FOLHA DE SP - 23/09
A Síria estava muito melhor antes desse fetiche da pseudoprimavera pela democracia
O oriente Médio tem uma fábula que é comum para quem lá viveu ou conhece bem a região: certa feita, um escorpião pediu a uma rã que o deixasse atravessar o rio nas suas costas. Ela, atenta, disse a ele que não era idiota e que não o deixaria atravessar o rio nas suas costas, porque ele a picaria no meio da travessia e ela morreria afogada.
O escorpião respondeu que não se preocupasse, porque se ele a picasse morreria junto com ela. A resposta pareceu razoável e eles iniciaram a travessia.
No meio do caminho, o escorpião picou a rã e, enquanto ela afundava, e ele com ela, ela perguntou desesperada: "Mas por quê? Você vai morrer comigo". Ele respondeu: "Sinto muito, mas é a minha natureza". É assim que o Oriente Médio se vê.
É impressionante como a minha classe intelectual se fez ridícula diante da Primavera Árabe, mais especificamente agora, com a Síria, achando que ali havia um movimento democrático islandês. Não há isso nem na Síria, nem no Egito. A democracia ali é tão estranha quanto para nós seria uma teocracia.
Mas a vida intelectual pública está morta no Brasil, vítima da mania de ver em toda parte "um processo histórico" em curso, da avenida Paulista às ruas de Damasco, o mesmo ridículo "frisson" com "um processo político" em curso, visando a "autonomia popular". Puro fetiche.
Não existe tal coisa como "um processo político histórico". Esses caras nunca se curaram do "mito da dialética" (expressão usada por Edmund Wilson, crítico americano, em seu grandioso "Rumo à Estação Finlândia"). Há muito que nós, intelectuais, sobrevivemos de fetiche no debate político. Esse fetiche chama-se "fetiche da democracia", "fetiche do povo" ou "fetiche da revolução".
Mais recentemente, e associado aos movimentos nos países árabes e às baladas de junho, nasceu um novo fetiche, o da revolução causada pelas redes sociais.
No Oriente Médio, os escorpiões riem desse ridículo, que tem em Obama "sua baratinha tonta" querida. O Obama pensa que é presidente de um centro acadêmico de ciências sociais.
Alguns intelectuais europeus, tomados pelo "frisson" de gozarem com seu próprio fetiche, chegaram a falar em "dois momentos da Primavera Árabe" (à la Marx) por conta do golpe "secular" do exército egípcio em cima do governo fundamentalista eleito democraticamente. Por que não paramos de projetar esquemas metafísicos (do tipo dialética hegeliano-marxista) sobre o mundo?
Acabamos por acreditar que obscuros cineastas árabes vivendo nos EUA ou professores de filosofia em capitais árabes (exemplos de "contaminação" com nosso modelo ocidental, ferramentas de nosso próprio gozo, porque "pensam como nós") representam a população e a vida nesses países.
Não, a Síria estava muito melhor (veja que não digo perfeita) antes dessa pseudoprimavera pela democracia.
A Síria, como a Jordânia hoje, era um país com razoável liberdade religiosa e social, com um cotidiano sem muita miséria e violência.
Ela é o palco da disputa entre Arábia Saudita (sunita) e Irã (xiita, defensora de Assad), que vivem num estado de Guerra Fria. Mas, nem o Irã, nem os sauditas, nem os EUA, nem Israel querem a queda de Assad, porque ele, mesmo que não perfeitamente, mantém um equilíbrio na região.
Mas, desde o momento em que a mídia ocidental batizou os movimentos nos países árabes de "primavera" (ecoando a Primavera de Praga), fetiche ocidental, estabeleceu-se um programa de interpretação daqueles fenômenos como se eles fossem réplicas da mitológica Revolução Francesa, de Maio de 68 (a revolução de queijos e vinhos) e da queda das ditaduras marxistas no Leste Europeu. Entrevistando "ocidentalizantes" naqueles países, acabamos por projetar sobre eles uma demanda estranha àquele universo.
Ao endossar sem crítica os chamados rebeldes sírios, acabamos por "justificar" a guerra civil síria, para depois ficarmos posando de Madalenas arrependidas com a violência na Síria.
Em vez disso, deveríamos ouvir a sabedoria do escorpião do deserto e menos nossos livros escritos sob a tutela de taças de vinhos nas ruas de Paris.
segunda-feira, setembro 23, 2013
Unidos, mas desiguais - LÚCIA GUIMARÃES
O Estado de S.Paulo - 23/09
"A maioria dos homens não precisa enfrentar o fato de que, no momento certo, no lugar certo, eles são capazes de fazer qualquer coisa."
Esta é a epígrafe do livro de memórias de Samantha Geimer, The Girl: Emerging from the Shadow of Roman Polanski (A Menina: Saindo da Sombra de Roman Polanski). É uma citação de um diálogo entre o personagem de John Houston e o de Jack Nicholson no clássico Chinatown, de Roman Polanski. Polanski é também o protagonista, com a autora, de outro drama. Ele foi indiciado na Califórnia, em 1977, por drogar e estuprar a autora quando ela tinha 13 anos.
Hoje, Polanski tem 80 anos e continua celebrado como um grande artista. A senhora Geimer tem 50 anos, um marido, três filhos e decidiu tomar posse da parte que lhe cabe do latifúndio narrativo criado em torno daquela tarde. Mesmo depois da breve prisão do cineasta na Suíça, graças ao pedido de extradição feito pelos Estados Unidos, o nome Samantha Geimer continuou desconhecido. Mas ela e a família não tiveram a opção da vida no anonimato.
Geimer relembra o terror que sentiu "depois" e que preferia ser forçada a fazer sexo de novo a reviver tudo o que passou diante da polícia, do sistema penal e da mídia.
A menina cuja mãe a estimulava a posar como modelo foi apanhada de carro por Polanski para uma sessão de fotos para a revista Vogue, na casa de Jack Nicholson. Depois de encharcar a garota de champanhe e fazer fotos topless, Polanski telefonou para a mãe dela e retirou o último obstáculo prometendo que ia levar Samantha para casa. Partiu um comprimido de Quaalude em três pedaços e mostrou a ela numa tentativa de detectar sua experiência. Geimer sabia o que era, mas disse que não queria tomar. Ele insistiu. Ela obedeceu, tomou o Qaalude com champanhe, entrou na jacuzzi. Assustada com a situação, mentiu, dizendo que tinha asma e precisava ir para casa. Ele disse "não" e a empurrou para a cama, onde Samantha não tinha mais condições nem de dizer "sim". Ela se lembra que não queria ser tocada por um homem de meia idade, mas se conformou com o ato inevitável que incluiu penetração anal.
Para Geimer, em 1977, estupro era algo que acontecia a uma menina raptada por um estranho. "Não havia sedução ou gentileza, nem mesmo a coerção gentil, na minha definição," escreve.
Seu padrasto maconheiro e sua mãe deslumbrada chamaram a polícia porque as fotos mostradas pelo diretor, quando deixou sua filha em casa, eram de péssima qualidade? Ou por que a irmã da menina, ao ouvir a história avisou os pais alarmada? A reação da mãe foi chamar seu contador. O contador mandou chamar a polícia. E a bola de neve rolou montanha abaixo, aumentada pelo apetite insaciável de um juiz egomaníaco e da imprensa de celebridade.
Quantos homens brasileiros de classe média alta hoje, em torno de 50 anos, começaram sua vida sexual na área de serviço da casa de seus pais, com menores de idade? Ouvi histórias destas conquistas como bravata, durante minha adolescência. Naquele tempo, nem me passou pela cabeça que o sexo, apesar de consensual, era também um arranjo único de abuso de poder.
O que se aconteceu entre a garota de 13 anos e o artista atormentado que se atribuía direitos ainda comuns na sociedade brasileira não é simples. Pertence a uma era em que a sexualização de meninas era um aspecto triste da contracultura americana, tolerada sem a hipocrisia de hoje - em que é perseguida de maneira bombástica pela justiça, enquanto continua estimulada por corporações e pela mídia.
Samantha Geiner diz que sente empatia, não simpatia, pelo homem que mudou sua vida. Acha que ambos são vítimas de um mesmo sistema corrupto. Aceita o pedido de desculpas - sem admissão de culpa- que recebeu numa breve carta de Polanski.
Na carta, escrita depois que assistiu ao documentário Polanski: Wanted and Desired, de 2009, o diretor se diz "impressionado com a integridade" de Geimer. Se, ao menos, esta qualidade fosse importante para Polanski naquela tarde, há 36 anos.
"A maioria dos homens não precisa enfrentar o fato de que, no momento certo, no lugar certo, eles são capazes de fazer qualquer coisa."
Esta é a epígrafe do livro de memórias de Samantha Geimer, The Girl: Emerging from the Shadow of Roman Polanski (A Menina: Saindo da Sombra de Roman Polanski). É uma citação de um diálogo entre o personagem de John Houston e o de Jack Nicholson no clássico Chinatown, de Roman Polanski. Polanski é também o protagonista, com a autora, de outro drama. Ele foi indiciado na Califórnia, em 1977, por drogar e estuprar a autora quando ela tinha 13 anos.
Hoje, Polanski tem 80 anos e continua celebrado como um grande artista. A senhora Geimer tem 50 anos, um marido, três filhos e decidiu tomar posse da parte que lhe cabe do latifúndio narrativo criado em torno daquela tarde. Mesmo depois da breve prisão do cineasta na Suíça, graças ao pedido de extradição feito pelos Estados Unidos, o nome Samantha Geimer continuou desconhecido. Mas ela e a família não tiveram a opção da vida no anonimato.
Geimer relembra o terror que sentiu "depois" e que preferia ser forçada a fazer sexo de novo a reviver tudo o que passou diante da polícia, do sistema penal e da mídia.
A menina cuja mãe a estimulava a posar como modelo foi apanhada de carro por Polanski para uma sessão de fotos para a revista Vogue, na casa de Jack Nicholson. Depois de encharcar a garota de champanhe e fazer fotos topless, Polanski telefonou para a mãe dela e retirou o último obstáculo prometendo que ia levar Samantha para casa. Partiu um comprimido de Quaalude em três pedaços e mostrou a ela numa tentativa de detectar sua experiência. Geimer sabia o que era, mas disse que não queria tomar. Ele insistiu. Ela obedeceu, tomou o Qaalude com champanhe, entrou na jacuzzi. Assustada com a situação, mentiu, dizendo que tinha asma e precisava ir para casa. Ele disse "não" e a empurrou para a cama, onde Samantha não tinha mais condições nem de dizer "sim". Ela se lembra que não queria ser tocada por um homem de meia idade, mas se conformou com o ato inevitável que incluiu penetração anal.
Para Geimer, em 1977, estupro era algo que acontecia a uma menina raptada por um estranho. "Não havia sedução ou gentileza, nem mesmo a coerção gentil, na minha definição," escreve.
Seu padrasto maconheiro e sua mãe deslumbrada chamaram a polícia porque as fotos mostradas pelo diretor, quando deixou sua filha em casa, eram de péssima qualidade? Ou por que a irmã da menina, ao ouvir a história avisou os pais alarmada? A reação da mãe foi chamar seu contador. O contador mandou chamar a polícia. E a bola de neve rolou montanha abaixo, aumentada pelo apetite insaciável de um juiz egomaníaco e da imprensa de celebridade.
Quantos homens brasileiros de classe média alta hoje, em torno de 50 anos, começaram sua vida sexual na área de serviço da casa de seus pais, com menores de idade? Ouvi histórias destas conquistas como bravata, durante minha adolescência. Naquele tempo, nem me passou pela cabeça que o sexo, apesar de consensual, era também um arranjo único de abuso de poder.
O que se aconteceu entre a garota de 13 anos e o artista atormentado que se atribuía direitos ainda comuns na sociedade brasileira não é simples. Pertence a uma era em que a sexualização de meninas era um aspecto triste da contracultura americana, tolerada sem a hipocrisia de hoje - em que é perseguida de maneira bombástica pela justiça, enquanto continua estimulada por corporações e pela mídia.
Samantha Geiner diz que sente empatia, não simpatia, pelo homem que mudou sua vida. Acha que ambos são vítimas de um mesmo sistema corrupto. Aceita o pedido de desculpas - sem admissão de culpa- que recebeu numa breve carta de Polanski.
Na carta, escrita depois que assistiu ao documentário Polanski: Wanted and Desired, de 2009, o diretor se diz "impressionado com a integridade" de Geimer. Se, ao menos, esta qualidade fosse importante para Polanski naquela tarde, há 36 anos.
Estatal manipulada - ADRIANO PIRES
O GLOBO - 23/09
Nos últimos anos, em particular, a partir de 2008, o mercado em geral e os acionistas da Petrobras passaram a perceber a utilização da companhia como complemento de política econômica e verificar um distanciamento das expectativas que os levaram a investir na estatal após a abertura de 1997. As causas da deterioração são conhecidas e o problema é que muito se fala e muito pouco se faz. Enquanto isso, os números da empresa vão piorando e o horizonte continua de cinza para negro.
Exemplos não faltam. O governo obriga a empresa a manter os preços domésticos defasados em relação ao mercado internacional com o objetivo de controlar a inflação e incentivar a atividade econômica. Desde 2003 a defasagem dos preços da gasolina e do disel promoveu perdas de mais de R$ 40 bilhões. Em 2013 a estatal tem perdido algo em tomo de 1 bilhão de reais mensais só com a importação de gasolina e diesel. Paralelamente, o crescimento da demanda incentivado pelo preço artificialmente baixo levou a empresa a importar grandes volumes de gasolina e diesel. Entre o 1^ trimestre de 2010 e segundo trimestre de 2013, a área de abastecimento da Petrobras já acumula prejuízo de cerca de R$ 36 bilhões e as importações de gasolina cresceram 395%. Por conta disso, a empresa tem tido dificuldade para cumprir seus cronogramas de investimento, e o resultado tem sido o atraso em vários projetos e a queda na produção.
Outro caso emblemático é a construção da Refinaria Abreu e Lima (RNEST), em Pernambuco, refletindo problemas relativos à gestão de projetos na Petrobras. Ao longo da construção, o custo previsto do projeto se multiplicou por dez, de US$ 2,3 bilhões para US$ 20,1 bilhões. Isso sem falar na compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, por um preço ainda não explicado de forma transparente.
Como resultado de todos esses desmandos, a lucratividade da empresa desabou, levando ao aumento de seu endividamento. Apesar de em 2010 realizar a maior capitalização da história, que gerou uma injeção de R$ 45 bilhões em seu caixa, a empresa se encontra hoje perigosamente perto dos níveis que fariam com que perdesse seu status de investimento grade. O seu endividamento cresceu 210% após a capitalização, e sua relação dívida líquida/ebtida e dívida líquida/capital líquido se encontram em 2x",9x e 34%, respectivamente, mesmo com a empresa se utilizando de "contabilidade criativa" que reduziu 70% do impacto da desvalorização cambial sobre a sua dívida. Agora a saída encontrada é o plano de desinvestimento, onde a empresa está vendendo ativos, como metade dos campos de petróleo que possuía na Africa.
O próximo passo poderá ser a promoção de uma nova capitalização após as eleições de outubro de 2014, o que irá provocar uma diluição maior dos minoritários, aprofundando o movimento de estatização da empresa. Pouco ou nada a comemorar em outubro quando a Petrobras completará 60 anos.
Indústria paga a conta - PAULO PEDROSA
Correio Braziliense - 23/09
Um ano após o esforço do governo para reduzir o custo da energia, graves problemas continuam comprometendo a competitividade do insumo. A principal preocupação da grande indústria é que se perdeu a prioridade da energia para produção no processo de renovação das concessões de geração e transmissão e do corte dos encargos.
Paradoxalmente, os efeitos da Medida Provisória nº 579, anunciada pelo governo em setembro do ano passado e posteriormente transformada na Lei nº 12.783, foram tão menores quanto maior o volume de energia utilizado. E as condições de competitividade têm se deteriorado ainda mais, com a transformação da indústria em subsidiadora do sistema.
A decisão da Alcoa de reduzir a produção de alumínio no país é o reflexo mais recente dessa preocupante condição. A companhia anunciou, em meados de agosto, o encerramento das operações das linhas de Poços de Caldas (MG) e de São Luís do Maranhão. A medida deve representar um corte de cerca de 124 mil toneladas no volume produzido no Brasil.
Com a mais desfavorável possível relação entre os custos da energia para os consumidores de baixa e de alta tensão, o Brasil segue na contramão de seus concorrentes globais. Enquanto o gás de xisto barato fomenta a recuperação da indústria e da economia dos Estados Unidos, países europeus, como a França e a Alemanha, desenvolvem políticas públicas focadas na grande indústria. Pelo mundo, muitos outros exemplos se seguem, da China ao Peru, da Austrália ao México.
No Brasil, os preços da energia elétrica têm sofrido intervenções de toda natureza e parte dos custos que neles deveriam estar contidos migrou para a conta de encargos, paga por fora pelos consumidores, agregando imensa imprevisibilidade ao custo final da energia. Hoje os consumidores que se protegem por meio de contratos de longo prazo acabam pagando por custos gerados por outros consumidores expostos aos riscos inerentes ao mercado de curto prazo. Também absorvem, sem transparência, problemas na gestão do sistema, como nos casos de atrasos de obras.
As grandes indústrias foram muito prejudicadas no processo de renovação das concessões. Pagaram pela depreciação das usinas na energia comprada, por empréstimos compulsórios para a construção das usinas e contribuíram para o fundo que indenizou seus concessionários, mas não tiveram acesso à energia das usinas.
O resultado é que a redução do custo da energia para as unidades produtivas ficou muito aquém do antecipado pelo governo quando publicou a MP: enquanto a perspectiva era de uma redução da ordem de 30% para os grandes consumidores, pesquisa com nossos associados mostra que o corte médio foi de apenas 7,5%. Ou seja, subsidiaram os consumidores das distribuidoras, novamente favorecidos no tratamento das concessões de transmissão.
