O GLOBO - 30/07
A Olimpíada do Rio encerra também a maratona de Lula correndo da polícia. Daí em diante, a prova é de 100 metros rasos
Dilma e Lula não vão à Olimpíada. Foram pegos no antidoping.
O laboratório da Lava-Jato descobriu que a campanha da presidente afastada derramava milhões de reais numa empresa de fachada do setor de informática, entre outros anabolizantes criminosos. No caso do ex-presidente, uma nova substância ilegal foi atestada em laudo da Polícia Federal — constatando que as reformas no sítio de Lula que não é de Lula foram orientadas pelo próprio. Só a repaginação da cozinha custou 252 mil reais.
O ex-presidente já avisou que não vai deixar barato. De fato, nada que envolva Lula é barato. Perguntem aos laranjas da Odebrecht que compraram um prédio para o Instituto Lula. E lá foi o maior palestrante do mundo para Genebra, com sua comitiva, denunciar à ONU a perseguição que está sofrendo no Brasil.
A elite vermelha está rica, pode rodar o mundo se quiser, alardeando o seu sofrimento, protegida por seus advogados milionários. Há de conseguir uma rede internacional de solidariedade, para que todos tenham direito de matar a fome em cozinhas de luxo, e não falte a ninguém uma empreiteira de estimação.
A ONU é a instância perfeita para o apelo de Lula. É uma entidade recheada de burocratas bem pagos para fomentar a indústria do alarme e da vitimização. Mas a ONU não é perfeita como Lula: parte de suas ações tem efetividade, manchando o ideal do proselitismo 100% parasitário. Deve ter sido um frisson em Genebra a chegada do ídolo brasileiro — que passou 13 anos liderando um governo oprimido, sugando um país inteiro sem perder a ternura, e permanecendo livre, leve e solto, voando por aí. Um mago.
É justamente para continuar livre e solto que Lula foi à ONU. Ele sabe que será condenado por Sérgio Moro. Acaba de virar réu por obstrução de Justiça, no caso Delcídio-Cerveró. Nessas horas é melhor mesmo recorrer aos gigolôs da bondade internacional. É uma turma capaz de ignorar numa boa as obras completas do mensalão e do petrolão, e tratar Lula como um pobre coitado, perseguido por um juiz fascista. A lenda do filho do Brasil cola muito mais fácil do que a do filho adotivo da Odebrecht.
Os plantonistas da solidariedade cenográfica já bateram um bolão na resistência ao golpe contra Dilma. Claro que toda a picaretagem revelada por João Santana não comove essa gente. Nem as confissões da Andrade Gutierrez sobre a rota da propina montada com um assessor direto da companheira afastada, injustiçada e perseguida. Muito menos o buraco em que esses heróis progressistas jogaram o Brasil, escondendo déficits graças à arte da prostituição contábil. Nada disso é crime para os simpáticos jardineiros da fraude.
Os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro representam um momento histórico. Marcarão a demissão definitiva da mulher sapiens, e a devolução ao povo da frota federal que serve sua filha. Ainda tem gente escolarizada defendendo esse escárnio — contando ninguém acredita —, mas são cada vez menos. Até a vocação para o vexame tem seus limites. A Olimpíada do Rio encerra também a maratona de Lula correndo da polícia. Daí em diante, a prova é de 100 metros rasos. Se a democracia ultrapassar a demagogia, o ex-presidente vai ter que pagar pela ação entre amigos que depenou o Brasil.
A opinião pública segue, como sempre, em sua viagem na maionese. Segundo dois grandes institutos de pesquisa, a maioria quer eleições presidenciais antecipadas.
Ou a maioria não conhece a lei, ou não está interessada em cumpri-la. É a renovação da esperança para a escola de malandragem que o país, a tanto custo, está enxotando do poder. Os heróis providenciais estão todos aí, excitadíssimos, para herdar o rebanho petista. São os que, de forma mais ou menos envergonhada, combateram o impeachment da mulher honrada — aí incluídos os puritanos da Rede, PSOL e demais genéricos do PT. Prestem atenção: estarão todos nas eleições municipais atacando o governo de homens velhos, brancos, bobos e feios de Michel Temer.
Esse governo careta, recatado e do lar, que não tem mulher sapiens para divertir a plateia, está arrumando a casa. Não porque Temer seja um iluminado. Ele só percebeu — como Itamar duas décadas antes — que sua única chance era botar os melhores para tomar conta do dinheiro. E botou. Saiu a delinquência fisiológica, entrou a eficiência. É assustador para os parasitas das lendas humanitárias ver a máquina nas mãos de profissionais.
O vento já virou, o Brasil vai melhorar, e isso é terrível. Como na época do Plano Real, os solidários de butique correm o risco de voltar a pregar no deserto, enquanto a vida da população desgraçadamente progride. Quem vai comprar ideologia vagabunda num cenário desses?
Só pedindo socorro à ONU. Mas se apressem, porque depois da Rio 2016 será a hora do xadrez.
Guilherme Fiuza é jornalista
sábado, julho 30, 2016
Lula réu - JOÃO DOMINGOS
ESTADÃO - 30/07
Terá consequências políticas e históricas a decisão do juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite, da 10.ª Vara Federal de Brasília, que ontem recebeu denúncia contra o ex-presidente Lula na investigação sobre a tentativa de obstruir a Justiça. Lula é acusado pelo Ministério Público, juntamente com o ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral, e mais cinco pessoas, de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró.
Três consequências do despacho do magistrado já podem ser sentidas pela reação do mundo político. Em primeiro lugar, a pressão de vários setores sobre o juiz Sérgio Moro, que comanda a Operação Lava Jato, está gerando outros Sérgios Moros.
Isso ficou claro quando, no mês passado, o também juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, de São Paulo, determinou a prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, marido da senadora petista Gleisi Hoffmann (PR), na Operação Custo Brasil.
Agora, quando toda a atenção de Lula e de sua defesa estavam voltadas para o juiz Sérgio Moro, que, anteontem, fora denunciado pelo ex-presidente ao Comitê dos Direitos Humanos da ONU, “por abuso de poder”, um juiz de Brasília torna Lula réu. Não se duvide se em outras regiões do País mais juízes federais tomarem atitude semelhante.
A segunda consequência da determinação do juiz brasiliense diz respeito à movimentação das peças do xadrez político que começa agora, nas eleições municipais de outubro, e se estenderá até as eleições presidenciais de 2018.
O futuro político de Lula passa a ser incerto. Já réu em Brasília, ele pode seguir o mesmo caminho em Curitiba. Caso seja condenado na primeira instância, por um ou por outro juiz, o caminho natural é o recurso ao Tribunal Regional Federal (TRF) da região onde a ação corre. No caso de Curitiba, as decisões do juiz Sérgio Moro têm sido confirmadas pelo TRF da 4.ª Região, que fica em Porto Alegre. Se, em Brasília, a tendência for a de confirmar a decisão do juiz de primeiro grau, como ocorre em Porto Alegre, Lula se tornará ficha-suja, conforme determina a Lei da Ficha Limpa.
Claro que tudo está no terreno da suposição do que pode ocorrer. Mas, como é possível que este seja o caminho, o raciocínio de que Lula poderá ser impedido de concorrer à eleição de 2018 já não é ilógico. Portanto, embora faltem dois anos e dois meses para a próxima eleição presidencial, não dá para dizer que Lula será candidato. Mesmo combalido pelas sucessivas denúncias de envolvimento dele em esquemas esquisitos e tráfico de influência, o ex-presidente ainda é um candidato competitivo.
Em terceiro lugar, a decisão do juiz Ricardo Augusto Leite torna-se um golpe muito duro para o PT e para a presidente afastada Dilma Rousseff. Para o PT porque o partido passa pelo pior momento em seus 36 anos de vida e a tendência é que piore. Com Lula empenhado em se defender numa vara no Centro-Oeste e em outra no Sul, ele terá menos tempo para rodar o Brasil para pedir votos nos candidatos a prefeito pelo PT.
Quanto à presidente afastada, a decisão do juiz de Brasília também a atinge em cheio. O processo de impeachment é político. Por mais que o advogado José Eduardo Cardozo insista em detalhes técnicos na sua defesa, nessas alturas das coisas, a tendência é que os senadores façam associação entre Dilma e Lula e as conversas que tiveram para tornar o ex-presidente ministro, dar-lhe foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF) e livrá-lo das mãos de Moro. O conteúdo da conversa entre Lula e Dilma, vazado por Sérgio Moro, tem muito mais força política do que a insistência de Cardozo em dizer que Dilma não cometeu crime de responsabilidade.
Terá consequências políticas e históricas a decisão do juiz federal Ricardo Augusto Soares Leite, da 10.ª Vara Federal de Brasília, que ontem recebeu denúncia contra o ex-presidente Lula na investigação sobre a tentativa de obstruir a Justiça. Lula é acusado pelo Ministério Público, juntamente com o ex-líder do governo no Senado Delcídio Amaral, e mais cinco pessoas, de tentar comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobrás Nestor Cerveró.
Três consequências do despacho do magistrado já podem ser sentidas pela reação do mundo político. Em primeiro lugar, a pressão de vários setores sobre o juiz Sérgio Moro, que comanda a Operação Lava Jato, está gerando outros Sérgios Moros.
Isso ficou claro quando, no mês passado, o também juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, de São Paulo, determinou a prisão do ex-ministro Paulo Bernardo, marido da senadora petista Gleisi Hoffmann (PR), na Operação Custo Brasil.
Agora, quando toda a atenção de Lula e de sua defesa estavam voltadas para o juiz Sérgio Moro, que, anteontem, fora denunciado pelo ex-presidente ao Comitê dos Direitos Humanos da ONU, “por abuso de poder”, um juiz de Brasília torna Lula réu. Não se duvide se em outras regiões do País mais juízes federais tomarem atitude semelhante.
A segunda consequência da determinação do juiz brasiliense diz respeito à movimentação das peças do xadrez político que começa agora, nas eleições municipais de outubro, e se estenderá até as eleições presidenciais de 2018.
O futuro político de Lula passa a ser incerto. Já réu em Brasília, ele pode seguir o mesmo caminho em Curitiba. Caso seja condenado na primeira instância, por um ou por outro juiz, o caminho natural é o recurso ao Tribunal Regional Federal (TRF) da região onde a ação corre. No caso de Curitiba, as decisões do juiz Sérgio Moro têm sido confirmadas pelo TRF da 4.ª Região, que fica em Porto Alegre. Se, em Brasília, a tendência for a de confirmar a decisão do juiz de primeiro grau, como ocorre em Porto Alegre, Lula se tornará ficha-suja, conforme determina a Lei da Ficha Limpa.
Claro que tudo está no terreno da suposição do que pode ocorrer. Mas, como é possível que este seja o caminho, o raciocínio de que Lula poderá ser impedido de concorrer à eleição de 2018 já não é ilógico. Portanto, embora faltem dois anos e dois meses para a próxima eleição presidencial, não dá para dizer que Lula será candidato. Mesmo combalido pelas sucessivas denúncias de envolvimento dele em esquemas esquisitos e tráfico de influência, o ex-presidente ainda é um candidato competitivo.
Em terceiro lugar, a decisão do juiz Ricardo Augusto Leite torna-se um golpe muito duro para o PT e para a presidente afastada Dilma Rousseff. Para o PT porque o partido passa pelo pior momento em seus 36 anos de vida e a tendência é que piore. Com Lula empenhado em se defender numa vara no Centro-Oeste e em outra no Sul, ele terá menos tempo para rodar o Brasil para pedir votos nos candidatos a prefeito pelo PT.
Quanto à presidente afastada, a decisão do juiz de Brasília também a atinge em cheio. O processo de impeachment é político. Por mais que o advogado José Eduardo Cardozo insista em detalhes técnicos na sua defesa, nessas alturas das coisas, a tendência é que os senadores façam associação entre Dilma e Lula e as conversas que tiveram para tornar o ex-presidente ministro, dar-lhe foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal (STF) e livrá-lo das mãos de Moro. O conteúdo da conversa entre Lula e Dilma, vazado por Sérgio Moro, tem muito mais força política do que a insistência de Cardozo em dizer que Dilma não cometeu crime de responsabilidade.
