FOLHA DE SP - 30/03
Caso o raro leitor tenha a impressão de já ter lido esta coluna, minhas sinceras desculpas. No entanto, como lamentei mais de uma vez, se os responsáveis pela política econômica insistem na repetição, o que pode fazer o analista senão seguir com a brincadeira?
Digo isso a propósito de nova decisão desastrada no campo da política econômica, expressa em mais uma mudança da meta fiscal. A original, R$ 24 bilhões, foi reduzida para cerca de R$ 3 bilhões, o que em si não chega a ser um completo desastre; o problema, na verdade, refere-se às inúmeras exceções, deduções, abatimentos, descontos, cláusulas de escape, desculpas esfarrapadas e afins, que permitem, no final das contas, que mesmo um deficit primário na casa de R$ 100 bilhões (1,6% do PIB) seja tomado como coerente com a (minúscula) meta fiscal.
A mera leitura do parágrafo acima já é suficiente para ilustrar a desmoralização do regime de política fiscal. Pelas regras, a meta fiscal para determinado ano é fixada em abril do ano anterior pela LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e guia a proposta orçamentária propriamente dita, enviada ao Congresso em agosto do mesmo ano.
Passados 11 meses, contudo, o governo de plantão pode não apenas alterar a meta determinada pela LDO mas violar as leis da matemática, em particular as que distinguem números positivos dos negativos e fingir que tudo vai bem.
Institucionalmente falando, trata-se da pá de cal sobre o regime que foi montado a partir do final do século passado, em torno do qual se articulou a visível melhora das contas públicas entre 1999 e 2008.
Tem razão meu amigo Samuel Pessôa em destacar o papel central da evolução da receita tributária no período, mas, de uma forma ou de outra, as regras vigentes não permitiram que todo crescimento da arrecadação terminasse por se tornar expansão ainda maior da despesa, o que certamente já deixou de ser o caso hoje.
Afora isso, a afirmação do ministro da Fazenda ("Eli, Eli, lamá sabachtháni?"*) acerca do "papel anticíclico" da despesa pública seria de fazer chorar qualquer economista de verdade.
Não se trata apenas de lembrar que essa mesma política, sob o comando da patativa genovesa, devidamente escudada pelo atual ministro, esteve no centro da deterioração econômica que nos trouxe à atual crise; ainda mais relevante, no presente contexto, é notar que preços de mercado já embutem um risco significativo de calote da dívida nacional, circunstância sob a qual a eficácia do gasto público para aumentar a demanda e a atividade praticamente inexiste.
Talvez nelson barbosa (pode manter as minúsculas, revisor) saiba disso, embora eu não coloque minha mão no fogo. Ainda assim, em face das pressões para a alteração da política econômica por parte do ex-futuro ministro da Casa Civil, o mais provável é que ele simplesmente não tenha tido a coragem de manter o rumo.
Afinal de contas, depois de tantos anos junto à patativa, não há coluna dorsal que não aprenda as virtudes da extraordinária flexibilidade.
Fica, portanto, mais difícil crer na sinceridade de propósito de seu "ajuste fiscal de longo prazo", ainda mais porque se trata da mesma proposta fulminada pela presidente ainda em sua encarnação como ministra. Não há rumo; apenas solidão.
"Deus meu, Deus meu, por que me abandonaste?", palavras de Jesus antes de morrer, segundo a Bíblia
quarta-feira, março 30, 2016
Marginais em ação - EDITORIAL O ESTADÃO
ESTADÃO - 30/03
Lula é o Partido dos Trabalhadores. Sem ele o PT não existe. Para os petistas, a palavra de Lula é lei, mandamento supremo que, como tal, se sobrepõe a qualquer preceito legal, inclusive os estabelecidos pela Constituição federal. Em 2012, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou por corrupção a cúpula dirigente do PT no rumoroso processo do mensalão, Lula decidiu que as sentenças foram ditadas “sem provas”, por pressão da opinião pública e da mídia. Sua palavra de ordem foi rigorosamente acatada pela manada petista, que, para compensar a “injustiça” praticada contra seus ex-dirigentes, elevou-os à categoria de “guerreiros do povo brasileiro”. A partir de então ficou estabelecido para o lulopetismo o princípio à luz do qual as leis devem ou não ser respeitadas: o interesse de Lula. A partir de então, do ponto de vista legal – e não se trata, neste caso, de nada relacionado com a Lava Jato – Luiz Inácio Lula da Silva optou claramente pela marginalidade, para a qual arrasta todo o seu séquito, inclusive a presidente da República.
Hoje, a grande questão legal em jogo é o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Vários ministros do STF já declararam que o impeachment é um instituto legal previsto pela Constituição federal. Com base nesse princípio, a própria Suprema Corte recentemente estabeleceu os procedimentos a serem observados pelo Congresso Nacional para o julgamento do impeachment da chefe do Executivo. Mas Lula, Dilma e os petistas não querem saber. Para eles, impeachment é golpe. Repetem isso incansavelmente, como um mantra. E é lamentável verificar que pessoas supostamente bem informadas, a pretexto de defender “as instituições democráticas” que Lula demoliu, não se pejam de engrossar o coro.
Em torno do interesse maior de Lula, que é sua própria sobrevivência política, e sob sua coordenação, está em curso uma ampla e agressiva campanha para combater o “golpe” e, a partir do desembarque do PMDB do governo, para tentar desmoralizar Michel Temer, sucessor natural da presidente, cujo mandato está agora por um fio. Essa campanha tem dois focos distintos. No âmbito do Congresso, destina-se a comprar, literalmente, o apoio de parlamentares em número suficiente para barrar o processo de impeachment. Trata-se de uma compra pura e simples, porque a mercadoria à venda é o cargo público a ser pago com um voto contra o impeachment.
No âmbito mais amplo da opinião pública, a estratégia cumprida por determinação de Lula envolve ações que variam das ameaças verbais a investidas no melhor estilo black bloc, como a realizada na segunda-feira na Câmara dos Deputados, e ainda a mobilização dos movimentos sociais que giram na órbita lulista para manifestações de rua, como as programadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O episódio de guerrilha urbana promovido na Câmara dos Deputados teve o patrocínio de juristas e advogados militantes ou simpatizantes do PT e destinava-se a impedir – o termo, por absurdo que pareça, é exatamente este – que o presidente e outros membros da direção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolassem o pedido de impeachment de Dilma Rousseff que foi aprovado por 26 votos contra 2 pelo Conselho Federal da entidade. Aos berros, empurrões e tapas, os quadrilheiros de Lula procuraram, em vão, impedir que o documento da OAB fosse entregue. É assim que a turma de Lula defende a democracia.
No plenário do Senado, o líder do PT, Humberto Costa, ameaçou Michel Temer de ser “o próximo a cair” depois de Dilma e garantiu: “Não haverá trégua a esse movimento golpista, nem antes, nem depois, caso ele venha, vergonhosamente, a se materializar”. Por sua vez, um dos coordenadores do MST, Alexandre Conceição, em ato pró-Dilma na Câmara repetiu a palavra de ordem ditada por Lula: “Está ocorrendo uma manobra inconstitucional, um golpe”. E acrescentou que Eduardo Cunha e Michel Temer doravante “não vão ter paz”, para concluir com uma proclamação de enorme alienação: “Para manter os ganhos sociais só há uma saída: manter Dilma na Presidência”. Alguém precisa explicar ao moço quem é que está pondo a perder os “ganhos sociais”.