Os problemas dos grandes consumidores também se verificam na expansão do setor. Como a seleção dos consórcios que construirão as usinas é feita pela menor tarifa para os consumidores cativos, os empreendedores procuram compensar esse baixo custo final na energia negociada com o mercado livre. As indústrias de base sofrem ainda com outras consequências do modelo de contratação, ao pagar indiretamente pelo aumento de custos que os empreendimentos podem impor ao sistema no tocante a transporte, perdas e para “firmar” a energia e potência associadas.
O Brasil precisa de condições de produção que reconheçam o papel da indústria, que a tirem da paradoxal condição de subsidiadora do sistema. É preciso garantir seu acesso à energia das concessões que vencem em 2015 e não foram renovadas, bem como que possa participar, em condições favoráveis, dos leilões da expansão. Além disso, têm que ser corrigidas as distorções nos encargos que tornam o preço absolutamente imprevisível e desproporcional ao que o Brasil poderia oferecer. Essa é a base da agenda do desenvolvimento estrutural e sustentável, do emprego e da estabilidade econômica.
Um ano após o esforço do governo para reduzir o custo da energia, graves problemas continuam comprometendo a competitividade do insumo. A principal preocupação da grande indústria é que se perdeu a prioridade da energia para produção no processo de renovação das concessões de geração e transmissão e do corte dos encargos.
Paradoxalmente, os efeitos da Medida Provisória nº 579, anunciada pelo governo em setembro do ano passado e posteriormente transformada na Lei nº 12.783, foram tão menores quanto maior o volume de energia utilizado. E as condições de competitividade têm se deteriorado ainda mais, com a transformação da indústria em subsidiadora do sistema.
A decisão da Alcoa de reduzir a produção de alumínio no país é o reflexo mais recente dessa preocupante condição. A companhia anunciou, em meados de agosto, o encerramento das operações das linhas de Poços de Caldas (MG) e de São Luís do Maranhão. A medida deve representar um corte de cerca de 124 mil toneladas no volume produzido no Brasil.
Com a mais desfavorável possível relação entre os custos da energia para os consumidores de baixa e de alta tensão, o Brasil segue na contramão de seus concorrentes globais. Enquanto o gás de xisto barato fomenta a recuperação da indústria e da economia dos Estados Unidos, países europeus, como a França e a Alemanha, desenvolvem políticas públicas focadas na grande indústria. Pelo mundo, muitos outros exemplos se seguem, da China ao Peru, da Austrália ao México.
No Brasil, os preços da energia elétrica têm sofrido intervenções de toda natureza e parte dos custos que neles deveriam estar contidos migrou para a conta de encargos, paga por fora pelos consumidores, agregando imensa imprevisibilidade ao custo final da energia. Hoje os consumidores que se protegem por meio de contratos de longo prazo acabam pagando por custos gerados por outros consumidores expostos aos riscos inerentes ao mercado de curto prazo. Também absorvem, sem transparência, problemas na gestão do sistema, como nos casos de atrasos de obras.
As grandes indústrias foram muito prejudicadas no processo de renovação das concessões. Pagaram pela depreciação das usinas na energia comprada, por empréstimos compulsórios para a construção das usinas e contribuíram para o fundo que indenizou seus concessionários, mas não tiveram acesso à energia das usinas.
O resultado é que a redução do custo da energia para as unidades produtivas ficou muito aquém do antecipado pelo governo quando publicou a MP: enquanto a perspectiva era de uma redução da ordem de 30% para os grandes consumidores, pesquisa com nossos associados mostra que o corte médio foi de apenas 7,5%. Ou seja, subsidiaram os consumidores das distribuidoras, novamente favorecidos no tratamento das concessões de transmissão.
Os problemas dos grandes consumidores também se verificam na expansão do setor. Como a seleção dos consórcios que construirão as usinas é feita pela menor tarifa para os consumidores cativos, os empreendedores procuram compensar esse baixo custo final na energia negociada com o mercado livre. As indústrias de base sofrem ainda com outras consequências do modelo de contratação, ao pagar indiretamente pelo aumento de custos que os empreendimentos podem impor ao sistema no tocante a transporte, perdas e para “firmar” a energia e potência associadas.
O Brasil precisa de condições de produção que reconheçam o papel da indústria, que a tirem da paradoxal condição de subsidiadora do sistema. É preciso garantir seu acesso à energia das concessões que vencem em 2015 e não foram renovadas, bem como que possa participar, em condições favoráveis, dos leilões da expansão. Além disso, têm que ser corrigidas as distorções nos encargos que tornam o preço absolutamente imprevisível e desproporcional ao que o Brasil poderia oferecer. Essa é a base da agenda do desenvolvimento estrutural e sustentável, do emprego e da estabilidade econômica.
Orçamento cada vez mais rígido - BERNARD APPY
O ESTADO DE S. PAULO - 22/09
Nos últimos meses uma série de projetos voltados a ampliar a vinculação de recursos para áreas sociais foi aprovada ouvem sendo discutida no Congresso Nacional. Um exemplo é a Lei n.° 12.858, sancionada no dia 9 deste mês, que destina à educação (75%) e à saúde (25%) a totalidade das receitas dos royalties do petróleo relativas a contratos celebrados a partir de 3 de dezembro de 2012, bem como destina à educação 50% dos recursos do Fundo Social (fundo formado para receber todos os recursos obtidos pela União com a exploração do petróleo no pré-sal).
Embora à primeira vista essa medida pareça positiva - afinal, quem é contra a ampliação de recursos para a educação e para a saúde?ela é o resultado de um modelo extremamente problemático de definição de prioridades para as despesas públicas no Brasil. Esse modelo consiste na vinculação de um montante cada vez maior de recursos a determinadas categorias de despesas, sem uma discussão minimamente adequada sobre como essa vinculação afeta as demais despesas, a carga tributária e a dívida pública do País.
Vou me explicar melhor. À primeira vista, o aumento das despesas sociais decorrentes da Lei n.° 12.858 tem uma fonte de recursos, que são os royalties do petróleo dos novos contratos. Em nenhum momento se discutiu, 110 entanto, o que se está deixando de fazer por conta dessa vinculação.
De fato, os royalties dos novos contratos tendem a substituir, progressivamente, as receitas resultantes dos contratos antigos, que tendem a se reduzir à medida que a produção dos poços antigos vai se esgotando. Como já existem despesas que hoje são financiadas com os royalties, ao vincular a totalidade dos novos recursos à educação e à saúde, a Lei n.° 12.858 está retirando a fonte de financiamento das demais despesas que hoje são cobertas com recursos do petróleo - tanto na União quanto nos Estados e municípios.
Ao perder a fonte de financiamento destas demais despesas, os governos têm três alternativas possíveis: ou cortam essas despesas ou aumentam a carga tributária ou a dívida pública para manter as despesas.
Este c o ponto que eu gostaria de destacar. O modelo vigente no Brasil de vinculação de recursos para determinadas categorias de despesas olha apenas para um lado da moeda, que é o do gasto que se quer privilegiar, mas não olha para o outro lado da moeda, que é o que se está deixando de fazer.
É importante ter em conta que a Lei n.° 12.858 não é um caso isolado. Além de a Constituição federal á determinar a destinação à educação de 18% da receita de impostos da União (líquida de transferências) e de 25% da receita de impostos (acrescida de transferências) dos Estados e municípios, nos últimos 15 anos várias medidas de vinculação de recursos à saúde e à educação foram adotadas.
Uma dessas medidas é a Emenda Constitucional 29, de 2000, que determinou a vinculação de 12% da receita liquidada impostos dos Estados (acrescida de transferências) à saúde, porcentual que sobe para 15% no caso dos municípios, e estabeleceu que as despesas da União com saúde serão corrigidas anualmente com base na variação do PIB. Outra medida é a Lei n.° 11.494, de 2007, que estabeleceu que pelo menos 70% das transferências da União para o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB) serão financiadas com recursos adicionais a vinculação constitucional de 18% dos impostos.
Não pretendo, neste artigo, discutir se o nível de gastos em educação e saúde no Brasil é adequado (sobre as despesas com educação, recomendo a leitura de três textos do início de setembro 110 blog de Mansueto Almeida -http://mansueto.wordpress.com). Em todo caso, vale destacar que, para vários analistas, antes de aumentar a despesa com educação e saúde, seria preciso tomar medidas voltadas para melhorar a gestão e aumentar a eficiência dos gastos já existentes.
O que me preocupa é a crescente rigidez do Orçamento público. Ao decidir vincular os recursos do petróleo à educação e à saúde, o legislador de hoje está reduzindo o espaço que o legislador de amanhã terá na definição de prioridades.
Esse enrijecimento do Orçamento no longo prazo não é acompanhado de qualquer discussão sobre as alternativas de utilização dos recursos. Não se discute, por exemplo, se há carências mais importantes e urgentes em outros setores, como segurança pública, transporte público ou infraestrutura. Tampouco se avalia se o aumento das receitas do petróleo poderia ser utilizado para viabilizar a redução da carga tributária de outros setores da economia.
O pior é que o Orçamento no Brasil já é extremamente rígido. Para além dos recursos vinculados, há um grande conjunto de despesas que não podem ser reduzidas no curto prazo - como benefícios previdenciários e assistenciais e os gastos com pessoal. O resultado é que a parcela do Orçamento que pode ser gerida pelos governos - como investimentos ou gastos em setores não protegidos por vinculações - é extremamente reduzida. Não é por outro motivo que o Brasil tem uma carga tributária de mais de 35% do PIB e aloca em investimentos públicos (nos três níveis de governo) menos de 3% do PIB.
Em razão dessa alta rigidez do Orçamento, quando se faz necessário algum ajuste nas contas públicas, o que resta ao governo é cortar investimentos ou elevar a carga tributária. Esse tipo de ajuste cobra seu preço na forma de um menor crescimento do País no longo prazo, o que, em última instância, acaba reduzindo inclusive os recursos destinados à saúde eà educação.
Em suma, ainda que despesas em saúde e educação sejam importantes, o aumento da vinculação de recursos a esses setores (ou a qualquer outro setor) não é a solução para o problema.
Finalizo informando que escreverei nesta coluna a cada cinco semanas. Retomarei o tema em meu próximo artigo, com a apresentação de algumas sugestões.
Nos últimos meses uma série de projetos voltados a ampliar a vinculação de recursos para áreas sociais foi aprovada ouvem sendo discutida no Congresso Nacional. Um exemplo é a Lei n.° 12.858, sancionada no dia 9 deste mês, que destina à educação (75%) e à saúde (25%) a totalidade das receitas dos royalties do petróleo relativas a contratos celebrados a partir de 3 de dezembro de 2012, bem como destina à educação 50% dos recursos do Fundo Social (fundo formado para receber todos os recursos obtidos pela União com a exploração do petróleo no pré-sal).
Embora à primeira vista essa medida pareça positiva - afinal, quem é contra a ampliação de recursos para a educação e para a saúde?ela é o resultado de um modelo extremamente problemático de definição de prioridades para as despesas públicas no Brasil. Esse modelo consiste na vinculação de um montante cada vez maior de recursos a determinadas categorias de despesas, sem uma discussão minimamente adequada sobre como essa vinculação afeta as demais despesas, a carga tributária e a dívida pública do País.
Vou me explicar melhor. À primeira vista, o aumento das despesas sociais decorrentes da Lei n.° 12.858 tem uma fonte de recursos, que são os royalties do petróleo dos novos contratos. Em nenhum momento se discutiu, 110 entanto, o que se está deixando de fazer por conta dessa vinculação.
De fato, os royalties dos novos contratos tendem a substituir, progressivamente, as receitas resultantes dos contratos antigos, que tendem a se reduzir à medida que a produção dos poços antigos vai se esgotando. Como já existem despesas que hoje são financiadas com os royalties, ao vincular a totalidade dos novos recursos à educação e à saúde, a Lei n.° 12.858 está retirando a fonte de financiamento das demais despesas que hoje são cobertas com recursos do petróleo - tanto na União quanto nos Estados e municípios.
Ao perder a fonte de financiamento destas demais despesas, os governos têm três alternativas possíveis: ou cortam essas despesas ou aumentam a carga tributária ou a dívida pública para manter as despesas.
Este c o ponto que eu gostaria de destacar. O modelo vigente no Brasil de vinculação de recursos para determinadas categorias de despesas olha apenas para um lado da moeda, que é o do gasto que se quer privilegiar, mas não olha para o outro lado da moeda, que é o que se está deixando de fazer.
É importante ter em conta que a Lei n.° 12.858 não é um caso isolado. Além de a Constituição federal á determinar a destinação à educação de 18% da receita de impostos da União (líquida de transferências) e de 25% da receita de impostos (acrescida de transferências) dos Estados e municípios, nos últimos 15 anos várias medidas de vinculação de recursos à saúde e à educação foram adotadas.
Uma dessas medidas é a Emenda Constitucional 29, de 2000, que determinou a vinculação de 12% da receita liquidada impostos dos Estados (acrescida de transferências) à saúde, porcentual que sobe para 15% no caso dos municípios, e estabeleceu que as despesas da União com saúde serão corrigidas anualmente com base na variação do PIB. Outra medida é a Lei n.° 11.494, de 2007, que estabeleceu que pelo menos 70% das transferências da União para o Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB) serão financiadas com recursos adicionais a vinculação constitucional de 18% dos impostos.
Não pretendo, neste artigo, discutir se o nível de gastos em educação e saúde no Brasil é adequado (sobre as despesas com educação, recomendo a leitura de três textos do início de setembro 110 blog de Mansueto Almeida -http://mansueto.wordpress.com). Em todo caso, vale destacar que, para vários analistas, antes de aumentar a despesa com educação e saúde, seria preciso tomar medidas voltadas para melhorar a gestão e aumentar a eficiência dos gastos já existentes.
O que me preocupa é a crescente rigidez do Orçamento público. Ao decidir vincular os recursos do petróleo à educação e à saúde, o legislador de hoje está reduzindo o espaço que o legislador de amanhã terá na definição de prioridades.
Esse enrijecimento do Orçamento no longo prazo não é acompanhado de qualquer discussão sobre as alternativas de utilização dos recursos. Não se discute, por exemplo, se há carências mais importantes e urgentes em outros setores, como segurança pública, transporte público ou infraestrutura. Tampouco se avalia se o aumento das receitas do petróleo poderia ser utilizado para viabilizar a redução da carga tributária de outros setores da economia.
O pior é que o Orçamento no Brasil já é extremamente rígido. Para além dos recursos vinculados, há um grande conjunto de despesas que não podem ser reduzidas no curto prazo - como benefícios previdenciários e assistenciais e os gastos com pessoal. O resultado é que a parcela do Orçamento que pode ser gerida pelos governos - como investimentos ou gastos em setores não protegidos por vinculações - é extremamente reduzida. Não é por outro motivo que o Brasil tem uma carga tributária de mais de 35% do PIB e aloca em investimentos públicos (nos três níveis de governo) menos de 3% do PIB.
Em razão dessa alta rigidez do Orçamento, quando se faz necessário algum ajuste nas contas públicas, o que resta ao governo é cortar investimentos ou elevar a carga tributária. Esse tipo de ajuste cobra seu preço na forma de um menor crescimento do País no longo prazo, o que, em última instância, acaba reduzindo inclusive os recursos destinados à saúde eà educação.
Em suma, ainda que despesas em saúde e educação sejam importantes, o aumento da vinculação de recursos a esses setores (ou a qualquer outro setor) não é a solução para o problema.
Finalizo informando que escreverei nesta coluna a cada cinco semanas. Retomarei o tema em meu próximo artigo, com a apresentação de algumas sugestões.
O PIB e a canja de galinha - GILMAR MENDES LOURENÇO
GAZETA DO POVO - PR - 23/09
A expansão de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no segundo trimestre de 2013, em comparação com os três meses imediatamente antecedentes, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em fins de julho, sustentada na pujante recuperação da agropecuária e na reação dos patamares de investimentos, surpreendeu os meios especializados ao suplantar, com apreciável margem, as previsões correntes que cravavam uma taxa de crescimento ao redor de 1%.
O aparecimento de uma estatística reconhecidamente mais favorável, mesmo que pontual, ensejou a formação de um ambiente de otimismo, nas hostes oficiais, principalmente no Palácio do Planalto e no Ministério da Fazenda, que chegou a contagiar parcela substancial dos representantes da comunidade empresarial e dos segmentos formadores de opinião.
Tanto é assim que o ministro Guido Mantega recorreu a um exercício de anualização da variação do PIB para sentenciar que o pior já teria passado e que a economia do país estaria crescendo 6,1% em 12 meses, sendo vencida, no ambiente global, nesse interregno, apenas pela China. De seu turno, a presidente Dilma, em discurso comemorativo do aniversário da independência, também fez questão de reiterar, de forma triunfalista, a natureza virtuosa do clima de negócios no Brasil.
É fácil notar que as autoridades e aqueles atores sociais permanentemente inclinados a alterações de diagnósticos e de posições ignoraram ao menos duas facetas relevantes contidas nas estimativas do PIB, que permitiriam relativizar o seu respectivo vigor. A primeira delas corresponde ao incremento estatístico verificado a partir de uma base de confronto deprimida do primeiro trimestre, quando houve acréscimo de apenas 0,6%. A segunda restrição repousa na concentração do dinamismo na cadeia produtiva baseada na agropecuária, apoiada na colheita recorde de grãos, nos preços internacionais dos alimentos 30% acima das médias históricas e no efeito-renda da depreciação cambial de mais de 20%.
Mas o principal disfarce da retórica governamental diz respeito ao fato de os números aparentemente bons traduzirem um passado com exíguas chances de perpetuação. Isso porque as pistas acerca do comportamento da economia para o terceiro trimestre são pouco animadoras, reproduzidas na despencada dos índices de confiança de empresários e consumidores para níveis semelhantes aos registrados no primeiro semestre de 2009, quando o país tentava sair da recessão, por ocasião do ápice da instabilidade global.