Crise do emprego - MÍRIAM LEITÃO
O Globo - 30/07
O desemprego voltou a subir em dois indicadores esta semana, o que mede o emprego formal e o dado do IBGE. O país termina o primeiro semestre perdendo mais de meio milhão de empregos formais em seis meses. Desde as eleições, o número de desempregados aumentou em 5 milhões, saindo de 6,5 milhões para 11,5 milhões. Em um ano, a alta foi de 32%, com mais 3,2 milhões de desempregados.
Omercado de trabalho sofre por várias frentes. Há aumento na taxa de desocupação, diminuição do emprego formal, aumento do número de empregados domésticos que haviam tentado outra colocação e agora voltam. Houve um acréscimo de 224 mil pessoas nesta ocupação, num total de 6,2 milhões. O setor industrial fechou 1,4 milhão de vagas em um ano. O rendimento médio real caiu 4,2% em um ano.
É uma devastação o que está acontecendo com o emprego e ainda pode não ter chegado ao fundo do poço. Em toda recessão, o desemprego é a última má notícia a chegar e a última a ir embora. Então, apesar dos pequenos sinais de melhora, os especialistas temem que a crise do emprego esteja longe do fim.
O Brasil tem um mercado de trabalho com problemas conjunturais – derivados da recessão – e tem distorções que se acumularam com o tempo e os erros não corrigidos. O país, ao fim desta crise, precisará encontrar formas de modernizar o ambiente econômico para que haja maior geração de emprego de qualidade.
Há setores que já enxergam alguma luz no fim do túnel. Ontem, a Abinee, do setor de eletroeletrônicos, divulgou que houve fechamento 753 postos de trabalho em junho, na 17ª retração mensal consecutiva. Mas o número deste mês foi 87% menor do que o do mesmo período do ano passado. Em sondagens recentes com empresários do setor, há relatos de melhora da confiança, segundo o presidente da Abinee, Humberto Barbato. O problema é que o nível de emprego atual no setor de eletroeletrônico caiu para 239,8 mil em junho, voltando ao mesmo patamar de fevereiro de 2006.
O Departamento Econômico do Bradesco também avalia que o ritmo de demissões vai diminuir no segundo semestre, e diz que esse nível elevado de desemprego, com queda do rendimento real, vai reduzir a inflação de serviços. A consultoria Rosenberg Associados acredita que o pico do desemprego acontecerá apenas no primeiro trimestre do ano que vem, mesmo que haja alguma recuperação do nível de atividade no segundo semestre.
No debate feito esta semana por este jornal, o sociólogo José Pastore manifestou esperança de que os indicadores comecem a melhorar, principalmente porque o governo terá que investir em obras de infraestrutura para combater a recessão. O economista José Márcio Camargo acha que o índice de desemprego pode chegar a 13% antes de cair. Os especialistas em mercado de trabalho concordam que é indispensável uma mudança radical na legislação, reduzindo-se o excesso de leis, súmulas, regras para se construir um mercado de trabalho dinâmico o suficiente para o momento atual.
Quando se fala com pequenas empresas, já é possível achar boas histórias. O presidente da Eurocolchões, Maurício Aballo, empresa que fabrica, importa e vende colchões no estado do Rio, conta que a rede de lojas da empresa cresceu de 18 para 35 unidades desde 2011. Ele demitiu, reduziu os custos com a folha de pagamentos em 15%, renegociou contratos e aumentou a produtividade. Parou de demitir no início deste ano e espera voltar com as contratações no ano que vem.
O CEO da Guarde Perto, Rodolfo Delgado, uma pequena empresa do segmento de self-storage, conta que conseguiu ampliar seu negócio através de financiamento. A companhia cresceu 59% no primeiro semestre deste ano e no mesmo período do ano passado registrou um aumento em 26%. O crescimento é explicado pela própria crise: empresas e famílias estão reduzindo gastos com aluguéis e guardando parte dos móveis.
É possível encontrar algumas histórias positivas, mas, em geral, o retrato do mercado de trabalho é de destruição de emprego. Ao fim da recessão ainda será preciso corrigir as distorções que se acumularam por décadas.
O desemprego voltou a subir em dois indicadores esta semana, o que mede o emprego formal e o dado do IBGE. O país termina o primeiro semestre perdendo mais de meio milhão de empregos formais em seis meses. Desde as eleições, o número de desempregados aumentou em 5 milhões, saindo de 6,5 milhões para 11,5 milhões. Em um ano, a alta foi de 32%, com mais 3,2 milhões de desempregados.
Omercado de trabalho sofre por várias frentes. Há aumento na taxa de desocupação, diminuição do emprego formal, aumento do número de empregados domésticos que haviam tentado outra colocação e agora voltam. Houve um acréscimo de 224 mil pessoas nesta ocupação, num total de 6,2 milhões. O setor industrial fechou 1,4 milhão de vagas em um ano. O rendimento médio real caiu 4,2% em um ano.
É uma devastação o que está acontecendo com o emprego e ainda pode não ter chegado ao fundo do poço. Em toda recessão, o desemprego é a última má notícia a chegar e a última a ir embora. Então, apesar dos pequenos sinais de melhora, os especialistas temem que a crise do emprego esteja longe do fim.
O Brasil tem um mercado de trabalho com problemas conjunturais – derivados da recessão – e tem distorções que se acumularam com o tempo e os erros não corrigidos. O país, ao fim desta crise, precisará encontrar formas de modernizar o ambiente econômico para que haja maior geração de emprego de qualidade.
Há setores que já enxergam alguma luz no fim do túnel. Ontem, a Abinee, do setor de eletroeletrônicos, divulgou que houve fechamento 753 postos de trabalho em junho, na 17ª retração mensal consecutiva. Mas o número deste mês foi 87% menor do que o do mesmo período do ano passado. Em sondagens recentes com empresários do setor, há relatos de melhora da confiança, segundo o presidente da Abinee, Humberto Barbato. O problema é que o nível de emprego atual no setor de eletroeletrônico caiu para 239,8 mil em junho, voltando ao mesmo patamar de fevereiro de 2006.
O Departamento Econômico do Bradesco também avalia que o ritmo de demissões vai diminuir no segundo semestre, e diz que esse nível elevado de desemprego, com queda do rendimento real, vai reduzir a inflação de serviços. A consultoria Rosenberg Associados acredita que o pico do desemprego acontecerá apenas no primeiro trimestre do ano que vem, mesmo que haja alguma recuperação do nível de atividade no segundo semestre.
No debate feito esta semana por este jornal, o sociólogo José Pastore manifestou esperança de que os indicadores comecem a melhorar, principalmente porque o governo terá que investir em obras de infraestrutura para combater a recessão. O economista José Márcio Camargo acha que o índice de desemprego pode chegar a 13% antes de cair. Os especialistas em mercado de trabalho concordam que é indispensável uma mudança radical na legislação, reduzindo-se o excesso de leis, súmulas, regras para se construir um mercado de trabalho dinâmico o suficiente para o momento atual.
Quando se fala com pequenas empresas, já é possível achar boas histórias. O presidente da Eurocolchões, Maurício Aballo, empresa que fabrica, importa e vende colchões no estado do Rio, conta que a rede de lojas da empresa cresceu de 18 para 35 unidades desde 2011. Ele demitiu, reduziu os custos com a folha de pagamentos em 15%, renegociou contratos e aumentou a produtividade. Parou de demitir no início deste ano e espera voltar com as contratações no ano que vem.
O CEO da Guarde Perto, Rodolfo Delgado, uma pequena empresa do segmento de self-storage, conta que conseguiu ampliar seu negócio através de financiamento. A companhia cresceu 59% no primeiro semestre deste ano e no mesmo período do ano passado registrou um aumento em 26%. O crescimento é explicado pela própria crise: empresas e famílias estão reduzindo gastos com aluguéis e guardando parte dos móveis.
É possível encontrar algumas histórias positivas, mas, em geral, o retrato do mercado de trabalho é de destruição de emprego. Ao fim da recessão ainda será preciso corrigir as distorções que se acumularam por décadas.
Entre o abuso e a impunidade - EDITORIAL ZERO HORA
ZERO HORA - RS - 30/07
Liderados pelo juiz Sergio Moro, magistrados, procuradores da República e promotores do Ministério Público Estadual do Paraná promoveram na última quinta-feira um ato de repúdio ao projeto de lei de autoria do presidente do Senado, Renan Calheiros, que redefine crimes de abuso de autoridade. Entidades de classe como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) também vêm se manifestando reiteradamente contra o projeto, que muda de forma substancial a responsabilização de autoridades. Moro chegou a afirmar que, em caso de aprovação do PLS 280/16, que tem como relator o senador Romero Jucá (PMDB-RR), as investigações contra poderosos serão barradas. Juízes e promotores interpretam o exame parlamentar da matéria como um contra-ataque dos políticos que tentam se livrar das investigações da Operação Lava-Jato — principalmente porque tanto o autor do texto quanto o relator estão entre os investigados.
Realmente, não deixa de ser intrigante que um projeto engavetado desde 2009 tenha voltado a tramitar exatamente no momento em que se trava uma verdadeira disputa de poder entre autoridades políticas e judiciárias, com vários parlamentares sob suspeita de corrupção e um pedido de impeachment contra o procurador-geral da República nas mãos do presidente do Senado. O texto prevê o enquadramento de comportamentos abusivos de delegados, promotores, membros do Ministério Público, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores, prevendo penas de até quatro anos de prisão e multa, além da perda de função da autoridade em caso de reincidência. Considera abuso de autoridade situações como ordenar prisão "fora das hipóteses legais", recolher ilegalmente alguém a carceragem policial, deixar de conceder liberdade provisória quando a lei admitir e prorrogar a execução de prisões temporárias. Também estabelece como crime ofender a intimidade de pessoas indiciadas, constranger alguém sob ameaça de prisão a depor sobre fatos que possam incriminá-lo, submeter o preso a algemas quando desnecessário e interceptar conversas telefônicas ou fazer escuta ambiental sem autorização.
Algumas dessas situações assemelham-se muito a ações da Operação Lava-Jato, aprovada majoritariamente pelos brasileiros pela sua eficácia contra a corrupção e contra as deformações da política. Mas o projeto em exame no Senado também contém elementos que os cidadãos certamente aprovariam, entre os quais a responsabilização pessoal do agente público que prejudica alguém, infringindo a lei ou errando deliberadamente, mesmo sabendo da inocência da vítima. Atualmente, quem responde pelo erro é o poder público e, em caso de indenização, pagam o erário e os contribuintes. Essa é uma correção que se impõe.
Entre o abuso e a impunidade, tem que haver um meio-termo que garanta aos cidadãos os mesmos direitos reivindicados pelas autoridades.
Liderados pelo juiz Sergio Moro, magistrados, procuradores da República e promotores do Ministério Público Estadual do Paraná promoveram na última quinta-feira um ato de repúdio ao projeto de lei de autoria do presidente do Senado, Renan Calheiros, que redefine crimes de abuso de autoridade. Entidades de classe como a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) também vêm se manifestando reiteradamente contra o projeto, que muda de forma substancial a responsabilização de autoridades. Moro chegou a afirmar que, em caso de aprovação do PLS 280/16, que tem como relator o senador Romero Jucá (PMDB-RR), as investigações contra poderosos serão barradas. Juízes e promotores interpretam o exame parlamentar da matéria como um contra-ataque dos políticos que tentam se livrar das investigações da Operação Lava-Jato — principalmente porque tanto o autor do texto quanto o relator estão entre os investigados.
Realmente, não deixa de ser intrigante que um projeto engavetado desde 2009 tenha voltado a tramitar exatamente no momento em que se trava uma verdadeira disputa de poder entre autoridades políticas e judiciárias, com vários parlamentares sob suspeita de corrupção e um pedido de impeachment contra o procurador-geral da República nas mãos do presidente do Senado. O texto prevê o enquadramento de comportamentos abusivos de delegados, promotores, membros do Ministério Público, juízes, desembargadores e ministros de tribunais superiores, prevendo penas de até quatro anos de prisão e multa, além da perda de função da autoridade em caso de reincidência. Considera abuso de autoridade situações como ordenar prisão "fora das hipóteses legais", recolher ilegalmente alguém a carceragem policial, deixar de conceder liberdade provisória quando a lei admitir e prorrogar a execução de prisões temporárias. Também estabelece como crime ofender a intimidade de pessoas indiciadas, constranger alguém sob ameaça de prisão a depor sobre fatos que possam incriminá-lo, submeter o preso a algemas quando desnecessário e interceptar conversas telefônicas ou fazer escuta ambiental sem autorização.