Lula é o Partido dos Trabalhadores. Sem ele o PT não existe. Para os petistas, a palavra de Lula é lei, mandamento supremo que, como tal, se sobrepõe a qualquer preceito legal, inclusive os estabelecidos pela Constituição federal. Em 2012, quando o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou por corrupção a cúpula dirigente do PT no rumoroso processo do mensalão, Lula decidiu que as sentenças foram ditadas “sem provas”, por pressão da opinião pública e da mídia. Sua palavra de ordem foi rigorosamente acatada pela manada petista, que, para compensar a “injustiça” praticada contra seus ex-dirigentes, elevou-os à categoria de “guerreiros do povo brasileiro”. A partir de então ficou estabelecido para o lulopetismo o princípio à luz do qual as leis devem ou não ser respeitadas: o interesse de Lula. A partir de então, do ponto de vista legal – e não se trata, neste caso, de nada relacionado com a Lava Jato – Luiz Inácio Lula da Silva optou claramente pela marginalidade, para a qual arrasta todo o seu séquito, inclusive a presidente da República.
Hoje, a grande questão legal em jogo é o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Vários ministros do STF já declararam que o impeachment é um instituto legal previsto pela Constituição federal. Com base nesse princípio, a própria Suprema Corte recentemente estabeleceu os procedimentos a serem observados pelo Congresso Nacional para o julgamento do impeachment da chefe do Executivo. Mas Lula, Dilma e os petistas não querem saber. Para eles, impeachment é golpe. Repetem isso incansavelmente, como um mantra. E é lamentável verificar que pessoas supostamente bem informadas, a pretexto de defender “as instituições democráticas” que Lula demoliu, não se pejam de engrossar o coro.
Em torno do interesse maior de Lula, que é sua própria sobrevivência política, e sob sua coordenação, está em curso uma ampla e agressiva campanha para combater o “golpe” e, a partir do desembarque do PMDB do governo, para tentar desmoralizar Michel Temer, sucessor natural da presidente, cujo mandato está agora por um fio. Essa campanha tem dois focos distintos. No âmbito do Congresso, destina-se a comprar, literalmente, o apoio de parlamentares em número suficiente para barrar o processo de impeachment. Trata-se de uma compra pura e simples, porque a mercadoria à venda é o cargo público a ser pago com um voto contra o impeachment.
No âmbito mais amplo da opinião pública, a estratégia cumprida por determinação de Lula envolve ações que variam das ameaças verbais a investidas no melhor estilo black bloc, como a realizada na segunda-feira na Câmara dos Deputados, e ainda a mobilização dos movimentos sociais que giram na órbita lulista para manifestações de rua, como as programadas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
O episódio de guerrilha urbana promovido na Câmara dos Deputados teve o patrocínio de juristas e advogados militantes ou simpatizantes do PT e destinava-se a impedir – o termo, por absurdo que pareça, é exatamente este – que o presidente e outros membros da direção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) protocolassem o pedido de impeachment de Dilma Rousseff que foi aprovado por 26 votos contra 2 pelo Conselho Federal da entidade. Aos berros, empurrões e tapas, os quadrilheiros de Lula procuraram, em vão, impedir que o documento da OAB fosse entregue. É assim que a turma de Lula defende a democracia.
No plenário do Senado, o líder do PT, Humberto Costa, ameaçou Michel Temer de ser “o próximo a cair” depois de Dilma e garantiu: “Não haverá trégua a esse movimento golpista, nem antes, nem depois, caso ele venha, vergonhosamente, a se materializar”. Por sua vez, um dos coordenadores do MST, Alexandre Conceição, em ato pró-Dilma na Câmara repetiu a palavra de ordem ditada por Lula: “Está ocorrendo uma manobra inconstitucional, um golpe”. E acrescentou que Eduardo Cunha e Michel Temer doravante “não vão ter paz”, para concluir com uma proclamação de enorme alienação: “Para manter os ganhos sociais só há uma saída: manter Dilma na Presidência”. Alguém precisa explicar ao moço quem é que está pondo a perder os “ganhos sociais”.
Navio fantasma - CELSO MING
ESTADÃO - 30/03
Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar; Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”
Com o desembarque do PMDB, o governo Dilma se transforma em navio fantasma. Sem timoneiro, sem mastros, sem lanterna de popa, transforma-se em massa informe e passiva, ao sabor do vento e das ondas.
Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar. Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”, como se o que está por acontecer seja realmente um golpe e como se bastasse recitar esse mantra para afastar o pior.
Os ataques indiscriminados à Justiça e ao Ministério Público sugerem que a presidente Dilma tem uma concepção confusa do que seja a independência dos Três Poderes e dos valores republicanos. Começou por dizer, em junho de 2015, que não respeita delator, esquecida de que foi ela própria quem promulgou a lei da delação premiada. Continuou por afirmar que a Operação Lava Jato trabalha com alvos seletivos, sem dar-se conta de que ela esteve entre os que pretendiam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, fosse alvo prioritário - e, portanto, também seletivo - do juiz Sérgio Moro.
Para arrancar os 172 votos de que precisa na Câmara, Dilma se dedica agora a garimpar políticos dispostos a aceitar cargos no governo em troca de apoio contra o impeachment, que recompusesse, assim, parte da base perdida com a defecção desta terça-feira, tendo em conta que nem todos os políticos do PMDB pularam fora.
Se conseguir safar-se, o que parece improvável, o que seria seu governo nos dois anos e pico que lhe sobrariam do atual mandato? Com que munição política conseguiria governar? E, mais importante, até que ponto o PT seguiria disposto a apoiar sua presidenta que refuga tão veementemente suas propostas de política econômica?
As posturas contraditórias complicam tudo. A presidente Dilma mostra-se, às vezes, interessada em negociar, mas, ao mesmo tempo, ataca quem poderia ajudá-la. E, entre os políticos, passou a ser conhecida como quem é incapaz de respeitar acordos.
As coisas ainda poderiam ser mais fáceis se a presidente Dilma admitisse seus erros, tanto na condução da política econômica quanto na condução das operações políticas. Mas ela não se mostra nunca disposta a pedir desculpas e a recomeçar em novas bases.
A hipótese de troca de governo, cada vez mais provável, não clareia o entorno. A primeira reação poderia ser de entusiasmo do mercado financeiro e dos agentes econômicos, mas há uma enorme e dolorosa conta a apresentar à população. O governo já admite que a queda do PIB deste ano será de 3,1%. É inevitável que a renda per capita caia em torno de 10% no biênio 2015 -16. O desemprego vai para mais de 10% da força de trabalho. As contas públicas estão em frangalhos, como se viu nesta terça-feira com a divulgação do relatório fiscal. A dívida bruta avança para os 80% da renda média do brasileiro. A indústria está em processo de desmanche. A Petrobrás, à beira do colapso.
As semanas seguintes à provável substituição de comando no governo, qualquer que seja ele, tenderiam a continuar fortemente conturbadas. E, além do mais, continuariam sob a influência de antigas e novas revelações da Operação Lava Jato.
CONFIRA:
Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar; Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”
Com o desembarque do PMDB, o governo Dilma se transforma em navio fantasma. Sem timoneiro, sem mastros, sem lanterna de popa, transforma-se em massa informe e passiva, ao sabor do vento e das ondas.
Nem uma estratégia de sobrevivência a presidente Dilma parece capaz de adotar. Por ora, dedica-se a repetir a seus devotos que “não vai ter golpe”, como se o que está por acontecer seja realmente um golpe e como se bastasse recitar esse mantra para afastar o pior.
Os ataques indiscriminados à Justiça e ao Ministério Público sugerem que a presidente Dilma tem uma concepção confusa do que seja a independência dos Três Poderes e dos valores republicanos. Começou por dizer, em junho de 2015, que não respeita delator, esquecida de que foi ela própria quem promulgou a lei da delação premiada. Continuou por afirmar que a Operação Lava Jato trabalha com alvos seletivos, sem dar-se conta de que ela esteve entre os que pretendiam que o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, fosse alvo prioritário - e, portanto, também seletivo - do juiz Sérgio Moro.
