cassação de 72 parlamentares. Destes, 67 não se reelegeram.

CORRIDA CONTRA O TEMPO

Segundo Carlos Sampaio, a briga é para ter acesso o quanto antes à lista negra dos parlamentares: “Isso precisa vir à luz antes da eleição”.

PARA CONSTAR

Tem 2,5 linhas o ofício do presidente da CPMI da Petrobras, Vital do Rêgo (PMDB-PB), pedindo acesso à delação do Paulo Roberto Costa.

VERGONHOSO

As perguntas do relator Marco Maia (PT-RS) ao esquisitão Nestor Cerveró, ontem, na CPMI, foram insultos à inteligência dos brasileiros.

DE PERTO

A mulher de Cerveró, Patrícia, acompanhou de perto as lorotas do marido na CPMI da Petrobras. Sentou-se na lateral da mesa diretora.

MINISTÉRIO DAS CIDADES TORNA CALOTE SUA MARCA

Entre os “quinta colunas”, o Ministério das Cidades é o campeão na arte de gerar insatisfação contra o governo. Além de protagonizar escândalos de corrupção, mantém atrasadas quase 60% das obras do PAC e aplica calotes milionários em fornecedores de bens e serviços, até em veículos que divulgaram campanhas, a maioria sobre educação do trânsito, num arremedo do sonhado controle “econômico” da mídia.

GENTE ATRASADA

Segundo levantamento do Instituto Trata Brasil, estão atrasadas 58% das 219 obras (149 de esgoto e 70 de água) do Ministério das Cidades.

INCOMPETÊNCIA

Expiraram contratos das três agências de publicidade e o Ministério das Cidades não teve interesse nem competência de abrir nova licitação.

EXPLICAÇÃO

Parcela do PP, que controla o Ministério das Cidades, seguiu o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) e apoia a eleição do tucano Aécio Neves.

GREVES DE JUÍZES

Pela primeira vez na vida, juízes do Tribunal de Justiça do DF votaram indicativo

de greve, em assembleia considerada histórica. A gota d’água foi um veto de Dilma à lei que deixa a magistratura em situação de desigualdade salarial, em relação ao Ministério Público.

CERIMONIAL AMIGO

Na cerimônia de sua posse na presidência do Supremo Tribunal Federal, o microfone do ministro Ricardo Lewandowski ficou aberto. Mostrou que, além de afinado, ele conhece a letra do Hino Nacional.

JOAQUIM QUEM?

Joaquim Barbosa fez questão de faltar à posse do sucessor Ricardo Lewandowski. A indelicadeza teve troco: ele foi solenemente ignorado no discurso do empossado, e nas saudações do ministro Marco Aurélio e do procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

PIMENTA RIFADO

Aécio Neves (PSDB) exibiu em seu programa na televisão uma dezena de tucanos ilustres pedindo votos para ele. Menos Pimenta da Veiga, candidato do partido ao governo de Minas Gerais. Estranho...

ADRENALINA

Foi de tensão o clima ontem da reunião da CPMI da Petrobras para tratar da delação premiada Paulo Costa. O preocupado líder do PT, Humberto Costa (PE), defendeu adiar o depoimento do ex-diretor.

VEXAME HISTÓRICO

Convertido em marqueteiro pelo padrinho Rui Falcão, presidente do PT que caiu em desgraça, o lobista Valdemir Garreta entrega ao partido dois fracassos: um no Rio de Janeiro e outro em São Paulo. Os dois candidatos petistas não chegam a atingir dois dígitos, segundo o Ibope.

NO LIMITE

Um poço de mágoas com o PSOL, por quem foi rifado para dar lugar a Luciana Genro na disputa a presidente, o senador Randolfe Rodrigues (AP) está a um passo de declarar apoio à candidatura de Marina Silva.

TREZE ANOS

O mundo lembra nesta quinta o mais dramático episódio da História recente: o dia em que terroristas jogaram aviões sequestrados contra as Torres Gêmeas, em Nova York, e outros locais nos Estados Unidos.

PERGUNTA NO CAFEZINHO

Na CPMI da Petrobras, as lorotas do enroladíssimo Nestor Cerveró foram combinadas, como no depoimento anterior?


PODER SEM PUDOR

SONHO IMPOSSÍVEL

Adhemar de Barros estava em campanha para a Presidência da República, em 1960, pelo PSP, quando certa vez tocou num assunto delicado: defendeu a aproximação do Brasil com a União Soviética.

A declaração causou surpresa e o repórter logo provocou:

- O sr. é favorável à legalização do Partido Comunista Brasileiro?

- Claro! - respondeu - Desde que permitam instalar um diretório do PSP em Moscou...