O próprio IBGE apurou queda de 2% da produção industrial brasileira no mês de julho de 2013, em confronto com junho, e pesquisas recentes, realizadas pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), revelam rápida subida dos estoques e redução do desejo de investimento do setor industrial.
Na realidade, a decolagem econômica brasileira vem sendo obstruída pelos crescentes desequilíbrios nas contas externas, pela debilidade das finanças públicas, pela ausência de um projeto consistente para a superação dos gargalos na infraestrutura, e pelos focos inflacionários domésticos, apesar dos sucessivos pacotes de benesses oficiais, lançados de forma improvisada pelas autoridades federais, para setores selecionados por critérios pouco transparentes. Nessas circunstâncias, vale a sábia recomendação dos nossos avós: juízo e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
A expansão de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro no segundo trimestre de 2013, em comparação com os três meses imediatamente antecedentes, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em fins de julho, sustentada na pujante recuperação da agropecuária e na reação dos patamares de investimentos, surpreendeu os meios especializados ao suplantar, com apreciável margem, as previsões correntes que cravavam uma taxa de crescimento ao redor de 1%.
O aparecimento de uma estatística reconhecidamente mais favorável, mesmo que pontual, ensejou a formação de um ambiente de otimismo, nas hostes oficiais, principalmente no Palácio do Planalto e no Ministério da Fazenda, que chegou a contagiar parcela substancial dos representantes da comunidade empresarial e dos segmentos formadores de opinião.
Tanto é assim que o ministro Guido Mantega recorreu a um exercício de anualização da variação do PIB para sentenciar que o pior já teria passado e que a economia do país estaria crescendo 6,1% em 12 meses, sendo vencida, no ambiente global, nesse interregno, apenas pela China. De seu turno, a presidente Dilma, em discurso comemorativo do aniversário da independência, também fez questão de reiterar, de forma triunfalista, a natureza virtuosa do clima de negócios no Brasil.
É fácil notar que as autoridades e aqueles atores sociais permanentemente inclinados a alterações de diagnósticos e de posições ignoraram ao menos duas facetas relevantes contidas nas estimativas do PIB, que permitiriam relativizar o seu respectivo vigor. A primeira delas corresponde ao incremento estatístico verificado a partir de uma base de confronto deprimida do primeiro trimestre, quando houve acréscimo de apenas 0,6%. A segunda restrição repousa na concentração do dinamismo na cadeia produtiva baseada na agropecuária, apoiada na colheita recorde de grãos, nos preços internacionais dos alimentos 30% acima das médias históricas e no efeito-renda da depreciação cambial de mais de 20%.
Mas o principal disfarce da retórica governamental diz respeito ao fato de os números aparentemente bons traduzirem um passado com exíguas chances de perpetuação. Isso porque as pistas acerca do comportamento da economia para o terceiro trimestre são pouco animadoras, reproduzidas na despencada dos índices de confiança de empresários e consumidores para níveis semelhantes aos registrados no primeiro semestre de 2009, quando o país tentava sair da recessão, por ocasião do ápice da instabilidade global.
O próprio IBGE apurou queda de 2% da produção industrial brasileira no mês de julho de 2013, em confronto com junho, e pesquisas recentes, realizadas pela Fundação Getulio Vargas (FGV) e pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), revelam rápida subida dos estoques e redução do desejo de investimento do setor industrial.
Na realidade, a decolagem econômica brasileira vem sendo obstruída pelos crescentes desequilíbrios nas contas externas, pela debilidade das finanças públicas, pela ausência de um projeto consistente para a superação dos gargalos na infraestrutura, e pelos focos inflacionários domésticos, apesar dos sucessivos pacotes de benesses oficiais, lançados de forma improvisada pelas autoridades federais, para setores selecionados por critérios pouco transparentes. Nessas circunstâncias, vale a sábia recomendação dos nossos avós: juízo e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
Não queremos saúde padrão Fifa - FRANCISCO BALESTRIN
Correio Braziliense - 23/09
Nos últimos meses, a população criou coragem e foi para as ruas exigir educação, uma política mais transparente e, principalmente, melhores condições de saúde. O descontentamento veio à tona especialmente com os altos investimentos para a Copa do Mundo de 2014, frente às mazelas do país. Entre as reivindicações, a saúde com padrão Fifa é um dos principais discursos. Mas a verdade é que não precisamos de saúde padrão Fifa, com investimentos estrondosos e construções exageradas, mas sim de uma saúde padrão Brasil, que atenda as necessidades da população.
O sistema público de saúde já possui grandes hospitais e o Brasil é o único país dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) com um modelo de saúde pública que é bastante elogiado, mas peca na execução. O setor privado, por sua vez, possui uma gestão bastante eficiente, mas não tem modelo definido. Os serviços de saúde precisam, de fato, melhorar; no entanto, investimentos desnecessários não resolverão os problemas de gestão da saúde no país.
A saúde precisa ser vista pelos governantes como um bem maior, que necessita de investimentos na mesma proporção de se implantar uma gestão inteligente. Mas não vemos isso na prática. Uma breve análise comparativa entre os gastos com a Copa do Mundo e os investimentos previstos para a saúde demonstra o quanto essa área vital carece de atenção no país. O objetivo desta reflexão não é criticar os gastos com a Copa, mas mostrar a ineficiência da gestão pública e a inversão de valores dos governantes.
Os investimentos previstos para a Copa são da ordem de R$ 26 bilhões. Obviamente, se acompanharmos os noticiários, perceberemos que esse valor foi ultrapassado em muito. Apenas os seis estádios utilizados na Copa das Confederações, por exemplo, custaram 65% mais que o previsto em 2010.
Enquanto isso, entre 2007 e 2012, o Brasil perdeu 11,2% dos leitos privados do país, o que corresponde a 18.322 leitos. No mesmo período, mais de 280 hospitais privados foram fechados. Nesse sentido, é importante lembrar que 64% dos leitos disponíveis pertencem aos hospitais privados e mais de 57% desses leitos atendem ao Sistema Único de Saúde (SUS), o que sobrecarrega ainda mais o setor. Além disso, o número de beneficiários de planos privados é crescente, alcançando 47,9 milhões de favorecidos, um crescimento de 2,1% em 2012.
Ao analisarmos os investimentos para a Copa do Mundo de 2014, verificamos que apenas com a construção e reforma de 12 estádios estão previstos gastos de mais de R$ 7 bilhões. Em nota técnica publicada pela Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), se considerarmos o crescimento médio de beneficiários de 2,1% ao ano, o segmento hospitalar privado precisará criar 13,7 mil novos leitos até 2016, sem considerar o deficit atual de leitos. Esse número equivale ao investimento de R$ 4,3 bilhões, ou seja, valor muito inferior ao gasto com os estádios. O setor público seguramente deve apresentar números maiores.
Os gastos com saúde no Brasil representam 9% do Produto Interno Bruto (PIB), o equivalente a R$ 396,7 bilhões, sendo a maior parte (57%) de origem privada, tanto por meio de planos de saúde quanto por gastos diretos dos cidadãos brasileiros. O governo federal destinou algo em torno de R$ 96 bilhões para a saúde em 2012, mas há notícias de que mais de R$ 9 bilhões deixaram de ser investidos. Esse recurso é quase equivalente ao total de gastos com internações do SUS no mesmo ano (R$ 11,6 bilhões). Com a disponibilidade e utilização adequada desse montante, poderíamos aumentar em mais de 90% os recursos para internação no sistema público de saúde.
Como parte de um pacto pela melhoria dos serviços públicos, a presidente Dilma apresentou algumas propostas, contemplando o combate à corrupção e a melhoria do atendimento à população nas áreas de saúde, educação e transporte público. O curioso é que, ao mesmo tempo em que o governo promete melhorar as condições dos serviços públicos no país, ele também se compromete a reduzir gastos e a atingir a meta de superavit, de 2,3%. O que nos resta saber é de onde esses gastos serão cortados.
Para a saúde, por exemplo, apesar de importantes, as alternativas propostas não solucionam um dos principais problemas do setor público — o de gestão do sistema. De nada adiantam novos hospitais e unidades básicas, se não houver qualidade e segurança na prestação dos serviços.
Aliás, atendimento de qualidade é direito do cidadão e deve ser entendido como essencial à condição humana. O sistema privado de saúde também deve resgatar sua condição existencial, voltando a ser opção do usuário e não condição para receber os cuidados de saúde que deveriam ser ofertados pelo SUS. Portanto, a gestão competente do sistema público é fundamental nesse processo, pois a ineficiência da saúde pública sobrecarrega e prejudica o todo.
Os contrapontos desse artigo mostram a urgência de investimentos para a saúde e, principalmente, a necessidade de uma gestão mais adequada do dinheiro público, requisito fundamental para o desenvolvimento do país.
Nos últimos meses, a população criou coragem e foi para as ruas exigir educação, uma política mais transparente e, principalmente, melhores condições de saúde. O descontentamento veio à tona especialmente com os altos investimentos para a Copa do Mundo de 2014, frente às mazelas do país. Entre as reivindicações, a saúde com padrão Fifa é um dos principais discursos. Mas a verdade é que não precisamos de saúde padrão Fifa, com investimentos estrondosos e construções exageradas, mas sim de uma saúde padrão Brasil, que atenda as necessidades da população.
O sistema público de saúde já possui grandes hospitais e o Brasil é o único país dos Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) com um modelo de saúde pública que é bastante elogiado, mas peca na execução. O setor privado, por sua vez, possui uma gestão bastante eficiente, mas não tem modelo definido. Os serviços de saúde precisam, de fato, melhorar; no entanto, investimentos desnecessários não resolverão os problemas de gestão da saúde no país.
A saúde precisa ser vista pelos governantes como um bem maior, que necessita de investimentos na mesma proporção de se implantar uma gestão inteligente. Mas não vemos isso na prática. Uma breve análise comparativa entre os gastos com a Copa do Mundo e os investimentos previstos para a saúde demonstra o quanto essa área vital carece de atenção no país. O objetivo desta reflexão não é criticar os gastos com a Copa, mas mostrar a ineficiência da gestão pública e a inversão de valores dos governantes.
Os investimentos previstos para a Copa são da ordem de R$ 26 bilhões. Obviamente, se acompanharmos os noticiários, perceberemos que esse valor foi ultrapassado em muito. Apenas os seis estádios utilizados na Copa das Confederações, por exemplo, custaram 65% mais que o previsto em 2010.
Enquanto isso, entre 2007 e 2012, o Brasil perdeu 11,2% dos leitos privados do país, o que corresponde a 18.322 leitos. No mesmo período, mais de 280 hospitais privados foram fechados. Nesse sentido, é importante lembrar que 64% dos leitos disponíveis pertencem aos hospitais privados e mais de 57% desses leitos atendem ao Sistema Único de Saúde (SUS), o que sobrecarrega ainda mais o setor. Além disso, o número de beneficiários de planos privados é crescente, alcançando 47,9 milhões de favorecidos, um crescimento de 2,1% em 2012.
Ao analisarmos os investimentos para a Copa do Mundo de 2014, verificamos que apenas com a construção e reforma de 12 estádios estão previstos gastos de mais de R$ 7 bilhões. Em nota técnica publicada pela Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp), se considerarmos o crescimento médio de beneficiários de 2,1% ao ano, o segmento hospitalar privado precisará criar 13,7 mil novos leitos até 2016, sem considerar o deficit atual de leitos. Esse número equivale ao investimento de R$ 4,3 bilhões, ou seja, valor muito inferior ao gasto com os estádios. O setor público seguramente deve apresentar números maiores.
Os gastos com saúde no Brasil representam 9% do Produto Interno Bruto (PIB), o equivalente a R$ 396,7 bilhões, sendo a maior parte (57%) de origem privada, tanto por meio de planos de saúde quanto por gastos diretos dos cidadãos brasileiros. O governo federal destinou algo em torno de R$ 96 bilhões para a saúde em 2012, mas há notícias de que mais de R$ 9 bilhões deixaram de ser investidos. Esse recurso é quase equivalente ao total de gastos com internações do SUS no mesmo ano (R$ 11,6 bilhões). Com a disponibilidade e utilização adequada desse montante, poderíamos aumentar em mais de 90% os recursos para internação no sistema público de saúde.
Como parte de um pacto pela melhoria dos serviços públicos, a presidente Dilma apresentou algumas propostas, contemplando o combate à corrupção e a melhoria do atendimento à população nas áreas de saúde, educação e transporte público. O curioso é que, ao mesmo tempo em que o governo promete melhorar as condições dos serviços públicos no país, ele também se compromete a reduzir gastos e a atingir a meta de superavit, de 2,3%. O que nos resta saber é de onde esses gastos serão cortados.
Para a saúde, por exemplo, apesar de importantes, as alternativas propostas não solucionam um dos principais problemas do setor público — o de gestão do sistema. De nada adiantam novos hospitais e unidades básicas, se não houver qualidade e segurança na prestação dos serviços.
Aliás, atendimento de qualidade é direito do cidadão e deve ser entendido como essencial à condição humana. O sistema privado de saúde também deve resgatar sua condição existencial, voltando a ser opção do usuário e não condição para receber os cuidados de saúde que deveriam ser ofertados pelo SUS. Portanto, a gestão competente do sistema público é fundamental nesse processo, pois a ineficiência da saúde pública sobrecarrega e prejudica o todo.
Os contrapontos desse artigo mostram a urgência de investimentos para a saúde e, principalmente, a necessidade de uma gestão mais adequada do dinheiro público, requisito fundamental para o desenvolvimento do país.
Sonho X pragmatismo - VERA MAGALHÃES - PAINEL
FOLHA DE SP - 23/09
Aliados de Marina Silva se dividem quanto a que a segunda colocada nas pesquisas presidenciais deveria fazer caso a Rede Sustentabilidade não tenha seu registro no TSE aprovado a tempo de disputar as eleições de 2014. O "núcleo duro", formado por amigos mais antigos da ex-senadora, acha que ela deveria ficar sem partido e abdicar da candidatura para preservar a biografia. Já os políticos tentam convencer Marina a se filiar a outro partido e tentar adaptá-lo à estrutura da Rede.
Lastro
O ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto era o vice dos sonhos de Marina porque a ex-senadora acredita que sua presença na chapa ajudaria a afastar o temor de que sua eventual eleição pudesse representar risco de uma crise institucional.
Vai com fé
Quanto aos prazos cada vez mais estreitos para criar a Rede, Ayres Britto é otimista, diz ele à coluna: "Foram coletadas mais de 600 mil assinaturas. Se houver presteza da Justiça, tenho para mim que dá tempo".
Olho mecânico
Já ministros do TSE consideram complicada a situação não só do partido de Marina, mas também do Solidariedade e do PROS, que estão na fila do tribunal para serem julgados nesta semana e na próxima. O pedido da Rede deve entrar em pauta em 1º de outubro.
Perigo
O maior risco, para os aliados de Marina, é que algum ministro peça vistas do processo, o que enterraria a chance de a Rede sair no prazo. Por isso, todas as informações prestadas à relatora estão sendo encaminhadas aos outros membros da corte.
Buracos
A corregedora do TSE e relatora dos processos da Rede e do Partido Republicano da Ordem Social, Laurita Vaz, pediu vista regimental do processo do PROS após dar seu voto. Ela vai examinar indícios de fraude encontrados, como a apresentação de cópias de certidões repetidas ao longo do processo.
Devassa
A Secretaria de Relações Institucionais da Presidência vai fazer um pente-fino em todas as ações de Idaílson Vilas Boas, ex-assessor de Ideli Salvatti exonerado após acusação de participar de uma quadrilha desbaratada pela Polícia Federal.
Protegido
Até lá, se não forem encontradas digitais de Olavo Noleto, responsável pela indicação de Idaílson, o subchefe de assuntos federativos da pasta sobreviverá no cargo, garantem interlocutores do Palácio do Planalto.
Seletiva
Dilma Rousseff, que cancelou encontro com Barack Obama em outubro, se reunirá com Bill Clinton em Nova York nesta semana. O ex-presidente quer apoio a projetos da Fundação Clinton de combate a tuberculose, malária e Aids na África.
Conversão
Dirigentes do PR em São Paulo reforçaram na última semana o convite para que Marco Feliciano (PSC) se filie à legenda. Prometeram que o deputado poderia disputar qualquer cargo, até o de vice-governador.
Interino
Com Joaquim Barbosa no exterior, Ricardo Lewandowski assume a presidência do STF a partir de hoje, até o fim da semana.
Quem manda
Quem acompanha as negociações do PMDB para emplacar um indicado no Ministério da Integração Nacional registra que os nomes cotados ainda não passaram pelo crivo do ex-presidente José Sarney.
Antiterror
Deputados e senadores envolvidos na elaboração do projeto de lei que tipifica o crime de terrorismo no Brasil se reúnem nesta semana para finalizar o texto. Eles querem incluir no projeto dispositivo para que atos de movimentos sociais não sejam enquadrados na lei.
Tiroteio
O Brasil democrático torce para que Marina consiga cumprir as exigências legais. O país merece tê-la como mais uma alternativa.
DO SENADOR AÉCIO NEVES (MG), presidente do PSDB e pré-candidato do partido à Presidência, sobre o prazo para que a ex-senadora crie a Rede.
Contraponto
Por que não disse antes?
Eduardo Campos (PSB-PE) fazia uma viagem num pequeno avião particular para quatro passageiros na campanha de 2006 ao governo, quando uma turbulência fez a aeronave balançar. Campos questionou o piloto sobre as condições de voo, e ele respondeu:
-Fique tranquilo. Este avião só caiu uma vez!
E contou que aquela era a aeronave na qual o deputado Raul Henry sofrera o acidente que lhe tirou a visão parcialmente, quatro anos antes.
Campos cumpriu a agenda, mas comunicou à equipe:
-Vamos voltar de carro.