Para arrancar os 172 votos de que precisa na Câmara, Dilma se dedica agora a garimpar políticos dispostos a aceitar cargos no governo em troca de apoio contra o impeachment, que recompusesse, assim, parte da base perdida com a defecção desta terça-feira, tendo em conta que nem todos os políticos do PMDB pularam fora.
Se conseguir safar-se, o que parece improvável, o que seria seu governo nos dois anos e pico que lhe sobrariam do atual mandato? Com que munição política conseguiria governar? E, mais importante, até que ponto o PT seguiria disposto a apoiar sua presidenta que refuga tão veementemente suas propostas de política econômica?
As posturas contraditórias complicam tudo. A presidente Dilma mostra-se, às vezes, interessada em negociar, mas, ao mesmo tempo, ataca quem poderia ajudá-la. E, entre os políticos, passou a ser conhecida como quem é incapaz de respeitar acordos.
As coisas ainda poderiam ser mais fáceis se a presidente Dilma admitisse seus erros, tanto na condução da política econômica quanto na condução das operações políticas. Mas ela não se mostra nunca disposta a pedir desculpas e a recomeçar em novas bases.
A hipótese de troca de governo, cada vez mais provável, não clareia o entorno. A primeira reação poderia ser de entusiasmo do mercado financeiro e dos agentes econômicos, mas há uma enorme e dolorosa conta a apresentar à população. O governo já admite que a queda do PIB deste ano será de 3,1%. É inevitável que a renda per capita caia em torno de 10% no biênio 2015 -16. O desemprego vai para mais de 10% da força de trabalho. As contas públicas estão em frangalhos, como se viu nesta terça-feira com a divulgação do relatório fiscal. A dívida bruta avança para os 80% da renda média do brasileiro. A indústria está em processo de desmanche. A Petrobrás, à beira do colapso.
As semanas seguintes à provável substituição de comando no governo, qualquer que seja ele, tenderiam a continuar fortemente conturbadas. E, além do mais, continuariam sob a influência de antigas e novas revelações da Operação Lava Jato.
CONFIRA:
Estoque de crédito
O gráfico mostra o comportamento do crédito, tanto no segmento livre como no direcionado.
Efeito recessão
O estoque de crédito prestado pelo sistema financeiro é o reflexo do que se passa na economia. Retração de 0,5% em fevereiro, em relação a janeiro; e aumento de apenas 5,3% em 12 meses. Não são só os bancos que se mantêm relativamente arredios das operações de crédito. Também empresas e pessoas físicas não se mostram dispostas a assumir mais riscos numa conjuntura de recessão e de queda do consumo.
O gráfico mostra o comportamento do crédito, tanto no segmento livre como no direcionado.
Efeito recessão
O estoque de crédito prestado pelo sistema financeiro é o reflexo do que se passa na economia. Retração de 0,5% em fevereiro, em relação a janeiro; e aumento de apenas 5,3% em 12 meses. Não são só os bancos que se mantêm relativamente arredios das operações de crédito. Também empresas e pessoas físicas não se mostram dispostas a assumir mais riscos numa conjuntura de recessão e de queda do consumo.
A farsa do ‘golpe’ construída pelo lulopetismo - EDITORIAL O GLOBO
O GLOBO - 30/03
Aceitar a tese de que seria ilegal o afastamento de Dilma, por meio da Justiça, é admitir que o Supremo participaria de uma ação de cunho político contra princípios constitucionais
Na estratégia de defesa e nas ações de agitação e propaganda de um PT e de uma presidente acuada no Planalto, a palavra “golpe” ganha grande relevância. “Golpe” é curto, fácil de pronunciar e adequado para ser gritado em manifestações — mas nada tem a ver com a crise política por que passa o país, na qual estão atolados PT e Dilma, e muito menos com o processo de impeachment da presidente em tramitação na Câmara.
O partido se encalacra a cada avanço da Lava-Jato, e ontem a presidente sofreu derrota emblemática, com a formalização pelo PMDB da saída da base do governo. Deve puxar uma fila de novas defecções, porque político, em geral, não gosta de ser sócio de derrocadas.
À medida que a campanha pelo impedimento crescia e o juiz Sérgio Moro, com a força-tarefa da Lava-Jato, se aproximava do ex-presidente Lula, a militância criou termos paradoxais, como “golpe constitucional”. Ora, se é golpe, não pode ser constitucional.
PT e aliados marcaram para amanhã, 31 de março, manifestações em defesa do governo e, por óbvio, farão referência ao golpe dado pelos militares, apoiados pelas classes médias e alta, há 52 anos.
Pura manipulação, porque o Brasil de 2016 nada tem a ver com o de 1964. A Lava-Jato, em que atuam de maneira coordenada a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal, trabalha sem atropelos constitucionais. E quando a defesa considera haver alguma ilegalidade, recorre às devidas instâncias judiciais. Se não tem conseguido muitos êxitos, é pela solidez das provas e argumentos do juiz Sérgio Moro. Equivocam-se, então, os que enxergam uma conspiração antidemocrática no combate à corrupção.
Já o processo de impeachment de Dilma, por sua vez, transita pelas instituições sem atropelos. Em 64 seria diferente. Acreditar no conto da carochinha do “golpe” é aceitar como verdadeiro o conluio do Supremo numa operação para defenestrar ilegalmente Dilma do Planalto. Só numa alucinação. Vários ministros da Corte já negaram esta ideia tresloucada: seu presidente, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Celso de Mello. Prova irrefutável da institucionalidade do impeachment é que seu rito foi estabelecido pelo próprio STF, com base naquele seguido contra Collor, em 1992.
Em 1964, houve ruptura institucional, com o atropelamento, pelos militares, das instituições. O golpe farsesco convence apenas desinformados e ingênuos, serve tão-somente aos mal-intencionados — estes, sim, golpistas — que desejam envolver numa espessa nuvem de fumaça as provas e evidências de grossa corrupção que envolve quadros petistas.
Aceite quem quiser que políticas de supostos benefícios aos pobres podem justificar a roubalheira. Não num país com instituições republicanas sólidas.
Aceitar a tese de que seria ilegal o afastamento de Dilma, por meio da Justiça, é admitir que o Supremo participaria de uma ação de cunho político contra princípios constitucionais
Na estratégia de defesa e nas ações de agitação e propaganda de um PT e de uma presidente acuada no Planalto, a palavra “golpe” ganha grande relevância. “Golpe” é curto, fácil de pronunciar e adequado para ser gritado em manifestações — mas nada tem a ver com a crise política por que passa o país, na qual estão atolados PT e Dilma, e muito menos com o processo de impeachment da presidente em tramitação na Câmara.
O partido se encalacra a cada avanço da Lava-Jato, e ontem a presidente sofreu derrota emblemática, com a formalização pelo PMDB da saída da base do governo. Deve puxar uma fila de novas defecções, porque político, em geral, não gosta de ser sócio de derrocadas.
À medida que a campanha pelo impedimento crescia e o juiz Sérgio Moro, com a força-tarefa da Lava-Jato, se aproximava do ex-presidente Lula, a militância criou termos paradoxais, como “golpe constitucional”. Ora, se é golpe, não pode ser constitucional.
PT e aliados marcaram para amanhã, 31 de março, manifestações em defesa do governo e, por óbvio, farão referência ao golpe dado pelos militares, apoiados pelas classes médias e alta, há 52 anos.
Pura manipulação, porque o Brasil de 2016 nada tem a ver com o de 1964. A Lava-Jato, em que atuam de maneira coordenada a Justiça, o Ministério Público e a Polícia Federal, trabalha sem atropelos constitucionais. E quando a defesa considera haver alguma ilegalidade, recorre às devidas instâncias judiciais. Se não tem conseguido muitos êxitos, é pela solidez das provas e argumentos do juiz Sérgio Moro. Equivocam-se, então, os que enxergam uma conspiração antidemocrática no combate à corrupção.