Algumas dessas situações assemelham-se muito a ações da Operação Lava-Jato, aprovada majoritariamente pelos brasileiros pela sua eficácia contra a corrupção e contra as deformações da política. Mas o projeto em exame no Senado também contém elementos que os cidadãos certamente aprovariam, entre os quais a responsabilização pessoal do agente público que prejudica alguém, infringindo a lei ou errando deliberadamente, mesmo sabendo da inocência da vítima. Atualmente, quem responde pelo erro é o poder público e, em caso de indenização, pagam o erário e os contribuintes. Essa é uma correção que se impõe.
Entre o abuso e a impunidade, tem que haver um meio-termo que garanta aos cidadãos os mesmos direitos reivindicados pelas autoridades.
Crônica de um desastre anunciado - RONALDO CAIADO
FOLHA DE SP - 30/07
Independentemente do seu resultado, o pleito municipal de outubro ficará marcado na história pelo elevado nível de judicialização. Em face da proibição de contribuição financeira oriunda de pessoas jurídicas, candidatos e partidos, todos, estarão previamente sob suspeita.
STF e Câmara convergiram nessa iniciativa, que, a pretexto de moralizar as eleições –e evitar práticas que a Lava Jato exibiu em profusão–, acabará por operar o oposto: a propagação daquelas distorções.
As fontes de financiamento vigentes são três: o fundo partidário, a cessão de horário gratuito no rádio e na TV e as doações de pessoas físicas.
Quanto à primeira, é insuficiente para as exigências de uma campanha, pois atende, em regra, a manutenção da estrutura partidária.
A segunda cobre precariamente a apenas um quesito da campanha, a propaganda. Com 35 partidos, a visibilidade dos milhares de candidatos será sempre insuficiente. Nada substituirá, como jamais substituiu, o corpo a corpo com o eleitor, que, num país-continente, adquire muitas vezes a dimensão de um empreendimento épico.
Quanto à terceira, o financiamento restrito a pessoas físicas, em até 10% de sua renda declarada, não tem raízes na tradição política brasileira. O eleitor não tem essa prática, nem essa cultura –nem muito menos meios. A população, para além dos 12 milhões de desempregados, é pobre e mal dispõe para seu próprio sustento. E ainda: com tantos partidos e candidatos, as eventuais contribuições serão pulverizadas. O que teremos então? De um lado, o favorecimento de candidatos ricos, autofinanciáveis, variações caboclas de Donald Trump; de outro, os que têm apoio de corporações –sindicatos, ONGs etc.
Impossível ignorar que, entre os inúmeros temas a serem tratados numa reforma eleitoral, é preciso priorizar a aprovação de uma cláusula de desempenho partidário (como forma de assegurar a própria governabilidade em todas as esferas) e o fim das coligações para as eleições realizadas sob o sistema proporcional (vereadores, deputados estaduais, distritais e federais).
Isso sem olvidar, por outro lado, a necessidade de rediscussão do financiamento da política, estabelecendo regras objetivamente claras para permitir, mediante condicionantes e limites legalmente definidos, as doações de pessoas físicas e jurídicas.
Enquanto a discussão desses temas –os quais reputo como os mais importantes da reforma eleitoral– for adiada pelo Congresso, veremos alguns expedientes nem previstos em lei, como é o caso da cobrança, pelo PT, de um percentual do salário de funcionários comissionados. Sendo certo que, depois de mais de 13 anos no poder –e tendo aparelhado as máquinas administrativas sob seu comando–, dispõe a agremiação de um contingente contributivo que os demais partidos não têm.
O mesmo se diga em relação à modalidade, inaugurada por José Dirceu para pagar sua multa no mensalão e recém-adotada por Dilma Rousseff, a pretexto de financiar viagens aéreas: pedir dinheiro pela internet. Os crowdfunding, nome dado a essa modalidade contributiva, são geralmente usados para bancar trabalhos artísticos, ações de voluntariado, pequenos negócios e coisas afins. Não há precedentes de seu uso em campanhas eleitorais, o que é preocupante por não haver regulamentação nem meios de controlar a fidelidade de sua origem.
Em todas essas modalidades, há amplo espaço para fraudes –as conhecidas e as inéditas: caixa dois, uso de CPFs de sindicalizados e de membros de ONGs para diluir contribuições graúdas e dar-lhes aparência de individuais, além, claro, da vaquinha digital.
Persiste o fato de que não se faz campanha sem verba –e, havendo campanha, verba há de haver. A transparência continua sendo uma meta, fora do alcance. E o único ganho será demonstrar o quão inútil é apelar a lances de ilusionismo ético. Além de aético, um desserviço ao eleitor.
Independentemente do seu resultado, o pleito municipal de outubro ficará marcado na história pelo elevado nível de judicialização. Em face da proibição de contribuição financeira oriunda de pessoas jurídicas, candidatos e partidos, todos, estarão previamente sob suspeita.
STF e Câmara convergiram nessa iniciativa, que, a pretexto de moralizar as eleições –e evitar práticas que a Lava Jato exibiu em profusão–, acabará por operar o oposto: a propagação daquelas distorções.
As fontes de financiamento vigentes são três: o fundo partidário, a cessão de horário gratuito no rádio e na TV e as doações de pessoas físicas.
Quanto à primeira, é insuficiente para as exigências de uma campanha, pois atende, em regra, a manutenção da estrutura partidária.
A segunda cobre precariamente a apenas um quesito da campanha, a propaganda. Com 35 partidos, a visibilidade dos milhares de candidatos será sempre insuficiente. Nada substituirá, como jamais substituiu, o corpo a corpo com o eleitor, que, num país-continente, adquire muitas vezes a dimensão de um empreendimento épico.
Quanto à terceira, o financiamento restrito a pessoas físicas, em até 10% de sua renda declarada, não tem raízes na tradição política brasileira. O eleitor não tem essa prática, nem essa cultura –nem muito menos meios. A população, para além dos 12 milhões de desempregados, é pobre e mal dispõe para seu próprio sustento. E ainda: com tantos partidos e candidatos, as eventuais contribuições serão pulverizadas. O que teremos então? De um lado, o favorecimento de candidatos ricos, autofinanciáveis, variações caboclas de Donald Trump; de outro, os que têm apoio de corporações –sindicatos, ONGs etc.
Impossível ignorar que, entre os inúmeros temas a serem tratados numa reforma eleitoral, é preciso priorizar a aprovação de uma cláusula de desempenho partidário (como forma de assegurar a própria governabilidade em todas as esferas) e o fim das coligações para as eleições realizadas sob o sistema proporcional (vereadores, deputados estaduais, distritais e federais).
Isso sem olvidar, por outro lado, a necessidade de rediscussão do financiamento da política, estabelecendo regras objetivamente claras para permitir, mediante condicionantes e limites legalmente definidos, as doações de pessoas físicas e jurídicas.
Enquanto a discussão desses temas –os quais reputo como os mais importantes da reforma eleitoral– for adiada pelo Congresso, veremos alguns expedientes nem previstos em lei, como é o caso da cobrança, pelo PT, de um percentual do salário de funcionários comissionados. Sendo certo que, depois de mais de 13 anos no poder –e tendo aparelhado as máquinas administrativas sob seu comando–, dispõe a agremiação de um contingente contributivo que os demais partidos não têm.
O mesmo se diga em relação à modalidade, inaugurada por José Dirceu para pagar sua multa no mensalão e recém-adotada por Dilma Rousseff, a pretexto de financiar viagens aéreas: pedir dinheiro pela internet. Os crowdfunding, nome dado a essa modalidade contributiva, são geralmente usados para bancar trabalhos artísticos, ações de voluntariado, pequenos negócios e coisas afins. Não há precedentes de seu uso em campanhas eleitorais, o que é preocupante por não haver regulamentação nem meios de controlar a fidelidade de sua origem.
Em todas essas modalidades, há amplo espaço para fraudes –as conhecidas e as inéditas: caixa dois, uso de CPFs de sindicalizados e de membros de ONGs para diluir contribuições graúdas e dar-lhes aparência de individuais, além, claro, da vaquinha digital.
Persiste o fato de que não se faz campanha sem verba –e, havendo campanha, verba há de haver. A transparência continua sendo uma meta, fora do alcance. E o único ganho será demonstrar o quão inútil é apelar a lances de ilusionismo ético. Além de aético, um desserviço ao eleitor.
O legado do PT - ANDRÉ GUSTAVO STUMPF
CORREIO BRAZILIENSE - 30/07
A política na América do Sul é herdeira direta de acordos, negociações e tratados realizados na península ibérica nos últimos séculos. A colonização deixou aqui suas marcas. A mais forte delas foi a contrarreforma da Igreja Católica e seu braço mais temido, o Santo Ofício. Houve três tribunais da Inquisição na América. Um na cidade do México, outro em Cartagena e o terceiro em Lima, no Peru. O radicalismo católico expulsou os judeus do sul da Europa onde conviveram durante séculos em perfeita harmonia com seus amigos muçulmanos.
Sem muitas alternativas, os judeus, convertidos ou não, fugiram para a América. Trabalharam nas plantações de cana-de-açúcar no Caribe e em Pernambuco, onde criaram, aliás, a primeira sinagoga no Novo Mundo ao tempo da dominação holandesa. Depois, tiveram que fugir de novo e fundaram outra sinagoga, desta vez em Nova Amsterdã, que foi rebatizada quando os ingleses dominaram a ilha: Nova York. Tudo isso tem implicações diversas na história do Brasil.
Espanha e Portugal passaram por momentos difíceis no século passado. Franco, ditador feroz, teve o cuidado de manter seu país em situação de atraso permanente, distante dos progressos europeus. Salazar, em Portugal, também tratou de estacionar como uma espécie de sociedade do norte da África, longe das liberdades e vantagens sociais dos vizinhos no continente. Em pouco tempo, contudo, desde que os dois ditadores morreram, os dois países ibéricos tiveram nível de desenvolvimento incrível e finalmente entraram na Europa.
Nada disso aconteceu por obra do acaso. São dois protagonistas. Soares e Suárez. Em julho de 1976, o Rei Juan Carlos I encomendou a Adolfo Suárez a formação do segundo governo de seu reinado e, por consequência, a desmontagem das estruturas franquistas. Ele era desconhecido para a maioria do povo espanhol. Mas, aos 43 anos, soube aglutinar grupos democráticos de diversas tendências. Reuniu social-democratas, liberais, democratas, democrata-cristãos e até falangistas. Desmontou o regime anterior com apoio do Partido Socialista Espanhol e do Partido Comunista.
Mário Soares, em Portugal, fez a sua parte. A revolução dos cravos, movimento militar contrário à manutenção das colônias ultramarinas derrubou o governo de Lisboa, na época, chefiado pelo advogado Marcelo Caetano. Os comunistas pularam na frente. Dominaram a ex-colônias (estão no poder até hoje em Angola e Moçambique) e tomaram o governo em Lisboa. Chegaram a realizar uma reforma agrária do minúsculo país. Mário Soares, socialista, deu a volta em todos os problemas, até nas nacionalizações forçadas, fez as reformas necessárias e colocou o país na União Europeia. Portugal descobriu a liberdade e o crescimento. A democracia se implantou e está lá até hoje.
A presidente afastada, Dilma Rousseff, apresentou sua defesa à comissão do impeachment que trabalha no Senado Federal. No início do mês, os senadores deverão votar para aceitar ou não a denúncia. Na última semana de agosto, o processo irá a voto para determinar, em caráter definitivo e mandatório, se a presidente da República deixará seu cargo por força de impedimento determinado pelo Congresso. Fim de uma era.
O grupo de políticos que gravitou em torno do líder trabalhista Luis Inácio Lula da Silva prometia um futuro melhor para o país. Seria o modelo de crescimento econômico e social por intermédio da visão de esquerda. Algo assemelhado ao que ocorreu na Península Ibérica. Lá funcionou. Aqui as sucessivas ações dos petistas produziram recessão, endividamento, desemprego em larga escala e inflação além de qualquer previsão. Por último, numa página vergonhosa, os principais operadores do PT estão envolvidos em tenebrosas transações financeiras. O partido ocupou-se prioritariamente de assaltar os cofres da nação.