Aliados de Marina Silva se dividem quanto a que a segunda colocada nas pesquisas presidenciais deveria fazer caso a Rede Sustentabilidade não tenha seu registro no TSE aprovado a tempo de disputar as eleições de 2014. O "núcleo duro", formado por amigos mais antigos da ex-senadora, acha que ela deveria ficar sem partido e abdicar da candidatura para preservar a biografia. Já os políticos tentam convencer Marina a se filiar a outro partido e tentar adaptá-lo à estrutura da Rede.
Lastro
O ex-presidente do STF Carlos Ayres Britto era o vice dos sonhos de Marina porque a ex-senadora acredita que sua presença na chapa ajudaria a afastar o temor de que sua eventual eleição pudesse representar risco de uma crise institucional.
Vai com fé
Quanto aos prazos cada vez mais estreitos para criar a Rede, Ayres Britto é otimista, diz ele à coluna: "Foram coletadas mais de 600 mil assinaturas. Se houver presteza da Justiça, tenho para mim que dá tempo".
Olho mecânico
Já ministros do TSE consideram complicada a situação não só do partido de Marina, mas também do Solidariedade e do PROS, que estão na fila do tribunal para serem julgados nesta semana e na próxima. O pedido da Rede deve entrar em pauta em 1º de outubro.
Perigo
O maior risco, para os aliados de Marina, é que algum ministro peça vistas do processo, o que enterraria a chance de a Rede sair no prazo. Por isso, todas as informações prestadas à relatora estão sendo encaminhadas aos outros membros da corte.
Buracos
A corregedora do TSE e relatora dos processos da Rede e do Partido Republicano da Ordem Social, Laurita Vaz, pediu vista regimental do processo do PROS após dar seu voto. Ela vai examinar indícios de fraude encontrados, como a apresentação de cópias de certidões repetidas ao longo do processo.
Devassa
A Secretaria de Relações Institucionais da Presidência vai fazer um pente-fino em todas as ações de Idaílson Vilas Boas, ex-assessor de Ideli Salvatti exonerado após acusação de participar de uma quadrilha desbaratada pela Polícia Federal.
Protegido
Até lá, se não forem encontradas digitais de Olavo Noleto, responsável pela indicação de Idaílson, o subchefe de assuntos federativos da pasta sobreviverá no cargo, garantem interlocutores do Palácio do Planalto.
Seletiva
Dilma Rousseff, que cancelou encontro com Barack Obama em outubro, se reunirá com Bill Clinton em Nova York nesta semana. O ex-presidente quer apoio a projetos da Fundação Clinton de combate a tuberculose, malária e Aids na África.
Conversão
Dirigentes do PR em São Paulo reforçaram na última semana o convite para que Marco Feliciano (PSC) se filie à legenda. Prometeram que o deputado poderia disputar qualquer cargo, até o de vice-governador.
Interino
Com Joaquim Barbosa no exterior, Ricardo Lewandowski assume a presidência do STF a partir de hoje, até o fim da semana.
Quem manda
Quem acompanha as negociações do PMDB para emplacar um indicado no Ministério da Integração Nacional registra que os nomes cotados ainda não passaram pelo crivo do ex-presidente José Sarney.
Antiterror
Deputados e senadores envolvidos na elaboração do projeto de lei que tipifica o crime de terrorismo no Brasil se reúnem nesta semana para finalizar o texto. Eles querem incluir no projeto dispositivo para que atos de movimentos sociais não sejam enquadrados na lei.
Tiroteio
O Brasil democrático torce para que Marina consiga cumprir as exigências legais. O país merece tê-la como mais uma alternativa.
DO SENADOR AÉCIO NEVES (MG), presidente do PSDB e pré-candidato do partido à Presidência, sobre o prazo para que a ex-senadora crie a Rede.
Contraponto
Por que não disse antes?
Eduardo Campos (PSB-PE) fazia uma viagem num pequeno avião particular para quatro passageiros na campanha de 2006 ao governo, quando uma turbulência fez a aeronave balançar. Campos questionou o piloto sobre as condições de voo, e ele respondeu:
-Fique tranquilo. Este avião só caiu uma vez!
E contou que aquela era a aeronave na qual o deputado Raul Henry sofrera o acidente que lhe tirou a visão parcialmente, quatro anos antes.
Campos cumpriu a agenda, mas comunicou à equipe:
-Vamos voltar de carro.
Temporada de cortejo - DENISE ROTHENBURG
Correio Braziliense - 23/09
Assim como o PT custou a cortejar o PSB, os tucanos ainda não fizeram qualquer gesto de grande apreço a José Serra e, a 12 dias do prazo fatal, as apostas são as de que esse galanteio dificilmente ocorrerá
O verbo cortejar é quase que sinônimo de política. Afinal, conquistar aliados nesse ramo é fundamental e requer a arte de atrair o outro para o seu projeto, de forma a que ele se sinta parte. A 12 dias do prazo de filiação partidária para os candidatos de 2014, a temporada é de exercitar essa capacidade.
Vejamos o que foi feito até aqui nesse quesito pelos principais atores. O PT, por exemplo, parece ter chegado tarde demais no que se refere a honras e galanteios políticos em torno do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Por mais que Lula se reúna com o ministro da Integração, Fernando Bezerra Coelho, o ex-presidente sabe que essa fase de manter o PSB no governo passou.
Ficar no governo depois de todo o carnaval em torno da saída soaria apenas jogo de cena por parte de Eduardo. E se tem uma coisa que o governador não faz é beicinho para ganhar um cargo. Afinal, todas as atitudes dele têm sido no sentido de mostrar que seu partido tem posições e é diferente dos demais aliados do governo Dilma.
O único discurso que poderia servir para manter Eduardo Campos ao lado do PT agora é o de não servir de escada para candidatos da direita ou que não tenham um projeto de modernização do país, com mais qualidade de vida, busca de educação e saúde públicas de excelência. Até aqui, nenhum dos adversários de Dilma tem esse perfil, ou se mostra disposto a comprometer programas sociais consolidados, caso do Bolsa Família.
A ex-ministra senadora Marina Silva, segunda colocada em todas as pesquisas, saiu do PT e tem um projeto de economia sustentável. Aécio Neves esteve, desde sempre, ao lado daqueles que trabalharam a redemocratização do Brasil. Hoje, representa o partido que implantou o Plano Real. Embora muitos discordem, o Plano Real promoveu a ascensão de muitos na escala social brasileira e deu a largada dos programas sociais. Para completar, em várias oportunidades recentes, Aécio deixou claro que o Bolsa Família e outros programas em curso vieram para ficar. Em suma, a agenda agora requer outros pré-requisitos, em especial, na economia.
Por falar em PSDB...
Da mesma forma que o cortejo do PT ao PSB chegou tarde, não se percebeu, até o momento, nenhum forte movimento do PSDB no sentido de cortejar José Serra. Se, nesta semana, nada for feito, o mais provável é que Serra deixe o ninho tucano. Afinal, parece que, pela primeira vez, o incômodo de Serra com os tucanos é grande e vice-versa.
Se Serra ficar no partido e for candidato a deputado federal, certamente tirará votos de vários tucanos em todo o estado. Se concorrer ao Senado, disputará uma campanha difícil, talvez contra Eduardo Suplicy, que, embora desgastado dentro do PT, jamais perdeu uma eleição para senador.
A alternativa de aguardar para ver se o PSDB faz dele candidato a presidente da Republica lá na frente é inviável, basta ver as entrevistas de Fernando Henrique Cardoso sobre a necessidade de renovação. Ou seja, se nada for feito esta semana, talvez Serra saia mesmo do PSDB para, quem sabe, no futuro próximo, ser cortejado por seu antigo partido.
Enquanto isso, no QG da Rede...
Parece ironia. A Rede é um partido que, oficialmente, ainda não existe, mas, a curto prazo, ninguém deixa de falar dele. Isso, para integrantes do futuro partido, significa que Marina Silva foi bem no cortejo a seus apoiadores, na manutenção de simpatizantes entre os eleitores, teve forte presença na mídia e tudo mais. Faltou a Justiça Eleitoral. Agora, vai tentar via Supremo Tribunal Federal. Pode apostar.
E no Planalto...
Com Dilma fora nos próximos dias — ela participará da abertura da Assembleia Geral da Nações Unidas —, o vice-presidente, Michel Temer, assume com a missão de apaziguar o PMDB na briga pelo Ministério da Integração Nacional. O problema é que, em se tratando de cortejo, os peemedebistas sempre passam a impressão de não ter agrado, não há discurso que dê jeito. Sempre querem mais. A ordem no governo é atender a ala em que o estrago da insatisfação seja menor. Mas essa é outra história.
Assim como o PT custou a cortejar o PSB, os tucanos ainda não fizeram qualquer gesto de grande apreço a José Serra e, a 12 dias do prazo fatal, as apostas são as de que esse galanteio dificilmente ocorrerá
O verbo cortejar é quase que sinônimo de política. Afinal, conquistar aliados nesse ramo é fundamental e requer a arte de atrair o outro para o seu projeto, de forma a que ele se sinta parte. A 12 dias do prazo de filiação partidária para os candidatos de 2014, a temporada é de exercitar essa capacidade.
Vejamos o que foi feito até aqui nesse quesito pelos principais atores. O PT, por exemplo, parece ter chegado tarde demais no que se refere a honras e galanteios políticos em torno do governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB). Por mais que Lula se reúna com o ministro da Integração, Fernando Bezerra Coelho, o ex-presidente sabe que essa fase de manter o PSB no governo passou.
Ficar no governo depois de todo o carnaval em torno da saída soaria apenas jogo de cena por parte de Eduardo. E se tem uma coisa que o governador não faz é beicinho para ganhar um cargo. Afinal, todas as atitudes dele têm sido no sentido de mostrar que seu partido tem posições e é diferente dos demais aliados do governo Dilma.
O único discurso que poderia servir para manter Eduardo Campos ao lado do PT agora é o de não servir de escada para candidatos da direita ou que não tenham um projeto de modernização do país, com mais qualidade de vida, busca de educação e saúde públicas de excelência. Até aqui, nenhum dos adversários de Dilma tem esse perfil, ou se mostra disposto a comprometer programas sociais consolidados, caso do Bolsa Família.
A ex-ministra senadora Marina Silva, segunda colocada em todas as pesquisas, saiu do PT e tem um projeto de economia sustentável. Aécio Neves esteve, desde sempre, ao lado daqueles que trabalharam a redemocratização do Brasil. Hoje, representa o partido que implantou o Plano Real. Embora muitos discordem, o Plano Real promoveu a ascensão de muitos na escala social brasileira e deu a largada dos programas sociais. Para completar, em várias oportunidades recentes, Aécio deixou claro que o Bolsa Família e outros programas em curso vieram para ficar. Em suma, a agenda agora requer outros pré-requisitos, em especial, na economia.
Por falar em PSDB...
Da mesma forma que o cortejo do PT ao PSB chegou tarde, não se percebeu, até o momento, nenhum forte movimento do PSDB no sentido de cortejar José Serra. Se, nesta semana, nada for feito, o mais provável é que Serra deixe o ninho tucano. Afinal, parece que, pela primeira vez, o incômodo de Serra com os tucanos é grande e vice-versa.
Se Serra ficar no partido e for candidato a deputado federal, certamente tirará votos de vários tucanos em todo o estado. Se concorrer ao Senado, disputará uma campanha difícil, talvez contra Eduardo Suplicy, que, embora desgastado dentro do PT, jamais perdeu uma eleição para senador.
A alternativa de aguardar para ver se o PSDB faz dele candidato a presidente da Republica lá na frente é inviável, basta ver as entrevistas de Fernando Henrique Cardoso sobre a necessidade de renovação. Ou seja, se nada for feito esta semana, talvez Serra saia mesmo do PSDB para, quem sabe, no futuro próximo, ser cortejado por seu antigo partido.
Enquanto isso, no QG da Rede...
Parece ironia. A Rede é um partido que, oficialmente, ainda não existe, mas, a curto prazo, ninguém deixa de falar dele. Isso, para integrantes do futuro partido, significa que Marina Silva foi bem no cortejo a seus apoiadores, na manutenção de simpatizantes entre os eleitores, teve forte presença na mídia e tudo mais. Faltou a Justiça Eleitoral. Agora, vai tentar via Supremo Tribunal Federal. Pode apostar.
E no Planalto...
Com Dilma fora nos próximos dias — ela participará da abertura da Assembleia Geral da Nações Unidas —, o vice-presidente, Michel Temer, assume com a missão de apaziguar o PMDB na briga pelo Ministério da Integração Nacional. O problema é que, em se tratando de cortejo, os peemedebistas sempre passam a impressão de não ter agrado, não há discurso que dê jeito. Sempre querem mais. A ordem no governo é atender a ala em que o estrago da insatisfação seja menor. Mas essa é outra história.
Casa para Amarildo - ANCELMO GOIS
O GLOBO - 23/09
Dia 8 de outubro, haverá um jantar de adesão na casa de Paula Lavigne. Custa R$ 500 o lugar à mesa. O jantar será seguido de um leilão de objetos e obras de arte, inclusive este polêmico quadro (foto) do artista Carlos Latuff, que retrata um negro crucificado sendo baleado por um policial. Marisa Monte vai doar para o leilão um instrumento musical.
A ideia é arrecadar pelo menos R$ 50 mil para a compra de uma casa para a família de Amarildo, o pedreiro desaparecido após uma abordagem pela polícia da UPP da Rocinha.
Segue...
Além de Paula, o grupo responsável pela iniciativa tem o desembargador Siro Darlan, o juiz João Damasceno, Pedro Lavigne, Caetano Veloso, Marisa Monte, Marcia Fortes, Pedro Tourinho e Márcio Botner.
Gois no rock I
Roberto Medina quer levar o Rock in Rio para o Oriente Médio.
Salada bolivariana
A escolha de Raymundo Magno para embaixador em La Paz subiu no telhado. O que se diz na Rádio Corredor é que o governo voltou atrás e vai mandar para lá o embaixador Guilherme Patriota, irmão caçula do ex-chanceler Antonio Patriota.
Veja só...
Guilherme havia sido mandado para trabalhar na ONU.
Mas a chefia da representação terminou entregue ao irmão, como prêmio de compensação. O Itamaraty, então, achou melhor evitar, digamos, nepotismo e pôr Guilherme em outro posto.
Enfim, juntos
No dia 1º, agora, Lula e FH vão participar das homenagens pela passagem dos 25 anos da Constituição Federal, na sede da OAB.
No ato haverá duas homenagens póstumas: Ulysses Guimarães e Mario Covas, ambos constituintes de 1988.
Lá vêm os noivos
A atriz Andréa Beltrão e o diretor Maurício Farias, que vivem juntos há anos e têm três filhos, vão se casar no dia 26 de outubro, no Clube dos Marimbás.
Gois no rock II
Roberto Medina, ao chamar Bruce Springsteen para tocar no festival, contrariou pesquisas que apontavam que o cantor não estava em alta. Mas, sábado, ele levou o público ao delírio:
— O show de Bruce só se compara ao de Fred Mercury no Rock in Rio em 1985. Eles entraram para a História.
Um luxo só
Paulo Coelho e a mulher, Cristina Oiticica, já começaram a enviar convites para comemoração, em 2014, do Dia de São José.
No dia 19 de março, vão festejar em Cascais, em Portugal. Ano passado foi em Veneza, e este ano foi na Grécia.
As polacas
Autora do livro “Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição”, a historiadora Beatriz Kushnir volta a denunciar o descaso com o Cemitério Israelita de Inhaúma, no Rio, o das Polacas:
— Mesmo tombado, o cemitério continua na cobiça da Sociedade Israelita Comunal do Caju, que volta a assediar para o que considera um terreno vazio. Para tal, quer cercar as lápides lá existentes e “purificar” o terreno.
E conclui:
— Pelo amor de Deus, deixemos aquelas mulheres descansarem em paz. Cabe à Comunidade Judaica Carioca é preservar o cemitério limpo e digno.
Gois no rock III
O uísque Jack Daniel's não desembolsou um centavo em patrocínio no Rock in Rio. Mas a sua marca estava em camisetas pretas na Cidade do Rock. A ligação desse uísque com o rock é antiga.
Shows históricos
A Universal Music lançará em 2014, em CDs, um box com três shows inéditos e históricos de Gal Costa.
São os clássicos “Índia”, “Gal canta Caymmi” e “Cantar”, com a participação especial de João Donato. O projeto é do pesquisador Rodrigo Faour.
Gois no rock IV
O secretário de Governo, Pedro Paulo, explicou por que Eduardo Paes não foi sábado ao Rock in Rio:
— A mulher dele viajou, e ele teve que ficar de babá dos filhos.
Gois no rock V
De um senhorzinho gaiato que entrou no banheiro, sábado, no Rock in Rio, e viu os mictórios ovais vazios e uma fila de marmanjos esperando a vez de entrar na cabine: “Será que todo mundo aqui tem pinto pequeno?”
Há testemunhas.
A ideia é arrecadar pelo menos R$ 50 mil para a compra de uma casa para a família de Amarildo, o pedreiro desaparecido após uma abordagem pela polícia da UPP da Rocinha.
Segue...
Além de Paula, o grupo responsável pela iniciativa tem o desembargador Siro Darlan, o juiz João Damasceno, Pedro Lavigne, Caetano Veloso, Marisa Monte, Marcia Fortes, Pedro Tourinho e Márcio Botner.
Gois no rock I
Roberto Medina quer levar o Rock in Rio para o Oriente Médio.
Salada bolivariana
A escolha de Raymundo Magno para embaixador em La Paz subiu no telhado. O que se diz na Rádio Corredor é que o governo voltou atrás e vai mandar para lá o embaixador Guilherme Patriota, irmão caçula do ex-chanceler Antonio Patriota.
Veja só...
Guilherme havia sido mandado para trabalhar na ONU.