Já o processo de impeachment de Dilma, por sua vez, transita pelas instituições sem atropelos. Em 64 seria diferente. Acreditar no conto da carochinha do “golpe” é aceitar como verdadeiro o conluio do Supremo numa operação para defenestrar ilegalmente Dilma do Planalto. Só numa alucinação. Vários ministros da Corte já negaram esta ideia tresloucada: seu presidente, Ricardo Lewandowski, Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Celso de Mello. Prova irrefutável da institucionalidade do impeachment é que seu rito foi estabelecido pelo próprio STF, com base naquele seguido contra Collor, em 1992.
Em 1964, houve ruptura institucional, com o atropelamento, pelos militares, das instituições. O golpe farsesco convence apenas desinformados e ingênuos, serve tão-somente aos mal-intencionados — estes, sim, golpistas — que desejam envolver numa espessa nuvem de fumaça as provas e evidências de grossa corrupção que envolve quadros petistas.
Aceite quem quiser que políticas de supostos benefícios aos pobres podem justificar a roubalheira. Não num país com instituições republicanas sólidas.
Vexame - ROBERTO ABDENUR
O GLOBO - 30/03
A presidente Dilma certamente não fez uma reflexão mais detida sobre o que poderiam ser as consequências do convite ao Corpo Diplomático para o encontro com juristas
Passou algo despercebido, nos últimos dias, o sentido mais amplo de insólita iniciativa tomada pela presidente da República. Refiro-me à convocação do Corpo Diplomático em Brasília para assistir ao evento denominado “Encontro com Juristas pela Legalidade da Democracia”. Na ocasião, a presidente expôs sua visão dos presentes acontecimentos e alinhavou argumentos contra o que considera ser um “golpe” e séria “ameaça à democracia”, capaz de “deixar profundas cicatrizes na vida política brasileira”. Compareceram ao evento, ao que consta, cerca de três dezenas de embaixadores e encarregados de negócios.
Embora em outro nível hierárquico — e certamente agindo à revelia do próprio governo —, dias antes um diplomata tomara a iniciativa de enviar aos postos no exterior reiteradas instruções no sentido de que fizessem ampla divulgação, junto à sociedade civil local, de denúncias sobre a “tentativa de golpe” que supostamente estaria a ocorrer no Brasil. Esse anedótico episódio não mereceria menção se não fosse sintomático do afã do governo e seus simpatizantes em projetar para fora do país a visão conspiratória que armou em sua defesa contra o impeachment.
Ambas as iniciativas vieram evidenciar como a linha de defesa contra o impeachment adotada pela presidente e pelas forças políticas que a apoiam extrapola significativamente os limites do cabível no que diz respeito à preservação da imagem do país aos olhos da comunidade internacional, acarretando prejuízos para nossos interesses tanto em questões de política externa quanto nos campos econômico e financeiro. E isto no momento em que o processo de devastação de nossa economia ora em curso, ao impacto dos erros cometidos pelo governo, já abala fortemente a credibilidade do país.
A presidente Dilma certamente não fez uma reflexão mais detida sobre o que poderiam ser as consequências do convite ao Corpo Diplomático estrangeiro. O evento constituiu espetáculo de autoflagelação. Flagelação da imagem do país, mas também autoflagelação da própria presidente.
Não se tem notícia, na história de nossas numerosas crises políticas, de situação em que o próprio chefe de Estado e de governo tenha recorrido a semelhante iniciativa, em esforço de angariar simpatia e apoio de governos estrangeiros para sua posição política. Uma posição que, deve a presidente saber em seu íntimo, não se coaduna com a realidade dos fatos, como atestam o correto funcionamento das instituições de Estado — Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal — e enfáticas declarações de membros do STF mostrando a completa legalidade do processo de impeachment.
O gesto da presidente valeu-lhe declarações de apoio por parte de três ou quatro governos “bolivarianos”, desde logo profundamente gratos ao ex-presidente Lula por seu denodado apoio aos projetos autoritários e até ditatoriais por eles encetados.
Essas manifestações “bolivarianas” já tiveram o efeito de colocar o Brasil na vexatória posição de estar sujeito a sanções, sob a égide da cláusula democrática do Mercosul. Mesmo o novo governo argentino, que teve a lucidez de não associar- se às declarações “bolivarianas”, veio a público, pela voz de sua chanceler, para expressar preocupação com o que aqui ocorre, e dizer que não exclui a hipótese de alguma manifestação contra o alegado risco de “golpe”. Constituirá inenarrável humilhação para o Brasil eventual manifestação de nossos vizinhos que endosse, explícita ou mesmo implicitamente, os argumentos expostos pela presidente.
No que diz respeito à maioria dos outros governos, contudo, o episódio redundará em desprestígio e perda de credibilidade. Caso, com efeito, sobreviva ao processo de impeachment, a presidente Dilma, ao longo de todo o restante de seu mandato, não será levada maiormente a sério em encontros bilaterais ou em reuniões e conferências multilaterais. Mas o Brasil, de sua parte, perde desde logo por conta do impacto negativo da atitude da presidente sobre o espírito de governantes estrangeiros, empresas, bancos, investidores, agências de rating e outros atores. E, no mesmo compasso, veem-se prejudicadas a seriedade e a confiabilidade de nossa política externa.
Oxalá não passe pela cabeça do governo instruir nossas embaixadas a veicularem no exterior aquilo que foi dito no citado encontro de juristas com a presidente. O Itamaraty não pode ser rebaixado ao ponto de servir de veículo para uma iniciativa em tal sentido.
Roberto Abdenur é embaixador aposentado
A presidente Dilma certamente não fez uma reflexão mais detida sobre o que poderiam ser as consequências do convite ao Corpo Diplomático para o encontro com juristas
Passou algo despercebido, nos últimos dias, o sentido mais amplo de insólita iniciativa tomada pela presidente da República. Refiro-me à convocação do Corpo Diplomático em Brasília para assistir ao evento denominado “Encontro com Juristas pela Legalidade da Democracia”. Na ocasião, a presidente expôs sua visão dos presentes acontecimentos e alinhavou argumentos contra o que considera ser um “golpe” e séria “ameaça à democracia”, capaz de “deixar profundas cicatrizes na vida política brasileira”. Compareceram ao evento, ao que consta, cerca de três dezenas de embaixadores e encarregados de negócios.
Embora em outro nível hierárquico — e certamente agindo à revelia do próprio governo —, dias antes um diplomata tomara a iniciativa de enviar aos postos no exterior reiteradas instruções no sentido de que fizessem ampla divulgação, junto à sociedade civil local, de denúncias sobre a “tentativa de golpe” que supostamente estaria a ocorrer no Brasil. Esse anedótico episódio não mereceria menção se não fosse sintomático do afã do governo e seus simpatizantes em projetar para fora do país a visão conspiratória que armou em sua defesa contra o impeachment.
Ambas as iniciativas vieram evidenciar como a linha de defesa contra o impeachment adotada pela presidente e pelas forças políticas que a apoiam extrapola significativamente os limites do cabível no que diz respeito à preservação da imagem do país aos olhos da comunidade internacional, acarretando prejuízos para nossos interesses tanto em questões de política externa quanto nos campos econômico e financeiro. E isto no momento em que o processo de devastação de nossa economia ora em curso, ao impacto dos erros cometidos pelo governo, já abala fortemente a credibilidade do país.
A presidente Dilma certamente não fez uma reflexão mais detida sobre o que poderiam ser as consequências do convite ao Corpo Diplomático estrangeiro. O evento constituiu espetáculo de autoflagelação. Flagelação da imagem do país, mas também autoflagelação da própria presidente.