O último capítulo da administração Rousseff vai demonstrar que os governos do PT não deixam legado relevante à população brasileira. O Brasil de hoje é pior do que era há dez anos. Os índices econômicos pioraram, as tabelas educacionais demonstram recuos sensíveis e importantes. E por todo lugar para onde se olha encontram-se falências, portas fechadas, estados quebrados, recessão e desalento. Não sobrou nada para o brasileiro comemorar. Esse é o legado do governo trabalhista e de esquerda no Brasil. Na Península Ibérica não foi assim. Alguém não entendeu que os tempos haviam mudado, sobretudo depois da queda do muro de Berlim.
A política na América do Sul é herdeira direta de acordos, negociações e tratados realizados na península ibérica nos últimos séculos. A colonização deixou aqui suas marcas. A mais forte delas foi a contrarreforma da Igreja Católica e seu braço mais temido, o Santo Ofício. Houve três tribunais da Inquisição na América. Um na cidade do México, outro em Cartagena e o terceiro em Lima, no Peru. O radicalismo católico expulsou os judeus do sul da Europa onde conviveram durante séculos em perfeita harmonia com seus amigos muçulmanos.
Sem muitas alternativas, os judeus, convertidos ou não, fugiram para a América. Trabalharam nas plantações de cana-de-açúcar no Caribe e em Pernambuco, onde criaram, aliás, a primeira sinagoga no Novo Mundo ao tempo da dominação holandesa. Depois, tiveram que fugir de novo e fundaram outra sinagoga, desta vez em Nova Amsterdã, que foi rebatizada quando os ingleses dominaram a ilha: Nova York. Tudo isso tem implicações diversas na história do Brasil.
Espanha e Portugal passaram por momentos difíceis no século passado. Franco, ditador feroz, teve o cuidado de manter seu país em situação de atraso permanente, distante dos progressos europeus. Salazar, em Portugal, também tratou de estacionar como uma espécie de sociedade do norte da África, longe das liberdades e vantagens sociais dos vizinhos no continente. Em pouco tempo, contudo, desde que os dois ditadores morreram, os dois países ibéricos tiveram nível de desenvolvimento incrível e finalmente entraram na Europa.
Nada disso aconteceu por obra do acaso. São dois protagonistas. Soares e Suárez. Em julho de 1976, o Rei Juan Carlos I encomendou a Adolfo Suárez a formação do segundo governo de seu reinado e, por consequência, a desmontagem das estruturas franquistas. Ele era desconhecido para a maioria do povo espanhol. Mas, aos 43 anos, soube aglutinar grupos democráticos de diversas tendências. Reuniu social-democratas, liberais, democratas, democrata-cristãos e até falangistas. Desmontou o regime anterior com apoio do Partido Socialista Espanhol e do Partido Comunista.
Mário Soares, em Portugal, fez a sua parte. A revolução dos cravos, movimento militar contrário à manutenção das colônias ultramarinas derrubou o governo de Lisboa, na época, chefiado pelo advogado Marcelo Caetano. Os comunistas pularam na frente. Dominaram a ex-colônias (estão no poder até hoje em Angola e Moçambique) e tomaram o governo em Lisboa. Chegaram a realizar uma reforma agrária do minúsculo país. Mário Soares, socialista, deu a volta em todos os problemas, até nas nacionalizações forçadas, fez as reformas necessárias e colocou o país na União Europeia. Portugal descobriu a liberdade e o crescimento. A democracia se implantou e está lá até hoje.
A presidente afastada, Dilma Rousseff, apresentou sua defesa à comissão do impeachment que trabalha no Senado Federal. No início do mês, os senadores deverão votar para aceitar ou não a denúncia. Na última semana de agosto, o processo irá a voto para determinar, em caráter definitivo e mandatório, se a presidente da República deixará seu cargo por força de impedimento determinado pelo Congresso. Fim de uma era.
O grupo de políticos que gravitou em torno do líder trabalhista Luis Inácio Lula da Silva prometia um futuro melhor para o país. Seria o modelo de crescimento econômico e social por intermédio da visão de esquerda. Algo assemelhado ao que ocorreu na Península Ibérica. Lá funcionou. Aqui as sucessivas ações dos petistas produziram recessão, endividamento, desemprego em larga escala e inflação além de qualquer previsão. Por último, numa página vergonhosa, os principais operadores do PT estão envolvidos em tenebrosas transações financeiras. O partido ocupou-se prioritariamente de assaltar os cofres da nação.
O último capítulo da administração Rousseff vai demonstrar que os governos do PT não deixam legado relevante à população brasileira. O Brasil de hoje é pior do que era há dez anos. Os índices econômicos pioraram, as tabelas educacionais demonstram recuos sensíveis e importantes. E por todo lugar para onde se olha encontram-se falências, portas fechadas, estados quebrados, recessão e desalento. Não sobrou nada para o brasileiro comemorar. Esse é o legado do governo trabalhista e de esquerda no Brasil. Na Península Ibérica não foi assim. Alguém não entendeu que os tempos haviam mudado, sobretudo depois da queda do muro de Berlim.
Na mira da lei - MERVAL PEREIRA
O Globo - 30/07
Denúncia contra Lula, acolhida pela Justiça, derruba tese de perseguição.
O ex-presidente Lula está no centro das investigações da Operação Lava-Jato e, percebido pelo procurador-geral da República como o chefe da organização criminosa que planejou e executou o esquema de corrupção na Petrobras, não poderia deixar de ser investigado em diversos aspectos de sua atuação.
Ontem ele virou réu pela primeira vez, e não pelo juiz Sérgio Moro nem pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, aos quais acusa de perseguição na sua ação na Comissão de Direitos Humanos da ONU. Foi a Justiça Federal no Distrito Federal que recebeu denúncia e transformou em réu o ex-presidente, devido ao fato de o ex-senador Delcídio do Amaral, também denunciado, ter perdido o foro privilegiado após cassação do mandato de senador.
Ele e mais cinco pessoas, entre os quais o pecuarista José Carlos Bumlai, são acusadas de participar de operação para evitar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Lula também é investigado na jurisdição de Moro em Curitiba, por suspeita de ter sido beneficiado por empreiteiras envolvidas na Lava-Jato.
Pura falta de sorte de Lula que esse caso tenha sido decidido em Brasília, pois foi o procurador Ivan Cláudio Marx quem fez a denúncia, o mesmo que deu parecer afirmando que a presidente afastada, Dilma Rousseff, não cometeu crime ao fazer as “pedaladas fiscais”, embora tenha querido maquiar as contas públicas.
O parecer de Marx foi considerado pela defesa ponto definitivo a favor de Dilma, o que desfaz de cara a tese da perseguição política contra Lula e a criminalização do PT contidas na ação de Lula em Genebra. Como o mesmo procurador pode ser favorável a Dilma e contra Lula, se o PT está sendo criminalizado pela Justiça brasileira?
Os pareceres do procurador Ivan Cláudio Marx só demonstram a independência das diversas instâncias judiciais durante esse processo, que se desdobra em vários outros “filhotes” fora de Curitiba. Lula ainda poderá se transformar em réu no processo sobre ocultação de patrimônio e tráfico de influência com base no sítio de Atibaia e no tríplex de Guarujá, mas o processo principal da Lava-Jato, a ser julgado pelo Supremo, é o que oferecerá a acusação mais pesada, a de ser o verdadeiro comandante da organização criminosa que está sendo investigada.
Nesse mesmo processo de obstrução da Justiça, a Procuradoria-Geral da Justiça, quando estava à frente do caso, sublinhou sua atuação afirmando que Lula “impediu e/ou embaraçou investigação criminal que envolve organização criminosa, ocupando papel central, determinando e dirigindo a atividade criminosa praticada por Delcídio do Amaral, André Santos Esteves, Edson de Siqueira Ribeiro, Diogo Ferreira Rodrigues, José Carlos Bumlai, e Maurício de Barros Bumlai”.
A Justiça referendou o parecer da PGR, e caberá ao juiz Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal de Brasília, comandar o processo que pode concluir com a condenação de Lula de 3 a 8 anos por “embaraço à investigação”.
Provavelmente por saber que seus processos se encaminham a uma decisão, Lula recorreu à Comissão da ONU, que, pelo artigo 1º do Protocolo Facultativo Relativo ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, pode examinar “comunicação de indivíduos”. Mas o artigo 5º, item 2, alínea b, alerta: “O Comitê não examinará comunicação alguma de um indivíduo sem que se haja assegurado de que o indivíduo em questão esgotou todos os recursos jurídicos internos disponíveis. Não se aplicará esta regra quando a aplicação dos mencionados recursos se prolongar injustificadamente”.
O que pretende Lula, provavelmente, é criar clima político que justifique eventual pedido de asilo, pois se for condenado em 2ª instância se tornará um ficha-suja e não poderá se candidatar a nada nos próximos anos. Pode não ir para a cadeia, se der sorte de um recurso ao STF cair nas mãos de um ministro como Lewandowski ou Celso de Mello, que são a favor de prisão só após o trânsito em julgado, contrariando decisão do pleno do STF.
Dificilmente, porém, pegaria pena em regime fechado, pois os crimes de que é acusado têm penas leves que propiciam no mínimo um semiaberto. Mas pode ser que Lula não queira ser visto de tornozeleira eletrônica por aí, e prefira se refugiar no Uruguai, por exemplo. Repetiria Bettino Craxi, ex-primeiro-ministro e líder do Partido Socialista na Itália, que, acusado pela Operação Mãos Limpas, refugiou-se na Tunísia e foi condenado à revelia.
Denúncia contra Lula, acolhida pela Justiça, derruba tese de perseguição.
O ex-presidente Lula está no centro das investigações da Operação Lava-Jato e, percebido pelo procurador-geral da República como o chefe da organização criminosa que planejou e executou o esquema de corrupção na Petrobras, não poderia deixar de ser investigado em diversos aspectos de sua atuação.
Ontem ele virou réu pela primeira vez, e não pelo juiz Sérgio Moro nem pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, aos quais acusa de perseguição na sua ação na Comissão de Direitos Humanos da ONU. Foi a Justiça Federal no Distrito Federal que recebeu denúncia e transformou em réu o ex-presidente, devido ao fato de o ex-senador Delcídio do Amaral, também denunciado, ter perdido o foro privilegiado após cassação do mandato de senador.
Ele e mais cinco pessoas, entre os quais o pecuarista José Carlos Bumlai, são acusadas de participar de operação para evitar a delação do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró. Lula também é investigado na jurisdição de Moro em Curitiba, por suspeita de ter sido beneficiado por empreiteiras envolvidas na Lava-Jato.
Pura falta de sorte de Lula que esse caso tenha sido decidido em Brasília, pois foi o procurador Ivan Cláudio Marx quem fez a denúncia, o mesmo que deu parecer afirmando que a presidente afastada, Dilma Rousseff, não cometeu crime ao fazer as “pedaladas fiscais”, embora tenha querido maquiar as contas públicas.
O parecer de Marx foi considerado pela defesa ponto definitivo a favor de Dilma, o que desfaz de cara a tese da perseguição política contra Lula e a criminalização do PT contidas na ação de Lula em Genebra. Como o mesmo procurador pode ser favorável a Dilma e contra Lula, se o PT está sendo criminalizado pela Justiça brasileira?
Os pareceres do procurador Ivan Cláudio Marx só demonstram a independência das diversas instâncias judiciais durante esse processo, que se desdobra em vários outros “filhotes” fora de Curitiba. Lula ainda poderá se transformar em réu no processo sobre ocultação de patrimônio e tráfico de influência com base no sítio de Atibaia e no tríplex de Guarujá, mas o processo principal da Lava-Jato, a ser julgado pelo Supremo, é o que oferecerá a acusação mais pesada, a de ser o verdadeiro comandante da organização criminosa que está sendo investigada.
Nesse mesmo processo de obstrução da Justiça, a Procuradoria-Geral da Justiça, quando estava à frente do caso, sublinhou sua atuação afirmando que Lula “impediu e/ou embaraçou investigação criminal que envolve organização criminosa, ocupando papel central, determinando e dirigindo a atividade criminosa praticada por Delcídio do Amaral, André Santos Esteves, Edson de Siqueira Ribeiro, Diogo Ferreira Rodrigues, José Carlos Bumlai, e Maurício de Barros Bumlai”.