Mas a chefia da representação terminou entregue ao irmão, como prêmio de compensação. O Itamaraty, então, achou melhor evitar, digamos, nepotismo e pôr Guilherme em outro posto.
Enfim, juntos
No dia 1º, agora, Lula e FH vão participar das homenagens pela passagem dos 25 anos da Constituição Federal, na sede da OAB.
No ato haverá duas homenagens póstumas: Ulysses Guimarães e Mario Covas, ambos constituintes de 1988.
Lá vêm os noivos
A atriz Andréa Beltrão e o diretor Maurício Farias, que vivem juntos há anos e têm três filhos, vão se casar no dia 26 de outubro, no Clube dos Marimbás.
Gois no rock II
Roberto Medina, ao chamar Bruce Springsteen para tocar no festival, contrariou pesquisas que apontavam que o cantor não estava em alta. Mas, sábado, ele levou o público ao delírio:
— O show de Bruce só se compara ao de Fred Mercury no Rock in Rio em 1985. Eles entraram para a História.
Um luxo só
Paulo Coelho e a mulher, Cristina Oiticica, já começaram a enviar convites para comemoração, em 2014, do Dia de São José.
No dia 19 de março, vão festejar em Cascais, em Portugal. Ano passado foi em Veneza, e este ano foi na Grécia.
As polacas
Autora do livro “Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição”, a historiadora Beatriz Kushnir volta a denunciar o descaso com o Cemitério Israelita de Inhaúma, no Rio, o das Polacas:
— Mesmo tombado, o cemitério continua na cobiça da Sociedade Israelita Comunal do Caju, que volta a assediar para o que considera um terreno vazio. Para tal, quer cercar as lápides lá existentes e “purificar” o terreno.
E conclui:
— Pelo amor de Deus, deixemos aquelas mulheres descansarem em paz. Cabe à Comunidade Judaica Carioca é preservar o cemitério limpo e digno.
Gois no rock III
O uísque Jack Daniel's não desembolsou um centavo em patrocínio no Rock in Rio. Mas a sua marca estava em camisetas pretas na Cidade do Rock. A ligação desse uísque com o rock é antiga.
Shows históricos
A Universal Music lançará em 2014, em CDs, um box com três shows inéditos e históricos de Gal Costa.
São os clássicos “Índia”, “Gal canta Caymmi” e “Cantar”, com a participação especial de João Donato. O projeto é do pesquisador Rodrigo Faour.
Gois no rock IV
O secretário de Governo, Pedro Paulo, explicou por que Eduardo Paes não foi sábado ao Rock in Rio:
— A mulher dele viajou, e ele teve que ficar de babá dos filhos.
Gois no rock V
De um senhorzinho gaiato que entrou no banheiro, sábado, no Rock in Rio, e viu os mictórios ovais vazios e uma fila de marmanjos esperando a vez de entrar na cabine: “Será que todo mundo aqui tem pinto pequeno?”
Há testemunhas.
ESPELHO QUEBRADO - MÔNICA BERGAMO
FOLHA DE SP - 23/09
As brasileiras não se veem na propaganda da TV: 56% delas acreditam que as peças publicitárias não mostram a mulher da vida real, de acordo com pesquisa feita pelo Data Popular em parceria com o Instituto Patrícia Galvão.
LOIRA
Para 39% das 779 entrevistadas, a mulher nunca é apresentada como inteligente; 57% acham que aparecem como objeto sexual e 84% dizem que o corpo feminino é "usado para promover a venda de produtos na TV". Mais de 70% veem mais loiras e de olhos claros, e mais de 80%, mulheres magras, brancas e de cabelos lisos nas propagandas. Segundo o IBGE, 51% da população se declara negra ou parda.
TUDO DIFERENTE
E 61% dizem que as mulheres se sentem frustradas por não terem o padrão de beleza mostrado nas propagandas de televisão.
ELA DISSE, ELE DISSE
A pesquisa também revela que elas se enxergam de forma bem diferente do modo que os homens as veem: 52% consideram ter seios pequenos, mas 54% dos homens "veem seios grandes nas mulheres ao seu redor"; 50% acham que têm bumbum pequeno, enquanto 60% dos homens veem o contrário; 52% delas se acham retas. Já 61% dos homens acham que elas têm, sim, muitas curvas.
DESPEDIDA
Na esteira das mudanças que a presidente Dilma Rousseff fará no governo a partir da virada do ano --pelo menos 12 ministros devem sair para disputar governos estaduais ou vagas no Senado--, até mesmo Aloizio Mercadante pode deixar o MEC (Ministério da Educação).
O CARA
Ele poderia sair do cargo em meados de 2014, para coordenar a campanha de reeleição de Dilma. De acordo com um interlocutor frequente da presidente, o ministro é um dos poucos quadros que desfruta da confiança plena dela, tem bom diálogo com Lula e também com o publicitário João Santana, que coordenará o marketing do PT na disputa eleitoral.
METRO QUADRADO
Um apartamento em bairro nobre de São Paulo pode custar o dobro de um similar em Orlando, nos EUA. Enquanto imóveis de três dormitórios na cidade americana são oferecidos por valores que variam entre R$ 414 mil e R$ 575 mil, unidades do mesmo padrão em locais como Morumbi, Jardins, Campo Belo e Vila Nova Conceição chegam a ultrapassar R$ 1 milhão, segundo levantamento da Lello.
METRO QUADRADO 2
A empresa de administração imobiliária, que atua nas duas cidades, constatou aumento de 42% no interesse de brasileiros por imóveis em Miami e Orlando no primeiro semestre, em relação ao mesmo período do ano passado. Nos últimos meses, o dólar variou bastante, o que pode afetar os preços em reais.
PÉ NO CHÃO
Depois de sofrer um acidente, o artista plástico Vik Muniz decidiu vender as duas motocicletas que tinha --uma ficava no Brasil e a outra, nos EUA. "Cair de moto aos 15, aos 25 ou aos 35 é uma coisa. Aos 52 já é bem diferente. Eu nunca tinha ficado inconsciente. Dessa vez, fiquei um dia inteiro desacordado. Quando abri os olhos não me lembrava de nada. Não gostei nem um pouco da sensação."
PÉ NA ESTRADA
O artista está plenamente recuperado e pronto para viajar. Em março do próximo ano, Vik abrirá exposição no Museu de Tel Aviv, em Israel. E, em abril, fará mostra no Japão, em parceria com o arquiteto Toyo Ito, na área que foi devastada pelo tsunami em 2011. "Fomos convidados para revitalizar o local e levar boas energias de volta àquele lugar", diz ele.
FASHION
Aos 50 anos de vida nos quadrinhos, Mônica é a estrela do editorial de moda da revista "L'Officiel" de outubro; a personagem de Mauricio de Sousa usa criações de estilistas famosos como Alexandre Herchcovitch
ENCONTRO DAS LETRAS
A romancista Patrícia Melo foi homenageada na primeira edição do Pauliceia Literária - Festival Internacional de Literatura, realizado na AASP (Associação dos Advogados de São Paulo). O escritor português Valter Hugo Mãe e o autor americano Scott Turow participaram do evento, que contou com a presença dos advogados Antônio Cláudio Mariz de Oliveira e José Diogo Bastos Neto com a namorada, a empresária Patricia Filardi.
BOA MESA
O chef Jun Sakamoto preparou, em conjunto com cozinheiros japoneses, o cardápio do 7º Sukiyaki do Bem, no hotel Tivoli Mofarrej. Os velejadores Lars Grael e Amyr Klink com a mulher, Marina Bandeira Klink, estiveram no jantar. A atriz Lisandra Souto e o ex-ministro Shigeaki Ueki também compareceram.
CURTO-CIRCUITO
O Comitê Voluntário de Apoio à Gestão Esportiva se reúne hoje, às 18h, na sede do Sindi-Clube, na avenida Indianópolis.
A mostra "Doc Gastronômica", que exibe filmes sobre comida, começa hoje, às 18h, no Cine Livraria Cultura. Grátis. 18 anos.
O cineasta João Batista de Andrade lança hoje o livro "Confinados", às 19h, na livraria Saraiva do shopping Paulista.
O parque do Povo recebe o primeiro karaokê colaborativo no dia 29, às 11h. Grátis.
LOIRA
Para 39% das 779 entrevistadas, a mulher nunca é apresentada como inteligente; 57% acham que aparecem como objeto sexual e 84% dizem que o corpo feminino é "usado para promover a venda de produtos na TV". Mais de 70% veem mais loiras e de olhos claros, e mais de 80%, mulheres magras, brancas e de cabelos lisos nas propagandas. Segundo o IBGE, 51% da população se declara negra ou parda.
TUDO DIFERENTE
E 61% dizem que as mulheres se sentem frustradas por não terem o padrão de beleza mostrado nas propagandas de televisão.
ELA DISSE, ELE DISSE
A pesquisa também revela que elas se enxergam de forma bem diferente do modo que os homens as veem: 52% consideram ter seios pequenos, mas 54% dos homens "veem seios grandes nas mulheres ao seu redor"; 50% acham que têm bumbum pequeno, enquanto 60% dos homens veem o contrário; 52% delas se acham retas. Já 61% dos homens acham que elas têm, sim, muitas curvas.
DESPEDIDA
Na esteira das mudanças que a presidente Dilma Rousseff fará no governo a partir da virada do ano --pelo menos 12 ministros devem sair para disputar governos estaduais ou vagas no Senado--, até mesmo Aloizio Mercadante pode deixar o MEC (Ministério da Educação).
O CARA
Ele poderia sair do cargo em meados de 2014, para coordenar a campanha de reeleição de Dilma. De acordo com um interlocutor frequente da presidente, o ministro é um dos poucos quadros que desfruta da confiança plena dela, tem bom diálogo com Lula e também com o publicitário João Santana, que coordenará o marketing do PT na disputa eleitoral.
METRO QUADRADO
Um apartamento em bairro nobre de São Paulo pode custar o dobro de um similar em Orlando, nos EUA. Enquanto imóveis de três dormitórios na cidade americana são oferecidos por valores que variam entre R$ 414 mil e R$ 575 mil, unidades do mesmo padrão em locais como Morumbi, Jardins, Campo Belo e Vila Nova Conceição chegam a ultrapassar R$ 1 milhão, segundo levantamento da Lello.
METRO QUADRADO 2
A empresa de administração imobiliária, que atua nas duas cidades, constatou aumento de 42% no interesse de brasileiros por imóveis em Miami e Orlando no primeiro semestre, em relação ao mesmo período do ano passado. Nos últimos meses, o dólar variou bastante, o que pode afetar os preços em reais.
PÉ NO CHÃO
Depois de sofrer um acidente, o artista plástico Vik Muniz decidiu vender as duas motocicletas que tinha --uma ficava no Brasil e a outra, nos EUA. "Cair de moto aos 15, aos 25 ou aos 35 é uma coisa. Aos 52 já é bem diferente. Eu nunca tinha ficado inconsciente. Dessa vez, fiquei um dia inteiro desacordado. Quando abri os olhos não me lembrava de nada. Não gostei nem um pouco da sensação."
PÉ NA ESTRADA
O artista está plenamente recuperado e pronto para viajar. Em março do próximo ano, Vik abrirá exposição no Museu de Tel Aviv, em Israel. E, em abril, fará mostra no Japão, em parceria com o arquiteto Toyo Ito, na área que foi devastada pelo tsunami em 2011. "Fomos convidados para revitalizar o local e levar boas energias de volta àquele lugar", diz ele.
FASHION
Aos 50 anos de vida nos quadrinhos, Mônica é a estrela do editorial de moda da revista "L'Officiel" de outubro; a personagem de Mauricio de Sousa usa criações de estilistas famosos como Alexandre Herchcovitch
ENCONTRO DAS LETRAS
A romancista Patrícia Melo foi homenageada na primeira edição do Pauliceia Literária - Festival Internacional de Literatura, realizado na AASP (Associação dos Advogados de São Paulo). O escritor português Valter Hugo Mãe e o autor americano Scott Turow participaram do evento, que contou com a presença dos advogados Antônio Cláudio Mariz de Oliveira e José Diogo Bastos Neto com a namorada, a empresária Patricia Filardi.
BOA MESA
O chef Jun Sakamoto preparou, em conjunto com cozinheiros japoneses, o cardápio do 7º Sukiyaki do Bem, no hotel Tivoli Mofarrej. Os velejadores Lars Grael e Amyr Klink com a mulher, Marina Bandeira Klink, estiveram no jantar. A atriz Lisandra Souto e o ex-ministro Shigeaki Ueki também compareceram.
CURTO-CIRCUITO
O Comitê Voluntário de Apoio à Gestão Esportiva se reúne hoje, às 18h, na sede do Sindi-Clube, na avenida Indianópolis.
A mostra "Doc Gastronômica", que exibe filmes sobre comida, começa hoje, às 18h, no Cine Livraria Cultura. Grátis. 18 anos.
O cineasta João Batista de Andrade lança hoje o livro "Confinados", às 19h, na livraria Saraiva do shopping Paulista.
O parque do Povo recebe o primeiro karaokê colaborativo no dia 29, às 11h. Grátis.
Dirceu presidente - PAULO BRIGUET
GAZETA DO POVO - PR - 23/09
Quando enfim tive a certeza de que os mensaleiros ganhariam um segundo julgamento – confesso que até os momentos finais alimentei alguma esperança do contrário –, soltei um longo suspiro e senti uma avassaladora saudade do meu pai. Ah, como eu queria conversar com ele sobre o assunto...
Apesar de sempre ter sido um homem de esquerda, meu pai nunca mais votou no PT depois da morte de Celso Daniel e do escândalo do mensalão. Sobre a recente e desastrosa decisão do STF, tenho certeza de que ele faria a seguinte piada: “Chega de intermediários – José Dirceu presidente!” Seria uma adaptação da piada que circulava entre os esquerdistas pós-1964: “Chega de intermediários – Lincoln Gordon presidente!” (nota: Lincoln Gordon era embaixador dos Estados Unidos à época do golpe militar brasileiro).
O mal que a decisão do STF causou ao país é de tal ordem que, acredito, poderemos dividir a nossa história recente entre antes e depois do livramento dos mensaleiros. Pois é efetivamente disso que se trata: adiar para o dia de São Nunca a punição de um grupo que tomou de assalto as instituições democráticas da República. Corruptos e corruptores de todos os partidos devem estar festejando agora. Se os mensaleiros livraram a cara, quem terá a coragem de deter saqueadores menores do dinheiro público?
Várias imagens me vieram à mente quando recebi a notícia de que José Dirceu e sua turma conseguiram evitar a punição. Os chiliques da senadora Ideli. O mutismo da então ministra Marina. A dancinha da deputada Ângela. Os dólares na cueca do assessor petista. Delúbio e seus “recursos não contabilizados”. A cara de pau de Lula em pedir desculpas ao país, dizer que fora traído e, tempos depois, simplesmente negar a existência do mensalão.
Fato que me chamou a atenção foi o absoluto silêncio das ruas. Desculpe perguntar, mas onde foram parar todos aqueles rebeldes preocupados com o futuro do Brasil? Onde está o gigante desperto? Onde está o grito das ruas? Onde estão os manifestantes, os jovens socialmente engajados, as faixas, os cartazes, os slogans, as palavras de ordem? Onde estão os pacíficos e os vândalos? Onde estão as máscaras do Anonymous? Onde estão os partidos revolucionários? Onde estão os jornalistas emocionados, os advogados ensandecidos, os militantes em fúria? As moças seminuas da Marcha das Vadias, que fim levaram? Os bravos black blocs, a trepidante Mídia Ninja, o antenado Capilé – cadê vocês, camaradas?
Respondo com os melancólicos versos de Manuel Bandeira, que meu pai recitava: “Estão todos dormindo. Dormindo profundamente”.
Quando enfim tive a certeza de que os mensaleiros ganhariam um segundo julgamento – confesso que até os momentos finais alimentei alguma esperança do contrário –, soltei um longo suspiro e senti uma avassaladora saudade do meu pai. Ah, como eu queria conversar com ele sobre o assunto...
Apesar de sempre ter sido um homem de esquerda, meu pai nunca mais votou no PT depois da morte de Celso Daniel e do escândalo do mensalão. Sobre a recente e desastrosa decisão do STF, tenho certeza de que ele faria a seguinte piada: “Chega de intermediários – José Dirceu presidente!” Seria uma adaptação da piada que circulava entre os esquerdistas pós-1964: “Chega de intermediários – Lincoln Gordon presidente!” (nota: Lincoln Gordon era embaixador dos Estados Unidos à época do golpe militar brasileiro).
O mal que a decisão do STF causou ao país é de tal ordem que, acredito, poderemos dividir a nossa história recente entre antes e depois do livramento dos mensaleiros. Pois é efetivamente disso que se trata: adiar para o dia de São Nunca a punição de um grupo que tomou de assalto as instituições democráticas da República. Corruptos e corruptores de todos os partidos devem estar festejando agora. Se os mensaleiros livraram a cara, quem terá a coragem de deter saqueadores menores do dinheiro público?
Várias imagens me vieram à mente quando recebi a notícia de que José Dirceu e sua turma conseguiram evitar a punição. Os chiliques da senadora Ideli. O mutismo da então ministra Marina. A dancinha da deputada Ângela. Os dólares na cueca do assessor petista. Delúbio e seus “recursos não contabilizados”. A cara de pau de Lula em pedir desculpas ao país, dizer que fora traído e, tempos depois, simplesmente negar a existência do mensalão.
Fato que me chamou a atenção foi o absoluto silêncio das ruas. Desculpe perguntar, mas onde foram parar todos aqueles rebeldes preocupados com o futuro do Brasil? Onde está o gigante desperto? Onde está o grito das ruas? Onde estão os manifestantes, os jovens socialmente engajados, as faixas, os cartazes, os slogans, as palavras de ordem? Onde estão os pacíficos e os vândalos? Onde estão as máscaras do Anonymous? Onde estão os partidos revolucionários? Onde estão os jornalistas emocionados, os advogados ensandecidos, os militantes em fúria? As moças seminuas da Marcha das Vadias, que fim levaram? Os bravos black blocs, a trepidante Mídia Ninja, o antenado Capilé – cadê vocês, camaradas?