Não se tem notícia, na história de nossas numerosas crises políticas, de situação em que o próprio chefe de Estado e de governo tenha recorrido a semelhante iniciativa, em esforço de angariar simpatia e apoio de governos estrangeiros para sua posição política. Uma posição que, deve a presidente saber em seu íntimo, não se coaduna com a realidade dos fatos, como atestam o correto funcionamento das instituições de Estado — Judiciário, Ministério Público, Polícia Federal — e enfáticas declarações de membros do STF mostrando a completa legalidade do processo de impeachment.
O gesto da presidente valeu-lhe declarações de apoio por parte de três ou quatro governos “bolivarianos”, desde logo profundamente gratos ao ex-presidente Lula por seu denodado apoio aos projetos autoritários e até ditatoriais por eles encetados.
Essas manifestações “bolivarianas” já tiveram o efeito de colocar o Brasil na vexatória posição de estar sujeito a sanções, sob a égide da cláusula democrática do Mercosul. Mesmo o novo governo argentino, que teve a lucidez de não associar- se às declarações “bolivarianas”, veio a público, pela voz de sua chanceler, para expressar preocupação com o que aqui ocorre, e dizer que não exclui a hipótese de alguma manifestação contra o alegado risco de “golpe”. Constituirá inenarrável humilhação para o Brasil eventual manifestação de nossos vizinhos que endosse, explícita ou mesmo implicitamente, os argumentos expostos pela presidente.
No que diz respeito à maioria dos outros governos, contudo, o episódio redundará em desprestígio e perda de credibilidade. Caso, com efeito, sobreviva ao processo de impeachment, a presidente Dilma, ao longo de todo o restante de seu mandato, não será levada maiormente a sério em encontros bilaterais ou em reuniões e conferências multilaterais. Mas o Brasil, de sua parte, perde desde logo por conta do impacto negativo da atitude da presidente sobre o espírito de governantes estrangeiros, empresas, bancos, investidores, agências de rating e outros atores. E, no mesmo compasso, veem-se prejudicadas a seriedade e a confiabilidade de nossa política externa.
Oxalá não passe pela cabeça do governo instruir nossas embaixadas a veicularem no exterior aquilo que foi dito no citado encontro de juristas com a presidente. O Itamaraty não pode ser rebaixado ao ponto de servir de veículo para uma iniciativa em tal sentido.
Roberto Abdenur é embaixador aposentado
Não vai ter golpe - MERVAL PEREIRA
O GLOBO - 30/03
A por enquanto incipiente manobra de aliados governistas em torno de um acordo para que a própria presidente Dilma convoque eleição presidencial antecipada a se realizar juntamente com as eleições municipais em outubro deste ano, depende de duas coisas: que o processo de impeachment que já tramita no Congresso seja sustado, e que o vice Michel Temer aceite renunciar também.
Como se vê, há na proposta um golpe embutido, da mesma qualidade que a ideia de implantar-se o parlamentarismo, ou o semiparlamentarismo, em meio ao mandato em curso. Não, não vai ter golpe. O que esses engenhosos políticos estão articulando é dar um fôlego à presidente Dilma até outubro, para que ela tente empinar seu governo para que o PT, provavelmente com Lula de candidato se ele não for condenado antes pelo juiz Moro, tenha alguma chance de reverter a situação atual.
E vai que, no meio do caminho, Lula recupera sua antiga verve e carisma, e convença a maioria dos brasileiros de que tudo o que a Operação Lava-Jato desvendou é uma grossa mentira. Nada indica que isso poderia acontecer, mas a esperança é a última que morre.
A Rede de Marina Silva, por exemplo, se sente atraída pela ideia de eleições presidenciais já, que em tese parece ser a melhor saída mesmo. Mas não há soluções legais para que isso aconteça, a não ser que se espere a decisão do Tribunal Superior Eleitoral sobre a campanha presidencial de 2014.
A questão do tempo decorrido pode não ser obstáculo legal, pois uma alteração no Código Eleitoral, feita em 2015, diz que a qualquer momento, menos a seis meses do fim do mandato, a substituição será por eleição direta: “Art. 224, parágrafos 3 e 4 do Código Eleitoral
§ 3º A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.
· Parágrafo 3º acrescido pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015.
§ 4º A eleição a que se refere o § 3º correrá a expensas da Justiça Eleitoral e será:
I – indireta, se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato;
II – direta, nos demais casos.
· Parágrafo 4º e incisos I e II acrescidos pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015.
Embora essa alteração no Código Eleitoral possa ser contestada no Supremo, já que a Constituição determina que a eleição seja indireta a partir do terceiro ano do mandato do presidente impedido, até agora isso não foi feito. E é difícil imaginar quem será a favor de uma eleição indireta pelo Congresso. Não vale pensar em Eduardo Cunha ou Renan Calheiros e similares, pois não terão força eleitoral para fazer vingar esse golpe.
A dificuldade aí parece ser a certeza de que o país não aguenta mais muito tempo sem direção. O impeachment é a saída constitucional mais eficaz e rápida para resolver um problema institucional sério. Não há mais dúvida de que existem motivos de sobra para o impedimento da presidente, falando-se apenas de crimes de responsabilidade.
Além das pedaladas, há no pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) dois outros crimes de responsabilidade cometidos pela presidente: as tentativas de obstruir a Justiça com a nomeação de Lula para seu ministério, em vias de ser reconhecida pelo STF, e a pressão sobre um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), relatada pelo senador Delcídio do Amaral em sua delação premiada, para soltar empreiteiros presos na Operação Lava-Jato.
Mas, assim como o processo de impeachment não pode ser parado, também o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem que continuar, com o perigo de que, com a impugnação da eleição de 2014, também Michel Temer perca seu lugar no Palácio do Planalto. Ou que a Operação Lava Jato faça uma surpresa ao PMDB.
Se assim for, teremos novas eleições presidenciais e, por caminhos tortuosos, chegaremos a uma solução bem mais palatável sem recorrermos a atalhos que parecem bons dependendo de quem os defende, mas são na verdade tentativas de burlar a Constituição.
No momento, no pós-impeachment cada vez mais provável, Michel Temer será empossado presidente da República. Sem golpes.
A por enquanto incipiente manobra de aliados governistas em torno de um acordo para que a própria presidente Dilma convoque eleição presidencial antecipada a se realizar juntamente com as eleições municipais em outubro deste ano, depende de duas coisas: que o processo de impeachment que já tramita no Congresso seja sustado, e que o vice Michel Temer aceite renunciar também.
Como se vê, há na proposta um golpe embutido, da mesma qualidade que a ideia de implantar-se o parlamentarismo, ou o semiparlamentarismo, em meio ao mandato em curso. Não, não vai ter golpe. O que esses engenhosos políticos estão articulando é dar um fôlego à presidente Dilma até outubro, para que ela tente empinar seu governo para que o PT, provavelmente com Lula de candidato se ele não for condenado antes pelo juiz Moro, tenha alguma chance de reverter a situação atual.
E vai que, no meio do caminho, Lula recupera sua antiga verve e carisma, e convença a maioria dos brasileiros de que tudo o que a Operação Lava-Jato desvendou é uma grossa mentira. Nada indica que isso poderia acontecer, mas a esperança é a última que morre.
A Rede de Marina Silva, por exemplo, se sente atraída pela ideia de eleições presidenciais já, que em tese parece ser a melhor saída mesmo. Mas não há soluções legais para que isso aconteça, a não ser que se espere a decisão do Tribunal Superior Eleitoral sobre a campanha presidencial de 2014.
A questão do tempo decorrido pode não ser obstáculo legal, pois uma alteração no Código Eleitoral, feita em 2015, diz que a qualquer momento, menos a seis meses do fim do mandato, a substituição será por eleição direta: “Art. 224, parágrafos 3 e 4 do Código Eleitoral
§ 3º A decisão da Justiça Eleitoral que importe o indeferimento do registro, a cassação do diploma ou a perda do mandato de candidato eleito em pleito majoritário acarreta, após o trânsito em julgado, a realização de novas eleições, independentemente do número de votos anulados.