A Justiça referendou o parecer da PGR, e caberá ao juiz Ricardo Augusto Soares Leite, da 10ª Vara da Justiça Federal de Brasília, comandar o processo que pode concluir com a condenação de Lula de 3 a 8 anos por “embaraço à investigação”.
Provavelmente por saber que seus processos se encaminham a uma decisão, Lula recorreu à Comissão da ONU, que, pelo artigo 1º do Protocolo Facultativo Relativo ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, pode examinar “comunicação de indivíduos”. Mas o artigo 5º, item 2, alínea b, alerta: “O Comitê não examinará comunicação alguma de um indivíduo sem que se haja assegurado de que o indivíduo em questão esgotou todos os recursos jurídicos internos disponíveis. Não se aplicará esta regra quando a aplicação dos mencionados recursos se prolongar injustificadamente”.
O que pretende Lula, provavelmente, é criar clima político que justifique eventual pedido de asilo, pois se for condenado em 2ª instância se tornará um ficha-suja e não poderá se candidatar a nada nos próximos anos. Pode não ir para a cadeia, se der sorte de um recurso ao STF cair nas mãos de um ministro como Lewandowski ou Celso de Mello, que são a favor de prisão só após o trânsito em julgado, contrariando decisão do pleno do STF.
Dificilmente, porém, pegaria pena em regime fechado, pois os crimes de que é acusado têm penas leves que propiciam no mínimo um semiaberto. Mas pode ser que Lula não queira ser visto de tornozeleira eletrônica por aí, e prefira se refugiar no Uruguai, por exemplo. Repetiria Bettino Craxi, ex-primeiro-ministro e líder do Partido Socialista na Itália, que, acusado pela Operação Mãos Limpas, refugiou-se na Tunísia e foi condenado à revelia.
Habeas corpus preventivo - EDITORIAL ESTADÃO
ESTADÃO - 30/07
Diante do amplo elenco de ilicitudes de que Lula é suspeito de ter praticado desde que assumiu a Presidência em 2003, a tentativa de ocultar a propriedade de imóveis como o de Atibaia é café pequeno
Se Lula da Silva for preso proximamente pela Polícia Federal, não importa por qual motivo, parecerá ao mundo que é vítima de retaliação pelo fato de ter “denunciado” o Estado brasileiro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pelo “abuso de poder” que teria sido praticado contra ele pelo juiz federal Sérgio Moro e pelos procuradores da Operação Lava Jato. Pois foi certamente por esse motivo esperto – a garantia de uma espécie de habeas corpus preventivo com aval internacional – que o chefão do PT foi apresentado como vítima de perseguição política. No mesmo dia, a Operação Lava Jato tornou público um laudo pericial da Polícia Federal que revela a existência de fortes indícios de que o casal Lula-Marisa Letícia tenha dado instruções específicas aos encarregados de realizar a instalação de uma “cozinha gourmet”, no valor de R$ 252 mil, no aprazível sítio de Atibaia que ambos negam veementemente ser de sua propriedade. E, no dia seguinte, Lula da Silva tornou-se réu, acusado de obstrução da Justiça.
Diante do amplo elenco de ilicitudes de que Lula é suspeito de ter praticado desde que assumiu a Presidência em 2003, a tentativa de ocultar a propriedade de imóveis como o de Atibaia é café pequeno. Não se compara à responsabilidade que lhe é atribuída, por óbvia, de ser o chefe da quadrilha que por mais de uma década aparelhou o Estado, cooptou aliados a peso de ouro e assaltou os cofres públicos, especialmente os das empresas estatais, com o objetivo de perpetuar um projeto de poder e enriquecer políticos, funcionários públicos e empresários inescrupulosos.
Alegam os filopetistas, de modo especial os intelectuais e artistas que gostam de parecer paladinos da justiça social, que o lulopetismo inaugurou uma era de conquistas populares e de desenvolvimento econômico, e que para fazê-lo teve de se submeter ao constrangimento de alianças indesejáveis, mas necessárias ao ato de governar. Ou seja: os fins justificam os meios. Mas o que na verdade resultou provado com o catastrófico desenlace da aventura lulopetista é que os meios explicam o fim do sonho de um projeto de poder que pode ter até nascido com as melhores intenções, mas que ao longo do caminho se deixou perder pela soberba, pela incompetência e pela corrupção.
Hoje, os brasileiros sofrem com o legado de desesperança que receberam de Lula e de sua desafortunada sucessora. Depois de ter frustrado todas as expectativas criadas por um perverso populismo que dividiu o País entre “nós” e “eles”, Lula vê agora frustrada sua própria expectativa de ter repouso virginal no panteão dos grandes heróis internacionais das causas populares. E reage com a mesma falta de escrúpulos que o levou aos descaminhos da moralidade na tentativa de se safar das consequências legais de seus trambiques. Pouco se lhe dá se, assim procedendo, enxovalha a imagem do Brasil no principal foro político internacional. Pois, recorrendo ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, Lula pode querer denegrir o juiz Moro, mas o que de fato faz é tentar comprometer o Estado brasileiro, insinuando que suas instituições são inermes diante do arbítrio de um funcionário. Com essa atitude mendaz, Lula quer fazer crer ao mundo que a Lava Jato transformou o País numa republiqueta refém do “abuso de poder” de uma autoridade judicial que peca pela “clara falta de imparcialidade” e se dedica a sucessivos “atos ilegais” movida pela obsessão de condená-lo.
Esse é o inescrupuloso estilo lulopetista de se safar de dificuldades: atirar para todos os lados, não importa quem possa ser atingido. É assim que Lula e sua tigrada se têm comportado desde o início do processo de impeachment contra Dilma Rousseff, acionando suas relações nos círculos e foros esquerdistas internacionais para veicular a versão de que o Brasil está sendo vítima de um “golpe”.
É improvável que a “denúncia” de Lula progrida. Entre outros motivos, porque antes de o Comitê da ONU se manifestar sobre a petição, será necessário que Lula prove ter esgotado todos os recursos legais no Brasil para se livrar do “abuso de poder”. E mesmo que se configure a improvável hipótese de que a “denúncia” seja aceita para julgamento, a análise do processo pode se estender por cerca de dois anos. Para Lula, isso pouco importa. O que ele quer é manter a Polícia Federal longe de sua porta.
Diante do amplo elenco de ilicitudes de que Lula é suspeito de ter praticado desde que assumiu a Presidência em 2003, a tentativa de ocultar a propriedade de imóveis como o de Atibaia é café pequeno
Se Lula da Silva for preso proximamente pela Polícia Federal, não importa por qual motivo, parecerá ao mundo que é vítima de retaliação pelo fato de ter “denunciado” o Estado brasileiro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) pelo “abuso de poder” que teria sido praticado contra ele pelo juiz federal Sérgio Moro e pelos procuradores da Operação Lava Jato. Pois foi certamente por esse motivo esperto – a garantia de uma espécie de habeas corpus preventivo com aval internacional – que o chefão do PT foi apresentado como vítima de perseguição política. No mesmo dia, a Operação Lava Jato tornou público um laudo pericial da Polícia Federal que revela a existência de fortes indícios de que o casal Lula-Marisa Letícia tenha dado instruções específicas aos encarregados de realizar a instalação de uma “cozinha gourmet”, no valor de R$ 252 mil, no aprazível sítio de Atibaia que ambos negam veementemente ser de sua propriedade. E, no dia seguinte, Lula da Silva tornou-se réu, acusado de obstrução da Justiça.
Diante do amplo elenco de ilicitudes de que Lula é suspeito de ter praticado desde que assumiu a Presidência em 2003, a tentativa de ocultar a propriedade de imóveis como o de Atibaia é café pequeno. Não se compara à responsabilidade que lhe é atribuída, por óbvia, de ser o chefe da quadrilha que por mais de uma década aparelhou o Estado, cooptou aliados a peso de ouro e assaltou os cofres públicos, especialmente os das empresas estatais, com o objetivo de perpetuar um projeto de poder e enriquecer políticos, funcionários públicos e empresários inescrupulosos.
Alegam os filopetistas, de modo especial os intelectuais e artistas que gostam de parecer paladinos da justiça social, que o lulopetismo inaugurou uma era de conquistas populares e de desenvolvimento econômico, e que para fazê-lo teve de se submeter ao constrangimento de alianças indesejáveis, mas necessárias ao ato de governar. Ou seja: os fins justificam os meios. Mas o que na verdade resultou provado com o catastrófico desenlace da aventura lulopetista é que os meios explicam o fim do sonho de um projeto de poder que pode ter até nascido com as melhores intenções, mas que ao longo do caminho se deixou perder pela soberba, pela incompetência e pela corrupção.
Hoje, os brasileiros sofrem com o legado de desesperança que receberam de Lula e de sua desafortunada sucessora. Depois de ter frustrado todas as expectativas criadas por um perverso populismo que dividiu o País entre “nós” e “eles”, Lula vê agora frustrada sua própria expectativa de ter repouso virginal no panteão dos grandes heróis internacionais das causas populares. E reage com a mesma falta de escrúpulos que o levou aos descaminhos da moralidade na tentativa de se safar das consequências legais de seus trambiques. Pouco se lhe dá se, assim procedendo, enxovalha a imagem do Brasil no principal foro político internacional. Pois, recorrendo ao Comitê de Direitos Humanos da ONU, Lula pode querer denegrir o juiz Moro, mas o que de fato faz é tentar comprometer o Estado brasileiro, insinuando que suas instituições são inermes diante do arbítrio de um funcionário. Com essa atitude mendaz, Lula quer fazer crer ao mundo que a Lava Jato transformou o País numa republiqueta refém do “abuso de poder” de uma autoridade judicial que peca pela “clara falta de imparcialidade” e se dedica a sucessivos “atos ilegais” movida pela obsessão de condená-lo.
Esse é o inescrupuloso estilo lulopetista de se safar de dificuldades: atirar para todos os lados, não importa quem possa ser atingido. É assim que Lula e sua tigrada se têm comportado desde o início do processo de impeachment contra Dilma Rousseff, acionando suas relações nos círculos e foros esquerdistas internacionais para veicular a versão de que o Brasil está sendo vítima de um “golpe”.
É improvável que a “denúncia” de Lula progrida. Entre outros motivos, porque antes de o Comitê da ONU se manifestar sobre a petição, será necessário que Lula prove ter esgotado todos os recursos legais no Brasil para se livrar do “abuso de poder”. E mesmo que se configure a improvável hipótese de que a “denúncia” seja aceita para julgamento, a análise do processo pode se estender por cerca de dois anos. Para Lula, isso pouco importa. O que ele quer é manter a Polícia Federal longe de sua porta.
Qual Previdência - EDITORIAL FOLHA DE SP
FOLHA DE SP - 30/07
Quando se caminha dos embates retóricos rumo a propostas concretas de reforma da Previdência Social, uma primeira constatação é que há não apenas uma, mas diversas previdências a reformar.
Assalariados com carteira assinada submetem-se a um regime geral que prevê aposentadorias por idade (65 anos para homens e 60 para mulheres), por tempo de contribuição (35 ou 30 anos, conforme o gênero) ou pela soma das duas condições (95 ou 85 anos).
Tais possibilidades incluem o Brasil num diminuto grupo de 13 países que autorizam a concessão do benefício sem critério de idade mínima, conforme estudo publicado pelo Ipea. Celetistas, entretanto, não terão dificuldade em apontar privilégios nas demais categorias.
Trabalhadores rurais podem aposentar-se cinco anos mais cedo, quase sem exigência de contribuições comprovadas, em modelo assemelhado à assistência social.
Entre funcionários públicos, dos quais se exige idade mínima de 55 (mulheres) ou 60 anos (homens), a grande maioria ainda tem direito a benefícios equivalentes aos salários da ativa, ou de valor próximo. Novos servidores civis perderam tal regalia; militares, não.
Na soma das partes, tem-se um sistema ao mesmo tempo iníquo e perdulário. Em comum, todos os regimes —e suas dezenas de regras e modalidades especiais— demandarão recursos crescentes da sociedade para despesas não cobertas pelos aportes dos segurados.