Respondo com os melancólicos versos de Manuel Bandeira, que meu pai recitava: “Estão todos dormindo. Dormindo profundamente”.
Para todos os gostos - PAULO BROSSARD
ZERO HORA - 23/09
É de justiça salientar que o voto que concluiu pelo cabimento dos embargos não foi um voto dogmático
A semana passada teve de tudo e para todos os gostos. A senhora presidente, por exemplo, cancelou viagem aos Estados Unidos marcada para o próximo mês e ficou frustrada porque um leilão para a concessão de determinada rodovia ninguém compareceu. Após esse fiasco, que parece estar relacionado com as condições estabelecidas pela administração para a concessão, este cuida agora de “fatiar” os leilões de rodovias, ou seja, reduzir nas proporções de modo a facilitar a concretização, fale-se também em a administração reassumir estradas que deveriam ser leiloadas. Variando o tema, a polícia diz ter apurado fraude, mediante falsidade de assinatura em sessão que o rejeitou vetos presidenciais.
Outro acontecimento foi relativo ao mensalão. Como divulgado, 12 pessoas envolvidas neste turbilhão foram condenadas, mas da condenação recorreram e o Supremo Tribunal Federal dividiu-se, meio a meio, quanto ao emprego de duas modalidades recursais denominadas embargos declaratórios e embargos infringentes. Ao décimo primeiro juiz, por sinal o decano da Corte, caberia ultimar o julgamento. No caso, não haveria controvérsia quanto aos embargos declaratórios, mas ela persistiria quanto aos embargos infringentes. Se não estou em erro, predominava a tendência pela aprovação da penalidade e sua consequente e imediata execução, de modo que a admissão de recurso, aliás, de natureza e alcance do primeiro, não era bem vista pela maioria que apoiara a condenação. Para mostrar o grau de envolvimento das pessoas, observo que, não me recordo de alguma manifestação a favor ou contra a decisão que o STF venha a tomar. No caso, porem, um grupo pequeno é verdade, antes mesmo da decisão, passou a estigmatizar o mais alto Tribunal da Nação, dizendo em uma faixa _ “STF vergonha da Nação”; isto antes mesmo de conhecida a decisão.
Considerando a corrente favorável à punição dos mensaleiros, é possível, haver segmentos que desgostem da decisão do STF, entendendo que a admissão de ambos os embargos, pode beneficiar os condenados; no entanto, é de justiça salientar que o voto que concluiu pelo cabimento dos embargos infringentes não foi um voto dogmático, como poderia ser, invocando simplesmente os fundamentos já exarados, mas ele esquadrinhou o problema em todos os seus aspectos; qualquer pessoa pode preferir a orientação agora vencida, mas não poderá dizer que o voto do ministro Celso de Mello não tenha sido minucioso e de inexcedida erudição. Outrossim, a experiência demonstra que há divergências intermináveis, mas elas têm de ser findas. Aliás, quando não haja recurso cabível, ou em outras palavras, quando a decisão for irrecorrível, certa ou não, ela se torna definitiva. A propósito, Rui Barbosa disse o óbvio ao afirmar que, em casos tais, alguém tem o direito de errar em último lugar; o homem erra e com ele os tribunais mais sábios, pois o erro é sempre possível entre homens. Por fim, parece-me oportuno lembrar outra sentença de Rui, pois convém não seja esquecida _ “Quando as leis cessam de proteger nossos adversários, virtualmente, cessam de nos proteger”.
P.S.: Depois de tantas coisas vulgares, ocorre-me dizer ao leitor que tenho em mãos um belo livro, para repetir o professor Luis Augusto Fischer, mas além de belo original e de bom gosto, da primeira à última página, Um Cronista Inesperado, de Luiz Coronel. Poeta e bajeense.
É de justiça salientar que o voto que concluiu pelo cabimento dos embargos não foi um voto dogmático
A semana passada teve de tudo e para todos os gostos. A senhora presidente, por exemplo, cancelou viagem aos Estados Unidos marcada para o próximo mês e ficou frustrada porque um leilão para a concessão de determinada rodovia ninguém compareceu. Após esse fiasco, que parece estar relacionado com as condições estabelecidas pela administração para a concessão, este cuida agora de “fatiar” os leilões de rodovias, ou seja, reduzir nas proporções de modo a facilitar a concretização, fale-se também em a administração reassumir estradas que deveriam ser leiloadas. Variando o tema, a polícia diz ter apurado fraude, mediante falsidade de assinatura em sessão que o rejeitou vetos presidenciais.
Outro acontecimento foi relativo ao mensalão. Como divulgado, 12 pessoas envolvidas neste turbilhão foram condenadas, mas da condenação recorreram e o Supremo Tribunal Federal dividiu-se, meio a meio, quanto ao emprego de duas modalidades recursais denominadas embargos declaratórios e embargos infringentes. Ao décimo primeiro juiz, por sinal o decano da Corte, caberia ultimar o julgamento. No caso, não haveria controvérsia quanto aos embargos declaratórios, mas ela persistiria quanto aos embargos infringentes. Se não estou em erro, predominava a tendência pela aprovação da penalidade e sua consequente e imediata execução, de modo que a admissão de recurso, aliás, de natureza e alcance do primeiro, não era bem vista pela maioria que apoiara a condenação. Para mostrar o grau de envolvimento das pessoas, observo que, não me recordo de alguma manifestação a favor ou contra a decisão que o STF venha a tomar. No caso, porem, um grupo pequeno é verdade, antes mesmo da decisão, passou a estigmatizar o mais alto Tribunal da Nação, dizendo em uma faixa _ “STF vergonha da Nação”; isto antes mesmo de conhecida a decisão.
Considerando a corrente favorável à punição dos mensaleiros, é possível, haver segmentos que desgostem da decisão do STF, entendendo que a admissão de ambos os embargos, pode beneficiar os condenados; no entanto, é de justiça salientar que o voto que concluiu pelo cabimento dos embargos infringentes não foi um voto dogmático, como poderia ser, invocando simplesmente os fundamentos já exarados, mas ele esquadrinhou o problema em todos os seus aspectos; qualquer pessoa pode preferir a orientação agora vencida, mas não poderá dizer que o voto do ministro Celso de Mello não tenha sido minucioso e de inexcedida erudição. Outrossim, a experiência demonstra que há divergências intermináveis, mas elas têm de ser findas. Aliás, quando não haja recurso cabível, ou em outras palavras, quando a decisão for irrecorrível, certa ou não, ela se torna definitiva. A propósito, Rui Barbosa disse o óbvio ao afirmar que, em casos tais, alguém tem o direito de errar em último lugar; o homem erra e com ele os tribunais mais sábios, pois o erro é sempre possível entre homens. Por fim, parece-me oportuno lembrar outra sentença de Rui, pois convém não seja esquecida _ “Quando as leis cessam de proteger nossos adversários, virtualmente, cessam de nos proteger”.
P.S.: Depois de tantas coisas vulgares, ocorre-me dizer ao leitor que tenho em mãos um belo livro, para repetir o professor Luis Augusto Fischer, mas além de belo original e de bom gosto, da primeira à última página, Um Cronista Inesperado, de Luiz Coronel. Poeta e bajeense.
A volta da empáfia - VINICIUS MOTA
FOLHA DE SP - 23/09
SÃO PAULO - O presidente vai melhorar o diálogo com a sociedade, ouvir os empresários, reunir-se com os líderes das siglas que o apoiam no Congresso. Pretende rever o curso de ações polêmicas da administração, num gesto de autocrítica.
No Brasil, esse é o protocolo do governante enfraquecido. Aciona-se a agenda da humildade quando o conjunto das variáveis políticas e econômicas degringola e os índices de popularidade mergulham.
Ocorreu com Dilma Rousseff neste ano, antes mesmo dos protestos de junho. A área econômica, acossada por um surto inflacionário e pela disparada do dólar, tomou certa distância do voluntarismo interventor. Lançou-se ao jogo convencional, em especial no Banco Central.
Diminuíram as declarações desastradas do ministro da Fazenda. O governo flexibilizou exigências que desagradavam investidores na infraestrutura. Autorizou reajustes na gasolina para aliviar o caixa da Petrobras. Com as manifestações, que derrubaram a aprovação do governo, esse ajuste de conduta exacerbou-se e alastrou-se pela administração.
Até que as notícias voltaram a melhorar. O PIB do segundo trimestre cresceu bem. A inflação de julho e agosto deu refresco. O aumento do dólar e dos juros globais mostrou-se efêmero e foi adiado.
A popularidade da presidente recuperou-se, assim como a expectativa de seu desempenho nas eleições de 2014. Até a primeira vitória significativa dos réus petistas no julgamento do mensalão ajuda a animar fileiras do partido da presidente.
E a empáfia voltou. Dilma disse que o governo fará as obras rodoviárias recusadas pelo setor privado nos leilões. Não fará.
O Brasil não melhorou tanto agora, como não tinha piorado tanto em junho. A modorra continua sendo o ritmo do desfile na avenida do desenvolvimento. O retorno da soberba só fará recair mais descrédito na perspectiva de acelerar o passo.
SÃO PAULO - O presidente vai melhorar o diálogo com a sociedade, ouvir os empresários, reunir-se com os líderes das siglas que o apoiam no Congresso. Pretende rever o curso de ações polêmicas da administração, num gesto de autocrítica.
No Brasil, esse é o protocolo do governante enfraquecido. Aciona-se a agenda da humildade quando o conjunto das variáveis políticas e econômicas degringola e os índices de popularidade mergulham.
Ocorreu com Dilma Rousseff neste ano, antes mesmo dos protestos de junho. A área econômica, acossada por um surto inflacionário e pela disparada do dólar, tomou certa distância do voluntarismo interventor. Lançou-se ao jogo convencional, em especial no Banco Central.
Diminuíram as declarações desastradas do ministro da Fazenda. O governo flexibilizou exigências que desagradavam investidores na infraestrutura. Autorizou reajustes na gasolina para aliviar o caixa da Petrobras. Com as manifestações, que derrubaram a aprovação do governo, esse ajuste de conduta exacerbou-se e alastrou-se pela administração.
Até que as notícias voltaram a melhorar. O PIB do segundo trimestre cresceu bem. A inflação de julho e agosto deu refresco. O aumento do dólar e dos juros globais mostrou-se efêmero e foi adiado.
A popularidade da presidente recuperou-se, assim como a expectativa de seu desempenho nas eleições de 2014. Até a primeira vitória significativa dos réus petistas no julgamento do mensalão ajuda a animar fileiras do partido da presidente.
E a empáfia voltou. Dilma disse que o governo fará as obras rodoviárias recusadas pelo setor privado nos leilões. Não fará.
O Brasil não melhorou tanto agora, como não tinha piorado tanto em junho. A modorra continua sendo o ritmo do desfile na avenida do desenvolvimento. O retorno da soberba só fará recair mais descrédito na perspectiva de acelerar o passo.
O ódio como política - JOSE ROBERTO DE TOLEDO
Estado de S.Paulo - 23/09
Nem prós nem contras. Quem mais perde com a prorrogação do julgamento do mensalão são os "muito pelo contrário". A extensão da disputa moral até 2014 reanima a desgastada polarização PT x PSDB no ano da eleição presidencial. Os candidatos que pretendem mudar a agenda e discutir política ou outra coisa, como Marina Silva e Eduardo Campos, têm mais dificuldade de aparecer.
Marina está no meio do julgamento para registrar seu partido - com boa chance de perder. Campos fez um gesto raro, ao abrir mão de cargos e verbas para disputar o poder maior. Ambos tiveram menos destaque na semana passada do que o playboy que tirou o pé da cova do anonimato ao ameaçar enterrar seu carro predileto.
A disputa política continua rodando em falso, cada lado repetindo as mesmas acusações de sempre. A única diferença é a quantidade crescente de bile a espumar nas timelines.
"A corrupção tem hegemonia no debate político. Um acusa o outro de desonesto e isso dinamita as pontes. O clima de ódio prevalece", diz o filósofo Renato Janine Ribeiro. Se o adversário é ladrão, não é preciso discutir. Basta prendê-lo.
O que era uma sensação difusa se materializa nas redes sociais. Seja o Mais Médicos, seja o voto do ministro Celso de Mello no julgamento dos embargos infringentes pelo Supremo Tribunal Federal: qualquer assunto de interesse político vira um Fla-Flu no Twitter e no Facebook. Não há pontos de convergência, nem campo comum para o debate.
Mapas relacionais elaborados pelo Labic.net (Universidade Federal do Espírito Santo), a pedido do Estadão Dados, mostram uma "guetização" dos contendores. Eles tendem a se isolar em redes próprias, que se autoalimentam e reforçam as próprias convicções. São raras as trocas de mensagem entre os polos.
"A polarização aniquila o debate político. Ninguém muda mais de ideia. As pessoas estão blindadas nas suas convicções." A constatação é do titular de Ética e Filosofia Política da principal universidade brasileira, a USP. Mas Janine Ribeiro não é o único acadêmico preocupado com o ódio na política.
O cientista social Marco Antonio Carvalho Teixeira é professor do departamento de Gestão Pública da FGV-SP. Ele pesquisa democracia, participação social e governo. Na sua opinião, o moralismo afasta as pessoas, ao mesmo tempo que "acirra paixões selvagens". Para ele, a polarização provém de como o debate está posto: "É plebiscitário, contra ou a favor, sem ponderar".
A despolarização é possível?
Teixeira acredita que sim, desde que se troque a exclusividade das acusações pelo debate de propostas. "Marina poderia ser o ponto de equilíbrio, mas depende do contexto de sua candidatura." Esse contexto será muito diferente do planejado pela presidenciável se ela não conseguir o registro da Rede.
Sem um partido para chamar de seu, Marina voltaria a ser refém dos burocratas partidários - o que a levou a renunciar às filiações ao PT e, mais recentemente, ao PV. Sem a Rede, seu discurso eleitoral pala renovação pode cair no vazio.
Em tese, a Rede poderia atrair os desiludidos com a política e despolarizar o debate, afirma Janine Ribeiro. Afinal, compartilham a mesma fala e ideia sobre organização social. "Marina e Eduardo Campos estão disputando o legado do PSDB, que me parece sem projeto. Eles poderiam distender o processo", diz.
Na opinião de Janine, quem não gosta de política não está polarizado. "A esperança pode estar neles", completa. O filósofo está descrente, porém, do sucesso da Rede. Faltam não apenas assinaturas de filiados, mas, na sua avaliação, propostas.
Fica no ar a previsão de Marco Antonio Teixeira: "Quanto mais o mensalão estiver perto da eleição, mais moralista vai ser o tom da campanha". E mais o ódio ocupará o lugar da política.
Nem prós nem contras. Quem mais perde com a prorrogação do julgamento do mensalão são os "muito pelo contrário". A extensão da disputa moral até 2014 reanima a desgastada polarização PT x PSDB no ano da eleição presidencial. Os candidatos que pretendem mudar a agenda e discutir política ou outra coisa, como Marina Silva e Eduardo Campos, têm mais dificuldade de aparecer.
Marina está no meio do julgamento para registrar seu partido - com boa chance de perder. Campos fez um gesto raro, ao abrir mão de cargos e verbas para disputar o poder maior. Ambos tiveram menos destaque na semana passada do que o playboy que tirou o pé da cova do anonimato ao ameaçar enterrar seu carro predileto.
A disputa política continua rodando em falso, cada lado repetindo as mesmas acusações de sempre. A única diferença é a quantidade crescente de bile a espumar nas timelines.
"A corrupção tem hegemonia no debate político. Um acusa o outro de desonesto e isso dinamita as pontes. O clima de ódio prevalece", diz o filósofo Renato Janine Ribeiro. Se o adversário é ladrão, não é preciso discutir. Basta prendê-lo.
O que era uma sensação difusa se materializa nas redes sociais. Seja o Mais Médicos, seja o voto do ministro Celso de Mello no julgamento dos embargos infringentes pelo Supremo Tribunal Federal: qualquer assunto de interesse político vira um Fla-Flu no Twitter e no Facebook. Não há pontos de convergência, nem campo comum para o debate.
Mapas relacionais elaborados pelo Labic.net (Universidade Federal do Espírito Santo), a pedido do Estadão Dados, mostram uma "guetização" dos contendores. Eles tendem a se isolar em redes próprias, que se autoalimentam e reforçam as próprias convicções. São raras as trocas de mensagem entre os polos.
"A polarização aniquila o debate político. Ninguém muda mais de ideia. As pessoas estão blindadas nas suas convicções." A constatação é do titular de Ética e Filosofia Política da principal universidade brasileira, a USP. Mas Janine Ribeiro não é o único acadêmico preocupado com o ódio na política.
O cientista social Marco Antonio Carvalho Teixeira é professor do departamento de Gestão Pública da FGV-SP. Ele pesquisa democracia, participação social e governo. Na sua opinião, o moralismo afasta as pessoas, ao mesmo tempo que "acirra paixões selvagens". Para ele, a polarização provém de como o debate está posto: "É plebiscitário, contra ou a favor, sem ponderar".
A despolarização é possível?
Teixeira acredita que sim, desde que se troque a exclusividade das acusações pelo debate de propostas. "Marina poderia ser o ponto de equilíbrio, mas depende do contexto de sua candidatura." Esse contexto será muito diferente do planejado pela presidenciável se ela não conseguir o registro da Rede.
Sem um partido para chamar de seu, Marina voltaria a ser refém dos burocratas partidários - o que a levou a renunciar às filiações ao PT e, mais recentemente, ao PV. Sem a Rede, seu discurso eleitoral pala renovação pode cair no vazio.