· Parágrafo 3º acrescido pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015.
§ 4º A eleição a que se refere o § 3º correrá a expensas da Justiça Eleitoral e será:
I – indireta, se a vacância do cargo ocorrer a menos de seis meses do final do mandato;
II – direta, nos demais casos.
· Parágrafo 4º e incisos I e II acrescidos pelo art. 4º da Lei nº 13.165/2015.
Embora essa alteração no Código Eleitoral possa ser contestada no Supremo, já que a Constituição determina que a eleição seja indireta a partir do terceiro ano do mandato do presidente impedido, até agora isso não foi feito. E é difícil imaginar quem será a favor de uma eleição indireta pelo Congresso. Não vale pensar em Eduardo Cunha ou Renan Calheiros e similares, pois não terão força eleitoral para fazer vingar esse golpe.
A dificuldade aí parece ser a certeza de que o país não aguenta mais muito tempo sem direção. O impeachment é a saída constitucional mais eficaz e rápida para resolver um problema institucional sério. Não há mais dúvida de que existem motivos de sobra para o impedimento da presidente, falando-se apenas de crimes de responsabilidade.
Além das pedaladas, há no pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) dois outros crimes de responsabilidade cometidos pela presidente: as tentativas de obstruir a Justiça com a nomeação de Lula para seu ministério, em vias de ser reconhecida pelo STF, e a pressão sobre um ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), relatada pelo senador Delcídio do Amaral em sua delação premiada, para soltar empreiteiros presos na Operação Lava-Jato.
Mas, assim como o processo de impeachment não pode ser parado, também o do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tem que continuar, com o perigo de que, com a impugnação da eleição de 2014, também Michel Temer perca seu lugar no Palácio do Planalto. Ou que a Operação Lava Jato faça uma surpresa ao PMDB.
Se assim for, teremos novas eleições presidenciais e, por caminhos tortuosos, chegaremos a uma solução bem mais palatável sem recorrermos a atalhos que parecem bons dependendo de quem os defende, mas são na verdade tentativas de burlar a Constituição.
No momento, no pós-impeachment cada vez mais provável, Michel Temer será empossado presidente da República. Sem golpes.
Temer, Lula e o pós-Dilma - ELIANE CANTANHÊDE
ESTADÃO - 30/03
Com o rompimento do PMDB, o foco sai da presidente Dilma Rousseff e passa para o vice Michel Temer, já que o impeachment ganhou ímpeto e tem até um “deadline”: a chegada da tocha olímpica ao Brasil, prevista para meados de maio. A intenção é gerar um ambiente de festa, congraçamento e recomeço – com um novo governo para mostrar ao mundo.
Quanto mais Dilma representa o passado, mais Temer passa a personificar o futuro, para o bem e para o mal. Para o bem, porque o vice sonha entrar para a história como o presidente da transição que reconduziu o País aos trilhos. Para o mal, porque ele vai atrair, junto com montanhas de adesões, também os raios e trovoadas do PT.
Se o discurso do PT e do governo é de que está em curso “um golpe” contra a democracia, agora é hora de dar cara, voz, cor e partido a esse “golpe”. É por isso que o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT), acusa Temer de “chefe do golpe” e o líder no Senado, Humberto Costa (PT), ameaça: se Dilma for destituída, Temer “seguramente será o próximo a cair”.
É a estratégia do medo, enquanto o Planalto troca as negociações partidárias (no “atacado”) por cooptação deputado a deputado (no “varejo”). Ambas – o medo e o varejo – são de altíssimo risco e de resultados incertos porque, quando a onda encorpa, ninguém segura.
Com o rompimento do PMDB, o cálculo de governo e oposição é que os partidos da base aliada vão debandar. O PSB já se foi e, aliás, fez um programa de TV duríssimo contra o governo na semana passada. O PRB também já vai tarde, apesar de a Igreja Universal do Reino de Deus ter lá seus interlocutores com o Planalto. O PSD libera os correligionários para votarem como bem entenderem. O PP e o PR serão os próximos.
Dilma acha que, além de comprar um voto daqui outro dali no Congresso, é capaz de se sustentar graças aos movimentos sociais alinhados com o PT. Eles vão às ruas agora para gritar contra “o golpe” e são uma ameaça a um eventual governo Temer – como, de resto, a qualquer composição que substitua Dilma e exclua o PT. Isso, porém, depende muito menos de Dilma e do governo e muito mais de Luiz Inácio Lula da Silva.
PT, CUT, UNE, MST... não vão às ruas por Dilma, mas sim por Lula e o que ele chama de “nosso projeto”, ameaçado pela Lava Jato e pela quebradeira da Petrobrás, mas principalmente pelo desastre Dilma, que desestruturou de tal forma da economia a ponto de, como informou o Estado, fechar 4.451 indústrias de transformação num único ano, 2015, e num único Estado, São Paulo, gerando milhões de desempregados. Não foi à toa que em torno de 400 entidades publicaram um contundente anúncio nos jornais de ontem clamando pelo impeachment.
Aí chegamos a Lula e à conversa que ele teve com o vice Michel Temer em São Paulo, em pleno Domingo de Páscoa. Lula não iria a Temer mendigar uma reviravolta do PMDB ou o adiamento da reunião que selou o fim da aliança com o Planalto. Mas Lula iria ao vice, sim, fazer uma avaliação dos cenários (inclusive o de Dilma fora, Temer dentro) e discutir um pacto de convivência que, em vez de destruir a transição com Temer, possa construir uma chance para o PT em 2018. De forma mais direta: Lula e o PT sabem que Dilma está perdida e já discutem o “day after”. Partir para um guerra com Temer em que ninguém sobreviveria ou selar uma trégua para uma recomposição de forças políticas e a recuperação da economia?
Para todos os efeitos, Lula está empenhado ao máximo em salvar Dilma. Na prática, está se mexendo para nem ele nem o PT morrerem com ela. Isso passa por um acordo com Temer e pode chegar a uma ordem de comando para, no caso da posse do vice, o exército vermelho sair das ruas e ficar apenas de prontidão.
Com o rompimento do PMDB, o foco sai da presidente Dilma Rousseff e passa para o vice Michel Temer, já que o impeachment ganhou ímpeto e tem até um “deadline”: a chegada da tocha olímpica ao Brasil, prevista para meados de maio. A intenção é gerar um ambiente de festa, congraçamento e recomeço – com um novo governo para mostrar ao mundo.
Quanto mais Dilma representa o passado, mais Temer passa a personificar o futuro, para o bem e para o mal. Para o bem, porque o vice sonha entrar para a história como o presidente da transição que reconduziu o País aos trilhos. Para o mal, porque ele vai atrair, junto com montanhas de adesões, também os raios e trovoadas do PT.
Se o discurso do PT e do governo é de que está em curso “um golpe” contra a democracia, agora é hora de dar cara, voz, cor e partido a esse “golpe”. É por isso que o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT), acusa Temer de “chefe do golpe” e o líder no Senado, Humberto Costa (PT), ameaça: se Dilma for destituída, Temer “seguramente será o próximo a cair”.
É a estratégia do medo, enquanto o Planalto troca as negociações partidárias (no “atacado”) por cooptação deputado a deputado (no “varejo”). Ambas – o medo e o varejo – são de altíssimo risco e de resultados incertos porque, quando a onda encorpa, ninguém segura.
Com o rompimento do PMDB, o cálculo de governo e oposição é que os partidos da base aliada vão debandar. O PSB já se foi e, aliás, fez um programa de TV duríssimo contra o governo na semana passada. O PRB também já vai tarde, apesar de a Igreja Universal do Reino de Deus ter lá seus interlocutores com o Planalto. O PSD libera os correligionários para votarem como bem entenderem. O PP e o PR serão os próximos.