Só no ano passado, a previdência rural contabilizou deficit de astronômicos R$ 91 bilhões; a dos servidores federais civis, de R$ 40 bilhões; a dos militares, de R$ 32,5 bilhões. No regime ainda superavitário dos celetistas urbanos, o saldo despencou de R$ 25,3 bilhões para R$ 5,1 bilhões.
Não espanta que o governo, sem ter mais como procrastinar uma reforma, incline-se pela unificação das normas previdenciárias. Esboçou-se a proposta no início do ano, ainda sob a presidente Dilma Rousseff (PT), hoje afastada, e a equipe do interino, Michel Temer (PMDB), agora a retoma.
Os objetivos não se limitam à correção de injustiças. A imposição a homens e mulheres, nos setores público e privado, de uma idade mínima condizente com a expectativa de vida nacional sustaria a sangria das aposentadorias precoces. Além disso, a cobrança de contribuições do setor agrícola daria alento às receitas.
Do ângulo político, o risco é desagradar a todos ao mesmo tempo —num país em que, como mostrou pesquisa Datafolha, a maioria almeja aposentar-se aos 60 anos.
Quando se caminha dos embates retóricos rumo a propostas concretas de reforma da Previdência Social, uma primeira constatação é que há não apenas uma, mas diversas previdências a reformar.
Assalariados com carteira assinada submetem-se a um regime geral que prevê aposentadorias por idade (65 anos para homens e 60 para mulheres), por tempo de contribuição (35 ou 30 anos, conforme o gênero) ou pela soma das duas condições (95 ou 85 anos).
Tais possibilidades incluem o Brasil num diminuto grupo de 13 países que autorizam a concessão do benefício sem critério de idade mínima, conforme estudo publicado pelo Ipea. Celetistas, entretanto, não terão dificuldade em apontar privilégios nas demais categorias.
Trabalhadores rurais podem aposentar-se cinco anos mais cedo, quase sem exigência de contribuições comprovadas, em modelo assemelhado à assistência social.
Entre funcionários públicos, dos quais se exige idade mínima de 55 (mulheres) ou 60 anos (homens), a grande maioria ainda tem direito a benefícios equivalentes aos salários da ativa, ou de valor próximo. Novos servidores civis perderam tal regalia; militares, não.
Na soma das partes, tem-se um sistema ao mesmo tempo iníquo e perdulário. Em comum, todos os regimes —e suas dezenas de regras e modalidades especiais— demandarão recursos crescentes da sociedade para despesas não cobertas pelos aportes dos segurados.
Só no ano passado, a previdência rural contabilizou deficit de astronômicos R$ 91 bilhões; a dos servidores federais civis, de R$ 40 bilhões; a dos militares, de R$ 32,5 bilhões. No regime ainda superavitário dos celetistas urbanos, o saldo despencou de R$ 25,3 bilhões para R$ 5,1 bilhões.
Não espanta que o governo, sem ter mais como procrastinar uma reforma, incline-se pela unificação das normas previdenciárias. Esboçou-se a proposta no início do ano, ainda sob a presidente Dilma Rousseff (PT), hoje afastada, e a equipe do interino, Michel Temer (PMDB), agora a retoma.
Os objetivos não se limitam à correção de injustiças. A imposição a homens e mulheres, nos setores público e privado, de uma idade mínima condizente com a expectativa de vida nacional sustaria a sangria das aposentadorias precoces. Além disso, a cobrança de contribuições do setor agrícola daria alento às receitas.
Do ângulo político, o risco é desagradar a todos ao mesmo tempo —num país em que, como mostrou pesquisa Datafolha, a maioria almeja aposentar-se aos 60 anos.
Os novos semitiranos - HÉLIO SCHWARTSMAN
FOLHA DE SP - 30/07
Não acho que Recep Tayyip Erdogan, o presidente da Turquia, tenha simulado um golpe militar contra seu governo com o objetivo de desferir a reação e endurecer o regime. Dirigentes paranoicos evitam jogadas arriscadas.
Não há dúvida, porém, de que a destrambelhada tentativa de golpe foi um presente para Erdogan e o seu AKP, o partido islamita com o qual governa desde 2003. O presidente, que já vinha nos últimos anos adotando uma linha mais despótica, encontrou o pretexto de que precisava para deslanchar sua ofensiva autoritária. Nas últimas semanas, Erdogan já fechou 131 veículos de comunicação e mandou prender ou suspender 60 mil pessoas, a maioria militares, juízes, policiais e professores.
Com tal currículo, Erdogan se perfila ao lado de outros líderes, como Vladimir Putin, da Rússia, e Hugo Chávez, da Venezuela, na categoria dos novos semitiranos. Eles chegaram ao poder pela democracia, mas depois a torceram para servir a seus projetos de poder. O interessante é que em nenhum momento adotam uma medida que configure um rompimento muito claro com a legalidade e gozam, na maior parte do tempo, de amplo apoio popular.
Desde Platão sabemos que a democracia é manipulável por demagogos. Só que, enquanto o ateniense ainda podia sonhar com uma oligarquia comandada por reis-filósofos com acesso direto à Verdade, nós não podemos nos dar a esse luxo.
O melhor meio de evitar os semitiranos é consolidar as estruturas da democracia que visam a impedir que alguma instância de poder se sobreponha sobre as demais. Isso significa que precisamos de um Legislativo forte, um Judiciário independente e alternância do poder, para que nenhum grupo político se perpetue no comando de nenhuma das instituições. Se o governo do AKP tivesse sido despachado pelo eleitor uma ou duas legislaturas atrás, Erdogan seria hoje descrito como um estadista.
Não acho que Recep Tayyip Erdogan, o presidente da Turquia, tenha simulado um golpe militar contra seu governo com o objetivo de desferir a reação e endurecer o regime. Dirigentes paranoicos evitam jogadas arriscadas.
Não há dúvida, porém, de que a destrambelhada tentativa de golpe foi um presente para Erdogan e o seu AKP, o partido islamita com o qual governa desde 2003. O presidente, que já vinha nos últimos anos adotando uma linha mais despótica, encontrou o pretexto de que precisava para deslanchar sua ofensiva autoritária. Nas últimas semanas, Erdogan já fechou 131 veículos de comunicação e mandou prender ou suspender 60 mil pessoas, a maioria militares, juízes, policiais e professores.
Com tal currículo, Erdogan se perfila ao lado de outros líderes, como Vladimir Putin, da Rússia, e Hugo Chávez, da Venezuela, na categoria dos novos semitiranos. Eles chegaram ao poder pela democracia, mas depois a torceram para servir a seus projetos de poder. O interessante é que em nenhum momento adotam uma medida que configure um rompimento muito claro com a legalidade e gozam, na maior parte do tempo, de amplo apoio popular.
Desde Platão sabemos que a democracia é manipulável por demagogos. Só que, enquanto o ateniense ainda podia sonhar com uma oligarquia comandada por reis-filósofos com acesso direto à Verdade, nós não podemos nos dar a esse luxo.
O melhor meio de evitar os semitiranos é consolidar as estruturas da democracia que visam a impedir que alguma instância de poder se sobreponha sobre as demais. Isso significa que precisamos de um Legislativo forte, um Judiciário independente e alternância do poder, para que nenhum grupo político se perpetue no comando de nenhuma das instituições. Se o governo do AKP tivesse sido despachado pelo eleitor uma ou duas legislaturas atrás, Erdogan seria hoje descrito como um estadista.
Brasil enfeia a foto regional -EDITORIAL ESTADÃO
ESTADÃO - 30/07
O Brasil bate a maior parte da América Latina em três quesitos nada invejáveis – a inflação, a dívida pública e a contração da atividade econômica
O Brasil bate a maior parte da América Latina em três quesitos nada invejáveis – a inflação, a dívida pública e a contração da atividade econômica. A dívida bruta do setor público brasileiro chegou no ano passado a 66,5% do Produto Interno Bruto (PIB), quase o dobro da média latino-americana, de 35,9%, segundo o novo panorama regional publicado esta semana pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). Conter o endividamento, reflexo da enorme desordem das contas oficiais, será o maior desafio para o governo brasileiro nos próximos anos. Reconhecer o tamanho do problema foi o passo preliminar. O seguinte foi a proposta, em exame no Congresso, de um teto para a despesa governamental. Entre os latino-americanos mais endividados aparecem, na lista da Cepal, a Argentina, com um índice de 52,3%, e o Uruguai, com 46%. Entre os menos endividados ficaram o Peru (16,6%), o Chile (17,5%) e a Bolívia (27,1%). Os dois maiores países do Cone Sul obviamente prejudicaram, e muito, a média regional.
Se a comparação for feita com emergentes da Ásia, o endividamento público brasileiro poderá parecer uma aberração. Se o confronto for feito com países avançados da Europa, a situação brasileira poderá parecer confortável, pelo menos para os menos informados. Na zona do euro, no primeiro trimestre deste ano, a dívida bruta correspondeu em média a 91,7% do PIB. A presidente Dilma Rousseff preferia esse tipo de referência. Mas o Brasil tem pago mais de 8% do PIB como juros da dívida. Esse custo ficou próximo de 4%, no ano passado, para Itália e Grécia, países com endividamento superior a 120% do PIB. Na França ficou perto de 2%. Em alguns, em torno de zero.
Se a comparação envolver outros dados econômicos, ficará ainda mais visível o desastroso efeito acumulado em anos de políticas irresponsáveis e incompetentes. A economia europeia cresce desde 2014, a inflação é quase nula e o desemprego médio é inferior aos 11,2% estimados no Brasil. Na América Latina poucos países têm sofrido inflação tão intensa quanto a brasileira e um número ainda menor exibe maior desajuste de preços. As economias mais dinâmicas da região têm crescido a taxas médias na faixa de 4% a 6% ao ano. Perderam impulso recentemente, principalmente por causa da queda dos preços de seus produtos de exportação, mas ainda avançam.
Pelas novas projeções da Cepal, o PIB do Brasil deve diminuir 3,5% em 2016, depois de um recuo de 3,8% no ano passado. Pelo menos o primeiro semestre, pelos dados já conhecidos, confirma a expectativa de um ano ruim.
As estimativas para a América do Sul indicam um resultado negativo de 2,1%, mas esse número reflete principalmente o desempenho de quatro países. Os outros três são a Argentina, com retração prevista de 1,5%, Equador, com perda de 2,5% no valor do PIB, e Venezuela, com um desastre de 8%.
Mas a retração argentina deve ser consequência do ajuste iniciado pelo novo governo, depois da longa fase de desmandos da presidente Cristina Kirchner. No Equador, as perspectivas são influenciadas tanto pelo preço do petróleo quanto pela valorização do dólar, sua moeda, um fator negativo para a competitividade. Quanto à Venezuela, enfrenta o quarto ano consecutivo de recessão, efeito natural e previsível de um governo catastrófico. Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e Bolívia continuarão com taxas positivas, entre 1,6% e 4,5%.
Em nove páginas dedicadas ao Brasil, o relatório resume a evolução da economia e da política econômica neste ano, com descrição das principais medidas de recuperação definidas pelo governo provisório. Na análise do ano passado, o destaque foi para “a permanente diminuição do investimento”. O valor investido em ativos fixos, isto é, em máquinas, equipamentos e obras, foi 14,1% menor que o do ano anterior, quando já havia diminuído 4,1%. Daí a importância, apontada em outra passagem, de um novo ciclo de concessões e de privatizações para deslanchar a recuperação da capacidade produtiva.
O Brasil bate a maior parte da América Latina em três quesitos nada invejáveis – a inflação, a dívida pública e a contração da atividade econômica
O Brasil bate a maior parte da América Latina em três quesitos nada invejáveis – a inflação, a dívida pública e a contração da atividade econômica. A dívida bruta do setor público brasileiro chegou no ano passado a 66,5% do Produto Interno Bruto (PIB), quase o dobro da média latino-americana, de 35,9%, segundo o novo panorama regional publicado esta semana pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal). Conter o endividamento, reflexo da enorme desordem das contas oficiais, será o maior desafio para o governo brasileiro nos próximos anos. Reconhecer o tamanho do problema foi o passo preliminar. O seguinte foi a proposta, em exame no Congresso, de um teto para a despesa governamental. Entre os latino-americanos mais endividados aparecem, na lista da Cepal, a Argentina, com um índice de 52,3%, e o Uruguai, com 46%. Entre os menos endividados ficaram o Peru (16,6%), o Chile (17,5%) e a Bolívia (27,1%). Os dois maiores países do Cone Sul obviamente prejudicaram, e muito, a média regional.