Em tese, a Rede poderia atrair os desiludidos com a política e despolarizar o debate, afirma Janine Ribeiro. Afinal, compartilham a mesma fala e ideia sobre organização social. "Marina e Eduardo Campos estão disputando o legado do PSDB, que me parece sem projeto. Eles poderiam distender o processo", diz.
Na opinião de Janine, quem não gosta de política não está polarizado. "A esperança pode estar neles", completa. O filósofo está descrente, porém, do sucesso da Rede. Faltam não apenas assinaturas de filiados, mas, na sua avaliação, propostas.
Fica no ar a previsão de Marco Antonio Teixeira: "Quanto mais o mensalão estiver perto da eleição, mais moralista vai ser o tom da campanha". E mais o ódio ocupará o lugar da política.
Uma nova Lei de Arbitragem - RODRIGO CANDIDO DE OLIVEIRA
O GLOBO - 23/09
Submeter a solução de litígios a pessoas de confiança é uma providência mais do que natural e intuitiva. Um desentendimento pode ser levado ao padre a quem todos respeitam. Ou ao rabino. No caso das tribos indígenas, ao pajé. Ou a um reconhecido especialista na matéria. Um professor, um diplomata, um médico. É o mais experiente, que conhece os problemas e pode resolvê-los de forma que todos entendam e aceitem. Um deles, ou alguns deles juntos, formando um grupo de julgadores.
Isso é Arbitragem. Não levar questões ao Judiciário é a vitória da sociedade, que conseguiu compor o conflito sem submetê-lo ao poder estatal. Apesar de ser um instituto milenar, a Arbitragem sofria enormes resistências no Brasil recente. Mesmo prevista desde muito antes do Código Comercial de 1850, e aplicada com sucesso algumas vezes, havia insegurança por inexistir uma regulação legal específica. Aí veio a lei nº 9.307/96, a nossa Lei de Arbitragem atualmente em vigor.
No entanto, ainda pairava dúvida sobre a sua constitucionalidade. Em dezembro de 2001 o Supremo tribunal Federal declarou a constitucionalidade da lei e, logo após, em 2002, o Brasil ratificou a Convenção de Nova York.
A partir daí, as coisas se desenvolveram em ritmo acelerado, passando a solução por arbitragem a constar de cada vez mais contratos privados. Surgindo problemas na sua execução, as arbitragens foram crescendo de forma exponencial. Arbitragens internas e internacionais.
Arbitragem que funciona significa investimento. Imagine-se a construção de uma hidrelétrica no interior do Brasil. Um fornecedor alemão, especializado em turbinas, quer investir aqui, mas, ao mesmo tempo, eleger para resolver controvérsias uma Câmara Arbitral no exterior. Na França, por exemplo. Nesta hipótese, os brasileiros e os alemães, no caso de um litígio, serão julgados na França, território que não é nem de um e nem de outro. E os árbitros podem ser especialistas americanos, ingleses, neozelandeses, suecos, os que forem escolhidos. Até, claro, brasileiros ou alemães.
Arbitragem é, hoje, condicionante para investimentos estrangeiros. Não ter regras arbitrais confiáveis, ou aplicá-las mal, significa mais uma parcela de custo Brasil.
Visando a aprimorar ainda mais a Lei de Arbitragem em vigor, o Senado Federal instalou, no começo deste ano, uma comissão para elaborar o anteprojeto de uma nova Lei de Arbitragem e Mediação. Os trabalhos já estão no fim, e se aguarda com ansiedade o seu resultado.
Que venha para fortalecer o instituto.
Aprender a política como festa - RENATO JANINE RIBEIRO
VALOR ECONÔMICO - 23/09
Um prefeito que tenha imaginação bem poderia entender que junho de 2013 deu uma grande lição aos governantes, e adotar uma medida inteligente: abrir, dois dias por ano, o espaço público para grandes manifestações políticas. Com data marcada, mas organizadas por entidades independentes ou, mesmo, não organizadas, só com algumas regras básicas de civilidade. Seria uma forma de dar vazão, propriamente política, a tudo o que é protesto ou projeto. Seria uma forma de aprendermos a traduzir em linguagem política nossos descontentamentos ou anseios. Seria uma forma de ocupar o espaço público, geralmente utilitário, como festa. Seria uma forma de aprendermos a fazer política como um espaço de prazer, de alegria - repito: de festa.
Porque este foi um dos lados das recentes manifestações. Em meio a dias de violência de manifestantes (numa primeira fase, mas sempre lembrando que a grande maioria deles foi comedida), um ou mais dias de violência policial (o fatídico 13 de junho, em São Paulo) e dias de violência contra prédios e militantes, houve a grande manifestação, absolutamente pacífica, também na capital paulista, do Largo da Batata. E outras, em outras cidades. A sensação de quem esteve é exultante. Os participantes a descrevem em linguagem que me levou a falar em epifania, em revelação. (Curiosamente, os amigos do Rede Sustentabilidade não gostam do termo; mas eu o mantenho). Porque se manifestava, a seus cinco sentidos, uma apropriação das ruas e avenidas pelo cidadão, melhor ainda, pelo ser humano; lá onde passam carros, ônibus e caminhões, lá onde há regras rígidas de circulação, lá onde a morte ronda constantemente sob a forma de atropelamentos e colisões, triunfou brevemente a lentidão do andar, o prazer do flanar, a alegria do encontrar.
Foram algumas janelas de vida feliz num mês ou dois que conheceram momentos de violência inaceitáveis. Para muitas pessoas, esse tipo de manifestação, que começa com o 1968 francês e irrompe de vez em quando mundo afora, sem causa determinada ou visível, deixa como único legado a festa. Pode ser pouco. Eu, pessoalmente, acho que só isso é pouco: quem bota o mundo de cabeça para baixo não deveria voltar, rápido demais, à rotina. Um carnaval pode fazer vislumbrar que outra experiência de vida pode existir. Mas é este momento "happening" que propicia a revelação. Se muitos apenas se divertem - se alguns até vivem esse dia como uma balada um pouco diferente - outros podem perceber, aí, que dá para reivindicar juntos. E isto é uma das coisas de que o Brasil mais precisa.
Porque nosso hábito é o da queixa individual, que nem chega a ser reclamação. Uma vez, quando um avião que seguia para São Paulo atrasou a ponto de ficar claro que pousaríamos em Guarulhos e não em Congonhas, vi uma fila de passageiros se queixar no balcão da companhia, mas sem unirem as vozes. Vários insultaram os funcionários - e depois, mansos, embarcaram para o aeroporto indesejado. Poucos anos depois, porém, outra experiência redimiu a primeira: vi uma moça reunir cinco ou seis dos passageiros, reclamar delicada mas firmemente com a companhia - e conseguir de volta a aeronave que estava sendo desviada para outro destino. A diferença está numa única palavra: organização. Incluí o depoimento dela, a médica Claudia Coutinho, no programa "A liberdade de organização", que fiz para a TV Futura.
Pode a organização nascer de uma festa? Pode. É preciso unir reclamações. Mas é necessário, sobretudo, sabermos que reclamações dão resultado, desde que feitas em conjunto. Quem se reúne tem mais êxito do que quem se divide. Nossa sociedade é individualista demais. Saber se unir é, para nós, prioridade. Nunca venceremos a corrupção enquistada nos castelos políticos se não desenharmos unidades alternativas a eles.
Agora, organizar em tom de festa é bom. É algo que o Brasil sabe fazer. Sempre se comenta que o carnaval, nossa festa com mais ares de bagunça, é na verdade um prodígio de organização. E no futebol, o esporte mais querido, o esporte que identificamos com a nacionalidade, os jogos começam na hora certa, sem atraso. Dá para misturar alegria e organização. Aliás, se pusermos alegria no convívio, no estar-juntos, teremos maior eficiência, que depende de sermos organizados. E, para completar, lembremos que os norte-americanos dizem "Let us get organized", Vamos nos organizar, quando querem dizer: este problema não pode ser resolvido por pessoas sozinhas, então nos juntaremos para enfrentá-lo.
Volto ao prefeito com imaginação. Uma festa das reivindicações, em que grupos grandes e sobretudo pequenos, até mesmo indivíduos, exponham suas críticas e propostas, ocupando avenidas ou praças da cidade - de qualquer cidade -, pode ser a ocasião de dar voz aos mil pequenos descontentamentos que nos acostumamos a calar. Dia a dia, engolimos frustrações com a baixa qualidade de nossa vida pública, de nossos serviços públicos. Não falar já é ruim. Não ver saída para problemas cruciais só agrava uma sorte de melancolia política que é nossa constante, com raros intervalos de euforia. Nós nos resignamos a muitos problemas, que achamos não terem como sair da vida pessoal e privada - e que são deprimentes. Mas eles podem ser enfrentados e até resolvidos, se soubermos transpô-los para a vida pública e política. É a esperança que o Brasil precisa construir: sair da passividade que nos isola a todos, para uma posição ativa que só existirá na cooperação de muitos. Esta proposta pode parecer ingênua e talvez o seja. Mas indica que podemos ter alegria numa política decente.
Porque este foi um dos lados das recentes manifestações. Em meio a dias de violência de manifestantes (numa primeira fase, mas sempre lembrando que a grande maioria deles foi comedida), um ou mais dias de violência policial (o fatídico 13 de junho, em São Paulo) e dias de violência contra prédios e militantes, houve a grande manifestação, absolutamente pacífica, também na capital paulista, do Largo da Batata. E outras, em outras cidades. A sensação de quem esteve é exultante. Os participantes a descrevem em linguagem que me levou a falar em epifania, em revelação. (Curiosamente, os amigos do Rede Sustentabilidade não gostam do termo; mas eu o mantenho). Porque se manifestava, a seus cinco sentidos, uma apropriação das ruas e avenidas pelo cidadão, melhor ainda, pelo ser humano; lá onde passam carros, ônibus e caminhões, lá onde há regras rígidas de circulação, lá onde a morte ronda constantemente sob a forma de atropelamentos e colisões, triunfou brevemente a lentidão do andar, o prazer do flanar, a alegria do encontrar.
Foram algumas janelas de vida feliz num mês ou dois que conheceram momentos de violência inaceitáveis. Para muitas pessoas, esse tipo de manifestação, que começa com o 1968 francês e irrompe de vez em quando mundo afora, sem causa determinada ou visível, deixa como único legado a festa. Pode ser pouco. Eu, pessoalmente, acho que só isso é pouco: quem bota o mundo de cabeça para baixo não deveria voltar, rápido demais, à rotina. Um carnaval pode fazer vislumbrar que outra experiência de vida pode existir. Mas é este momento "happening" que propicia a revelação. Se muitos apenas se divertem - se alguns até vivem esse dia como uma balada um pouco diferente - outros podem perceber, aí, que dá para reivindicar juntos. E isto é uma das coisas de que o Brasil mais precisa.
Porque nosso hábito é o da queixa individual, que nem chega a ser reclamação. Uma vez, quando um avião que seguia para São Paulo atrasou a ponto de ficar claro que pousaríamos em Guarulhos e não em Congonhas, vi uma fila de passageiros se queixar no balcão da companhia, mas sem unirem as vozes. Vários insultaram os funcionários - e depois, mansos, embarcaram para o aeroporto indesejado. Poucos anos depois, porém, outra experiência redimiu a primeira: vi uma moça reunir cinco ou seis dos passageiros, reclamar delicada mas firmemente com a companhia - e conseguir de volta a aeronave que estava sendo desviada para outro destino. A diferença está numa única palavra: organização. Incluí o depoimento dela, a médica Claudia Coutinho, no programa "A liberdade de organização", que fiz para a TV Futura.
Pode a organização nascer de uma festa? Pode. É preciso unir reclamações. Mas é necessário, sobretudo, sabermos que reclamações dão resultado, desde que feitas em conjunto. Quem se reúne tem mais êxito do que quem se divide. Nossa sociedade é individualista demais. Saber se unir é, para nós, prioridade. Nunca venceremos a corrupção enquistada nos castelos políticos se não desenharmos unidades alternativas a eles.
Agora, organizar em tom de festa é bom. É algo que o Brasil sabe fazer. Sempre se comenta que o carnaval, nossa festa com mais ares de bagunça, é na verdade um prodígio de organização. E no futebol, o esporte mais querido, o esporte que identificamos com a nacionalidade, os jogos começam na hora certa, sem atraso. Dá para misturar alegria e organização. Aliás, se pusermos alegria no convívio, no estar-juntos, teremos maior eficiência, que depende de sermos organizados. E, para completar, lembremos que os norte-americanos dizem "Let us get organized", Vamos nos organizar, quando querem dizer: este problema não pode ser resolvido por pessoas sozinhas, então nos juntaremos para enfrentá-lo.
Volto ao prefeito com imaginação. Uma festa das reivindicações, em que grupos grandes e sobretudo pequenos, até mesmo indivíduos, exponham suas críticas e propostas, ocupando avenidas ou praças da cidade - de qualquer cidade -, pode ser a ocasião de dar voz aos mil pequenos descontentamentos que nos acostumamos a calar. Dia a dia, engolimos frustrações com a baixa qualidade de nossa vida pública, de nossos serviços públicos. Não falar já é ruim. Não ver saída para problemas cruciais só agrava uma sorte de melancolia política que é nossa constante, com raros intervalos de euforia. Nós nos resignamos a muitos problemas, que achamos não terem como sair da vida pessoal e privada - e que são deprimentes. Mas eles podem ser enfrentados e até resolvidos, se soubermos transpô-los para a vida pública e política. É a esperança que o Brasil precisa construir: sair da passividade que nos isola a todos, para uma posição ativa que só existirá na cooperação de muitos. Esta proposta pode parecer ingênua e talvez o seja. Mas indica que podemos ter alegria numa política decente.
Vozes do Brasil - AÉCIO NEVES
FOLHA DE SP - 23/09
Semana passada, vivi uma rica experiência ao participar de um debate ao vivo na internet, com convidados de áreas diversas e internautas de todo o país, sobre os grandes desafios nacionais.
Foi uma conversa franca, na qual ficou claro que o diálogo com a população é um processo necessário, irreversível e saudável. E cada vez mais possível com os novos recursos tecnológicos. São fronteiras ampliadas de interlocução, de uma forma nunca antes experimentada por quem carrega a responsabilidade da representação.
Não há mais ambiente para as verdades inflexíveis, soluções generalistas e discursos retóricos vazios. Para representar o desejo coletivo, é necessário dar espaço e ressonância à voz do outro. A impaciência e a revolta que emanaram das ruas são sintomas de uma sociedade que deseja ser ouvida de verdade e com urgência.
Se quer respostas, o brasileiro deseja também contribuir, participar. Viajando pelo país como presidente do PSDB, o que sinto é uma imensa vontade do cidadão de se engajar num projeto de país realmente transformador. Mesmo com sotaques e regionalismos diversos, perdura o sentimento de uma forte unidade, em um cenário de grande diversidade cultural. Se é fato que a maioria reconhece as conquistas das últimas décadas, a percepção geral é a de que ainda não chegamos lá.
Comerciantes, industriais, jovens de todas as classes sociais, gente que quer empreender e fazer acontecer relatam o cotidiano de um país estrangulado, injusto e desigual, com infraestrutura insuficiente e as mazelas de um governo cada vez mais intervencionista, pesado e pouco eficaz. O pior é o sentimento de que muitas conquistas dos brasileiros estão em risco com o baixo crescimento e a inflação alta.
Foi uma boa conversa, mas ainda insuficiente. Precisamos ouvir mais uns aos outros para a construção de um projeto coletivo, capaz de acolher os diferentes sonhos e esperanças. Entre as muitas certezas revigoradas, trago uma constatação: não há rede oficial de rádio e TV capaz de abafar as vozes do Brasil real.
PS: Não poderia encerrar a coluna de hoje, em que falo de internet, sem manifestar minha solidariedade às atrizes Carol Castro, Rosamaria Murtinho, Nathalia Timberg, Susana Vieira e Bárbara Paz. Para quem não acompanhou, exercendo o legítimo direito de expressão --que deve ser garantido a todo brasileiro, qualquer que seja sua opinião-- elas manifestaram a decepção pessoal com o resultado da votação dos embargos no caso do mensalão. Acabaram vítimas de violentos e injustos ataques realizados pelo exército digital, que, aparelhado, tenta constranger e intimidar todos aqueles que não se alinham às causas do projeto de poder instalado no país.
Semana passada, vivi uma rica experiência ao participar de um debate ao vivo na internet, com convidados de áreas diversas e internautas de todo o país, sobre os grandes desafios nacionais.
Foi uma conversa franca, na qual ficou claro que o diálogo com a população é um processo necessário, irreversível e saudável. E cada vez mais possível com os novos recursos tecnológicos. São fronteiras ampliadas de interlocução, de uma forma nunca antes experimentada por quem carrega a responsabilidade da representação.
Não há mais ambiente para as verdades inflexíveis, soluções generalistas e discursos retóricos vazios. Para representar o desejo coletivo, é necessário dar espaço e ressonância à voz do outro. A impaciência e a revolta que emanaram das ruas são sintomas de uma sociedade que deseja ser ouvida de verdade e com urgência.
Se quer respostas, o brasileiro deseja também contribuir, participar. Viajando pelo país como presidente do PSDB, o que sinto é uma imensa vontade do cidadão de se engajar num projeto de país realmente transformador. Mesmo com sotaques e regionalismos diversos, perdura o sentimento de uma forte unidade, em um cenário de grande diversidade cultural. Se é fato que a maioria reconhece as conquistas das últimas décadas, a percepção geral é a de que ainda não chegamos lá.
Comerciantes, industriais, jovens de todas as classes sociais, gente que quer empreender e fazer acontecer relatam o cotidiano de um país estrangulado, injusto e desigual, com infraestrutura insuficiente e as mazelas de um governo cada vez mais intervencionista, pesado e pouco eficaz. O pior é o sentimento de que muitas conquistas dos brasileiros estão em risco com o baixo crescimento e a inflação alta.