Dilma acha que, além de comprar um voto daqui outro dali no Congresso, é capaz de se sustentar graças aos movimentos sociais alinhados com o PT. Eles vão às ruas agora para gritar contra “o golpe” e são uma ameaça a um eventual governo Temer – como, de resto, a qualquer composição que substitua Dilma e exclua o PT. Isso, porém, depende muito menos de Dilma e do governo e muito mais de Luiz Inácio Lula da Silva.
PT, CUT, UNE, MST... não vão às ruas por Dilma, mas sim por Lula e o que ele chama de “nosso projeto”, ameaçado pela Lava Jato e pela quebradeira da Petrobrás, mas principalmente pelo desastre Dilma, que desestruturou de tal forma da economia a ponto de, como informou o Estado, fechar 4.451 indústrias de transformação num único ano, 2015, e num único Estado, São Paulo, gerando milhões de desempregados. Não foi à toa que em torno de 400 entidades publicaram um contundente anúncio nos jornais de ontem clamando pelo impeachment.
Aí chegamos a Lula e à conversa que ele teve com o vice Michel Temer em São Paulo, em pleno Domingo de Páscoa. Lula não iria a Temer mendigar uma reviravolta do PMDB ou o adiamento da reunião que selou o fim da aliança com o Planalto. Mas Lula iria ao vice, sim, fazer uma avaliação dos cenários (inclusive o de Dilma fora, Temer dentro) e discutir um pacto de convivência que, em vez de destruir a transição com Temer, possa construir uma chance para o PT em 2018. De forma mais direta: Lula e o PT sabem que Dilma está perdida e já discutem o “day after”. Partir para um guerra com Temer em que ninguém sobreviveria ou selar uma trégua para uma recomposição de forças políticas e a recuperação da economia?
Para todos os efeitos, Lula está empenhado ao máximo em salvar Dilma. Na prática, está se mexendo para nem ele nem o PT morrerem com ela. Isso passa por um acordo com Temer e pode chegar a uma ordem de comando para, no caso da posse do vice, o exército vermelho sair das ruas e ficar apenas de prontidão.
Caminho estreito - MÍRIAM LEITÃO
O GLOBO - 30/03
O que está acontecendo, como disse ontem neste espaço, é a dinâmica de fuga de um governo cadente. E não fogem por virtude. Eles tentam escapar da cena do crime, porque acham que assim se salvam, mas a explicação que dão só poderia ser aceita se o país tivesse um surto coletivo de perda de memória. Os peemedebistas querem convencer o país de que não estiveram onde estiveram, não foram sócios do poder, não sustentaram as mesmas medidas.
A cena de ontem lembra um outro momento da história política. Em 1984, ao fim do regime militar, e depois de servi-lo fielmente por toda a ditadura, o senador José Sarney abandonou a presidência do PDS, partido do governo, e fez uma encenação de que estava sendo perseguido pelo regime. Apesar de tudo, o final da história o favoreceu: ele foi para o PMDB e virou presidente.
Na verdade, estão todos nos pedindo que apaguemos os arquivos da memória. O governo, com a ladainha de que há um golpe em andamento e que a democracia está ameaçada por um novo ciclo autoritário, quer trazer de volta um fantasma no qual só eles acreditam ou fingem acreditar. Tentam impor um medo sem qualquer base achando que assim reavivam um trauma do Brasil.
Até fatos recentes, as pessoas públicas quer que esqueçamos. O ministro Nelson Barbosa foi ontem ao Congresso defender o déficit público como algo bom para estabilizar a economia. Ao falar dessa sua crença na capacidade milagrosa do déficit, o ministro explicou que ele é resultado de dois problemas: o aumento forte das despesas obrigatórias e a queda das receitas a partir de 2010. Ora, quem estava no governo em 2010? E quem nos anos seguintes não adotou qualquer medida para resolver o problema? Pelo contrário, o governo Dilma ampliou subsídios e isenções num período de queda da receita. E nada fez para enfrentar o aumento das despesas obrigatórias. Os dois gráficos exibidos pelo ministro mostram o desgoverno — do qual ele fez e faz parte — que nos conduziu à pior recessão da nossa história e à grave crise fiscal que o país atravessa.
O governo Dilma acabou. Nenhum governo se sustenta com índice tão alto de rejeição, depois de mergulhar o país numa crise da qual não sabe como tirar, diante de acusações de corrupção tão graves como as que estão sendo divulgadas e no meio de uma debandada da sua base parlamentar.
A contradição é que o partido que se apresenta como sucedâneo é o sócio do mesmo governo, parceiro nas mesmas transações, co-piloto das mesmas políticas. Evidentemente não é crível como opositor ao governo do qual ainda sequer se desligou.
Do ponto de vista da defesa de novos valores, ontem foi também um dia emblemático. Voluntários entregaram ao Congresso dois milhões de assinaturas em uma proposta de medidas contra a corrupção. Elas foram colhidas em todos os estados cumprindo o percentual de cada unidade da federação estabelecido pela Lei. Foi um ano de campanha em que pessoas do país inteiro se mobilizaram para convencer pessoas de que aquelas ideias poderiam ajudar o país.
A proposta das dez medidas nasceu no Ministério Público Federal de Curitiba após o estudo de casos de países que tiveram sucesso no combate à corrupção. Este não é, claro, um problema só brasileiro. Muitos países, no entanto, conseguiram subir vários degraus na escala da Transparência Internacional. Foi a partir de medidas que deram certo em vários países que se fez a proposta que chegou ontem ao Congresso como projeto de iniciativa popular.
O momento é de extrema gravidade. Não há solução boa no curto prazo, mas é em iniciativas como esta, das dez medidas, que deve repousar nossa esperança. Uma esperança cansada, admito, mas este é o sentido da mudança que devemos perseguir, por mais estreito que seja o caminho. Foi em nome destas ideias que se reuniram dois milhões de assinaturas num tempo breve.
Começar de novo - DORA KRAMER
ESTADÃO - 30/03
O PMDB ontem encerrou um capítulo da longa narrativa da crise ao confirmar a retirada de seu apoio ao governo e, com isso, aproximar o Brasil da possibilidade de ver interrompido o segundo mandato presidencial no espaço de pouco mais de 20 anos.
O epílogo dessa história, no entanto, ainda está por ser escrito. Caso venha mesmo a ocorrer o impeachment da presidente Dilma Rousseff, essa tarefa caberá ao conjunto das forças políticas – se possível com o PT incluído – em aliança com a sociedade e as demais instituições. O País não aguenta mais o atual governo, é verdade.
A hipótese do fim antes do tempo regulamentar propicia um horizonte de alívio imediato, embora não represente a solução para os males que nos assolam nem significa o fim do caminho. Ao contrário: marca a urgente necessidade de um recomeço, pois o Brasil tampouco aguenta mais conviver com a incúria, a corrupção e o cinismo na forma de fatores imprescindíveis ao exercício do poder.
A luta, portanto, continua, vai além do ciclo do PT. É muito maior que a montagem de um governo de transição “surpreendentemente bom”, conforme as palavras do senador José Serra, espectador e interlocutor privilegiado do episódio atual e daquele que resultou na queda de Fernando Collor há 24 anos. Se a provável interrupção do governo Dilma não resultar numa proposta firme e séria de recomeço, o impeachment não terá valido de coisa alguma.
Suas excelências estejam atentas: trocar seis por meia dúzia não vai angariar a simpatia do público escaldado e temente até de água fria. O governo de Itamar Franco cumpriu seu dever de transição. Serviu a uma alteração de paradigmas logo de imediato, mas não se prestou à extinção das velhas e viciadas práticas. Apesar disso, construiu algo ao resultar no Plano Real que estabilizou a economia e preparou o País para o crescimento.