Se a comparação for feita com emergentes da Ásia, o endividamento público brasileiro poderá parecer uma aberração. Se o confronto for feito com países avançados da Europa, a situação brasileira poderá parecer confortável, pelo menos para os menos informados. Na zona do euro, no primeiro trimestre deste ano, a dívida bruta correspondeu em média a 91,7% do PIB. A presidente Dilma Rousseff preferia esse tipo de referência. Mas o Brasil tem pago mais de 8% do PIB como juros da dívida. Esse custo ficou próximo de 4%, no ano passado, para Itália e Grécia, países com endividamento superior a 120% do PIB. Na França ficou perto de 2%. Em alguns, em torno de zero.
Se a comparação envolver outros dados econômicos, ficará ainda mais visível o desastroso efeito acumulado em anos de políticas irresponsáveis e incompetentes. A economia europeia cresce desde 2014, a inflação é quase nula e o desemprego médio é inferior aos 11,2% estimados no Brasil. Na América Latina poucos países têm sofrido inflação tão intensa quanto a brasileira e um número ainda menor exibe maior desajuste de preços. As economias mais dinâmicas da região têm crescido a taxas médias na faixa de 4% a 6% ao ano. Perderam impulso recentemente, principalmente por causa da queda dos preços de seus produtos de exportação, mas ainda avançam.
Pelas novas projeções da Cepal, o PIB do Brasil deve diminuir 3,5% em 2016, depois de um recuo de 3,8% no ano passado. Pelo menos o primeiro semestre, pelos dados já conhecidos, confirma a expectativa de um ano ruim.
As estimativas para a América do Sul indicam um resultado negativo de 2,1%, mas esse número reflete principalmente o desempenho de quatro países. Os outros três são a Argentina, com retração prevista de 1,5%, Equador, com perda de 2,5% no valor do PIB, e Venezuela, com um desastre de 8%.
Mas a retração argentina deve ser consequência do ajuste iniciado pelo novo governo, depois da longa fase de desmandos da presidente Cristina Kirchner. No Equador, as perspectivas são influenciadas tanto pelo preço do petróleo quanto pela valorização do dólar, sua moeda, um fator negativo para a competitividade. Quanto à Venezuela, enfrenta o quarto ano consecutivo de recessão, efeito natural e previsível de um governo catastrófico. Chile, Colômbia, Paraguai, Peru e Bolívia continuarão com taxas positivas, entre 1,6% e 4,5%.
Em nove páginas dedicadas ao Brasil, o relatório resume a evolução da economia e da política econômica neste ano, com descrição das principais medidas de recuperação definidas pelo governo provisório. Na análise do ano passado, o destaque foi para “a permanente diminuição do investimento”. O valor investido em ativos fixos, isto é, em máquinas, equipamentos e obras, foi 14,1% menor que o do ano anterior, quando já havia diminuído 4,1%. Daí a importância, apontada em outra passagem, de um novo ciclo de concessões e de privatizações para deslanchar a recuperação da capacidade produtiva.
Razão fundamental da crise - MARIO CESAR FLORES
ESTADÃO - 30/07
O drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado
Por que o País vive mais uma crise grave? A resposta é simples, mas suas consequências nocivas permeiam os grandes problemas brasileiros: o drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado gigante e complexo.
Território extenso e bem dotado de recursos naturais, ausência de catástrofes ambientais e de contenciosos internacionais ou nacionais graves não significam sucesso automático. A qualidade da atuação humana no uso desse quadro favorável é condição indispensável e está hoje, como esteve no passado, aquém da necessária, do topo à base da pirâmide social. Para o tema deste artigo é ao alto da pirâmide e nele à elite política que cabe a maior responsabilidade – equação complicada, já que o poder político depende do voto da grande massa de cultura política precária, condicionada por seu cotidiano penoso e vulnerável à ilusão.
Limitando-nos ao pós-1930: no Brasil gradativamente industrializado os “coronéis” do velho patriarcado rural, atuantes na política no Império e na Primeira República, foram substituídos pelos “coronéis burgueses” das grandes empresas – incluídas empreiteiras a serviço do Estado – e pelos “coronéis pelegos” de organizações sindicais fortes, aqueles e estes inerentes ao novo modelo socioeconômico. A mudança dos atores influentes ocorreu em consonância com a evolução do conservadorismo para o ideário de feição liberal da classe média ascendente e para o populismo típico da democracia de massa urbanizada.
Mas a essência da política não mudou. Tal como na democracia tutelada pelo patriarcalismo conservador, que hierarquizava alto o interesse da oligarquia, as políticas simpáticas à classe média e ao populismo não atribuíam – não atribuem – relevância às exigências do País e às do País no mundo, em mudança radical: população, urbanização, industrialização e injunções ambientais em crescimento acelerado, integração regional e global na economia e na informação. Exigências dependentes de medidas nem sempre, se não raramente, dotadas de “apelo” eleitoral de curto prazo, quesito fundamental para quem pensa principalmente na próxima eleição – uma característica de nossa democracia.
O déficit na condução humana natural a esse paradigma de poder, pouco ou não motivado pela visão (pelo planejamento) do futuro, é agravado pela falácia do Estado interveniente em tudo, de origem histórica, mas inflado no pós-1930 e desde então também grande empresário. Apêndice natural do gigantismo, hoje em evidência no País: a vulnerabilidade do sistema político e do serviço público à corrupção, que, no Brasil como em todo o mundo, é proporcional à dimensão do Estado. Vivemos a cultura apoteótica mantida viva pelo interesse de seus beneficiários, por convicção ideológica ou pela inércia em frágil nível cultural, que entende o Estado como podendo e devendo tudo, à margem da realidade fiscal e de outras limitações. As mazelas do Estado gigante e de sua condução medíocre são ampliadas por nossa ilusão federativa inibidora dos governos locais: Federação política correta para país extenso e diversificado, mas desfigurada pela concentração fiscal na União.
Houve no passado alguns espasmos de planejamento, na Secretaria de Assuntos Estratégicos e, antes, no Conselho de Segurança Nacional, a que o mundo político não dedicava entusiasmo porque sem peso político no povo ou por desinteresse cultural – político e da sociedade. E no contexto econômico-financeiro atual, o que nosso Ministério do Planejamento realmente planeja é a complexa distribuição da escassez orçamentária. Sufocado pelo imediato socioeconômico e suas consequências na política, o futuro aguarda soluções competentes, algumas provavelmente penosas, que, se não se concretizarem, a cobrança virá: ocorrerão outras crises. Como estaríamos hoje se, em felizes manifestações de competência e visão de futuro, não tivessem sido construídas nos 1970 Itaipu, outras grandes hidrelétricas e a ponte Rio-Niteroi...?
Em suma, o déficit de qualidade na condução do Estado “complicado” por sua irrealista onipotência e onipresença é a causa responsável básica pela situação difícil que estamos vivendo. E da mesma forma que somos hoje vítimas de insuficiências (?) do passado, agravadas por insuficiências recentes, as gerações subsequentes seguirão vítimas de crises decorrentes de insuficiências da condução atual. Cabe à condução nacional atual planejar e deslanchar as bases de um futuro sem sustos. Infelizmente, o panorama político confuso que estamos vivendo não sugere segurança de que isso venha a acontecer. O governo tenta controlar o tormento presente, mas estamos planejando e adotando medidas que propiciem esperança de progresso em tranquilidade no futuro? Quando a participação no poder se impõe à revelia de ideias sobre o presente e o futuro, como tem acontecido na formação de nossos governos, a esperança na redenção se fragiliza.
Manifestação emblemática dessa insegurança: a resistência à reforma da Previdência, cujo déficit coberto pelo Estado tido como milagroso ameaça conduzir à catástrofe orçamentária e ao colapso dessa garantia social. Necessária hoje e, sobretudo, com vista ao futuro, mas que põe em risco a reeleição de quem votar em coerência com a realidade e na contramão do ilusório populista, a reforma tende a desembocar no paliativo, que apenas adia a catástrofe. Raciocínio similar se aplica à revisão de tópicos da CLT, anacrônicos no cenário socioeconômico atual, diferente do que existia ao tempo da promulgação desse código. A postergação da reforma tributária (que supostamente “federalizaria” a Federação...) é outro caso da mesma natureza.
Condução em déficit de qualidade, de Estado gigante, interveniente em tudo e com deficiências de organização, é convite à crise, se não ao desastre. Podemos corrigir isso?
* MARIO CESAR FLORES É ALMIRANTE
O drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado
Por que o País vive mais uma crise grave? A resposta é simples, mas suas consequências nocivas permeiam os grandes problemas brasileiros: o drama nacional decorre basicamente do déficit de qualidade na condução do nosso Estado gigante e complexo.
Território extenso e bem dotado de recursos naturais, ausência de catástrofes ambientais e de contenciosos internacionais ou nacionais graves não significam sucesso automático. A qualidade da atuação humana no uso desse quadro favorável é condição indispensável e está hoje, como esteve no passado, aquém da necessária, do topo à base da pirâmide social. Para o tema deste artigo é ao alto da pirâmide e nele à elite política que cabe a maior responsabilidade – equação complicada, já que o poder político depende do voto da grande massa de cultura política precária, condicionada por seu cotidiano penoso e vulnerável à ilusão.
Limitando-nos ao pós-1930: no Brasil gradativamente industrializado os “coronéis” do velho patriarcado rural, atuantes na política no Império e na Primeira República, foram substituídos pelos “coronéis burgueses” das grandes empresas – incluídas empreiteiras a serviço do Estado – e pelos “coronéis pelegos” de organizações sindicais fortes, aqueles e estes inerentes ao novo modelo socioeconômico. A mudança dos atores influentes ocorreu em consonância com a evolução do conservadorismo para o ideário de feição liberal da classe média ascendente e para o populismo típico da democracia de massa urbanizada.
Mas a essência da política não mudou. Tal como na democracia tutelada pelo patriarcalismo conservador, que hierarquizava alto o interesse da oligarquia, as políticas simpáticas à classe média e ao populismo não atribuíam – não atribuem – relevância às exigências do País e às do País no mundo, em mudança radical: população, urbanização, industrialização e injunções ambientais em crescimento acelerado, integração regional e global na economia e na informação. Exigências dependentes de medidas nem sempre, se não raramente, dotadas de “apelo” eleitoral de curto prazo, quesito fundamental para quem pensa principalmente na próxima eleição – uma característica de nossa democracia.
O déficit na condução humana natural a esse paradigma de poder, pouco ou não motivado pela visão (pelo planejamento) do futuro, é agravado pela falácia do Estado interveniente em tudo, de origem histórica, mas inflado no pós-1930 e desde então também grande empresário. Apêndice natural do gigantismo, hoje em evidência no País: a vulnerabilidade do sistema político e do serviço público à corrupção, que, no Brasil como em todo o mundo, é proporcional à dimensão do Estado. Vivemos a cultura apoteótica mantida viva pelo interesse de seus beneficiários, por convicção ideológica ou pela inércia em frágil nível cultural, que entende o Estado como podendo e devendo tudo, à margem da realidade fiscal e de outras limitações. As mazelas do Estado gigante e de sua condução medíocre são ampliadas por nossa ilusão federativa inibidora dos governos locais: Federação política correta para país extenso e diversificado, mas desfigurada pela concentração fiscal na União.
Houve no passado alguns espasmos de planejamento, na Secretaria de Assuntos Estratégicos e, antes, no Conselho de Segurança Nacional, a que o mundo político não dedicava entusiasmo porque sem peso político no povo ou por desinteresse cultural – político e da sociedade. E no contexto econômico-financeiro atual, o que nosso Ministério do Planejamento realmente planeja é a complexa distribuição da escassez orçamentária. Sufocado pelo imediato socioeconômico e suas consequências na política, o futuro aguarda soluções competentes, algumas provavelmente penosas, que, se não se concretizarem, a cobrança virá: ocorrerão outras crises. Como estaríamos hoje se, em felizes manifestações de competência e visão de futuro, não tivessem sido construídas nos 1970 Itaipu, outras grandes hidrelétricas e a ponte Rio-Niteroi...?