Foi uma boa conversa, mas ainda insuficiente. Precisamos ouvir mais uns aos outros para a construção de um projeto coletivo, capaz de acolher os diferentes sonhos e esperanças. Entre as muitas certezas revigoradas, trago uma constatação: não há rede oficial de rádio e TV capaz de abafar as vozes do Brasil real.
PS: Não poderia encerrar a coluna de hoje, em que falo de internet, sem manifestar minha solidariedade às atrizes Carol Castro, Rosamaria Murtinho, Nathalia Timberg, Susana Vieira e Bárbara Paz. Para quem não acompanhou, exercendo o legítimo direito de expressão --que deve ser garantido a todo brasileiro, qualquer que seja sua opinião-- elas manifestaram a decepção pessoal com o resultado da votação dos embargos no caso do mensalão. Acabaram vítimas de violentos e injustos ataques realizados pelo exército digital, que, aparelhado, tenta constranger e intimidar todos aqueles que não se alinham às causas do projeto de poder instalado no país.
Bolhas em série - PAULO GUEDES
O GLOBO - 23/09
Houve enorme alívio quando Bemanke anunciou, em reunião do Federal Reserve (Fed) na semana passada, que nada muda por enquanto em sua política de estímulo mensal à economia, uma injeção de liquidez de 85 bilhões de dólares por meio da compra de títulos públicos. Os mercados reagiram inebriados à manutenção da droga do dinheiro barato em suas doses habituais.
O século XXI se iniciou com o estouro de uma bolha de investimentos em novas tecnologias. As perdas foram colossais, mas concentradas em pouco mais de dois milhões de investidores no Vale do Silício. A queda das bolsas em 2000-2001 e o colapso dos investimentos em telecomunicações, mídia e internet trouxeram a ameaça de fulminante recuo da produção e do emprego por insuficiência de demanda, desembocando em uma Grande Depressão, como em 1929.
A instabilidade dos investimentos privados na virada do milênio fez ressurgir a extraordinária figura de Keynes. Já em sua reinterpretação da tragédia dos anos 30, Milton Friedman a atribuiu aos erros do Fed, permitindo a degeneração de uma seqüência de quebras de bancos em um buraco negro que engoliu os meios de pagamento e bloqueou o crédito. Por isso, em 2002 o pragmatismo americano apostou na síntese de Keynes e Friedman. Bush, o Senhor da Guerra, disparou os gatilho fiscal, e Greenspan, o Senhor dos Mercados, o gatilho monetário com juros exageradamente baixos por tempo demasiadamente longo. O experimento parecia bem-sucedido: a reaceleração da economia americana e a sincronização do crescimento global no período 2003-2007 em ritmo superior a 4% anuais, even to inédito no pós-guerra.
Mas "o avanço do conhecimento se dá de antigos problemas para novos problemas" dizia Karl Popper. E tivemos novos problemas em 2008-2009. O crash das bolsas, a crise imobiliária, o crunch do crédito, a quebra do sistema financeiro e a asfixia de mais de 200 milhões de consumidores americanos pelo endividamento excessivo ocorreram após doses exageradas de dinheiro barato. Sabemos agora o que teria ocorrido nos anos 30 ante o enfraquecimento dos "animal spirits" o instinto vital dos empreendedores, se o Fed, em vez da paralisia, tivesse ido ao outro extremo, o da hiperatividade. Bolhas em série pela garantia de fornecimento da droga.
A farra e a saúde - DENIS LERRER ROSENFIELD
O Estado de S.Paulo - 23/09
O que tem que ver uma medida provisória (MP) que trata do setor sucroalcooleiro, visando especificamente a Região Nordeste, com nova regulamentação que permite a captação de receitas entre drogarias e farmácias de manipulação? Literalmente, nada!
No entanto, esse é o caso da MP n.º 615, de 2013 - muito apropriadamente denominada pelo Estadão de "farra das MPs", em editorial de 16 de setembro -, ora pendente de sanção pela presidente da República. A situação é surreal!
Interesses dos mais difusos e, às vezes, mais obscuros são contemplados em negociações que têm como objetivo a aprovação de uma MP de interesse do governo. Assuntos que nada têm em comum com o assunto tratado são inseridos arbitrária e açodadamente num texto legal, sem passarem pelos trâmites legislativos ordinários, próprios, por exemplo, de projetos de lei.
Isso faz com que discussões não tenham lugar, o embate e o confronto de opiniões não se realizem e os argumentos pró e contra sejam simplesmente desconsiderados. O que seria o trâmite específico do processo legislativo simplesmente não ocorre, sendo substituído pelo arbítrio de interesses que estavam à espreita de uma oportunidade para se concretizarem.
Trata-se de uma prática que perverte o processo legislativo. É como se o interesse que teme a discussão clara e ordenada, não ousando apresentar-se sob a forma de projeto de lei, pudesse apenas prosperar sob essa forma legal da medida provisória, porém essencialmente distorcida. Um Legislativo que se preze não poderia compactuar com tal tipo de prática. É o próprio processo de criação e elaboração de leis que é sumariamente abandonado.
No caso em questão, o efeito é ainda mais perverso, porque afeta a saúde da população, transformando o texto legal em vigor e até uma resolução da Anvisa, de 2007. O problema é grave: como pode um agregado extemporâneo a uma medida provisória alterar um texto legal, fruto de todo um processo legislativo, e uma resolução posterior da Anvisa tratando da mesma questão? Se há algo a ser mudado, deveria ele seguir os trâmites legislativos normais, e não ser introduzido de forma arbitrária no calor de uma negociação a respeito do setor de cana-de-açúcar e etanol.
Atualmente, drogarias não podem captar receitas com prescrições magistrais, próprias de farmácias de manipulação. O que se visa com isso é manter a qualidade dos produtos manipulados e a saúde da população. Não se trata de uma separação arbitrária, pois ela obedece a formas de produção e personalização de produtos bastante distintas. O que está em questão é o coletivo, e não os interesses setoriais.
Farmácias de manipulação são rigorosamente controladas. Obedecem a uma série de condições e critérios que as distinguem das drogarias. Cada uma delas tem laboratório, farmacêutico responsável, trata os seus clientes de forma individualizada, segue regras sanitárias estritas e obedece a condições rigorosas de conservação de seus produtos. Medicamentos manipulados são únicos e personalizados, distinguindo-se, nesse sentido, dos medicamentos industrializados, que obedecem a outras regras e condições.
Drogarias, por sua vez, vendem medicamentos em série, caracterizando-se pelo comércio de produtos industrializados. Não têm a cultura do produto manipulado, tampouco possuem os laboratórios correspondentes. Logo, não obedecem às regras próprias, sanitárias e laboratoriais, das farmácias de manipulação. Sua atividade é completamente distinta. Só o olhar incauto as identificaria.
Dessa maneira, o agregado introduzido pelo artigo 36 na Medida Provisória 615 visa a abolir essa distinção, fazendo com que as drogarias venham a exercer certas funções das farmácias de manipulação, sem terem as condições de cultura, laboratoriais e sanitárias para tal. O risco daí decorrente pode ser grande para clientes que, inadvertidamente, passem a recorrer a drogarias para adquirirem um produto que lá não é manipulado. Ou seja, sob a forma aparentemente anódina de uma autorização para que drogarias e farmácias possam captar receitas entre si, introduz-se uma grande modificação. Eis o perigo.
Para além dos problemas próprios de conservação dos produtos manipulados e das condições laboratoriais específicas de sua produção, perde-se a cultura da relação pessoal com o cliente e da de produtos únicos, que são individualizados de acordo com as necessidades de cada um. Receituários médicos, odontológicos e veterinários exercem, precisamente, essa função. São prescrições personalizadas. É como se os medicamentos manipulados pudessem vir a ser produzidos em série, industrialmente, o que contraria justamente a sua natureza própria.
Ademais, a autorização de captação de receitas entre estabelecimentos de natureza distinta (farmácias de manipulação e drogarias) faria com que a ação fiscalizadora da autoridade sanitária correspondente se visse sensivelmente enfraquecida. As farmácias de manipulação, que obedecem a uma legislação sanitária estrita, cujo objetivo consiste em preservar a qualidade, a segurança e a eficácia dos seus produtos, ver-se-iam confrontadas com uma situação completamente distinta. Seus medicamentos e suas finalidades próprias de individualização correriam um grande risco, podendo afetar a saúde da população. Quem seria responsável?
Não pode, portanto, vingar, na farra de negociação de uma MP, que o arbitrário vença uma regulamentação legal vigente, que atende às necessidades da população brasileira. Se for para mudar, que todos sejam ouvidos, que os interessados apresentem os seus argumentos, num processo legislativo adequado aos projetos de lei. Os direitos do cidadão seriam, assim, preservados. Urge que a presidente da República vete o artigo 36 da Medida Provisória n.º 615.
O que tem que ver uma medida provisória (MP) que trata do setor sucroalcooleiro, visando especificamente a Região Nordeste, com nova regulamentação que permite a captação de receitas entre drogarias e farmácias de manipulação? Literalmente, nada!
No entanto, esse é o caso da MP n.º 615, de 2013 - muito apropriadamente denominada pelo Estadão de "farra das MPs", em editorial de 16 de setembro -, ora pendente de sanção pela presidente da República. A situação é surreal!
Interesses dos mais difusos e, às vezes, mais obscuros são contemplados em negociações que têm como objetivo a aprovação de uma MP de interesse do governo. Assuntos que nada têm em comum com o assunto tratado são inseridos arbitrária e açodadamente num texto legal, sem passarem pelos trâmites legislativos ordinários, próprios, por exemplo, de projetos de lei.
Isso faz com que discussões não tenham lugar, o embate e o confronto de opiniões não se realizem e os argumentos pró e contra sejam simplesmente desconsiderados. O que seria o trâmite específico do processo legislativo simplesmente não ocorre, sendo substituído pelo arbítrio de interesses que estavam à espreita de uma oportunidade para se concretizarem.
Trata-se de uma prática que perverte o processo legislativo. É como se o interesse que teme a discussão clara e ordenada, não ousando apresentar-se sob a forma de projeto de lei, pudesse apenas prosperar sob essa forma legal da medida provisória, porém essencialmente distorcida. Um Legislativo que se preze não poderia compactuar com tal tipo de prática. É o próprio processo de criação e elaboração de leis que é sumariamente abandonado.
No caso em questão, o efeito é ainda mais perverso, porque afeta a saúde da população, transformando o texto legal em vigor e até uma resolução da Anvisa, de 2007. O problema é grave: como pode um agregado extemporâneo a uma medida provisória alterar um texto legal, fruto de todo um processo legislativo, e uma resolução posterior da Anvisa tratando da mesma questão? Se há algo a ser mudado, deveria ele seguir os trâmites legislativos normais, e não ser introduzido de forma arbitrária no calor de uma negociação a respeito do setor de cana-de-açúcar e etanol.
Atualmente, drogarias não podem captar receitas com prescrições magistrais, próprias de farmácias de manipulação. O que se visa com isso é manter a qualidade dos produtos manipulados e a saúde da população. Não se trata de uma separação arbitrária, pois ela obedece a formas de produção e personalização de produtos bastante distintas. O que está em questão é o coletivo, e não os interesses setoriais.
Farmácias de manipulação são rigorosamente controladas. Obedecem a uma série de condições e critérios que as distinguem das drogarias. Cada uma delas tem laboratório, farmacêutico responsável, trata os seus clientes de forma individualizada, segue regras sanitárias estritas e obedece a condições rigorosas de conservação de seus produtos. Medicamentos manipulados são únicos e personalizados, distinguindo-se, nesse sentido, dos medicamentos industrializados, que obedecem a outras regras e condições.
Drogarias, por sua vez, vendem medicamentos em série, caracterizando-se pelo comércio de produtos industrializados. Não têm a cultura do produto manipulado, tampouco possuem os laboratórios correspondentes. Logo, não obedecem às regras próprias, sanitárias e laboratoriais, das farmácias de manipulação. Sua atividade é completamente distinta. Só o olhar incauto as identificaria.
Dessa maneira, o agregado introduzido pelo artigo 36 na Medida Provisória 615 visa a abolir essa distinção, fazendo com que as drogarias venham a exercer certas funções das farmácias de manipulação, sem terem as condições de cultura, laboratoriais e sanitárias para tal. O risco daí decorrente pode ser grande para clientes que, inadvertidamente, passem a recorrer a drogarias para adquirirem um produto que lá não é manipulado. Ou seja, sob a forma aparentemente anódina de uma autorização para que drogarias e farmácias possam captar receitas entre si, introduz-se uma grande modificação. Eis o perigo.
Para além dos problemas próprios de conservação dos produtos manipulados e das condições laboratoriais específicas de sua produção, perde-se a cultura da relação pessoal com o cliente e da de produtos únicos, que são individualizados de acordo com as necessidades de cada um. Receituários médicos, odontológicos e veterinários exercem, precisamente, essa função. São prescrições personalizadas. É como se os medicamentos manipulados pudessem vir a ser produzidos em série, industrialmente, o que contraria justamente a sua natureza própria.
Ademais, a autorização de captação de receitas entre estabelecimentos de natureza distinta (farmácias de manipulação e drogarias) faria com que a ação fiscalizadora da autoridade sanitária correspondente se visse sensivelmente enfraquecida. As farmácias de manipulação, que obedecem a uma legislação sanitária estrita, cujo objetivo consiste em preservar a qualidade, a segurança e a eficácia dos seus produtos, ver-se-iam confrontadas com uma situação completamente distinta. Seus medicamentos e suas finalidades próprias de individualização correriam um grande risco, podendo afetar a saúde da população. Quem seria responsável?
Não pode, portanto, vingar, na farra de negociação de uma MP, que o arbitrário vença uma regulamentação legal vigente, que atende às necessidades da população brasileira. Se for para mudar, que todos sejam ouvidos, que os interessados apresentem os seus argumentos, num processo legislativo adequado aos projetos de lei. Os direitos do cidadão seriam, assim, preservados. Urge que a presidente da República vete o artigo 36 da Medida Provisória n.º 615.
Suprema hipocrisia - VALDO CRUZ
FOLHA DE SP - 23/09
BRASÍLIA - Frustrante para muitos, correta para outros, a decisão do STF de garantir um novo julgamento a doze réus do mensalão revela a suprema hipocrisia dos políticos brasileiros, sem distinção.
Desde que um dos seus não esteja sentado no banco dos réus, nossos políticos são de uma coragem e braveza sem iguais na defesa da cadeia imediata para criminosos envolvidos em casos de corrupção.
Basta fazer uma pesquisa para encontrar petistas, peemedebistas, tucanos, democratas e afins gritando, em alto e bom som: só pobre vai para cadeia no Brasil, bem-nascidos sempre escapam à custa de advogados milionários que usam e abusam de recursos para protelar a execução de sentenças.
No discurso, tese linda e popular de ser defendida. Na prática, a realidade poderia ser outra, mas nossa classe política sempre evitou atacar de frente tal injustiça. Motivo: o deputado ou senador de hoje pode muito bem ser o réu de amanhã.
Afinal, bastaria que o Congresso aprovasse nova lei reduzindo, de fato, o universo dos recursos judiciais, acabando, por exemplo, com seu uso meramente protelatório.
Mas isso sempre esbarra no instinto de sobrevivência dos nossos parlamentares. Realidade bem exposta pelo ministro Celso de Mello, ao definir que os réus do mensalão terão direito a novo julgamento por meio dos embargos infringentes.
Em 1998, apontou Mello, o Congresso, com o apoio de tucanos, pfelistas e petistas, rejeitou o fim dos embargos infringentes, que hoje servem aos objetivos dos mensaleiros para tentar mudar suas condenações no próprio Supremo.
Não estou discutindo se tais embargos existem ou não, apenas tentando mostrar que não há mocinho nessa história. Afinal, em 98, os congressistas legislaram em causa própria. Ali, rasgaram seus discursos e buscaram se proteger de futuros infortúnios. Para não correrem o risco de ver o sol nascer quadrado.
BRASÍLIA - Frustrante para muitos, correta para outros, a decisão do STF de garantir um novo julgamento a doze réus do mensalão revela a suprema hipocrisia dos políticos brasileiros, sem distinção.
Desde que um dos seus não esteja sentado no banco dos réus, nossos políticos são de uma coragem e braveza sem iguais na defesa da cadeia imediata para criminosos envolvidos em casos de corrupção.
Basta fazer uma pesquisa para encontrar petistas, peemedebistas, tucanos, democratas e afins gritando, em alto e bom som: só pobre vai para cadeia no Brasil, bem-nascidos sempre escapam à custa de advogados milionários que usam e abusam de recursos para protelar a execução de sentenças.
No discurso, tese linda e popular de ser defendida. Na prática, a realidade poderia ser outra, mas nossa classe política sempre evitou atacar de frente tal injustiça. Motivo: o deputado ou senador de hoje pode muito bem ser o réu de amanhã.
Afinal, bastaria que o Congresso aprovasse nova lei reduzindo, de fato, o universo dos recursos judiciais, acabando, por exemplo, com seu uso meramente protelatório.
Mas isso sempre esbarra no instinto de sobrevivência dos nossos parlamentares. Realidade bem exposta pelo ministro Celso de Mello, ao definir que os réus do mensalão terão direito a novo julgamento por meio dos embargos infringentes.
Em 1998, apontou Mello, o Congresso, com o apoio de tucanos, pfelistas e petistas, rejeitou o fim dos embargos infringentes, que hoje servem aos objetivos dos mensaleiros para tentar mudar suas condenações no próprio Supremo.
Não estou discutindo se tais embargos existem ou não, apenas tentando mostrar que não há mocinho nessa história. Afinal, em 98, os congressistas legislaram em causa própria. Ali, rasgaram seus discursos e buscaram se proteger de futuros infortúnios. Para não correrem o risco de ver o sol nascer quadrado.
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