Se for o caso de Dilma ser substituída, a quem vier a assumir no lugar dela – o vice ou um novo eleito – caberá dar início a um processo de demolição de uma obra podre e, ato contínuo, a reconstrução de um Brasil em alicerces fincados em valores segundo os quais incúria, corrupção, cinismo, demagogia não sejam regra e passem a ser exceção.
Disposição transitória. Os tucanos, inclusive aqueles favoráveis à participação do PSDB em eventual governo de transição presidido por Michel Temer, defendem como premissa para qualquer acordo o compromisso do vice de não se candidatar a presidente em 2018.
No ano passado, quando as conversas sobre o tema consideravam o afastamento de Dilma como hipótese ainda remota, o tucanato chegou a propor a Temer a apresentação de uma emenda ao capítulo das Disposições Transitórias da Constituição, cujo texto contemplaria essa condição.
Na época, Temer rechaçou a proposta.
Para concluir. A título de mero registro: dos ministros e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal que já se pronunciaram em prol da legalidade do processo de impeachment, repudiando a tese do “golpe”, cinco foram indicados em governos do PT. Luis Roberto Barroso, Antônio Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Carlos Ayres Britto e Eros Grau.
Isso sem contar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que durante os últimos anos esteve entre a omissão e a ponderação no tocante a críticas ao governo, que não apenas respalda como acaba de apresentar novo pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Evidência de que, no caso em tela, a espada é a lei.
O PMDB ontem encerrou um capítulo da longa narrativa da crise ao confirmar a retirada de seu apoio ao governo e, com isso, aproximar o Brasil da possibilidade de ver interrompido o segundo mandato presidencial no espaço de pouco mais de 20 anos.
O epílogo dessa história, no entanto, ainda está por ser escrito. Caso venha mesmo a ocorrer o impeachment da presidente Dilma Rousseff, essa tarefa caberá ao conjunto das forças políticas – se possível com o PT incluído – em aliança com a sociedade e as demais instituições. O País não aguenta mais o atual governo, é verdade.
A hipótese do fim antes do tempo regulamentar propicia um horizonte de alívio imediato, embora não represente a solução para os males que nos assolam nem significa o fim do caminho. Ao contrário: marca a urgente necessidade de um recomeço, pois o Brasil tampouco aguenta mais conviver com a incúria, a corrupção e o cinismo na forma de fatores imprescindíveis ao exercício do poder.
A luta, portanto, continua, vai além do ciclo do PT. É muito maior que a montagem de um governo de transição “surpreendentemente bom”, conforme as palavras do senador José Serra, espectador e interlocutor privilegiado do episódio atual e daquele que resultou na queda de Fernando Collor há 24 anos. Se a provável interrupção do governo Dilma não resultar numa proposta firme e séria de recomeço, o impeachment não terá valido de coisa alguma.
Suas excelências estejam atentas: trocar seis por meia dúzia não vai angariar a simpatia do público escaldado e temente até de água fria. O governo de Itamar Franco cumpriu seu dever de transição. Serviu a uma alteração de paradigmas logo de imediato, mas não se prestou à extinção das velhas e viciadas práticas. Apesar disso, construiu algo ao resultar no Plano Real que estabilizou a economia e preparou o País para o crescimento.
Se for o caso de Dilma ser substituída, a quem vier a assumir no lugar dela – o vice ou um novo eleito – caberá dar início a um processo de demolição de uma obra podre e, ato contínuo, a reconstrução de um Brasil em alicerces fincados em valores segundo os quais incúria, corrupção, cinismo, demagogia não sejam regra e passem a ser exceção.
Disposição transitória. Os tucanos, inclusive aqueles favoráveis à participação do PSDB em eventual governo de transição presidido por Michel Temer, defendem como premissa para qualquer acordo o compromisso do vice de não se candidatar a presidente em 2018.
No ano passado, quando as conversas sobre o tema consideravam o afastamento de Dilma como hipótese ainda remota, o tucanato chegou a propor a Temer a apresentação de uma emenda ao capítulo das Disposições Transitórias da Constituição, cujo texto contemplaria essa condição.
Na época, Temer rechaçou a proposta.
Para concluir. A título de mero registro: dos ministros e ex-ministros do Supremo Tribunal Federal que já se pronunciaram em prol da legalidade do processo de impeachment, repudiando a tese do “golpe”, cinco foram indicados em governos do PT. Luis Roberto Barroso, Antônio Dias Toffoli, Cármen Lúcia, Carlos Ayres Britto e Eros Grau.
Isso sem contar a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que durante os últimos anos esteve entre a omissão e a ponderação no tocante a críticas ao governo, que não apenas respalda como acaba de apresentar novo pedido de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Evidência de que, no caso em tela, a espada é a lei.
Hora de faxina - RODRIGO CRAVEIRO
CORREIO BRAZILIENSE - 30/03
Impeachment deixou de ser um processo constitucional e legítimo. Passou a ser golpe. Simpatizantes da oposição viraram coxinhas. A classe média, no alto de suas varandas gourmets, não tem direito de reclamar os seus direitos. Tornou-se uma espécie de parasita social, que conquistou benesses durante os primeiros quatro anos de gestão petista e caminha rumo à derrocada em meio à crise econômica. Ironias à parte, infantilizamos o debate político e relegamos ao segundo plano fatos incontestáveis. Nunca antes na história se roubou tanto, ao mesmo tempo em que se tenta contestar uma operação policial histórica e corajosa.
Impeachment deixou de ser um processo constitucional e legítimo. Passou a ser golpe. Simpatizantes da oposição viraram coxinhas. A classe média, no alto de suas varandas gourmets, não tem direito de reclamar os seus direitos. Tornou-se uma espécie de parasita social, que conquistou benesses durante os primeiros quatro anos de gestão petista e caminha rumo à derrocada em meio à crise econômica. Ironias à parte, infantilizamos o debate político e relegamos ao segundo plano fatos incontestáveis. Nunca antes na história se roubou tanto, ao mesmo tempo em que se tenta contestar uma operação policial histórica e corajosa.
No Brasil, investigado é empossado ministro; réu dirige a maior das casas do Legislativo; presidente alimenta o discurso do ódio, ao denunciar golpe; deputados cuja probidade inexiste seguem achincalhando a nação, enquanto juram dar sua parcela de contribuição para o povo. Até mesmo opositores que se destacavam como paladinos da moral, da ética e da honradez veem todo o seu discurso egocêntrico ruir como um castelo de cartas, citados no limbo.
Se vivemos dias difíceis, parte da culpa é nossa. Ficamos tempo demais deitados em berço esplêndido, enquanto o nosso dinheiro era surrupiado por engravatados que nos faziam acreditar agirem em nome do bem-estar social. O nosso voto reconduziu ao poder figurões de histórico e de caráter duvidosos. Fizemos senador um ex-presidente que foi forçado a abandonar o Planalto por causa de um Fiat Elba. Ficamos tempo demais calados, enquanto a Petrobras, que um dia foi motivo de orgulho nacional, era assaltada sem piedade nem vergonha na cara.
Antes que me considerem de direita, sou avesso a rótulos. Questiono o populismo em sua forma mais pueril, por comprar apoio político em troca de migalhas. Abomino a figura de líderes que se escoram num partido e veem a ideologia do mesmo como única força motriz de um país. Talvez o Brasil consiga colher ventos amenos e frescos da tempestade pela qual atravessa. É hora de uma faxina na política. É tempo de retirar o poder dos corruptos e eleger os candidatos realmente compromissados com o altruísmo e com o desenvolvimento do Estado. Chega de sermos palhaços, enquanto o circo se incendeia e desaba sobre nós.
Assinar:
Postagens (Atom)