Em suma, o déficit de qualidade na condução do Estado “complicado” por sua irrealista onipotência e onipresença é a causa responsável básica pela situação difícil que estamos vivendo. E da mesma forma que somos hoje vítimas de insuficiências (?) do passado, agravadas por insuficiências recentes, as gerações subsequentes seguirão vítimas de crises decorrentes de insuficiências da condução atual. Cabe à condução nacional atual planejar e deslanchar as bases de um futuro sem sustos. Infelizmente, o panorama político confuso que estamos vivendo não sugere segurança de que isso venha a acontecer. O governo tenta controlar o tormento presente, mas estamos planejando e adotando medidas que propiciem esperança de progresso em tranquilidade no futuro? Quando a participação no poder se impõe à revelia de ideias sobre o presente e o futuro, como tem acontecido na formação de nossos governos, a esperança na redenção se fragiliza.
Manifestação emblemática dessa insegurança: a resistência à reforma da Previdência, cujo déficit coberto pelo Estado tido como milagroso ameaça conduzir à catástrofe orçamentária e ao colapso dessa garantia social. Necessária hoje e, sobretudo, com vista ao futuro, mas que põe em risco a reeleição de quem votar em coerência com a realidade e na contramão do ilusório populista, a reforma tende a desembocar no paliativo, que apenas adia a catástrofe. Raciocínio similar se aplica à revisão de tópicos da CLT, anacrônicos no cenário socioeconômico atual, diferente do que existia ao tempo da promulgação desse código. A postergação da reforma tributária (que supostamente “federalizaria” a Federação...) é outro caso da mesma natureza.
Condução em déficit de qualidade, de Estado gigante, interveniente em tudo e com deficiências de organização, é convite à crise, se não ao desastre. Podemos corrigir isso?
* MARIO CESAR FLORES É ALMIRANTE
A chance de uma produtiva reforma política - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 30/07
Com a proibição das doações de empresas, partidos começam a apoiar medidas que reduzam o número de legendas no Congresso, algo positivo para a democracia
Por uma dessas trapaças do acaso, uma reforma política que há tempos bate às portas do Congresso, mas renitentes parlamentares resistem a executá-la, pode se viabilizar. Trata-se de duas alterações tópicas, capazes de reorganizar o quadro partidário na melhor direção: menos partidos, portanto mais representativos.
Há tempos é defendida a aprovação de uma cláusula de desempenho, para que apenas partidos que consigam um mínimo dos votos nacionais e regionais tenham acesso pleno ao fundo partidário e ao horário dito gratuito de rádio e TV. Há ainda a intenção de se acabar com a coligação em eleições proporcionais, outra medida cujo efeito também é barrar a entrada no Legislativo de político sem voto.
As alterações estão numa proposta de emenda constitucional do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Em nenhuma hipótese estará sendo cerceado o direito constitucional de livre reunião e congregação em partidos. Porém, apenas os mais votados teriam assento no Congresso e demais prerrogativas. Um princípio democrático, seguido em várias sólidas democracias, como a alemã.
Da maneira que está é que não se pode continuar. Existem 38 legendas oficializadas e, dessas, 28 estão representadas no Congresso. E há vários pedidos em tramitação para o lançamento de novas agremiações. A Torre de Babel partidária pode ficar ainda pior.
Explica-se: ter um partido é ótimo negócio, pois garante acesso automático à distribuição de 5% do Fundo Partidário, hoje de R$ 800 milhões. Disso resultado que cada legenda deverá receber este ano cerca de R$ 1 milhão. Tenha ou não votos e parlamentares nas Casas legislativas. Há ainda o movimentado balcão de negociação de minutos na propaganda eleitoral.
Transformar política em negócio é envenenar a democracia. Além de tudo, a enorme pulverização partidária dificulta a formação de alianças para dar sustentação aos governos. Este é outro incentivo à corrupção, como demonstrou o PT de Lula e Dilma.
Os parlamentares eram renitentes a uma reforma neste sentido porque, mesmo de partidos nanicos, sempre ganharam uma fatia do bolo fermentado pelo dinheiro do contribuinte. A boa notícia é que, segundo O GLOBO, o fim da doação de empresas gerou um efeito positivo: sem dinheiro, os partidos veem que esta reforma é o caminho para terem acesso ao Fundo, sem precisar repartir o dinheiro com muitas legendas.
Pela proposta de Ferraço, a cláusula estabeleceria, para começar, a exigência mínima de 2% dos votos nacionais, e distribuídos por pelo menos 14 estados. A partir de 2022, o índice subiria para 3%, preservando-se os 2% nos 14 estados. A barreira ficaria, então, abaixo dos 5% do limite estabelecido em 1995 para entrar em vigor nas eleições de 2006. Infelizmente, a cláusula foi derrubada pelo Supremo, sob o argumento de que revogaria direitos das minorias. Ministros da Corte já admitem o equívoco.
Se a crise econômica força governo e Congresso a fazer reformas cruciais — na Previdência, por exemplo —, há este efeito bem-vindo no universo político. As mudanças deverão reduzir o número de partidos no Congresso dos atuais 28 para 10 ou 12. Aumentarão a visibilidade do cenário político-parlamentar e a representatividade de cada agremiação. Por isso, esta reforma política deve ser tratada com a urgência dos aperfeiçoamentos na economia.
Por uma dessas trapaças do acaso, uma reforma política que há tempos bate às portas do Congresso, mas renitentes parlamentares resistem a executá-la, pode se viabilizar. Trata-se de duas alterações tópicas, capazes de reorganizar o quadro partidário na melhor direção: menos partidos, portanto mais representativos.
Há tempos é defendida a aprovação de uma cláusula de desempenho, para que apenas partidos que consigam um mínimo dos votos nacionais e regionais tenham acesso pleno ao fundo partidário e ao horário dito gratuito de rádio e TV. Há ainda a intenção de se acabar com a coligação em eleições proporcionais, outra medida cujo efeito também é barrar a entrada no Legislativo de político sem voto.
As alterações estão numa proposta de emenda constitucional do senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES). Em nenhuma hipótese estará sendo cerceado o direito constitucional de livre reunião e congregação em partidos. Porém, apenas os mais votados teriam assento no Congresso e demais prerrogativas. Um princípio democrático, seguido em várias sólidas democracias, como a alemã.
Da maneira que está é que não se pode continuar. Existem 38 legendas oficializadas e, dessas, 28 estão representadas no Congresso. E há vários pedidos em tramitação para o lançamento de novas agremiações. A Torre de Babel partidária pode ficar ainda pior.
Explica-se: ter um partido é ótimo negócio, pois garante acesso automático à distribuição de 5% do Fundo Partidário, hoje de R$ 800 milhões. Disso resultado que cada legenda deverá receber este ano cerca de R$ 1 milhão. Tenha ou não votos e parlamentares nas Casas legislativas. Há ainda o movimentado balcão de negociação de minutos na propaganda eleitoral.
Transformar política em negócio é envenenar a democracia. Além de tudo, a enorme pulverização partidária dificulta a formação de alianças para dar sustentação aos governos. Este é outro incentivo à corrupção, como demonstrou o PT de Lula e Dilma.
Os parlamentares eram renitentes a uma reforma neste sentido porque, mesmo de partidos nanicos, sempre ganharam uma fatia do bolo fermentado pelo dinheiro do contribuinte. A boa notícia é que, segundo O GLOBO, o fim da doação de empresas gerou um efeito positivo: sem dinheiro, os partidos veem que esta reforma é o caminho para terem acesso ao Fundo, sem precisar repartir o dinheiro com muitas legendas.
Pela proposta de Ferraço, a cláusula estabeleceria, para começar, a exigência mínima de 2% dos votos nacionais, e distribuídos por pelo menos 14 estados. A partir de 2022, o índice subiria para 3%, preservando-se os 2% nos 14 estados. A barreira ficaria, então, abaixo dos 5% do limite estabelecido em 1995 para entrar em vigor nas eleições de 2006. Infelizmente, a cláusula foi derrubada pelo Supremo, sob o argumento de que revogaria direitos das minorias. Ministros da Corte já admitem o equívoco.
Se a crise econômica força governo e Congresso a fazer reformas cruciais — na Previdência, por exemplo —, há este efeito bem-vindo no universo político. As mudanças deverão reduzir o número de partidos no Congresso dos atuais 28 para 10 ou 12. Aumentarão a visibilidade do cenário político-parlamentar e a representatividade de cada agremiação. Por isso, esta reforma política deve ser tratada com a urgência dos aperfeiçoamentos na economia.
Réu, Lula entra na faxina da era PT como detrito - JOSIAS DE SOUZA
BLOG DO JOSIAS DE SOUZA
Prestes a ser confirmado pelo Senado, o impeachment de Dilma Roussef marca o fim da era petista no poder federal —uma época que acaba com exames de consciência e uma tentativa de faxina. Convertido em réu pela primeira vez num processo relacionado à Lava Jato, Lula entra nesse pedaço da história brasileira como detrito.
Suprema ironia: um dia depois de recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU contra o juiz Sérgio Moro, Lula foi enviado ao banco dos réus por outro magistrado. O doutor Ricardo Leite, de Brasília, aceitou a denúncia em que a Procuradoria da República acusa Lula, o senador cassado Delcidio Amaral e outras cinco pessoas de tentar sabotar a Lava Jato comprando o silêncio do delator Nestor Cerveró por R$ 250 mil.
Esse pedaço do escândalo ficou em Brasília graças ao empenho da defesa de Lula para desmembrar a Lava Jato, afastando-a da mesa de Moro. O petismo soltou fogos quando o ministro Teori Zavaschi, relator do caso no STF, decidiu manter na Capital esse naco do inquérito. Deu chabu. A exemplo do que já sucedeu com partes do processo enviadas para outras praças, juízes de São Paulo e do Rio parecem acometidos de uma espécie de ‘efeito Moro’. Tomam decisões draconianas uma atrás da outra.
Para que outra época comece, a faxina é fundamental. É preciso recolocar o abajur em pé, desentortar a vara do trombone e certificar-se de que o governo de Michel Temer não continuará tentando esconder peemedebistas sujos sob o tapete. Dessa limpeza depende a qualidade da democracia brasileira.
Lula amou a democracia até o capítulo que estipulava que um ex-operário também pode chegar à Presidência da República. Passou a abominar o sistema depois que o Brasil se deu conta de que numa democracia plena todos são iguais perante a lei. Tratado como detrito e já meio farto de tanta democracia, Lula agora se queixa à ONU dos alegados excessos da “República de Curitiba”.
Prestes a ser confirmado pelo Senado, o impeachment de Dilma Roussef marca o fim da era petista no poder federal —uma época que acaba com exames de consciência e uma tentativa de faxina. Convertido em réu pela primeira vez num processo relacionado à Lava Jato, Lula entra nesse pedaço da história brasileira como detrito.
Suprema ironia: um dia depois de recorrer ao Comitê de Direitos Humanos da ONU contra o juiz Sérgio Moro, Lula foi enviado ao banco dos réus por outro magistrado. O doutor Ricardo Leite, de Brasília, aceitou a denúncia em que a Procuradoria da República acusa Lula, o senador cassado Delcidio Amaral e outras cinco pessoas de tentar sabotar a Lava Jato comprando o silêncio do delator Nestor Cerveró por R$ 250 mil.
Esse pedaço do escândalo ficou em Brasília graças ao empenho da defesa de Lula para desmembrar a Lava Jato, afastando-a da mesa de Moro. O petismo soltou fogos quando o ministro Teori Zavaschi, relator do caso no STF, decidiu manter na Capital esse naco do inquérito. Deu chabu. A exemplo do que já sucedeu com partes do processo enviadas para outras praças, juízes de São Paulo e do Rio parecem acometidos de uma espécie de ‘efeito Moro’. Tomam decisões draconianas uma atrás da outra.
Para que outra época comece, a faxina é fundamental. É preciso recolocar o abajur em pé, desentortar a vara do trombone e certificar-se de que o governo de Michel Temer não continuará tentando esconder peemedebistas sujos sob o tapete. Dessa limpeza depende a qualidade da democracia brasileira.
Lula amou a democracia até o capítulo que estipulava que um ex-operário também pode chegar à Presidência da República. Passou a abominar o sistema depois que o Brasil se deu conta de que numa democracia plena todos são iguais perante a lei. Tratado como detrito e já meio farto de tanta democracia, Lula agora se queixa à ONU dos alegados excessos da “República de Curitiba”.
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